Os institutos liberais e a batalha de ideias
O presente artigo tem como objetivo analisar os institutos liberais surgidos no Brasil e na América Latina com o objetivo de defender uma nova ordem na configuração da política econômica e política dos governos latino-americanos: o neoliberalismo. Para tanto, recorremos à origem dessas propostas, descrevendo o surgimento desses institutos e considerando o poderoso papel desempenhado por essas organizações.
O neoliberalismo, cujo propósito é legitimar ideologicamente o mercado, pode ser compreendido como um projeto econômico-político das elites capitalistas que envolve, na realidade econômica periférica da região latino-americana, as seguintes diretrizes: desconstruir completamente todos os vestígios das políticas desenvolvimentistas e da soberania nacional; mercantilizar todas as áreas da vida social; redefinir o papel do Estado concebido como mero agente dos interesses do grande capital; privatizar, globalizar e desregulamentar a economia; reduzir o custo da força de trabalho; expropriar a classe trabalhadora de direitos e políticas sociais; transformar o emprego em trabalho e a sociedade em negócio.
O neoliberalismo só se afirmou gradativamente como projeto hegemônico na década de 1980, a partir da crise do Keynesianismo,1mas, para essa ascensão, foi fundamental a longa batalha de ideias iniciada por Hayek.2 Ele tinha clareza de que um projeto de tamanha dimensão requereria planejamento: a criação de várias associações da Sociedade Mont Pélerin3 em escala mundial como aparato formador de opinião pública. Requereria, ainda, um movimento, uma cruzada que envolvesse o engajamento de acadêmicos, da intelectualidade e daqueles que ele denominava “vendedores de ideias de segunda mão”, quais sejam: professores, jornalistas e representantes da mídia (Hayek, 1985, p. 82).
Hayek julgava que a intelectualidade dispunha de capacidade ímpar para persuadir a opinião pública por meio de condicionamentos cognitivos e políticos. Em razão dessa consideração, argumentou:
Necessitamos de líderes intelectuais que estejam dispostos a trabalhar por um ideal, por menor que sejam as perspectivas de sua realização em curto prazo. Eles devem ser homens que estejam dispostos a aderir aos princípios e lutar por sua plena realização, todavia, ainda em condições remotas [...] A principal lição que o verdadeiro liberal deve aprender com o sucesso dos socialistas é que foi a sua coragem de ser utópico que lhes valeu o apoio de intelectuais e, consequentemente, uma influência sobre a opinião pública que a cada dia torna possível o que parecia recentemente totalmente improvável. (Hayek, 2012, p. 15)
A iniciativa e a militância de Hayek para estabelecer uma rede internacional de fundações, institutos, centros de pesquisa, jornais e agências de relações públicas – para apoiar e difundir o pensamento neoliberal – revelaram-se fecundas. A sociedade Mont Pélerin tornou-se uma das mais importantes redes neoliberais e trabalha, atualmente, com uma rede de 1000 membros e 100 think tanks.4 Os aplicados discípulos de Hayek seguiram rigorosamente as orientações do mestre e permearam o terreno para o florescimento neoliberal, seja como visão de mundo, seja como projeto econômico. Seguramente o triunfo da batalha de ideias se deveu, em larga medida, à atuação dos think tanks liberais — entidades ou organizações liberais. Eles deram sequência ao movimento estratégico de luta de ideias iniciado pela Associação Mont Pélerin, construindo redes de entidades fomentadoras de ideias liberais destinadas à obra de construção e perpetuação da hegemonia neoliberal, em âmbito transnacional.
Segundo a organização TheBestSchools.org, o último levantamento realizado nos Estados Unidos revelou que existem, naquele país, 1.984 think tanks, quase um terço do total de entidades de ideias políticas do mundo. A TheBestSchools.org sustenta que essas entidades se dedicam permanentemente à pesquisa de soluções para uma multiplicidade de “problemas do mundo” dentro dos princípios básicos do sistema capitalista. Para tanto, constroem arcabouços argumentativos que defendem e pressionam para que haja mudanças de políticas nos âmbitos local, estadual, federal e mundial.
Algumas entidades liberais, como o Brookings Institution ou a Heritage Foundation, tornaram-se reconhecidas por sua atuação e forte inserção na grande imprensa. Outras organizações têm uma inserção midiática mais tímida, algumas delas publicam seus próprios artigos e livros para um público específico, mas em proporção considerável. Esses institutos são patrocinados por grandes corporações econômicas para formular teorias, investigar, ficcionar e distorcer a realidade e, assim, assegurar os interesses de seus financiadores ao transmitir e propagar essas formulações. Esses numerosos institutos de ideias liberais operam de forma integrada a extensas redes em escala global, que atuam apoiando política, financeira e intelectualmente diversas organizações.
