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O Império de Santo Elesbão na cidade do Rio de Janeiro, no século XVIII

Resumos

O artigo analisa a especificidade das formas de organização da geração de escravos africanos vindos da África Ocidental para a cidade do Rio de Janeiro no século XVIII. A autora mostra como esses africanos se reorganizam no interior das irmandades católicas destinadas a homens pretos e como garantem espaços de organização étnica e reprodução do grupo.


The article concerns on the special condition of the enslaved West African born peoples in Rio de Janeiro city, during the 18th century. The author shows how these Africans make use of their ethnic identity as a base to the catholic black brotherhoods where they organize themselves and keep the group together.


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  • 1
    Um conjunto de novos trabalhos sobre tráfico atlântico e história da África tem contribuído para esse debate. Destaco aqui os trabalhos de Paul E. Lovejoy. Transformations in slavery: a history of slavery in Africa. Cambridge University Press. 1983; Joseph Miller. Way of death: merchant capitalism and the Angolan slave trade 1730-1830. Princeton University Press. 1988; Patrick Manning. Slavery and African life. Occidental, Oriental, and African slave trades. Cambridge University Press. 1990; John K. Thornton. Africa and Africans in the making of the Atlantic world, 1400-1680. Cambridge University Press. 1992; David Eltis. The rise of African slavery in the Americas. Cambridge University Press. 2000.
  • 2
    A especificidade da situação dos escravos nascidos na África no universo da escravidão das Américas começa a merecer a atenção dos historiadores, mas enfrenta ainda o problema do reconhecimento das fontes adequadas para a análise e da freqüente dispersão desse material. Em trabalhos relativos ao Brasil, poucos autores têm enfocado a presença de africanos vindos da África Ocidental para o Rio de Janeiro. Para o século XIX ver Mary Karasch. A vida dos escravos no Rio de Janeiro. 1808-1850. São Paulo. Companhia das Letras. 2000 (edição original em inglês de 1987) e Carlos Eugênio Líbano Soares. A capoeira escrava e outras tradições rebeldes no Rio de Janeiro (1808-1850). São Paulo. Unicamp/ CECULT. 2001. Para o século XVIII ver Mariza de Carvalho Soares. Devotos da cor. Identidade étnica, religiosidade e escravidão no Rio de Janeiro, século XVIII. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira. 2000.
  • 3
    Sobre grupos de procedência ver Mariza de Carvalho Soares. Devotos da cor... Ver também Fredrik Barth. "Grupos étnicos e suas fronteiras". In O guru, o iniciador e outras variações antropológicas. Organização de Tomke Lask. Rio de Janeiro. Contra Capa. 2000; e Paul Lovejoy. "Enslaved africans in the diaspora". In: Paul Lovejoy (edited by) Identity in the shadow of slavery. London/New York. Continuum. 2000.
  • 4
    Destaco trabalhos como os de Stuart Schwartz. Segredos internos. Engenhos e escravos na sociedade colonial (primeira edição em inglês, 1985). São Paulo. Companhia das Letras. 1995; João José Reis. Rebelião escrava no Brasil. A história do levante dos malês (1835). São Paulo: Brasiliense. 1986; Silvia Hunold Lara. Campos da violência. Escravos e senhores na capitania do Rio de Janeiro. 1750-1808. Rio de Janeiro: Paz e Terra. 1988.
  • 5
    "Preto" é um termo de uso generalizado no século XVIII. As irmandades são oficialmente denominadas "Homens Pretos" e "Homens Pardos".
