A AGENDA DE PESQUISA DA BUROCRACIA DE NÍVEL DE RUA NO CONTEXTO DA PANDEMIA: UMA REVISÃO INTEGRATIVA

La agenda de investigación sobre la burocracia a nivel de la pública en el contexto de la pandemia: una revisión integrativa

RESUMO

A implementação das políticas públicas em situações de crise é um campo de estudo escasso, sobretudo no nível de rua, em que há a interação entre o Estado e o cidadão. A pandemia enquanto crise afetou a autonomia dos profissionais da linha de frente e moldou seu comportamento, sobretudo por fatores organizacionais e relacionais. Dessa forma, o estudo explora a agenda de pesquisa no contexto da pandemia disponível na base de dados da Web of Science, buscando compreender a sua influência para a implementação das políticas públicas no nível de rua, utilizando para esse fim o método de revisão integrativa. Adicionalmente, empreendeu-se entender de que forma o uso de softwares contribui com a análise dos dados, apontando suas vantagens e limitações. Para isso, utilizou-se o VOSviewer 1.6.17. Os principais resultados revelaram que contextos de crise como a pandemia influenciam profundamente a implementação das políticas públicas no nível de rua com impactos negativos para o atendimento do usuário. O trabalho possui limitações do recorte definido, que carece de avanços no número de dados analisados, mas contribui para a melhor compreensão da influência das crises para a implementação no nível de rua. Indicam-se investigações sobre as consequências emocionais da linha de frente e a abordagem da atuação durante a crise dos profissionais que lidam diariamente com situações de emergência, como os bombeiros e os profissionais de veículos móveis das redes de urgência e emergência médicas.

Palavras-chave:
burocratas de nível de rua; discricionariedade; Covid-19; crise; revisão

RESUMEN

La implementación de políticas públicas en situaciones de crisis es un campo de estudio escaso, especialmente a nivel de calle donde existe interacción entre el Estado y el ciudadano. La pandemia como crisis afectó la autonomía de los profesionales de primera línea y moldeó su comportamiento, especialmente influenciado por factores organizativos y relacionales. De esta forma, el estudio explora la agenda de investigación en el contexto de la pandemia, disponible en la base de datos Web of Science, buscando comprender su influencia en la implementación a pie de calle, utilizando para ello el método de revisión integradora. Adicionalmente, se intenta comprender cómo el uso de software contribuye al análisis de datos, señalando sus ventajas y limitaciones. Para ello se utilizó VOSviewer 1.6.17. Los principales resultados revelaron que contextos de crisis como la pandemia influyen profundamente en la implementación a pie de calle con impactos negativos en la atención al usuario. El trabajo tiene limitaciones del corte definido, que carecen de avances en la cantidad de datos analizados, pero contribuye a una mejor comprensión de las influencias de las crisis para la implementación a pie de calle. Se indican investigaciones sobre las consecuencias emocionales de la primera línea y el planteamiento de actuación durante la crisis de los profesionales que atienden a diario situaciones de emergencia como los bomberos y los vehículos móviles de la red de emergencias y emergencias médicas.

Palabras clave:
burócratas de nivel de calle; discreción; COVID-19; crisis; revisión

ABSTRACT

The implementation of public policies during crises situations, particularly at the street level where interactions between the state and the citizen occur, remains a sparsely studied area. The COVID-19 pandemic significantly affected the autonomy of street-level bureaucrats influenced by organizational and relational factors. This study explores the literature available in the Web of Science database on street-level bureaucracy during the pandemic through an integrative review, seeking to understand the crisis’ influence on policy implementation at the street level. Additionally, the use of software, specifically the VOSviewer 1.6.17, is examined to understand its contribution to data analysis, pointing out its advantages and limitations. The main results revealed that crisis contexts, such as the pandemic, profoundly influence the implementation of public policies at the street level with negative impacts on user services. While this research has limitations due to the limited number of analyzed data, it contributes to a better understanding of the influences of crises on the street-level implementation of public policies. Furthermore, future investigations should explore the emotional consequences experienced by street-level bureaucrats and examine the approach taken during crises by professionals who regularly deal with emergency situations, such as firefighters and ambulance crews.

Keywords:
street-level bureaucrats; discretion; COVID-19; crisis; integrative review

INTRODUÇÃO

A implementação das políticas públicas em situações de normalidade é um campo de estudo com espaço restrito de pesquisa quando comparada às investigações sobre as fases da agenda, formulação, tomada de decisão e avaliação (Lotta et al., 2018). A escassez de pesquisas que abordam o diálogo entre o fundamento teórico da implementação com os casos empíricos das mais variadas áreas públicas setoriais é apontada como uma lacuna do campo de estudo (Lotta, 2008, 2010; Cavalcanti, Lotta, & Pires, 2018; Lotta et al., 2018) e passa a ser ampliada quando se considera o contexto das crises, sobretudo no nível de rua, em que há a interação entre o Estado e o cidadão e se devem debruçar os esforços de compreensão (Henderson, 2014; Brodkin, 2021; Gofen & Lotta, 2021; Lotta et al., 2021).

