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Plano Diretor Participativo, território e inundações em Rio do Sul/SC

Resumo

O estudo deste artigo foi realizado com o objetivo de cruzar informações entre planejamento urbano e gestão de desastres naturais, tendo como objeto o município de Rio do Sul/SC. Foram interpoladas, utilizando SIG, camadas vetoriais de inundações ocorridas na cidade com o zoneamento do Plano Diretor Participativo. Tendo território como referencial teórico, discutiram-se as relações de poder envolvidas e os efeitos observados na morfologia urbana local. Buscou-se contribuir academicamente com análises técnicas e críticas de planejamento/gestão urbanas pós-Estatuto da Cidade, necessárias para casos de outras cidades da realidade brasileira. Concluiu-se que os técnicos responsáveis pelo Plano Diretor Participativo pouco consideraram as inundações no processo de composição desse instrumento, influenciando a atuação dos agentes espaciais e reforçando os processos de segregação que já ocorriam.

planejamento urbano; inundações urbanas; gestão urbana; sistema de informação geográfica; território

Abstract

The study was carried out with the objective of crossing information about urban planning and natural disaster management, having as object the municipality of Rio do Sul, State of Santa Catarina. Using GIS, vector layers of floods that occurred in the city were interpolated with the zoning of the Participatory Master Plan. With territory as the theoretical framework, we discussed the power relations involved and their effects on the local urban morphology. Our aim was to provide an academic contribution to the technical and critical analyses of urban planning and management that were conducted after the approval of the City Statute, necessary for cases of other Brazilian cities. We concluded that the technicians responsible for the master plan did not consider floods in the process of composition of this instrument, influencing the spatial agents’ action and reinforcing the segregation processes that already occurred.

urban planning; urban flooding; urban management; geographic information system; territory

Introdução: interesses e desastres em um novo contexto nacional

A relação entre ocupação urbana e dinâmica natural (seja esta hidrológica, climatológica, geomorfológica, etc.) tende a apresentar processos conflituosos, que se espacializam e geram consequências territorialmente delimitadas. A produção e a reprodução do espaço urbano acabam por englobar essas tensões, alterando a morfologia das cidades em que tais questões são pertinentes aos seus respectivos contextos históricos e espaciais de consolidação. No caso brasileiro, país semiperiférico e caracterizado por um capitalismo desigual, os agentes espaciais apresentam grande heterogeneidade, flertam e interagem entre si e compõem uma gama de interesses de difícil contabilização.

Tais características não estão confinadas somente às grandes metrópoles nacionais, mas se manifestam espacialmente em diferentes escalas, atingindo também as pequenas e médias cidades. Nesses ambientes, as relações de interesse e, consequentemente, poder, podem se manifestar de forma ainda mais aguda no espaço do que nos grandes centros, especialmente por via da atuação de agentes espaciais, como por exemplo mercado imobiliário e industrial, necessidades e objetivos de movimentos sociais, atuação do Estado (em diferentes instâncias governamentais) e também dos próprios técnicos de urbanismo.1 1 Este pode ser considerado o principal achado empírico das pesquisas agrupadas em Pereira (2015).

Em um momento em que as condições na escala nacional avançaram na direção de uma expansão da institucionalização do planejamento urbano em todo o País, com a consolidação dos Estatuto da Cidade (Brasil, 2001BRASIL (2001). Lei n. 10257, de 10 de julho de 2001. Regulamenta os arts. 182 e 183 da Constituição Federal, estabelece diretrizes gerais da política urbana e dá outras providências. Estatuto da Cidade. Brasília, Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/Ccivil_03/leis/LEIS_2001/L10257.htm>. Acesso em: 2 ago 2018.
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) e a expansão dos Planos Diretores Participativos (PDP), as tensões supracitadas afloraram e se tornaram assunto central na literatura científica em planejamento urbano no Brasil.2 2 O trabalho de Santos Júnior e Montandon (2011) é um marco significativo dessa produção acadêmica. A necessidade de zonear, os anseios por uma gestão urbana mais eficaz e o desafio de articular o jogo de interesses que compõe as cidades se tornaram marcas desse novo momento, manifestando-se de forma diferenciada nos variados territórios País afora. A gestão de desastres naturais, outro elemento desse “caldeirão”, aparenta não ter ganhado a devida importância pelos planejadores e tem até servido como fator determinante para a espacialização das mais-valias imobiliárias, como o estudo de caso aqui explorado.

Em setembro de 2011, o município de Rio do Sul, cidade mais populosa do Alto Vale do Itajaí, estado de Santa Catarina, passou por um dos maiores desastres naturais de seu registro, com inundações que atingiram 12,96 metros, o segundo maior de sua história. Suas consequências foram grandes danos em termos econômicos e sociais, decorrentes de uma ocupação do território desordenada e suscetível a esse tipo de evento.

No entanto, inundações menores e que, mesmo assim, interferem na vida de parte da população se tornam cada vez mais frequentes, principalmente em razão da antropização de espaços não indicados à urbanização. É, nesse contexto, que foi formulado este estudo de caso, com o objetivo de avaliar, por via de Sistema de Informações Geográficas, o zoneamento do Plano Diretor Participativo de 2006 e sua relação com as inundações constantes em Rio do Sul, que causam diversas consequências territoriais.

As inundações urbanas em Rio do Sul

Antes de tratar objetivamente das inundações, é necessário compreender, ainda que superficialmente, qual a localização e posição de Rio do Sul em sua rede urbana, enquanto centro regional de pequeno porte para os padrões brasileiros, mas com significativa importância regional. Com população, levantada pelo censo, de 61.198 pessoas e estimada atualmente em 71.061 (IBGE, 2019IBGE – INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (2019). Cidades: Santa Catarina, Rio do Sul. Disponível em: <https://cidades.ibge.gov.br/brasil/sc/rio-do-sul/panorama>. Acesso em: 27 jan 2020.
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), tal cidade é a mais populosa da microrregião de mesmo nome, composta por 20 municípios. A região é conhecida coloquialmente como Alto Vale do Itajaí, nome da associação de municípios local (Associação dos Municípios do Alto Vale do Itajaí). Sua localização é relativamente central no estado de Santa Catarina, o que pode ser observado no Mapa 1.

Mapa 1
– Localização do município de Rio do Sul/SC

Em termos de malha urbana, Rio do Sul apresenta conurbações intensas com os municípios de Lontras e Agronômica e, de forma mais branda, com Aurora e Laurentino. Segundo o IBGE (2007)IBGE – INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (2007). Região de influência das cidades. IBGE, Rio de Janeiro., a cidade pode ser classificada como um centro sub-regional A,3 3 Um centro sub-regional é assim caracterizado: “integram esse nível 169 centros com atividades de gestão menos complexas, dominantemente entre os níveis 4 e 5 da gestão territorial; têm área de atuação mais reduzida, e seus relacionamentos com centros externos à sua própria rede dão-se, em geral, apenas com as três metrópoles nacionais. Com presença mais adensada nas áreas de maior ocupação do Nordeste e do Centro-Sul, e mais esparsa nos espaços menos densamente povoados das Regiões Norte e Centro-Oeste, estão também subdivididos em grupos, a saber: a) Centro sub-regional A – constituído por 85 cidades, com medianas de 95 mil habitantes e 112 relacionamentos; e b) Centro sub-regional B - constituído por 17 cidades, com medianas de 71 mil habitantes e 71 relacionamentos.” (IBGE, 2007, p. 10). tendo influência direta em dez centros locais e três centros de zona B (Ibirama, Ituporanga e Taió, cada um com, respectivamente, três, seis e quatro municípios de nível “centro local” em suas esferas), sendo subordinada a centros maiores como Blumenau e Florianópolis, o que é possível visualizar na Figura 1. Em termos econômicos e sociais, tal município apresenta significativa relevância no estado, tendo um Produto Interno Bruto de aproximadamente R$2,5 bilhões, o 21º de Santa Catarina (IBGE, 2019IBGE – INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (2019). Cidades: Santa Catarina, Rio do Sul. Disponível em: <https://cidades.ibge.gov.br/brasil/sc/rio-do-sul/panorama>. Acesso em: 27 jan 2020.
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), e com Índice de Desenvolvimento de 0,802, considerado muito alto, sendo o 9º maior do estado e 36º do país (PNUD, 2013PNUD – PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO (2013). O índice de desenvolvimento humano municipal brasileiro. Disponível em: <http://www.pnud.org.br/Noticia.aspx?id=3750>. Acesso em: 20 jun 2016.
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).