A Fundação de Pesquisa Econômica Atlas (Atlas Economic Research Foundation), a título de exemplo, é uma rede de institutos de ideias liberais de conexão transnacional, com sede em Washington, EUA, de grande inserção na América Latina. Essa organização foi criada com o propósito de “promover em âmbito mundial a disseminação das ideias liberais, como as ideias de liberdade”.5 A Atlas foi fundada pelo empresário Anthony Fisher, em 1981, e incorporada ao think tank British Institute of Economic Affairs, também fundado por ele, em 1955. A partir de então “realmente começou a ser construída a rede da Europa para a América do Norte, da América do Norte para a América do Sul e, até mesmo, para a Ásia e a África” (Blundel, 2013).
A Atlas atuou, durante um longo período, como a principal rede de transferência de fundos e de diversos recursos no âmbito transnacional para fomentar a disseminação das ideias e das políticas neoliberais. Como o seu principal objetivo é promover, por meio de subsídio, o processo de criação de novos institutos liberais, a Atlas presta apoio financeiro; dá suporte de infraestrutura; fornece treinamento de líderes; patrocina e distribui prêmios e auxílios.6
No momento inicial do processo de constituição de sua rede, a Atlas desempenhou atividades sistemáticas de consultoria e treinamento das novas organizações. Esse instituto forneceu um corpo de profissionais aptos para orientar as tarefas de elaboração de estatutos dos novos institutos; assim como para instruir sobre a formação de conselhos de diretores, de conselhos de curadores, instâncias, muitas vezes, integradas por membros da própria Atlas. Os profissionais da fundação também atuaram preparando as novas organizações para a elaboração do plano de ação e do plano de orçamento e para iniciar projetos de pesquisa e publicação. A Atlas fomentou, ainda, a realização de conferências, palestras, seminários, colóquios e cursos, sobretudo em âmbito regional, com vistas à disseminação do pensamento liberal e à expansão da Rede. Essas iniciativas foram fundamentais para a constituição e consolidação de sua órbita global da Atlas. Devido à sua bem-sucedida expansão, desde 2008, o nome do site foi alterado – de AtlasUSA.org para AtlasNetwork.org –, embora mantenha o nome Atlas Economic Research Foundation como registro legal da entidade.
A formação de uma rede global composta por inúmeros institutos liberais destinados à fabricação de ardis discursivos e de estratégias cada vez mais sofisticadas de persuasão do pensamento e do programa neoliberal foi o resultado da trajetória de ativismo político obstinado e sistemático da Atlas. O diretório global da fundação atualmente é composto por 481 parceiros em 95 países ao redor do mundo, sendo 82 instituições na América Latina e no Caribe, como mostra a Figura 1.
Os Institutos liberais ligados à Rede Atlas não são organizações associadas da fundação, mas, sim, organizações parceiras inseridas em uma vasta rede transfronteiriça, da qual a Atlas é o núcleo. No Brasil, os Institutos liberais parceiros da Rede Atlas estão apresentados na Figura 2.
A Rede Atlas é conectada a diversas redes latino-americanas de Institutos Liberais, dentre as quais se destacam, pelo seu protagonismo político, as Redes Centro Hispano-Americano de Pesquisa Econômica (Hacer), a Rede Liberal para a América Latina (Relial) e a Fundação Internacional pela Liberdade (FIL).
Importa fazer uma breve sinopse dessas redes para elucidar os níveis de entrelaçamento e articulação existentes entre elas e a Atlas, na definição e difusão de táticas e estratégias econômicas e sociais, notadamente para a América Latina. O Centro Hispano-Americano de Pesquisa Econômica (Hacer), fundado em 1996, com sede em Washington DC, é uma organização sem fins lucrativos dedicada a promover o estudo de questões pertinentes aos países da América hispânica, bem como de hispano-americanos que vivem nos Estados Unidos, especialmente em relação a como eles se relacionam com os valores de liberdade pessoal e econômica, governo limitado sob o Estado de Direito e responsabilidade individual.
A Rede Hacer opera predominantemente nos países da América do Norte e do Sul e é composta por 108 institutos de ideias liberais, entre os quais vários estão associados também à Rede Atlas (Figura 3). O presidente da Atlas, Alejandro Chafuen,7 integra o Conselho Curador do Hacer, o que evidencia a estreita aproximação entre as duas entidades. Os relatórios de notícias do Hacer fornecem, em fluxo contínuo, matérias atualizadas/recentes sobre as políticas governamentais dos países latino-americanos. Essas informações chegam de Institutos liberais parceiros da América Latina e são veiculadas em inglês e espanhol.
