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"O que fará essa gente quando for decretada a completa emancipação dos escravos?" - serviço doméstico e escravidão nas plantations cafeeiras do Vale do Paraíba.

Resumo:

O presente artigo discute o tema da escravidão doméstica nas plantations cafeeiras do Vale do Paraíba Fluminense durante a segunda metade do século XIX. A análise é dividida em dois momentos principais. O primeiro traz uma discussão historiográfica sobre o tema na historiografia brasileira, enfatizando a importância do estudo da mesma no espaço rural onde se encontravam a grande maioria dos escravos do centro-sul do Império. O segundo reflete sobre os espaços fronteiriços que envolviam as relações senhores-escravos domésticos no ambiente da casa grande tendo como lócus privilegiado de estudo a fazenda Pau Grande.

Palavras chave:
Escravidão doméstica; Família; Vale do Paraíba; Brasil Império

Abstract:

This article discusses the issue of domestic slavery in coffee plantations located in the Paraiba Valley during the second half of the XIXth century. It is divided into two main parts. The first discusses how Brazilian historiography treats this topic and emphases the importance of studying domestic slavery in rural areas. The second analyses the relations between slaves and masters inside the big houses taking as a example the Pau Grande plantation.

Key words:
Domestic slavery; Family; Paraíba Valley; Brazilian Empire

Todo o serviço doméstico é feito por pretos: é um cocheiro preto quem nos conduz, uma preta que nos serve. Junto ao fogão, o cozinheiro é preto e a escrava amamenta a criança branca. Gostaria de saber o que fará essa gente quando for decretada a completa emancipação dos escravos.

Ina Von Binzen, 1886

Segundo levantamento da Organização Internacional do Trabalho (OIT), o Brasil possui na atualidade o maior número de empregados domésticos do mundo.1 1 Os dados aqui fornecidos foram retirados do relatório da Organização Internacional do Trabalho (OIT): Domestic workers across the world: global and regional statistics and extent of legal protection by International Labor Office Geneva, 14/1/2013, In: http://www.ilo.org/wcmsp5/groups/public/---dgreports/---dcomm/---publ/documents/publication/wcms_173363.pdf. Consultado em 15/1/2015. A pesquisa citada foi realizada entre 2009 e 2013 e cobriu todos os trabalhadores com carteira assinada de 117 países de diferentes continentes. No Brasil, os dados foram obtidos com base no censo do IBGE e não incluíram um número significativo de domésticas que trabalham na informalidade e/ou possuem 15 anos ou menos de idade. A inclusão destas variáveis certamente elevaria esse percentual, pois estima-se que somente 30% da categoria está empregada formalmente no Brasil. Consultar o Apêndice 2, p. 124. Pelos dados disponibilizados, trata-se de uma função majoritariamente feminina, pois 93% das 7,2 milhões de pessoas do setor são mulheres. O índice equivale à 17% da força de trabalho feminina com carteira assinada no país. Ou seja, uma a cada seis mulheres formalmente empregadas é doméstica, proporção que aumenta para 60% quando se trata de mulheres afrodescendentes. Os números apresentados constatam uma realidade social que mantém as mulheres, mais especificamente as de ascendência negra, em postos de trabalho precários, fora do circuito mercantil, com alto grau de informalidade, que exigem pouca ou nenhuma escolaridade e pagam baixos salários. Tal realidade se agrava quando pensamos que atualmente somente 30% das domésticas possuem carteira assinada e as mesmas só tiveram todos os direitos garantidos por lei aos outros trabalhadores do país no dia 1o de junho de 2015, após a aprovação da Lei Complementar 150 pela presidente Dilma Rousseuf.2 2 Na constituição de 1988, as empregadas domésticas não receberam os mesmos direitos trabalhistas das outras categorias. Em abril de 2013, o Senado Federal aprovou a proposta de emenda constitucional, o chamado PEC das Domésticas, igualando seus direitos aos demais trabalhadores. Sobre o tema, consultar: NUNES, Christane Girad & SILVA, Pedro Henrique Isaac. "Entre o prescrito e o real: o papel da subjetividade na efetivação dos direitos das empregadas domésticas no Brasil" In: Sociedade e Estado. Brasília, vol.28 No.3, Set./Dec; MELO, Hildete Pereira de. "Criadas e trabalhadoras". In: Estudos Feministas, Rio de Janeiro, v. 6, No. 2, 1998; BRUSCHINI, Cristina & LOMBARDI, Maria Rosa. "A bipolaridade do trabalho feminino no Brasil contemporâneo" In: Cadernos de Pesquisa, São Paulo, No 110, p. 67-104, 2000 e BRITES, Jurema. Serviço doméstico: elementos políticos de um campo desprovido de ilusões. Campos: Paraná, n. 3, p. 65-82, 2003.

Como entender tamanha diferença de direitos entre os trabalhadores brasileiros? Penso que a escravidão, o processo de abolição e as relações de trabalho no pós-abolição são fatores históricos importantes para a compreensão deste fenômeno. Afinal, o serviço doméstico foi fartamente executado por escravas durante o Império, além de ser o emprego que mais absorveu mulheres negras, ex-escravas, no pós-abolição.3 3 O fenômeno de incorporação de ex-escravas ao serviço doméstico já foi explorado pela historiografia americana. Ver: SHARPLESS, Rebecca. Cooking in Other Womens Kitchens: Domestic Workers in the South, 1865-1960. North Carolina, University of North Carolina Press, 2010 e GLYMPH, Travolia. Out of house of bondage: the trasnformation of the plantation household. Cambridge University Press, 2008. No novo contexto, as libertas foram integradas ao mercado de trabalho através da execução de serviços que, na maioria das vezes, lhes proporcionaram condições análogas à vida no cativeiro.4 4 Sobre as relações raciais e de trabalho no pós- abolição: COOPER, Frederick, HOLT, Thomas e SCOTT, Rebecca J., Beyond Slavery: explorations of race, labour, and citizenship in postemancipation societies, Chapel Hill, NC, University of North Carolina Press, 2000; e RIOS, Ana Maria & MATTOS, Hebe Maria "O pós-abolição como problema histórico: balanços e perspectivas" in: Topoi, nº 8, 2004, pp. 17-195. Tal situação se espraiou no tempo com a conivência de uma legislação que pouca atenção dedicou a tais trabalhadoras. As fronteiras de gênero e raça constituídas na vigência da escravidão foram suficientemente fortes para manterem a maioria das ex-escravas atreladas à esfera privada e doméstica, delegando-lhes posições de trabalho pouco valorizadas em termos sociais, culturais e econômicos. As consequências históricas deste processo são sentidas ainda hoje, como demonstrado pelos dados da OIT.

Durante a segunda metade do século XIX, o modelo de família construído pela classe senhorial do Império valorizou a etiqueta, o refinamento, as práticas de consumo a exemplo do novo habitus social em ascensão na Europa. Contudo, por aqui, a proximidade entre a ordem escravocrata e a ordem doméstica foi determinante das formas de se viver em família.5 5 Sobre o processo de transformação da família e do habitus da classe senhorial, consultar: MUAZE, Mariana. As memórias da viscondessa: família e poder no Império. RJ: Zahar, 2008. Este artigo parte do princípio de que, ao se reinventar, a família senhorial não só ressignifica um habitus europeu moldando-o a seu serviço, mas também transforma sua relação com aqueles com quem convive diariamente no ambiente da casa, ou seja os escravos domésticos. Neste processo, são introduzidos no espaço da casa um sem número de funções e serviços executados pela escravaria doméstica para gerar conforto, refinamento, além de obedecer os preceitos da etiqueta e do savoir vivre que vinham da Europa. Que serviços eram estes requisitados nas grandes fazendas? Quem os executava no que compete a sexo, idade, família? Que relações de poder envolviam senhores e escravos domésticos no novo contexto? Que espaços fronteiriços a convivência doméstica abria nas relações senhores-escravos? Pensar estas questões pode ser um primeiro passo para se entender as relações entre nosso passado escravista e a atual dificuldade de efetivação de direitos trabalhistas para os empregos domésticos no Brasil. Mas não somente isso. Num âmbito mais geral, tais perguntas ajudam a pensar o porquê a exclusão é constitutiva de nossa sociedade atual e a refletir sobre o papel de nossa matriz escravista na produção de afastamentos históricos entre povo e cidadania, entre povo e direitos, típicos da sociedade brasileira atual.6 6 Sobre a permanência de valores e concepções de mundo hierárquicos e desiguais no pós abolição e na atualidade, ver: SALLES, Ricardo. Nostalgia Imperial: escravidão e formação da identidade nacional no Brasil do Segundo Reinado. SP: Topbooks, 1996.

Ao que tudo indica, a preocupação da professora alemã Ina Von Binzen ao escrever para sua amiga alemã Grete, tinha fundamento: "o que fará essa gente quando for decretada a completa emancipação dos escravos?" Como pode ser comprovado pelos dados atuais sobre o emprego doméstico no Brasil, os mais de três séculos de domínio de relações escravistas não foram diluídos facilmente. Ao contrário, tendo a família como seu maior reduto, relações de trabalho baseadas na hierarquia, violência e desigualdade (que tinham como referência o período escravista) foram redesenhadas e se esgarçaram no tempo sob a proteção do privado. Tamanhas persistências explicam os dados levantados pelo relatório da OIT, mas também cenas que muitos de nós presenciam cotidianamente como babás uniformizadas de branco em lugares públicos (o que demarca claramente o seu lugar social em relação à família a quem acompanham), banheiros de clubes e locais diferenciados para uso das domésticas, muitos com quartos sem janelas e com tamanho muito reduzido, etc.

A complexidade das questões apontadas e as nuances na transição do trabalho escravo para o trabalho livre explicam que, no limite deste artigo, a discussão proposta se detenha ao período de vigência da escravidão no Brasil. A seguir, apresento a temática da escravidão doméstica no contexto da historiografia brasileira e faço apontamentos ainda preliminares sobre as relações entre senhores e cativos no interior das casas de morada das grandes propriedades rurais cafeeiras. Neste momento da pesquisa, me concentrei em levantar dados referentes à escravaria da fazenda Pau Grande, em Paty do Alferes, Vale do Paraíba fluminense, para buscar responder algumas provocações colocadas acima. A escolha desta região se justifica por sua centralidade na economia e na política do Império no contexto da "segunda escravidão"7 7 TOMICH, Dale W. Pelo prisma da escravidão: trabalho, capital e economia mundial. SP: EDUSP, 2011; MARQUESE, Rafael; TOMICH, Dale. "O Vale do Paraíba escravista e a formação do mercado mundial do café no século XIX" in: SALLES, Ricardo & GRINBERG, Keila (org). O Brasil Imperial. RJ: Civilização Brasileira, 2010, vol 3. . Durante o longo século XIX, o sistema capitalista industrial em ascensão fomentou concomitantemente a implementação do regime de trabalho assalariado na Europa e a escravidão em larga escala, em áreas produtoras de gêneros primários baratos, principalmente no sul dos Estados Unidos, Vale do Paraíba Fluminense e Caribe. Neste contexto, a região centro-sul fluminense manteve a maior concentração de escravos até o fim legal da escravidão no Império, com a assinatura da lei Áurea, em 1888.8 8 Sobre os mega proprietários do Vale do Paraíba Fluminense, ver: SALLES, Ricardo. E o vale era escravo. Vassouras, século XIX. RJ: Civilização Brasileira, 2008. Tal concentração geográfica da escravidão no Brasil foi acompanhada de uma concentração social, pois entre 1836 e 1850, durante a expansão do café, os grandes senhores possuíam a metade dos escravos do Vale do Paraíba Fluminense e, entre 1851 e 1865, este índice chegou a 72,2%.

Apontamentos sobre os estudos da escravidão doméstica no Brasil:

A manutenção cotidiana do domicílio foi uma das mais antigas e disseminadas formas de utilização do trabalho escravo no Brasil. O preparo e cozimento dos alimentos, o abastecimento de água, a dispensa dos dejetos em lugar apropriado, a vigilância das crianças, a confecção de utensílios de uso diário, a limpeza e a arrumação dos espaços eram funções realizadas nas mais diferentes casas da América Portuguesa e do Império, na grande maioria das vezes, por escravos africanos e seus descendentes. Com o recrudescimento do tráfico Atlântico de africanos na primeira metade do século XIX, o uso da mão de obra escrava em tarefas domésticas cresceu. Disseminada pelas diferentes camadas sociais do Império, era difícil se encontrar alguém que não possuísse ao menos um escravo. Nas cidades e em pequenas propriedades rurais, os cativos realizavam várias tarefas sem muita especialização, suprindo tanto os serviços de roça ou de rua, quanto os afazeres da casa. Contudo, em 1850, com o fim definitivo do tráfico, esta tendência foi revertida. Com a interrupção da entrada de mão de obra africana nos portos brasileiros, o preço da mesma aumentou de forma considerável e possuir escravos passou, cada vez mais, a ser privilégio de poucos. Pelo mesmo motivo, atividades econômicas com uma rentabilidade diminuta foram, gradativamente, se desfazendo de seus cativos através da venda dos mesmos para áreas produtoras em ascensão, sendo a principal delas o Vale do Paraíba cafeeiro, no centro sul.

No que compete às áreas urbanas, tamanha alteração na geografia e nos números da escravidão ocasionou uma profunda mudança nos mundos do trabalho nas décadas de 1870 e 1880. No que compete à esfera doméstica, houve uma multiplicação das formas e contratos que pode ser comprovada pela variedade de anúncios de jornal recrutando ou oferecendo trabalhadores libertos ou cativos. Através desta e de outras fontes, historiadores perceberam que, com o encarecimento do preço dos escravos após 1850, houve um aumento das práticas de alugar cativos e contratar libertos9 9 Ver: SOUZA, Flavia Fernandes. Para casa de família e mais serviços: O trabalho doméstico na cidade do Rio de Janeiro no final do século XIX. Dissertação de Mestrado. São Gonçalo / RJ: FFP/UERJ, 2009 e CARVALHO, Marcus F. M. de. "De portas adentro e de portas afora: trabalho doméstico e escravidão no Recife, 1822-1850" In: Afro-Ásia, Salvador, n. 29/30, p. 41-78, 2003; ARIZA, Marilia Bueno de Araujo. O ofício da liberdade: contratos de locação de serviços e trabalhadores libertandos em São Paulo e Campinas (1830 - 1888). FFLCH, USP, (dissertação de mestrado), 2012. para as funções de: lavadeiras, cozinheiras, mucamas, amas de leite, pajens, arrumadeiras, quituteiras, cocheiros, antes realizadas majoritariamente por escravos. No caso do trabalho escravo aqui em questão, eram caracterizados como de "portas adentro" (execução de serviços no interior da casa) ou "portas afora" (execução de serviços fora da casa, a exemplo de lavadeiras, negras de tabuleiro, etc.). Os escravos domésticos trabalhavam diretamente para seus proprietários ou "por aluguel", quando realizavam as funções destinadas na residência de outrem mediante ao pagamento de quantia estipulada por seu senhor. Muitos daqueles envolvidos nas atividades "portas afora" eram "de ganho", viviam "sobre si", ou seja executavam atividades que geravam renda e pagavam ao patrão (proprietário ou quem o tivesse alugando) uma féria diária. Contudo, com o declínio progressivo da escravidão a partir dos anos de 1870, como foi dito, muitos serviços domésticos passaram a ser executados por trabalhadores livres, alguns deles ex-escravos, complexificando ainda mais as relações entre patrões e empregados.10 10 No que compete à produção historiográfica sobre serviço doméstico no espaço urbano, destaco: SOUZA, Flavia Fernandes. Op. Cit; DIAS. Maria Odila Leite da Silva. Quotidiano e poder em São Paulo no século XIX. Editora Brasiliense, São Paulo, 1984; CARVALHO, Marcus F. M. de. "De portas adentro e de portas afora", Op. Cit.; SOARES, Luiz Carlos. "Escravidão Doméstica" In: O "povo de Cam" na capital do Brasil: a escravidão urbana no Riode Janeiro do século XIX. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2007 e KARASH, Mary. A vida dos escravos no Rio de Janeiro,1808-1850. SP: Cia das Letras, 2000.

