Acessibilidade / Reportar erro

Análises ontogenéticas do pericarpo de espécies de Mimosa Linnaeus (Fabaceae, Mimosoideae)

Ontogenetic analysis of the pericarp of species of Mimosa Linnaeus (Fabaceae, Mimosoideae)

Resumos

Os objetivos foram analisar ontogeneticamente frutos de Mimosa daleoides, M. dolens var. anisitsii e M. orthacantha, comparálos e classificá-los corretamente. Coletas realizadas em Botucatu, SP, Brasil, renderam frutos nos vários estádios de desenvolvimento, preparados segundo técnicas anatômicas usuais. Durante o desenvolvimento do pericarpo, emergências dendríticas e espiniformes são formadas, e um meristema adaxial é instalado, originando o endocarpo externo, multisseriado e lignificado na maturidade, e o interno, unisseriado e parenquimático. A estrutura do pericarpo segue o padrão para as Fabaceae, com exocarpo unisseriado, mesocarpo parenquimático e vascularizado, e endocarpo heterogêneo. Em M. daleoides e M. orthacantha, formam-se falsos septos, onde o pericarpo fragmenta-se transversalmente; além disso, tecido lignificado forma-se externamente aos feixes ventrais e ao dorsal. Os frutos destas duas espécies são, portanto, craspédios e Mimosa dolens var. anisitsii forma legumes com deiscência passiva.

anatomia; fruto; Mimosa ; morfologia; ontogênese


The objectives were to analyze ontogenetically the fruits of Mimosa daleoides, M. dolens var. anisitsii and M. orthacantha, comparing themselves and identifying them correctly. Collections were made in Botucatu, São Paulo State, Brazil, and the fruits in several development stages were prepared according to usual anatomical techniques. During pericarp development, dendritics and spine-like emergences are produced, and an adaxial meristem is installed, originating the multiseriate lignified outer endocarp and the uniseriate parenchymatous inner endocarp. The structure of pericarp follows the pattern for Fabaceae, with uniseriate exocarp, parenchymatous and vascularized mesocarp, and heterogeneous endocarp. In M. daleoides and M. orthacantha, false septa are formed where transverse fragmentation of the pericarp occur; moreover, lignified tissue is produced externally to the ventral and dorsal bundles. Therefore, the fruits of these two species are craspedium and M. dolens var. anisitsii produces legumes with passive dehiscence.

anatomy; fruit; Mimosa ; morphology; ontogenesis


Introdução

A divisão de Fabaceae em famílias ou subfamílias tem gerado debates e grandes controvérsias entre os autores. Tradicionalmente é considerada uma única família com três subfamílias Caesalpinioideae, Mimosoideae e Faboideae (Papilionoideae), com exceção de alguns autores, dentre eles Cronquist (1981)Cronquist, A. 1981. An integrated system of classification of flowering plants. Columbia University Press, New York. que prefere reconhecer três famílias distintas (Fabaceae, Caesalpiniaceae e Mimosaceae); contudo esta classificação não vem sendo adotada, devido ao fato destas famílias não constituírem grupos monofiléticos, principalmente Caesalpiniaceae. Sendo assim, este trabalho considera as leguminosas distribuídas numa única família com as três subfamílias (Souza & Lorenzi 2008Souza, V.C. & Lorenzi, H. 2008. Botânica Sistemática. Guia Ilustrado para identificação das famílias de Angiospermas da flora brasileira, baseado em APG II. 2 ed. Editora Plantarum, Nova Odessa.).

De acordo com os autores supracitados, estudos filogenéticos ainda não são suficientes para uma conclusão aceitável em relação às subfamílias de Fabaceae. Assim, mostra-se evidente que Mimosoideae e Faboideae são monofiléticas e Caesalpinioideae é claramente polifilética.

De acordo com Judd et al. (2009)Judd, W.S., Campbell, C.S., Kellog, E.A. & Stevens, P.F. 2009. Sistemática vegetal: Um enfoque filogenético. Editora Artmed, São Paulo. Fabaceae tem distribuição praticamente cosmopolita, sendo a terceira maior família de angiospermas, ocorrendo em uma ampla diversidade de hábitats. Apresentam aproximadamente 630 gêneros e cerca de 18.000 espécies, sendo que Mimosa é o quinto maior gênero dentro da família, ficando atrás somente de Astragalus (2.000 spp.), Acacia (1.000 spp.), Indigofera (700 spp.) e Crotalaria (600 spp.).

No caso de Mimosoideae, algumas podem ser vistas como ornamentais, forrageiras, produtoras de madeira e usadas para a extração de compostos secundários (Elias 1974Elias, T.S. 1974. The genera of Mimosoideae (Leguminosae) in the Southeastern United States. Journal of the Arnold Arboretum 55: 67-87., Lorenzi 1992Lorenzi, H. 1992. Árvores brasileiras. Manual de identificação e cultivo de plantas arbóreas nativas do Brasil. Editora Plantarum, Nova Odessa.). Encontram-se espécies de Mimosa como cercas-vivas, invasoras de pastagens, indicadoras de endemismo e/ou com propriedades medicinais (Camargo-Ricalde 2000Camargo-Ricalde, S.L. 2000. Descripción, distribución, anatomía, composición química y usos de Mimosa tenuiflora (Fabaceae-Mimosoideae) en México. Revista de Biologia Tropical 48: 939-954., Simon & Proença 2000Simon, M.F. & Proença, C. 2000. Phytogeographic patterns of Mimosa (Mimosoideae, Leguminosae) in the Cerrado biome of Brazil: an indicator genus of high-altitude centers of endemism? Biological Conservation 96: 279-296., Carmona et al. 2001Carmona, R., Neto, B.S.C.A. & Pereira, R.C. 2001. Controle de Acacia farnesiana e de Mimosa pteridofita em pastagem. Pesquisa Agropecuária Brasileira 36: 1301-1307.).

Mimosa é o segundo gênero mais abundante de Mimosoideae, com 480 espécies registradas (Elias 1974Elias, T.S. 1974. The genera of Mimosoideae (Leguminosae) in the Southeastern United States. Journal of the Arnold Arboretum 55: 67-87., 1981Elias, T.S. 1981. Mimosoideae. In: R.M. Polhill & P.H. Raven (eds.). Advances in Legume Systematics. Royal Botanic Garden, Kew, pp.143-152., Barroso et al. 1984Barroso, G.M., Peixoto, A.L., Ichaso, C.L.F., Costa, C.G., Guimarães, E.F. & Lima, H.C. 1984. Sistemática de Angiospermas do Brasil. v.2. Imprensa Universitária da Universidade Federal de Viçosa, Viçosa., Stevens 2006Stevens, P.F. 2006. Angiosperm phylogeny website. Disponível em http://www.mobot.org/MOBOT/research/APWeb (acesso em 20-VII-2007).
http://www.mobot.org/MOBOT/research/APWe...
). Nos cerrados brasileiros, foram levantadas 189 espécies de Mimosa, 50% delas endêmicas (Simon & Proença 2000Simon, M.F. & Proença, C. 2000. Phytogeographic patterns of Mimosa (Mimosoideae, Leguminosae) in the Cerrado biome of Brazil: an indicator genus of high-altitude centers of endemism? Biological Conservation 96: 279-296.), sendo o gênero com maior número de espécies da subfamília nesse bioma (Mendonça et al. 1998Mendonça, R.C., Felfili, J.M., Walter, B.M.T., Silva Junior, M.C., Rezende, A.V., Filgueiras, T.S. & Nogueira, P.E. 1998. Flora vascular do cerrado. In: S.M. Sano & S.P. Almeida (eds.). Cerrado. Ambiente e flora. Embrapa-CPAC, Planaltina, pp. 298-556.).

Mimosa daleoides Benth., Mimosa dolens Vell. var. anisitsii (Lindm.) Barneby e Mimosa orthacantha Benth. são espécies arbustivas ocorrentes no Cerrado, potencialmente invasoras, exibindo variados tipos de frutos. Observações preliminares levaram a dúvidas quanto à deiscência e, consequentemente, ao tipo de fruto em M. dolens var. anisitsii e, para as outras duas espécies, quanto ao tipo de inflorescência a partir do qual os frutos se desenvolvem.

Barroso et al. (1999)Barroso, G.M., Morin, M.P., Peixoto, A.L. & Ichaso, C.L.F. 1999. Frutos e sementes. Morfologia aplicada à sistemática de Dicotiledôneas. Editora UFV, Viçosa. descreveram, para Mimosoideae, nove tipos de frutos: legume, folículo, craspédio, criptolomento, sacelo, lomento drupáceo e legumes bacoide, nucoide e legume samaroide.