O Hacer criou um blog de notícias cujo foco são as reformas econômicas na América Latina que têm como paradigma o Chile do governo Pinochet, como revelam as informações do próprio site do Hacer, com o seguinte teor:
A Transformação Econômica do Chile:
Neste projeto, desenvolvido pela Hacer a pedido da Fundação de Pesquisa Econômica da Atlas e Libertad y Desarrollo do Chile, criamos um blog repleto de notícias com uma grande seleção de artigos em inglês sobre a transformação econômica do Chile, uma referência de sucesso para o resto do mundo em desenvolvimento para aspirar, estudar e, esperamos, imitar. (Hacer, 2018a)
Por intermédio da Rede Hacer, a Rede Liberal para a América Latina (Relial) está ligada à Rede Atlas. Essa organização, com sede na Cidade do México, é presidida atualmente pelo brasileiro Ricardo Santos Gomes,8 membro do Conselho Deliberativo do Instituto de Estudos Empresariais. A entidade tem, como conselheiro honorífico, Mario Vargas Llosa. A Relial foi criada em 2004 com o apoio da Fundação Friedrich Naumann para a Liberdade da Alemanha.
Essa rede é composta por 40 entidades liberais de 18 países da América Central e do Sul (Quadro 1). Sua estrutura organizacional é formada por uma junta diretiva composta pela presidência, pela vice-presidência e por cinco diretores. Todos os integrantes da junta diretiva ocupam cargos de direção em entidades associadas à Relial. A entidade concebe-se como promotora do elo “mais representativo das organizações liberais na região” latino-americana.
Na visão de seus integrantes, a ela:
[...] é a união de organizações e de partidos liberais mais representativa da região. Através da Relial, estimulamos um diálogo entre nossos parceiros para cooperar frente aos desafios que se impõem na região latino-americana. A Relial tem como objetivo principal consolidar o liberalismo como um eixo sobre o qual se tomam as decisões e as ações políticas na América Latina. A atuação da Relial segue os seguintes princípios: defesa da democracia liberal; liberdade e responsabilidade individual; respeito pela propriedade privada; promoção do governo limitado, impulsionando a economia de mercado; primazia do Estado de Direito; defesa da paz. (Relial, 2018)
A partir de outubro de 2009, a Relial passou a veicular informações e índices sobre a economia de mercado e sobre o livre comércio na América Latina. Conforme discorre o Relatório de 2018 dessa rede, “todos os especialistas de todas as nossas organizações debatem a situação política, econômica e social da região”. Eles “trocam boas práticas e experiências” as quais são sistematizadas e “replicadas na região” (ibid.).
Segundo Alejandro Chafuen, presidente da Atlas:
A Rede Liberal para a América Latina (Relial), com aproximadamente 40 membros e mais de 12 organizações associadas, é uma das redes mais fortes da América Latina. Sua missão é tornar-se uma rede liberal beligerante e eficiente que ajude a converter a América Latina numa região caracterizada por democracias liberais e sociedades prósperas, comprometidas com os princípios da liberdade, da responsabilidade individual, do respeito à propriedade privada, à economia de mercado e do primado do Estado de direito e da paz, a fim de elevar o nível de vida na região. (Chafuen, 2014; grifo nosso)
Nesse sentido, a Relial assume a postura de guardiã por excelência da economia de mercado na América Latina. A sua pretensão, conforme seu site, é “consolidar o liberalismo como o eixo sobre o qual são tomadas decisões e ações políticas na América Latina”. Ela se incumbe de operar como a organização baluarte da batalha ideológica neoliberal. Para tanto, dedica-se a converter a América Latina em uma região plenamente integrada aos ditames da propriedade privada e da economia de mercado.
A Rede Fundação Internacional pela Liberdade (FIL) foi fundada em um seminário realizado em 2003, quando líderes de laboratórios de ideias liberais da América Latina e dos EUA se reuniram na Espanha por iniciativa da Fundação Ibero-americana e Europa (FIE). A sua criação foi uma reação ao fenômeno denominado Maré Rosa – termo cunhado por Francisco Panizza, acadêmico uruguaio da London School of Economics, para nominar o ciclo que emerge na América do Sul, nos anos 2000, de sucessivos governantes de trajetória de esquerda, “quebrando” o dogmatismo neoliberal da década anterior. Portanto, a FIL origina-se da ação ofensiva dos institutos de ideias liberais transnacionais, destinada a bloquear a ascensão de governos oriundos de partidos de tradição de esquerda na América do Sul. O escritório da Rede FIL está localizado na cidade de Rosário, município da província de Santa Fé, na Argentina. O seu presidente é Mario Vargas Llosa, e o presidente da Rede Atlas, Alejandro Chafuen, integra o Conselho de Administração da fundação. Essa rede tem por finalidade “influenciar a agenda internacional para apoiar os seus institutos e fundações na difusão das ideias e fornecer informações sobre a realidade latino-americana e suas relações com os Estados Unidos, com a Espanha e com a Europa”. Para tanto, atua ativamente divulgando sua opinião em grandes debates de âmbito internacional. Essa é a caracterização da FIL, organização que “adota uma estratégia de combate no campo das ideias aos valores que ameaçam a liberdade, a democracia e a tolerância” (FIL, 2018a).