A temática da escravidão doméstica não é nova nas análises históricas da sociedade brasileira. Ousaria dizer que Gilberto Freyre foi o primeiro estudioso a tratar do tema. Entendendo a família patriarcal como base da formação colonial brasileira, Freyre destacou o pater famílias - chefe da família, senhor de terras e escravos - como a autoridade máxima no espaço da "casa". Em sua interpretação, a família patriarcal incluía não somente os membros da família nuclear, mas também agregados, dependentes, escravos domésticos e escravos do eito, últimos na hierarquia social e de poder estabelecida. Dando ênfase às questões da mestiçagem e da vida privada, a escravidão doméstica foi valorizada na sua dimensão cultural e cotidiana pelas canções de ninar, histórias, brincadeiras, lendas, culinária e relações sexuais, tendo as amas de leite como a figura mais destacada da "escravaria de dentro". Escrevendo ainda nos anos 30 do século XX, a intenção do autor era ressaltar positivamente as influências da cultura negra e rebater as correntes cientificistas e racistas que consideravam a miscigenação um problema crônico na formação social brasileira de autores como Nina Rodrigues e Oliveira Vianna. Freyre ainda dedicaria o livro O Escravo nos anúncios de jornais brasileiros do século XIX para discutir, dentre outras coisas, a escravidão doméstica no cotidiano Imperial através da análise pioneira dos anúncios de hebdomadários como fonte de pesquisa.11 11 FREYRE, Gilberto. Casa Grande e Senzala. 25a., SP: José Olympio Editora, 1987. FREYRE, Gilberto. O Escravo nos anúncios de jornais brasileiros do século XIX. CBBA/Propeg: 1984.

Depois de longo intervalo, no contexto da História Social, a escravidão doméstica voltou a ser discutida nos anos 80 por historiadoras que enfatizaram a presença das mulheres na história. Os trabalhos de Maria Odila Leite Dias e Sandra Graham Lauderdale valorizaram as formas de resistência feminina e demonstraram como as mulheres burlavam as normas e inventavam novos modos de agir em busca de espaços de atuação social. A primeira problematizou o cotidiano e o papel das escravas e mulheres forras em São Paulo durante o Oitocentos, influenciando, com sua análise, uma série de pesquisas subsequentes. A segunda elegeu o binômio Proteção e Obediência como chave interpretativa das relações patriarcais no Brasil oitocentista e trabalhou com o serviço doméstico como objeto principal de análise.12 12 DIAS, Maria Odila Leite da Silva. Quotidiano e poder em São Paulo no século XIX. Op. Cit; GRAHAM, Sandra Lauderdale. House and Street: the domestic world of servants and masters in nineteenth-centrury Rio de Janeiro. University of Cambridge press, 1988 (traduzido para o português como "Proteção e Obediência: criadas e seus patrões no Rio de Janeiro, 1860-1910", SP: Cia das Letras, 1992). Destaco ainda: Kátia Matoso no livro: Ser Escravo no Brasil. SP: Brasiliense, 1990; MATOS, Maria Izilda Santos de. Cotidiano e cultura: história, cidade e trabalho. Bauru: EDUSC, 2002; e GRAHAM, Sandra Lauderdale. "O impasse da escravatura: prostitutas escravas, suas senhoras e a lei brasileira de 1871", In: Acervo, vol. 9, 1996.

Usando o conceito de "teias de significação" de Clifford Geertz, a historiadora norte-americana resgatou as visões, experiências e resistências dos escravos vivenciadas no âmbito das moradias senhoriais urbanas da cidade do Rio de Janeiro. Em pesquisa subsequente, Sandra Graham manteve suas reflexões acerca da escravidão doméstica, mas enfocou o meio rural através da micro análise das vidas da escrava Caetana e da liberta Bernardina, ambas habitantes do Vale do Paraíba cafeeiro.13 13 GRAHAM, Sandra Lauderdale. Caetana diz não. SP: Cia das Letras, 2005, Conforme os autos do processo no tribunal eclesiástico, Caetana foi obrigada a se casar com o escravo Custódio a mando de seu senhor, mas se recusou a ter relações sexuais com o marido. Já Bernardina aparece como principal herdeira do testamento de sua ex-senhora Inácia Delfina de Souza Werneck, contudo não conseguiu receber a quantia devido às manipulações do testamenteiro, o barão do Paty do Alferes. Ambos os exemplos são valorizados pela autora no sentido de demonstrar como mulheres de diferentes grupos sociais tentaram fazer valer suas vontades no contexto da sociedade patriarcal Oitocentista.

Atualmente, o serviço doméstico tem recebido cada vez mais atenção de pesquisadores interessados em discutir família, relações de gênero, mundos do trabalho, escravidão e pós Abolição. Preocupados em entender as relações sociais como dinâmicas e complexas, as análises contemporâneas admitem oportunidades de negociação para os diversos grupos sociais marginalizados - escravos, africanos livres, forros, trabalhadores livres, mulheres -, apesar do reconhecimento da extrema precarização das formas de vida e trabalho vivenciadas no cotidiano. Neste grupo, destaco os estudos de Maria Izilda Matos, Lorena Féres da Silva Telles, Marcus Carvalho, Camillia Cowling, Flavia Fernandes de Souza e Maria Olivia Gomes da Cunha14 14 MATOS, Maria Izilda Santos de. "Porta adentro: criados de servir em São Paulo de 1890 a 1930". In: BRUSCHINI, Maria Cristina; SORJ, Bila (Org.). Novos olhares: mulheres e relações de gênero no Brasil. São Paulo: Marco Zero, 1994; CARVALHO, Marcus J. M. de. Op. Cit; Flavia Fernandes de Souza. Op. Cit; COWLING, Camillia. Conceiving Freedom - women of color, gender, and the Abolition od Slavery in Havana and Rio de janeiro. Chapel Hill, University of North Carolina press, 2013; CUNHA, Olívia Maria Gomes da. "Criadas para servir: domesticidade, intimidade e retribuição". In: ______; GOMES, Flávio (Org.). Quase-Cidadão: histórias e antropologias da pós-emancipação no Brasil. Rio de Janeiro: FGV, 2007. que, para além de importantes reflexões sobre "os criados de servir", apresentam uma gama diversificada de fontes (literatura, memórias, "códigos de posturas municipais", processos criminais, ações de liberdade, relatório de chefes de polícia, anuncio de jornais, relatos de viajantes, censos e documentos escolares) aos interessados neste objeto. Os estudos são unânimes em apontar a hierarquização existente entre as diversas funções "domésticas" que eram exercidas por escravos e afirmam que, no topo da mesma, estavam as chamadas "amas de leite".

Em trabalho anterior, refleti sobre o papel das amas de leite nos núcleos familiares da classe senhorial do Império tendo como fio condutor as diferentes formas de tratar e conceber a infância no Oitocentos. Destaquei a persistência deste tipo de prática de amamentação, muito embora o discurso médico-científico e grande parte da imprensa feminina fossem contrários à mesma. Já Maria Elizabeth Ribeiro Carneiro trabalhou as amas no espaço da Santa Casa da Misericórdia e enfatizou como eram representadas no discurso médico científico, na literatura e na iconografia entre 1850-1888. Sandra Sofia Machado Kotsoukos e Maria Helena Machado também trouxeram importantes contribuições ao tema. A primeira fez um levantamento das fotografias de amas de leite em estúdios fotográficos do Império, concluindo que os retratos de crianças acompanhadas por amas eram a mais frequente imagem de escravos domésticos produzidas a mando das famílias senhoriais. A segunda demonstrou, através da análise de um processo criminal no qual a ama de leite sufoca e mata a criança branca, as várias tensões envolvidas nas relações entre os senhores e a escrava no âmbito da intimidade doméstica. Da narrativa dos diversos envolvidos no caso, emergem as agruras da escrava que vivia no conflito sobre a quem alimentar (seu filho Benedito ou o filho do senhor de mesmo nome), as inúmeras noites sem dormir, a superposição de atividades a serem executadas e as promessas não cumpridas do patrão. 15 15 MUAZE, Mariana. A Descoberta da infância: a formação de um habitus civilizado na boa sociedade imperial. Dissertação (Mestrado em História Social da Cultura) - PUC-RJ, Rio de Janeiro, 1999; CARNEIRO, Maria Elizabeth Ribeiro. Procura-se preta, com muito bom leite, prendada, carinhosa: uma cartografia das mas de leite na sociedade carioca 1850-1888. Tese (Doutorado em História) - PPGHIS, UNB, Brasília, 2006. MARTINS, Bárbara Canedo Ruiz. Amas-de-leite e mercado de trabalho feminino: descortinando práticas e sujeitos (Rio de Janeiro, 1830-1890). Dissertação (Mestrado em História) - Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2006. KOUTSOUKOS, Sandra Sofia Machado. "Amas na fotografia brasileira da segunda metade do século XIX". In: Studium- dossier Representação imagética das africanidades no Brasil. Campinas, 2007, disponível em: <http://www.studium.iar.unicamp.br/africanidades.html>, acesso em 18/12/2014. MACHADO, Maria Helena P. T., "Entre Dois Beneditos: histórias de amas de leite no ocaso da escravidão", in: XAVIER, Giovana, BARRETO, Juliana e GOMES, Flávio (orgs.), Mulheres Negras no Brasil escravista e do Pós- Emancipação. São Paulo: Sumus/Selo Negro, 2012.

Tendo em vista o quadro apresentado, é interessante notar que a complexidade das formas de escravidão, a problemática da agência, a resistência cotidiana, bem como as múltiplas experiências do ser escravo foram questões fartamente trabalhadas pela história social da escravidão. Contudo, no que compete à escravidão doméstica, gostaria de fazer duas considerações. A primeira diz respeito à necessidade se combinar as análises das ações e resistências escravas com um quadro geral das estruturas e processos econômicos, sociais, políticos e culturais em curso no Oitocentos, com o intuito de percebermos as ligações entre os mesmos. A segunda concerne a alta qualidade das pesquisas quem têm como lócus o meio urbano que se contrasta com a quase inexistência de interpretações para o meio rural. Ora, a vida rural foi bastante significativa da sociedade brasileira até, pelo menos, os anos 40 do século XX. Durante o Oitocentos, apesar da crescente importância que as cidades, notadamente o Rio de Janeiro, a grande maioria da população livre e de escravos, em particular, se concentrava no meio rural. Sendo que, após o fechamento do tráfico Atlântico de escravos, o número de cativos urbanos declinou em ritmo muito mais acentuado que no campo. O censo de 1872 aponta que as províncias de Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo, ou seja o centro-sul, concentrava mais da metade dos escravos de todo o Império. A maioria destes cativos estava alocada no campo como lavradores ("de roça", conforme demonstram diversas pesquisas em inventários e o censo de 1872), sendo o serviço doméstico a segunda função que mais aparece. Portanto, o investimento em pesquisas que abordem o tema nos diferentes espaços e conformações de propriedade rural é fundamental para o entendimento da sociedade Oitocentista como um todo. A exemplo do que ocorre na historiografia norte-americana,16 16 Assim como no caso brasileiro, a historiografia dedicada às questões de família e gênero contribuiu para transformar a escravidão doméstica em tema de pesquisa. Anne Firor Scott e Catherine Clinton, por exemplo, questionaram o ideal de mulher sulista como frágil e indefesa, demonstrando como as senhoras tiveram grande importância no cotidiano e nos negócios das plantations. Contudo, esta historiografia feminista ressaltava a senhora como a figura de autoridade da fazenda, sem dar aos escravos o devido destaque, o que minimizava as faces da violência a que estes trabalhadores estavam submetidos. Um livro importante para uma virada interpretativa a cerca da escravidão doméstica e da relação entre mulheres brancas e negras nas plantations escravistas, foi o de Elizabeth Fox-Genovese. A autora demonstrou como o trabalho cativo estava impregnado no cotidiano da "household". Nele, senhoras e cativas dividiam um mundo de antagonismos mútuos e sentimentos que frequentemente irrompiam em violência, crueldade e até morte. Em estudo publicado em 2008, Thavolia Glymph diagnostica os meandros das relações desiguais e de poder entre senhoras e escravas domésticas. Segundo ela, a violência e a humilhação marcaram o tratamento de escravas por senhoras, tornando estas últimas experts no uso da violência física e psicológica, além de personagens fundamentais na formação de valores e construção da sociedade escravista do sul. Sua análise não deixa de fora as formas de resistência escrava no cotidiano doméstico e as acompanha até o período pós emancipação. SCOTT, Anne Firor. The Southern lady: from pedestal to politics, 1830-1930. Charlottesville: University Press of Virginia, 1995. CLINTON, Catherine. The plantation mistress: women's worls in the old South. New York, Pantheon, 1982; _____Caught in the web of the big house in the web of Southern social relations: women, Family and education. Athens: university of Georgia press, 1985. FOX-GENOVESE, E. Within the plantation household: Chapel Hill: The University of North Carolina Press, 1988, p 35.GLYMPH, Travolia. Out of house of bondage, ambridge University Press, 2008. Para um exame das pequenas propriedades, cito: BURKE, Diane Mutti. On slavery's border: missouri's small slaveholding households 1815-1865. Athen and London: The University of Georgia Press, 2010. tal esforço possibilitaria uma revisão ampla do papel da escravidão doméstica em nossa formação histórica e acarretaria uma crítica aprofundada à noção de escravidão doméstica "docilizada", estabelecida por Freyre, e ainda hoje vigente no imaginário social brasileiro.

Entre a casa e o eito: escravidão doméstica rural nas plantations do Vale do Paraíba Fluminense.

Nessa parte do artigo, dedico maior atenção à fazenda Pau Grande e às relações entre senhores e escravos domésticos no interior de sua casa de morada. Localizada nas proximidades da vila de Paty do Alferes, a Pau Grande era uma das propriedades mais antigas, produtivas e importantes da região do Vale do Paraíba fluminense. Tendo começado como engenho de açúcar ainda no século XVIII sob o comando de proprietários José Rodrigues da Cruz e Antônio Ribeiro de Avellar, cresceu e estendeu seus limites até se tornar um dos maiores complexos cafeeiros de Vassouras sob a administração do Barão de Capiray e, posteriormente, de seu filho Joaquim Ribeiro de Avellar, Visconde de Ubá. Em 1863, com o falecimento do barão, seu filho o futuro Visconde de Ubá herdou um total de 709 escravos, o que o classifica como um mega proprietário de escravos.17 17 A denominação foi retirada do estudo de Ricardo Salles para o vale do Paraíba que considera de mega proprietário aqueles que possuem mais de 100 escravos. SALLES, Ricardo. E o vale era escravo. Op. Cit. A maior parte da fortuna recebida estava distribuída pelas terras e propriedades que constituíam a casa do Pau Grande: Cachoeira (122 escravos, 160.000 pés de café), Posse (104 escravos, 200.000 pés de café), São Joaquim (93 escravos, 168.000 pés de café), Glória (100 escravos, 100.000 pés de café), Papagaio (77 escravos, 200.000 pés de café) e, a já conhecida fazenda Pau Grande (213 escravos, sem quantidade de cafezais descriminada) onde residiam o senhor e sua família.18 18 Inventário do Barão de Capivary, 1863. Inventariante: Joaquim Ribeiro de Avellar Jr. Vassouras: CDH/ Universidade Severino Sombra, (caixa 116).