Craspédios são considerados típicos de Mimosa, como verificado por Lima (1985)Lima, M.P.M. 1985. Morfologia dos frutos e sementes dos gêneros da tribo Mimoseae (Leguminosae-Mimosoideae) aplicada à sistemática. Rodriguésia 37: 53-78., também ocorrendo em espécies do gênero Entada e em Schrankia leptocarpa (Barroso et al. 1999)Barroso, G.M., Morin, M.P., Peixoto, A.L. & Ichaso, C.L.F. 1999. Frutos e sementes. Morfologia aplicada à sistemática de Dicotiledôneas. Editora UFV, Viçosa.. Lima (1985)Lima, M.P.M. 1985. Morfologia dos frutos e sementes dos gêneros da tribo Mimoseae (Leguminosae-Mimosoideae) aplicada à sistemática. Rodriguésia 37: 53-78. e Barroso et al. (1999)Barroso, G.M., Morin, M.P., Peixoto, A.L. & Ichaso, C.L.F. 1999. Frutos e sementes. Morfologia aplicada à sistemática de Dicotiledôneas. Editora UFV, Viçosa. citaram o sacelo como um tipo também encontrado nesse gênero; e Bravato (1974)Bravato, M. 1974. Estudio morfológico de frutos y semillas de las Mimosoideae (Leguminosae) de Venezuela. Acta Botanica Venezuelica 9: 317-361. e Burkart (1979)Burkart, A. 1979. Leguminosas mimosóideas. In: P.R. Reitz (ed.). Flora Ilustrada Catarinense. Herbário Barbosa Rodrigues, Itajaí, pp. 1-299. consideraram, equivocadamente, que o craspédio é um tipo de lomento, resultando em descrições de Mimosa também com esse tipo de fruto.

Além disso, frutos derivados do legume diferem, em grande parte, pelo modo de deiscência, como, por exemplo, o folículo, com deiscência apenas ventral; o lomento, que se fragmenta transversalmente; o sacelo, que se abre transversalmente apenas na região apical do fruto; e o craspédio, que fragmenta o pericarpo assim como o lomento, porém formando replum. Consequentemente, estudos anatômicos e ontogenéticos desses órgãos se fazem necessários para a determinação precisa do padrão de deiscência e, portanto, de uma classificação carpológica eficiente.

A literatura destaca que certas características morfológicas e/ou anatômicas dos frutos de Fabaceae são úteis à taxonomia (Elias 1974Elias, T.S. 1974. The genera of Mimosoideae (Leguminosae) in the Southeastern United States. Journal of the Arnold Arboretum 55: 67-87., Pate & Kuo 1981Pate, J.S. & Kuo, J. 1981. Anatomical studies of legume pods - a possible tool in taxonomic research. In: R.M. Polhill & P.H. Raven (eds.). Advances in Legume Systematics. Royal Botanic Garden, Kew, pp. 903-912., Barroso et al. 1984Barroso, G.M., Peixoto, A.L., Ichaso, C.L.F., Costa, C.G., Guimarães, E.F. & Lima, H.C. 1984. Sistemática de Angiospermas do Brasil. v.2. Imprensa Universitária da Universidade Federal de Viçosa, Viçosa., 1999Barroso, G.M., Morin, M.P., Peixoto, A.L. & Ichaso, C.L.F. 1999. Frutos e sementes. Morfologia aplicada à sistemática de Dicotiledôneas. Editora UFV, Viçosa., Gunn 1984Gunn, C.R. 1984. Fruits and seeds of genera in the subfamily Mimosoideae (Fabaceae). Technical Bulletin 1681: 1-194., Lima 1985Lima, M.P.M. 1985. Morfologia dos frutos e sementes dos gêneros da tribo Mimoseae (Leguminosae-Mimosoideae) aplicada à sistemática. Rodriguésia 37: 53-78.), a análises evolutivas (Fahn & Zohary 1955Fahn, A. & Zohary, M. 1955. On the pericarpial structure of the legumen, its evolution and relation to dehiscence. Phytomorphology 5: 99-111.) e às correlações filogenéticas (Pate & Kuo 1981Pate, J.S. & Kuo, J. 1981. Anatomical studies of legume pods - a possible tool in taxonomic research. In: R.M. Polhill & P.H. Raven (eds.). Advances in Legume Systematics. Royal Botanic Garden, Kew, pp. 903-912., Gunn 1984Gunn, C.R. 1984. Fruits and seeds of genera in the subfamily Mimosoideae (Fabaceae). Technical Bulletin 1681: 1-194.).

Baseando-se nas considerações citadas, o presente trabalho tem por objetivos a análise morfoanatômica e ontogenética do pericarpo de três espécies que são comuns no Cerrado (Mimosa daleoides, Mimosa dolens var. anisitsii e Mimosa orthacantha), com frutos relativamente diferentes no mesmo gênero e proporcionar alguma ferramenta de cunho sistemático e/ou filogenético, por meio da correta análise e classificação dos tipos de frutos formados.

Material e métodos

Baseando-se em Dutra e Morin (2013)Dutra, V.F. & Morin, M.P. 2013. Mimosa. In: Lista de Espécies da Flora do Brasil. Jardim Botânico do Rio de Janeiro. Disponível em http://floradobrasil.jbrj.gov.br/jabot/floradobrasil/FB31121 (acesso em 22-V-2013).
http://floradobrasil.jbrj.gov.br/jabot/f...
, os principais caracteres relacionados com origem, hábito, localizações e aspectos fenológicos das espécies estudadas, encontram-se na tabela 1.

Tabela 1
Caracteres gerais e aspectos fenológicos de espécies analisadas de Mimosa Linnaeus.

Table 1. General characters and phenological aspects of the analyzed species of Mimosa Linnaeus.


Foram coletados botões florais, flores em antese e frutos em vários estádios de desenvolvimento para as três espécies de Mimosa. As populações de M. daleoides e M. orthacantha são densas e encontram-se nos bordos da rodovia Gastão dal Farra, entre os quilômetros cinco e sete (22º56'S e 48º26'W), no município de Botucatu, São Paulo, Brasil. Mimosa dolens var. anisitsii apresenta indivíduos isolados, porém bem distribuídos no distrito de Rubião Junior, município de Botucatu, São Paulo, Brasil (22º53'S e 48º29'W), onde foram coletados. Ramos vegetativos e férteis das três espécies foram depositados no Herbário "Irina D. Gemtchujnicov" (BOTU), do Departamento de Botânica, UNESP, Campus de Botucatu, registrados sob os números: 20.556 (M. daleoides), 19.497 (M. dolens var. anisitsii) e 19.374 (M. orthacantha).

O material coletado foi fixado em FAA 50 (Johansen 1940Johansen, D.A. 1940. Plant microtechnique. New York, McGraw-Hill Book.) e conservado em álcool 70% (Jensen 1962Jensen, W.A. 1962. Botanical histochemistry: principles and practice. W.H. Freeman, San Francisco.). Parte das amostras foi desidratada em série etílica e incluída em metacrilato Leica®, de acordo com o fabricante. Os cortes foram feitos em micrótomo de rotação com espessuras variando de 7 a 12 mm, corados com azul de toluidina 0,05% em pH 4,7 (O'Brien et al. 1964O'Brien, T.P., Feder, N., & McCully, M.E. 1964. Polychromatic staining of plant cell walls by toluidine blue O. Protoplasma 59: 368-373.) e montados em resina sintética.

Foram realizados testes histoquímicos usuais, tais como: vermelho de rutênio, para identificar polissacarídeos diversos e pectinas (Johansen 1940Johansen, D.A. 1940. Plant microtechnique. New York, McGraw-Hill Book., Jensen 1962Jensen, W.A. 1962. Botanical histochemistry: principles and practice. W.H. Freeman, San Francisco.); floroglucinol acrescido de ácido clorídrico, para evidenciar paredes lignificadas (Johansen 1940Johansen, D.A. 1940. Plant microtechnique. New York, McGraw-Hill Book.); Sudan IV, para a localização de substâncias lipídicas (Johansen 1940Johansen, D.A. 1940. Plant microtechnique. New York, McGraw-Hill Book.); lugol, para a detecção de amido (Johansen 1940Johansen, D.A. 1940. Plant microtechnique. New York, McGraw-Hill Book.); cloreto férrico acrescido de carbonato de sódio, para verificar a ocorrência de compostos fenólicos (Johansen 1940Johansen, D.A. 1940. Plant microtechnique. New York, McGraw-Hill Book.); e azul mercúrio de bromofenol, para a verificação de proteínas (Mazia et al. 1953Mazia, D., Brewer, P.A. & Alfert, M. 1953. The cytochemistry staining and measurement of protein with mercuric bromophenol blue. Biological Bulletin 104: 57-67.).

Além disso, realizou-se maceração da região esclerenquimática dos pericarpos, seguindo-se a técnica de Franklin (1945)Franklin, G.L. 1945. Preparation of thin section of the synthetic resins and wood-resin composites, and a new macerating method for wood. Nature 155: 51., modificada conforme sugerido por Kraus & Arduin (1997)Kraus, J.E. & Arduin, M. 1997. Manual básico de métodos em morfologia vegetal. EDUR, Seropédica., montando-se em gelatina glicerinada.

O conceito adotado para a descrição das camadas pericárpicas seguiu a nomenclatura no sentido estrito referida por Roth (1977)Roth, I. 1977. Fruits of Angiosperms. Gebrüder Borntraeger, Berlin., onde a epiderme externa ovariana origina o exocarpo, o mesofilo ovariano produz o mesocarpo e a epiderme interna constitui o endocarpo. A terminologia adotada foi baseada também em Gunn (1984)Gunn, C.R. 1984. Fruits and seeds of genera in the subfamily Mimosoideae (Fabaceae). Technical Bulletin 1681: 1-194. e Barroso et al. (1999)Barroso, G.M., Morin, M.P., Peixoto, A.L. & Ichaso, C.L.F. 1999. Frutos e sementes. Morfologia aplicada à sistemática de Dicotiledôneas. Editora UFV, Viçosa..