A FIL possui uma estrutura político-administrativa complexa que compreende uma junta diretiva composta por 19 diretores, um conselho acadêmico constituído por 34 conselheiros, um diretório associado integrado por 33 membros, um conselho empresarial formado por 16 conselheiros e um comitê de comunicação constituído por três componentes. Em todas essas instâncias, atuam representantes de organizações latino-americanas, europeias e estadunidenses. Atualmente, existem 37 entidades associadas em 18 países compondo a Rede FIL (Figura 4). Os propósitos da FIL evidenciam, para além da postura político-ideológica dessa organização, a sua veia hayekiana comprometida com a batalha de ideias em âmbito transfronteiriço, articulando institutos de ideias liberais e fechando o cerco para o socialismo, o Estado de Bem-Estar Social e, até mesmo, para os projetos neoliberais menos ortodoxos. A título de elucidação sobre a atuação articulada da Rede FIL com as estratégias neoliberais ardilosas nos países latino-americanos, o próximo evento promovido por essa rede será o Seminário Internacional: “Grandes desafios da Ibero-América”, que se realizou em 3 de dezembro de 2018 e que contou com as participações como expositores de Paulo Guedes,9 Sérgio Moro,10 além de outros mentores do neoliberalismo na região.
Os institutos de ideias liberais que atuam no Brasil
O movimento político-ideológico liberal, estratégico e tático, articulado e planejado pedagogicamente em âmbito mundial para consolidar e preservar a hegemonia do livre mercado, teve início no Brasil com as organizações denominadas Institutos Liberais (ILs). Estes atuaram como polo aglutinador de diferentes frações da burguesia, com o objetivo de idealizar, materializar e sustentar o triunfo neoliberal no Brasil.
O Instituto Liberal foi criado em 1983, no Rio de Janeiro, por um conjunto de empresários e intelectuais adeptos do ideário liberal, com a finalidade de propagar o pensamento liberal no Brasil entre o empresariado e formadores de opinião. Tão logo o Instituto Liberal do Rio de Janeiro (IL-RL) iniciou suas atividades, verificou-se a necessidade de expansão para outros estados da federação, em razão de as especificidades regionais dificultarem a sua inserção no País.11
Nessa perspectiva, buscou-se aumentar o número de mantenedores e ampliou-se a entidade por meio de estrutura seccional de institutos análogos no Distrito Federal e nos seguintes estados: Rio Grande do Sul, São Paulo, Paraná, Minas Gerais, Pernambuco, Bahia e Ceará. Essa configuração possibilitou “a constituição de núcleos municipais no interior dos diferentes estados, núcleos esses filiados aos respectivos institutos das capitais estaduais e de acordo com o princípio federativo”.12
A atuação dos Institutos liberais correspondeu, no Brasil, ao que foi o processo de reabilitação do liberalismo desencadeado pela Sociedade Mont Pélerin em 1947. A instituição dedicou-se inicialmente a tradução, edição, publicação de livros e de panfletos, divulgando ideias, pressupostos teóricos e acepções alusivas ao liberalismo. Além da função de transmissão do pensamento neoliberal, os ILs operaram como laboratório de ideias, pesquisas, planejamento e consultoria das concepções da Escola Austríaca, orientada à realidade política e sócio-histórica brasileira. Em consonância com esse ativismo político, os Institutos liberais traduziram e publicaram obras da Escola Austríaca de Economia, literatura até então pouco conhecida no Brasil, entre elas, O caminho da servidão e Direito, legislação e liberdade, de Friedrich Hayek.
Os ILs congregaram inicialmente empresários de diversos estados que se identificaram com o liberalismo, figuras de projeção econômica e política, como: Jorge Gerdau Johannpeter (RS), Jorge Simeira Jacob (SP), Roberto Bornhausen (SP), João Pedro Gouvêa Vieira Filho (RJ) e Sérgio Andrade de Carvalho e Winston Ling (RS). Todavia, a entidade estendeu-se para além de um agrupamento empresarial, uma vez que arregimentou para seus quadros indivíduos de diversas ocupações, abarcando advogados, economistas, estudantes, jornalistas, médicos, professores, etc.
As atividades dos ILs foram financiadas, ao longo de sua trajetória, por vários mantenedores, entre os quais se destacam: Aços Villares, Banco Itaú, Copersucar, Banco de Boston, Dow Química, Gradiente, Nestlé, Philco, Sharp e Votorantim (primeiros mantenedores), e posteriormente pelas empresas Amil Assistência Médica Internacional, Arno, Banco Bamerindus, Banco Bozano Simonsen, Banco Fenícia, Bombril, Bradesco, Companhia Brasileira de Petróleo Ipiranga, Companhia Antártica Paulista, Citibank, Companhia Nestlé Indústria e Comércio, Construtora Norberto Odebrecht, Eucatex Indústria e Comércio, Indústrias Gradiente, Rhodia, Indústrias Votorantim, White Martins, TV Globo, Unibanco Corretora de Seguros, Varig, Vasp e Xerox do Brasil.