No que diz respeito à função dos escravos, o inventário do barão do Capivary é pouco detalhado. A maioria dos 709 cativos aparece sem função determinada, havendo somente as seguintes especificações: carpinteiro (1), carreteiro (3), de tropa (1), capataz (1), ferreiro (1), cozinheiro (1), alfaiate (1), pajem (1). A falta de definição das atividades dos cativos existente no documento, não era uma exceção à regra nos inventários do período. Tal formato deixa claro que, o que estava em jogo, eram a idade e a condição física, pois influenciavam diretamente no preço dos escravos e no monte-mor arrolado.19 19 A análise do bando de dados constituído pelos inventários de Vassouras, depositados no antigo CDH da Universidade Severino Sombra, demonstra nos 923 inventários arrolados entre 1821 e 1888 aparecem 30.534 escravos registrados e somente 2.829, ou seja 9,26%, possuíam algum tipo de ofício registrado. No livro E o Vale era o escravo Ricardo Salles afirma que os ofícios só começaram a ser anotados a partir de 1845.SALLES. Op. Cit. p. 202-3, Não há como explicar o porquê da qualificação destes homens e mulheres em especial neste documento, mas 3 deles podem ser considerados escravos domésticos: Felicidade (cozinheira, africana, 55 anos, 700$000), Juvenal (alfaiate, africano, 50 anos, 800$000) e Paschoal (pajem, crioulo, 33 anos, 1.300$000). A alta avaliação recebida pelos três justifica-se pelas funções especializadas a que eram destinados e o maior valor de Paschoal, certamente, por sua idade considerada ainda de boa produtividade, vitalidade e força física para um cativo.

A imensa casa de morada da fazenda Pau Grande, erguida em estilo de quinta portuguesa no princípio do século, possuía duas alas principais interligadas por uma capela. A esquerda ficavam Joaquim Ribeiro de Avellar, sua esposa Mariana Velho de Avellar, e os seis filhos do casal. A outra metade era habitada pelos primos Anna Balbina, Maria Serafina e Antônia Ludovina de Mascarenhas Salter, todos solteiros. A arquitetura, portanto, propiciava uma convivência familiar reduzida em núcleos menores,20 20 Gostaria de enfatizar que não estou fazendo uma associação direta entre o número de pessoas que coabitavam o mesmo domicílio e o tipo de família (nuclear ou extensa). Como chamei atenção na introdução, estas categorizações são dotadas de sentido a partir da forma com a qual os agentes familiares se relacionam no interior da parentela. E, portanto, devem levar em consideração sentimentalidades, vínculos pessoais, estratégias de casamento, mecanismos de manutenção do patrimônio e outros fatores. sem descartar uma disposição geral que preservasse a proximidade da parentela, família extensa. Afinal, havia passagens abertas na igreja e na sala de jantar que mantinham conexões entre os dois lados da casa através das áreas destinadas à sociabilidade. Por tais espaços, também circulava a escravaria doméstica pertencente à ambos os núcleos, sendo que a capela possuía um amplo andar térreo onde os escravos da fazenda assistiam às missas nos domingos e dias santos de pé, podendo ser observados pelo senhor e seus familiares que se colocavam no segundo andar, próximo ao altar.21 21 Telles, Augusto C. da Silva. "Vassouras: estudo da construção residencial urbana" In: Revista do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. RJ: Ministério da educação e Cultura, 1968, vol 16, pp 9-137, planta VIII. As informações sobre as disposições dos cômodos e localização dos moradores foram fornecidas por d. Ivone Barros Franco a quem devo meus sinceros agradecimentos.

Essa breve descrição do lugar de residência é para que o leitor perceba que o número de escravos domésticos que aparecem com função descrita no inventário do barão de Capivary não confere com o que deveria ser a realidade cotidiana daquele espaço, bastante grande e trabalhoso para somente 3 pessoas cuidarem. Além disso, desde meados do século, a classe senhorial do Império vinha adotando uma sofisticação do habitus social que incorporava formas de comportamento europeizadas como elemento de prestígio e diferencial de classe. Tal habitus incluía a valorização da etiqueta, da educação, da instrução, da moda, mas também uma vasta gama de bens de consumo. A relação destes artigos (prataria variada, louça fina brasonada, cristais, roupas de cama e mesa, lustres e mobiliário) e as quantidades dos mesmos nos inventários de grandes proprietários são um excelente referencial para se perceber o "fetiche da mercadoria"22 22 Alusão ao termo usado por MARX, K. "A Mercadoria" in: O Capital. São Paulo: Abril Cultural, 1982. Cap.I., Livro 1, Vol. 1. que acompanhou o processo de construção dos gostos e valores destas fracções da classe dominante ao longo do século XIX. E, nas casas de morada das plantations escravistas, tais objetos eram conservados, limpos, lustrados, passados, engomados e guardados por escravos que se dividiam no serviço doméstico. O novo habitus social e suas regras do savoir vivre foram regularmente seguidos por Mariana Velho de Avellar, quando a mesma se tornou a responsável pelo governo e administração da esfera doméstica da fazenda nos idos de 1860, quando se muda definitivamente para a fazenda com o marido, filho do barão de Capivary.

A matrícula dos escravos de Joaquim Ribeiro de Avellar (1872), esposo de Mariana e herdeiro universal dos bens da casa do Pau Grande, permite esmiuçar as funções exercidas pela escravaria de suas propriedades.23 23 Matrícula dos escravos de Joaquim Ribeiro de Avellar, 1872. Documento pertencente ao arquivo privado da família Barros Franco. Sem ignorar a problemática contida na fonte em termos da procedência e da idade dos escravos listados, pois é sabido que os senhores mentiam nestes campos com o intuito de oficializar a propriedade sobre indivíduos escravizados ilegalmente após a lei de 1831, a listagem traz importantes pontos para análise. Somente 9 anos após a morte do barão do Capivary, aparecem relacionados na lista de matrícula dos escravos de seu filho e herdeiro universal, 91 trabalhadores domésticos, sendo 9 libertos e 15 falecidos, dentre os mais de 800 escravos catalogados. Em 1872, a família tinha 2 propriedades na qual passava longas temporadas: a fazenda Pau Grande e a casa de Petrópolis, adquirida em 1863. Ou seja, havia circulando entre as duas moradias principais 67 escravos e 9 libertos para o serviço doméstico. Tais pessoas deveriam servir cerca de 10 indivíduos com residência fixa na fazenda e um núcleo mais reduzido em Petrópolis, pois o mais comum era viajar somente o casal com os filhos.24 24 Na época, habitavam a Pau Grande o casal Joaquim e Mariana Ribeiro de Avellar, seus filhos Elisa, Luisa, Julia, José Maria, Antônio e Joaquim, além da governanta francesa Mme Doyen, a prima d. Antônia Ludovina Mascarenhas Salter e Joaquim Mascarenhas Salter. A filha primogenital Maria José já havia casado com Manoel Tosta e morava na corte, mas tinha o hábito de passar temporadas com a família em Petrópolis e na fazenda. Sobre o número de escravos domésticos na Pau Grande, é preciso que se faça uma ressalva. Pela Matrícula de 1872, não é possível saber quem residia aonde e o casal Avellar possúía outras fazendas na ocasião. Mesmo assim, somente a Pau Grande e a Glória eram propriedades com casas de morada de maior conforto, sendo que a Glória nunca foi citada em cartas como local de moradia. Portanto, os números apresentados podem envolver mais de uma propriedade. Vamos aos números.

Analisando os escravos de Joaquim Ribeiro de Avellar na matrícula de 1872, elenquei duas categorias de funções: escravos "de fora" e escravos "de dentro". Os primeiros trabalhavam como capataz, ferreiro, campeiro, pedreiro, "pecheiro", "hortelão", tropeiro, criador de galinha, "de roça", carreiro, carpinteiro e arreador. Enquanto os escravos domésticos, "de dentro", realizavam atividades de costureira, serviço de casa, mucama, engomadeira, copeiro, pajem, cozinheiro, lavadeira, alfaiate e caseiro. Transformadas em números e materializadas em grupos familiares quando possível, as funções citadas fornecem uma geografia da organização doméstica e de quem eram os africanos e crioulos, homens e mulheres, adultos e crianças que ali trabalhavam. Vejamos:

I.
Escravaria doméstica quanto à função, idade, procedência e sexo25 25 Dados retirados da Matrícula dos escravos de Joaquim Ribeiro de Avellar, 1872. Op. Cit.

Analisando a tabela construída nota-se que existem funções que seguem uma distinção por gênero, como o caso das costureiras, mucamas e lavadeiras que se destinavam às mulheres e dos pajens exercida por homens. Quanto às categorias copeiro e engomadeira, prefiro não afirmar que sofriam uma distinção por gênero devido ao número pouco expressivo de cativos encontrados o que, certamente, levaria a uma generalização equivocada. No que compete aos alfaiates, a própria denominação determina ser uma incumbência masculina ligada ao saber costurar roupas finas e com cortes rebuscados. Todavia, muitas costureiras dominavam esta arte e cortavam pesados vestidos como aparece nas cartas familiares através das encomendas de tecidos, botões e enfeites para roupas femininas. Vale a pena dizer que as costureiras foram consideradas escravas domésticas porque exerciam suas atividades diárias no interior da casa de vivenda, sob o olhar das senhoras, sendo este um encargo exercido em grupo. Além disso, o número alto de escravas dedicadas a tal se devia ao fabrico das roupas para os cativos no interior da unidade doméstica.

A costura, a contabilidade e a distribuição das roupas para os escravos era uma função feminina. Com relação à fazenda Pau Grande, Mariana Velho de Avellar possuía um caderno onde anotava a quantidade de peças confeccionadas por suas costureiras e a distribuição das mesmas para os escravos do eito.26 26 Caderno de anotações de Mariana Velho de Avellar, 1880-1884. Coleção privada família Barros Franco. Escrevia "roupa que tomou a gente da roça" e apontava aqueles que recebiam "camisa e calça", "saia e camisa", "camisa comprida" e "camisa pequena", demonstrando a grande carga de trabalho que as escravas costureiras possuíam o ano inteiro, afinal tratava-se de um plantel de mais de setecentos escravos. O livro preenchido mês a mês durante os anos de 1880 a 1884 dividia-se em três lotes e colocava o nome de cada escravo contemplado com peças de roupa. Quando as mesmas eram entregues aos capatazes para fazerem a distribuição, o que era raro, também mereciam registro.

Ainda pensando na questão de gênero, surpreende o número de escravos cozinheiros, principalmente acrescentando-se à tabela os falecidos recentemente. Dos 7 cozinheiros relacionados, havia 6 homens, dos quais 5 eram africanos. Mesmo que consideremos que alguns desses escravos cozinheiros não fossem domésticos e que preparassem as refeições dos escravos do eito, os dados acima apontam uma cozinha "africana" e eminentemente masculina na casa-grande. Se pensarmos na necessária manipulação de grandes e pesadas panelas de ferro, tachos, lenha para o forno, bem como matança, destrincho e carregamento de animais nas chamadas "cozinhas sujas" que ficavam do lado de fora da casa, percebe-se que a força física era uma característica importante no exercício da função.27 27 A análise dos anúncios do Jornal do Commercio para os anos de 1840 e 1850 também apontam a preferência por cozinheiros homens. Contudo, as tarefas da "cozinha limpa," onde as massas, doces, refrescos, bolos, sucos e guisados eram realizados, podiam ser facultadas à ambos os sexos e já seguiam um padrão mais europeizado. Na fazenda Pau Grande, as cozinhas se localizavam no fundo de longos corredores. Suas janelas davam acesso para o lado de trás do sobrado, no alto da colina onde passava um córrego que fazia seu abastecimento interno de água. Nelas havia, ainda, outras duas escadas que levavam ao andar térreo com dispensas e por onde alguns escravos domésticos passavam sem acessar a área social. As cozinhas eram espaços centrais nas casas grandes.28 28 Segundo Guerrand, as cozinhas podem ser chamadas no século XIX de espaços da rejeição, pois foram o último reduto da casa a ser adentrado pela racionalidade burguesa, permanecendo como um espaço onde os patrões pouco penetravam. GUERRAND, Roger-Henri. "Espaços Privados" In: PERROT, Michelle (org), História da Vida Privada: da Revolução Francesa à Primeira Guerra. SP: Cia das Letras, 1999. Por este ambiente podiam circular todos os cativos domésticos. O preparo dos alimentos era realizado majoritariamente pelos escravos cozinheiros e por alguns trabalhadores classificados como "serviço de casa", mas outras atividades como lavagem de louça e aquecimento de água para banho também eram ali executadas.

No que compete às comidas preparadas, algumas receitas servidas na fazenda Pau Grande sobreviveram ao tempo anotadas num caderno que continha observações do tipo: "bolo dos anjos - excelente, econômico na falta de ovos".29 29 Caderno de receitas de Mariana Velho de Avellar, s/d. Coleção privada família Barros Franco. Como a esmagadora maioria dos escravos não sabiam ler, para a confecção dos quitutes desejados, era necessário a ajuda de alguém letrado, em geral, a senhora. Há listados desde biscoitos de polvilho azedo, broas de milho e doces de fruta, bastante comuns na culinária brasileira, até doces de ovos portugueses e "plum cake", influência das modas europeias.

Como se vê, a marcante presença de africanos na cozinha da casa grande, apontada pela matrícula de 1872, contrastava como a vontade de "europeizar" os hábitos alimentares, percebida nas receitas copiadas, nos jornais femininos e nas cartas que trocadas entre Mariana Velho de Avellar e sua mãe D. Leonarda Maria Velho da Silva30 30 Mariana Velho da Silva era filha do casal José Maria e Leonarda Velho da Silva. Seus pais prestaram longos anos de serviço à família Imperial, a mãe como Dama de Companhia da Impertriz Teresa Christina e o pai como Mordomo do Paço. Em 17 de novembro de 1849, depois de longas negociações entre as famílias envolvidas, Mariana se casa como Joaquim Ribeiro de Avellar, filho do Barão do Capivary. O casal reside na corte por poucos anos e em meados dos anos 50 se muda para a fazenda do Pau Grande. Sobre as famílias Ribeiro de Avellar e Velho da Silva, consultar: MUAZE, Mariana. As memórias da viscondessa. Op. Cit. : "mamãe, empresta-me (...) seu cozinheiro Luiz não só para tratar a todos como devo e tenho vontade, como também para os meus "bichos de cozinha" aprenderem com ele alguma coisa de quitutes de que há tanto estou privada".31 31 Carta de Mariana Velho de Avellar para Leonarda Maria Velho da Silva. Petrópolis, 13 de novembro de 1862. Coleção Roberto Meneses de Moraes Ao pedir emprestado o cozinheiro de D. Leonarda, que morava na corte, para passar uns tempos na fazenda, Mariana Velho de Avellar pretendia não só impressionar os convidados que viriam jantar, mas também fazer Luiz ensinar seus escravos, a quem se refere de forma pejorativa como "bichos de cozinha". Luiz se destacava por seu um cozinheiro "de forno e fogão", pois conhecia o uso da lenha, do carvão e do barro, além do preparo de refeições mais rebuscadas.