Figura 1
– A posição de Rio do Sul na rede urbana, na área de influência de Blumenau

Tendo noção da sua posição regional, é possível focar em como as inundações urbanas são um aspecto essencial para a compreensão da realidade urbana de Rio do Sul, sendo parte intrínseca de sua história como cidade e município. Por esse motivo, é tema marcante para a mídia e o imaginário popular local que, respectivamente, noticiam e vivem esses fenômenos.

Em termos históricos e espaciais, essas inundações estão presentes na realidade local desde o início de sua colonização e urbanização. Cardoso (1984)CARDOSO, A. E. (1984). Rio do Sul 1931-1984. Rio do Sul, Prefeitura Municipal de Rio do Sul. descreve eventos de grande porte nos anos de 1880 e 1911, por exemplo, que, apesar de terem suas cotas somente medidas na região central de Blumenau à época, apresentaram relatos que tratam dos impactos causados no que é hoje o município de Rio do Sul (à época um distrito blumenauense). Para compreender essa dinâmica, devem-se observar os dois principais aspectos dessa situação: o ambiente físico no qual a cidade está inserida; e a antropização do espaço resultante do crescimento demográfico e sua consequente urbanização (Bogo, 2016BOGO, R. S. (2016). Plano diretor participativo, território e inundações em Rio do Sul/SC. Trabalho de conclusão de curso. Florianópolis, Universidade Federal de Santa Catarina.).

Em relação ao primeiro aspecto, é necessário compreender a inserção de Rio do Sul na bacia hidrográfica do rio Itajaí-Açu que, segundo o Atlas de Santa Catarina (1986)SANTA CATARINA [Gabinete de Planejamento e Coordenação Geral] (1986). Atlas de Santa Catarina. Rio de Janeiro, Aerofoto Cruzeiro., é a maior bacia inteiramente catarinense. No entanto, não é somente essa característica a causadora das inundações, já que, no caso riosulense há uma relação complexa de fatores que facilitam esses eventos. Primeiramente, as classificações apresentadas por Pandolfo et al. (2002)PANDOLFO, C.; BRAGA, H. J.; SILVA JÚNIOR, V. P.; MASSIGNAN, A. M.; PEREIRA, E. S.; THOMÉ, V. M. R. e VALCI, F. V (2002). Atlas climatológico do Estado de Santa Catarina. Florianópolis, Epagri. CD-ROM. podem inserir Rio do Sul num contexto de clima subtropical (método de Koppen-Geiger) ou mesotérmico brando tipo 2A (método de Braga e Ghellere); para a análise aqui realizada, no entanto, a mais importante dessas constatações é o índice de pluviosidade, que varia entre 1.300 mm e 1.500 mm anuais, demonstrando a quantidade considerável de chuvas que atinge o município no decorrer do ano.

Já o Atlas de Santa Catarina (1986)SANTA CATARINA [Gabinete de Planejamento e Coordenação Geral] (1986). Atlas de Santa Catarina. Rio de Janeiro, Aerofoto Cruzeiro. e o Mapa Geológico de Santa Catarina (1986)SANTA CATARINA [Gabinete de Planejamento e Coordenação Geral] (1986). Atlas de Santa Catarina. Rio de Janeiro, Aerofoto Cruzeiro. também incluem os fatores do substrato que intensificam a ocorrência de enchentes. Tais publicações estabelecem a geologia local como composta principalmente de siltitos, argilitos e varvitos, o que Machado (s/d) determina como rochas selantes, dificultando a absorção de água. Já os solos, por sua vez, são classificados como cambissolos álicos e distróficos, o que também influencia a permanência das inundações por um maior período, já que, segundo Oliveira, Oliveira e Soares (2010), os cambissolos apresentam, em geral, uma baixa permeabilidade.

Há, portanto, uma relação entre elevados índices de pluviosidade, uma bacia hidrográfica de alta capacidade, além de geologia e pedologia que dificultam a absorção da água, aspectos que influenciam o acontecimento das inundações. No entanto seria simplista considerar somente as dinâmicas naturais como as causas das inundações no município em questão. A influência das atividades humanas é latente neste estudo de caso, sendo originária desde o período da colonização até a emancipação municipal e o adensamento do centro urbano de Rio do Sul, entre os anos 30 e 40 do século XX.

Essa tese é sustentada por Colaço e Klanovicz (1999)COLAÇO, T. L. e KLANOVICZ, J. (1999). “Urbanização”. In: KLUG, J. e DIRKSEN, V. Rio do Sul: uma história. Rio do Sul, Editora da UFSC. Cap. 3. pp. 121-149., visto que os autores atribuem a maior parte da ocupação de Rio do Sul a um efeito “aleatório” de acompanhamento do rio principal, sem criar uma centralidade. Esta só veio a se realizar nos anos 1930, com o fortalecimento da indústria madeireira, principalmente a da família Odebrecht, como citado por Cardoso (1984)CARDOSO, A. E. (1984). Rio do Sul 1931-1984. Rio do Sul, Prefeitura Municipal de Rio do Sul.. Por consequência, o centro da cidade, como conhecido atualmente, veio a se estabelecer entre os anos 1940 e 1950, constituindo, juntamente dos rios Itajaí do Sul e Oeste, o que Colaço e Klanovicz (ibid.) chamam de “nó estruturador urbano”, em consonância com o crescimento econômico e demográfico local na época.

A relação entre a morfologia urbana e as inundações já se configurou na época, iniciando de forma progressiva o efeito visualizado hoje em Rio do Sul: a de desvalorização dos imóveis em áreas alagáveis, migração crescente dos moradores de maior renda para áreas elevadas e uma consequente periferização dos mais pobres em regiões de menor cota, como analisado por Bogo (2016)BOGO, R. S. (2016). Plano diretor participativo, território e inundações em Rio do Sul/SC. Trabalho de conclusão de curso. Florianópolis, Universidade Federal de Santa Catarina.. Evidência clara, ainda que de difícil contabilização empírica, de uma forte relação entre aspectos naturais e antrópicos na produção do espaço urbano e na apropriação do capital imobiliário sobre tal dinâmica.

É, nesse contexto espaço-temporal, que tanto Colaço e Klanovicz (ibid.) quanto Poleza (2003)POLEZA, M. M. (2003). Mudanças na estrutura urbana de Rio do Sul em decorrência das enchentes de 1983. Dissertação de Mestrado. Blumenau, Universidade Regional de Blumenau. tratam diretamente da desorganização espacial que se deu na urbanização de Rio do Sul, em que não houve uma ocupação do solo ordenada territorialmente. O traçado não planejado das ruas é decorrente desse processo, por exemplo. Houve também o surgimento de uma crise ambiental, visto o descontrole para com a legislação ambiental e também a utilização da bacia hidrográfica local para desfazer-se de todos os tipos de resíduos e efluentes, sejam estes domésticos ou industriais. Houve tentativas de implementação de um plano diretor para o município nos anos 1960 e 1970, principalmente em decorrência da propaganda desenvolvimentista do governo federal. No entanto, nenhum foi efetivamente concretizado, o que Poleza (ibid.) vê como fator agravante para os problemas ambientais do município, permitindo urbanização não controlada.4 4 Apesar de se concordar aqui com as críticas de Villaça (1999) ao histórico “fetiche” dos planejadores urbanos brasileiros com o plano diretor, que tendem a atribuir a este um otimismo demasiado enquanto vetor de uma urbanização equilibrada, concorda-se com Poleza (2003) que a ausência total de um lastro urbanístico institucional foi prejudicial para a cidade estudada.

Considerando esse breve histórico, é possível compreender as condições que levaram aos desastres ambientais de 1983 e 1984 quando a elevação da água do rio chegou, respectivamente, às cotas de 13,58 e 12,80 metros. Estas são a maior e a terceira maior (Quadro 1) de todo o registro histórico de inundações no município, que ultrapassa os 100 anos (Camargo, 2015CAMARGO, A. (2015). A história das enchentes em Rio do Sul, no Vale. Jornal de Santa Catarina. Florianópolis. 28 out. Disponível em: <http://jornaldesantacatarina.clicrbs.com.br/sc/geral/noticia/2015/10/a-historia-das-enchentes-em-rio-do-sul-no-alto-vale-4888520.html>. Acesso em: 21 jun 2016.
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).