De acordo com informações do IL-RJ, a partir de meados da década de 2000, em decorrência “de problemas administrativos, os ILs foram sendo reincorporados ao IL-RJ e fechando suas filiais”.13 O Instituto Liberal do Rio Grande do Sul converteu-se em Instituto Liberdade. Também nesse mesmo período foram constituídas várias entidades independentes em defesa do neoliberalismo, como o Instituto Mises Brasil, os Institutos de Formação de Líderes, o Instituto Millenium, o Instituto Liberal do Nordeste, o Instituto Ordem Livre e Estudantes pela Liberdade, todos atuantes em parceria com IL-RJ (IL-RJ, 2018).
Segundo dados divulgados pela 2017 Global Go To Think Tank Index Report,14 o Brasil tem 93 think tanks, dentre os quais se destaca o Instituto Millenium (Imil), pela sua forte inserção política e midiática, característica que confere a essa entidade posição de protagonista na batalha de ideias liberais no País, a partir de sua criação. O aporte financeiro assegurado pelas mantenedoras/doadores, a estrutura política administrativa, o corpo de especialistas e convidados aliado a um conjunto incessante de atividades desenvolvidas em âmbito nacional conferem ao Imil a condição de polo de ideias liberais intelectualmente mais sofisticado e mais bem instrumentalizado para realizar, hoje no País, a sustentação política ideológica liberal (McGann, 2018).
O Imil foi criado formalmente em 2006, durante o Fórum da Liberdade, em Porto Alegre, pelo chicago-boy Armínio Fraga, para ser um polo irradiador de ideias liberais no Brasil. O instituto é uma organização político-empresarial mantida por líderes de grandes corporações – Gerdau; Globo; Pottencial Seguradora, uma das empresas de Salim Mattar, dono da locadora de veículos Localiza; Abril; Banco Pactual; Bank of America Merrill Lynch; grupo Évora, dos irmãos Ling; grupo Ultra; e Hélio Beltrão.
De acordo com informações apresentadas no site da organização, o Imil é uma entidade sem fins lucrativos e sem vinculação político-partidária, com sede no Rio de Janeiro. Formado por intelectuais e empresários, “o instituto promove valores e princípios que garantem uma sociedade livre, como liberdade individual, direito de propriedade, economia de mercado, democracia representativa, Estado de Direito e limites institucionais à ação do governo”.
A estrutura político-administrativa do Imil é formada pelas seguintes instâncias: Câmara de Mantenedores, Câmara de Fundadores, Conselho de Governança, Conselho Fiscal e Comitê Gestor. O Millenium realiza regularmente atividades como seminários, palestras e encontros por todo o País que são cobertas pela imprensa e publicadas no portal. Os eventos promovidos pelo Imil contam com o apoio de um corpo de 200 especialistas de diversas áreas do conhecimento. Ademais, a entidade dispõe de uma equipe de convidados composta por notórios defensores do ideário liberal de inserção na grande mídia, dentre os quais: acadêmicos, advogados, juristas, economistas, cineastas, empresários, âncora de telejornal, jornalistas e analistas políticos (Figura 5).
O papel estratégico de relevo do Millenium no fomento e na difusão do ideário neoliberal, mais especificamente da economia de mercado no Brasil, deve-se, em larga medida, à atuação de intelectuais orgânicos da economia de mercado (os chicago-boys brasileiros), notadamente Armínio Fraga, Gustavo Franco, Pedro Malam, Paulo Guedes; de empresários brasileiros ligados ao grande capital; e de empresários ligados à grande imprensa, como Ali Kamel, diretor-geral de Jornalismo e Esportes da Rede Globo. O instituto contribui, assim, significativamente, para a disseminação e institucionalização das prescrições neoliberais no Brasil.
O Millenium, assim como os demais institutos que compõem a imensa rede internacional difusora do ideário liberal, rejeita e desqualifica o arcabouço acadêmico da esquerda e contrapõe-se a ele fabricando e legitimando produções de saberes, como se fossem a própria racionalidade econômica.
Essa rede alinhada à agenda de Washington veicula matérias, como do link conteúdo/artigo do site do Imil. Vale examinar duas matérias disponíveis no referido link, cujos temas são obstinadamente defendidos pelos neoliberais:
Governo Temer e as prescrições para superação da crise econômica;
flexibilização da legislação trabalhista.
