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Mulheres e Mães Negras: mobilidade social e estratégias sucessórias em Minas Gerais na segunda metade do século XVIII

Resumo:

Esse artigo examina a mobilidade social de pessoas de ascendência africana na vila e termo de Sabará, Minas Gerais, no século XVIII, a partir do questionamento da possibilidade de ascenção social disponíveis a mulheres negras e seus descendentes. Através da análise de documentos cartoriais (inventários, testamentos, escrituras de venda, etc.) e documentos da Câmara Municipal de Sabará, esse estudo investiga as oportunidades de sucesso econômico disponíveis às mulheres de cor e os limites da mobilidade social; os efeitos do processo sucessório na transferência de vantagens sócio-econômicas de uma geração para outra; e as estratégias usadas por mulheres negras para garantir que a sucessão de bens pudesse se traduzir em vantagens (e ascensão) sociais para seus filhos.

Palavras-chave:
Mulheres Negras; Afro-descendentes; Mobilidade Social; Sucessão de Bens; Sabará, Minas Gerais; Século XVIII

Abstract: Through a critical examination of the possibilities of social improvement available to black women and their descendants, this article discusses social mobility among Afro-descending people in the town and precincts of Sabará, Minas Gerais, in the eighteenth century. Using various notarial documents (inventories, wills, deeds of sale, etc.) and papers from the municipal council of Sabará, this study investigates the types of economic success enjoyed by women of Afro-descent and the limits to their social mobility; the impact of inheritance procedures on the transfer of socio-economic resources from one generation to the next; and the strategies black women employed to ensure that transmission of their property to their children would translate into social advantages.

Keywords:
Black Women; Afro-Descendants; Social Mobility; Transmission of Property; Sabará, Minas Gerais; Eighteenth Century


Desde o final da década de 1980 e início da década de 1990, trabalhos como o de Liana Maria Reis, Luciano Figueiredo, Eduardo França Paiva, e Kathleen Higgins têm ajudado a destacar a realidade vivida por mulheres de descendência africana nas Minas setecentistas e sua importante participação na vida econômica, social e cultural daquela capitania.1 1 REIS, Liana Maria. Mulheres do ouro: as negras de tabuleiro nas Minas Gerais do século XVIII. Revista do Departamento de História, Belo Horizonte, v. 8., p. 72-85, 1989. FIGUEIREDO, Luciano Raposo de Almeida. O avesso da memória: cotidiano e trabalho da mulher em Minas Gerais no século XVIII. Rio de Janeiro: Editora J. Olympio, 1993. HIGGINS, Kathleen. "Licentious Liberty" in a Brazilian Gold-Mining Region: Slavery, Gender, and Social Control in Eighteenth-Century Sabará, Minas Gerais. University Park: Pennsylvania State University Press, 1999. PAIVA, Eduardo França. Escravidão e universo cultural na colônia: Minas Gerais,1716-1789. Belo Horizonte: Editora Universidade Federal de Minas Gerais, 2006. Estes e tantos outros estudos produzidos sobre o mesmo assunto contribuíram para ressaltar a presença e envolvimento da mulher negra no trabalho escravo; na formação de uma população livre e negra; nas formas e possibilidades de inserção sócio-econômica de escravos libertos e seus descendentes livres; e nos relacionamentos familiares e sociais que escravos e libertos cultivaram durante o período colonial.2 2 Ver, por exemplo, FURTADO, Júnia. Pérolas Negras: mulheres livres de cor no distrito Diamantino. In FURTADO, Júnia (org.) Diálogos Oceânicos: Minas Gerais e as novas abordagens para uma história do Império Ultramarino Português. Belo Horizonte: Editora da Universidade Federal de Minas Gerais, 2001. p. 81-121. FARIA, Sheila de Castro. Sinhás pretas: acumulação de pecúlio e transmissão de bens de mulheres forras no sudeste escravista (séculos XVIII e XIX). In SILVA, Francisco C. T. Da; MATTOS, Hebe Maria de; FRAGOSO, João (orgs.) Escritos sobre a História da Educação: Homenagem à Maria Yedda Leita Linhares. Rio de Janeiro: Mauad/Faperj, 2001. p. 289-329. XAVIER, Giovana; FARIAS, Juliana Barreto; GOMES, Flávio (orgs.) Mulheres Negras no Brasil Escravista e do Pós-Emancipação. São Paulo: Selo Negro, 2012. Nesse sentido, essa historiografia ajudou a inserir a mulher africana e afro-descendente na narrativa histórica que explica o desenvolvimento da sociedade colonial e pós-colonial brasileira.

O trabalho de Júnia Furtado em particular oferece uma importante contribuição para a literatura sobre as mulheres escravas e libertas no Brasil colônia. Em sua discussão da vida e família de Chica da Silva, Furtado enfatiza a influência que estas mulheres tiveram na formação de famílias, redes de sociabilidade e novas gerações de pessoas livres de ascendência africana. Mas Furtado também presta a devida atenção às limitações e contradições vividas por essas mulheres que afetaram tanto o contorno do que a elas era possível alcançar quanto as estratégias que elas utilizaram para vencer tais obstáculos. Como Furtado demonstrou em seu livro, Chica da Silva não foi nem a astuta mulher negra que seduziu e controlou o poderoso contratador de diamantes João Fernandes de Oliveira, nem a mulata de cor clara que se beneficiou de uma possível falta de rigidez na hierarquia racial colonial para assumir uma posição privilegiada na sociedade do Serro Frio. Em uma análise mais completa e complexa da vida e do mundo de Chica da Silva, Furtado retrata os efeitos da dominação racial e masculina na vida da mulher escrava e posteriormente forra que fora Chica, demonstrando como suas experiências muitas vezes se assemelharam às de outras mulheres de cor.3 3 FURTADO, Júnia Ferreira. Chica da Silva e o contratador dos diamantes: o outro lado do mito. São Paulo, Companhia das Letras, 2003 A Chica da Silva de Júnia Furtado ilustra, portanto, o caminho tortuoso que estas mulheres enfrentaram para adquirir a liberdade e se tornarem proprietárias de bens. Ela demonstra também os desafios que elas encontraram para garantir aos filhos uma melhor situação social e econômica. Pois, como mostra Furtado, o processo sucessório de transmissão de bens e o peso social da ascendência africana podia impedir que os filhos de mulheres libertas se beneficiassem do sucesso sócio-econômico de suas mães.4 4 FURTADO, Chica da Silva, 58-63, 188-198, 246-264.

As experiências vividas por mulheres coloniais negras nos remete à discussão das historiadoras norte-americanas Barbara Bush-Slimani e Jennifer Morgan. Segundo estas, mulheres negras e escravas no Caribe, assim como nos Estados Unidos, sofreram uma dupla sujeição à dominação masculina e à branca. Além disso, elas foram submetidas a uma dupla exploração: a do trabalho e a de sua sexualidade e poder reprodutivo.5 5 BUSH, Barbara. Slave Women in Caribbean Society, 1650-1838. Bloomington: Indiana University Press, 1989; MORGAN, Jennifer. Laboring Women: Reproduction and Gender in New World Slavery. Philadelphia: University of Pennsylvania Press, 2004. Mas apesar de tamanha desvantagem social, política e econômica, elas ainda assim desenvolveram estratégias para minimizar, ou ao menos manejar, o peso da cor e do gênero nas suas oportunidades de ascensão social e na preservação de certo status por seus filhos e demais descendentes.

No contexto colonial das Minas Gerais, as mulheres negras cultivaram um nicho praticamente exclusivo na economia local através de suas atividades como vendedoras de rua ou negras de tabuleiro. Elas acumularam o valor de sua alforria e negociaram sua liberdade através de termos de coartação, compra de um escravo substituto, ou pagamento imediato de seu valor de mercado. Elas investiram em escravos para viverem de seus ganhos e em bens materiais para se dissociarem da condição de escravas. Elas cultivaram relações sociais e de negócios com homens brancos que pudessem as beneficiar. Elas construíram redes de sociabilidade onde se posicionaram como protetoras ou benfeitoras de pessoas menos privilegiadas. Elas integraram irmandades que lhes permitiram partilhar de uma identidade corporativa que as definisse como mais do que simplesmente mulheres negras e que lhes garantisse uma morte digna.6 6 Ver, por exemplo, PAIVA, Eduardo França. Bateias, Carumbés, Tabuleiros: mineração africana e mestiçagem no mundo novo. In PAIVA, Eduardo França; ANASTASIA, Carla Maria Junho. O Trabalho Mestiço: Maneiras de Pensar e Formas de Viver, séculos XVI a XIX. São Paulo: Annablume, 2002. GOMES, Flávio dos Santos; SOARES, Carlos Eugênio Líbano. 'Dizem as Quitandeiras...': ocupações urbanas e identidades étnicas em uma cidade escravista: Rio de Janeiro, século XIX. Acervo-Revista do Arquivo Nacional, Rio de Janeiro, v. 15, n. 2, p. 3-16, 2002. QUINTÃO, Antonia Aparecida. Lá Vem o Meu Parente: as irmandades de pretos e pardos no Rio de Janeiro e em Pernambuco (século XVIII). São Paulo: Annablume, 2002. Finalmente, assim como Chica, elas investiram no futuro dos filhos ao tentaram proporcionar às filhas uma vida condizente com expectativas contemporâneas de honra feminina e, eventualmente, um casamento vantajoso, e aos filhos posses e contatos sociais para que se definissem como homens de qualidade e distinção capazes de ocupar cargos de prestígio.

Esse último aspecto das estratégias de sobrevivência e mobilidade social empregadas por mulheres negras (seus esforços para assegurar aos filhos a possibilidade de ascenderam socialmente), merece, contudo, um estudo mais sistemático. Documentos cartoriais, em particular inventários e testamentos, contêm inúmeros exemplos de estratégias sucessórias e geracionais adotadas por mulheres libertas mas que, em muitos casos, aguardam tratamento por historiadores.7 7 Em um artigo recentemente publicado, por exemplo, eu exploro a prática da venda de meação observada na Comarca do Rio das Velhas, Minas Gerais. DANTAS, Mariana. Succession of Property, Sales of Meação, and the Economic Empowerment of Widows of African Descent in Colonial Minas Gerais, Brazil. Journal of Family History, Los Angeles, v. 39, n. 3, p. 222-238, julho de 2014. Exemplos de trabalhos sobre estratégias sucessórias femininas em outros contextos incluem CAVALLO, Sandra; WARNER, Lyndan. Widowhood in Medieval and Early Modern Europe. New York: Pearson Education Ltd., 1999. p. 193-219. GAUDERMAN, Kimberly. Women's Lives in Colonial Quito: Gender, Law, and Economy in Spanish America. Austin: University of Texas Press, 2003. p. 30-47. MANGAN, Jane. Trading Roles: Gender, Ethnicity, and the Urban Economy in Colonial Potosí. Durham, NC: Duke University Press, 2005. p. 147-49. CONGER, Vivian Bruce. The Widows' Might: Widowhood and Gender in Early British America. New York: New York University Press, 2009. p. 49-78. Tais estudos podem contribuir também para um entendimento mais equilibrado dos desafios e sucessos vividos por esse grupo, evitando assim uma percepção distorcida do fenômeno da mobilidade social e da tolerância racial na sociedade colonial mineira. Pois como adverte o historiador norte-americano William Jordan, em seu estudo sobre mulheres e crédito em sociedades africanas e diaspóricas, o sucesso alcançado por algumas mulheres em atividades comerciais e produtivas não deve ser confundido com mobilidade social. Tal sucesso, segundo Jordan, foi muitas vezes o resultado da existência de uma divisão de trabalho baseada em gênero e não necessariamente desafiou a dominação econômica, social, ou política de grupos masculinos.8 8 JORDAN, William. Women and Credit in Pre-Industrial and Developing Societies. Philadelphia: University of Pennsylvania Press, 1993.