Quadro 1
– Cinco maiores cotas de inundação do registro histórico de Rio do Sul (de 1983 a 2017)

No que diz respeito ao evento de 1983, Poleza (2003)POLEZA, M. M. (2003). Mudanças na estrutura urbana de Rio do Sul em decorrência das enchentes de 1983. Dissertação de Mestrado. Blumenau, Universidade Regional de Blumenau. cita uma série de problemáticas urbanas que permitiram que o fenômeno climático fosse ainda mais impactante. Primeiro, a concentração urbana que ocorreu a partir dos anos 19705 5 Esse intenso processo de urbanização, de caráter nacional, é descrito e analisado de forma aprofundada por Santos (2013). fez com que, na época, a população urbana já fosse 92% do total do município (IBGE, 2011IBGE – INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (2011). Sinopse do Censo Demográfico 2010. Rio de Janeiro, IBGE. Disponível em: < https://biblioteca.ibge.gov.br/index.php/biblioteca-catalogo?view=detalhes&id=249230>. Acesso em: 27 jan 2020.
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), resultando em uma maior ocupação das zonas próximas ao rio. Segundo, a não ocorrência de enchentes que afetassem a área central (somente as áreas mais baixas e de baixa renda) desde a década de 1950 fez com que o próprio poder público diminuísse o controle da urbanização, inclusive na ocupação de territórios alagáveis.

O evento teve duração de 13 dias, e toda a região do Vale do Itajaí foi impactada, desabrigando em torno de 250 mil pessoas. Só em Rio do Sul foram 25 mil, o que seria aproximadamente 70% da população do município na época, conforme os dados do IBGE (ibid.). A autora acrescenta o fato de tal inundação ter sido muito superior à de 1954, uma vez que que todas as classes sociais fossem atingidas, e não somente as de mais baixa renda, moradoras das partes baixas. O setor fabril também foi impactado, visto que, das 125 indústrias instaladas na época, 120 sofreram danos (Poleza, 2003POLEZA, M. M. (2003). Mudanças na estrutura urbana de Rio do Sul em decorrência das enchentes de 1983. Dissertação de Mestrado. Blumenau, Universidade Regional de Blumenau.).

Em 1984, houve outra forte inundação, que Mattedi (1999)MATTEDI, M. A. (1999). As enchentes como tragédias anunciadas: impactos da problemática ambiental nas situações de emergência em Santa Catarina. Tese de doutorado. Campinas, Universidade Estadual de Campinas classifica como um evento que atingiu uma população já enfraquecida e que tentava se recuperar do desastre do ano anterior. O autor ainda cita que, não somente os aspectos climáticos interferiram, mas também a vulnerabilidade socioeconômica e geográfica da população do Vale do Itajaí, o que se refletiu em Rio do Sul.

Depois de 25 anos de amenidades em relação a grandes inundações (e algumas menores nesse meio tempo), Rio do Sul desenvolveu-se economicamente por via da indústria, principalmente têxtil, em consonância com a realidade do Vale do Itajaí (Siebert, 1997SIEBERT, C. F. (1997). Estrutura e desenvolvimento da Rede Urbana do Vale do Itajaí. Blumenau, Editora da FURB.). Isso acarretou melhoria da qualidade de vida, como mostra (ainda que superficialmente) o já citado IDH municipal, muito elevado (PNUD, 2013PNUD – PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO (2013). O índice de desenvolvimento humano municipal brasileiro. Disponível em: <http://www.pnud.org.br/Noticia.aspx?id=3750>. Acesso em: 20 jun 2016.
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), e também alterações na morfologia urbana, como o aumento da verticalização. No que tange ao planejamento urbano, sucederam-se dois planos diretores no período, os de 1995 e 2006, mas eles pouco modificaram a relação da cidade com as cheias (Bogo, 2016BOGO, R. S. (2016). Plano diretor participativo, território e inundações em Rio do Sul/SC. Trabalho de conclusão de curso. Florianópolis, Universidade Federal de Santa Catarina.).

O fenômeno de 2011, por sua vez, registrou a segunda maior cota da história de Rio do Sul (Quadro 1), e os impactos também foram elevados, visto que, segundo Espíndola e Nodari (2013)ESPÍNDOLA, M. A. e NODARI, E. S. (2013). Enchentes inesperadas? Vulnerabilidades e políticas públicas em Rio do Sul - SC, Brasil. Esboços - Revista do Programa de Pós-Graduação em História da UFSC. Florianópolis, v. 20, n. 30, pp. 9-34. Disponível em: <https://periodicos.ufsc.br/index.php/esbocos/article/view/2175-7976.2013v20n30p9>. Acesso em: 24 jun 2016.
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, a cidade não estava preparada, no que diz respeito a estrutura, gestão e planejamento de desastres, para lidar com tal evento da forma adequada.

O resumo dos danos pode ser visto no relato de Lapolli (2013)LAPOLLI, A. V. (2013). O Plano diretor e o plano de gerenciamento de enchentes do município de Rio do Sul – SC: A construção de um território seguro? Dissertação de Mestrado. Florianópolis, Universidade do Estado de Santa Catarina., em que 15 mil pessoas foram desalojadas e 3 mil desabrigadas. Sendo esta a segunda maior inundação da história do município, os estragos socioeconômicos foram muito significativos, chegando a um prejuízo de R$283 milhões, com 80% do município afetado, além de 20% das ruas intransitáveis. Essa inundação de grande porte, somada às outras listadas anteriormente, têm o poder de chamar a atenção da mídia e da população acerca dos problemas ambientais e de planejamento do qual os habitantes de Rio do Sul têm de conviver. O debate tende a se intensificar, visto os eventos recentes de porte considerável, como os de 2013 (10,39 metros), 2015 (10,71 metros) e 2017 (10,89 metros) (PMRS, 2019PMRS – PREFEITURA MUNICIPAL DE RIO DO SUL (2019). Quadro de cheias ocorridas em Rio do Sul. Disponível em: <https://defesacivil.riodosul.sc.gov.br/index.php?r=externo%2Fplanilha>. Acesso em: 5 out 2019.
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).

No entanto, é necessário também enxergar as frequentes inundações de menor porte que têm menor alcance espacial, mas que atingem diretamente principalmente as moradias da população de baixa renda, além de, consequentemente, evidenciarem as relações de poder econômicas e políticas que se territorializam no espaço urbano. Exemplos recentes dessa realidade podem ser vistos nos últimos eventos de inundação, que ocorreram em 2018 (7,34 metros) e 2019 (7,55 metros) (ibid., 2019).

Territorialidade e inundações: quais relações possíveis?

O conceito de território é complexo, sendo este, como argumentado por Souza (2006)SOUZA, M. J. L. de (2006). “O Território: Sobre espaço e poder, autonomia e desenvolvimento”. In: CASTRO, I. E. de; GOMES, P. C. da C. e CORRÊA, R. L. (orgs.). Geografia: conceitos e temas. Rio de Janeiro, Bertrand Brasil. Cap. 3. pp. 77-115., de grande riqueza científica. Os diversos autores (Gottman, 2012GOTTMAN, J. (2012). A evolução do conceito de território. Boletim Campineiro de Geografia. Campinas, v. 2, n. 3, pp. 523-545.; Raffestin, 1993RAFFESTIN, C. (1993). Por uma geografia do poder. São Paulo, Ática.; Sack, 2011SACK, R. D. (2011). “O significado de territorialidade” In: DIAS, L. C. e FERRARI, M. (orgs.). Territorialidades humanas e redes sociais. Florianópolis, Insular.; entre outros) trabalham as suas aplicações em diferentes espectros, sejam eles econômicos, sociais, naturais ou até a articulação destes todos.

Pode-se analisar o território como “relações de poder espacialmente delimitadas e operando, destarte, sobre um substrato referencial” (Souza, 2013SOUZA, M. J. L. de (2013). Os conceitos fundamentais da pesquisa socioespacial. Rio de Janeiro, Bertrand Brasil., p. 97). E, para que haja qualquer tipo de interação e também de execução do poder, é necessária a presença de agentes territoriais, sejam eles indivíduos, grupos ou classes. Correa (1986)CORRÊA, R. L. (1986). Espaço Urbano. Rio de Janeiro, Ática. trata dos agentes do espaço urbano como modificadores de sua morfologia por via de relações complexas que as compõem. É possível estender esse conceito também para a dinâmica territorial, à medida que esses agentes exercem poder em relação ao uso do solo de acordo com seus interesses. No entanto, não se deve confundir os conceitos de espaço e território. Como abordado por Raffestin, “O espaço é a “prisão original”, e o território é a prisão que os homens constroem para si” (1993, p. 2). Ou seja, o principal aspecto do conceito de território está nas relações de poder e no espaço onde são exercidas.