  • 6
    O compromisso de 1618 de Santa Casa da Misericórdia de Salvador estabelece sete condições para filiação, entre elas ser "limpo de sangue", condição ligada ao Estatuto da Pureza de Sangue. No Rio de Janeiro a Santa Casa de Misericórdia é a primeira agremiação leiga a instituir esse critério de exclusão. A J R. Russell-Wood. Fidalgos e filantropos. A Santa Casa de Misericórdia da Bahia, 1550-1755. Brasília: EdUnB. 1981; Ver também Bernard Vincent. "Lês confréries de noirs dans la Péninsule Ibérique (XVe-XVIIIe siècles). In David González Cruz (editor) Religiosidad y costumbres populares em Iberoamérica. Actas Del Primer Encuentro Internacional celebrado em Almonte-El Rocio (España) del 19 al 21 de febrero de 1999; e John Thornton. Africa and Africans..., pp.183-205.
  • 7
    Compromisso da Irmandade de NS do Rosário dos Homens Pretos do Convento de São Domingos de Lisboa, capítulo 7. Patrícia Ann Mulvey The black lay brotherhoods of colonial Brazil: a history. City University of New York, Ph.D. 1976. Xerox University Microfilms. Ann Arbor. Michegan 48 108. "Appendix B". pp. 255-263.
  • 8
    Nas irmandades do Rosário, muitas delas criadas ainda no século XVII, são aceitos pretos de um modo geral, mas apenas os angolas e congos e algumas vezes crioulos têm acesso a cargos na irmandade. No século XVII a Irmandade de NS do Rosário de Salvador aceita apenas angolas e crioulos. A Irmandade de Santo Antônio do Categeró aceita qualquer pessoa, mas restringe o acesso aos cargos a angolas e crioulos. No Rio de Janeiro apenas após 1759 a Irmandade do Rosário abre aos africanos vindos da Costa da Mina a possibilidade de integrar a Mesa diretora. Sobre a Irmandade de Santo Antônio do Categeró, ver A. J. R Russell-Wood. Fidalgos e filantropos..., p. 108. Na segunda metade do século XVIII, por exigência régia (ainda não muito bem esclarecida na documentação consultada) os compromissos retiram esse tipo de restrição. Compromisso da Irmandade de NS do Rozario e Sam Benedito do Rio de Janeiro retira a restrição em 1759. AHU cód. 1950, capítulo 12, parágrafo 33. Agradeço a cópia desse documento a Larissa Viana. O compromisso da Irmandade de Santo Elesbão e Santa Efigênia faz o mesmo em 1767 onde no capítulo 25 reformula o capítulo 10 que impede a entrada de angolas. Arquivo da Irmandade de Santo Elesbão e Santa Efigênia, sem código.
  • 9
    Faço aqui referência à noção de identidade contrastiva proposta pelo antropólogo Roberto Cardoso de Oliveira. Identidade, etnia e estrutura social. São Paulo. Pioneira. 1976.
  • 10
    Olympio de Castro. "Memórias sobre a Irmandade de NS do Rosário e São Benedito dos Homens Pretos do Rio de Janeiro, escrita pelo Rev.mo Capelão Cônego Dr. Olympio de Castro (publicada na edição especial do Jornal do Commercio, comemorativa do Ano Santo) 1928." In Compromisso da Irmandade de NS do Rosário e S. Benedito dos Homens Pretos ereta na sua mesma igreja nesta Corte do Rio de Janeiro. 1928. pp. 47-58.
  • 11
    Sobre a diversidade das nações africanas no Rio de Janeiro, ver Mariza de Carvalho Soares."Descobrindo a Guiné no Brasil colonial". RIHGB, ano 161, no 407, abr/jun 2000. pp. 71-94.
  • 12
    Compromisso da Irmandade de Santo Elesbão e Santa Efigênia (1740). E Compromis-so da Irmandade de Santo Antônio da Mouraria do Rio de Janeiro. Arquivo Nacional, Códice 825.