O argumento de Jordan nos convida a adotar certa cautela ao celebrarmos mulheres negras que, nas Minas coloniais, alcançaram a alforria, uma lucrativa participação na economia local e a posse de bens, pois elas raramente competiram economicamente com os homens (principalmente os brancos) daquela sociedade, nem desafiaram sua posição dominante. Adicionalmente, como trabalhadoras e participantes do comércio de rua e, em alguns casos, companheiras ilegítimas de seus parceiros brancos, essas mulheres não se encontraram em posição de competir nem de desafiar a proeminência social das mulheres brancas. Segundo a lógica de Jordan, portanto, o sucesso individual de mulheres como Chica da Silva não promoveu a mobilidade social coletiva de mulheres negras das Minas coloniais.

Por outro lado, documentos relativos ao processo sucessório revelam padrões de comportamento de mulheres negras que sugerem maneiras pelas quais esse grupo negociou e tentou influenciar o tratamento que a sociedade colonial mineira lhes reservava. Essa documentação nos permite vislumbrar, por exemplo, como essas mulheres cultivaram suas próprias ideias sobre a forma em que iriam dispor de seus bens após a morte; ou sobre o direito que seus filhos tinham à sua propriedade e a um futuro menos marcado pelo trabalho manual; ou, ainda, sobre o direito que suas filhas tinham de reivindicar honra feminina e a proteção daquela sociedade à sua reputação.

Assim, sem perder de vista a estrutura hierárquica, sócio-econômica e racial prevalente nas Minas coloniais, proponho mostrar como mulheres negras construíram um espaço para si na economia e sociedade mineira a partir do qual puderam adotar certas práticas e apropriar-se de certas normas comportamentais que normalmente beneficiaram membros brancos e dominantes, daquela sociedade. Nesse sentido os esforços dessas mulheres tiveram o efeito tanto de reforçar a importância e dominância de certas práticas e normas, quanto de naturalizar a participação da população negra nesses padrões comportamentais. Esse estudo baseia-se na análise de documentos cartoriais, principalmente inventários, testamentos, e escrituras, produzidos na Vila e Termos de Sabará, Comarca do Rio das Velhas, durante a segunda metade do século XVIII, período durante o qual a população negra da comarca era a mais numerosa e apresentava crescimento demográfico mais intenso do que qualquer outra na capitania das Minas Gerais.9 9 A informação discutida nessa artigo baseia-se em pesquisa realizada em 350 inventários assim como escrituras e testamentos registrados em 15 livros de notas produzidos entre 1750 e 1799 na Comarca do Rio da Velhas. Cartório do Primeiro Ofício e Cartório de Segundo Ofício, Instituto Brasileiro de Museus-Museu do Ouro de Sabará/Arquivo Casa Borba Gato [MOS/ACBG]. Para uma análise da população negra da Comarca do Rio da Velhas, ver DANTAS, Mariana. Black Townsmen: Urban Slavery and Freedom in the Eighteenth-Century Americas. New York: Palgrade Macmilla, 2008. A discussão que se segue foi organizada em torno de três pontos distintos: as oportunidades de sucesso econômico disponíveis às mulheres de cor e os limites da mobilidade social; os efeitos do processo sucessório na transferência de vantagens sócio-econômicas de uma geração para outra; estratégias usadas por mulheres negras para garantir que a sucessão de bens pudesse se traduzir em vantagens (e ascensão) sociais para seus filhos.

Mobilidade sócio-econômica: possibilidades e limitações

A história de Antônia Rangel de Abreu, mulher parda, nascida escrava no Rio de Janeiro, ilustra bem as dificuldades que mulheres negras enfrentaram nas Minas setecentistas ao buscarem oportunidades econômicas e mobilidade social.10 10 Trabalhos que illustram tais realidades vividas por mulheres afro-descendentes incluem SCARANO, Julita. Cotidiano e Solidariedade: vida diária da gente de cor nas Minas Gerais, século XVIII. São Paulo: Editora Brasiliense, 1994. FIGUEIREDO, Luciano R. A. Figueiredo. Barrocas Famílias: vida familiar em Minas Gerais no século XVIIII. São Paulo: HUCITEC, 1997. PAIVA, Eduardo França. Escravos e libertos nas Minas Gerais do século XVIII : estratégias de resistência através dos testamentos. São Paulo: Editora Annablume, 2000. FARIA, Sheila de Castro. "Mulheres Forra: Riqueza e estigma social." Tempo, Rio de Janeiro, v. 5, n. 9, Julho 2000, p. 65-92. Não é possível determinar quando Antônia obteve a sua alforria; ela foi identificada como forra em seu inventário, mas detalhes sobre sua alforria não foram incluídos. Também não é possível determinar quando Antônia decidiu mudar do Rio de Janeiro para as Minas (ou se ela fora ali levada por seu senhor). Mas sabemos que uma vez em Sabará, ela trabalhou como negra de tabuleiro, constando um tabuleiro, instrumento de seu ofício, listado em seu inventário. Antônia também se tornou proprietária de uma mulher escrava, da qual pode extrair jornais para sustentar-se e de quem obteve mais escravos para aumentar seu patrimônio (os três filhos que aquela tivera). Finalmente, sabemos que Antônia acumulou durante a vida alguns objetos materiais de valor: um manto de seda, fivelas de sapato de prata, e um medalhão de prata. Sabemos também que Antônia morou em Sabará com seu único filho e que após sua morte e feitura de seu inventário, e uma vez que suas dívidas foram pagas, seu filho recebeu uma herança no valor de 113$000 réis.11 11 Inventário de Antônia Rangel de Abreu, Sabará, 14 de maio, 1756, CSO, cx. 18, doc. 07, MOS/ACBG. Em 1756, 113$000 (cento e treze mil) réis era uma quantia insuficiente para comprar um escravo em idade produtiva. Ver BERGAD, Laird. Slavery and the Demographic and Economic History of Minas Gerais, Brazil, 1720-1888. New York: Cambridge University Press, 2000. p. 180.

A ex-escrava Antônia encontrou na atividade da venda ambulante uma maneira de sustentar a si e a seus dependentes. Se ela teve algum envolvimento com um homem branco (fosse seu pai ou um companheiro), este não ofereceu a ela a oportunidade de integrar um grupo social mais privilegiado através do reconhecimento de sua paternidade ou do matrimônio. Seus esforços econômicos, por outro lado, não renderam mais do que o necessário à sobrevivência. Mesmo assim, Antônia representa um grupo bastante visível e economicamente relevante na sociedade colonial mineira: aquele de mulheres vendeiras que contribuíram para sustentar trocas comerciais e distribuição de crédito e espécie na economia mineira.12 12 Para uma definição e discussão da importância econômica das vendas, ver CHAVES, Cláudia Maria das Graças. Perfeitos negociantes: mercadores das Minas setecentistas. São Paulo: Annablume, 1999. p. 59-61. FURTADO, Júnia Ferreira. Homens de negócio: A interiorização da metrópole e do coméricio nas Minas setecentistas. São Paulo: Hucitec, 1999. p. 230-72. PANTOJA, Selma. A Dimensão Atlântica das Quitandeira. In FURTADO, Júnia (org.). Diálogos Oceânicos: Minas Gerais e as novas abordagens para uma história do Império Ultramarino Português. Belo Horizonte: Editora da Universidade Federal de Minas Gerais, 2001. p. 45-67. SILVA, Flávio Marcus da. Susbsistência e poder: a política do abastecimento alimentar nas Minas setecentistas. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2008. p. 156-163. Contudo, as poucas oportunidades econômicas estendidas a elas e a conotação negativa que o trabalho de rua carregava no que concerne à preservação da honra feminina, condenaram mulheres negras a uma posição social inferior a de outros grupos econômicos e sociais e as tornaram vulneráveis ao abuso e distrate na mão de homens brancos.13 13 A conexão entre serviço de rua e honra feminina é um tema bastante explorado na literatura sobre a América espanhola. Ver SOCOLOW, Susan M. The Women of Colonial Latin America. Cambridge: Cambridge University Press, 2000. p. 112-29. GAUDERMAN. Women's Lives in Colonial Quito. MANGAN, Trading Roles. p. 134-60.

De fato, no que concerne à sua atividade de vendeira, Antônia representa uma entre inúmeras mulheres negras que alcançaram uma inserção econômica na sociedade mineira através da participação no comércio local. Já em sua descrição da região mineira publicada em 1711, o padre jesuíta Antonil menciona mulheres escravas vendeiras que, segundo ele, eram empregadas por seus donos na venda de bebidas e comestíveis com o intuito de encorajar escravos e trabalhadores das minas a gastarem o ouro extraído.14 14 ANTONIL, André João. Cultura e opulência do Brasil. Belo Horizonte: Editora Itatiaia, 1982. p. 169-73. Enquanto o comentário de Antonil continha uma forte crítica ao comportamento dessas escravas e de seus donos, o qual via como perniciosos à produção aurífera local, os serviços por elas prestados não se desenvolveram simplesmente por causa da malícia de certos moradores das Minas. Organizando a distribuição de mantimentos e comestíveis e intermediando a troca econômica entre produtores e consumidores de cachaça, farinha, açúcar, toucinho, entre outros produtos, elas atendiam a uma demanda econômica real que surgiu como resultado da povoação daquela região.