O tema do Governo Temer e das prescrições para superação da crise econômica é tratado em entrevista concedida por Armínio Fraga ao jornal Estado de S.Paulo. A pergunta central da enquete era: “O País melhorou depois do impeachment?” e “O governo de Michel Temer segue na direção certa?”. Ele responde: “A mudança foi impressionante. O Brasil, como estava, ia quebrar três vezes mais”. Na sequência da entrevista, ele defende a agenda na linha do “consenso” de 1989:
O ideal seria fazer o ajuste mais rápido, mas está atuando dentro do que é possível no campo político a essa altura do jogo. A agenda é boa. A PEC do teto do gasto (Proposta de Emenda Constitucional 241) é um avanço extraordinário. Ainda assim, exige a reforma da Previdência, se não o teto não fica de pé. Mas eu acho que vai precisar de mais reformas. [...] se aprovar a reforma da Previdência no primeiro trimestre, vai ter tempo para fazer mais e não vejo por que parar. Acho muito boa a ideia de discutir as questões trabalhistas. O Estadão, aliás, publicou uma fantástica matéria sobre isso. (Instituto Millenium, 2018)
A matéria a que Armínio Fraga se refere trata do tema flexibilização da legislação trabalhista, veiculada também no Estado de S. Paulo: “Flexibilização da CLT pode ajudar a impulsionar a economia, segundo especialistas”. Nesse texto jornalístico, tece-se crítica mordaz ao que se nomeia “rigidez das leis trabalhistas brasileiras”. A estrutura do artigo é intercalada com breves pareceres de vários “especialistas”, todos obviamente favoráveis à flexibilização da legislação trabalhista. O empresário David Neeleman, fundador da Azul, expressa as suas dificuldades com a legislação trabalhista. Ele explica que pretendia criar um call center remoto, no qual os trabalhadores atenderiam as ligações da clientela em suas próprias casas. A proposta permitiria a mulheres com filhos pequenos, além de aposentados e estudantes, organizar a jornada de trabalho de acordo com a sua disponibilidade. Essa proposta tão “avançada” não pôde ser executada em razão do rigor da legislação trabalhista brasileira (ibid.).
As matérias veiculadas nos sites dos institutos de ideias liberais apresentam os mesmos conteúdos. Com grau maior ou menor de sofisticação argumentativa, essas entidades se aglutinam em torno da agenda neoliberal. À proporção que essas organizações operam, vão inscrevendo ideologicamente pensamentos, opções e convicções. Elas formam padrões de comportamento, pontos de vista, enfoques, pareceres e concepções, reguladas em âmbito nacional e internacional. Essa formação gradativa abarca um conjunto significativo de pessoas, conjunto este que se eleva rapidamente em dimensão de massa.
Com o propósito de aproximar ainda mais essa organização de importantes grupos formadores de opinião, como os estudantes universitários e os jornalistas, foram desenvolvidos, pelo Instituto Millenium, desde 2012, os seguintes projetos:
Imil na Sala de Aula – leva especialistas a universidades de todo o País para debater com os alunos temas de relevância no cenário nacional, sempre atrelados aos valores do instituto.
Millenium nas Redações – promove encontros com a imprensa. O objetivo é contribuir para o fortalecimento da liberdade de expressão, por meio da promoção de uma visão mais crítica e independente.
Além disso, o Instituto Millenium dispõe de um site bem constituído que divulga as suas próprias produções e replica matérias jornalísticas de diversos órgãos de imprensa, sobretudo do jornal Estado de S.Paulo. Possivelmente, seja este, diferentemente das demais organizações, o papel por excelência desse instituto. Em verdade, há um forte vínculo de articulação e de complementaridade entre os diversos institutos de ideias liberais, e provavelmente distintas organizações liberais atuem mais em outras frentes dessa mesma batalha; por exemplo, dedicando-se a treinamento de jovens, realizando formação de líderes, organizando fóruns de debates, ofertando cursos de graduação e pós-graduação, produzindo e veiculando informações atualizadas do Brasil para municiar redes internacionais.
Estudantes pela Liberdade e o Movimento Brasil Livre (MBL)
A Atlas patrocina, no Brasil, com outras redes e laboratórios de ideias, estudantes, jovens latino-americanos para se engajarem na batalha ideológica de desgastarem e de apertarem o cerco aos governos considerados de esquerda, empunhando os anacrônicos bordões liberais revestidos de uma nova retórica. Em 2016, o Estudantes pela Liberdade no Brasil – fundador do Movimento Brasil Livre – recebeu da Atlas e da Rede Students for Liberty, da qual é associada, aproximadamente, R$ 300 mil para investir na batalha contra os governos populistas.
Segundo informações contidas no site desse laboratório de ideias, a sua criação teve início em 2010, a partir do “blog no qual Juliano Torres e Anthony Ling escreviam conteúdos”. A entidade desenvolveu, como primeiro projeto, uma revista acadêmica, chamada Estudos pela Liberdade. A essa altura, “dois grupos faziam parte da organização: o Círculo de Estudos Roberto Campos e Círculo Bastiat, um na UFRGS e outro na Faculdade Pitágoras”. No Seminário de Verão do Instituto Ordem Livre, em 2012 – organizado por Diogo Costa, Magno Karl e Elisa Martins –, Juliano Torres, Anthony Ling e os outros integrantes do grupo criaram “um projeto mais elaborado para mudar a vida dos estudantes nas universidades brasileiras”. Para tanto, deram “início às atividades de uma organização focada na divulgação das ideias de liberdade”. Essa empreitada foi assumida por Juliano Torres que contou com colaboração de “Anthony Ling, Lino Gill, Pedro Menezes e Mano Ferreira”.