O profissional que trabalha na linha de frente tanto nas situações de normalidade quanto de anormalidade, denominado de burocrata de nível de rua, é o elemento central dessa implementação, por exercer sua discricionariedade durante o contato com o cidadão na entrega dos serviços à sociedade e modificando a política formulada localmente, podendo ser visto como um formulador de políticas (Ferreira & Medeiros, 2016; Lima-Silva, Sandim, Magri, & Lotta, 2020). Na literatura que aborda esse agente público são encontradas outras expressões sinônimas ao burocrata de nível de rua: agente de implementação (Cavalcanti et al., 2018), burocratas da linha de frente (Ferreira & Medeiros, 2016) ou implementadores (Lima & D’Ascenzi, 2017), e elas serão intercambiadas ao longo deste trabalho.

A pandemia enquanto crise (Christensen & Lægreid, 2020) revelou a importância desses profissionais que atuam na linha de frente em um cenário de insuficiência de recursos para o atendimento ao usuário e para sua proteção individual, além de ter seu ambiente de trabalho e suas rotinas alterados por respostas governamentais ambíguas e que lhes dão maior autonomia de ação (Cox, Dickson, & Marier, 2021; Davidovitz, Cohen, & Gofen, 2021; Meza, PérezChiqués, Campos, & Varela Castro, 2021). Os limites de atuação do burocrata são definidos pelas regras formais e informais, que no decorrer da pandemia foram determinantes para alterar a sua extensão, deslocando-se no sentido contrário a como ocorre em épocas de normalidade (Malandrino & Sager, 2021; Pérez-Chiqués et al., 2021).

A crise não apenas afetou a autonomia do profissional da linha de frente, como também o seu comportamento (Christensen & Lægreid, 2020; Lima-Silva et al., 2020; Oliveira, Barabashev, Tapscott, Thompson, & Qian, 2021; Gofen, Lotta, & Marchesini da Costa, 2021), fazendo emergir novas estratégias de enfrentamento das pressões (Lotta et al., 2018) e mudando os papéis exercidos, colocando o racionamento de recursos como o principal fator de orientação no processamento dos clientes (Meza et al., 2021), sobretudo influenciado por fatores organizacionais, considerando o impacto das regras, recursos, produção de incentivos e o aprendizado disponível sobre seus comportamentos (Lotta, 2010; Bonelli, Fernandes, Coêlho, & Palmeira, 2019). De igual maneira, as relações e as interações entre os burocratas e os usuários foram profundamente afetadas pela pandemia, destacando a motivação e a vontade do agente público de implementar, mesmo em meio ao contexto de incertezas e medo de contágio com o vírus (Malandrino & Sager, 2021; Meza et al., 2021; Pérez-Chiqués et al., 2021).

Para compreender as influências da crise para a burocracia de nível de rua, este estudo explorou a agenda de pesquisa no contexto da pandemia, utilizando para esse fim o método de revisão integrativa, em que são feitas análises tanto quantitativas quanto qualitativas (Botelho, Cunha, & Macedo, 2011). Adotou-se a técnica bibliométrica, de caráter estatístico-quantitativo (Araújo, 2006), em que são aplicadas categorias analíticas e que serão apresentadas na próxima seção.

A leitura integral dos textos foi feita na perspectiva da crise e sua influência para três categorias analíticas: o espaço discricionário, as estratégias de enfrentamento das pressões e o exercício de papéis na atuação. A primeira categoria mensura a extensão das decisões dos profissionais atendendo ou excluindo os usuários, podendo ser também compreendida como a autonomia disponível para sua ação (Hupe & Hill, 2007). A segunda categoria analisa as influências das regras formais e não ditadas, incentivos e recursos para o comportamento discricionário, e, por fim, a terceira categoria avalia as dinâmicas de interação e as relações no contato entre os profissionais e os usuários (Lotta, 2010; Bonelli et al., 2019).

Adicionalmente, empreendeu-se com a pesquisa entender de que forma o uso de softwares contribui na análise dos dados, apontando suas vantagens e limitações. Para isso, optou-se por explorar o VOSViewer 1.6.17, por causa da compatibilidade dos arquivos gerados pela fonte de onde foram extraídos os dados. Pretendeu-se contribuir no campo de estudo de análise das burocracias de nível de rua em contextos de crise (Henderson, 2014; Lima-Silva et al., 2020).

Quanto à estrutura do estudo, além desta introdução, na qual foram delimitados o tema e os objetivos, são apresentados na próxima seção os procedimentos metodológicos empregados durante a pesquisa, suas características e limitações. A seguir, são elencadas as contribuições para o campo de estudo da burocracia de nível de rua no contexto de crise. Na última seção, há as indicações de futuras investigações para o campo de análise.

METODOLOGIA

Este estudo buscou aplicar o método de revisão integrativa da literatura para investigar a agenda de pesquisa da burocracia de nível de rua em contextos de crise, como a pandemia, utilizando como dados primários os artigos que abordassem simultaneamente a pandemia e a burocracia de nível de rua encontrados na base de dados da Web of Science, mediante o seu acesso pela plataforma dos periódicos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). A revisão integrativa faz parte de uma estrutura de revisão sistemática em que há a combinação de métodos quantitativos e qualitativos (De-la-Torre-Ugarte-Guanilo, Takahashi, & Bertolozzi, 2011).