O comércio rapidamente se tornou uma das principais atividades econômicas nas Minas, onde a proeminência da indústria extrativa atraiu grande número de investidores e trabalhadores e criou um mercado consumidor interessado em uma gama de produtos necessários para sua sobrevivência pessoal e profissional.15 15 Sobre o abastacimento da capitania mineira, ver ZEMELLA, Mafalda P. O abastecimento da capitania das Minas Gerais no século XVIII. São Paulo: Hucitec, 1990. MENESES, José Newton Coelho. O continente rústico: abastecimento alimentar nas Minas Gerais setecentistas. Diamantina: Editora Maria Fumaça, 2000. CARRARA, Angelo Alves. Minas e currais: produção rural e mercado interno de Minas Gerais, 1674-1807. Juiz de Fora: Editora da Universidade Federal de Juiz de Fora, 2007. SILVA. Subsistência e poder. Consequentemente, já ao final da primeira metade do século XVIII, a maioria dos homens abastados da capitania-listados em uma relação produzida para o Conselho Ultramarino em 1756-estavam envolvidos primordialmente com o comércio ao invés da mineração.16 16 "Relação dos homens abastados das Comarcas de Minas, capitania de Minas Gerais," 24 de julho, 1756, Coleção Arquivo Histórico Ultramarino [AHU], cx. 70, doc. 40, Arquivo Público Mineiro. O rápido crescimento do comércio local também é visível nos documentos relativos à capitação coletada durante a primeira metade do XVIII. No caso da vila de Sabará, onde viveu Antônia Rangel de Abreu, o número de lojas e vendas tributadas entre 1729 e 1750 dobrou. Em Minas Gerais como um todo, o número de vendas subiu de 671 em 1729 para 1,566 em 1750. Para colocar esse número em perspectiva, é útil compará-lo ao número de escravos tributados durante o mesmo intervalo pela capitação: 52,348 em 1729 e 88,251 em 1750. Se considerarmos que o número de escravos registrado nos documentos da capitação representa aproximadamente o crescimento populacional geral em Minas Gerais durante esse período, podemos concluir que as vendas se multiplicaram em uma razão duas vezes maior do que a população local.17 17 BARBOSA, Waldemar de Almeida. Dicionário da terra e da gente de Minas. Belo Horizonte: Publicações do Arquivo Público Mineiro, 1985. p. 84-85. "Mapa geral da capitação do governo de Minas Gerais, capitania de Minas Gerais, 1750, AHU cx. 60, doc. 52, Arquivo Público Mineiro. Esses números sugerem, portanto, que durante a primeira metade do século XVIII havia uma constante, e crescente, demanda pelo serviço de distribuição de produtos prestado por esses agentes econômicos.

Mulheres como Antônio Rangel de Abreu foram em grande parte responsáveis não só pela criação desse tipo de comércio-segundo sugere o comentário de Antonil-mas também pelo crescimento observado no número das vendas existentes e operantes na capitania. No caso da Vila de Sabará vale notar que enquanto o número geral de vendas licenciadas entre 1750 e 1790 aumentou 108 porcento, o número de vendas licenciadas para mulheres escravas aumentou 130 porcento, indicando que escravas tornaram-se vendeiras em Sabará com maior frequência do que outros grupos sociais. Relevante também é o fato de mulheres escravas, as quais constituíam a minoria dos escravos da vila, representarem três quartos dos escravos vendeiros. O emprego de cativos em atividades comerciais, portanto, afetou mulheres escravas em razão desproporcional ao seu número.

Em torno do final do século XVIII e início do século XIX, contudo, escravas perderam sua posição dominante no negócio de vendas em Sabará para mulheres de cor forras e livres. Estas, apesar de representarem somente um terço das mulheres de origem e descendência africana com licença de venda em 1780 (os dois outros terços correspondiam a mulheres escravas), constituíram oitenta porcento das mulheres vendeiras listadas em 1806, segundo documentos da Câmara Municipal de Sabará.18 18 "Aferições de balanças, pesos e medidas", Sabará, 1745-1756, Fundo Câmara Municipal de Sabará, códice 16ª, Arquivo Público Mineiro. "Registro de lojas e vendas", Sabará, 1788-1795, Fundo Câmara Municipal de Sabará, códice 82, Arquivo Público Mineiro. "Lançamento da receita do contrato das afilações e cabeças", Sabará,1806, Fundo Câmara Municipal de Sabará, códice 128, Arquivo Público Mineiro. Assim como Antônia, outras mulheres negras, libertas ou livres, encontraram na atividade de vendeira um meio para obterem as condições econômicas para se sustentarem, aproveitando-se da contínua demanda local por comestíveis e outros produtos que precisavam ser distribuídos pelas diferentes vilas, arraiais, e áreas mineradoras da capitania.

Participação no comércio local, porém, não estava livre de certos estigmas, e mulheres afro-descendentes como Antônia tiveram que lidar com as consequências negativas de estarem expostas ao trabalho de rua e a parceiros comerciais econômico e socialmente mais influentes e poderosos do que elas. Como mostra o estudo de Luciano Figueiredo, O Avesso da Memória, o trabalho como vendeira gerou suspeitas que essas mulheres estavam se prostituindo para conseguirem acumular os jornais demandados por seus donos ou mesmo para se sustentarem. A suspeita de que elas também facilitavam encontros e festas de escravos, os quais causavam desordem e escândalos, gerou uma imagem da mulher vendeira como sendo ela mesma desordeira e predisposta a exibir um comportamento escandaloso.19 19 FIGUEIREDO, O Avesso da Memória, Appendix 1, p. 205-14. Maria Odila Silva Dias também encontrou evidências que semelhantes suspeitas e reclamações afetaram vendeiras em São Paulo nos séculos XVIII e XIX. DIAS, Maria Odila Silva. Quotidiano e Poder em São Paulo no século XIX. São Paulo: Editora Brasiliense, 1995. p. 70-85.

A associação entre o trabalho de rua e a falta de honra feminina aparece bem estabelecida nos inventários de Sabará. Vários dentre esses documentos incluiram declarações feitas pelos tutores de órfãos a respeito do estado em que se encontravam herdeiros menores que se achavam sob sua guarda. Invariavelmente, tutores de órfãs se preocuparam em informar ao juiz se suas tuteladas estava vivendo com discrição e honrosamente, o que envolvia permanecerem reclusas em casa, aprendendo os ofícios próprios do seu sexo (fiar, tecer, coser). No caso das filhas de José de Freitas Costa, homem branco e pobre que morou próximo à vila de Sabará, encontramos o tutor expressando sua discordância com o juiz de órfãos que lhe ordenou a empregar as duas meninas em casa alheia para que pudessem ganhar o seu sustento. Observando que na colônia serviçais eram comumente empregadas tanto em serviços de casa quanto de rua, o tutor argumentou que aquela ordem colocaria em risco a honra das meninas. Ele acrescentou que sendo suas tuteladas brancas e com direito a alguma herança, não deveriam ser forçadas a exporem-se à rua, "o que facilitaria a perda de sua honra, a jóia mais preciosa do sexo feminino."20 20 Inventário de José de Freitas Costa, Sabará, 11 de junho, 1778, CSO cx. 46, doc. 06, MOS/ACBG.

A conotação negativa do trabalho de rua não somente levantou dúvidas sobre a honra de vendeiras-assim como de outras mulheres de ascendência africana expostas à rua por causa do trabalho-mas justificou o tratamento abusivo dessas por parte de homens brancos. Quando os "homens e mulheres crioulos, pretos, e mestiços dessas Minas" apresentaram em 1755 uma petição ao rei através do Conselho Ultramarino para que esse nomeasse "um procurador para os defender das violências de que são vítimas", eles listaram os abusos sofridos por essas mulheres nas mãos de clientes e parceiros comerciais brancos. Em particular, eles chamaram atenção para o caso de Maria de Assumpção, uma crioula forra moradora de Sabará, que fora erroneamente acusada de desonestidade por um pretendente vingativo e injustamente punida com 200 chibatadas no pelourinho daquela vila.21 21 Crioulo(a) foi um termo utlizado nas Minas coloniais para se referir a indivíduos descendentes de africanos mas nascidos na colônia. Para uma discussão dos termos usados em Minas Gerais para identificar cor e descendência, ver LIBBY, Douglas. A empiria e as cores: representações identitárias nas Minas Gerais dos séculos XVIII e XIX. In PAIVA, Eduardo França; Isnara Pereira Ivo; Ilton Cesar Martins (org). Escravidão, mestiçagens, populações e identidades culturais. São Paulo: Annablume, 2010. p. 41-62. O outro exemplo foi o de Izabel Gouvea, também injustamente acusada e também punida violentamente por ter recusado a um poderoso local o direito de se relacionar sexualmente com suas filhas solteiras. Mulheres como Maria e Izabel, e por extensão suas filhas, sofreram tratamento abusivo nas mãos de outros por serem negadas, em razão de sua ascendência africana, cor de pele, e atividade econômica (o trabalho de rua), a proteção que essa sociedade, fortemente marcada por noções patriarcais e raciais de direitos e privilégios, reservava às mulheres brancas. Finalmente, o exemplo do abuso sofrido por Maria Cardim, descrita como mulher honesta, rica, e preta, demonstra ainda que o sucesso econômico não garantiu às mulheres negras e de cor o reconhecimento de sua igualdade social em relação às mulheres brancas, colocando assim em relevo os limites da mobilidade social alcançada por elas.22 22 "Requerimento dos crioulos pretos das minas da Vila Real de Sabará, Vila Rica, Serro do Frio, São José e São João pedindo que se lhes nomeie um procurador para os defender das violências de que são vítimas, capitania de Minas Gerais", 14 de outubro, 1755, AHU, cx. 68, doc. 66, Arquivo Público Mineiro.

Sucessão de bens e mobilidade geracional

A realidade colonial e as restrições sofridas por mulheres negras inspirou algumas a tentar, através da sucessão de bens e interações com o juizado dos órfãos, melhorar as oportunidades de mobilidade social disponíveis à geração subsequente. Os esforços feito por Ana Pereira, africana forra, e por sua escrava Maria Pereira para oferecer uma situação sócio-econômica mais vantajosa à Ana-filha de Maria e escrava e afilhada de Ana Pereira-ilustra bem tais tentativas. Como no caso de Antônia Rangel, descrito acima, Ana Pereira aparenta ter ganhado a vida como vendeira; as 43 panelas e 12 frigideiras listadas no seu inventário sugerem a produção de alimentos para o mercado local.23 23 Inventário de Ana Pereira, Sabará, 5 de outubro 1774, CSO, cx. 38, doc. 07, MOS/ACBG. Diferente de Antônia, porém, Ana Pereira parece ter sido mais bem sucedida, sendo proprietária de uma casa em Sabará, três escravos adultos, e vários itens pessoais. Também diferente de Antônia, Ana Pereira, assim como muitas mulheres africanas do Brasil colonial, morreu sem filhos e, portanto, sem herdeiros necessários.24 24 Segundo as leis sucessórias portuguesas, os descendentes diretos do indivíduo falecido eram os seus herdeiros forçados e, na falta destes, o eram seus ascendentes diretos. Código Philippino, ou Ordenaçoões e Leis do Reino de Portugal. Livro 1, título LXXXVIII. Rio de Janeiro: Cândido Mendes de Almeida, 1870; Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1985. p. 206-15. Para uma discussão das leis e práticas sucessórias no Brazil colonial, ver METCALF, Alida. Family and Frontier in Colonial Brazil: Santana do Paraíba, 1580-1822. Berkeley: University of California Press, 1992. p. 95-100; SILVA, Maria Beatriz Nizza da. História da Família no Brasil Colonial. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 1998. LEWIN, Linda. Surprise Heirs I: Illegitimacy, Patrimonial Rights, and Legal Nationalism in Luso-Brazilian Inheritance, 1750-1821. Stanford, CA: Stanford University Press, 2003. p. 19-39. Tendo falecido em 1774, alguns anos após a proibição da prática de deixar a alma como herdeira (prática essa que beneficiava desmedidamente a igreja), Ana Pereira se viu limitada a duas opções: deixar o estado desfrutar de seu patrimônio ou nomear em testamento um herdeiro.25 25 Até 1769, testadores tinham a opção de deixar a alma como herdeira, uma decisão que efetivamente tornava a igreja herdeira de seus bens. As reformas pombalinas trouxeram um fim a essa prática com a lei de 1769, que autorizava o estado a manter e leiloar os bens de defuntos sem herdeiros forçados ou nomeados. Código Philippino. Livro 4, Lei de 9 de Setembro de 1769, p. 1057-61. Ver também LEWIN. Surprise Heirs. p. 34-37. Ela optou por nomear a crioula Ana, filha de sua escrava africana Maria, como sua herdeira universal, concedendo à então menina (alforriada no testamento) o direito de receber um patrimônio no valor de mais de 500$000 réis.