  • 13
    Robin Law. The slave coast of West África 1550-1750. The impact of the Atlantic slave trade on an African society. Claredon Press. Oxford. 1991. pp. 14, 21-22. Ver mapa 18. No ano de 1741 começa a circular em Minas Gerais um vocabulário manuscrito da então chamada "Língua geral da Mina". Considerando que os povos da Costa dos Escravos começam a ser traficados para Minas Gerais por volta de 1700 e que já no ano de 1741 está sendo divulgado nessa capitania o referido vocabulário, é justo supor que ou esse intercâmbio lingüístico foi construído muito rapidamente no cativeiro ou já existia antes dele. Antônio da Costa Peixoto. Obra nova de Lingoa g.al de mina traduzida, ao nosso Igdioma por Antonio da Costa Peixoto, Naciognal do Rn.o de Portugal, da Provincia de Entre Douro e Minho, do comcelho de Filgr.as Que com curuzid.e trabalho, e desvello, se expoz, em aprendella, p.a tembem a emsignar, a q.m for curiozo, e tiver von.de de a saber E.o Nas Minas Gerais,e Frg.a de Barm.ou Anno de 1741. Lisboa. Agência Geral das Colônias. 1949.
  • 14
    Sobre os povos de língua gbe na Bahia ver Luis Nicolau Pares. "Transformations of thesea thunder voduns in the Gbe-speaking area and in the Bahian Jeje Candomblé." Enslaving Connections: Africa and Brazil during the Era of the Slave Trade. York University, Toronto. 11-15 October, 2000. vol 2.
  • 15
    Costa da Mina é a rubrica usada nos registros portugueses do tráfico atlântico onde nãohá menção à Costa dos Escravos.
  • 16
    "...os moradores do Rio de Janeiro, e das capitanias suas anexas, continuam a mandar ,há poucos anos, várias embarcações a resgatar escravos a Costa da Mina, o que até agora não faziam..." Arquivo Público do Estado da Bahia, 7, 108. Apud Pierre Verger. Fluxo e refluxo do tráfico de escravos entre o golfo do Benin e a Bahia de Todos os Santos dos séculos XVIII a XIX.3a edição. São Paulo: Corrupio. 1987. pp. 39-40.
  • 17
    Ao iniciar o século XVIII já existem duas rotas de escravos em direção às lavras de ouro: a primeira sai da cidade de Salvador e, passando pela Vila de Cachoeira, segue por terra pelo Caminho do Sertão até as Minas; a outra sai de Salvador por mar, passa pelo Rio de Janeiro onde se junta à rota que vem da Mina para o Rio Janeiro, segue por mar para a Vila de Parati e daí sobe por terra a Serra da Mantiqueira até chegar às Minas. De acordo com o Livro de passaportes e guias da cidade de Salvador entre os anos de 1718 e 1729, saem dessa cidade 21. 238 escravos sendo que 19.500 deles com destino a Minas. Livro de passaportes e guias, 1718-1729. Arquivo Público Estado da Bahia, doc. 248.
  • 18
    "E como esta Irmandade forão seus fundadores homens pretos de todas as naçõez, não he justo deixem de ocupar todos os cargoz e empregos dela, pelo que ordenamoz que todas e qual quer pessoa que for Irmão desta Irmandade, possa servir e ocupar todos os cargoz dela, sem que para hisso se admita preferencia de melhoria desta, ou daquela nasção, tanto de Guinê, como da Costa da Mina," Compromisso da Irmandade de NS Rosário do Rio de Janeiro, 1759, capítulo 12. AHU cód. 1950.
  • 19
    Embora sejam, efetivamente, um grupo minoritário em relação aos angolas, na primeira metade do século XVIII, os minas chegam a representar quase 30% da população africana da cidade. Além disso, suas devoções e irmandades indicam ser esse grupo bastante organizado e provido de recursos financeiros. Mariza de Carvalho Soares. Devotos da cor....
  • 20
    Segundo o marquês, essas capelas, freqüentadas por "pessoas depravadas, e de má vida, e costumes" acontecem "cousas torpes, e indecentes". Por isso seu plano, estabelecido de comum acordo com os irmãos do Rosário, é a demolição das pequenas capelas e a concentração de todas as devoções de pretos na Igreja do Rosário. Requerimento da Irmandade do Rosário ao rei datado de 27.07.1774. AHU. Rio de Janeiro - avulsos - caixa 107 - doc. 31. Agradeço a Maria Fernanda Bicalho a transcrição dessa correspondência.