Os cativos destinados ao "serviço de casa" tinham livre trânsito na cozinha. Estes trabalhadores são a maioria na matrícula de 1872 certamente por englobarem variadas atividades como: limpeza e arrumação da casa, lavagem da louça, remoção de dejetos, colocação da mesa, cuidado com a prataria e a roupa, sem contar com alguns alimentos e guloseimas que podiam ser feitos por homens e mulheres listados como "serviço de casa." Sobre eles, as cartas revelam múltiplas funções que poderiam exercer cotidianamente: "veja mamãe que no meio de toda esta confusão adoeceu-me uma lavadeira e fui obrigada a mandar Felipa lavar e pôr Bernarda a engomar".32 32 Carta de Mariana Velho de Avellar para Leonarda Maria Velho da Silva. Petrópolis 15 de fevereiro de 1862. Coleção Roberto Meneses de Moraes Outro exemplo foi narrado por D. Leonarda em 8 de agosto de 1864, quando adquiriu uma excelente escrava para D. Antônia Mascarenhas Salter por um conto e quinhentos e cinquenta mil réis, incluindo a siza e demais impostos. Comemorava a compradora: "ela cozinha, tem me feito há 2 dias o meu jantar e eu não tenho ficado com fome, estimo que o meu paladar igualmente se combine com o de nossa amiga. Engoma sofrivelmente roupa de homem, lava, e mesmo na cozinha faz suas massas".33 33 O imposto da meia siza foi criado por D. João VI, através do alvará régio de 3 de junho de 1809. Tratava-se de uma taxa de 5% paga ao tesouro que insidia sobre a compra, venda, adjudicação e arrecadação de escravos ladinos. FERNANDES, Guilherme Vilela. "Tributação e escravidão: o imposto da meia siza sobre o comércio de escravos na província de São Paulo (1809-1850)". In: www.almanack.usp.br. Portanto, a nova escrava era bastante capacitada e podia fazer diversas tarefas de casa: cozinhar para paladares sofisticados, engomar e lavar.34 34 Carta de Leonarda Maria Velho da Silva para Mariana Velho de Avellar. Rio de Janeiro 8 de agosto de 1864. Coleção Roberto Meneses de Moraes

Interessante notar que, numa fazenda do porte da Pau Grande, existiam inúmeras escravas que supririam as funções destacadas sem que fosse necessário se pagar um valor tão alto. No entanto, o que as senhoras desejavam era uma escrava que já dominasse o know how de serviços refinados tanto de cozinha, quanto de roupa, talentos difíceis de aprender e cada vez mais valorizados. Dentre as qualidades da serviçal, enumerava ainda sua robustez, alegria e gratidão, características de uma "boa escrava." Por fim, pedia a filha que "no primeiro dia em que a preta cozinhar, vá assistir o jantar para me dizeres o que observas".35 35 Carta de Leonarda Maria Velho da Silva para Mariana Velho de Avellar. Rio, 8 de agosto de 1864. Coleção Roberto Meneses de Moraes. A necessidade de treinar os "escravos de dentro" se repete em outras passagens: "a criada que tenho é uma rapariga de 24 anos que nada sabe. Nos dias que cá ficou tanto ela, como os pretos, fizeram boas asneiras. É preciso ir ver aquela gente para não perder estes poucos escravos que tenho".36 36 Carta de Leonarda Maria Velho da Silva para Mariana Velho de Avellar. Petrópolis 3a. f 22 de dezembro. Coleção Roberto Meneses de Moraes.

As cozinhas eram espaços centrais nas casas grandes. Todavia poder circular fora delas aumentava as chances da conquista da tão sonhada liberdade. O leitor verá na tabela abaixo que todos os servidores domésticos libertos concentravam-se em 4 funções: mucama, pajem, costureira e serviço de casa. Os dados apontam também para a permanência destes homens e mulheres nas mesmas atividades que exerciam quando eram escravos. Tal fato pode ter várias explicações, não excludentes entre si, que vão desde o recurso da gratidão como fio condutor da relação entre senhores e seus ex-escravos; a existência de vínculos familiares que prendiam esses libertos aos plantéis de origem; até o não se vislumbrar outras possibilidades de trabalho após longo período de cativeiro na fazenda. Dos 9 casos de libertos encontrados, somente 2 aparecem sem vínculos parentais com escravos da Pau Grande, são eles: a costureira Mariana, crioula, de procedência desconhecida, e a mucama Maria, crioula, listada como nascida na propriedade, porém com pais falecidos. Acredito que Maria devia ser parente de alguma escrava doméstica que escolheu libertar a menina por já ter idade mais avançada. Mas, por ser órfã de pai e mãe, o registro de parentesco não aparece na listagem. As mulheres mais jovens que foram destinadas à tarefa possuíam 15 e 17 anos. O exercício da função de mucama em tão tenra idade demonstra o artifício de mantê-la no mesmo ambiente que algum membro de sua família, pois não era nada fácil alcançar a condição de liberta, nem de doméstica. Muito provavelmente ela contava com a ajuda e supervisão de outros escravos mais velhos no cumprimento de seus deveres.

II. Tabela
contendo os escravos domésticos libertos por função executada37 37 Dados retirados da Matrícula dos escravos de Joaquim Ribeiro de Avellar, 1872. Op. Cit.

No que pese às redes familiares, a matrícula de 1872 permite que se identifique várias gerações de escravos que exerceram, em temporalidades distintas ou concomitantes, funções no interior da casa grande. Gostaria de apontar a família da engomadeira Bernardina (crioula, 50 anos, solteira) que possuía 3 filhos: a mucama Martiniana (crioula, 17 anos, solteira), a escrava de serviço doméstico Ponciana (crioula, 31 anos, casada com o carpinteiro Ambrósio e mãe de Raul,10; Deolinda,7, Florinda,6, e o pajem Leoncio (crioulo, 26 anos, casado com a costureira Laurentina). Além de Bernardina e dos 3 filhos estarem trabalhando como "escravos de dentro", os casamentos realizados tiveram como cônjuges escravos com especialização, sendo que Laurentina, esposa de Leoncio, além de costureira era irmã do copeiro Firmino (crioulo, 30 anos, solteiro). Apesar de terem conseguido pertencer à escravaria "de dentro", Laurentina e Firmino tinham mais 6 irmãos, todos "de roça", assim como a mãe, a africana Alda (viúva, 54 anos).38 38 A matrícula de escravos de 1872 para a fazenda Pau Grande aqui utilizada se encontra no arquivo privado da família Barros Franco. Trata-se da cópia que Joaquim Ribeiro de Avellar guardou dos escravos referents a sua propriedade.

É claro que a convivência no mesmo ambiente, mostrada no exemplo acima, facilitava a proximidade de relações de afeto e solidariedade que se desdobravam em casamentos entre escravos "de dentro". Contudo, não se pode negar que tais escolhas significaram uma estratégia bem sucedida de manutenção do grupo familiar no mesmo espaço de convivência. Outro caso parecido é o da liberta Ludocina (serviço doméstico, 50 anos, africana). Tendo criado as duas filhas no cotidiano da casa grande, ela conseguiu manter Ginésia (serviço doméstico, crioula, 30 anos, solteira e mãe de Antônio) e Adelaide (serviço doméstico, crioula, 29 anos, casada com o cozinheiro Augusto e mãe de Maria) como parte da escravaria doméstica, contabilizando 3 gerações (mães, filhas e netos) trabalhando e convivendo na residência senhorial.

Contudo, não era sempre que os escravos domésticos com família constituída conseguiam ficar próximos dos parentes e filhos depois que estes atingiam a idade produtiva. O casal formado pelo cozinheiro Daniel (africano, 50 anos) e a mucama Aderandrina (crioula, 42 anos) teve 5 filhos. Destes, Eugenia (3 anos) e Marcelina (9 anos) passavam os dias acompanhando os pais, porque ainda eram "cria", sem idade para o exercício regular de funções. Todavia, Quirino, de apenas 12 anos, Daniela de 22 anos e Midelina de 19 anos (casada com Manoel) foram destinados à roça, passando a ocupar espaços de trabalho diferentes dos pais e irmãos. Além disso, com certeza, as múltiplas tarefas e a pesada labuta diária exercida no eito e na casa grande dificultavam bastante a convivência entre os indivíduos em questão.

Considerando todos os escravos domésticos arrolados na matricula de 1872, no que compete às configurações familiares, foram encontrados 37 cativos sem família, ou seja sem que estivesse identificado algum vínculo parental no interior do plantel, e mais 27 diferentes grupos familiares, com composições variadas, que envolviam de um a 6 escravos domésticos numa mesma formação. Para este cálculo, incluí as relações não sanguíneas como marido e mulher, sogra, cunhada, etc. Os dados encontrados demonstram não só existência da família escrava em grandes plantéis já fartamente apontada por Ricardo Salles, Manolo Florentino, Roberto Góis, Robert Slenes e outros, mas também que existiam diferentes famílias escravas, com variadas formações e composições, servindo no interior da casa grande.39 39 SALLES, Ricardo. E o vale era escravo. Op. Cit.; SLENES, Robert W. Na Senzala uma Flor, esperanças e recordações na formação da família escrava -Brasil Sudeste, século XIX. SP: Unicamp ed, 1999; FLORENTINO, Manolo & GOES, J.R. A paz das senzalas. Famílias escravas e tráfico atlântico, Rio de Janeiro, 1790-1850. RJ: Civilização Brasileira, 1997. A presença africana nestas famílias não deve ser desconsiderada, principalmente porque é sabido que muitos escravizados cadastrados em 1872 como crioulos eram, na verdade, africanos chegados ao Vale do Paraíba após 1831, quando o tráfico já era ilegal no Brasil.40 40 Heitor Moura, em artigo, recente apresenta estimativas para a chegada de africanos no Vale do Paraíba Fluminense cobrindo, inclusive o pós lei de1831.Ver: MOURA, Heitor. "Tirando leite de pedra": o tráfico africano estimado a partir de dados etários". In: MUAZE, Mariana & SALLES, Ricardo (org). O Vale do Paraíba e o Império do Brasil nos quadros da segunda escravidão. RJ: 7 Letras, 2015.

Em relação às crianças escravas, a matrícula de 1872 permite fazer análises interessantes. Dentre os 67 escravos e 9 libertos adultos que exerciam funções nas propriedades da casa do Pau Grande, havia 33 crianças, seus filhos, que tinham alguma circulação nos mesmos ambientes de seus pais e parentes. Além disso, não importando se os pais estavam lotados como "de dentro" ou "de fora", as crianças relacionadas na matrícula tinham o campo "função" em branco e vinham logo abaixo do nome de suas mães, quando as mesmas eram vivas. Tal forma de organização permite dizer que, quando tal campo era preenchido, a criança já labutava. Esse foi o destino de Cezandrina (filha de Bonifácia, de roça), Abel (filho de Abel, serviço doméstico), Cepalpino (filho de Faustina, 40 anos, mucama) e Deolinda (pais falecidos), todos no "serviço doméstico" aos 10 e 11 anos. Sobre isso, é interessante notar que a mesma média de idade era mantida para as crianças "de roça", indicando ser essa a fase da vida quando terminava a infância para todos nascidos cativos. Tal verificação ainda permite afirmar que o "serviço de casa" era a primeira ocupação de todo escravo doméstico. Nesta função aprenderiam a fazer de tudo um pouco, podendo posteriormente serem destinados à funções mais especializadas, continuarem no serviço doméstico ou mesmo irem para a roça, quando não demonstrassem aptidão, confiança ou bom comportamento para permanecerem no espaço da casa senhorial.

As cartas trocadas entre Mariana Velho de Avellar e D. Leonarda Velho da Silva também ajudam a pensar o dia-a-dia da escravaria doméstica. Do cotidiano familiar descrito nas cartas emergem o vai e vem de mucamas, o trato que os senhores dispensavam aos escravos, as amas com as crianças, além da circulação de escravos da corte para a província por empréstimos ou compra. Do cruzamento deste discurso senhorial com os testamentos, inventários e matrícula de escravos, é possível perceber as relações desiguais, violências simbólicas e estratégias de sobrevivência que permeavam as relações entre senhores e escravos. Em carta escrita em 13 de novembro de 1862, Mariana agradecia: "Deus e Nossa Senhora lhe darão alívios e tudo quanto deseja, minha boa mãe, pelo bem e alívio que me deu emprestando-me a sua grande escrava que, quando se comporta bem, não há dinheiro que pague".41 41 Grifo meu. Carta de Mariana Velho de Avellar para Leonarda Maria Velho da Silva. Petrópolis 13 de novembro de 1862. Coleção Roberto Meneses de Moraes. Tais considerações apontavam para a valorização do "bom escravo" que, aos olhos das senhoras, eram aqueles que conseguiam unir competência no serviço e bom comportamento.

Entendidas como duas faces da mesma moeda, habilidade e obediência escrava deveriam se equilibrar positivamente na forma como idealmente eram concebidas na política de dominação vigente. Contudo, na passagem acima citada, Mariana reconhecia que, na realidade, aí se encontrava uma complicação, porque a boa conduta e execução dos trabalhos solicitados dependiam da vontade da cativa. Seu comentário, então, deixava transparecer certa condescendência no quesito comportamento devido à qualidade do trabalho oferecido. Como estratégia, a escrava transformava o seu "bem servir" em instrumento de negociação que a valorizava frente à senhora e permitia, quem sabe, a conquista de alguma vantagem quando o serviço era realizado de bom grado. Com exceção de queixas sutis como esta, nenhum relato detalhado de desobediência da escravaria doméstica foi encontrado nas cartas. Os agentes que desfiavam a narrativa epistolar aqui disponibilizada estavam pouco ou nada interessados em relatar as formas de reação dos escravos, suas resistências e atos de rebeldia. No discurso existente nas cartas entre Mariana e D. Leonarda, percebe-se as relações verticalizadas que caracterizavam a política de dominação da classe senhorial e tudo parecia funcionar conforme a lógica hierárquica vigente.

Buscando o papel daqueles que apareciam como coadjuvantes na narrativa epistolar em questão, percebe-se que os escravos domésticos acompanhavam seus senhores em viagens. Quando a família Ribeiro de Avellar passava temporadas em suas casas em Petrópolis e na corte, levava boa parte de escravaria para servi-la. O trânsito de escravos domésticos também ocorria por outros motivos. Um caso bastante comum era o das amas de leite. Como Mariana possuía uma vasta escravaria, frequentemente havia a solicitação de algum familiar pedindo que ela cedesse escravas nas condições de gravidez desejadas para o aleitamento. Em 25 de março de 1862, comentava: "mamãe me fará muito favor dizer ao Juca que lhe ofereço Felisberta que já me criou duas filhas, é ao contrário de Bernarda quanto a boa casa, mas é muito cuidadosa e limpa só é mais senil, o que julgo é que está mais atrasada do que Carolina." Suas palavras ressaltam a necessidade de sincronia dos partos, as características de limpeza e cuidado, bem como sua clara preferência por amas de leite conhecidas da família. Sua intenção era evitar problemas como: doenças, falta de higiene, promiscuidade e alimentação precária que eram os principais argumentos utilizados pelos médicos que condenavam esse tipo de aleitamento.42 42 Para uma análise do debate sobre aleitamento materno no século XIX consultar: MUAZE, Mariana. A Descoberta da infância: a formação de um habitus civilizado na boa sociedade imperial. RJ: Departamento de História da PUC, dissertação de mestrado, 1999.

O trânsito de escravos fazenda-corte ou corte-fazenda também ocorria em caso de tratamento médico. Em 26 de junho, por exemplo, o conselheiro José Maria Velho da Silva explicava à filha Mariana as orientações do médico Dr. Peixoto para a recuperação de seu escravo Sebastião: não apanhar chuva, sereno ou sol, fazer passeios, não comer muita gordura, não consumir bebida alcoólica e, se possível, tomar leite. A justificava dada para a transferência provisória do cativo eram os ares mais salutares do campo, contudo havia recomendações claras de que: "não haja mimos com ele, senão fica perdido. Dei-lhe algum trabalho para não se desacostumar, pois que o seu primeiro defeito é preguiça".43 43 Carta de José Maria Velho da Silva para Mariana Velho de Avellar. 26 de junho, s/d. Sobre alimentação e saúde dos escravos ver: KARASCH, Mary. A Vida dos Escravos no Rio de Janeiro 1808-1850. SP: Cia das Letras, 2000, em especial o capítulo cinco.

A narrativa uniforme e harmônica contida nas cartas minimizava claramente os conflitos e violências cotidianos, reproduzindo o discurso dominante na sociedade escravista. No entanto, detalhes escapam em simples observações como a preguiça de Sebastião ou os arroubos de mal comportamento da escrava anteriormente citada. Na política de dominação em vigor, a escolha das tarefas, os locais de habitação, a quantidade de horas trabalhadas, a permissão para cultos religiosos, a possibilidade de viver em família, a formação de laços de compadrio, a autorização para acumular pecúlio, tudo era computado no cálculo de poder senhorial, sem contar a prerrogativa da violência física. Para aqueles que trabalhavam ou circulavam no espaço de morada de seus senhores, a possibilidade de conquista de benesses podia ser mais provável. Mesmo assim, dentro da lógica patriarcal vigente, cabia aos senhores manterem um equilíbrio instável dos privilégios concedidos, lembrando sempre que se tratava de algo que poderia ser retirado a qualquer momento.44 44 REIS, João José & SILVA, Eduardo. Negociação e Conflito SP: Cia das letras, 1989.