Os resultados foram descritos com base no grau de desenvolvimento do pericarpo, especialmente do endocarpo, como comumente adotado para os frutos de leguminosas, da seguinte maneira: Estádio I - representado por flores em pré-antese e antese, no qual o ovário apresenta tecidos meristemáticos com poucas células diferenciadas e com raras divisões; Estádio II - representado pela flor em pós-antese e fruto em início de desenvolvimento, marcado por intensa atividade meristemática; Estádio III -alongamento celular, observada nos frutos jovens. Os filetes não são mais visualizados e os frutos mostram coloração verde em M. daleoides e M. dolens var. anisitsii e tons de roxo e verde em M. orthacantha; Estádio IV - maturação do pericarpo e deiscência. Ao final, o laminário confeccionado foi analisado por meio de estereomicroscópio EZ4D Leica e microscópio óptico Olympus BX 50; os resultados foram documentados com fotografias tiradas com câmera digital Canon Power A95.

Resultados

O período de floração das três espécies é coincidente, iniciando no mês de setembro, com frutos sendo formados de outubro a dezembro, quando se mantém a produção de novas flores, de maneira contínua. Mimosa orthacantha difere das demais espécies em estudo com relação à formação dos frutos, que ocorre somente no mês de dezembro com rápido desenvolvimento. A produção de flores, nessa espécie, é contínua desde setembro, no entanto, as flores mais precoces sofrem abscisão logo após a antese.

Estádio I – O ovário é estipitado (figura 1), unicarpelar, unilocular, de placentação marginal e produz cerca de três a cinco óvulos em Mimosa daleoides e M. orthacantha, e dois a quatro em M. dolens var. anisitsii.

Figuras 1-7
Estrutura ovariana, Estádio I. Mimosa daleoides (2), Mimosa dolens var. anisitsii (4-7) e Mimosa orthacantha (1, 3). Secções longitudinais (1-3, 7), secções transversais (4-6). 1. Vista geral do ovário estipitado. 2-3. Detalhes da parede ovariana, respectivamente com e sem emergências em formação. 4. Aspecto da região de sutura do carpelo (seta) em ovário de botão floral. 5-6. Respectivamente, região ventral e dorsal; notar feixes colaterais com idioblastos secretores (ponta de seta). 7. Parede ovariana com idioblastos secretores alinhados longitudinalmente (ponta de seta: parede entre dois idioblastos). cp: cordão procambial, ee: epiderme externa, ei: epiderme interna, em: emergência, et: estípite, fd: feixe vascular dorsal, fl: feixe vascular lateral, fv: feixe vascular ventral, me: mesofilo, ov: óvulo, pl: placenta, *: conteúdo fenólico. Barras: 125 μm (1), 20 μm (2), 25 μm (3, 7), 50 μm (4-6).

Figures 1-7. Ovary, Stage I. Mimosa daleoides (2), Mimosa dolens var. anisitsii (4-7) e Mimosa orthacantha (1, 3). Longitudinal sections (1-3, 7), transverse sections (4-6). 1. Ovary general view. 2-3. Details of the ovary wall respectively with and without emergences formation. 4. Aspect of the carpel suture region (arrow) in the ovary of the floral bud. 5-6. Respectively, the ventral and dorsal region; note collateral bundles with secretory idioblasts (arrowhead). 7. Ovary wall with secretory idioblasts longitudinally aligned (arrowhead: wall between two idioblasts). cp: procambial strand, ee: outer epidermis, ei: inner epidermis, em: emergence, et: stipe, fd: dorsal vascular bundle, fl: lateral vascular bundle, fv: ventral vascular bundle, me: mesophyll, ov: ovule, pl: placenta, * phenolic content. Bars: 125 mm (1), 20 mm (2), 25 mm (3, 7), 50 mm (4-6).


A parede ovariana apresenta epiderme externa unisseriada, glabra em Mimosa dolens var. anisitsii e com tricomas glandulares em início de formação nas outras duas espécies. Estômatos podem ser observados em todas as fases de desenvolvimento do pericarpo, sendo mais raros em M. daleoides. Células epidérmicas e subepidérmicas externas de M. daleoides e M. dolens var. anisitsii começam a se dividir e iniciam a formação de emergências (figura 2), que se alongam durante o desenvolvimento dos frutos.

O mesofilo mostra cerca de três camadas de células parenquimáticas em Mimosa daleoides (figura 2) e quatro em M. dolens var. anisitsii e M. orthacantha (figura 3). A vascularização, inicialmente procambial no botão floral (figura 4), na antese passa a ser constituída por dois feixes colaterais na região ventral (figura 5), por um feixe dorsal e dois laterais a ele, também colaterais (figura 6). Em M. dolens var. anisitsii, durante a antese, os feixes ventrais, o dorsal e os dois laterais a ele apresentam idioblastos fenólicos de grande calibre, voltados para o floema. Em secção longitudinal, esses mesmos idioblastos mostram-se alinhados com conteúdo granular (figura 7).

Idioblastos fenólicos são observados margeando o feixe dorsal em direção à cavidade seminal de Mimosa daleoides e M. dolens var. anisitsii, representando duas camadas de células na primeira espécie e quatro a cinco na segunda (figura 6); na região ventral, esses idioblastos formam cerca de quatro camadas de células em M. daleoides e são mais isolados em M. orthacantha.

Aepiderme interna é unisseriada nas três espécies (figuras 2-3). Observam-se compostos fenólicos nas camadas subepidérmicas externa e interna de Mimosa daleoides (figura 2), nas células epidérmicas e subepidérmicas de M. dolens var. anisitsii (figuras 5-6) e apenas na camada subepidérmica externa de M. orthacantha (figura 3).

Transversalmente, permanece distinta, em algumas secções, a região de sutura do carpelo de Mimosa dolens var. anisitsii (figura 4) e M. orthacantha.

Estádio II - A flor em pós-antese é caracterizada pelo murchamento e abscisão das anteras, permanecendo alguns filetes. A coloração da inflorescência muda como um todo, passando de amarelas para tons de marrom em Mimosa daleoides e de rosadas para roxo escuro nas demais espécies.

O exocarpo tem células que exibem apenas divisões celulares anticlinais e outras que apresentam outros planos, como nas emergências. Estas emergências, iniciadas no estádio anterior em Mimosa daleoides e M. dolens var. anisitsii, começam a se formar nesta fase em M. orthacantha (figura 8). O sentido de crescimento dessas emergências é acrópeto em M. dolens var. anisitsii (figura 9) e M. orthacantha. Em M. daleoides, este desenvolvimento se dá de maneira perpendicular à superfície do pericarpo (figura 10). Nesta última espécie, as emergências mostram novas projeções sendo formadas. Em M. orthacantha, essas emergências restringem-se às regiões dorsal e ventral, enquanto nas outras duas espécies ocorrem dispersas por toda a superfície. Os tricomas glandulares de M. daleoides e M. orthacantha, agora também observados em M. dolens var. anisitsii, apresentam pedúnculo unisseriado e ápice secretor unicelular na primeira espécie (figura 11) e uni ou multicelular nas outras duas (figura 12).

Figuras 8-17
Estádio II. Mimosa daleoides (10-11), Mimosa dolens var. anisitsii (9, 12-15) e Mimosa orthacantha (8, 16-17). Secções longitudinais (9-10, 12-13, 15, 17), secções transversais (8, 11, 14, 16). 8. Pericarpo com emergência e tricoma glandular em formação. 9. Fruto com emergências acrópetas. 10. Pericarpo com emergências perpendiculares; notar região mediana do mesocarpo com células em divisão (seta) e o meristema adaxial. 11-12. Tricomas glandulares com porção secretora unicelular e multicelular respectivamente. 13. Detalhe da região lateral do fruto; notar as emergências em formação, o mesocarpo com divisões (seta) e a instalação do meristema adaxial. 14. Pericarpo com cristais, idioblastos secretores de um feixe lateral alinhados e meristema adaxial instalado. 15. Formação de canais secretores; observar a parede sendo reabsorvida entre dois idioblastos secretores (ponta de seta). 16. Vista geral pericarpo; observar a descontinuidade do endocarpo nas regiões ventral e dorsal (dupla ponta de seta). 17. Detalhe da formação dos falsos septos transversais. cr: cristal, em: emergência, en: endocarpo, ex: exocarpo, fd: feixe vascular dorsal, fl: feixe vascular lateral, fv: feixe vascular ventral, is: idioblasto secretor, ma: meristema adaxial, mc: mesocarpo, se: semente, sp: falso septo, tg: tricoma glandular, *: conteúdo fenólico. Barras: 50 μm (8, 10-15), 200 μm (9), 100 μm (16-17).