Do conceito de território, decorrem outros, como de territorialidade e territorialização/desterritorialização. Para Sack (2011)SACK, R. D. (2011). “O significado de territorialidade” In: DIAS, L. C. e FERRARI, M. (orgs.). Territorialidades humanas e redes sociais. Florianópolis, Insular., territorialidade seria “[...] a tentativa, por indivíduo ou grupo, de afetar, influenciar ou controlar pessoas, fenômenos e relações, ao delimitar e assegurar seu controle sobre certa área geográfica” (ibid., p. 76). Ou seja, o autor descreve o que se dá como um desdobramento do poder exercido no território, em que os diferentes agentes espaciais criam territorialidades com objetivos que muitas vezes estão ligados a uma determinada localização daquele território e que terá articulações econômicas de interesse ao agente que exerce o poder e, consequentemente, se torna um produtor do espaço, seja na forma material, seja na perspectiva simbólica. Então, Sack (ibid.) percebe a territorialidade como uma estratégia utilizada pelos seres humanos nas mais diversas escalas, demonstrando como as relações espaciais não são neutras.

Visto isso, é perceptível que se trata de um conceito elucidativo para o estudo de caso em Rio do Sul, considerando que as inundações urbanas são parte significativa da dinâmica que envolve as relações territoriais por agentes humanos. Um argumento em prol dessa tese é o relato de Colaço e Klanovicz acerca da influência que as inundações, principalmente as de grande porte, tiveram no mercado imobiliário riosulense, o qual os autores chamam de “remanejamento social”, quando “[...] os mais abastados da parte baixa da cidade procuram os morros, considerados até então áreas de predomínio da pobreza” (1999, p. 143).

Os efeitos aprofundaram-se e geraram transformações internas, que modificaram claramente a morfologia urbana riosulense, por via de efeitos como especulação imobiliária, expulsão da população pobre de determinadas áreas e expansão habitacional não acompanhada pela infraestrutura, visto que

Os lotes tiveram seus valores alterados após 1984: os lugares imunes de inundação, sobretudo os morros onde até então habitava a população de baixa renda, foram a partir de então rapidamente valorizados. Porém, os morros apresentavam seus problemas: falta de infraestrutura, ruas [sem] traçado prévio, pouca luz e saneamento quase inexistente. Além do mais, as casas já instaladas não tinham um padrão tão elevado quanto às habitações das áreas baixas e centros da cidade. Verifica-se então uma reestruturação e deslocamento de significativa parcela da população, ou seja, moradores dos morros compram casas nas áreas baixas por um preço mais barato, ao passo que famílias com poder aquisitivo mais elevado adquirem os terrenos ou casas dos que habitavam nos morros, reformando as casas ou construindo novas. (Ibid., p. 144)

O fenômeno repetiu-se nos anos posteriores à inundação de 2011 e veio a se intensificar ainda mais com as novas ocorrências de 2013, 2015 e 2017, desvalorizando gradativamente o preço da terra em áreas alagáveis. É nesse momento que pode ser visualizado, na prática, o conceito de territorialidade, como trabalhado por Sack (2011)SACK, R. D. (2011). “O significado de territorialidade” In: DIAS, L. C. e FERRARI, M. (orgs.). Territorialidades humanas e redes sociais. Florianópolis, Insular.. Visto que, segundo o autor, esta é uma poderosa estratégia geográfica para controlar pessoas e coisas por meio do controle de área, fica claro que se trata de relações de poder no espaço e no exercício desse poder, que muitas vezes são realizadas pelo Estado, iniciativa privada ou da articulação entre ambos. As inundações, característica do espaço local, servem como mais uma determinante para a aplicação do poder por parte desses agentes espaciais, utilizando-se dela para delimitar áreas específicas em prol de determinados interesses ou valorizar outras em prol de um maior lucro, respectivamente.

No estudo de caso aqui analisado, é perceptível que existe uma territorialidade por parte do governo local (ou seja, a prefeitura municipal) que, ao elaborar o plano diretor6 6 Bogo (2016) faz breve análise crítica sobre a questão da participação popular nos Planos Diretores Participativos de 2006 e 2014 em Rio do Sul, em que foi possível observar uma clara tendência tecnocrática em ambos, desalinhados com os fundamentos do Estatuto da Cidade (Brasil, 2001). e condicionar o uso do solo, permite a construção em determinadas áreas do município e impede em outras. A lei, nesse caso, trata-se do exercício de uma forma de territorialidade. E é perceptível como o poder público posiciona-se como agente do espaço (ou territorial, nesse caso), baseando-se nos termos de Correa (1986)CORRÊA, R. L. (1986). Espaço Urbano. Rio de Janeiro, Ática.. A legislação e o zoneamento não estão isentos de interesses, de forma que a delimitação do uso do solo por parte da PMRS tende a responder aos anseios de um grupo restrito, em detrimento de uma maioria.

Em uma análise científica, como a realizada aqui, aprofundar quais os interesses e projetos de poder envolvidos em tal contexto socioespacial demandaria uma pesquisa de caráter qualitativo que foge do escopo deste trabalho.7 7 Alguns exemplos de pesquisa desse gênero e direcionadas ao planejamento urbano no contexto catarinense podem ser vistos em Pereira (2015). No entanto, é possível identificar superficialmente quais os agentes espaciais envolvidos nessa trama, tanto os de caráter institucional quanto os outros atores envolvidos “por fora” do processo.

Baseando-se em Correa (ibid.), é possível colocar o grupo de agentes espaciais (ou territoriais) envolvidos numa tríade, em que suas relações se entrecruzam e sobrepõem, sendo eles: sociedade, estado e mercado/capital. No caso estudado, a população é representada principalmente por sua relação com a esfera do mercado no processo de compra e venda de imóveis, que sofre direto impacto dos desastres, como mostrado anteriormente por Colaço e Klanovicz (1999)COLAÇO, T. L. e KLANOVICZ, J. (1999). “Urbanização”. In: KLUG, J. e DIRKSEN, V. Rio do Sul: uma história. Rio do Sul, Editora da UFSC. Cap. 3. pp. 121-149.. A inserção popular em canais participativos e a atuação de movimentos sociais com pautas acerca da habitação8 8 O mesmo não pode ser dito acerca de grupos sociais que têm nas inundações a sua pauta. Um exemplo está no movimento que requisita a construção de um canal extravasor na usina de Salto Pilão, à jusante de Rio do Sul. Tal debate já foi institucionalizado após moção aprovada pela Câmara de Vereadores do município vizinho de Lontras (Rádio Educadora, 2018). ou de matriz contra-hegemônica são muito reduzidas, algo visto por Lapolli (2013)LAPOLLI, A. V. (2013). O Plano diretor e o plano de gerenciamento de enchentes do município de Rio do Sul – SC: A construção de um território seguro? Dissertação de Mestrado. Florianópolis, Universidade do Estado de Santa Catarina. como um cenário que não se alterou, mesmo com a ocorrência de fortes inundações, de alta frequência, no decorrer dos anos 2010.

O Estado presente em sua diversidade institucional e com sua heterogeneidade característica, em que os focos e objetivos das políticas (e também dos atores, indivíduos e interesses envolvidos) não são os mesmos. No caso riosulense, há especial destaque para a atuação da Secretaria de Planejamento e seus técnicos, responsáveis pela elaboração do PDP aqui discutido (e também o posterior, de 2014); a Defesa Civil, que, após as inundações de 2011, melhorou seu aparelhamento e monitoramento acerca das possibilidades de ocorrências de enchentes e movimentos de massa;9 9 O que fica evidente em seu site oficial (https://defesacivil.riodosul.sc.gov.br/index.php). e Agência Nacional de Águas, em que o comitê da bacia do Rio Itajaí, que compõe 50 municípios, tem como função elaborar planos integrados e deliberar acerca de questões ambientais que envolvem o uso da águas. Identificados esses agentes, o que é perceptível é que se trata de uma relação conflituosa e não integrada no que diz respeito aos aspectos urbanos. Numa cidade com histórico de inundações e inserida num vale diretamente influenciado por sua bacia hidrográfica, o planejamento local deveria estar mais articulado com Defesa Civil e ANA de forma a ser mais restritivo em áreas de inundações e também nas de movimento de massa. A relação territorial existente é a de que a PMRS, por via de seu plano diretor, pouco restringe a atuação do capital privado e não altera os processos vigentes, prejudiciais à qualidade de vida da população, especialmente a de baixa renda. A defesa civil está relegada a basicamente um papel de monitoramento, diferentemente da propositiva necessária para uma gestão urbana e desastres de qualidade.