Por outro lado, da parte do cativo, era preciso conhecer as regras do jogo e suas brechas. Sendo assim, muitas vezes, fugas, desobediências, pequenos atos de rebeldia e mau comportamento não tinham como principal finalidade romper com o sistema, e sim valorizar-se perante o mesmo. Mesmo assim, qualquer iniciativa era sempre arriscada em se tratando de vínculos tão desigualmente constituídos. As relações escravistas exercidas no âmbito doméstico envolviam concessão de privilégios, mas também a existência de abuso, humilhação, assédio, violência física e moral. Na lógica de dominação patriarcal, os valores ligados à autoridade, dependência e hierarquia constituíam um vocabulário de poder falado através de pequenos gestos, olhares e escolhas. Suas consequências e possibilidades pertenciam ao horizonte de expectativa dos escravos. O cálculo das formas de agir era uma prática cotidiana exercida por ambos os agentes sociais em questão. Todavia, senhores e escravos dependiam de seus resultados de forma bastante desigual, pois ocupavam lugares desbalanceados na sociedade em questão.

Contudo, mesmo balizados por relações hierárquicas da convivência cotidiana, emergiam afetividades, cumplicidades e fidelidades que perpassavam a estrutura verticalizada senhor-escravo. Estas relações ambíguas, potencialmente possibilitadas pela cartilha de poder patriarcal, são um dos aspectos mais difíceis de serem avaliados nos vínculos construídos entre senhores e escravos "de dentro". É claro que não se trata aqui de adocicar a escravidão da casa-grande, como fez Gilberto Freyre, mas de buscar entender como funcionavam as conexões estabelecidas na esfera doméstica. O desafio interpretativo continua posto, pois o binômio proteção e obediência, não explica tudo.45 45 GRAHAM, Sandra L. Proteção e Obediência. Op. Cit.

Pensemos o exemplo da escrava Felisberta que aparece em cartas trocadas entre Mariana e Carolina, esposa de seu irmão Juca, moradora da corte.

É tão grande e elevado o favor que você me fez emprestando-me Felisberta para criar Maria Izabel que, naturalmente, a importância do serviço vence a minha natural dificuldade de escrever.

Fico-te muito e muito obrigada por este teu tão delicado obséquio. (...) Grata te estou até o íntimo do coração e bem assim ao compadre. Felisberta cumpre religiosa e exatissimamente a sua obrigação, se esmerando sempre em nos agradar, tanto que volta para aí levando grandes saudades nossas. Desejo a ela tudo quanto há de bom, porque ela tudo merece. Se não fora o médico manda-la para a fora da corte, com toda a sua cerimônia, ia deixando a ficar comigo. (...)

De coração te dou um apertadíssimo abraço, abraço a Mariquinhas, a Júlia, Lulu, Antônio Ribeiro e ao José Maria abraço também a D Antônia e a D Maria.

Recomenda-se a Sra. D. Mariana, ao Sr. Braz e ao Sr. Joaquim Mascarenhas. Saudades ao meu compadre e mano. Lembranças a Janjana, a Maria Gertrudes e a Bernarda.

De todo o coração

Tua mana e comadre muito grata,

Carolina Velho46 46 Carta de Carolina Velho para Mariana Velho de Avellar. SC, 18 de janeiro de 1865. Coleção Roberto Meneses de Moraes.

Felisberta foi morar com o casal Juca e Carolina Velho da Silva em março de 1862, quando do nascimento da menina Maria Izabel. A escrava foi escolhida por já ter criado Júlia e Luísa, filhas de Mariana. Na carta acima, Carolina agradece pelos quase 3 anos que a ama de leite permaneceu em sua casa e fez elogios a mesma. Cruzando as cartas com o inventário do barão de Capivary (1863), cujo plantel de escravos arrolado foi integralmente herdado por Joaquim e Mariana, encontra-se a africana, cabinda, 30 anos, de nome Felisberta. Estando em plena idade reprodutora, as evidências apontam que se trata da mesma cativa. Trabalhando com esta hipótese, pode-se inferir que, se Felisberta criou Júlia, Luísa e Maria Isabel é sinal que a mesma teve, no mínimo, três partos, dos quais as crianças podem ter sobrevivido ou não. Após longo tempo morando na corte na casa de Juca e Carolina, Felisberta apresentou problemas de saúde e retornou para a fazenda, corroborando a prática de enviar cativos para a província com o objetivo de convalescimento. Contudo, se ao voltar para a Pau Grande a cativa encontrou os filhos, é um questionamento que as fontes silenciam.

Em 1866, com o nascimento de Mariana, segunda herdeira de Carolina e Juca, a viscondessa tornou a emprestar uma escrava ao irmão para servir de ama de leite. Desta vez, a escolhida foi Bernarda:

(...) Marianinha vai passando admiravelmente e a Bernarda vai preenchendo muito bem o seu mister, ela vai nos enchendo as medidas e nos agradando muito. Ela é muito respeitosa e com gratidão te agradece as constantes e favoráveis notícias que, por meu intermédio, lhe envio de seu filho, ela te agradece muito e muito os cuidados que te merece o seu Feliciano. Continue Bernarda assim, como espero, que fico descansado.

Manda-nos notícias de Felisberta de quem somos tão amigos, pois não cansamos de nos recordar da sua sisudez, brio e das provas de interesse e de amizade que ela nos deu enquanto esteve tomando conta de Maria Izabel: que bela criatura! Dá-lhe lembranças nossas muitas a ela, e diz-lhe que sempre nos lembramos dela com prazer. (...)

Seu mano e amigo sincero

José Maria.47 47 Grifo meu. Carta de José Maria Velho da Silva para Mariana Velho de Avellar. Corte, 4 de agosto de 1866. Coleção Roberto Meneses de Moraes.

No discurso senhorial, os elogios tecidos às escravas domésticas Felisberta e Bernarda misturavam qualidades significativas: competência nas tarefas executadas, bom comportamento, gratidão, vontade de agradar, subserviência e reconhecimento da hierarquia senhor-escravo. Em troca pelos serviços prestados, os senhores se valiam da "política de favores" instituída. No caso da africana, Moçambique, Bernarda, de 40 anos, Mariana Velho de Avellar prometera que seu filho Feliciano, de apenas 3 anos, permaneceria na fazenda e receberia os cuidados necessários ao seu desenvolvimento. Contudo, se a mesma seria ama de leite, por que também não lhe enviavam informações sobre o bebê que acabara de nascer? A própria Mariana havia falado que a escrava tinha menos tempo de gravidez do que Carolina. Tal ausência aponta duas possibilidades: a morte da criança logo após o parto ou a permanência da cria com a mãe na corte, sendo esta última uma escolha bastante rara, pois os senhores não gostavam que seus filhos dividissem o leite e os cuidados da ama com outra criança.48 48 Tal questão foi discutida por MACHADO, Maria Helena. Op. Cit.

Como se vê, ao contrário do que possa parecer numa primeira leitura da epístola, as negociações entre senhoras e cativas amas de leite nada tinham a ver com a vigência de relações harmoniosas. O índice de mortalidade na primeira infância era enorme em todos os grupos sociais e com os escravos esse número era ainda mais alto devido à precariedade de suas condições de vida e de trabalho. Portanto, Bernarda, assim como Felisberta citada anteriormente, sabia que talvez nunca mais voltasse a ver Feliciano e as outras crias que, por ventura, tivesse. Todavia, se resistisse em exercer sua nova função, deflagraria um conflito que poderia significar a perda das regalias conquistadas como "escrava de dentro". Então, lhe restou atender às solicitações dos senhores e negociar para que zelassem pela saúde da criança. Assim, quem sabe, ela teria melhor sorte.

Casos como os de Felisberta e Bernarda apontam espaços fronteiriços, extremamente ambíguos, das relações entre senhores e escravos domésticos. Os longos anos de convivência proporcionaram o nascimento de sentimentos de bem querer, como os expressados por Juca, Carolina e Maria Izabel nas cartas. Esta última enviou um corte de vestido de presente para Felisberta, a quem chamou carinhosamente de "mãe Beta".49 49 "Pelo Sabino receberás um corte de vestido que a Maria Izabel manda de lembrança a sua mãe Beta". Carta de José Maria Velho da Silva para Mariana Velho de Avellar. Corte 20 de março de 1867. Coleção Roberto Meneses de Moraes. A idade da menina não permitia que a mesma saísse à rua para compras, portanto, o tecido presenteado foi adquirido pelo pai ou, mais provavelmente, pela mãe. Outro exemplo a ser mencionado é o de Deolinda. A recuperação da escrava que pertencia à D. Leonarda foi comemorada pela filha Mariana: "fiquei muito satisfeita com as notícias que me dá de Deolinda. Enfiar uma agulha com o olho tapado e só com a vista doente, é milagre e acertou de tratamento".50 50 É interessante ressaltar que no inventário de D. Leonarda Maria Velho da Silva, Deolinda foi citada como uma de suas escravas avaliada em 800$000. Inventário de D. Leonarda Maria Velho da Silva, Rio de Janeiro, 16 de março de 1871. Coleção Roberto Meneses de Moraes. A ambiguidade das relações aqui em questão tocavam escravos que desempenhavam várias funções no interior do domicílio. Em carta remetida no dia 3 de dezembro, D. Leonarda dizia:

vimos com surpresa e com sobressalto chegar o Daniel, que às nossas apressadas perguntas foi logo respondendo que não havia novidade e que todos estavam bons. Mas, como não há gostos perfeitos, dando-nos, em seguida, a má notícia da morte do pobre Simão. Ficamos bem tristes por esse muito bom escravo por quem Mariquinhas, quando pequenina, gostara e, finalmente, por ter sido meu vallet de chambre nos dias que passei em Botafogo. O Joaquim, de certo, havia de sentir e ainda mais por estar acostumado com ele. Deixemos porém esta página triste e vamos passar a coisas alegres.51 51 Grifo meu. Carta de Leonarda Maria Velho da Silva para Mariana Velho de Avellar. Petrópolis, sábado, 3 de dezembro, às 9h da noite, s/a. Coleção Roberto Meneses de Moraes.

Da parte dos cativos, havia uma série de expectativas em relação aos bons serviços prestados que ia muito além do tecido recebido por Bernarda ou do tratamento médico especializado contratado para Deolinda. O grande momento almejado, pelo menos do ponto de vista do escravo, era a obtenção da alforria. Contudo, nada era garantido. A convivência próxima, as afetividades e fidelidades construídas durante os muitos anos de servidão doméstica podiam ou não ser retribuídas com a liberdade. Por isso, a abertura do testamento do senhor era um momento importante para os escravos, pois trazia a chance de realização do sonho da liberdade. A possibilidade da concessão deste máximo benefício era um instrumento de domínio exercido cotidianamente pelos senhores e senhoras. O testamento de D. Mariana Luiza da Glória Avellar, tia de Joaquim Ribeiro de Avellar, é bastante significativo da lógica de poder senhorial:52 52 Tais exemplos demonstram como paralelamente a marca da violência sempre presente, a escravidão como instituição tecia espaços, tanto de barganha, quanto de conflito, num cotidiano delimitado pela hierarquização social. REIS, João José & SILVA, Eduardo. Op. Cit.

Deixo forras todas as escravas, a saber: Guilhermina crioula, Jesuína crioula, Emília parda, Militana Inhanhana.

O testamenteiro pagará as partes a que pertença as suas manas das duas escravas Balbina e Maria do Bom Jesus para que fiquem forras.

Deixo cordão de ouro, memória, brinco e roupa toda para seu senhor repartir com as escravas que deixa forras a saber: Guilhermina, Jesuína, Emília, Militana e Deolinda.53 53 Grifo meu. Testamento de D. Mariana Luiza da Glória Avellar. Paty do Alferes, 1848. Coleção Roberto Meneses de Moraes.

Pouco tempo após registrar as alforrias acima em testamento, D. Mariana da Glória mudou de ideia. Vendeu Militana Inhanhana, Balbina e Maria do Bom Jesus ao irmão barão de Capivary. No documento de compra e venda das escravas, afirmou claramente que a transação não foi feita por razões econômicas. Explicou: "faço esta venda em consequência do seu mau procedimento" e seguiu acusando as outras duas de serem coniventes com a má ação de Militana.54 54 Contrato de venda de escravos redigido por D. Mariana Luiza da Glória Avellar, Pau Grande. 9 de março de 1848. Coleção Roberto Meneses de Moraes. A atitude aqui descrita tinha um caráter autoritário e pedagógico fortemente respaldado pela lógica de dominação senhorial. Suas ações atingiam não somente as mulheres punidas, mas todos os escravos domésticos que, através deste ato, sentiram o peso do poder discricionário dos senhores sobre seus destinos. Na gramática escravista vigente, a alforria (ou qualquer outro privilégio adquirido na política de favores envolvida nas relações patriarcais vigentes) deveria ser entendida como uma graça, uma concessão generosa, e, portanto, poderia ser retirada. D. Mariana da Glória se beneficiou desta instabilidade e usou artimanhas conhecidas de sua classe para colocar a justiça a seu favor. Ao vender as escravas, revogou parte de seu testamento sem precisar reformulá-lo, pois não se poderia libertar aquilo que não mais lhe pertencia. Com um simples gesto legitimado na política de dominação senhorial, traçara um novo destino para aquelas escravas.

Como se vê, na "política de favores" reinante não se dispensava o uso da força quando necessário. Além da violência física havia ainda a violência simbólica55 55 O noção aqui utilizada inspira-se em Bourdieu para quem o poder simbólico/violência simbólica possui uma ação sobre o mundo que lhe permite obter o equivalente ao que é obtido pela força (física ou econômica). Para ele, o poder simbólico não reside nos "sistemas simbólicos", mas na relação entre quem exerce o poder e aqueles que estão sujeitos à ele. Assim, pode ser entendido o poder das palavras, das palavras de ordem e daqueles que as pronunciam. BOURDIEU, P. O poder simbólico. 10 ed. Rios de Janeiro: Bertrand Brasil, 2007, pp 14, 15. que impunha o domínio dos senhores e lembrava a todo o momento o lugar social que o escravo deveria ocupar, ou seja o de simples mercadoria cujo destino cabia a outrem. A título de conclusão, é possível afirmar que o "bom escravo" aos olhos da classe dominante era aquele que havia internalizado a lógica patriarcal e se comportava conforme o desejado. As atitudes de D. Maria da Gloria demonstram que as mulheres das classes abastadas, senhoras do lar, também rezavam na cartilha de dominação patriarcal e buscavam manter a ordem no âmbito privado através de suas funções no governo da casa. Desta dinâmica cotidiana afloravam afetividades, cumplicidades e sentimentalidades extremamente ambíguas que, se ressaltadas, ajudam a entender a complexidade das relações entre senhores e escravos domésticos. Mas, tais emoções em nada adocicavam à escravidão doméstica, pelo contrário, transformavam-na num fenômeno histórico complexo cujas consequências ainda são sentidas em nossa sociedade.