  • 21
    Essa explicação é dada pelo pintor Jean Baptiste Debret que reside na cidade entre 1816e 1831, Provavelmente por esse motivo, as folias do Rio de Janeiro não são registradas em suas pranchas, nem nas de outros artistas que visitam a cidade no século XIX. Segundo Debret "...com a presença da Corte no Rio de Janeiro proibiram-se aos pretos as festas fantasiadas extremamente ruidosas a que se entregavam em certas épocas do ano para lembrar a mãe pátria; essa proibição privou-os igualmente de uma cerimônia extremamente tranqüila, embora com fantasias, que haviam introduzido no culto católico. É por esse motivo que somente nas outras províncias do Brasil, se pode observar ainda a eleição anual de um rei, de uma rainha, de um capitão da guarda..." Debret reproduz uma coleta de esmolas na Irmandade do Rosário do Rio Grande do Sul. No Rio de Janeiro, pinta o enterro do filho de um rei negro. Na legenda dessa prancha não há qualquer associação entre o filho do rei e as folias que ele afirma não mais festejarem seus santos de devoção na cidade do Rio de Janeiro. Jean Baptiste Debret. Viagem pitoresca e histórica ao Brasil. Notas de Sergio Milliet. São Paulo. Livraria Martins. 1940.
  • 22
    A documentação referente à Igreja de Santo Elesbão e Santa Efigênia é composta pordois conjuntos de fontes. O primeiro diz respeito à documentação própria irmandade (atas e compromissos) pertence ao acervo da própria irmandade (sem qualquer classificação) e também à Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro e à Biblioteca Nacional de Lisboa,. O segundo conjunto é composto pelos testamentos pertencentes ao Arquivo da Cúria Metropolitana do Rio de Janeiro, também sem classificação. Recentemente localizei no Arquivo da Cúria uma cópia impressa não datada do compromisso de 1740, com todas as alterações nele acrescidas até o ano de 1767. A ata da Congregação Mahi pertence à Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro BN(MS)9,3,11; a proposta de compromisso da Irmandade de NS dos Remédios pertence à Biblioteca Nacional de Lisboa, AHU/CUcód.1300.
  • 23
    É o caso de Antônio Luiz Soares, preto forro mina falecido com bastante idade em 1755que tendo saído de sua terra com a "idade de sete anos" informa em seu testamento: "declaro que fui nascido em terras de brutos da gentilidade [...] da Costa da Mina e sou nação cabu". Arquivo da Cúria Metropolitana do Rio de Janeiro, Livro de óbitos e testamentos da Freguesia do Santíssimo Sacramento, 1746-1776. fl. 298v. Os cabus são também chamados kabu, gabu ou ngaabu. Alberto da Costa e Silva. A enxada e a lança. A África antes dos portugueses, 2a edição revista e ampliada. Rio de Janeiro. Nova Fronteira. 1996. pp. 610-612.
  • 24
    Nesse sentido as fontes locais indicam situações mais complexas que as apontadas pelo historiador John Thornton quando argumenta a unidade cultural das confrarias de africanos no Novo Mundo e a formação do que chama de "grupos culturais". Ver John Thornton. Africa and Africans... capítulo 7.