Esse é um recurso metodológico empregado por pesquisadores no início de seus estudos, com o propósito de responder a perguntas de pesquisa sobre determinado tema (Sampaio & Mancini, 2007; Botelho et al., 2011). O objetivo desse método qualitativo perpassa pelo compartilhamento dos resultados de outros estudos aproximados, pelo relacionamento do diálogo entre estudos sobre um tópico ou até mesmo pelo fornecimento de uma estrutura que estabeleça a importância de uma pesquisa e seus indicadores de comparação com outros resultados (Creswell, 2010).

Além disso, a revisão possui caráter exploratório, pois permite maior aderência do pesquisador ao tema pesquisado, desenvolvimento de insights e ideias (Conforto, Amaral, & Silva, 2011).

O método sumariza a literatura antecedente para prover uma compreensão mais ampla sobre fenômenos particulares (Botelho et al., 2011), por meio da consolidação e análise de estudos experimentais e não experimentais, teóricos ou empíricos, com contribuição ao campo de conhecimento anteriormente investigado, permitindo a construção de teorias, identificação de lacunas e proposição de novos estudos (Grant & Booth, 2009; Botelho et al., 2011), em direção ao estado da arte sobre o assunto. Alguns cuidados devem ser tomados pelos pesquisadores que decidem utilizar esse método, a começar pela sistematização do estudo. A revisão integrativa requer uma ordem procedimental na busca, coleta e seleção dos dados a serem analisados, evitando erros metodológicos ou de viés de pesquisa (Botelho et al., 2011). Para isso, os autores propõem um processo compreendendo seis etapas para o desenvolvimento de uma revisão integrativa, conforme apresentado na Figura 1.

Figura 1
Processo de revisão integrativa

Fonte: adaptada de Botelho et al. (2011)

O detalhamento dessas etapas ficará para outro momento, em razão dos objetivos propostos para este estudo e pela limitação para discussão. A seguir, serão descritos os procedimentos metodológicos adotados neste artigo, utilizando o processo de revisão integrativa proposto por Botelho et al. (2011).

Como critério de inclusão, foram selecionados os artigos que apresentassem algum dos descritores de busca em seu título, resumo ou palavra-chave. As buscas ocorreram no banco de dados da Web of Science, entre os meses de setembro e novembro de 2021. Como descritores de busca, empregaram-se as expressões “street-level bureaucrats”, “street-level bureaucracy” e “frontline professionals” associadas com indexador boleano “AND” aos termos “COVID-19”, “pandemic” e “coronavirus”. O recorte temporal estabelecido deu-se do dia 30 de janeiro de 2020, quando a Organização Mundial da Saúde (OPAS, 2020) declarou que o novo coronavírus constituía uma emergência de saúde pública de importância internacional, até o dia 1º de junho de 2021, quando essa organização validou mundialmente a oitavavacina para uso emergencial contra o novo coronavírus (OPAS, 2021).

A tabela 1 mostra o número total de artigos encontrados no banco de dados escolhido e os números parciais por descritores de busca.

Tabela 1
Relação de artigos encontrados

DESCRITORES DE BUSCAS	NÚMERO DE ARTIGOS
	WEB OF SCIENCE
Street-level bureaucrats AND COVID-19	17
Street-level bureaucracy AND COVID-19	7
Street-level bureaucrats AND pandemic	16
Street-level bureaucracy AND pandemic	7
Street-level bureaucracy AND coronavirus	1
Street-level bureaucrats AND coronavirus	0
Frontline professionals AND COVID-19	14
Frontline professionals AND pandemic	15
Frontline professionals AND coronavirus	9
Total	86

Uma primeira seleção por meio do processo de exclusão foi feita adotando-se os critérios de descarte das duplicidades, das publicações que não se encaixaram no recorte temporal e dos artigos em que não foi possível obter seus conteúdos na íntegra. Por fim, um último filtro foi aplicado, durante a leitura integral dos artigos, confirmando-se a adequação de seu conteúdo ao objetivo da pesquisa. Após a aplicação de todos os critérios, foram selecionados nove artigos para a análise, embora o total de artigos encontrados tenha sido 86. Esse fenômeno é decorrente do elevado número de duplicidades encontradas a cada etapa de busca com os descritores escolhidos. Os artigos que preencheram os parâmetros estabelecidos para a pesquisa foram categorizados segundo critérios de análise definidos pelos autores do artigo: áreas setoriais, métodos de abordagem, instrumentos de coleta de dados, países onde foram desenvolvidas as pesquisas e fontes de publicação.

O software VOSViewer 1.6.17 foi utilizado para realizar um estudo bibliométrico de caráter quantitativo-estatístico, o qual permite analisar a produção científica e identificar a sua contribuição para o conhecimento (Araújo, 2006), aplicando-se a análise dos dados obtidos da plataforma Web of Science. Explorou-se no software a análise de coautoria de autores e países, cocitação e acoplamento bibliográfico das referências. A análise de coautoria propicia identificar as relações entre os autores na elaboração dos artigos, as linhas de pesquisa, temas e abordagens. A análise de cocitação e acoplamento bibliográfico possibilita conhecer as relações de conexão teórico-metodológica de um campo de estudo, sua aproximação, limites, associações e interface entre documentos e autores (Grácio, 2016). Pode-se afirmar que a cocitação lista os autores utilizados nas referências dos trabalhos em ordem decrescente de recorrência, revelando, portanto, aqueles mais utilizados por outros pesquisadores. O número reduzido de artigos selecionados pode ser um problema no estudo bibliométrico com o uso de software. Por outro lado, os resultados podem contribuir para atingir um dos objetivos da pesquisa.