Voltando às considerações sobre o emprego doméstico na atualidade realizadas no princípio deste artigo, pode-se dizer que o habitus escravista pautado em relações sociais discricionárias, autoritárias e hierárquicas dominante no Oitocentos, deitou raízes profundas que se esgarçam até nossos dias. Seus valores, construídos durante séculos de violência física e simbólica, foram reinventados na longa duração e encontraram lócus de permanência à despeito das lutas sociais e trabalhistas ocorridas ao longo dos séculos XX e XXI. O serviço doméstico, categoria que acabou de conquistar a isonomia em relação aos direitos trabalhistas e onde somente 30% dos empregados possuem carteira assinada, certamente é um destes lócus de permanência.56 56 Outro lócus de permanência a ser citado é o trabalho rural que recebeu isonomia de direitos trabalhistas somente na constituição de 1988 e possui o maior índice de "trabalho escravo contemporâneo" da sociedade brasileira. Para saber mais sobre o trabalho escravo contemporâneo na sociedade brasileira ver: Gomes, Angela de Castro. "Representação e mudança no trabalho análogo a de escravo no Brasil: tempo presente e usos do passado". In: Revista Brasileira de História. SP: Vol32, N64, p167-184, 2012; SCOTT, Rebecca. "O trabalho escravo contemporâneo e os usos da História" in: Public law and Legal Theoty Research Papers Siries, paper 333, Jul 2013. Consultado no site http://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2292162 em 2 de fevereiro de 2015. Todavia, ainda se pode citar o emprego rural que, somente conquistou direitos trabalhistas plenos na Constituição de 1988 e conta com o maior índice de "trabalho escravo contemporâneo" da sociedade brasileira. Tais afirmações levam a refletir sobre as relações passado-presente com grande força. Deixo ao leitor, no limite destas páginas, algumas contribuições para esta reflexão.

Fontes Primárias:

  1. Caderno de anotações de Mariana Velho de Avellar, 1880-1884. Coleção privada família Barros Franco.

  2. Caderno de receitas de Mariana Velho de Avellar, s/d. Coleção privada família Barros Franco.

  3. Carta de Mariana Velho de Avellar para Leonarda Maria Velho da Silva. Petrópolis, 13 de novembro de 1862. Coleção Roberto Meneses de Moraes.

  4. Carta de Mariana Velho de Avellar para Leonarda Maria Velho da Silva. Petrópolis, 15 de fevereiro de 1862. Coleção Roberto Meneses de Moraes.

  5. Carta de Leonarda Maria Velho da Silva para Mariana Velho de Avellar. Rio de Janeiro, 8 de agosto de 1864. Coleção Roberto Meneses de Moraes.

  6. Carta de Leonarda Maria Velho da Silva para Mariana Velho de Avellar. Rio, 8 de agosto de 1864. Coleção Roberto Meneses de Moraes.

  7. Carta de Leonarda Maria Velho da Silva para Mariana Velho de Avellar. Petrópolis, 3a. f 22 de dezembro. Coleção Roberto Meneses de Moraes.

  8. Carta de Mariana Velho de Avellar para Leonarda Maria Velho da Silva. Petrópolis,13 de novembro de 1862. Coleção Roberto Meneses de Moraes.

  9. Carta de José Maria Velho da Silva para Mariana Velho de Avellar. 26 de junho, s/d.

  10. Carta de Carolina Velho para Mariana Velho de Avellar. SC, 18 de janeiro de 1865. Coleção Roberto Meneses de Moraes.

  11. Carta de José Maria Velho da Silva para Mariana Velho de Avellar. Corte, 4 de agosto de 1866. Coleção Roberto Meneses de Moraes.

  12. Carta de José Maria Velho da Silva para Mariana Velho de Avellar. Corte 20 de março de 1867. Coleção Roberto Meneses de Moraes.

  13. Carta de Leonarda Maria Velho da Silva para Mariana Velho de Avellar. Petrópolis, sábado, 3 de dezembro, às 9h da noite, s/a. Coleção Roberto Meneses de Moraes.

  14. Contrato de venda de escravos redigido por D. Mariana Luiza da Glória Avellar, Pau Grande. 9 de março de 1848. Coleção Roberto Meneses de Moraes.

  15. Inventário do Barão de Capivary, 1863. Inventariante: Joaquim Ribeiro de Avellar Jr. Vassouras: CDH/ Universidade Severino Sombra, (caixa 116).

  16. Inventário de D. Leonarda Maria Velho da Silva, Rio de Janeiro, 16 de março de 1871. Coleção Roberto Meneses de Moraes.

  17. Jornal do Commercio para os anos de 1840 e 1850. Consulta feita no Arquivo do Museu Casa da Hera, Vassouras.

  18. Matrícula dos escravos de Joaquim Ribeiro de Avellar, 1872. Coleção privada família Barros Franco.

  19. Testamento de D. Mariana Luiza da Glória Avellar. Paty do Alferes, 1848. Coleção Roberto Meneses de Moraes.

  20. Relatório da Organização Internacional do Trabalho (OIT): Domestic workers across the world: global and regional statistics and extent of legal protection by International Labor Office Geneva., publicado em 14/1/2013 in: http://www.ilo.org/wcmsp5/groups/public/---dgreports/---dcomm/---publ/documents/publication/wcms_173363.pdf. Acesso em:15/1/2015.