Graças à decisão da testadora Ana Pereira, a herdeira Ana passou da condição de escrava à de liberta e proprietária de bens. Mas sua transição para uma posição social mais privilegiada não se deu de forma tranquila. Como fora o caso em tantos processos sucessórios envolvendo libertos, os interesses de herdeiros foi ameaçado pela sua impossibilidade de contar com familiares livres e de posição social privilegiada que fossem capazes de se ocupar das últimas vontades do morto.26 26 Em outros trabalhos eu exploro em maior detalhes os problemas sofridos por afro-descendentes ao long do processo sucessório. Ver DANTAS, Mariana L. R. Inheritance Practices among Individuals of African Origin and Descent in Eighteenth-Century Minas Gerais, Brazil. In KLEIJWEGT, Marc (org.) The Faces of Freedom: The Manumission and Emancipation of Slaves in Old World and New World Slavery. Leiden: Brill, 2006. p. 153-81; DANTAS. Succession of Property, 222-238. No caso da crioula Ana, esta se viu entregue aos cuidados de um tutor que, segundo a mãe, não somente mal administrava sua herança, correndo o risco de perdê-la, mas também levara a herdeira para viver em sua casa onde ele vivia ilicitamente com sua concubina. Ao apelar para o juízo dos órfãos para remover o tutor e nomear outro, Maria, a mãe de Ana, quiz proteger a nova posição econômica da filha. Ela também quis evitar que Ana perdesse a reputação de honrosa, a qual, juntamente com a herança que recebera, lhe permitiriam obter um bom casamento e solidificar seu novo status social. Maria certamente temia que o comportamento irresponsável e escandaloso do tutor ameaçaria a oportunidade oferecida a sua filha de avançar socialmente.

Através de sua intervenção, Maria conseguiu que o juiz de órfãos nomeasse outro tutor. Alguns anos depois Ana, já casada com José Telles da Silva, um crioulo forro, foi emancipada pelo juízo dos órfãos e declarou ter recebido a herança deixada por Ana Peireira. Graças à decisão de sua antiga senhora, e à interferência de sua mãe no processo sucessório, Ana se tornou proprietária de bens e alcançou uma posição social superior à que tinha enquanto escrava. Seu casamento com José, contudo, demonstra que apesar de ela ter gozado de alguma mobilidade social, sua nova rede social não incluíra indivíduos com posição socio-raciail muito diferente da sua.

O caso de Ana Peixoto e suas agregadas revela, portanto, os benefícios que a sucessão de bens poderiam proporcionar a escravos e seus descendentes, e também o uso que algumas mulheres de origem e descendência africana fizeram desse instrumento para oferecer a uma segunda geração a oportunidade de adquirir uma melhor posição social. Mas, por outro lado, esse caso demonstra também as dificuldades que o próprio processo sucessório criou para alguns herdeiros. Como aconteceu com a herdeira Ana, outros herdeiros negros em Sabará tiveram que lidar com a incompetência ou falta de dedicação de tutores nomeados para se ocuparem do bem-estar dos órfãos. Escolhidos muitas vezes por serem homens de posse, ou homens brancos e que, portanto, eram considerados de qualidade, alguns tutores de herdeiros negros não tinham qualquer relação de parentesco com seus tutelados, o que encorajou a negligência.27 27 Código Phillipino. Livro 4, título CII. Alguns ainda usaram a nomeação para beneficiarem-se da herança que passariam a administrar. Esse parece ter sido o caso do tutor de Manuel Martins. Neto de Josefa Martins Penna, crioula forra, Manuel passou a ser o herdeiro de sua avó após a morte de sua mãe, filha de Josefa. Como herdeiro ele teve o direito a uma herança no valor de 129$874 réis (o preço de um escravo adulto). Mas sendo menor idade, Manuel e sua herança ficaram sob os cuidados do tutor nomeado João Soares Ribeiro. Seis anos após a feitura do inventário Manuel apresentou petição ao juízo dos órfãos requerendo um novo tutor por suspeitar que João estivesse dissipando sua herança. O juízo agiu imediatamente, e nomeou um novo tutor. Mas aparentemente a ação do juiz não foi suficiente para salvar a herança de Manuel. A documentação relacionada ao inventário de sua avó não indica se Manuel tomou posse de seus bens.28 28 Inventário de Josefa Martins Penna, 14 de Janeiro, 1785, CSO cx. 60, doc. 447, MOS/ACBG.

A nomeação de um tutor era parte corriqueira do processo de sucessão em casos onde haviam órfãos menores de 25 anos (considerados legalmente dependentes) e estava prevista pelas Ordenações Filipinas. O propósito do tutor era administrar a herança dos órfãos na ausência do pai, ou pais, e prover-lhes com uma educação condizente com sua qualidade (nobre, proprietário, artesão, ou trabalhador manual).29 29 Código Phillipino. Livro 1, título LXXXVIII, § 13-21, 211-13. Livro de Provimento dos Órfãos. p. 15v-16. MOS/ACBG. De acordo com leis portuguesas, a idéia de qualidade se baseou na noção de linhagem e ascendência nobre ou plebéia. No contexto colonial, tais noções também incorporaram ascendência escrava ou africana. Para uma discussão da noção de qualidade e suas implicações sociais, ver DANTAS, Mariana. Humble Slaves and Loyal Vassals: Free Africans and Their Descendants in Eighteenth-century Minas Gerais, Brazil. InFISHER, Andrew B.; Matthew O'Hara (org.). Imperial Subjects: Race and Identity in Colonial Latin America. Durham, NC: Duke University Press, 2009. p. 115-40. Ver também na mesma coletânea TWINAM, Ann. Purchasing Whiteness: Conversations on the Essence of Pardo-ness old Mulatto-ness at the End of Empire. p. 141-66. Quando o processo sucessório envolvia famílias constituídas a partir de uniões formalizadas pelo matrimônio, o mais comum era o cônjuge sobrevivente assumir a tutela dos filhos. No caso desse ser o pai, a tutela legal dos filhos lhe era passada automaticamente; já no caso de ser a mãe, esta tinha que comprovar que vivia honestamente e em estado de solteira através de justificação apresentada ao rei contendo declarações providas por testemunhas fidedignas.30 30 Código Filipino. Livro 1, título LXXXVIII, § 6, p. 209; e Código Philippino. Livro 4, título CII, p. 994-1004. A possibilidade de contar com a mãe como tutora era, consequentemente, quase nula no caso de filhos naturais de mulheres de cor, e rara até mesmo no caso de famílias formais racialmente mistas.31 31 Dentre 21 petições encontradas para vila de Sabará onde viúvas requereram a tutela dos filhos, somente duas envolveram mulheres afro-descendentes e ambas eram pardas. Luiza de Souza de Oliveira, 30 de outubro, 1778, AHU cx. 113, doc. 58, Arquivo Público Mineiro; e Maria Rodrigues da Cruz, 24 de setembro, 1784, AHU cx.122, doc. 27, Arquivo Público Mineiro. Essas mulheres tinham mais dificuldade em provar que viviam honestamente (ou não tinham como fazê-lo se haviam se unido ilicitamente ao pai de seus filhos) e eram comumente negadas o direito à tutela dos filhos. Nesses casos, o cuidado com os herdeiros era passado às mãos de um parente próximo ou membro da comunidade; mas em vários casos o primeiro candidato disponível era nomeado tutor. O mesmo acontecia no caso de filhos de uniões informais ou ilícitas quando a mãe morria e o pai era desconhecido ou ausente. Vários inventários indicam que as ações do tutor, reveladas através dos autos de contas que estes tinham que prestar ao juízo de órfãos, beneficiaram os herdeiros e lhes garantiram uma melhor herança, uma educação vantajosa, ou um bom casamento. Porém, os exemplos onde tutores dissiparam a herança dos órfãos sob sua guarda ou negligenciaram sua educação ou formação profissional são igualmente comuns.

As dificuldades enfrentadas durante o processo sucessório por herdeiros descendentes de mulheres africanas não se limitaram, porém, a possíveis disputas com tutores. Outras circunstâncias ameaçaram a integridade da herança e futuro desses indivíduos com relativa frequência. A principal delas foi a necessidade de pagar as dívidas pendentes do defunto após a feitura do inventário e antes da partilha dos bens.32 32 Era prática comum na vila de Sabará alocar durante a partilha de bens parte dos bens do defunto para o pagamento de dívidas. Outra prática comum era a apresentação por parte de credores de petições requerendo pagamento por dívidas ainda ativas. Ambas as práticas resultaram na transferência de bens a credores sem que a família pudesse administrar tais pagamentos. Para outras discussões do impacto de dívidas no processo sucessório, ver METCALF, Alida C. Fathers and Sons: the politics of inheritance in a colonial Brazilian township. Hispanic American Historical Review, Durham, v. 66, n. 3, p. 455-84, Agosto de 1986; FARIA, Sheila de Castro. A Colônia em Movimento: Fortuna e Família no Cotidiano Colonial. Rio de Janeiro, Brazil: Editora Nova Fronteira, 1998. p. 263-65. Em alguns casos, quando as dívidas se aproximaram ou mesmo ultrapassaram o valor do patrimônio deixado pelo morto, essa prática resultou na perda da herança e meios de sobrevivência dos herdeiros, afetando não somente sua situação econômica e material mas também a possibilidade de ascensão social.33 33 Dentre os 112 inventários consultados para esse estudo que incluíram herdeiros de descendência africana, 35 mencionam dívidas pagas com parte dos bens do defunto e 12 revelam a perda total do monte-mor por causa do pagamento de dívidas. Inventários do Cartório do Segundo Ofício, caixas 12-69, MOS/ACBG.

Por exemplo, Quitéria da Conceição, mulher parda e esposa de João Pinto Pereira, se viu sob a ameaça de perder o patrimônio que ela e o marido construíram quando este faleceu em 1770. Donos de uma roça de milho e doze escravos entre crianças e adultos, o casal devia a uma longa lista de credores. Quando o inventário foi feito e a partilha de bens determinada pelo juízo dos órfãos, o juiz ordenou que grande parte dos bens fossem vendidos para pagar as dívidas pendentes. Quitéria, mãe de cinco filhos e grávida de um sexto, apresentou petição requerindo que a venda fosse cancelada pois, sem os bens que haviam sido do casal, ela não poderia sustentar a família. O juiz e o curador nomeado para avaliar o seu caso concordaram com ela. De posse dos bens, ela continuou a administrar a sua roça e oito anos mais tarde, já com duas filhas casadas e seus escravos em idade mais produtiva, ela vendeu sete escravos para pagar as dívidas.34 34 Inventário de João Pinto Pereira, 7 de Agosto, 1770, CSO cx. 32, doc. 262, MOS/ACBG.