Em entrevista à repórter Mariana Amaral – por ocasião do Fórum pela Liberdade em 2015 –, Juliano Torres, o diretor executivo do Estudantes pela Liberdade (EPL), explicita a ligação entre o EPL e o Movimento Brasil Livre (MBL): o Movimento Brasil Livre (MBL) foi uma legenda cunhada pelo EPL para possibilitar a sua atuação nas manifestações do Passe Livre em 2013, resguardando as normas das “organizações americanas que são impedidas de doar recursos para ativistas políticos pela legislação da receita americana (IRS)”. Juliano relata:
Quando teve os protestos em 2013 pelo Passe Livre, vários membros do Estudantes pela Liberdade queriam participar, só que, como a gente recebe recursos de organizações como a Atlas e a Students for Liberty, por uma questão de imposto de renda lá, eles não podem desenvolver atividades políticas. Então a gente falou: “Os membros do EPL podem participar como pessoas físicas, mas não como organização para evitar problemas. Aí a gente resolveu criar uma marca, não era uma organização, era só uma marca para a gente se vender nas manifestações como Movimento Brasil Livre. Então juntou eu, Fábio [Ostermann], juntou o Felipe França, que é de Recife e São Paulo, mais umas quatro, cinco pessoas, criamos o logo, a campanha de Facebook. E aí acabaram as manifestações, acabou o projeto. E a gente estava procurando alguém para assumir, já tinha mais de 10 mil likes na página, panfletos. E aí a gente encontrou o Kim [Kataguiri]15 e o Renan [Haas], que afinal deram uma guinada incrível no movimento com as passeatas contra a Dilma e coisas do tipo. Inclusive, o Kim é membro da EPL, então ele foi treinado pela EPL também. E boa parte dos organizadores locais são membros do EPL. Eles atuam como integrantes do Movimento Brasil Livre, mas foram treinados pela gente, em cursos de liderança”. (Agência Pública, 2015)
Esse relato evidencia como essas organizações de ideias liberais investiram vigorosamente no desgaste do governo Dilma. Elas não apenas se engajaram nas manifestações de junho de 2013, mas a insuflaram. Infere-se, também, que o movimento de 2013 permeou ideologicamente o caminho para o movimento pró-impeachment, desencadeado em 2015, fomentado pelo Movimento Brasil Livre que aglutinou as forças conservadoras do País e pôs em marcha o golpe, em atuação articulada com seus correligionários, que operam em outras organizações liberais.
No processo eleitoral de 2018, as organizações liberais, nomeadamente o MBL, para tentar evitar a divulgação de notícias falsas pela rede social, atuaram disseminando avalanches de mensagens falsas nas redes sociais com o objetivo de desqualificar os governos petistas e a esquerda e enaltecer a candidatura de Bolsonaro. Segundo o jornal El País, esse movimento divulgou em vídeos e postagens publicados na internet; os ativistas tentam desqualificar o trabalho das agências profissionais de checagem de dados, escolhidas como parceiras pelo Facebook e até divulgam perfis pessoais dos jornalistas desses veículos para classificá-los como "militantes da esquerda". A ironia é que dirigentes do MBL. como o próprio Santos, Kim Kataguiri e Arthur do Val, mais conhecido pelo apelido de Mamãefalei, e inclusive um deputado federal e um procurador da Justiça do Rio de Janeiro difundiram dados falsos para criticar o combate aos dados falsos.
O Fórum da Liberdade é um evento realizado sob o auspício do Instituto de Estudos Empresariais (IEE) e, segundo informações do site, em “2013, foi reconhecido pela Revista Forbes como o maior espaço de debate político, econômico e social da América Latina” (IEE, 2018).
O Fórum tem o expresso propósito de fomentar alternativas objetivas de explicar e replicar as ideias de livre mercado ao público jovem universitário. Nessa perspectiva, promove debates como palestrantes liberais, como Luis Felipe Pondé, Diogo Costa, Demétrio Magnoli, Mário Mesquita, Alejandro Chafuen e Ronaldo Caiado. Dessa forma, oferece uma contribuição imprescindível, nessa batalha, mediante a cobertura maciça da mídia nacional ao Fórum da Liberdade.