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  • REIS, João José & SILVA, Eduardo. Negociação e Conflito., SP: Cia das Letras 1989.
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  • SCOTT, Rebecca. "O trabalho escravo contemporâneo e os usos da História" in: Public law and Legal Theoty Research Papers Siries, paper 333, Jul 2013. Consultado no site http://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2292162 em 2 de fevereiro de 2015.
    » http://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2292162
  • SHARPLESS, Rebecca. Cooking in Other Womens Kitchens: Domestic Workers in the South, 1865-1960. North Carolina, University of North Carolina Press, 2010.
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  • TOMICH, Dale W. Pelo prisma da escravidão: trabalho, capital e economia mundial. SP: EDUSP, 2011.
  • 1
    Os dados aqui fornecidos foram retirados do relatório da Organização Internacional do Trabalho (OIT): Domestic workers across the world: global and regional statistics and extent of legal protection by International Labor Office Geneva, 14/1/2013, In: http://www.ilo.org/wcmsp5/groups/public/---dgreports/---dcomm/---publ/documents/publication/wcms_173363.pdf. Consultado em 15/1/2015. A pesquisa citada foi realizada entre 2009 e 2013 e cobriu todos os trabalhadores com carteira assinada de 117 países de diferentes continentes. No Brasil, os dados foram obtidos com base no censo do IBGE e não incluíram um número significativo de domésticas que trabalham na informalidade e/ou possuem 15 anos ou menos de idade. A inclusão destas variáveis certamente elevaria esse percentual, pois estima-se que somente 30% da categoria está empregada formalmente no Brasil. Consultar o Apêndice 2, p. 124.
  • 2
    Na constituição de 1988, as empregadas domésticas não receberam os mesmos direitos trabalhistas das outras categorias. Em abril de 2013, o Senado Federal aprovou a proposta de emenda constitucional, o chamado PEC das Domésticas, igualando seus direitos aos demais trabalhadores. Sobre o tema, consultar: NUNES, Christane Girad & SILVA, Pedro Henrique Isaac. "Entre o prescrito e o real: o papel da subjetividade na efetivação dos direitos das empregadas domésticas no Brasil" In: Sociedade e Estado. Brasília, vol.28 No.3, Set./Dec; MELO, Hildete Pereira de. "Criadas e trabalhadoras". In: Estudos Feministas, Rio de Janeiro, v. 6, No. 2, 1998; BRUSCHINI, Cristina & LOMBARDI, Maria Rosa. "A bipolaridade do trabalho feminino no Brasil contemporâneo" In: Cadernos de Pesquisa, São Paulo, No 110, p. 67-104, 2000 e BRITES, Jurema. Serviço doméstico: elementos políticos de um campo desprovido de ilusões. Campos: Paraná, n. 3, p. 65-82, 2003.
  • 3
    O fenômeno de incorporação de ex-escravas ao serviço doméstico já foi explorado pela historiografia americana. Ver: SHARPLESS, Rebecca. Cooking in Other Womens Kitchens: Domestic Workers in the South, 1865-1960. North Carolina, University of North Carolina Press, 2010 e GLYMPH, Travolia. Out of house of bondage: the trasnformation of the plantation household. Cambridge University Press, 2008.
  • 4
    Sobre as relações raciais e de trabalho no pós- abolição: COOPER, Frederick, HOLT, Thomas e SCOTT, Rebecca J., Beyond Slavery: explorations of race, labour, and citizenship in postemancipation societies, Chapel Hill, NC, University of North Carolina Press, 2000; e RIOS, Ana Maria & MATTOS, Hebe Maria "O pós-abolição como problema histórico: balanços e perspectivas" in: Topoi, nº 8, 2004, pp. 17-195.
  • 5
    Sobre o processo de transformação da família e do habitus da classe senhorial, consultar: MUAZE, Mariana. As memórias da viscondessa: família e poder no Império. RJ: Zahar, 2008.
  • 6
    Sobre a permanência de valores e concepções de mundo hierárquicos e desiguais no pós abolição e na atualidade, ver: SALLES, Ricardo. Nostalgia Imperial: escravidão e formação da identidade nacional no Brasil do Segundo Reinado. SP: Topbooks, 1996.
  • 7
    TOMICH, Dale W. Pelo prisma da escravidão: trabalho, capital e economia mundial. SP: EDUSP, 2011; MARQUESE, Rafael; TOMICH, Dale. "O Vale do Paraíba escravista e a formação do mercado mundial do café no século XIX" in: SALLES, Ricardo & GRINBERG, Keila (org). O Brasil Imperial. RJ: Civilização Brasileira, 2010, vol 3.
  • 8
    Sobre os mega proprietários do Vale do Paraíba Fluminense, ver: SALLES, Ricardo. E o vale era escravo. Vassouras, século XIX. RJ: Civilização Brasileira, 2008.
  • 9
    Ver: SOUZA, Flavia Fernandes. Para casa de família e mais serviços: O trabalho doméstico na cidade do Rio de Janeiro no final do século XIX. Dissertação de Mestrado. São Gonçalo / RJ: FFP/UERJ, 2009 e CARVALHO, Marcus F. M. de. "De portas adentro e de portas afora: trabalho doméstico e escravidão no Recife, 1822-1850" In: Afro-Ásia, Salvador, n. 29/30, p. 41-78, 2003; ARIZA, Marilia Bueno de Araujo. O ofício da liberdade: contratos de locação de serviços e trabalhadores libertandos em São Paulo e Campinas (1830 - 1888). FFLCH, USP, (dissertação de mestrado), 2012.
  • 10
    No que compete à produção historiográfica sobre serviço doméstico no espaço urbano, destaco: SOUZA, Flavia Fernandes. Op. Cit; DIAS. Maria Odila Leite da Silva. Quotidiano e poder em São Paulo no século XIX. Editora Brasiliense, São Paulo, 1984; CARVALHO, Marcus F. M. de. "De portas adentro e de portas afora", Op. Cit.; SOARES, Luiz Carlos. "Escravidão Doméstica" In: O "povo de Cam" na capital do Brasil: a escravidão urbana no Riode Janeiro do século XIX. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2007 e KARASH, Mary. A vida dos escravos no Rio de Janeiro,1808-1850. SP: Cia das Letras, 2000.
  • 11
    FREYRE, Gilberto. Casa Grande e Senzala. 25a., SP: José Olympio Editora, 1987. FREYRE, Gilberto. O Escravo nos anúncios de jornais brasileiros do século XIX. CBBA/Propeg: 1984.
  • 12
    DIAS, Maria Odila Leite da Silva. Quotidiano e poder em São Paulo no século XIX. Op. Cit; GRAHAM, Sandra Lauderdale. House and Street: the domestic world of servants and masters in nineteenth-centrury Rio de Janeiro. University of Cambridge press, 1988 (traduzido para o português como "Proteção e Obediência: criadas e seus patrões no Rio de Janeiro, 1860-1910", SP: Cia das Letras, 1992). Destaco ainda: Kátia Matoso no livro: Ser Escravo no Brasil. SP: Brasiliense, 1990; MATOS, Maria Izilda Santos de. Cotidiano e cultura: história, cidade e trabalho. Bauru: EDUSC, 2002; e GRAHAM, Sandra Lauderdale. "O impasse da escravatura: prostitutas escravas, suas senhoras e a lei brasileira de 1871", In: Acervo, vol. 9, 1996.
  • 13
    GRAHAM, Sandra Lauderdale. Caetana diz não. SP: Cia das Letras, 2005,
  • 14
    MATOS, Maria Izilda Santos de. "Porta adentro: criados de servir em São Paulo de 1890 a 1930". In: BRUSCHINI, Maria Cristina; SORJ, Bila (Org.). Novos olhares: mulheres e relações de gênero no Brasil. São Paulo: Marco Zero, 1994; CARVALHO, Marcus J. M. de. Op. Cit; Flavia Fernandes de Souza. Op. Cit; COWLING, Camillia. Conceiving Freedom - women of color, gender, and the Abolition od Slavery in Havana and Rio de janeiro. Chapel Hill, University of North Carolina press, 2013; CUNHA, Olívia Maria Gomes da. "Criadas para servir: domesticidade, intimidade e retribuição". In: ______; GOMES, Flávio (Org.). Quase-Cidadão: histórias e antropologias da pós-emancipação no Brasil. Rio de Janeiro: FGV, 2007.
  • 15
    MUAZE, Mariana. A Descoberta da infância: a formação de um habitus civilizado na boa sociedade imperial. Dissertação (Mestrado em História Social da Cultura) - PUC-RJ, Rio de Janeiro, 1999; CARNEIRO, Maria Elizabeth Ribeiro. Procura-se preta, com muito bom leite, prendada, carinhosa: uma cartografia das mas de leite na sociedade carioca 1850-1888. Tese (Doutorado em História) - PPGHIS, UNB, Brasília, 2006. MARTINS, Bárbara Canedo Ruiz. Amas-de-leite e mercado de trabalho feminino: descortinando práticas e sujeitos (Rio de Janeiro, 1830-1890). Dissertação (Mestrado em História) - Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2006. KOUTSOUKOS, Sandra Sofia Machado. "Amas na fotografia brasileira da segunda metade do século XIX". In: Studium- dossier Representação imagética das africanidades no Brasil. Campinas, 2007, disponível em: <http://www.studium.iar.unicamp.br/africanidades.html>, acesso em 18/12/2014. MACHADO, Maria Helena P. T., "Entre Dois Beneditos: histórias de amas de leite no ocaso da escravidão", in: XAVIER, Giovana, BARRETO, Juliana e GOMES, Flávio (orgs.), Mulheres Negras no Brasil escravista e do Pós- Emancipação. São Paulo: Sumus/Selo Negro, 2012.
  • 16
    Assim como no caso brasileiro, a historiografia dedicada às questões de família e gênero contribuiu para transformar a escravidão doméstica em tema de pesquisa. Anne Firor Scott e Catherine Clinton, por exemplo, questionaram o ideal de mulher sulista como frágil e indefesa, demonstrando como as senhoras tiveram grande importância no cotidiano e nos negócios das plantations. Contudo, esta historiografia feminista ressaltava a senhora como a figura de autoridade da fazenda, sem dar aos escravos o devido destaque, o que minimizava as faces da violência a que estes trabalhadores estavam submetidos. Um livro importante para uma virada interpretativa a cerca da escravidão doméstica e da relação entre mulheres brancas e negras nas plantations escravistas, foi o de Elizabeth Fox-Genovese. A autora demonstrou como o trabalho cativo estava impregnado no cotidiano da "household". Nele, senhoras e cativas dividiam um mundo de antagonismos mútuos e sentimentos que frequentemente irrompiam em violência, crueldade e até morte. Em estudo publicado em 2008, Thavolia Glymph diagnostica os meandros das relações desiguais e de poder entre senhoras e escravas domésticas. Segundo ela, a violência e a humilhação marcaram o tratamento de escravas por senhoras, tornando estas últimas experts no uso da violência física e psicológica, além de personagens fundamentais na formação de valores e construção da sociedade escravista do sul. Sua análise não deixa de fora as formas de resistência escrava no cotidiano doméstico e as acompanha até o período pós emancipação. SCOTT, Anne Firor. The Southern lady: from pedestal to politics, 1830-1930. Charlottesville: University Press of Virginia, 1995. CLINTON, Catherine. The plantation mistress: women's worls in the old South. New York, Pantheon, 1982; _____Caught in the web of the big house in the web of Southern social relations: women, Family and education. Athens: university of Georgia press, 1985. FOX-GENOVESE, E. Within the plantation household: Chapel Hill: The University of North Carolina Press, 1988, p 35.GLYMPH, Travolia. Out of house of bondage, ambridge University Press, 2008. Para um exame das pequenas propriedades, cito: BURKE, Diane Mutti. On slavery's border: missouri's small slaveholding households 1815-1865. Athen and London: The University of Georgia Press, 2010.
  • 17
    A denominação foi retirada do estudo de Ricardo Salles para o vale do Paraíba que considera de mega proprietário aqueles que possuem mais de 100 escravos. SALLES, Ricardo. E o vale era escravo. Op. Cit.
  • 18
    Inventário do Barão de Capivary, 1863. Inventariante: Joaquim Ribeiro de Avellar Jr. Vassouras: CDH/ Universidade Severino Sombra, (caixa 116).
  • 19
    A análise do bando de dados constituído pelos inventários de Vassouras, depositados no antigo CDH da Universidade Severino Sombra, demonstra nos 923 inventários arrolados entre 1821 e 1888 aparecem 30.534 escravos registrados e somente 2.829, ou seja 9,26%, possuíam algum tipo de ofício registrado. No livro E o Vale era o escravo Ricardo Salles afirma que os ofícios só começaram a ser anotados a partir de 1845.SALLES. Op. Cit. p. 202-3,
  • 20
    Gostaria de enfatizar que não estou fazendo uma associação direta entre o número de pessoas que coabitavam o mesmo domicílio e o tipo de família (nuclear ou extensa). Como chamei atenção na introdução, estas categorizações são dotadas de sentido a partir da forma com a qual os agentes familiares se relacionam no interior da parentela. E, portanto, devem levar em consideração sentimentalidades, vínculos pessoais, estratégias de casamento, mecanismos de manutenção do patrimônio e outros fatores.
  • 21
    Telles, Augusto C. da Silva. "Vassouras: estudo da construção residencial urbana" In: Revista do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. RJ: Ministério da educação e Cultura, 1968, vol 16, pp 9-137, planta VIII. As informações sobre as disposições dos cômodos e localização dos moradores foram fornecidas por d. Ivone Barros Franco a quem devo meus sinceros agradecimentos.
  • 22
    Alusão ao termo usado por MARX, K. "A Mercadoria" in: O Capital. São Paulo: Abril Cultural, 1982. Cap.I., Livro 1, Vol. 1.
  • 23
    Matrícula dos escravos de Joaquim Ribeiro de Avellar, 1872. Documento pertencente ao arquivo privado da família Barros Franco.
  • 24
    Na época, habitavam a Pau Grande o casal Joaquim e Mariana Ribeiro de Avellar, seus filhos Elisa, Luisa, Julia, José Maria, Antônio e Joaquim, além da governanta francesa Mme Doyen, a prima d. Antônia Ludovina Mascarenhas Salter e Joaquim Mascarenhas Salter. A filha primogenital Maria José já havia casado com Manoel Tosta e morava na corte, mas tinha o hábito de passar temporadas com a família em Petrópolis e na fazenda. Sobre o número de escravos domésticos na Pau Grande, é preciso que se faça uma ressalva. Pela Matrícula de 1872, não é possível saber quem residia aonde e o casal Avellar possúía outras fazendas na ocasião. Mesmo assim, somente a Pau Grande e a Glória eram propriedades com casas de morada de maior conforto, sendo que a Glória nunca foi citada em cartas como local de moradia. Portanto, os números apresentados podem envolver mais de uma propriedade.
  • 25
    Dados retirados da Matrícula dos escravos de Joaquim Ribeiro de Avellar, 1872. Op. Cit.
  • 26
    Caderno de anotações de Mariana Velho de Avellar, 1880-1884. Coleção privada família Barros Franco.
  • 27
    A análise dos anúncios do Jornal do Commercio para os anos de 1840 e 1850 também apontam a preferência por cozinheiros homens.
  • 28
    Segundo Guerrand, as cozinhas podem ser chamadas no século XIX de espaços da rejeição, pois foram o último reduto da casa a ser adentrado pela racionalidade burguesa, permanecendo como um espaço onde os patrões pouco penetravam. GUERRAND, Roger-Henri. "Espaços Privados" In: PERROT, Michelle (org), História da Vida Privada: da Revolução Francesa à Primeira Guerra. SP: Cia das Letras, 1999.
  • 29
    Caderno de receitas de Mariana Velho de Avellar, s/d. Coleção privada família Barros Franco.
  • 30
    Mariana Velho da Silva era filha do casal José Maria e Leonarda Velho da Silva. Seus pais prestaram longos anos de serviço à família Imperial, a mãe como Dama de Companhia da Impertriz Teresa Christina e o pai como Mordomo do Paço. Em 17 de novembro de 1849, depois de longas negociações entre as famílias envolvidas, Mariana se casa como Joaquim Ribeiro de Avellar, filho do Barão do Capivary. O casal reside na corte por poucos anos e em meados dos anos 50 se muda para a fazenda do Pau Grande. Sobre as famílias Ribeiro de Avellar e Velho da Silva, consultar: MUAZE, Mariana. As memórias da viscondessa. Op. Cit.
  • 31
    Carta de Mariana Velho de Avellar para Leonarda Maria Velho da Silva. Petrópolis, 13 de novembro de 1862. Coleção Roberto Meneses de Moraes
  • 32
    Carta de Mariana Velho de Avellar para Leonarda Maria Velho da Silva. Petrópolis 15 de fevereiro de 1862. Coleção Roberto Meneses de Moraes
  • 33
    O imposto da meia siza foi criado por D. João VI, através do alvará régio de 3 de junho de 1809. Tratava-se de uma taxa de 5% paga ao tesouro que insidia sobre a compra, venda, adjudicação e arrecadação de escravos ladinos. FERNANDES, Guilherme Vilela. "Tributação e escravidão: o imposto da meia siza sobre o comércio de escravos na província de São Paulo (1809-1850)". In: www.almanack.usp.br.
  • 34
    Carta de Leonarda Maria Velho da Silva para Mariana Velho de Avellar. Rio de Janeiro 8 de agosto de 1864. Coleção Roberto Meneses de Moraes
  • 35
    Carta de Leonarda Maria Velho da Silva para Mariana Velho de Avellar. Rio, 8 de agosto de 1864. Coleção Roberto Meneses de Moraes.
  • 36
    Carta de Leonarda Maria Velho da Silva para Mariana Velho de Avellar. Petrópolis 3a. f 22 de dezembro. Coleção Roberto Meneses de Moraes.
  • 37
    Dados retirados da Matrícula dos escravos de Joaquim Ribeiro de Avellar, 1872. Op. Cit.
  • 38
    A matrícula de escravos de 1872 para a fazenda Pau Grande aqui utilizada se encontra no arquivo privado da família Barros Franco. Trata-se da cópia que Joaquim Ribeiro de Avellar guardou dos escravos referents a sua propriedade.
  • 39
    SALLES, Ricardo. E o vale era escravo. Op. Cit.; SLENES, Robert W. Na Senzala uma Flor, esperanças e recordações na formação da família escrava -Brasil Sudeste, século XIX. SP: Unicamp ed, 1999; FLORENTINO, Manolo & GOES, J.R. A paz das senzalas. Famílias escravas e tráfico atlântico, Rio de Janeiro, 1790-1850. RJ: Civilização Brasileira, 1997.
  • 40
    Heitor Moura, em artigo, recente apresenta estimativas para a chegada de africanos no Vale do Paraíba Fluminense cobrindo, inclusive o pós lei de1831.Ver: MOURA, Heitor. "Tirando leite de pedra": o tráfico africano estimado a partir de dados etários". In: MUAZE, Mariana & SALLES, Ricardo (org). O Vale do Paraíba e o Império do Brasil nos quadros da segunda escravidão. RJ: 7 Letras, 2015.
  • 41
    Grifo meu. Carta de Mariana Velho de Avellar para Leonarda Maria Velho da Silva. Petrópolis 13 de novembro de 1862. Coleção Roberto Meneses de Moraes.
  • 42
    Para uma análise do debate sobre aleitamento materno no século XIX consultar: MUAZE, Mariana. A Descoberta da infância: a formação de um habitus civilizado na boa sociedade imperial. RJ: Departamento de História da PUC, dissertação de mestrado, 1999.
  • 43
    Carta de José Maria Velho da Silva para Mariana Velho de Avellar. 26 de junho, s/d. Sobre alimentação e saúde dos escravos ver: KARASCH, Mary. A Vida dos Escravos no Rio de Janeiro 1808-1850. SP: Cia das Letras, 2000, em especial o capítulo cinco.
  • 44
    REIS, João José & SILVA, Eduardo. Negociação e Conflito SP: Cia das letras, 1989.
  • 45
    GRAHAM, Sandra L. Proteção e Obediência. Op. Cit.
  • 46
    Carta de Carolina Velho para Mariana Velho de Avellar. SC, 18 de janeiro de 1865. Coleção Roberto Meneses de Moraes.
  • 47
    Grifo meu. Carta de José Maria Velho da Silva para Mariana Velho de Avellar. Corte, 4 de agosto de 1866. Coleção Roberto Meneses de Moraes.
  • 48
    Tal questão foi discutida por MACHADO, Maria Helena. Op. Cit.
  • 49
    "Pelo Sabino receberás um corte de vestido que a Maria Izabel manda de lembrança a sua mãe Beta". Carta de José Maria Velho da Silva para Mariana Velho de Avellar. Corte 20 de março de 1867. Coleção Roberto Meneses de Moraes.
  • 50
    É interessante ressaltar que no inventário de D. Leonarda Maria Velho da Silva, Deolinda foi citada como uma de suas escravas avaliada em 800$000. Inventário de D. Leonarda Maria Velho da Silva, Rio de Janeiro, 16 de março de 1871. Coleção Roberto Meneses de Moraes.
  • 51
    Grifo meu. Carta de Leonarda Maria Velho da Silva para Mariana Velho de Avellar. Petrópolis, sábado, 3 de dezembro, às 9h da noite, s/a. Coleção Roberto Meneses de Moraes.
  • 52
    Tais exemplos demonstram como paralelamente a marca da violência sempre presente, a escravidão como instituição tecia espaços, tanto de barganha, quanto de conflito, num cotidiano delimitado pela hierarquização social. REIS, João José & SILVA, Eduardo. Op. Cit.
  • 53
    Grifo meu. Testamento de D. Mariana Luiza da Glória Avellar. Paty do Alferes, 1848. Coleção Roberto Meneses de Moraes.
  • 54
    Contrato de venda de escravos redigido por D. Mariana Luiza da Glória Avellar, Pau Grande. 9 de março de 1848. Coleção Roberto Meneses de Moraes.
  • 55
    O noção aqui utilizada inspira-se em Bourdieu para quem o poder simbólico/violência simbólica possui uma ação sobre o mundo que lhe permite obter o equivalente ao que é obtido pela força (física ou econômica). Para ele, o poder simbólico não reside nos "sistemas simbólicos", mas na relação entre quem exerce o poder e aqueles que estão sujeitos à ele. Assim, pode ser entendido o poder das palavras, das palavras de ordem e daqueles que as pronunciam. BOURDIEU, P. O poder simbólico. 10 ed. Rios de Janeiro: Bertrand Brasil, 2007, pp 14, 15.