Figures 8-17. Stage II. Mimosa daleoides (10-11), Mimosa dolens var. anisitsii (9, 12-15) and Mimosa orthacantha (8, 16-17). Longitudinal sections (9-10, 12-13, 15, 17), transverse sections (8, 11, 14, 16). 8. Pericarp with an emergence and glandular trichomes in training. 9. Fruit with acropetal emergences. 10. Pericarp with perpendicular emergences; note the median region of the mesocarp with dividing cells (arrow) and the adaxial meristem. 11-12. Glandular trichomes respectively with unicellular and multicellular secretory portion. 13. Detail of the lateral region of the fruit; note the emergences formation, mesocarp with divisions (arrow) and the adaxial meristem installation. 14. Pericarp with crystals, secretory idioblasts parallel to a lateral bundle and the adaxial meristem installed. 15. Formation of secretory ducts; observe the absorption of the cell wall between two idioblasts (arrowhead). 16. Pericarp general view; observe the discontinuity of the endocarp in ventral and dorsal regions (double arrowhead). 17. Detail of the transverse false septa formation. cr: crystal, em: emergence, en: endocarp, ex: exocarp, fd: dorsal vascular bundle, fl: lateral vascular bundle, fv: ventral vascular bundle, is: secretory idioblast, ma: adaxial meristem, mc: mesocarp, se: seed, sp: false septum, tg: glandular trichome, * phenolic content. Bars: 50 mm (8, 10-15), 200 mm (9), 100 mm (16-17).


O mesocarpo apresenta células em divisão em todos os sentidos, principalmente nas camadas medianas, que não acumulam compostos fenólicos (figuras 10, 13). Idioblastos cristalíferos são observados em Mimosa dolens var. anisitsii e M. orthacantha, sendo mais dispersos em M. orthacantha; eles ocorrem entre duas a três camadas próximas do endocarpo em M. dolens var. anisitsii (figura 14). Cordões procambiais estão imersos por toda a lateral do mesocarpo nas três espécies, porém, ao final deste estádio, M. dolens var. anisitsii exibe feixes diferenciados e do tipo colateral. Para esta última espécie, amplos idioblastos fenólicos ocorrem juntamente com os feixes laterais (figura 14). Esses idioblastos são alinhados longitudinalmente e, em alguns locais, a parede entre duas células adjacentes se rompe, formando canais secretores. Mimosa daleoides e M. orthacantha finalizam esse estádio ainda com cordões procambiais na região lateral do mesocarpo.

Os feixes ventrais e dorsal de Mimosa dolens var. anisitsii e M. orthacantha apresentam grande quantidade de células secretoras dispostas longitudinalmente junto ao floema, as quais também formam longos canais secretores (figura 15); esses canais são produzidos por células alinhadas longitudinalmente que, assim como nos feixes da região lateral do mesocarpo de M. dolens var. anisitsii, apresentam reabsorção das paredes celulares anticlinais, constituindo canais lisígenos, sem epitélio secretor distinto. Em M. daleoides não foram observados canais nem mesmo células secretoras associadas a nenhum dos feixes vasculares.

O endocarpo mostra muitas divisões celulares, especialmente periclinais, constituindo o meristema adaxial (figuras 10, 13-14). É a região que mais exibe modificações ao longo do desenvolvimento do fruto. Em geral, apresenta três camadas de células pequenas no início, formando uma faixa que se interrompe nas faces ventral e dorsal, não havendo continuidade do endocarpo de uma valva com o da outra; nesta região, observa-se apenas uma camada de células (figura 16).

Substâncias fenólicas começam a ser acumuladas na camada mais interna do endocarpo de Mimosa orthacantha, onde também é possível visualizar raros estômatos. Nesta espécie e em M. daleoides, a parede celular voltada para a cavidade seminal inicia espessamento por substâncias pécticas, principalmente nas regiões entre as sementes; nestas, a parede interna de uma valva se aproxima da outra e ambas se encostam, formando falsos septos transversais que subdividem a cavidade seminal (figura 17).

Ao final desse estádio, o endocarpo mostra-se dividido em dois estratos, o externo, multisseriado, com células pequenas, e o interno, unisseriado e com células tendendo a paliçádicas (figuras 16-17). Em Mimosa orthacantha, começam a ficar evidentes duas regiões no endocarpo externo, uma faixa iniciando alongamento celular longitudinal e outra perpendicular a ela. Nas outras espécies, o endocarpo externo é homogêneo.

Estádio III - Nas três espécies, as emergências acumulam grande quantidade de substâncias fenólicas e mostram dendríticas em Mimosa daleoides (figura 18) e espiniformes nas outras espécies (figura 19); a partir deste estádio, passa a ocorrer o depósito de lignina nas paredes celulares. Raros estômatos foram observados no exocarpo de M. daleoides. Nas três espécies, as células do exocarpo apresentam paredes mais espessas, fina cutícula e conteúdo fenólico; em M. daleoides, a parede periclinal externa mostra-se levemente convexa (figura 20), exceto nas regiões dorsal e ventral, onde se tornam realmente convexas; nas outras espécies, as células encontram-se levemente alongadas no sentido tangencial (figura 21).

Figuras 18-22
Estádio III. Mimosa daleoides (18, 20), Mimosa dolens var. anisitsii (19, 22), Mimosa orthacantha (21). Secção longitudinal (20), secções transversais (18-19, 21-22). 18-19. Frutos com emergências dendríticas e espiniformes respectivamente. 20. Detalhe do pericarpo com parede periclinal externa do exocarpo convexa e emergência dendrítica. 21. Região dorsal, com formação de esclerênquima externo aos feixes; no destaque, notar o alongamento das células do endocarpo externo (as setas indicam os sentidos). 22. Pericarpo com estratificação do mesocarpo e endocarpo dividido em porção externa e interna. em: emergência, en: endocarpo, er: endocarpo externo, ex: exocarpo, fd: feixe vascular dorsal, fi: fibras, fl: feixe vascular lateral, fv: feixe vascular ventral, in: endocarpo interno, mc: mesocarpo, se: semente, *: conteúdo fenólico. Barras: 100 μm (18, 21-22), 250 μm (19), 50 μm (20).

Figures 18-22. Stage III. Mimosa daleoides (18, 20), Mimosa dolens var. anisitsii (19, 22), Mimosa orthacantha (21). Longitudinal section (20), transverse sections (18-19, 21-22). 18-19. Fruits respectively with dendritic and spine-like emergences. 20. Detail of the pericarp with convex outer periclinal walls and a dendritic emergence in the exocarp. 21. Dorsal region with sclerenchyma external to the bundles; in the detail, note the elongation of the outer endocarp cells (arrows indicate directions). 22. Pericarp with stratified mesocarp and endocarp divided in an inner and outer portion. em: emergence, en: endocarp, er: outer endocarp, ex: exocarp, fd: dorsal vascular bundle, fi: fibers, fl: lateral vascular bundle, fv: ventral vascular bundle, in: inner endocarp, mc: mesocarp, se: seed, * phenolic content. Bars: 100 mm (18, 21-22), 250 mm (19), 50 mm (20).


Próximo à maturação, o número de camadas celulares no mesocarpo varia entre as espécies, com cerca de cinco a sete camadas em Mimosa daleoides (figura 18), oito a 10 em M. orthacantha (figura 21) e 10 a 15 em M. dolens var. anisitsii (figura 22). As células subexocárpicas são menores e com substâncias fenólicas no seu interior em M. daleoides, apresentando aspecto colenquimatoso em M. orthacantha e M. dolens var. anisitsii (figura 23), principalmente sob os estômatos. Em M. dolens var. anisitsii, nota-se uma estratificação no mesocarpo devido à deposição de compostos fenólicos, que se concentra nas camadas mais externa e interna (figura 24); a região mais interna do mesocarpo de M. daleoides e de M. dolens var. anisitsii mostra células volumosas e com substâncias fenólicas (figuras 20, 22), ocorrendo paredes mais delgadas em M. orthacantha (figura 21). Notam-se idioblastos cristalíferos contendo drusas ou cristais prismáticos em M. daleoides e apenas cristais prismáticos em M. dolens var. anisitsii e M. orthacantha. Os feixes vasculares laterais são também do tipo colateral, com fibras floemáticas em formação em M. dolens var. anisitsii. Nessa espécie, ainda é possível visualizar cordões de células procambiais. Em M. orthacantha, assim com já descrito para M. dolens var. anisitsii, os feixes laterais passam a apresentar canais secretores (figura 25).

Figuras 23-28
Estádio III. Mimosa dolens var. anisitsii (23-24) e Mimosa orthacantha (25-28). Secções longitudinais (23, 25, 28), secções transversais (24, 26-27). 23. Detalhe do exocarpo, evidenciando um estômato, e de parte do mesocarpo, com células colenquimatosas. 24. Região ventral; notar estratificação do mesocarpo e presença de tricomas endocárpicos internos (seta). 25. Detalhe de feixe lateral com canais secretores (ponta de seta: parede em reabsorção). 26. Detalhe de um feixe ventral, destacando o câmbio. 27. Endocarpo das duas valvas no falso septo, evidenciando o coalescimento (seta). 28. Região de falso septo com as células do endocarpo externo em lignificação. aa: ápice do artículo, ba: base do artículo, ca: câmbio, ce: complexo estomático, co: célula colenquimatosa, cs: cavidade seminal, er: endocarpo externo, ex: exocarpo, fi: fibras, fl: feixe vascular lateral, fv: feixe vascular ventral, in: endocarpo interno, mc: mesocarpo, pf: parênquima fundamental, sp: falso septo, *: conteúdo fenólico. Barras: 50 μm (23, 25-27), 200 μm (24, 28).