Os resultados serão apresentados a seguir e discutidos amplamente para melhor compreensão do assunto.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A pandemia trouxe inúmeras consequências para o mundo, sobretudo para os profissionais da linha de frente no atendimento das pessoas doentes, submetidos à alta carga de estresse e de trabalho e a um forte sentimento de medo pela exposição ao risco de contaminação, tomando decisões extremamente complexas no enfrentamento do coronavírus (Lima-Silva et al., 2020; Matarazzo, Fernandes, & Alcadipani, 2020; Moura, Furtado, & Sobral, 2020; Vidal, 2020).

As consequências do vírus adentraram também no campo das pesquisas sociais, deslocando a agenda de pesquisa, de maneira especial em relação aos estudos sobre a implementação, que tiveram crescimento exponencial a partir de fevereiro de 2020, na perspectiva dos burocratas de nível de rua, em razão de suas contribuições no enfrentamento da doença (Musheno, Musheno, & Austin, 2021). Os resultados gerais da pesquisa são apresentados no quadro analítico da Tabela 2.

Tabela 2
Quadro analítico bibliométrico dos artigos selecionados

CATEGORIAS ANALÍTICAS	DESCRIÇÃO
Área pública setorial	Saúde (Cox et al., 2021; Davidovitz et al., 2021; Gofen et al., 2021; Meza et al., 2021; Prusty & Mahapatra, 2021), assistência social (Lima-Silva et al., 2020), multiáreas (Gofen & Lotta, 2021), segurança pública (Matarazzo et al., 2020; Davidovitz et al., 2021) e educação (Davidovitz et al., 2021; Malandrino & Sager, 2021).
Países onde foram desenvolvidas as pesquisas	Brasil (3), Israel (3), México (3), Estados Unidos (2), Canadá (1), Itália (1), Suíça (1), Índia (1)
Fontes de publicação	Journal of Public Affairs (1), Journal of Comparative Policy Analysis (6), Revista de Administração Pública (2)
Métodos de abordagem	Quantitativo, qualitativo e misto
Técnicas de pesquisa	Documental, entrevistas, survey, triangulação, revisão de literatura
Instrumentos de coleta dos dados	Documentos, jornais, revistas, entrevista semiestruturada, storytelling, questionário, artigos, vinhetas, Facebook e outras fontes online

As áreas públicas setoriais abordadas nas investigações sobre o trabalho dos burocratas de nível de rua no contexto de uma crise se limitaram às da assistência social, educação, segurança pública e, sobretudo, saúde. Um tema emergente foi o empreendedorismo de rua, que abordou a avaliação da atuação dos agentes de saúde comunitários, revelando que os burocratas de nível de rua (BNR) agiram de forma defensiva em ações empreendedoras durante a implementação das políticas de enfrentamento ao vírus (Gofen et al., 2021). Os profissionais da saúde que atuam nos hospitais e em asilos, os agentes de saúde comunitários, os agentes de assistência social, os professores e os policiais foram as categorias de burocratas encontradas nos estudos, desenvolvidos em oito países - Brasil, Estados Unidos da América, Canadá, México, Israel, Itália, Suíça e Índia. Os países da África e da Oceania não foram abordados nos estudos encontrados. As fontes de publicação limitaram-se ao Journal of Comparative Policy Analysis, concentrando seis publicações, ao Journal of Public Affairs e à Revista de Administração Pública.

Quanto aos métodos, identificou-se preponderância de estudos qualitativos, embora tenham sido encontrados estudos quantitativos e de métodos mistos. As técnicas de pesquisa empregadas foram a documental, entrevistas, survey, triangulação de dados e revisão da literatura, utilizando como instrumentos de coleta de dados documentos, jornais, revistas, entrevista semiestruturada, storytelling, questionário, artigos, vinhetas, Facebook e outras fontes online, como transmissões ao vivo. A triangulação foi empregada em apenas dois estudos, embora seja uma técnica importante para a validação de qualquer pesquisa. Por fim, as restrições impostas pelas políticas públicas de saúde de distanciamento e isolamento social alteraram a instrumentalização tradicional de coleta de dados, como as entrevistas e a aplicação de questionários presenciais para métodos de busca de informações em revistas (Cox et al., 2021; Gofen et al., 2021).

A seção a seguir continuará a análise dos resultados por meio da aplicação do software na análise bibliométrica.