Já o mercado é marcado especialmente por dois grandes agentes de importância na cidade: capital imobiliário (construtoras e o processo de venda/troca/aluguel que se estabelece em seu entorno) e industrial. A iniciativa privada no ramo imobiliário, em Rio do Sul, lida diretamente com a condicionante das inundações. Sejam elas de grande impacto, mais raras, ou até as menores, quase anuais, que geram diferentes valorizações do uso do solo. É nesse ponto que o conceito é aplicado e deve ser compreendido, visto que, segundo Sack, “Nós devemos conhecer não somente o que a territorialidade é, mas o que ela faz. E é principalmente aí que reside o valor de uma definição: ajudar a indicar os importantes efeitos de um fenômeno” (2011, p. 75). Ou seja, o efeito da territorialidade foi um aumento do preço da terra em áreas mais elevadas, vinculada a uma utilização do poder espacial via capital imobiliário. O capital industrial também é motor desse efeito, ao utilizar de sua força econômica e política para obter áreas do município que facilitam o escoamento de produção, principalmente se relacionando com a BR-470; há aí uma nova evidência da correlação entre capital privado e o poder público. Visto que a posição às margens de uma rodovia faz sentido do ponto de vista do planejamento urbano, cabe ressaltar que essas mesmas zonas industriais não são atingidas pelas inundações pequenas, de alta frequência, com sua maioria sofrendo danos somente nos eventos de maior porte.

E são justamente esses eventos menores, quando o rio atinge a cota de até 8 metros, que correspondem a aproximadamente 37% dos eventos. Se considerarmos até 9 metros, a porcentagem salta para 63%, segundo dados da PMRS (2019)PMRS – PREFEITURA MUNICIPAL DE RIO DO SUL (2019). Quadro de cheias ocorridas em Rio do Sul. Disponível em: <https://defesacivil.riodosul.sc.gov.br/index.php?r=externo%2Fplanilha>. Acesso em: 5 out 2019.
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. Ou seja, pode-se compreender que essas cheias menores, que recebem atenção menos significativa da mídia e de parte da população, são justamente os maiores estopins para a desterritorialização.

Esse subconceito é apresentado por Souza (2013)SOUZA, M. J. L. de (2013). Os conceitos fundamentais da pesquisa socioespacial. Rio de Janeiro, Bertrand Brasil. como processos de exclusão social e espacial, em que os habitantes de determinado território são deslocados e descaracterizados deste, interferindo diretamente na qualidade de vida dos indivíduos e também gerando um efeito de desenraizamento deles em relação à identidade espacial dessas localidades.

O fenômeno da desterritorialização é recorrente em Rio do Sul, seja por aplicação do poder por via do Estado e, consequentemente, da iniciativa privada, quando há deslocamento de moradores por interesses imobiliários, seja também por questões socioambientais, como é o caso das inundações urbanas. Como destacado por Souza (ibid.), tais efeitos geram impactos identitários e econômicos aos moradores desterritorializados, o que é recorrente num município que lida com interesses econômicos vinculados aos efeitos das inundações. O planejamento urbano de caráter técnico-político, no caso riosulense, aparenta ineficácia na tentativa de aumentar a convivência entre os diferentes estratos socioespaciais na cidade, sendo necessário contestar até que ponto isso seria de interesse das classes dominantes, costumeiramente relacionadas com o poder público no jogo de interesses dos territórios urbanos.

Compreendendo a relação entre inundações e territorialidades em Rio do Sul, é possível realizar uma análise por via de sistemas de informação geográfica para, utilizando-se de dados empíricos, perceber a correlação entre as enchentes e o Plano Diretor Participativo de 2006. Tendo em vista a importância deste para o planejamento urbano da cidade e sua influência em termos territoriais e, consequentemente, de uso do solo, uma avaliação dos impactos em termos espaciais pode trazer indicativos sobre as discussões até aqui trabalhadas.

Relação espacial entre inundações e zoneamento do Plano Diretor Participativo de 2006

Antes de observar as relações que norteiam este tópico, cabe fazer uma breve introdução acerca do Plano Diretor Participativo de 2006 de Rio do Sul, correspondente à lei complementar n. 163, de 12 de dezembro de 2006. A elaboração do referido plano foi uma resposta à demanda nacional dos PDPs, que surgiu com o Estatuto da Cidade (lei n. 10.257), de 2001, e se intensificou após a criação do Ministério das Cidades, em 2003. O Estatuto, por sua vez, estabelecia um prazo de cinco anos para elaboração e revisão dos planos diretores em todas as cidades que compunham regiões metropolitanas, áreas de interesse estratégico ou com população superior a 20 mil habitantes (Santos Júnior, Silva e Sant’ana, 2011), categoria na qual Rio do Sul estava enquadrada.

Um dos principais focos do Estatuto estava no aumento da participação popular na elaboração dos planos diretores, de forma a combater o ordenamento territorial puramente tecnocrático e gerar maior integração entre poder público e comunidade, uma demanda de movimentos populares que resultaram nos artigos 182 e 183 da Constituição Federal de 1988, tendo como mais notórios representantes o Movimento Nacional da Reforma Urbana e o Fórum Nacional da Reforma Urbana.10 10 Souza (2010) argumenta que os dois artigos da CF/88 supracitados, assim como o Estatuto da Cidade, tratam de “derrotas estratégicas” para o MNRU/FNRU, apesar dos claros avanços em relação aos períodos históricos anteriores. No entanto a literatura científica, utilizando-se de estudos de caso, percebeu uma série de dificuldades (ou falta de interesse) em intensificar a participação popular e também em alcançar uma excelência técnica de acordo com as necessidades de um PDP, tanto em cidades grandes quanto médias (Avritzer, 2008AVRITZER, L. (2008). Instituições participativas e desenho institucional: algumas considerações sobre a variação da participação no Brasil democrático. Opinião Pública, Campinas, v. 14, n. 1, pp. 43-64.; Fontes, 2010FONTES, M. L. P. (2010). Planos diretores no Brasil: um estudo de caso. Dissertação de Mestrado. São Paulo, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.; Oliveira e Sant’ana, 2011; Vieira et al., 2013VIEIRA, R. et al. (2013). Participação popular no processo de planejamento urbano: a universidade como “decodificadora” de um sistema de muitos códigos. Urbe - Revista Brasileira de Gestão Urbana, [s.l.], v. 5, n. 480, pp. 115-131.; Silva, 2014SILVA, S. D. M. (2014). O papel do poder público local nos processos participativos de planos diretores em Santa Catarina. Tese de Doutorado. Florianópolis, Universidade Federal de Santa Catarina.; Pereira, 2015PEREIRA, E. M. (2015). A Alegoria da Participação: planos diretores participativos pós Estatuto da Cidade. Florianópolis, Insular.).

E, baseando-se na descrição de Lapolli (2013)LAPOLLI, A. V. (2013). O Plano diretor e o plano de gerenciamento de enchentes do município de Rio do Sul – SC: A construção de um território seguro? Dissertação de Mestrado. Florianópolis, Universidade do Estado de Santa Catarina., o caso riosulense não foi diferente. O autor descreveu baixa participação (apesar de ter sido realizada divulgação por parte da prefeitura), além de uma significativa limitação técnica da Secretaria de Planejamento no decorrer da elaboração do plano, com um contingente de funcionários de somente três trabalhando intensamente no PDP. Isso resultou nos problemas apresentados mais detalhadamente por Bogo (2016)BOGO, R. S. (2016). Plano diretor participativo, território e inundações em Rio do Sul/SC. Trabalho de conclusão de curso. Florianópolis, Universidade Federal de Santa Catarina., como: utilização de cotas de base que não estavam de acordo com a realidade topográfica do município (aspecto que foi melhorado no PDP de 2014); descrição superficial dos limites de áreas non aedificanti; pouco detalhamento acerca de questões que interferem na antropização de regiões de vales; o não cumprimento de medidas abordadas na redação do plano; e zoneamento inadequado em diversos pontos da cidade.

Este último, em consonância com o evento de setembro de 2011, foi a correlação de fatores que incentivou a realização desta pesquisa, utilizando-se de metodologia específica para avaliação do planejamento urbano de Rio do Sul, por via do cruzamento de informações do zoneamento local à época e de dados empíricos obtidos com sistemas de informação geográfica. Os mapas resultantes foram trabalhados na escala de 1:70000, o que permitiu demonstrar os impactos em todo o perímetro urbano do município. Assim, avaliou-se a espacialização deste e foram realizadas interpolações entre as diferentes cotas de inundação abordadas, o zoneamento do PDP de 2006, as áreas de expansão urbana e a transversalidade entre essas informações espaciais.