Figures 23-28. Stage III. Mimosa dolens var. anisitsii (23-24) and Mimosa orthacantha. (25-28). Longitudinal sections (23, 25, 28), transverse sections (24, 26-27). 23. Detail exocarp showing a stoma, and of a part of the collenchymatous mesocarp. 24. Ventral region; note the stratification of the mesocarp and the presence of inner endocarp trichomes (arrow). 25. Detail of a lateral bundle with secretory ducts (arrowhead: wall reabsorption). 26. Detail of a ventral bundle highlighting the cambium. 27. Endocarp of the two valves in the false septum, showing the coalescence (arrow). 28. False septum region with lignification of the outer endocarp cells. aa: article apex, ba: article base, ca: cambium, ce: stoma complex, co: collenchymatous cell, cs: seed chamber, er: outer endocarp, ex: exocarp, fi: fibers, fl: lateral vascular bundle, fv: ventral vascular bundle, in: inner endocarp, mc: mesocarp, pf: ground parenchyma, sp: false septum, *: phenolic content. Bars: 50 mm (23, 25-27), 200 mm (24, 28).


Nas três espécies, nos feixes ventrais, no dorsal e nos laterais a ele, observa-se o câmbio, porém com restrito acréscimo de tecidos vasculares secundários (figura 26). Além disso, também nestes feixes, é evidente a presença dos canais secretores nas três espécies, porém em Mimosa daleoides não foram verificados idioblastos secretores precedendo os canais. Para M. dolens var. anisitsii, apesar de já haver canais formados, ainda podem ser visualizados idioblastos secretores alinhados, principalmente nestas regiões.

Fibras começam a ser formadas externamente aos feixes ventrais e ao dorsal e seus dois laterais em Mimosa daleoides e M. orthacantha (figura 21). Externamente a essas células há, ainda, duas camadas de parênquima mesocárpico (figura 21).

O endocarpo externo está composto por três camadas de células alongadas e em início de espessamento parietal. A camada mais externa mostra células isodiamétricas, com pequenos cristais prismáticos, também iniciando espessamento parietal. Em Mimosa orthacantha, conforme há espessamento das paredes celulares de todo o endocarpo externo, fica mais evidente a diferença no sentido de alongamento celular; as duas ou três camadas de células mais externas, exceto a camada cristalífera, se alongam perpendicularmente ao maior sentido do fruto, e a camada mais interna, geralmente única, se alonga no sentido longitudinal do fruto (figura 21). Ao final desse estádio, observam-se fibras e esclereídes constituindo esta camada rígida nas três espécies.

O endocarpo interno permanece unisseriado, com acúmulo de substâncias fenólicas e células levemente paliçádicas de superfície convexa; nas regiões delimitantes de cavidades seminais, estas células são mais alongadas, constituindo tricomas que se entrelaçam (figuras 24, 27), exceto em Mimosa daleoides, onde as células podem ser menores em algumas regiões.

Nas regiões anteriores, onde havia a justaposição do endocarpo interno das duas faces, começam a ser observadas células de paredes delgadas e arranjadas aleatoriamente, evidenciando uma descontinuidade por todo o endocarpo de Mimosa daleoides e M. orthacantha (figura 28), que logo envolve o meso e o exocarpo, tornando-se visíveis externamente. Os falsos septos também ocorrem em M. dolens var. anisitsii, sendo visíveis apenas internamente, havendo um leve coalescimento das paredes celulares do endocarpo interno; nestes pontos, observam-se grupos de células reduzidas e de parede delgada.

Análises de toda a extensão do pericarpo das três espécies mostram que não há grande variação anatômica ao longo do fruto, a não ser pela presença de tecido esclerenquimático no ápice do pericarpo de Mimosa orthacantha e pela presença de células lignificadas e alongadas no sentido do fruto, logo internamente ao exocarpo (figura 29), unindo-se na base de cada artículo de M. daleoides.

Figuras 29-35
Estádio IV. Mimosa daleoides (29-30, 32, 34), Mimosa dolens var. anisitsii (31) e Mimosa orthacantha (33, 35). Secções longitudinais (29, 34), secções transversais (30-33, 35). 29. Região basal de artículo. 30-31. Pericarpo próximo à maturidade. 32-33. Região lateral de pericarpo seco e deiscente. 34. Região de falso septo. 35. Região ventral do fruto próximo à maturidade após reação que evidencia tecidos lignificados. aa: ápice do artículo, ba: base do artículo, em: emergência, er: endocarpo externo, ex: exocarpo, fi: fibras, fv: feixe vascular ventral, in: endocarpo interno, mc: mesocarpo, sp: falso septo, *: conteúdo fenólico. Barras: 200 μm (29, 31), 50 μm (30, 32-33), 100 μm (34), 250 μm (35).

Figures 29-35. Stage IV. Mimosa daleoides (29-30, 32, 34), Mimosa dolens var. anisitsii (31) and Mimosa orthacantha (33, 35). Longitudinal sections (29, 34), transverse sections (30-33, 35). 29. Basal region of an article. 30-31. Pericarp near the maturity. 32-33. Lateral region of dry dehiscent pericarp. 34. Region of a false septum. 35. Ventral region of the fruit near the maturity after reaction showing lignified tissues. aa: article apex, ba: article base, em: emergence, er: outer endocarp, ex: exocarp, fi: fibers, fv: ventral vascular bundle, in: inner endocarp, mc: mesocarp, sp: false septum, * : phenolic content. Bars: 200 mm (29, 31), 50 mm (30, 32-33), 100 mm (34), 250 mm (35).


Estádio IV - O exocarpo permanece unisseriado, com paredes de espessamentos pécticos, recoberto por fina cutícula. O formato das células varia entre as espécies estudadas, exibindo a parede periclinal externa levemente convexa em Mimosa daleoides (figura 30) e células alongadas tangencialmente em M. dolens var. anisitsii (figura 31) e M. orthacantha. Nas três espécies, as células das emergências apresentam paredes lignificadas, permanecendo rígidas e intactas durante a desidratação e deiscência dos frutos.

O mesocarpo é comprimido com a maturação do fruto (figura 32), sendo possível, ainda, a visualização de algumas camadas celulares em Mimosa dolens var. anisitsii e M. orthacantha (figura 33), que apresentam as células colenquimatosas.

O endocarpo externo permanece intacto devido às fibras e esclereídes (figuras 32-33), além de células com cristais, também de paredes espessas e lignificadas. O endocarpo interno permanece com paredes delgadas, com substâncias fenólicas em todas as espécies; quando o pericarpo desidrata, suas células são comprimidas e rompem-se em algumas regiões (figura 32).

O tecido formado nos falsos septos constitui o tecido de separação em Mimosa daleoides (figura 34) e M. orthacantha, dividindo o pericarpo em vários artículos monospérmicos. O tecido esclerenquimático do endocarpo externo nessas espécies é interrompido ao longo da valva, mais especificamente na região de contato entre as valvas (figura 35); entretanto, o que ocorre em M. orthacantha é a ligação desse tecido de uma valva com a outra apenas na região basal de cada artículo monospérmico (observar a figura 28). Em M. daleoides, o que liga uma valva à outra é o tecido esclerenquimático na região periférica do mesocarpo, presente apenas na base de cada artículo (figura 29). Na região apical dos artículos, não há ligação do tecido lignificado, permanecendo apenas células parenquimáticas. O aparelho de deiscência é, então, composto por tecido lignificado do endocarpo externo de M. daleoides e M. orthacantha e tecido parenquimático na região de coalescimento das valvas. Além disso, o replum é formado, contendo os feixes ventrais de um lado e o dorsal, acompanhado pelos dois laterais próximos, de outro. Como houve a formação de um tecido esclerenquimático externamente a esses feixes (figura 35), a separação entre o replum e as valvas é dada pela compressão e ruptura do tecido parenquimático localizado entre os feixes e a cavidade seminal (figuras 36-37).

Figuras 36-41
Estádio IV. Mimosa daleoides (36, 39), Mimosa dolens var. anisitsii (38, 41) e Mimosa orthacantha (37, 40). Secções transversais (36-38). 36. Região dorsal separada do restante do pericarpo, formando o replum (seta: local de separação). 37. Região ventral do pericarpo próximo à deiscência (setas: início de formação do replum). 38. Região dorsal do pericarpo; notar poucas células lignificadas externamente aos feixes (ponta de seta) e o parênquima de separação. 39-41. Aspecto geral dos frutos maduros. 39. Racemo com craspédios. 40. Glomérulo de craspédios. 41. Glomérulo de legumes. em: emergência, fd: feixe vascular dorsal, fi: fibras, rp: replum, ts: tecido de separação. Barras: 100 μm (36), 200 μm (37-38), 2 mm (39), 6 mm (40), 5 mm (41).

Figures 36-41. Stage IV. Mimosa daleoides (36, 39), Mimosa dolens var. anisitsii (38, 41) and Mimosa orthacantha (37, 40). Transverse sections (36-38). 36. Dorsal region separated from the rest of the pericarp, constituting the replum (arrow: separation region). 37. Ventral region near the pericarp dehiscence (arrows: early stage of replum formation). 38. Dorsal region of the pericarp; note few lignified cells externally to the bundles (arrowhead) and the separation parenchyma. 39-41. General aspect of the mature fruits. 39. Raceme with craspedium. 40. Glomerule of craspedium. 41. Glomerule of legumes. em: emergence, fd: dorsal vascular bundle, fi: fibers, rp: replum, ts: separation tissue. Bars: 100 mm (36), 200 mm (37-38), 2 mm (39), 6 mm (40), 5 mm (41).