Aplicação de software para análise bibliométrica

A medição estatística da produção científica literária surgiu do que se conhecia como bibliografia estatística e foi modificada para bibliometria (Vanti, 2001; Araújo, 2006). Esse método quantitativo aplica conceitos matemáticos da estatística para avaliar a produção científica, descrevendo seus aspectos (Araújo, 2006). Os softwares auxiliam os pesquisadores no desenvolvimento dos estudos bibliométricos, contribuindo para a elaboração das análises e discussão dos resultados das pesquisas, e reduzem o tempo empregado nessas etapas. Neste estudo, optou-se pela utilização do software VOSviewer 1.6.17 por ser uma ferramenta gratuita capaz de mapear o conhecimento em estruturas de redes bibliométricas, por meio de técnicas que agrupam os dados (van Eck & Waltman, 2017; Vieira, Lemos, & Teixeira, 2021).

Os tipos de análise empregados com o uso do software foram de coautoria de autores e países, coocorrência de palavras, cocitação de referência e acoplamento bibliográfico de documentos. O software para análise dos dados está limitado à sua compatibilidade com os arquivos gerados pelas bases Scopus, Dimensions, Lens, PubMed e Web of Science, esta última utilizada para coleta neste estudo. Para análise de coautoria, foram considerados os 21 autores identificados pelo software, que gerou seis clusters, conforme ilustrado na Figura 2.

Figura 2
Análise de coautoria

A análise de coautoria de autores revela as associações entre os autores nas investigações sobre um tema, quais deles são os elementos centrais nas pesquisas e, por consequência, as áreas temáticas de maior expressão. Quanto maior a ligação entre os autores, maior será o número de publicações sobre um tema.

Assim, a Figura 2 relevou três clusters principais, identificados pelas cores vermelha, verde e amarela, tendo como autoras centrais Elizabeth Pérez-Chiqués, Gabriela Lotta e Anat Gofen. O cluster formado por Elizabeth Pérez-Chiqués investigou a implementação das políticas de saúde no contexto pandêmico. Nos três grupos de artigos, a ambiguidade das regras aumentou o espaço discricionário dos profissionais da linha de frente, embora na prática tenha ocorrido o efeito contrário para o caso da dispensação de medicamentos para pacientes dependentes em tratamento, provocado pela mediação das organizações que limitaram o espaço de decisão dos burocratas de nível de rua (Pérez-Chiqués et al., 2021). Na sequência, o empreendedorismo de nível de rua e a percepção do público sobre a ação do profissional implementador foram temas abordados por Lotta e Gofen (Gofen et al., 2021; Gofen & Lotta, 2021). De outro modo, houve três clusters de autores que não se associaram com os demais, permanecendo isolados no campo de análise.

A análise de coautoria de países permite avaliar como os autores de um país se relacionam com os de países diferentes, identificando a conexão existente entre eles. Dessa forma, a análise revelou quatro grupos, formados por:

• (i) Brasil, Israel e México;

• (ii) Canadá e Estados Unidos da América;

• (iii) Itália e Suécia;

• (iv) Índia.

Os grupos (i) e (ii) conectaram-se por meio do estudo realizado no México, indicando convergência de pesquisa nesse ponto. Os demais não apresentaram interconexões, permanecendo isolados.

Na análise de coocorrência de palavras, é possível ao pesquisador extrair informações que permitem sugerir novos descritores de busca, contribuindo com as futuras investigações. Desse modo, as palavras de maior recorrência foram “street-level bureaucrats”, “COVID-19” e “discretion”. Em certa medida, o resultado validou os descritores utilizados nesta pesquisa demonstrando que o caminho adotado foi adequado ao objeto de análise. Em continuidade, a Figura 3 traz a análise de cocitação de referência, em que foi aplicada a limitação do número mínimo de três citações. A cocitação de uma referência indica a proximidade conceitual, teórica e/ ou metodológica com outros autores também citados em um mesmo documento, e a intensidade dessa característica revela o grau de relação estabelecido entre eles para um assunto abordado (Grácio, 2016).

Figura 3
Análise de cocitação de referência

A Figura 3 permite extrair informações analíticas relevantes. Em primeiro lugar, pode-se verificar que há predominantemente dois grupos, identificados pelas cores vermelha e verde. Esses grupos são formados pelas referências utilizadas para a elaboração dos artigos (dados de análise da pesquisa) e aparecem em pelo menos três deles. Além disso, as referências de um grupo revelam convergência entre eles. É possível afirmar que os autores que utilizaram uma referência (a) também utilizaram (b), (c) e (n), pois seus temas dialogavam entre si com maior força de conexão. Todavia, percebe-se que em algum momento os grupos se inter-relacionam. Isso significa que os assuntos abordados pelos autores dessa conexão dialogam com ambos os grupos em um ponto específico.

Na análise de acoplamento bibliográfico, identificou-se a utilização de uma ou mais referências em artigos diferentes, demonstrando sua proximidade teórico-conceitual e/ou metodológica e uma “relação implícita entre eles” (Grácio, 2016, pp. 85). Logo, a análise do acoplamento bibliográfico de documentos apontou para a existência de dois clusters.