O evento propiciou, até os dias atuais, a exposição de 300 palestrantes, sendo 103 deles estrangeiros, e cinco ganhadores do Prêmio Nobel, quais sejam: James Buchanan, Gary Becker, James Heckman, Douglass North e Mario Vargas Llosa. Contou, também, com a presença de sete chefes de Estado, de 53 lideranças políticas nacionais e internacionais, e de 16 ministros de Estado, além de lideranças empresariais, acadêmicos e estudiosos. O Fórum congrega anualmente um público médio de 5.000 pessoas e mais de 200.000 acessos no Fórum da Liberdade On-line, sendo que, destes, mais de 150.000 são por meio das redes sociais – Facebook, Twitter e YouTube. O Fórum também é compartilhado por mais de 25 mil fãs no Facebook; os vídeos do YouTube tiveram mais de 77.000 visualizações; e a transmissão ao vivo atinge mais de 100 mil acessos no mês de realização do evento.
Cabe destacar o papel emblemático desempenhado pelo 28º Fórum da Liberdade, realizado em 2015, cujo caráter político apoteótico, em razão da conjuntura do País, revela o nível de articulação e o grau de beligerância da batalha ideológica neoliberal. O evento foi realizado nos dias 13 e 14 de abril de 2015, na PUC-RS, em Porto Alegre, num auditório de 2 mil lugares, totalmente repleto. O 28º Fórum contou, inclusive, com a participação de Alejandro Chafuen, presidente da Atlas. Os patrocinadores oficiais do evento foram Souza Cruz, Gerdau, Ipiranga e RBS (afiliada da Rede Globo).
Considerações finais
As redes de organizações liberais exercem uma ação ofensiva e beligerante contra as ideias e os projetos políticos que se opõem à ordem espontânea do mercado. Essa ofensiva não se processa apenas por meio da grande mídia, mas, sobretudo, mediante as miríades de redes liberais, que se imbricam local, regional e globalmente e se complementam, gerando uma dinâmica veloz de fomento à produção de ideias, de táticas e de estratégias que municiam, em fluxo contínuo, a artilharia da batalha ideológica.
A batalha protagonizada por essas organizações envolve o engajamento não apenas do empresariado, mas de lideranças políticas e religiosas, de discentes de diferentes níveis de ensino, de diversos profissionais que atuam em atividades ligadas à formação de opinião, como acadêmicos, economistas, jornalistas, publicitários, advogados, juristas, docentes e artistas. Os materiais publicitários produzidos por essas redes de ideias compreendem: edição de livros, pesquisas de cunho acadêmico, tradução de livros e artigos, periódicos, folhetos, cartilhas. As atividades de divulgação ocorrem por meio de congressos, fóruns, simpósios, seminários, colóquios, conferências e, até mesmo, cimeiras.
Verifica-se, assim, que a força operacional desses institutos consiste em sistematizar, alinhar e padronizar uma visão de mundo sob a qual a função do Estado se restringe a apenas assegurar os meios de reprodução do capital, requeridos pelos setores hegemônicos da burguesia, ou seja, reduzir o Estado à esfera dos interesses do grande capital interno e internacional. Trata-se, em última instância, de formar a convicção nos indivíduos de que o princípio da igualdade é injusto e que a desigualdade encerra em si um caráter de justiça conferido pelo merecimento.
Revela-se falaciosa a ideia defendida por Adam Smith, segundo a qual a “mão invisível” do mercado livre regula as relações econômicas sociais e produz o bem comum. Revela-se também falaciosa a acepção hayekiana da ordem espontânea do mercado que ressalta a superioridade do mercado sobre a cognição humana. A intervenção concreta, orquestrada, deliberada, das organizações liberais na América Latina, evidencia o oposto da “mão invisível” e da “ordem espontânea”. O dirigismo neoliberal concentra-se nas ofensivas sistemáticas aos governos eleitos de esquerda e de centro-esquerda, que não aderem ou aderem parcialmente aos ditames desmensurados do livre mercado. A batalha político-ideológica liberal não se restringe ao campo democrático. Ela é travada, a cada momento, de forma mais radicalizada, ardilosa e desumana; a estratégia é demonizar, criminalizar, desestabilizar e, por fim, demolir esses governos e os movimentos sociais que se opõem ao projeto liberalizante.
O compromisso real do neoliberalismo é com os interesses do grande capital. Quando os interesses dos agentes do livre mercado estão ameaçados, pela soberania da maioria, pela maioria assalariada, a força bruta, a ditadura, torna-se uma alternativa defendida por seus mentores, a exemplo do golpe no Chile protagonizado pelo general Pinochet, que tornou possível a implantação, naquele país, sob a batuta do regime ditatorial, do primeiro experimento neoliberal no mundo. Ao contrário do que apregoam os ideólogos do neoliberalismo, de que há uma correspondência direta entre democracia e liberalismo, liberalismo e democracia são concepções antitéticas, não guardando quaisquer vínculos. A concepção de democracia traz, na sua gênese, o escopo de garantir a maior participação da coletividade no processo público decisório; já a acepção neoliberal ocupa-se, tão somente, de resguardar as elites econômicas (grupo minoritário) em face daqueles que somente possuem a sua força de trabalho, para, assim, manter a dinâmica de acumulação e de reprodução do capital.