Em Mimosa dolens var. anisitsii, a deiscência do pericarpo ocorre de maneira diferente, pois não há fragmentação do pericarpo e nem coalescimento de paredes celulares na cavidade seminal. Externamente aos feixes ventrais e ao dorsal com os dois laterais a ele, há um tecido esclerenquimático restrito, com poucas células lignificadas, que se mostra insuficiente para impedir a deiscência por essa região (figura 38). No lado ventral, entre os dois feixes ventrais, há um tecido parenquimático que liga do endocarpo na cavidade seminal até o exocarpo; é um local de fragilidade, por onde o pericarpo se abre na maturação. Na região dorsal, entre o feixe dorsal e cada um dos laterais, há um tecido parenquimático com substâncias fenólicas, porém sem espaços intercelulares. Entretanto, o tecido esclerenquimático é interrompido entre um dos feixes laterais e o dorsal, permitindo uma deiscência passiva.

Em campo, observa-se que as três espécies expõem suas sementes, porém sem deiscência explosiva, permanecendo as sementes dentro dos frutos. Portanto, os frutos das três espécies são deiscentes e podem ser classificados como craspédios em Mimosa daleoides (figura 39) e M. orthacantha (figura 40), e legumes de deiscência passiva em M. dolens var. anisitsii (figura 41).

A coloração dos frutos maduros e secos varia de marrom mais claro e aspecto aveludado em Mimosa daleoides, marrom escuro e numerosos processos espiniformes em M. dolens var. anisitsii, e marrom claro e aspecto glabro, porém também com numerosos processos espiniformes somente na região do replum em M. orthacantha.

Mimosa daleoides permanece com seus frutos agrupados no eixo da inflorescência, que não se desenvolve, com a corola ainda presa à base do fruto, recobrindo o pequeno pedicelo; o aspecto é aveludado, conferido pelas emergências dendríticas (figura 39). Mimosa dolens var. anisitsii, quando os frutos são verdes ainda, pouco antes de amadurecerem, exibem a base das emergências de cor vermelha e ápice fino e de cor branca, caracterizando bem a espécie. Ao amadurecer, todas as estruturas tornam-se marrom-escuras; o eixo da inflorescência também não se desenvolve e permanece retendo os frutos (figura 41). Mimosa orthacantha, por longo tempo, retém o estilete preso ao ápice dos frutos, que permanecem unidos ao eixo da inflorescência; nesta espécie, os processos espiniformes são mais longos que em M. dolens var. anisitsii (figura 40).

Discussão

Estudos morfoanatômicos e, principalmente, ontogenéticos são importantes no auxílio à identificação de espécies, na verificação de padrões estruturais comuns entre os taxa, na observação de possíveis especializações ao bioma em que a espécie ocorre, na correta classificação dos frutos, em análises filogenéticas do gênero e até da família. Para Mimosa, estudos moleculares ainda não são suficientes e o incremento de estudos estruturais é necessário para se verificarem supostas linhas filogenéticas.

Segundo Lewis & Elias (1981)Lewis, G.P. & Elias. T.S. 1981. Mimoseae Bronn. In : R.M. Polhill & P.H. Raven (eds.). Advances in Legume Systematics. Royal Botanic Garden, Kew, pp. 155-168., o ovário das espécies de Mimoseae pode ser ou não estipitado, com ou sem tricomas. Para as espécies estudadas, nota-se uma pequena estípite elevando o ovário, além de tricomas que, exceto em Mimosa dolens var. anisitsii, já se encontram em diferenciação. A presença e tipos de tricomas no ovário e fruto podem ter interesse taxonômico segundo Pate & Kuo (1981)Pate, J.S. & Kuo, J. 1981. Anatomical studies of legume pods - a possible tool in taxonomic research. In: R.M. Polhill & P.H. Raven (eds.). Advances in Legume Systematics. Royal Botanic Garden, Kew, pp. 903-912.. Deste modo, a presença de tricomas no pericarpo pode auxiliar a esclarecer incertezas taxonômicas.

De acordo com Roth (1977)Roth, I. 1977. Fruits of Angiosperms. Gebrüder Borntraeger, Berlin., o exocarpo unisseriado consiste na principal camada protetora de muitos frutos, como observado nas espécies em estudo. Notam-se apenas espessamentos parietais de natureza péctica complementando esta proteção e uma fina camada de cutícula. Além disso, compostos fenólicos também se acumulam nessas células e no restante do pericarpo, que podem proteger esses órgãos contra a ação de fungos e bactérias (Swain 1979Swain, T. 1979. Tanins and lignins. In : G.A. Rosenthal. & D.H. Janzen (eds). Herbivores: their interaction with secondary plant metabolites. Academic Press, New York, pp. 657-674.).

Também com função protetora, é interessante destacar a formação das emergências nas espécies em estudo. Além do caráter protetor, o aspecto aveludado observado nos frutos maduros de Mimosa daleoides é conferido pelas emergências, dendríticas neste caso. Em M. dolens var. anisitsii e M. orthacantha, as emergências apresentam-se como projeções espiniformes. Fahn & Zohary (1955)Fahn, A. & Zohary, M. 1955. On the pericarpial structure of the legumen, its evolution and relation to dehiscence. Phytomorphology 5: 99-111. esquematizaram emergências nos pericarpos de uma espécie de Hedysarum L. e de Scorpiurus L., ambas leguminosas, em que essas estruturas também são lignificadas. Oliveira et al. (2007)Oliveira, D.M.T., Siqueira, A.C.N. & Nakamura, A.T. 2007. Anatomia e ontogênese da sâmara de Centrolobium tomentosum Guill. ex Benth. (Leguminosae: Papilionoideae). Rodriguésia 58: 231-247. descreveram emergências vascularizadas, que constituem espinhos sobre os núcleos seminíferos das sâmaras de Centrolobium tomentosum Guill. ex Benth. (Faboideae).

Segundo Roth (1977)Roth, I. 1977. Fruits of Angiosperms. Gebrüder Borntraeger, Berlin., o carpelo pode desenvolver um meristema adaxial produzindo tanto a epiderme interna como as camadas subepidérmicas, formando o endocarpo. Para as espécies estudadas, o meristema presente é estritamente adaxial, visto que apenas a epiderme interna é meristemática, sofrendo divisões principalmente periclinais, que constituem o endocarpo heterogêneo: fibras e esclereídes externamente e parênquima internamente.

A instalação do meristema adaxial no pericarpo é característica de Fabaceae, porém não exclusivo da família, uma vez que tal estrutura foi observada também para espécies de Euphorbiaceae (Oliveira & Oliveira 2009Oliveira, J.H.G & Oliveira, D.M.T. 2009. Morfoanatomia e ontogênese do pericarpo de Manihot caereulescens Pohl. e M. tripartita Müll. Arg. (Euphorbiaceae). Revista Brasileira de Botânica 32: 117-129.). Baseando-se nas camadas resultantes desse meristema, Fahn & Zohary (1955)Fahn, A. & Zohary, M. 1955. On the pericarpial structure of the legumen, its evolution and relation to dehiscence. Phytomorphology 5: 99-111. diferenciaram 17 tipos de pericarpo na família. Essa diferenciação fundamenta-se no número de camadas e na orientação das células. Mimosa daleoides e M. dolens var. anisitsii enquadram-se no tipo Trigonella, com apenas um estrato esclerenquimático em que as células estão orientadas num único sentido, paralelas ao eixo do fruto; as fibras existentes nos feixes vasculares laterais são reduzidas, não influenciando a ação do estrato esclerenquimático. O mesmo tipo foi observado, por Pietrobom & Oliveira (2004)Pietrobom, R.C.V. & Oliveira, D.M.T. 2004. Morfoanatomia e ontogênese do pericarpo de Schizolobium parahyba (Vell.) Blake (Fabaceae, Caesalpinioideae). Revista Brasileira de Botânica 27: 767-779., no pericarpo de Schizolobium parahyba (Vell.) Blake (Caesalpinioideae). Por outro lado, M. orthacantha enquadra-se no tipo Astragalus, com dois estratos esclerenquimáticos de espessura similar, o interno com fibras e esclereídes paralelas ao eixo do fruto e o externo perpendicular.

Ainda de acordo com Roth (1977)Roth, I. 1977. Fruits of Angiosperms. Gebrüder Borntraeger, Berlin., o seed cushion é um tecido multisseriado, de paredes delgadas, onde as sementes encaixam-se durante o desenvolvimento, sendo reduzido com a maturação do fruto; é verificado em espécies de Fabaceae, principalmente em Faboideae. Nas três espécies de Mimosoideae estudadas, observou-se um tecido unisseriado com substâncias fenólicas acumuladas, não constituindo um seed cushion, e sim uma epiderme interna. Em Mimosa dolens var. anisitsii e M. orthacantha, esse tecido mostra-se tricomatoso, principalmente quando em contato com as sementes. Conclui-se, portanto, que a epiderme interna é homóloga ao seed cushion, ou seja, exibe a mesma origem e apresenta funções semelhantes, pois o seed cushion é interpretado como um tecido especial, que mantém as sementes úmidas (Roth 1977Roth, I. 1977. Fruits of Angiosperms. Gebrüder Borntraeger, Berlin.), e os tricomas no endocarpo interno também podem desempenhar essa função.