O primeiro é formado por Cox et al. (2021), Davidovitz et al. (2021), Gofen e Lotta (2021), Malandrino e Sager (2021) e Prusty e Mahapatra (2021). Os trabalhos fazem uma interlocução nas investigações sobre governança e como as respostas governamentais, muitas vezes ambíguas, podem moldar o comportamento dos profissionais da linha de frente de maneiras muito diferentes, além de aumentar sua autonomia na implementação das políticas públicas nos contextos de crise. O segundo cluster, composto de Gofen et al. (2021), Lima-Silva et al. (2020), Meza et al. (2021) e Pérez-Chiqués, Strach e Zuber (2021), forma o grupo de estudos que analisam a emergência de novos papéis e funções e a importância dos burocratas de nível de rua na implementação dos serviços ao cidadão, diante das rápidas mudanças nas políticas em períodos de crise. O artigo de Gofen e Lotta (2021) é uma edição especial dos estudos que tratam da burocracia de nível de rua publicados nos primeiros meses da pandemia e utiliza uma metodologia comparativa dos dados encontrados.

Finalmente, a utilização do software contribuiu significativamente para a análise dos dados ao permitir a compreensão das relações estabelecidas nos estudos coletados, o que indica para futuros pesquisadores os autores a serem consultados nas linhas de pesquisa escolhidas, no entanto o software não permite uma análise textual com formação de nuvem de palavras, classificação hierárquica descendente, análise lexical ou de estatísticas textuais básicas, sendo uma de suas limitações. A utilização de outros softwares gratuitos é indicada para os estudos que se propõem a realizar esse tipo de análise.

Na sequência, serão apresentados os resultados da análise da leitura integral dos artigos, na perspectiva da crise e sua influência, para três categorias analíticas: o espaço discricionário, as estratégias de enfrentamento das pressões e o exercício de papéis na atuação. Essas categorias emergiram após a leitura dos textos, direcionando a análise a seguir.

O espaço discricionário no contexto da crise

Em geral, os formuladores de políticas buscam limitar o espaço de ação no nível de rua, estabelecendo regras não flexíveis para a implementação (Davidovitz et al., 2021). No entanto, durante a pandemia, o movimento deu-se no sentido oposto, na medida em que as diretrizes dos órgãos centrais ampliavam o poder de ação no nível de rua (Malandrino & Sager, 2021; Pérez-Chiqués et al., 2021).

As respostas formais nas políticas públicas setoriais na pandemia ocorreram de forma heterogênea, mudando rapidamente em curtos períodos de tempo, e aumentaram a autonomia dos trabalhadores responsáveis pela implementação. A frequência e a intensidade das mudanças nas políticas foram quase que diárias, expandindo a ambiguidade das regras e dificultando a aderência dos profissionais durante a tomada de decisão em situações extremamente complexas (Cox et al., 2021). As dinâmicas de trabalho dos burocratas de nível de rua mudavam tanto o ambiente de trabalho quanto os procedimentos adotados, sendo alteradas em razão das restrições formais estabelecidas pelos governos nacionais e subnacionais, e seus mecanismos de controle foram comprometidos (Malandrino & Sager, 2021).

A interrupção do contato entre o profissional de nível de rua e o cidadão implicou em sérios problemas para a implementação dos serviços públicos de assistência social (Lima-Silva et al., 2020), de saúde comunitária (Gofen et al., 2021), de assistência a dependentes químicos (Pérez-Chiqués et al., 2021) e para a atuação de policiais, médicos e professores (Davidovitz et al., 2021; Malandrino & Sager, 2021). A rotina do profissional da linha de frente foi alterada com a criação de um ambiente de trabalho remoto, com redução ou suspensão das atividades presenciais com o cidadão/usuário do serviço público e com o aumento da carga de trabalho (Lima-Silva et al., 2020; Malandrino & Sager, 2021).

Na área educacional o distanciamento entre professores e alunos fez com que ocorresse uma transferência de responsabilidades aos profissionais, modificando as práticas pedagógicas e concedendo novos papéis para a sua atuação no ensino, com o aumento de sua carga horária na elaboração de conteúdos e atendimentos não convencionais por telefone fora do horário de aula (Malandrino & Sager, 2021). Para os agentes comunitários da rede socioassistencial, as medidas restritivas de contato trouxeram mudanças profundas para seu trabalho, pois, ao mesmo tempo que havia preocupação com a autoproteção, a carência das pessoas e famílias atendidas era uma realidade a ser considerada ao se escolher adotar as ações de isolamento social (LimaSilva et al., 2020).

No ambiente hospitalar as políticas formais dos documentos diretivos alteraram o modo de operação dos hospitais, com a designação de leitos específicos para o tratamento de Covid-19 (Meza et al., 2021). As cirurgias eletivas e os tratamentos clínicos nesses locais foram suspensos, e os burocratas de nível de rua tiveram de alinhar sua tomada de decisão às mudanças implementadas. A intensidade das interações também foi afetada, na medida em que houve uma mudança na abordagem de ação dos burocratas de nível de rua de cliente-centrada para população-centrada, em razão da escassez de recursos ante o maior número de pacientes atendidos (Meza et al., 2021).

Na assistência à saúde de idosos implementada por cuidadores, a mudança foi no sentido de garantir a não contaminação dos pacientes atendidos que estavam sujeitos às consequências mais prejudiciais da doença (Cox et al., 2021). Adicionalmente, as implicações da pandemia para a autonomia dos profissionais da linha de frente em governos multiníveis são inconclusivas, tendo em vista que há um descompasso de decisões entre governo federal e os estaduais (Gofen & Lotta, 2021).