A história de Quitéria mostra que não foi somente o pagamento de dívidas que ameaçou prejudicar o bem-estar social e econômico de herdeiros de mulheres de cor; o processo de partilha de bens, previsto por lei e normalmente praticado pelo juízo de órfãos, também criou complicações. Em particular, a exigência de que bens sob risco de depreciação, tais como animais, alguns bens pessoais, e escravos fossem vendidos em praça pública e seu valor depositado no cofre do juízo dos órfãos para ser emprestado a juros (e assim gerar rendimentos), podia resultar na perda dos recursos necessários à sobrevivência da família.35 35 Código Philippino. Livro 1. Título LXXXVIII. p. 206-15.

Vitória Moreira, mulher parda e forra, se viu diante dessa exata situação quando, após a morte do marido Antônio de Morais, o juiz de órfãos ordenou a venda do patrimônio do casal para disponibilizar para o filhos já emancipados o valor de sua herança. Apesar de pequeno, o patrimônio, que incluía alguns escravos, uma casa, uma venda, além de tachos e outros instrumentos para preparar doces, era essencial à sobrevivência da família e dos herdeiros mais novos. Vitória apelou a decisão do juiz e pediu a preservação da integridade dos bens para que pudesse continuar mantendo e cuidando dos filhos. Ela teve seu pedido aceito e a ordem revogada.36 36 Inventário de Antônio de Morais, 25 de fevereiro, 1773, CSO cx. 38, doc. 291, MOS/ACBG. Outras famílias, contudo, não tiveram a mesma sorte.

Filhos naturais de homens brancos e mulheres de cor, nascidos da união informal ou ilícita dos pais, enfrentaram às vezes uma maior vulnerabilidade no momento da sucessão de bens. Nesses casos, a mãe, por não ter um papel legalmente reconhecido no processo sucessório, nem sempre pode defender os interesses dos filhos como fizeram Quitéria ou Vitória. Foi possivelmente essa a situação na qual os filhos de José Pinto de Araújo, proprietário de terras e homem branco, se encontraram após a morte do pai em 1758. Araújo havia reconhecido em seu testamento os dois filhos pardos, José e Manuel, e os nomeado herdeiros de suas terras, escravos, e demais possessões. Mas não sendo casado com a mãe destes, esta, se ainda viva, não pode intervir junto ao juiz para garantir que o patrimônio da família, que passou a pertencer a seus filhos, fosse protegido das demandas de credores. Quando o inventário de Araújo foi feito o juízo dos órfãos determinou que as dívidas do defunto eram maiores do que o monte-mor (o valor total dos bens inventariados). Os bens que teriam sido de José e Manuel foram reivindicados pelos credores de seu pai e não houve quem pudesse interviu para proteger os órfãos e lhes garantir o acesso ao patrimônio da família. Tendo vislumbrado a oportunidade de tornarem-se donos de terras e escravos, os herdeiros foram no entanto encaminhados por seu tutor a ofícios mais ajustados à sua "qualidade": José passou a trabalhar na roça enquanto Manuel se tornou aprendiz de ferreiro.37 37 Inventário de José Pinto de Araújo, 5 de Julho, 1758, CSO (19)165, MOS/ACBG.

A leitura e análise dos inventários setecentistas de Sabará revelam diversas maneiras em que o processo sucessório causou aos descendentes de mulheres negras a perda da promessa de ascensão social contida no sucesso econômico dos pais. Vários foram os fatores capazes de prejudicar a transmissão de bens de uma geração à outra: a negligência de um tutor, a avidez de credores demandando o pagamento imediato de dívidas pendentes, a interferência do juízo de órfãos na organização e execução da sucessão. Tais fatores exacerbaram a possibilidade de herdeiros de cor perderem acesso a bens que poderiam lhes garantir uma melhor situação econômica, uma ocupação mais distinta que lhes concedesse reconhecimento de uma qualidade superior à dos pais, ou um casamento que lhes permitisse participar de diferentes e mais elevadas redes de sociabilidade. Algumas mulheres negras se armaram, porém, de recursos legais para minimizar o impacto negativo que o processo sucessório poderia ter sobre as futuras oportunidades sócio-econômicas dos filhos. Apropriando-se da noção da honra feminina ou da fragilidade financeira de herdeiros órfãos, e munindo-se do direito de intervir enquanto mães em benefício dos filhos, mulheres de origem ou descendência africana como Maria, Quitéria, e Vitória se esforçaram para assegurar à próxima geração uma melhor posição na sociedade colonial mineira.38 38 Estudos sobre as ações legais de mães afro-descendentes tendem a focar o final do século XIX, quando a lei do ventre livre lhes permitiu intervir legalmente com mais sucesso em benefício da liberdade dos filhos. ABREU, Marta. Escravas e Filhos Libertos: novas perspectivas em torno da Lei do Ventre Livre, Rio de Janeiro, 1871. In RIZZINI, Irene (org.) Olhares sobre a criança no Brasil: século XIX e XX. Rio de Janeiro: USU Editora Universitári, Amais, 1997. COWLING, Camillia. Conceiving Freedom: women of color, gender, and the abolition of slavery in Havana and Rio de Janeiro. Chapel Hill: University of North Carolina Press, 2013. Mas como mostra o presente trabalho, o período colonial contém também importantes exemplos do esforço que essas mulheres fizeram para defender os interesses dos filhos nos juízos coloniais.

Estratégias sucessórias de mulheres afro-descendentes

A incerteza que marcou o processo sucessório no período colonial levou algumas mulheres africanas e afro-descendentes a adotarem estratégias de sucessão que visaram evitar certos procedimentos legais e, assim, garantir aos filhos a posse de seus bens. Esse foi o caso de Thomázia de Souza Teles. Africana forra e mãe de quatro filhos naturais, Thomázia, que havia acumulado durante a vida casa, escravos, e diferentes bens pessoais, morreu ciente das dificuldades que seus filhos enfrentariam para preservar e expandir quaisquer vantagens econômicas ou sociais que ela lhes havia oferecido. Consequentemente, ela não se limitou a deixar-lhes uma boa herança e nem se resignou a confiar no juízo de órfãos para organizar a sucessão de seus bens, mas esforçou-se para interferir no processo sucessório de maneira a garantir o futuro dos filhos. Primeiramente, ela vendeu quatro escravos homens ao filho mais velho. Dessa maneira, ela garantiu-lhe o status de proprietário de escravos e a oportunidade de ganhar a vida através dos jornais de seus escravos sem sofrer a necessidade de assumir um ofício que rebaixasse sua qualidade à de trabalhador manual, como foi o caso com outros descendentes de mulheres negras em Sabará. Ciente das questões legais que afetavam vendas entre vivos (em particular, a prática comum adotada pelo juízo de órfãos de anular tais vendas quando existiam outros herdeiros), ela deixou registrada em cartório uma petição onde assegurava aos oficiais do juízo que a venda fora feita com o consentimento dos demais herdeiros e, assim, era legal e correta.39 39 Inventário de Thomázia de Souza Telles, Sabará, 4 de maio, 1778, CSO, cx. 49, doc. 368, MOS/ACBG. Durante o período de 1750 a 1799, examinado neste estudo, em torno de um quarto dos inventários consultados incluíram venda inter-vivos. A prática de planejar a transmissão de bens através de vendas e o uso dessa estratégia para evitar procedimentos jurídicos também foi observado em outros contextos históricos. Ver GOODY, Jack. The Development of Family and Marriage in Europe. Cambridge, UK: Cambridge University Press, 1983. p. 21.

À sua filha mais velha, por sua vez, Thomázia ofereceu um dote composto de três escravos (incluindo um homem) e uma casa. Dessa forma, garantiu à filha a posse de bens avaliados a uma quantia superior ao valor de aproximadamente um terço dos inventários de pessoas de cor registrados em Sabará nesse período, assim como a perspectiva de contratar um bom casamento.40 40 O valor médio dos bens de inventariados afro-descendentes na vila de Sabará durante a segunda metade do século XVIII foi 700$000 réis. Thomázia também proporcionou à filha a oportunidade de viver como mulher casada e de posses e de evitar ocupações que lhe expusesse ao trabalho de rua. Finalmente, Thomázia conseguiu para a filha mais nova, Bibiana, de dezesseis anos, um lugar no Recolhimento de Macaúbas, oferecendo àquela instituição um dote (sobre o qual, infelizmente, não consta maiores informações no seu inventário).41 41 Macaúbas, apesar de não ser um convento propriamente dito (não oferecendo a opção de tomar votos solenes às suas recolhidas), serviu de refúgio para órfãs, filhas, e viúvas de alguma posse cujas famílias queriam garantir-lhes uma vida recatada e proteger sua honra. Ver ALGRANTI, Leila M. Honradas e devotas: mulheres da colônia-condição feminina nos conventos e recolhimentos do Sudeste do Brasil, 1750-1822. Rio de Janeiro: Editora José Olympio, 1993. ALMEIDA, Suely Creusa Cordeiro de. Um Lugar para Marias, Evas, e Madalenas: Entre Pernambuco e Portugal, recolhimentos femininos como lugar de inserção social. Portuguese Studies Review, vol. 144, no. 1, p. 205-230. 2006. MYSCOFSKI, Carole. Amazons, Wives, Nuns, and Witches: women and the Catholic church in colonial Brazil, 1500-1822. Austin: University of Texas Press, 2013. Uma carta de alforria, na qual Bibiana, ainda residente em Macaúbas, declarou sua intenção de libertar sua escrava Feliciana indica que a segunda filha de Thomázia, apesar de reclusa, também era proprietária de escravos como os irmãos.42 42 Carta de Alforria de Feliciana, crioula, 16 de setembro, 1808, Livro de Registro de Notas do Cartório do Segundo Ofício, L89, MOS/ACBG. Thomázia assim garantiu às duas filhas uma posição social, quer de casada ou de recolhida, reconhecida naquela sociedade como digna e honrosa. Apesar de não poder controlar se ambas, assim como os filhos, seriam identificados socialmente a partir da cor e descendência africana, seus esforços lhes ofereceram a oportunidade de serem reconhecidos como pessoas de posse e de honra e, assim, de desfrutarem dos privilégios que naquela sociedade colonial demandaram essas marcas de distinção.

Semelhante ao inventário de Thomázia, testamentos desse período revelam o esforço que mães de origem e descendência africana fizeram para evitar que práticas institucionais e barreiras sociais determinassem o futuro dos filhos. De fato, testamentos constituíram um importante instrumento legal para o controle por parte dos pais da distribuição de patrimônio aos filhos, uma vez que leis sucessórias portuguesas limitaram significativamente a autonomia destes no momento da sucessão de bens. No caso de indivíduos casados, por exemplo, somente metade do patrimônio do casal constituía o legado do cônjuge falecido. Dessa metade, um terço poderia ser distribuído de acordo com as preferências do morto caso sua vontade estivesse declarada em testamento; os dois terços restantes deveriam ser divididos igualmente entre os herdeiros. Na falta de testamento, a metade dos bens do casal pertencente ao cônjuge defunto deveria ser dividida igualmente entre os herdeiros. Nesse caso, porém, um terço do terço (a tercinha, como era chamada) poderia ser usado para cobrir despesas funerárias ou doações pias em benefício da alma do morto. No caso de indivíduos solteiros, o patrimônio cabia todo aos herdeiros, podendo a terça ser usada para cumprir legados pios e seculares estipulados em testamento e, na falta deste, a tercinha usada para cobrir despesas funerárias.43 43 Código Philippino, Livro 4, título XLVI, 832-35; Código Philippino, Livro 4, título XCV, 949-54; Código Philippino, Livro 4, título XCVI, 954-68. Consequentemente, somente através da feitura do testamento é que pais poderiam exercer maior controle sobre a forma pela qual seu patrimônio beneficiaria seus descendentes. Utilizando-se desse recurso legal, algumas mulheres negras usaram a terça para garantir que um filho mais velho herdasse bens que lhe permitisse manter a produtividade do patrimônio e cuidar da educação dos irmãos, ou que uma filha contasse com um dote suficientemente atraente para contratar um casamento proveitoso.44 44 DANTAS. Inheritance Practices. p. 174.