Cabe ressaltar, também, o método de elaboração de algumas camadas utilizadas para este estudo, principalmente as manchas de inundação. Para o caso de 12,96 metros, referente ao evento de 2011 aqui analisado, a informação foi obtida e descrita por Dolzan e Laudares (2015)DOLZAN, D. A. e LAUDARES, S. (2015). Geotecnologias webmapping como ferramenta de divulgação de áreas inundáveis: estudo de caso da área urbana do município de Rio do Sul. Disponível em: <https://www.google.com/maps/d/viewer?mid=1BFoe-q2LJHLd66R0MpianejE30_XYkdo≪=-27.199187164570784%2C-49.63131125004884&z=13>. Acesso em: 6 fev 2020.
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, sendo concedida por eles. No entanto, as manchas de 7 metros e 9 metros foram elaboradas seguindo as curvas de nível do município, obtidas pelo levantamento de Modelo Digital de Terreno na escala 1:5000. Seguindo a cotação de base do rio, as manchas de inundação foram feitas conforme as cotas medidas nos eventos e também concedidas pela Defesa Civil de Rio do Sul.

No que diz respeito às camadas que tratam das feições urbanas do município e do levantamento cadastral, estas sofreram uma última atualização no ano de 2014. A área coberta por tais feições se limita à área de restituição estabelecida, que inclui o perímetro urbano, aplicando-se as classes de lotes, logradouros e até as curvas de nível. O método de cruzamento entre as diferentes informações espaciais, com o objetivo de observar a sobreposição entre desastres e zoneamento pode ser visto também no trabalho de Rego Neto e Teixeira (2015), para o caso de Florianópolis.

Para o estudo de caso aqui concebido foram gerados, então, três mapas: um para demonstrar a relação entre o zoneamento do PDP de 2006 e as inundações das cotas de 7 metros (Mapa 2), um segundo para demonstrar essa relação nas cotas de 9 metros (Mapa 3) e um terceiro com as mesmas informações, agora para o evento de 2011, com a cota de 12,96 metros (Mapa 4).

Mapa 2
– Impacto das inundações (cota de 7 metros) no zoneamento do PDP de 2006

Mapa 3
– Impacto das inundações (cota de 9 metros) no zoneamento do PDP de 2006

Mapa 4
– Impacto das inundações (cota de 12,96 metros) no zoneamento do PDP de 2006

No Mapa 2, observa-se que o impacto das inundações na faixa dos 7 metros pode ser considerado baixo, se comparado com outros eventos de inundação, que serão vistos a seguir. Porém, alguns pontos devem ser considerados acerca dessa cota, assim como as consequências desses eventos em termos territoriais, principalmente as relações que resultam dessas cheias relativamente corriqueiras.

Sabe-se, primeiramente, que estas são as cotas atingidas com mais frequência, com eventos ocorrendo mais de uma vez no mesmo ano em certas ocasiões, tendo os mais recentes ocorridos em 2011, 2014 e 2017 (PMRS, 2019PMRS – PREFEITURA MUNICIPAL DE RIO DO SUL (2019). Quadro de cheias ocorridas em Rio do Sul. Disponível em: <https://defesacivil.riodosul.sc.gov.br/index.php?r=externo%2Fplanilha>. Acesso em: 5 out 2019.
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). Isso faz com que as residências já estabelecidas nessas regiões sejam as mais afetadas e que, consequentemente, tenham um valor de mercado inferior, sendo habitadas por moradores de baixa renda. Esse fenômeno é relatado por Colaço e Klanovicz (1999)COLAÇO, T. L. e KLANOVICZ, J. (1999). “Urbanização”. In: KLUG, J. e DIRKSEN, V. Rio do Sul: uma história. Rio do Sul, Editora da UFSC. Cap. 3. pp. 121-149..

É perceptível também que, mesmo com a alta frequência de inundações, praticamente toda a mancha atinge áreas do zoneamento que são classificadas como possíveis ao estabelecimento de moradia. Zonas Mistas Diversificadas (1, 2 e 3), além de Residencial Predominante 1 e 2, são atingidas em diferentes partes do perímetro urbano, com impactos maiores na porção leste do zoneamento. Algumas áreas classificadas como de tipo industrial também sofrem danos, mas em menor escala. As áreas de preservação permanente (P1) praticamente não são atingidas, com exceção de uma vasta área no extremo sudoeste do município. Essa classe de zoneamento poderia ser utilizada, por exemplo, para impedir a construção em cotas mais baixas e amortecer o efeito das inundações, possibilidade que praticamente não foi utilizada nesse PDP.

Isso demonstra, a princípio, pouco uso do conhecimento acerca das dinâmicas naturais das cheias para o planejamento urbano local, visto que o instrumento legislativo a ele vinculado aparentava ser, à época, pouco restritivo com a urbanização em áreas de claro risco ambiental. As populações que ali vivem, em muitos casos de baixa renda, sofrem com aspectos que são vistos na cidade informal, da conceituação de Maricato (2000)MARICATO, E. (2000). “As ideias fora do lugar e o lugar fora das ideias”. In: ARANTES, O.; VAINER, C. e MARICATO, E. A cidade do pensamento único: Desmanchando consensos. Petrópolis, Vozes. Cap. 4. pp. 121-192.. Ainda que estejam sob a tutela da lei, são ignorados pelo poder público, perdendo o direito à moradia e a qualidade de vida. Ainda que a questão da segregação socioespacial seja menos marcada em relação às inundações de 9 metros (Mapa 3), o debate segue relevante.

No Mapa 3, com a cota de inundação entre os 9 e 9,5 metros, a espacialização do impacto já é muito mais presente em outras zonas, com destaque para as Mistas Diversificadas de todas as classes, mas principalmente para a de tipo 2. Isso reflete um impacto maior em áreas com aptidão para o comércio e com alta circulação da população, o que influencia diretamente no prejuízo socioeconômico das inundações. Áreas previstas como Residencial Predominante, tanto tipo 1 quanto 2, são vastamente atingidas na porção leste do zoneamento, demonstrando fragilidade local e condicionante para a qualidade de vida dos moradores.

Na porção oeste do mapa, percebe-se que as áreas industriais já são vastamente atingidas, assim como as zonas Mistas Diversificadas 3. Apesar da maior necessidade de as indústrias estarem próximas dos rios para o despejo de resíduos e também da BR-470 para o escoamento da produção, áreas industriais sendo atingidas em cotas de cheias relativamente baixas (e com ocorrência de inundações mais frequentes recentemente, como visto anteriormente) é preocupante, visto o impacto econômico causado.

Como ponto positivo, fica claro, no mapa, que praticamente nenhuma área de Urbanização Controlada (UC), ou seja, em que se pretende expandir a urbanização da cidade, é atingida. Isso demonstra que, pelo menos para as áreas em que se planejou a extensão da malha urbana, houve uma consideração com as cotas de inundação, ainda que se trate das mais baixas, o que não se aplica aos maiores eventos (Mapa 4). Ainda assim cabe citar, novamente, que as áreas mais elevadas sofrem forte especulação imobiliária, o que não é controlado adequadamente pelo poder público municipal. É perceptível, nesse caso, a forte correlação entre diferentes agentes na produção do espaço urbano, como relatado por Correa (1986)CORRÊA, R. L. (1986). Espaço Urbano. Rio de Janeiro, Ática., exercendo sua territorialidade por via da legislação ou do capital privado. No entanto, retomando o aspecto do zoneamento, o impacto dos 9/9,5 metros em outras áreas consideradas para a manutenção de áreas residenciais e comerciais, assim como nas zonas de urbanização controlada, é evidente.

Agora, o objeto tratado é o Mapa 4, que diz respeito às inundações de 2011. Numa primeira visualização, fica claro como o alcance observado, no que diz respeito à abrangência espacial das áreas inundáveis, é bem superior aos alcances vistos nos mapas anteriores. Com a cota de inundação atingindo quase 13 metros, os impactos sociais e econômicos são imensos, como já apresentado anteriormente. Em termos de zoneamento, várias áreas diferentes foram atingidas, mas de forma heterogênea. Os destaques são as de uso Misto Diversificado, em todos os tipos, mas principalmente as de tipo 3. O fato de todas as suas áreas zoneadas terem sido atingidas, algumas quase em sua totalidade, demonstra praticamente um padrão na configuração do zoneamento. As áreas comerciais, muitas delas centralizadoras de fluxo, acabam por sofrer de forma mais agressiva com o desastre.

Porém, tais cheias impactaram de forma muito abrangente outras áreas, como a MC (Misto Central) e as RPs (Residencial Predominante), bastante atingidas. Estas últimas, principalmente as de tipo 1, tiveram impactos em todo o território municipal, com destaque para os efeitos vistos na porção mais a leste do município, em que uma das áreas classificadas como RP 1 é quase completamente submergida. Já as áreas de uso Residencial Exclusivo são pouco atingidas.