  • 56
    Outro lócus de permanência a ser citado é o trabalho rural que recebeu isonomia de direitos trabalhistas somente na constituição de 1988 e possui o maior índice de "trabalho escravo contemporâneo" da sociedade brasileira. Para saber mais sobre o trabalho escravo contemporâneo na sociedade brasileira ver: Gomes, Angela de Castro. "Representação e mudança no trabalho análogo a de escravo no Brasil: tempo presente e usos do passado". In: Revista Brasileira de História. SP: Vol32, N64, p167-184, 2012; SCOTT, Rebecca. "O trabalho escravo contemporâneo e os usos da História" in: Public law and Legal Theoty Research Papers Siries, paper 333, Jul 2013. Consultado no site http://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2292162 em 2 de fevereiro de 2015.
  • 57
    This research received funding from FAPERJ, CNPq and CAPES. I sincerely thank the comments of Ricardo Salles in this article.
  • 58
    The data presented herein were taken from the International Labour Organization (ILO) report: Domestic workers across the world: global and regional statistics and extent of legal protection by International Labor Office Geneva, 14/1/2013. Available at <http://www.ilo.org/wcmsp5/groups/public/---dgreports/---dcomm/---publ/documents/publication/wcms_173363.pdf>. Access in Jan. 15th, 2015. The research mentioned was held be between 2009 and 2013, covering all formal workers from 117 countries in different continents. In Brazil, the data were obtained based on the IBGE Census and did not include a significant number of housekeepers working informally and/or that are 15 years old or younger. The addition of such variables would certainly increase the percentage, because it is estimated that only 30% of the housekeepers is formally employed in Brazil. See Appendix 2, p. 124.
  • 59
    In the 1988 Brazilian Constitution, the domestic workers did not receive the same labour rights as the other categories. In April 2013, the Federal Senate approved the Proposal of Constitutional Amendment (PEC, in Portuguese), the so-called "PEC das Domésticas" (Domestic workers PEC), should match their rights to the other workers'. About this topic, please refer to: NUNES, Christane Girad; SILVA, Pedro Henrique Isaac. "Entre o prescrito e o real: o papel da subjetividade na efetivação dos direitos das empregadas domésticas no Brasil". Sociedade e Estado. Brasília, vol.28 no3, set./dez. MELO, Hildete Pereira de. "Criadas e trabalhadoras". Estudos Feministas, Rio de Janeiro, v. 6, no. 2, 1998. BRUSCHINI, Cristina; LOMBARDI, Maria Rosa. "A bipolaridade do trabalho feminino no Brasil contemporâneo". Cadernos de Pesquisa, São Paulo, n. 110, p. 67-104, 2000 e BRITES, Jurema. Serviço doméstico: elementos políticos de um campo desprovido de ilusões. Campos: Paraná, n. 3, p. 65-82, 2003.
  • 60
    The phenomenon of incorporating former slaves to the domestic service was already explored by the North-American historiography. See: SHARPLESS, Rebecca. Cooking in Other Womens Kitchens: Domestic Workers in the South, 1865-1960. North Carolina: University of North Carolina Press, 2010 e GLYMPH, Thavolia. Out of the House of Bondage: the transformation of the plantation household. Cambridge: Cambridge University Press, 2008.
  • 61
    About race relations and work relations after the abolition: COOPER, Frederick; HOLT, Thomas e SCOTT, Rebecca J., Beyond Slavery: explorations of race, labour, and citizenship in postemancipation societies. Chapel Hill: University of North Carolina Press, 2000 e RIOS, Ana Maria; MATTOS, Hebe Maria. "O pós-abolição como problema histórico: balanços e perspectivas". Topoi, nº 8, 2004, pp. 17-195.
  • 62
    See more about the process of transformation in the landlord class family and habitus at: MUAZE, Mariana. As memórias da viscondessa: família e poder no Império. Rio de Janeiro: Zahar, 2008.
  • 63
    In relation to the permanence of values and conceptions of hierarchical and uneven worlds after the abolition and in the present, please see: SALLES, Ricardo. Nostalgia Imperial: escravidão e formação da identidade nacional no Brasil do Segundo Reinado. São Paulo: Topbooks, 1996.
  • 64
    TOMICH, Dale W. Pelo prisma da escravidão: trabalho, capital e economia mundial. São Paulo: EDUSP, 2011; MARQUESE, Rafael e TOMICH, Dale. "O Vale do Paraíba escravista e a formação do mercado mundial do café no século XIX". In: SALLES, Ricardo e GRINBERG, Keila (org.). O Brasil Imperial (vol. 3). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2010.
  • 65
    In relation to the mega owners of the Paraíba Valley, Rio de Janeiro Part, please see: SALLES, Ricardo. E o vale era o Escravo. Vassouras, século XIX. RJ: Civilização Brasileira, 2008.
  • 66
    See: SOUZA, Flavia Fernandes. Para casa de família e mais serviços: O trabalho doméstico na cidade do Rio de Janeiro no final do século XIX. Master's degree dissertation. São Gonçalo: FFP/UERJ, 2009 e CARVALHO, Marcus F. M. de. "De portas adentro e de portas afora: trabalho doméstico e escravidão no Recife, 1822-1850". In: Afro-Ásia, Salvador, n. 29/30, p. 41-78, 2003; ARIZA, Marília Bueno de Araujo. O ofício da liberdade: contratos de locação de serviços e trabalhadores libertandos em São Paulo e Campinas (1830 - 1888). Master's degree dissertation, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2012.
  • 67
    In relation to the historiographic production about the domestic services within the urban area, I highlight: SOUZA, Flavia Fernandes. Op. Cit.; DIAS. Maria Odila Leite da Silva. Quotidiano e poder em São Paulo no século XIX. São Paulo: Editora Brasiliense, 1984; CARVALHO, Marcus F. M. de. De portas adentro...Op.Cit.; SOARES, Luiz Carlos. "Escravidão Doméstica". In: O "povo de Cam" na capital do Brasil: a escravidão urbana no Rio de Janeiro do século XIX. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2007 e KARASH, Mary. A vida dos escravos no Rio de Janeiro, 1808-1850. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.
  • 68
    FREYRE, Gilberto. Casa Grande e Senzala (25a edição). São Paulo: José Olympio Editora, 1987. FREYRE, Gilberto. O Escravo nos anúncios de jornais brasileiros do século XIX. CBBA/Propeg: 1984.
  • 69
    DIAS, Maria Odila Leite da Silva. Quotidiano e Poder... Op.Cit.; GRAHAM, Sandra Lauderdale. House and Street: the domestic world of servants and masters in nineteenth-century Rio de Janeiro. Cambridge: University of Cambridge Press, 1988. I also highlight: MATOSO, Kátia. Ser Escravo no Brasil. São Paulo: Brasiliense, 1990. MATOS, Maria Izilda Santos de. Cotidiano e cultura: história, cidade e trabalho. Bauru: EDUSC, 2002 e GRAHAM, Sandra Lauderdale. "O impasse da escravatura: prostitutas escravas, suas senhoras e a lei brasileira de 1871". Acervo, vol. 9, 1996.
  • 70
    GRAHAM, Sandra Lauderdale. Caetana diz não. São Paulo: Companhia das Letras, 2005,
  • 71
    MATOS, Maria Izilda Santos de. "Porta adentro: criados de servir em São Paulo de 1890 a 1930". In: BRUSCHINI, Maria Cristina; SORJ, Bila (Org.). Novos olhares: mulheres e relações de gênero no Brasil. São Paulo: Marco Zero, 1994; CARVALHO, Marcus J. M. de. Op. Cit; Flavia Fernandes de Souza. Op. Cit; COWLING, Camillia. Conceiving Freedom - women of color, gender, and the Abolition od Slavery in Havana and Rio de janeiro. Chapel Hill: University of North Carolina press, 2013; CUNHA, Olívia Maria Gomes da. "Criadas para servir: domesticidade, intimidade e retribuição". In: ______; GOMES, Flávio (Org.). Quase-Cidadão: histórias e antropologias da pós-emancipação no Brasil. Rio de Janeiro: FGV, 2007.
  • 72
    MUAZE, Mariana. A Descoberta da infância: a formação de um habitus civilizado na boa sociedade imperial. Dissertação (Mestrado em História Social da Cultura) - PUC-RJ, Rio de Janeiro, 1999; CARNEIRO, Maria Elizabeth Ribeiro. Procura-se preta, com muito bom leite, prendada, carinhosa: uma cartografia das amas de leite na sociedade carioca 1850-1888. Tese (Doutorado em História) - PPGHIS, UNB, Brasília, 2006. MARTINS, Bárbara Canedo Ruiz. Amas-de-leite e mercado de trabalho feminino: descortinando práticas e sujeitos (Rio de Janeiro, 1830-1890). Dissertação (Mestrado em História) - Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2006. KOUTSOUKOS, Sandra Sofia Machado. "Amas na fotografia brasileira da segunda metade do século XIX". In: Studium- dossier "Representação imagética das africanidades no Brasil". Campinas, 2007. Available at: <http://www.studium.iar.unicamp.br/africanidades.html>. Access in Dec. 18th, 2014. MACHADO, Maria Helena P. T., "Entre Dois Beneditos: histórias de amas de leite no ocaso da escravidão". In: XAVIER, Giovana; BARRETO, Juliana e GOMES, Flávio (Orgs.). Mulheres Negras no Brasil escravista e do Pós- Emancipação. São Paulo: Sumus/Selo Negro, 2012.
  • 73
    As in the Brazilian case, the historiography dedicated to the family and gender issues contributed to convert the domestic slavery in a research topic. Anne Firor Scott and Catherine Clinton, for example, questioned the ideal of the southern woman, fragile and helpless. However, they did not emphasize the slaves, and this minimized the faces of violence which they were subject to. An important book interpretative upturn about domestic slavery was the one written by Elizabeth Fox-Genovese, because it has shown how the captives work was impregnated in the household daily life. In 2008, Thavolia Glymph diagnosed the meanderings of the imbalances of power between mistresses and domestic slaves, demonstrating the violence suffered by the slaves, from those mistresses who were experts in using physical and psychological violence, and were key characters in the creation of values and formation of the slaveholding society from the South. SCOTT, Anne Firor. The Southern lady: from pedestal to politics, 1830-1930. Charlottesville: University Press of Virginia, 1995. CLINTON, Catherine. The plantation mistress: women's worlds in the old South. New York: Pantheon, 1982; _____. Caught in the web of the big house in the web of Southern social relations: women, Family and education. Athens: University of Georgia Press, 1985. FOX-GENOVESE, E. Within the plantation household. Chapel Hill: The University of North Carolina Press, 1988, p 35. GLYMPH, Thavolia. Out of the house... Op. Cit. To study the small properties, I mention: BURKE, Diane Mutti. On slavery's border: Missouri's small slaveholding households 1815-1865. Athen and London: University of Georgia Press, 2010.
  • 74
    The designation was taken from the study of Ricardo Salles for the Paraíba Valley, considering as mega owners the ones with more than 100 slaves. SALLES, Ricardo. E o vale era o Escravo. Op. Cit.
  • 75
    Capivary Baron Inventory, 1863. Executor: Joaquim Ribeiro de Avellar Jr. Vassouras: CDH/ Universidade Severino Sombra (box 116).
  • 76
    The analysis of the database created by the inventories in Vassouras, registered in the old Historical Documentation Center of the University Severino Sombra, demonstrates that, in the 923 inventories enrolled between 1821 and 1888, 30,534 slaves were registered and only 2,829, that is, 9.26%, had some kind of registered profession. In the book "E o Vale era o escravo", Ricardo Salles states that the profession started to be written down only after 1845. SALLES, Ricardo. Op. Cit. p. 202-3,
  • 77
    I would like to emphasize that I am not directly associating the number of people living together and the type of family (nuclear or extended). As stressed before, such categorizations have a meaning according to the form in which the family agents relate to each other. And, thus, they should take into account affections, personal connections, marriage strategies, mechanisms to maintain the properties and other factors.
  • 78
    TELLES, Augusto C. da Silva. "Vassouras: estudo da construção residencial urbana". Revista do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Rio de Janeiro: Ministério da educação e Cultura, 1968, vol. 16, pp. 9-137, Planta VIII. The details about the dispositions of the rooms and the setting of the residents were provided by Ms. Ivone Barros Franco, to whom I express my sincere thanks.
  • 79
    Reference to the term used by MARX, K. "The Commodity" Capital. São Paulo: Abril Cultural, 1982. Cap. I., Livro 1, Vol. 1.
  • 80
    Enrollment list of the slaves of Joaquim Ribeiro de Avellar, 1872. Document pertaining to the private files of the family Barros Franco.
  • 81
    At that time, lived in Pau Grande farm the couple Joaquim and Mariana Ribeiro de Avellar, their children Elisa, Luisa, Julia, José Maria, Antônio and Joaquim, besides the French governess Mme Doyen, their cousin, Ms. Antônia Ludovina Mascarenhas Salter and Joaquim Mascarenhas Salter. The eldest daughter, Maria José, had married Manoel Tosta and was living in the court, but she had the habit to spent periods with the family in Petrópolis and in the farm. In relation to the number of domestic slaves in the Pau Grande farm, we have to make a proviso. Through the enrollment list from 1872, it is not possible to know where the slaves lived, and the couple had other farms in that occasion. Even so, only Pau Grande and Glória were properties with dwelling houses with a greater comfort, and Glória was never mentioned in letters as a dwelling house. Therefore, the numbers presented may involve more than one property.
  • 82
    Data from the enrollment list of the slaves of Joaquim Ribeiro de Avellar, 1872. Op. Cit.
  • 83
    Mariana Velho de Avellar notebook, 1880-1884. Private collection of the Barros Franco family.
  • 84
    The analysis of the ads in the Jornal do Commercio newspaper between 1840 and 1850 also pointed out the preference for men as cooks.
  • 85
    According to Guerrand, the kitchens were called as rejection space during the 19th century, because it was the last place of the house where the bourgeois would come in, so they were spaces where the masters hardly ever would enter. GUERRAND, Roger-Henri. "Espaços Privados". In: PERROT, Michelle (Org.). História da Vida Privada: da Revolução Francesa à Primeira Guerra. São Paulo: Companhia das Letras, 1999.
  • 86
    Mariana Velho de Avellar notebook, no date. Private collection of the Barros Franco family.
  • 87
    In relation to the Ribeiro de Avellar and Velho da Silva families, please see: MUAZE, Mariana. As memórias da viscondessa. Op. Cit.
  • 88
    Letter from Mariana Velho de Avellar to Leonarda Maria Velho da Silva. Petrópolis, November 13th, 1862. Roberto Meneses de Moraes collection.
  • 89
    Letter from Mariana Velho de Avellar to Leonarda Maria Velho da Silva. Petrópolis, February 15th, 1862. Roberto Meneses de Moraes collection.
  • 90
    Letter from Leonarda Maria Velho da Silva to Mariana Velho de Avellar. Rio de Janeiro, August 8th, 1864. Roberto Meneses de Moraes collection.
  • 91
    Letter from Leonarda Maria Velho da Silva to Mariana Velho de Avellar. Rio, August 8th, 1864. Roberto Meneses de Moraes collection.
  • 92
    Letter from Leonarda Maria Velho da Silva to Mariana Velho de Avellar. Petrópolis 3rd. f December 22nd. Roberto Meneses de Moraes collection.
  • 93
    Data from the enrollment list of the slaves of Joaquim Ribeiro de Avellar, 1872. Op. Cit.
  • 94
    The slaves enrollment from 1872 for the Pau Grande farm here used is currently in the private files of the Barros Franco family. It is a copy kept by Joaquim Ribeiro de Avellar, with the slaves belonging to his property.
  • 95
    SALLES, Ricardo. E o vale era escravo. Op. Cit.; SLENES, Robert W. Na Senzala uma Flor, esperanças e recordações na formação da família escrava -Brasil Sudeste, século XIX. São Paulo: Ed. Unicamp, 1999; FLORENTINO, Manolo e GOES, J.R. A paz das senzalas. Famílias escravas e tráfico atlântico, Rio de Janeiro, 1790-1850. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1997.
  • 96
    Heitor Moura, in a recent article, presents estimates for the arrival of Africans in that area, covering even after the 1831 Law. See: MOURA, Heitor. "Tirando leite de pedra": o tráfico africano estimado a partir de dados etários". In: MUAZE, Mariana & SALLES, Ricardo (Org.). O Vale do Paraíba e o Império do Brasil nos quadros da segunda escravidão. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2015.
  • 97
    Oficial list of resident slaves on every propriety. It contained name, age and origin, and became mandatory after the Free Womb Law in order to control each slave should be freed
  • 98
    My emphasis. Letter from Mariana Velho de Avellar to Leonarda Maria Velho da Silva. Petrópolis, November 13th, 1862. Roberto Meneses de Moraes collection.
  • 99
    In relation to breastfeeding during the 19th century, please see: MUAZE, Mariana. A Descoberta da infância: a formação de um habitus civilizado na boa sociedade imperial. Dissertação de Mestrado, Pontíficia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 1999.
  • 100
    Letter from José Maria Velho da Silva to Mariana Velho de Avellar. June 26th, no date. In relation to slaves diets and health, please see: KARASCH, Mary. A Vida dos Escravos no Rio de Janeiro 1808-1850. São Paulo: Companhia das Letras, 2000, especially Chapter 5.
  • 101
    REIS, João José e SILVA, Eduardo. Negociação e Conflito. Op. Cit.
  • 102
    GRAHAM, Sandra L. Proteção e Obediência. Op. Cit.
  • 103
    Letter from Carolina Velho to Mariana Velho de Avellar. SC, January 18th, 1865. Roberto Meneses de Moraes collection.
  • 104
    My emphasis. Letter from José Maria Velho da Silva to Mariana Velho de Avellar. Court, August 4th, 1866. Roberto Meneses de Moraes collection.
  • 105
    This issue was discussed by MACHADO, Maria Helena. Op. Cit.
  • 106
    "By means of Sabino you will receive a dress that Maria Izabel sends to her mother Beta". Letter from José Maria Velho da Silva to Mariana Velho de Avellar. Court, March 20th, 1867. Roberto Meneses de Moraes collection.
  • 107
    It is interesting to highlight that, in the inventory of Ms. Leonarda Maria Velho da Silva, Deolinda was mentioned as one of her slaves, calculated in 800$000. Inventory of Ms. Leonarda Maria Velho da Silva, Rio de Janeiro, March 16th, 1871. Roberto Meneses de Moraes collection.
  • 108
    My emphasis. Letter from Leonarda Maria Velho da Silva to Mariana Velho de Avellar. Petrópolis, Saturday, December 3rd, 9:00 p.m., s/a. Roberto Meneses de Moraes collection.
  • 109
    Such examples show how, at the same time as the violence, which was always present, slavery as an institution created spaces, for bargaining and for conflicts, in a daily life defined by social hierarchic division. REIS, João José & SILVA, Eduardo. Op. Cit.
  • 110
    My emphasis. Will of Ms. Mariana Luiza da Glória Avellar. Paty do Alferes, 1848. Roberto Meneses de Moraes collection.
  • 111
    Agreement for the sale of slaves written by Ms. Mariana Luiza da Glória Avellar, Pau Grande farm. March 9th, 1848. Roberto Meneses de Moraes collection.
  • 112
    The idea used here is inspired by Bourdieu, to whom the symbolic power/symbolic violence acts on the world, allowing it to obtain the equivalent to what is obtained with force (physical or economic force). For Bourdieu, the symbolic power is not on the "symbolic systems", but in the relationship between who exercises the power and the ones who are subject to it. Thereby, the power of the words and mottoes of the ones who said them can be understood. BOURDIEU, P. O poder simbólico (10ª ed.). Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2007, pp. 14-15.
  • 113
    Another permanence locus that can be mentioned is the rural work, which achieved isonomy of labor rights only in the 1988 Constitution, with the highest rate of "contemporary slave labor" of the Brazilian society. In relation to the contemporary slave work, please see: GOMES, Ângela de Castro. "Representação e mudança no trabalho análogo a de escravo no Brasil: tempo presente e usos do passado". Revista Brasileira de História. São Paulo: vol. 32, n.64, pp. 167-184, 2012; SCOTT, Rebecca. "O trabalho escravo contemporâneo e os usos da História". Public law and Legal Theoty Research Papers Siries. Paper 333, Jul. 2013. Available at <http://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2292162>. Access in Feb. 2nd. 2015.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Abr 2016
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