O dote e outras doações feitas entre vivos antes mesmo da feitura do testamento em preparo para a morte representam uma outra estratégia encontrada na documentação relativa a mulheres negras e que sugere o esforço de controlar o processo sucessório. Os livros de notas dos cartórios de Sabará incluem vários registros desse tipo de transação. Por exemplo, em 1782 Maria de Jesus, africana forra moradora em Matozinhos, registrou uma escritura de doação de uma casa situada em Itabira a sua neta Jerónima Antônia da Silva, identificado como mulher parda. Ela explica no documento que a doação era uma remuneração pelo bom tratamento que ela havia recebido da neta e pelas despesas que esta tivera consigo durante suas enfermidades.45 45 Escritura de doação que faz Maria de Jesus preta forra a sua neta Jerónima Antônia, 17 de setembro, 1782, Livro de Registro de Notas do Cartório do Primeiro Ofício 24(74), MOS/ACBG. Como já foi mencionado, dívidas podiam causar enorme prejuízo à herança de pessoas de cor; enfermidades, por sua vez, foram uma das principais causas de dívidas.46 46 Um tratamento comumente recomendado contra doenças coloniais era uma dieta rica em carne, particularmente galinha, normalmente não adotada por famílias pobres e afro-descendentes por causa dos custos altos. RIBEIRO, Márcia Moisés, A ciência dos trópicos: a arte médica no Brasil do século XVIII. São Paulo: Editora Hucitec, 1997. GURGEL, Cristina. Doenças e curas: o Brasil nos primeiros séculos. São Paulo: Ed. Contexto, 2008. ALMEIDA, Carla B. S. Medicina mestiça: saberes e práticas curativas nas minas setecentistas. São Paulo: Annablume, 2010. É possível que através dessa escritura de doação Maria tivesse tentado garantir à neta o direito de desfrutar de bens que ela havia acumulado durante a vida, evitando os riscos de perda que o processo legal de sucessão de bens imporia àquela herança. Já no caso de Josefa de Souza Freira, crioula forra moradora em Sabará, sua decisão de transferir a posse de sua casa para a filha mais velha, e já casada, garantiu não somente o bem-estar da filha mas certa estabilidade para os demais filhos ainda não emancipados: segundo o inventário de Josefa, feito após a sua morte (pouco depois da doação ser feita), seus filhos menores continuaram morando com a irmã e cunhado, recebendo deles os devidos cuidados e educação.47 47 Inventário de Josefa de Souza Freire, Sabará, 10 de julho, 1770, CSO, cx 29, doc. 06, MOS/ACBG.

Finalmente, a venda entre vivos, como a feita entre Thomázia e seu filho mais velho, aparece em diversos inventários setecentistas da vila de Sabará como uma alternativa ao processo de sucessão de bens administrado pelo juízo de órfãos.48 48 Dentre os 350 inventários consultados para este estudo, dezenove (ou 5.5 porcento) envolveram venda de bens entre membros de uma mesma família. Inventários do Cartório do Segundo Ofício, caixas 12-69, MOS/ACBG. A venda proporcionava uma vantagem a mais em relação às doações ou dotes uma vez que, segundo as Ordenações Filipinas, herdeiros que haviam recebido doação ou dote deveriam, após a morte do pai ou da mãe, retornar aquela quantia ao monte-mor para garantir a sucessão igualitária nos bens dos pais. A análise de inventários produzidos em Sabará demonstra que, de fato, essa transação foi efetuada em alguns casos, sem maiores consequências quando a doação era de valor inferior ou igual à herança, mas resultando no possível confisco de propriedade quando a doação era de valor superior. Já no caso das vendas, a lei requeria somente declaração dos demais filhos dizendo que eles não se sentiam prejudicados para que esta não causasse maiores complicações para o filho ou filha beneficiado.49 49 Código Philippino. Livro 4. Título VII. p. 791-93. Foi por essa razão que Thomázia deixou preparada semelhante declaração, garantindo assim que a posse de seus escravos pelo filho mais velho não seria contestada.

O uso de vendas para controlar o processo sucessório não se limitou, contudo, a pais e filhos. No caso de Ana Maria Lopes de Brito e seu marido Jacob Lopes de Brito, ambos africanos forros, o casal optou pela venda da meação (metade dos bens comuns do casal) como estratégia para evitar que o processo sucessório prejudicasse a estabilidade do patrimônio da família. Poucos dias antes de morrer, Ana Maria fez venda da sua meação a Jacob. Consequentemente, o inventário de seus bens listou somente o termo de venda contratado entre os dois; seus sete filhos, por sua vez, herdaram parcelas do pagamento da venda que seu pai passou a dever a eles.50 50 Inventário de Ana Maria Lopes de Brito, 31 de Janeiro, 1760, CSO cx 10, doc. 10, MOS/ACBG. Donos de poucas posses, incluindo uma casa modesta em Sabará e dois escravos adultos, Ana e Jacob haviam contudo conseguido alcançar a sua alforria e garantir aos filhos a liberdade. Seus esforços lhes asseguraram certa mobilidade social, uma vez que de escravos eles se tornaram proprietários e pais de filhos livres. Mas a possibilidade de continuar sustentando os filhos após a morte de um dos esposos, e de eventualmente transmitir seu patrimônio, mesmo que pequeno, à geração seguinte, dependeria da maneira pela qual a sucessão de seus bens ocorreria. Este processo determinaria de certa forma a chance que seus filhos teriam de construir uma melhor posição sócio-econômica a partir da fundação estabelecida por seus pais. A venda de meação, nesse caso, permitiu a Jacob exercer total controle sobre os bens do casal após o falecimento de Ana Maria e, aos seus filhos, a continuar expandindo o patrimônio familiar sem a interferência de credores ou juízes.51 51 Para uma análise mais detalhada da prática da venda de meação, ver DANTAS. Inheritance Practices. DANTAS. "Succession of Property".

Um outro caso de venda que merece ser relatado envolveu Custódio Rabelo, homem branco e senhor de propriedades rurais e escravos, e sua concubina Ana Rabelo, crioula forra e mãe dos nove filhos menores de Custódio. Pouco antes de morrer, Custódio vendeu todos os seus bens a Ana e assim, quando seu inventário foi feito, o único bem a ser declarado foi a escritura de venda entre os dois. Ana se tornou proprietária de todos os bens do defunto. Mas talvez mais importante para o bem-estar de seus filhos, ela também passou a administrar a herança que um dia seria deles.52 52 Inventário de Custádio Rabelo, 23 de março, 1787, CSO cx. 63, doc. 470, MOS/ACBG. Como mencionei acima, mães nessa sociedade tinham que tolerar certos procedimentos legais para poderem ocupar-se dos filhos após a morte do marido ou companheiro. Porém, no caso de Ana, a possibilidade de se tornar tutora de seus filhos e administradora de seus bens era nula, pois ela não satisfazia os requerimentos exigidos pela lei: era crioula e concubina e não podia provar viver uma vida correta e honrosa. A venda que ela orquestrou com Custódio, portanto, lhe permitiu contornar as restrições da lei e os limites que aquela sociedade e cultura legal impunham a suas ações e prerrogativas como mãe. Seus filhos, por sua vez, poderiam crescer como proprietários de bens e, possivelmente, livres da influência de algum tutor que tentasse definir sua qualidade e, consequentemente, futuras ocupações.

Thomázia de Souza Telles, Josefa de Souza e Freire, Maria de Jesus, Ana Maria Lopes de Brito, e Ana Rabelo, dentre outras mulheres de origem e descendência africana, se esforçaram para controlar a maneira pela qual seus bens seriam transferidos aos filhos ou mesmo netos, e como estes poderiam beneficiá-los. Suas decisões e ações devem ser entendida a partir do contexto social e legal que marcou as Minas coloniais. Durante o século XVIII, um número significativo de mulheres negras alcançaram a transição da escravidão para a liberdade, acumularam através do seu trabalho e esforço empreendedor bens que lhes permitiram viver com algum conforto material, e criaram filhos que, ao contrário delas, não carregavam necessariamente as marcas da experiência do cativeiro. Os seus sucessos não impediram, porém, que a elas fossem negados, por causa de sua descendência africana, tratamento, oportunidades e direitos disponíveis a outros grupos sociais. É possível que, bem integradas à sociedade mineira da época, elas nem ambicionassem a igualdade social ou legal, reconhecendo que viviam em um mundo fundamentalmente organizado a partir de noções de diferença e desigualdade. Contudo, suas tentativas de proporcionar aos filhos os meios econômicos e, em certos casos, a educação para que esses pudessem negociar uma posição social que não fosse restringida pela cor ou proximidade à escravidão, sugere que elas não se resignaram totalmente àquela realidade. Seus esforços para proporcionar às filhas uma vida reconhecida publicamente como honrosa e um dote que pudesse facilitar um casamento proveitoso, ou aos filhos propriedade que os isentassem do trabalho manual, também sugere o intuito de resistir e, de certa forma, controlar a maneira pela qual as normas e práticas locais de diferenciação afetariam suas vidas.

Conclusão

Documentos relativos à sucessão de bens nas Minas colonial revelam o processo pelo qual mulheres de origem e descendência africana desafiaram os limites sociais e raciais impostos pela sociedade colonial mineira. Cientes dos benefícios que a posse de escravos ou outra propriedade poderiam oferecer a seus filhos, ou que um dote e a reputação de honrosa poderiam oferecer a suas filhas, mães afro-descendentes se esforçaram para controlar a transmissão de seus bens. Esse processo, por sua vez, reflete o diálogo que se estabeleceu na sociedade mineira setecentista sobre o significado da ascendência africana e o papel destacado que mulheres negras tiveram naquele processo. As mulheres discutidas nesse trabalho viveram numa sociedade que, diante da expansão de uma população negra livre, e desejosa de manter a ordem escravocrata e os privilégios gozados pela população branca, recorreu à discriminação para manter controle social e político. A busca da mobilidade social, que para várias começou com a negociação da alforria, foi portanto limitada pelo peso do seu passado escravo, origens étnicas, cor da pele, e envolvimento com o trabalho de rua. Mas ao esforçarem-se para resistir tais limitações à sua mobilidade social, ou ao avanço social de seus filhos e descendentes, essas mulheres recorreram a práticas e normas dominantes para reivindicarem para si os benefícios que a estrutura econômica, cultural, e jurídica colonial oferecia à elite branca. As decisões e ações de mulheres negras e de cor ajudou a reproduzir, nesses sentido, certas expectativas sociais que comumente condenaram afro-descendentes a uma posição social inferior e desprivilegiada. Por outro lado, elas criaram um ambiente social onde africanos e seus descendentes puderam ocasionalmente apropriaram-se com sucesso da linguagem da honra e da qualidade, e da distinção que a posse de bens poderia oferecer, para negociar o impacto da ascendência africana na sua posição social e naquela de futuras gerações.