Desse modo, os estudos revelaram que o espaço de atuação dos burocratas de nível aumentou durante a crise e que essa ampliação foi provocada pela desconexão entre as instâncias de governo e pelas respostas formais que estabeleceram regras ambíguas e complexas de serem colocadas em prática, moldando o comportamento dos profissionais que trabalham no nível de rua. Veremos adiante como os agentes reagiram perante as dificuldades do momento de crise e quais fatores foram determinantes em seu comportamento.

A crise e as estratégias de enfrentamento das pressões (coping)

Os burocratas de nível de rua enfrentam dois tipos de pressão na execução de suas tarefas fora do ambiente de crise, dicotômicos entre si. De um lado, encontra-se um Estado demandante de eficiência na implementação de seus serviços ofertados à população. De outro, há o usuário em busca de atendimento personalizado (Lotta et al., 2018). Todavia, outras formas de pressão emergiram da crise, exigindo novas estratégias de enfrentamento baseadas em cálculos de custo-benefício e na autoproteção contra o risco de contaminação com o vírus (Cox et al., 2021).

O medo de contágio e as incertezas sobre a doença determinaram, de um lado, o heroísmo e a vocação profissional (Lima-Silva et al., 2020) e, de outro, a inação, a segurança e o modo de agir protetivo dos trabalhadores no nível de rua que evitaram o atendimento físico com os usuários de serviços de saúde e assistenciais (Meza et al., 2021; Pérez-Chiqués et al., 2021). As regras formais que mudavam o ambiente de trabalho foram aceitas com maior facilidade do que aquelas que buscaram direcionar suas decisões (Meza et al., 2021). A falta de apoio institucional, que não forneceu os meios de proteção necessários, causou engajamento de resistência e inação por parte dos burocratas de nível de rua (Lima-Silva et al., 2020; Cox et al., 2021).

As estratégias foram tanto cooperativas quanto conflitivas (Bonelli et al., 2019). No primeiro caso, a adesão aos protocolos de segurança, a adaptação de equipamentos de proteção individual diante da escassez de recursos e as novas práticas de implementação adotadas na crise para os cuidados de idosos refletiram em ações de inovação de improvisação. No segundo caso, as ações de autoproteção e a fuga à responsabilidade foram identificadas como formas de resistência de alguns profissionais que evitaram o contato com os pacientes em um comportamento autointeressado (Cox et al., 2021). Cox et al. (2021) apontam que os profissionais da linha de frente responderam às mudanças provocadas pela crise com improvisação, seguida de um discurso de acomodação e de frustração pela incapacidade de mudança do cenário, contentando-se com o que é disponível e colocando-se muitas vezes em risco, com base no senso de dever e com resistência para proteger seus familiares, evitando a sua exposição em tarefas de alto risco de contágio e quando as respostas não forneceram as acomodações de redução dos sacrifícios realizados por eles.

De igual maneira, a falta de profissionais qualificados, de recursos de proteção individual e de informações a respeito dos procedimentos de segurança contra o vírus foi determinante para conformar as relações e interações entre os agentes e o cidadão, interrompendo o processo de construção de vínculos e impactando de maneira negativa a implementação da política (LimaSilva et al., 2020). A crise também trouxe para o debate as condições de trabalho e remuneração perante os sacrifícios feitos na implementação de serviços essenciais (Cox et al., 2021).

Assim, o ambiente de crise revelou novos aspectos das estratégias de enfrentamento das pressões não encontrados em situações normais e que carecem de aprofundamento em pesquisas futuras.

A mudança de papéis em situações de emergência

O acesso do cidadão ao Estado é condicionado pela disponibilidade dos serviços públicos, na medida em que se estabelecem critérios para tal, facilitando esse acesso para alguns e dificultando-o para outros (Lipsky, 2019). Essa função é definida como o processamento de clientes e, em geral, orientada pelo racionamento de recursos, que são limitados, não garantindo a entrega do serviço a todos os usuários. Todavia, durante a pandemia, houve uma mudança na ordem desses papéis. A alta demanda de serviços públicos gerada no contexto da pandemia fez com que a escassez de recursos fosse exacerbada (Prusty & Mahapatra, 2021). Dessa forma, as decisões dos burocratas de nível de rua passaram a ser orientadas de acordo com o número de recursos disponíveis para o atendimento do maior número de pessoas (Meza et al., 2021).

Na saúde, as regras formais de planos de emergência alteraram a disponibilidade dos serviços que deixaram de atender aos procedimentos de rotina para dedicar os leitos e equipamentos hospitalares aos pacientes contaminados e que necessitavam de atendimento especializado (Cox et al., 2021). Conscientização de recursos, equilíbrio em estresse, conscientização no cliente e autocuidado emergiram no ambiente hospitalar como subpapéis desenvolvidos pelos profissionais (Meza et al., 2021). Os policiais passaram a lidar ainda com novas tarefas, como a aplicação de sanções sobre os cidadãos que se recusavam a cumprir as regras de isolamento social, e com a preocupação do risco de contágio, aumentando os conflitos diários entre Estado e usuário (Davidovitz et al., 2021).