Isso evidencia um padrão da relação entre o zoneamento e o desastre, em que as áreas de convívio, comércio e habitação da população são as mais afetadas. Isso tende a gerar as desterritorializações citadas por Souza (2006)SOUZA, M. J. L. de (2006). “O Território: Sobre espaço e poder, autonomia e desenvolvimento”. In: CASTRO, I. E. de; GOMES, P. C. da C. e CORRÊA, R. L. (orgs.). Geografia: conceitos e temas. Rio de Janeiro, Bertrand Brasil. Cap. 3. pp. 77-115., à medida que o morador é progressivamente expulso, numa correlação entre efeitos naturais e antrópicos, do seu território de vivência e de relações comerciais.

Mas não são somente as áreas indicadas para comércio e moradia que são atingidas; as áreas industriais sofrem igualmente um impacto muito significativo nessa ocasião, o que se refletiu nos números apresentados anteriormente acerca das perdas econômicas sofridas pelo município. Ainda que a maior parte do território do zoneamento para indústria não seja atingido, o alcance das águas é relevante nas menores áreas industriais localizadas no extremo oeste do município e também na maior porção ao leste, em que há um maior espraiamento da inundação.

Tratando das áreas de expansão urbana vinculadas às UCs (zonas de Urbanização Complementar), tal evento atingiu 4 das 5 áreas classificadas para esse intuito, com grande abrangência em duas delas. Isso evidencia que, mesmo com a busca do poder público em descentralizar a malha urbana municipal e a migrar para as áreas mais elevadas, algumas das áreas do zoneamento se mantêm suscetíveis aos desastres, o que demonstra uma utilização inadequada (ou no mínimo insuficiente) dos instrumentos de planejamento urbano, incluindo os introduzidos pelo Estatuto da Cidade.

Ainda que seja compreensível, o evento de 2011 ser considerado excepcional, visto que se trata da segunda maior ocorrência de inundação já registrada num período histórico superior a 100 anos (PMRS, 2019PMRS – PREFEITURA MUNICIPAL DE RIO DO SUL (2019). Quadro de cheias ocorridas em Rio do Sul. Disponível em: <https://defesacivil.riodosul.sc.gov.br/index.php?r=externo%2Fplanilha>. Acesso em: 5 out 2019.
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). Esse tipo de dinâmica está diretamente vinculada à realidade do município, de sua população, de seu espaço urbano e, consequentemente, de seu planejamento e gestão urbanos. O alcance e impacto das cheias de 2011 foram inferiores às de 1983, que atingiu os 13,56 metros. De posse dessa informação, apresentada de forma espacial, demonstra-se a não consideração das inundações de 1983 na elaboração do Plano Diretor Participativo de 2006, em termos de zoneamento. Ou seja, a negligência acerca de aspectos intrínsecos do território riosulense – as relações de poder na ocupação da cidade e sua ligação com as questões ambientais – demonstra um uso insuficiente das ferramentas legais para o planejamento e a gestão urbanos.

Embora sejam citados no texto do PDP, como já visto anteriormente, trechos sobre a necessidade de buscar um planejamento que seja adequado com a realidade das enchentes, pouco é visto na prática. Não se consideraram os fenômenos urbanos decorrentes das inundações de 1983, assinalados por Colaço e Klanovicz (1999)COLAÇO, T. L. e KLANOVICZ, J. (1999). “Urbanização”. In: KLUG, J. e DIRKSEN, V. Rio do Sul: uma história. Rio do Sul, Editora da UFSC. Cap. 3. pp. 121-149. e Poleza (2003)POLEZA, M. M. (2003). Mudanças na estrutura urbana de Rio do Sul em decorrência das enchentes de 1983. Dissertação de Mestrado. Blumenau, Universidade Regional de Blumenau. e discutidos anteriormente.

Mesmo se tratando de um evento extremo e da história da ocupação urbana ao lado do rio, retrospecto de uma combinação entre a especificidade regional e a realidade brasileira evidenciada por Tucci (2007)TUCCI, C. E. M. (2007). Inundações urbanas. Porto Alegre, ABRH/RHAMA., os instrumentos de ordenamento territorial deveriam ter sido utilizados de forma mais eficaz. O resultado de uma relação entre antropização do espaço, especulação imobiliária e poder público pouco atuante é a realidade de enchentes mais constantes, além de eventos de grande porte que atingem com força quase todo o contingente populacional, como foi o de 2011, descrito por Lapolli (2013)LAPOLLI, A. V. (2013). O Plano diretor e o plano de gerenciamento de enchentes do município de Rio do Sul – SC: A construção de um território seguro? Dissertação de Mestrado. Florianópolis, Universidade do Estado de Santa Catarina. e evidenciado no Mapa 4. Uma última análise pode ser destacada no Quadro 2, ao se perceber a relação entre área atingida e o zoneamento.

Quadro 2
– Área atingida do zoneamento pelas inundações em km2

Deve-se visualizar, primeiramente, o impacto causado pelas cheias já nos 7 metros, atingindo mais de 8% das áreas passíveis de construção, o que evidencia o não condicionamento à construção em áreas baixas pela lei de zoneamento.

O quadro também demonstra como o impacto das inundações de 2011 e 1983 é extremamente elevado, ultrapassando os 30% do que foi zoneado no PDP de 2006 como possíveis de ocupação. Sem considerar as zonas P1 e P2, que não devem ser ocupadas, o índice quase alcança os 40%. Além de mostrar, pelos números, o nível dos desastres supracitados, também deixa clara a necessidade de uma expansão do tecido urbano que se desloque para áreas não impactadas pelas inundações. O plano diretor deve ser usado como ferramenta para essa tarefa, ainda que seja difícil, sozinho, conter a mobilidade da iniciativa privada e também dos arranjos políticos, que fazem parte da realidade urbana e das relações de poder na produção do espaço da cidade capitalista, seja na metrópole, seja nas cidades médias e pequenas.

E a partir deste estudo de caso, calcado nos dados empíricos, torna-se possível identificar a forte relação entre a atuação do Estado, com planejamento e gestão urbanas, com as territorialidades dela resultantes. O território municipal não se limita somente aos seus limites administrativos, mas apresenta muitas outras variáveis, que envolvem intencionalidades com determinadas porções do espaço e que se manifestam por via de determinados mecanismos que permitem (ou restringem) a aplicação do poder. A produção e reprodução das cidades é marca central do capitalismo e dos interesses existentes nas áreas urbanas, em que o foco tende a ser o lucro ou o controle territorial. A gestão de desastres, que deveria ser vista sob uma perspectiva humanizada e com foco na qualidade de vida, fica relegada a um papel de monitoramento, o que tem consequência espacial e nas relações de poder. O poder público, de planejamento centralizado, ao permitir e validar a construção e manipulação do capital privado em áreas de inundação, posiciona-se como um agente detentor e fornecedor de poder espacial, abrindo caminhos para que os detentores do mercado imobiliário possam se reproduzir e territorializar. Os instrumentos disponíveis no Estatuto da Cidade para diminuir a especulação e distribuir os ônus de forma mais equânime no espaço urbano são subutilizados e, por consequência, acabam formando intensas marcas territoriais. Isentar-se ou ausentar-se também é estar presente, e é no território que isso se mostra claramente.

Considerações finais

Como conclusões, foi possível perceber por via da pesquisa que existem relações entre territorialidades e as inundações, visto que estas últimas são determinantes para a espacialização das relações de poder nas áreas urbanas de Rio do Sul. À medida que as cheias interferem na vida da população e no cotidiano dos moradores, os agentes do espaço moldam a morfologia urbana e criam novos territórios, sejam eles da população de baixa renda, do capital imobiliário, do industrial ou até do poder público, que ordena, planeja e cruza seus interesses com os outros agentes. Baseando-se nas colocações de David Harvey (Valença, 2008VALENÇA, M. M. (2008). “Ensaio sobre a dinâmica do imobiliário em Harvey”. In: VALENÇA, M. M. (ed.). Cidade [i]legal. Rio de Janeiro, Mauad X. pp. 242-249.), num país capitalista e semiperiférico como o Brasil, do qual a lógica neoliberal se faz presente nas relações espaciais, os fenômenos de financeirização, mercantilização e reprodução do capital imobiliário ocorrem conforme interesses correlatos entre capital e Estado em cidades de diferentes escalas.

Essas considerações são decorrentes dos resultados obtidos na pesquisa, possibilitando concluir que as inundações de 1983 e 1984 pouco foram consideradas na elaboração do PDP de 2006, que permitiu a ocupação de áreas suscetíveis a cheias. Isso, aliado ao grande evento de 2011, potencializou o desastre e os impactos econômicos sofridos, alterando novamente a compreensão da população em relação a sua própria cidade. Além disso, o alcance das inundações de 7 e 9 metros também evidencia o impacto das enchentes de menor porte, o que deve ser posto em discussão na área do planejamento urbano local.