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  • ZEMELLA, Mafalda P. O abastecimento da capitania das Minas Gerais no século XVIII. São Paulo: Hucitec, 1990.
  • 1
    REIS, Liana Maria. Mulheres do ouro: as negras de tabuleiro nas Minas Gerais do século XVIII. Revista do Departamento de História, Belo Horizonte, v. 8., p. 72-85, 1989. FIGUEIREDO, Luciano Raposo de Almeida. O avesso da memória: cotidiano e trabalho da mulher em Minas Gerais no século XVIII. Rio de Janeiro: Editora J. Olympio, 1993. HIGGINS, Kathleen. "Licentious Liberty" in a Brazilian Gold-Mining Region: Slavery, Gender, and Social Control in Eighteenth-Century Sabará, Minas Gerais. University Park: Pennsylvania State University Press, 1999. PAIVA, Eduardo França. Escravidão e universo cultural na colônia: Minas Gerais,1716-1789. Belo Horizonte: Editora Universidade Federal de Minas Gerais, 2006.
  • 2
    Ver, por exemplo, FURTADO, Júnia. Pérolas Negras: mulheres livres de cor no distrito Diamantino. In FURTADO, Júnia (org.) Diálogos Oceânicos: Minas Gerais e as novas abordagens para uma história do Império Ultramarino Português. Belo Horizonte: Editora da Universidade Federal de Minas Gerais, 2001. p. 81-121. FARIA, Sheila de Castro. Sinhás pretas: acumulação de pecúlio e transmissão de bens de mulheres forras no sudeste escravista (séculos XVIII e XIX). In SILVA, Francisco C. T. Da; MATTOS, Hebe Maria de; FRAGOSO, João (orgs.) Escritos sobre a História da Educação: Homenagem à Maria Yedda Leita Linhares. Rio de Janeiro: Mauad/Faperj, 2001. p. 289-329. XAVIER, Giovana; FARIAS, Juliana Barreto; GOMES, Flávio (orgs.) Mulheres Negras no Brasil Escravista e do Pós-Emancipação. São Paulo: Selo Negro, 2012.
  • 3
    FURTADO, Júnia Ferreira. Chica da Silva e o contratador dos diamantes: o outro lado do mito. São Paulo, Companhia das Letras, 2003
  • 4
    FURTADO, Chica da Silva, 58-63, 188-198, 246-264.
  • 5
    BUSH, Barbara. Slave Women in Caribbean Society, 1650-1838. Bloomington: Indiana University Press, 1989; MORGAN, Jennifer. Laboring Women: Reproduction and Gender in New World Slavery. Philadelphia: University of Pennsylvania Press, 2004.
  • 6
    Ver, por exemplo, PAIVA, Eduardo França. Bateias, Carumbés, Tabuleiros: mineração africana e mestiçagem no mundo novo. In PAIVA, Eduardo França; ANASTASIA, Carla Maria Junho. O Trabalho Mestiço: Maneiras de Pensar e Formas de Viver, séculos XVI a XIX. São Paulo: Annablume, 2002. GOMES, Flávio dos Santos; SOARES, Carlos Eugênio Líbano. 'Dizem as Quitandeiras...': ocupações urbanas e identidades étnicas em uma cidade escravista: Rio de Janeiro, século XIX. Acervo-Revista do Arquivo Nacional, Rio de Janeiro, v. 15, n. 2, p. 3-16, 2002. QUINTÃO, Antonia Aparecida. Lá Vem o Meu Parente: as irmandades de pretos e pardos no Rio de Janeiro e em Pernambuco (século XVIII). São Paulo: Annablume, 2002.
  • 7
    Em um artigo recentemente publicado, por exemplo, eu exploro a prática da venda de meação observada na Comarca do Rio das Velhas, Minas Gerais. DANTAS, Mariana. Succession of Property, Sales of Meação, and the Economic Empowerment of Widows of African Descent in Colonial Minas Gerais, Brazil. Journal of Family History, Los Angeles, v. 39, n. 3, p. 222-238, julho de 2014. Exemplos de trabalhos sobre estratégias sucessórias femininas em outros contextos incluem CAVALLO, Sandra; WARNER, Lyndan. Widowhood in Medieval and Early Modern Europe. New York: Pearson Education Ltd., 1999. p. 193-219. GAUDERMAN, Kimberly. Women's Lives in Colonial Quito: Gender, Law, and Economy in Spanish America. Austin: University of Texas Press, 2003. p. 30-47. MANGAN, Jane. Trading Roles: Gender, Ethnicity, and the Urban Economy in Colonial Potosí. Durham, NC: Duke University Press, 2005. p. 147-49. CONGER, Vivian Bruce. The Widows' Might: Widowhood and Gender in Early British America. New York: New York University Press, 2009. p. 49-78.
  • 8
    JORDAN, William. Women and Credit in Pre-Industrial and Developing Societies. Philadelphia: University of Pennsylvania Press, 1993.
  • 9
    A informação discutida nessa artigo baseia-se em pesquisa realizada em 350 inventários assim como escrituras e testamentos registrados em 15 livros de notas produzidos entre 1750 e 1799 na Comarca do Rio da Velhas. Cartório do Primeiro Ofício e Cartório de Segundo Ofício, Instituto Brasileiro de Museus-Museu do Ouro de Sabará/Arquivo Casa Borba Gato [MOS/ACBG]. Para uma análise da população negra da Comarca do Rio da Velhas, ver DANTAS, Mariana. Black Townsmen: Urban Slavery and Freedom in the Eighteenth-Century Americas. New York: Palgrade Macmilla, 2008.
  • 10
    Trabalhos que illustram tais realidades vividas por mulheres afro-descendentes incluem SCARANO, Julita. Cotidiano e Solidariedade: vida diária da gente de cor nas Minas Gerais, século XVIII. São Paulo: Editora Brasiliense, 1994. FIGUEIREDO, Luciano R. A. Figueiredo. Barrocas Famílias: vida familiar em Minas Gerais no século XVIIII. São Paulo: HUCITEC, 1997. PAIVA, Eduardo França. Escravos e libertos nas Minas Gerais do século XVIII : estratégias de resistência através dos testamentos. São Paulo: Editora Annablume, 2000. FARIA, Sheila de Castro. "Mulheres Forra: Riqueza e estigma social." Tempo, Rio de Janeiro, v. 5, n. 9, Julho 2000, p. 65-92.
  • 11
    Inventário de Antônia Rangel de Abreu, Sabará, 14 de maio, 1756, CSO, cx. 18, doc. 07, MOS/ACBG. Em 1756, 113$000 (cento e treze mil) réis era uma quantia insuficiente para comprar um escravo em idade produtiva. Ver BERGAD, Laird. Slavery and the Demographic and Economic History of Minas Gerais, Brazil, 1720-1888. New York: Cambridge University Press, 2000. p. 180.
  • 12
    Para uma definição e discussão da importância econômica das vendas, ver CHAVES, Cláudia Maria das Graças. Perfeitos negociantes: mercadores das Minas setecentistas. São Paulo: Annablume, 1999. p. 59-61. FURTADO, Júnia Ferreira. Homens de negócio: A interiorização da metrópole e do coméricio nas Minas setecentistas. São Paulo: Hucitec, 1999. p. 230-72. PANTOJA, Selma. A Dimensão Atlântica das Quitandeira. In FURTADO, Júnia (org.). Diálogos Oceânicos: Minas Gerais e as novas abordagens para uma história do Império Ultramarino Português. Belo Horizonte: Editora da Universidade Federal de Minas Gerais, 2001. p. 45-67. SILVA, Flávio Marcus da. Susbsistência e poder: a política do abastecimento alimentar nas Minas setecentistas. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2008. p. 156-163.
  • 13
    A conexão entre serviço de rua e honra feminina é um tema bastante explorado na literatura sobre a América espanhola. Ver SOCOLOW, Susan M. The Women of Colonial Latin America. Cambridge: Cambridge University Press, 2000. p. 112-29. GAUDERMAN. Women's Lives in Colonial Quito. MANGAN, Trading Roles. p. 134-60.
  • 14
    ANTONIL, André João. Cultura e opulência do Brasil. Belo Horizonte: Editora Itatiaia, 1982. p. 169-73.
  • 15
    Sobre o abastacimento da capitania mineira, ver ZEMELLA, Mafalda P. O abastecimento da capitania das Minas Gerais no século XVIII. São Paulo: Hucitec, 1990. MENESES, José Newton Coelho. O continente rústico: abastecimento alimentar nas Minas Gerais setecentistas. Diamantina: Editora Maria Fumaça, 2000. CARRARA, Angelo Alves. Minas e currais: produção rural e mercado interno de Minas Gerais, 1674-1807. Juiz de Fora: Editora da Universidade Federal de Juiz de Fora, 2007. SILVA. Subsistência e poder.
  • 16
    "Relação dos homens abastados das Comarcas de Minas, capitania de Minas Gerais," 24 de julho, 1756, Coleção Arquivo Histórico Ultramarino [AHU], cx. 70, doc. 40, Arquivo Público Mineiro.
  • 17
    BARBOSA, Waldemar de Almeida. Dicionário da terra e da gente de Minas. Belo Horizonte: Publicações do Arquivo Público Mineiro, 1985. p. 84-85. "Mapa geral da capitação do governo de Minas Gerais, capitania de Minas Gerais, 1750, AHU cx. 60, doc. 52, Arquivo Público Mineiro.
  • 18
    "Aferições de balanças, pesos e medidas", Sabará, 1745-1756, Fundo Câmara Municipal de Sabará, códice 16ª, Arquivo Público Mineiro. "Registro de lojas e vendas", Sabará, 1788-1795, Fundo Câmara Municipal de Sabará, códice 82, Arquivo Público Mineiro. "Lançamento da receita do contrato das afilações e cabeças", Sabará,1806, Fundo Câmara Municipal de Sabará, códice 128, Arquivo Público Mineiro.
  • 19
    FIGUEIREDO, O Avesso da Memória, Appendix 1, p. 205-14. Maria Odila Silva Dias também encontrou evidências que semelhantes suspeitas e reclamações afetaram vendeiras em São Paulo nos séculos XVIII e XIX. DIAS, Maria Odila Silva. Quotidiano e Poder em São Paulo no século XIX. São Paulo: Editora Brasiliense, 1995. p. 70-85.
  • 20
    Inventário de José de Freitas Costa, Sabará, 11 de junho, 1778, CSO cx. 46, doc. 06, MOS/ACBG.
  • 21
    Crioulo(a) foi um termo utlizado nas Minas coloniais para se referir a indivíduos descendentes de africanos mas nascidos na colônia. Para uma discussão dos termos usados em Minas Gerais para identificar cor e descendência, ver LIBBY, Douglas. A empiria e as cores: representações identitárias nas Minas Gerais dos séculos XVIII e XIX. In PAIVA, Eduardo França; Isnara Pereira Ivo; Ilton Cesar Martins (org). Escravidão, mestiçagens, populações e identidades culturais. São Paulo: Annablume, 2010. p. 41-62.
  • 22