O pericarpo do legume, fruto característico de Fabaceae, segundo Roth (1977)Roth, I. 1977. Fruits of Angiosperms. Gebrüder Borntraeger, Berlin. e Pate & Kuo (1981)Pate, J.S. & Kuo, J. 1981. Anatomical studies of legume pods - a possible tool in taxonomic research. In: R.M. Polhill & P.H. Raven (eds.). Advances in Legume Systematics. Royal Botanic Garden, Kew, pp. 903-912., apresenta epiderme externa unisseriada, hipoderme podendo ser esclerenquimática, mesocarpo parenquimático e endocarpo normalmente dividido em região externa e interna, sendo a externa esclerificada e a interna parenquimática. Para as espécies em estudo, este padrão exibe uma pequena alteração, visto que não existe hipoderme esclerenquimática, e sim camadas fenólicas subepidermicamente em Mimosa daleoides e M. dolens var. anisitsii; de modo geral, a estrutura aqui descrita concorda com as generalizações suprarreferidas.

Uma interpretação interessante abordando tendências evolutivas e a região esclerificada do pericarpo foi feita por Fahn & Zohary (1955)Fahn, A. & Zohary, M. 1955. On the pericarpial structure of the legumen, its evolution and relation to dehiscence. Phytomorphology 5: 99-111.. Para os autores, frutos com dois estratos esclerenquimáticos são tidos como mais primitivos, passando pelos uniestratificados, sendo os frutos indeiscentes e sem nenhuma lignificação considerados os mais derivados. Com base nisso, pode-se indicar que Mimosa orthacantha apresenta o fruto mais relictual entre as três espécies. Mimosa daleoides, apesar de ter o mesmo tipo de fruto que M. orthacantha, não apresenta uma das camadas esclerenquimáticas, mostrando-se derivada em relação à primeira. Já M. dolens var. anisitsii apresenta frutos com deiscência passiva, fato esse confirmado pelas análises anatômicas, possuindo, das três espécies em estudo, o pericarpo mais derivado.

Quanto aos tipos carpológicos encontrados, Mimosa daleoides e M. orthacantha formam craspédio, fruto que é um subtipo do legume, caracterizado pela fragmentação transversal do pericarpo em artículos monospérmicos, sem atingir os bordos do carpelo, que permanecem inteiros constituindo o replum (Barroso et al. 1999Barroso, G.M., Morin, M.P., Peixoto, A.L. & Ichaso, C.L.F. 1999. Frutos e sementes. Morfologia aplicada à sistemática de Dicotiledôneas. Editora UFV, Viçosa.).

No que se refere à deiscência dos craspédios, Bravato (1974)Bravato, M. 1974. Estudio morfológico de frutos y semillas de las Mimosoideae (Leguminosae) de Venezuela. Acta Botanica Venezuelica 9: 317-361., Lima (1985)Lima, M.P.M. 1985. Morfologia dos frutos e sementes dos gêneros da tribo Mimoseae (Leguminosae-Mimosoideae) aplicada à sistemática. Rodriguésia 37: 53-78. e Barroso et al. (1999)Barroso, G.M., Morin, M.P., Peixoto, A.L. & Ichaso, C.L.F. 1999. Frutos e sementes. Morfologia aplicada à sistemática de Dicotiledôneas. Editora UFV, Viçosa. destacaram que eles podem ser deiscentes ou não, apesar de se fragmentarem. De acordo com Spjut (1994)Spjut, R.W. 1994. A systematic treatment of fruit types. Memoirs of the New York Botanical Garden 70: 1-182., fruto deiscente é aquele que libera ou pelo menos expõe a semente após abertura do pericarpo. Portanto, apesar de Mimosa daleoides e M. orthacantha não apresentarem deiscência explosiva, arremessando as sementes para fora dos frutos, há exposição das sementes e, por isso, são craspédios que formam artículos deiscentes.

Uma característica morfológica que diferencia Mimosa daleoides e M. orthacantha, ambas com craspédios de artículos deiscentes, são as inflorescências. Mimosa daleoides apresenta flores e frutos reunidos em racemos, com pedicelos curtos, e M. orthacantha em capítulos globosos, conhecidos como glomérulos. A coloração das flores também é um caráter de divergência entre essas duas espécies; observações pessoais evidenciaram que as flores são amarelas na primeira espécie e rosáceas na segunda; são os filetes e as anteras em M. daleoides que marcam a coloração da flor, e em M. orthacantha apenas os filetes.

Em Mimosa dolens var. anisitsii, notou-se que, apesar de haver a formação de falsos septos, eles são visíveis apenas internamente, sem realmente fragmentar o fruto. Lima (1985)Lima, M.P.M. 1985. Morfologia dos frutos e sementes dos gêneros da tribo Mimoseae (Leguminosae-Mimosoideae) aplicada à sistemática. Rodriguésia 37: 53-78. estudou M. acerba Benth., atualmente sob M. dolens Vell. subsp. acerba (Benth.) Barneby, e classificou seus frutos como sacelos; segundo citado por Lima (1985)Lima, M.P.M. 1985. Morfologia dos frutos e sementes dos gêneros da tribo Mimoseae (Leguminosae-Mimosoideae) aplicada à sistemática. Rodriguésia 37: 53-78., estes frutos diferem dos legumes típicos por sua "deiscência transverso-apical, mantendo as duas valvas unidas, dando a impressão de pequenas bocas abertas". Embora morfologicamente os frutos dessa espécie sejam idênticos aos de M. dolens var. anisitsii aqui estudados, após análise anatômica detalhada da região basal até a apical do fruto, verifica-se que não há variação anatômica que permita a deiscência exclusivamente apical, de modo que os frutos de M. dolens var. anisitsii não constituem sacelos. Vale ressaltar, neste momento, a importância de estudos anatômicos, complementares aos morfológicos, para se chegar à classificação correta dos frutos. O que pode explicar a deiscência aparentemente transversoapical destas duas subespécies de M. dolens é a falta de espaço para que o restante do pericarpo se abra, pois os frutos permanecem densamente agrupados nos glomérulos, os quais são bem congestos. Como os frutos de M. dolens var. anisitsii se abrem tanto pela região ventral, como pela dorsal, eles constituem legumes típicos, porém com deiscência passiva.

Mimosa dolens var. anisitsii e M. orthacantha apresentam inflorescências semelhantes, inclusive com flores de mesma coloração (rosáceas), sendo, portanto, o tipo de fruto formado um importante caráter distintivo entre elas.

Deste modo, estudos morfoanatômicos são importantes na separação de taxa, pois segundo alguns autores, frutos de Fabaceae apresentam caracteres que podem ter valor diagnóstico (Elias 1974Elias, T.S. 1974. The genera of Mimosoideae (Leguminosae) in the Southeastern United States. Journal of the Arnold Arboretum 55: 67-87., Pate & Kuo 1981Pate, J.S. & Kuo, J. 1981. Anatomical studies of legume pods - a possible tool in taxonomic research. In: R.M. Polhill & P.H. Raven (eds.). Advances in Legume Systematics. Royal Botanic Garden, Kew, pp. 903-912., Gunn 1984Gunn, C.R. 1984. Fruits and seeds of genera in the subfamily Mimosoideae (Fabaceae). Technical Bulletin 1681: 1-194., Lima 1985Lima, M.P.M. 1985. Morfologia dos frutos e sementes dos gêneros da tribo Mimoseae (Leguminosae-Mimosoideae) aplicada à sistemática. Rodriguésia 37: 53-78., Barroso et al. 1999)Barroso, G.M., Morin, M.P., Peixoto, A.L. & Ichaso, C.L.F. 1999. Frutos e sementes. Morfologia aplicada à sistemática de Dicotiledôneas. Editora UFV, Viçosa.. Lima (1985)Lima, M.P.M. 1985. Morfologia dos frutos e sementes dos gêneros da tribo Mimoseae (Leguminosae-Mimosoideae) aplicada à sistemática. Rodriguésia 37: 53-78. destacou a importância de estudos morfoanatômicos com frutos e sementes de Mimosa, que podem ser utilizados como caracteres decisivos na sistemática do gênero. Vale ressaltar que Fabaceae pode apresentar 14 tipos diferentes de frutos e Mimosoideae nove, de acordo com Barroso et al. (1999)Barroso, G.M., Morin, M.P., Peixoto, A.L. & Ichaso, C.L.F. 1999. Frutos e sementes. Morfologia aplicada à sistemática de Dicotiledôneas. Editora UFV, Viçosa., sendo eles legume, folículo, craspédio, criptolomento, legume bacoide, legume nucoide, legume samaroide, sacelo e lomento drupáceo. Mimosa foi amplamente estudada por Barneby (1991)Barneby, R.C. 1991. Sensitivae censitae : a description of the genus Mimosa Linnaeus (Mimosaceae) in the New World. Memoirs of the New York Botanical Garden 65: 1-835., que fez uma descrição profunda sobre o gênero, mostrando as diferentes espécies identificadas, e relacionando-as em suas respectivas seções, séries e sub-séries. Neste trabalho, o autor dividiu o gênero em cinco seções, baseado principalmente na presença ou ausência de nectários extraflorais na raque foliar, nos tipos de tricomas e em características florais como o número de pétalas e estames, sendo elas: Mimosa sect. Mimadenia, Mimosa sect. Batocaulon, Mimosa sect. Calothamnos, Mimosa sect. Habbasia e Mimosa sect. Mimosa.