Os professores de escolas públicas e privadas que passaram a ensinar remotamente se dedicaram em jornadas extra de trabalho a atender alguns alunos, por meio de tecnologias e de celulares particulares, prestando um atendimento heterogêneo e orientado pelo seu tempo disponível (Malandrino & Sager, 2021). A crise aumentou a vocação profissional desses burocratas, em razão da redução de controle e da ausência de diretrizes claras, fazendo com que eles empregassem mais tempo e recursos para os usuários de seus serviços (Malandrino & Sager, 2021). Na assistência social a insuficiência de recursos, como equipamentos de proteção individual, impactou na implementação, distanciando o Estado do usuário que não recebeu o acompanhamento dos profissionais dessa área, aumentando as gravidades socioeconômicas das pessoas de classes mais baixas (Lima-Silva et al., 2020) e daqueles em tratamento de dependência química (Pérez-Chiqués et al., 2021).

De maneira geral, a insuficiência de recursos e a capacidade administrativa do Estado de gerenciamento durante a crise demonstraram existir relação direta entre as preferências dos burocratas e seus papéis para a implementação no nível de rua.

CONCLUSÃO

Embora as investigações sobre a implementação das políticas públicas no nível de rua tenham avançado nas últimas décadas, a compreensão acerca da atuação desses profissionais em situações de emergência ou crise permanece incipiente e pouco explorada (Lima-Silva et al., 2020). Dessa forma, este estudo buscou entender as influências da crise para a burocracia de nível de rua, explorando a agenda de pesquisa no contexto da pandemia, utilizando o método de revisão integrativa.

Na análise bibliométrica, observou-se um deslocamento da agenda de pesquisa a respeito da implementação, sobretudo no nível de rua, que teve relevante crescimento a partir de fevereiro de 2020, em razão da importância dos profissionais da linha de frente no enfrentamento da doença (Musheno et al., 2021). Os estudos, com abordagens quantitativas, qualitativas e de métodos mistos, investigaram a atuação de médicos, enfermeiros, agentes comunitários de saúde, cuidadores de idosos, policiais, professores e assistentes sociais em oito países das Américas, Europa e Ásia. Estudos em países da África e Oceania não foram encontrados durante a pesquisa. O periódico que concentrou o maior número de publicações foi o Journal of Comparative Policy Analysis. As mídias digitais utilizadas para a coleta de dados em alguns casos demonstraram ser importantes ferramentas em contextos de crise, em que há restrições de contato social, de maneira a permitir a continuidade dos estudos científicos.

A utilização do software VOSviewer 1.6.17 contribuiu significativamente para a análise dos dados ao permitir a compreensão das relações estabelecidas nos estudos coletados, indicando possíveis linhas de pesquisa e os autores que mais se destacaram, no entanto o software possui limitações de análises textuais e de conteúdo que podem ser exploradas em outros programas para complementar a fase de análise de dados das pesquisas.

Na etapa de leitura integral dos textos, os estudos revelaram que o espaço de atuação dos burocratas de nível aumentou durante a crise e que essa expansão foi provocada pela desconexão entre as instâncias de governo e pelas respostas formais que estabeleceram regras ambíguas e complexas de serem colocadas em prática. Os fatores organizacionais, tais como a exacerbação da insuficiência de recursos e de informações, a ambiguidade das regras e a falta de incentivos, influenciaram profundamente o comportamento dos profissionais de nível de rua, ampliando as estratégias de enfrentamento das pressões, com resistência, inovação e improvisação (Cox et al., 2021). Em última instância, as relações e as dinâmicas de interação entre os burocratas de nível de rua e os usuários foram modificadas pelo isolamento social, afetando negativamente na implementação das políticas públicas.

Assim, percebeu-se que contextos de crise como a pandemia influenciam profundamente a implementação no nível de rua, com impactos negativos para o atendimento do usuário. O trabalho possui limitações metodológicas ao ter coletado poucos dados na etapa empírica, embora sejam os existentes para o recorte definido. Todavia, acredita-se que o desenho feito pode ser expandido em futuras investigações, em análises comparativas do comportamento científico para o campo de estudo, que permanece incipiente quando se trata da atuação das burocracias de nível de rua em crises.

Por fim, a pesquisa contribuiu para a melhor compreensão das influências das crises para a implementação de políticas públicas no nível de rua, aumentando o espaço discricionário dos profissionais que lidam com as situações de emergência, além de ter revelado como os fatores organizacionais e relacionais moldam o seu comportamento. Podem-se indicar futuras investigações sobre as consequências emocionais nos profissionais da linha de frente da saúde que trabalharam nos centros de urgência de Covid-19 e a análise da atuação de profissionais que trabalham diariamente com situações de emergência, no contexto da pandemia e de outras crises, como os bombeiros e profissionais dos veículos móveis das redes de urgência e emergência médicas.

• Avaliado pelo processo de double-blind review.

AGRADECIMENTOS

À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig), ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), código de financiamento 001. Agradecimentos adicionais à equipe editorial e aos avaliadores anônimos pelas suas valiosas contribuições, que repercutiram positivamente no presente artigo.

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Editado por

Editor Associado: Felipe Gonçalves Brasil

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  22 Dez 2023
• Data do Fascículo
  2023

Histórico

• Recebido
  10 Set 2021
• Aceito
  02 Ago 2022