    "Requerimento dos crioulos pretos das minas da Vila Real de Sabará, Vila Rica, Serro do Frio, São José e São João pedindo que se lhes nomeie um procurador para os defender das violências de que são vítimas, capitania de Minas Gerais", 14 de outubro, 1755, AHU, cx. 68, doc. 66, Arquivo Público Mineiro.
  • 23
    Inventário de Ana Pereira, Sabará, 5 de outubro 1774, CSO, cx. 38, doc. 07, MOS/ACBG.
  • 24
    Segundo as leis sucessórias portuguesas, os descendentes diretos do indivíduo falecido eram os seus herdeiros forçados e, na falta destes, o eram seus ascendentes diretos. Código Philippino, ou Ordenaçoões e Leis do Reino de Portugal. Livro 1, título LXXXVIII. Rio de Janeiro: Cândido Mendes de Almeida, 1870; Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1985. p. 206-15. Para uma discussão das leis e práticas sucessórias no Brazil colonial, ver METCALF, Alida. Family and Frontier in Colonial Brazil: Santana do Paraíba, 1580-1822. Berkeley: University of California Press, 1992. p. 95-100; SILVA, Maria Beatriz Nizza da. História da Família no Brasil Colonial. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 1998. LEWIN, Linda. Surprise Heirs I: Illegitimacy, Patrimonial Rights, and Legal Nationalism in Luso-Brazilian Inheritance, 1750-1821. Stanford, CA: Stanford University Press, 2003. p. 19-39.
  • 25
    Até 1769, testadores tinham a opção de deixar a alma como herdeira, uma decisão que efetivamente tornava a igreja herdeira de seus bens. As reformas pombalinas trouxeram um fim a essa prática com a lei de 1769, que autorizava o estado a manter e leiloar os bens de defuntos sem herdeiros forçados ou nomeados. Código Philippino. Livro 4, Lei de 9 de Setembro de 1769, p. 1057-61. Ver também LEWIN. Surprise Heirs. p. 34-37.
  • 26
    Em outros trabalhos eu exploro em maior detalhes os problemas sofridos por afro-descendentes ao long do processo sucessório. Ver DANTAS, Mariana L. R. Inheritance Practices among Individuals of African Origin and Descent in Eighteenth-Century Minas Gerais, Brazil. In KLEIJWEGT, Marc (org.) The Faces of Freedom: The Manumission and Emancipation of Slaves in Old World and New World Slavery. Leiden: Brill, 2006. p. 153-81; DANTAS. Succession of Property, 222-238.
  • 27
    Código Phillipino. Livro 4, título CII.
  • 28
    Inventário de Josefa Martins Penna, 14 de Janeiro, 1785, CSO cx. 60, doc. 447, MOS/ACBG.
  • 29
    Código Phillipino. Livro 1, título LXXXVIII, § 13-21, 211-13. Livro de Provimento dos Órfãos. p. 15v-16. MOS/ACBG. De acordo com leis portuguesas, a idéia de qualidade se baseou na noção de linhagem e ascendência nobre ou plebéia. No contexto colonial, tais noções também incorporaram ascendência escrava ou africana. Para uma discussão da noção de qualidade e suas implicações sociais, ver DANTAS, Mariana. Humble Slaves and Loyal Vassals: Free Africans and Their Descendants in Eighteenth-century Minas Gerais, Brazil. InFISHER, Andrew B.; Matthew O'Hara (org.). Imperial Subjects: Race and Identity in Colonial Latin America. Durham, NC: Duke University Press, 2009. p. 115-40. Ver também na mesma coletânea TWINAM, Ann. Purchasing Whiteness: Conversations on the Essence of Pardo-ness old Mulatto-ness at the End of Empire. p. 141-66.
  • 30
    Código Filipino. Livro 1, título LXXXVIII, § 6, p. 209; e Código Philippino. Livro 4, título CII, p. 994-1004.
  • 31
    Dentre 21 petições encontradas para vila de Sabará onde viúvas requereram a tutela dos filhos, somente duas envolveram mulheres afro-descendentes e ambas eram pardas. Luiza de Souza de Oliveira, 30 de outubro, 1778, AHU cx. 113, doc. 58, Arquivo Público Mineiro; e Maria Rodrigues da Cruz, 24 de setembro, 1784, AHU cx.122, doc. 27, Arquivo Público Mineiro.
  • 32
    Era prática comum na vila de Sabará alocar durante a partilha de bens parte dos bens do defunto para o pagamento de dívidas. Outra prática comum era a apresentação por parte de credores de petições requerendo pagamento por dívidas ainda ativas. Ambas as práticas resultaram na transferência de bens a credores sem que a família pudesse administrar tais pagamentos. Para outras discussões do impacto de dívidas no processo sucessório, ver METCALF, Alida C. Fathers and Sons: the politics of inheritance in a colonial Brazilian township. Hispanic American Historical Review, Durham, v. 66, n. 3, p. 455-84, Agosto de 1986; FARIA, Sheila de Castro. A Colônia em Movimento: Fortuna e Família no Cotidiano Colonial. Rio de Janeiro, Brazil: Editora Nova Fronteira, 1998. p. 263-65.
  • 33
    Dentre os 112 inventários consultados para esse estudo que incluíram herdeiros de descendência africana, 35 mencionam dívidas pagas com parte dos bens do defunto e 12 revelam a perda total do monte-mor por causa do pagamento de dívidas. Inventários do Cartório do Segundo Ofício, caixas 12-69, MOS/ACBG.
  • 34
    Inventário de João Pinto Pereira, 7 de Agosto, 1770, CSO cx. 32, doc. 262, MOS/ACBG.
  • 35
    Código Philippino. Livro 1. Título LXXXVIII. p. 206-15.
  • 36
    Inventário de Antônio de Morais, 25 de fevereiro, 1773, CSO cx. 38, doc. 291, MOS/ACBG.
  • 37
    Inventário de José Pinto de Araújo, 5 de Julho, 1758, CSO (19)165, MOS/ACBG.
  • 38
    Estudos sobre as ações legais de mães afro-descendentes tendem a focar o final do século XIX, quando a lei do ventre livre lhes permitiu intervir legalmente com mais sucesso em benefício da liberdade dos filhos. ABREU, Marta. Escravas e Filhos Libertos: novas perspectivas em torno da Lei do Ventre Livre, Rio de Janeiro, 1871. In RIZZINI, Irene (org.) Olhares sobre a criança no Brasil: século XIX e XX. Rio de Janeiro: USU Editora Universitári, Amais, 1997. COWLING, Camillia. Conceiving Freedom: women of color, gender, and the abolition of slavery in Havana and Rio de Janeiro. Chapel Hill: University of North Carolina Press, 2013. Mas como mostra o presente trabalho, o período colonial contém também importantes exemplos do esforço que essas mulheres fizeram para defender os interesses dos filhos nos juízos coloniais.
  • 39
    Inventário de Thomázia de Souza Telles, Sabará, 4 de maio, 1778, CSO, cx. 49, doc. 368, MOS/ACBG. Durante o período de 1750 a 1799, examinado neste estudo, em torno de um quarto dos inventários consultados incluíram venda inter-vivos. A prática de planejar a transmissão de bens através de vendas e o uso dessa estratégia para evitar procedimentos jurídicos também foi observado em outros contextos históricos. Ver GOODY, Jack. The Development of Family and Marriage in Europe. Cambridge, UK: Cambridge University Press, 1983. p. 21.
  • 40
    O valor médio dos bens de inventariados afro-descendentes na vila de Sabará durante a segunda metade do século XVIII foi 700$000 réis.
  • 41
    Macaúbas, apesar de não ser um convento propriamente dito (não oferecendo a opção de tomar votos solenes às suas recolhidas), serviu de refúgio para órfãs, filhas, e viúvas de alguma posse cujas famílias queriam garantir-lhes uma vida recatada e proteger sua honra. Ver ALGRANTI, Leila M. Honradas e devotas: mulheres da colônia-condição feminina nos conventos e recolhimentos do Sudeste do Brasil, 1750-1822. Rio de Janeiro: Editora José Olympio, 1993. ALMEIDA, Suely Creusa Cordeiro de. Um Lugar para Marias, Evas, e Madalenas: Entre Pernambuco e Portugal, recolhimentos femininos como lugar de inserção social. Portuguese Studies Review, vol. 144, no. 1, p. 205-230. 2006. MYSCOFSKI, Carole. Amazons, Wives, Nuns, and Witches: women and the Catholic church in colonial Brazil, 1500-1822. Austin: University of Texas Press, 2013.
  • 42
    Carta de Alforria de Feliciana, crioula, 16 de setembro, 1808, Livro de Registro de Notas do Cartório do Segundo Ofício, L89, MOS/ACBG.
  • 43
    Código Philippino, Livro 4, título XLVI, 832-35; Código Philippino, Livro 4, título XCV, 949-54; Código Philippino, Livro 4, título XCVI, 954-68.
  • 44
    DANTAS. Inheritance Practices. p. 174.
  • 45
    Escritura de doação que faz Maria de Jesus preta forra a sua neta Jerónima Antônia, 17 de setembro, 1782, Livro de Registro de Notas do Cartório do Primeiro Ofício 24(74), MOS/ACBG.
  • 46
    Um tratamento comumente recomendado contra doenças coloniais era uma dieta rica em carne, particularmente galinha, normalmente não adotada por famílias pobres e afro-descendentes por causa dos custos altos. RIBEIRO, Márcia Moisés, A ciência dos trópicos: a arte médica no Brasil do século XVIII. São Paulo: Editora Hucitec, 1997. GURGEL, Cristina. Doenças e curas: o Brasil nos primeiros séculos. São Paulo: Ed. Contexto, 2008. ALMEIDA, Carla B. S. Medicina mestiça: saberes e práticas curativas nas minas setecentistas. São Paulo: Annablume, 2010.
  • 47
    Inventário de Josefa de Souza Freire, Sabará, 10 de julho, 1770, CSO, cx 29, doc. 06, MOS/ACBG.
  • 48
    Dentre os 350 inventários consultados para este estudo, dezenove (ou 5.5 porcento) envolveram venda de bens entre membros de uma mesma família. Inventários do Cartório do Segundo Ofício, caixas 12-69, MOS/ACBG.
  • 49
    Código Philippino. Livro 4. Título VII. p. 791-93.
  • 50
    Inventário de Ana Maria Lopes de Brito, 31 de Janeiro, 1760, CSO cx 10, doc. 10, MOS/ACBG.
  • 51
    Para uma análise mais detalhada da prática da venda de meação, ver DANTAS. Inheritance Practices. DANTAS. "Succession of Property".
  • 52
    Inventário de Custádio Rabelo, 23 de março, 1787, CSO cx. 63, doc. 470, MOS/ACBG.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Apr 2016
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