A tabela 2 mostra caracteres diferenciáveis entre os frutos das espécies estudadas, embora haja caracteres que são comuns a duas das espécies, pertencentes inclusive a seções diferentes. Por exemplo, o fruto do tipo craspédio e a epiderme externa ovariana unisseriada com tricomas glandulares ocorrem tanto em M. daleoides (seção Calothamnos) quanto em M. orthacantha (seção Mimosa). Isso denota que a estrutura do fruto parece revelar que os caracteres têm baixo valor diagnóstico para as seções, por outro lado o conjunto de caracteres pode ser útil na separação das espécies.

Tabela 2
Caracteres morfoanatômicos dos frutos que são potencialmente significativos para o diagnóstico das espécies analisadas de Mimosa Linneaus.

Table 2. Morphological and anatomical features of the fruits that are potentially significant for the analyzed species of Mimosa Linneaus.


Agradecimentos

À Profª Drª Valquíria Ferreira Dutra, da Universidade Federal do Espírito Santo, pela identificação das espécies; à Profª Drª Karina Fidanza Rodrigues, pelas orientações taxonômicas e ao Prof. Luiz Antonio de Souza, pelas sugestões finais à conclusão do trabalho, ambos da Universidade Estadual de Maringá.

Literatura citada

  • Barneby, R.C. 1991. Sensitivae censitae : a description of the genus Mimosa Linnaeus (Mimosaceae) in the New World. Memoirs of the New York Botanical Garden 65: 1-835.
  • Barroso, G.M., Morin, M.P., Peixoto, A.L. & Ichaso, C.L.F. 1999. Frutos e sementes. Morfologia aplicada à sistemática de Dicotiledôneas. Editora UFV, Viçosa.
  • Barroso, G.M., Peixoto, A.L., Ichaso, C.L.F., Costa, C.G., Guimarães, E.F. & Lima, H.C. 1984. Sistemática de Angiospermas do Brasil. v.2. Imprensa Universitária da Universidade Federal de Viçosa, Viçosa.
  • Bravato, M. 1974. Estudio morfológico de frutos y semillas de las Mimosoideae (Leguminosae) de Venezuela. Acta Botanica Venezuelica 9: 317-361.
  • Burkart, A. 1979. Leguminosas mimosóideas. In: P.R. Reitz (ed.). Flora Ilustrada Catarinense. Herbário Barbosa Rodrigues, Itajaí, pp. 1-299.
  • Camargo-Ricalde, S.L. 2000. Descripción, distribución, anatomía, composición química y usos de Mimosa tenuiflora (Fabaceae-Mimosoideae) en México. Revista de Biologia Tropical 48: 939-954.
  • Carmona, R., Neto, B.S.C.A. & Pereira, R.C. 2001. Controle de Acacia farnesiana e de Mimosa pteridofita em pastagem. Pesquisa Agropecuária Brasileira 36: 1301-1307.
  • Cronquist, A. 1981. An integrated system of classification of flowering plants. Columbia University Press, New York.
  • Dutra, V.F. & Morin, M.P. 2013. Mimosa. In: Lista de Espécies da Flora do Brasil. Jardim Botânico do Rio de Janeiro. Disponível em http://floradobrasil.jbrj.gov.br/jabot/floradobrasil/FB31121 (acesso em 22-V-2013).
    » http://floradobrasil.jbrj.gov.br/jabot/floradobrasil/FB31121
  • Elias, T.S. 1974. The genera of Mimosoideae (Leguminosae) in the Southeastern United States. Journal of the Arnold Arboretum 55: 67-87.
  • Elias, T.S. 1981. Mimosoideae. In: R.M. Polhill & P.H. Raven (eds.). Advances in Legume Systematics. Royal Botanic Garden, Kew, pp.143-152.
  • Fahn, A. & Zohary, M. 1955. On the pericarpial structure of the legumen, its evolution and relation to dehiscence. Phytomorphology 5: 99-111.
  • Franklin, G.L. 1945. Preparation of thin section of the synthetic resins and wood-resin composites, and a new macerating method for wood. Nature 155: 51.
  • Gunn, C.R. 1984. Fruits and seeds of genera in the subfamily Mimosoideae (Fabaceae). Technical Bulletin 1681: 1-194.
  • Jensen, W.A. 1962. Botanical histochemistry: principles and practice. W.H. Freeman, San Francisco.
  • Johansen, D.A 1940. Plant microtechnique. New York, McGraw-Hill Book.
  • Judd, W.S., Campbell, C.S., Kellog, E.A. & Stevens, P.F. 2009. Sistemática vegetal: Um enfoque filogenético. Editora Artmed, São Paulo.
  • Kraus, J.E. & Arduin, M. 1997. Manual básico de métodos em morfologia vegetal. EDUR, Seropédica.
  • Lewis, G.P. & Elias. T.S. 1981. Mimoseae Bronn. In : R.M. Polhill & P.H. Raven (eds.). Advances in Legume Systematics. Royal Botanic Garden, Kew, pp. 155-168.
  • Lima, M.P.M. 1985. Morfologia dos frutos e sementes dos gêneros da tribo Mimoseae (Leguminosae-Mimosoideae) aplicada à sistemática. Rodriguésia 37: 53-78.
  • Lorenzi, H. 1992. Árvores brasileiras. Manual de identificação e cultivo de plantas arbóreas nativas do Brasil. Editora Plantarum, Nova Odessa.
  • Mazia, D., Brewer, P.A. & Alfert, M. 1953. The cytochemistry staining and measurement of protein with mercuric bromophenol blue. Biological Bulletin 104: 57-67.
  • Mendonça, R.C., Felfili, J.M., Walter, B.M.T., Silva Junior, M.C., Rezende, A.V., Filgueiras, T.S. & Nogueira, P.E. 1998. Flora vascular do cerrado. In: S.M. Sano & S.P. Almeida (eds.). Cerrado. Ambiente e flora. Embrapa-CPAC, Planaltina, pp. 298-556.
  • O'Brien, T.P., Feder, N., & McCully, M.E. 1964. Polychromatic staining of plant cell walls by toluidine blue O. Protoplasma 59: 368-373.
  • Oliveira, D.M.T., Siqueira, A.C.N. & Nakamura, A.T. 2007. Anatomia e ontogênese da sâmara de Centrolobium tomentosum Guill. ex Benth. (Leguminosae: Papilionoideae). Rodriguésia 58: 231-247.
  • Oliveira, J.H.G & Oliveira, D.M.T. 2009. Morfoanatomia e ontogênese do pericarpo de Manihot caereulescens Pohl. e M. tripartita Müll. Arg. (Euphorbiaceae). Revista Brasileira de Botânica 32: 117-129.
  • Pate, J.S. & Kuo, J. 1981. Anatomical studies of legume pods - a possible tool in taxonomic research. In: R.M. Polhill & P.H. Raven (eds.). Advances in Legume Systematics. Royal Botanic Garden, Kew, pp. 903-912.
  • Pietrobom, R.C.V. & Oliveira, D.M.T. 2004. Morfoanatomia e ontogênese do pericarpo de Schizolobium parahyba (Vell.) Blake (Fabaceae, Caesalpinioideae). Revista Brasileira de Botânica 27: 767-779.
  • Roth, I. 1977. Fruits of Angiosperms. Gebrüder Borntraeger, Berlin.
  • Simon, M.F. & Proença, C. 2000. Phytogeographic patterns of Mimosa (Mimosoideae, Leguminosae) in the Cerrado biome of Brazil: an indicator genus of high-altitude centers of endemism? Biological Conservation 96: 279-296.
  • Souza, V.C. & Lorenzi, H. 2008. Botânica Sistemática. Guia Ilustrado para identificação das famílias de Angiospermas da flora brasileira, baseado em APG II. 2 ed. Editora Plantarum, Nova Odessa.
  • Spjut, R.W. 1994. A systematic treatment of fruit types. Memoirs of the New York Botanical Garden 70: 1-182.
  • Stevens, P.F. 2006. Angiosperm phylogeny website. Disponível em http://www.mobot.org/MOBOT/research/APWeb (acesso em 20-VII-2007).
    » http://www.mobot.org/MOBOT/research/APWeb
  • Swain, T. 1979. Tanins and lignins. In : G.A. Rosenthal. & D.H. Janzen (eds). Herbivores: their interaction with secondary plant metabolites. Academic Press, New York, pp. 657-674.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2014

Histórico

  • Recebido
    23 Maio 2013
  • Aceito
    08 Abr 2014
Instituto de Pesquisas Ambientais Av. Miguel Stefano, 3687 , 04301-902 São Paulo – SP / Brasil, Tel.: 55 11 5067-6057, Fax; 55 11 5073-3678 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: hoehneaibt@gmail.com