As análises foram possíveis por via da obtenção de dados empíricos e sua manipulação em ambiente SIG, de forma que as interações entre inundações e zoneamento ficaram claras em termos espaciais. Portanto, os objetivos da pesquisa foram atingidos, à medida que os dados evidenciam a hipótese e as dinâmicas sociais discutidas pelo autor nesta pesquisa. É dessa forma que se pode identificar o conceito de território como categoria fundamental para compreender as relações urbanas, tendo em vista que os dados empíricos dão suporte para a abordagem teórica e evidenciam as relações de poder espacialmente distribuídas, como discutido anteriormente.

À guisa de conclusão, em termos de ações práticas que podem ser iniciadas a partir dos dados obtidos por esta pesquisa, considera-se que duas frentes são necessárias: a do planejamento e a da gestão urbana em Rio do Sul. Em termos de planejamento, conforme o estudo mais aprofundado realizado em Bogo (2016)BOGO, R. S. (2016). Plano diretor participativo, território e inundações em Rio do Sul/SC. Trabalho de conclusão de curso. Florianópolis, Universidade Federal de Santa Catarina., o PDP mais recente avançou em diversas problemáticas que envolviam o aqui discutido, mas ainda é insuficiente em impedir o avanço da urbanização nas áreas de risco, especialmente as suscetíveis à inundação. Por lei, os planos diretores devem ser renovados a cada 10 anos (Brasil, 2001BRASIL (2001). Lei n. 10257, de 10 de julho de 2001. Regulamenta os arts. 182 e 183 da Constituição Federal, estabelece diretrizes gerais da política urbana e dá outras providências. Estatuto da Cidade. Brasília, Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/Ccivil_03/leis/LEIS_2001/L10257.htm>. Acesso em: 2 ago 2018.
http://www.planalto.gov.br/Ccivil_03/lei...
), algo que está próximo para o documento mais recente, de 2014. Considera-se que tal ocasião seria a ideal para a realização de um processo participativo de maior qualidade, que efetivamente debata tal problemática com os moradores da cidade, que são os principais interessados em um planejamento urbano mais dedicado às necessidades do espaço riosulense. É necessário regular e restringir a ocupação de áreas baixas e também buscar a recuperação de margens e suas proximidades, com enfoque tanto na questão urbana quanto em aspectos ambientais.

Finalizando, a gestão urbana é o segundo ponto que deve ser trabalhado com mais esmero de forma a alterar os processos e os fenômenos aqui relatados. Os desastres naturais, que têm significativo impacto na realidade da população riosulense, devem ser vistos não somente sob a perspectiva de seus efeitos materiais diretos, mas também em sua influência na organização espacial. Em termos de gestão, a defesa civil, o Instituto de Meio Ambiente do Estado, a seção local da Agência Nacional de Águas e a prefeitura municipal (com suas devidas subdivisões, com as áreas ambiental e de planejamento) devem estar mais integradas e direcionadas à questão urbana. Outro aspecto necessário é uma visão não localista de planejamento, mas sim que considere os outros municípios em seu entorno e o impacto que suas gestões locais podem ter na dinâmica da bacia hidrográfica do rio Itajaí em maior escala. Rio do Sul, enquanto município central e de maior porte na região, deveria assumir a dianteira de planejar regionalmente e de estar focado na relação direta entre as cidades e seus rios, que dão à tona da urbanização do Alto Vale do Itajaí.

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Notas

  • 1
    Este pode ser considerado o principal achado empírico das pesquisas agrupadas em Pereira (2015)PEREIRA, E. M. (2015). A Alegoria da Participação: planos diretores participativos pós Estatuto da Cidade. Florianópolis, Insular..
  • 2
    O trabalho de Santos Júnior e Montandon (2011) é um marco significativo dessa produção acadêmica.
  • 3
    Um centro sub-regional é assim caracterizado: “integram esse nível 169 centros com atividades de gestão menos complexas, dominantemente entre os níveis 4 e 5 da gestão territorial; têm área de atuação mais reduzida, e seus relacionamentos com centros externos à sua própria rede dão-se, em geral, apenas com as três metrópoles nacionais. Com presença mais adensada nas áreas de maior ocupação do Nordeste e do Centro-Sul, e mais esparsa nos espaços menos densamente povoados das Regiões Norte e Centro-Oeste, estão também subdivididos em grupos, a saber: a) Centro sub-regional A – constituído por 85 cidades, com medianas de 95 mil habitantes e 112 relacionamentos; e b) Centro sub-regional B - constituído por 17 cidades, com medianas de 71 mil habitantes e 71 relacionamentos.” (IBGE, 2007IBGE – INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (2007). Região de influência das cidades. IBGE, Rio de Janeiro., p. 10).
  • 4
    Apesar de se concordar aqui com as críticas de Villaça (1999)VILLAÇA, F. (1999). “Uma contribuição para a história do planejamento urbano no Brasil”. In: DEÁK, C. e SCHIFFER, S. R. (orgs.). O processo de urbanização no Brasil. São Paulo, Edusp, pp. 171-243. Disponível em: <https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/4449703/mod_resource/content/1/Fl%C3%A1vio%20Villa%C3%A7a%20-%20Uma%20contribuicao%20para%20a%20historia%20do%20planejamento%20%20urbano%20no%20Brasil.pdf>. Acesso em: 5 out 2019.
    https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.p...
    ao histórico “fetiche” dos planejadores urbanos brasileiros com o plano diretor, que tendem a atribuir a este um otimismo demasiado enquanto vetor de uma urbanização equilibrada, concorda-se com Poleza (2003)POLEZA, M. M. (2003). Mudanças na estrutura urbana de Rio do Sul em decorrência das enchentes de 1983. Dissertação de Mestrado. Blumenau, Universidade Regional de Blumenau. que a ausência total de um lastro urbanístico institucional foi prejudicial para a cidade estudada.
  • 5
    Esse intenso processo de urbanização, de caráter nacional, é descrito e analisado de forma aprofundada por Santos (2013)SANTOS, M. (2013). A Urbanização Brasileira. São Paulo, Edusp..
  • 6
    Bogo (2016)BOGO, R. S. (2016). Plano diretor participativo, território e inundações em Rio do Sul/SC. Trabalho de conclusão de curso. Florianópolis, Universidade Federal de Santa Catarina. faz breve análise crítica sobre a questão da participação popular nos Planos Diretores Participativos de 2006 e 2014 em Rio do Sul, em que foi possível observar uma clara tendência tecnocrática em ambos, desalinhados com os fundamentos do Estatuto da Cidade (Brasil, 2001BRASIL (2001). Lei n. 10257, de 10 de julho de 2001. Regulamenta os arts. 182 e 183 da Constituição Federal, estabelece diretrizes gerais da política urbana e dá outras providências. Estatuto da Cidade. Brasília, Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/Ccivil_03/leis/LEIS_2001/L10257.htm>. Acesso em: 2 ago 2018.
    http://www.planalto.gov.br/Ccivil_03/lei...
    ).
  • 7
    Alguns exemplos de pesquisa desse gênero e direcionadas ao planejamento urbano no contexto catarinense podem ser vistos em Pereira (2015)PEREIRA, E. M. (2015). A Alegoria da Participação: planos diretores participativos pós Estatuto da Cidade. Florianópolis, Insular..
  • 8
    O mesmo não pode ser dito acerca de grupos sociais que têm nas inundações a sua pauta. Um exemplo está no movimento que requisita a construção de um canal extravasor na usina de Salto Pilão, à jusante de Rio do Sul. Tal debate já foi institucionalizado após moção aprovada pela Câmara de Vereadores do município vizinho de Lontras (Rádio Educadora, 2018RÁDIO EDUCADORA (2018). Moção apela por canal extravasor em Lontras: obra poderia amenizar enchentes. Disponível em: <http://www.educadora.am.br/noticia/mocao-apela-por-canal-extravasor-em-lontras/>. Acesso em: 27 jan 2020.
    http://www.educadora.am.br/noticia/mocao...
    ).
  • 9
    O que fica evidente em seu site oficial (https://defesacivil.riodosul.sc.gov.br/index.php).
  • 10
    Souza (2010)SOUZA, M. J. L. de (2010). Mudar a cidade: uma introdução crítica ao planejamento e à gestão urbanos. Rio de Janeiro, Bertrand Brasil. argumenta que os dois artigos da CF/88 supracitados, assim como o Estatuto da Cidade, tratam de “derrotas estratégicas” para o MNRU/FNRU, apesar dos claros avanços em relação aos períodos históricos anteriores.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    17 Abr 2020
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2020

Histórico

  • Recebido
    7 Out 2019
  • Aceito
    26 Nov 2019
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