  • 25
    O mesmo capítulo acrescenta ainda severa punição aos que ousam descumprir essas determinações. A gravidade do ato e a punição a ele atribuída fazem suspeitar da freqüência com que, de modo não esclarecido, os angolas e outros indesejados irmãos impõem sua presença na irmandade. "E o Juiz e mais oficiais e os Irmãos da Mesa que ao contrário fizerem, acabando o ano de sua ocupação não tornarão a servir coisa alguma na dita Irmandade, de que se fará termo pelo Juiz oficial e mais Irmãos de Mesa que logo lhe suceder, destituindo outro sem os ditos Irmãos que admitam os ditos pretos e pretas d'Angola, crioulas ou cabras, tanto homens como mulheres, devolvendo a cada um o que deram de sua entrada, para que fique de nenhum efeito seus assentos de que se fará declaração à margem dos livros deles". Arquivo da Irmandade de Santo Elesbão e Santa Efigênia, Compromisso da Irmandade (1740) s/ código.
  • 26
    Entre eles os dagomés, mahis, savalus e agolins. É feita ainda menção a um grupo ianno (ou lano) que não pude identificar. BN(MS)9,3,11. A documentação africana cuja nomenclatura mais se aproxima da encontrada no documento da Congregação Mahi por mim analisado é a obra do etnólogo Paul Hazoumé, nascido em Porto Novo em 1890, escrita em francês. Doguicimi é considerado o primeiro romance histórico africano. Doguicimi é a esposa do príncipe Toffa, prisioneiro de guerra dos mahi durante o reinado de Ghezo (1818-1858). Paul Hazoumè. Doguicimi. Paris. Maisonneuve et Larose. 1978.
  • 27
    Assinam o primeiro compromisso da irmandade em 1740 quatro irmãos, considerados"fundadores": Francisco Vieira, Antônio Bastos Maia, Francisco das Neves, Antônio Pires dos Santos.
  • 28
    Entre 1744 e 1748 são adquiridos três terrenos em nome da irmandade. Nessas nego-ciações estão envolvidas várias pessoas, dentre elas Manoel dos Santos Martins, Antonio Pires dos Santos e Francisco Gonçalves Nunes, ditos pretos forros e Clemente da Serra preto forro de Cabo Verde. AN - 4o Ofício de Notas. Livro de Notas: 24/2/1744-7/9/ 1744. No 36, p. 109; 4o Ofício de Notas. Livro de Notas: 20/10/1747-2/5/1748. No 43, p. 140; 1o Ofício de Notas. Livro de Notas: 10/5/1748-?/11/1748. Caixa 12866. Nº 115, p. 106. Agradeço a transcrição dos registros a Maurício Abreu.
  • 29
    Candelária é a freguesia portuária, onde se concentram os escravos minas da cidade na primeira metade do século XVIII. Na década de 1750 eles chegam a representar em torno de 50% da população escrava africana da freguesia, a maior parte deles trabalhando em atividades ligadas ao porto. Ver Mariza de Carvalho Soares. Devotos da cor...
  • 30
    Arquivo da Cúria Metropolitana do Rio de Janeiro, Livro de óbitos e testamentos. Freguesia da Candelária 1797-1809, óbito em 29.07.1803, fl 140v. Agradeço esse testamento a Eduardo Cavalcanti.
  • 31
    BN (MA) 9,3,11.
  • 32
    Os mahis habitam ao norte do reino do Daomé de quem são tradicionais inimigos. Osúnicos trabalhos disponíveis sobre eles são o de Jessie Gaston Mulira. A History of the Mahi Peoples from 1774-1920. A dissertation submitted in partial satisfction of the requirements for the degree of Doctor of Philosophy in History. University of California, 1984; e o de J. A. M. A. R. Bergé. "Étude sur lê pays Mahi". Bulletin du Comité d'Études Historiques et Scientifiques de l'A O F II (1928). pp. 708-55.
  • 33
    A Folia pode sair às ruas várias vezes ao ano, de acordo com os recursos e a vontade dosreis, mas seu principal compromisso é o comparecimento à festa dos oragos da igreja. A Folia se apresenta em trajes especiais cabendo ao rei manto, coroa, cetro e guarda-sol.
  • 34
    A mais relevante imagem pictórica das folias da cidade do Rio de Janeiro está em Carlos
  • 35
    Julião. (aquarelas por) Riscos iluminados de figurinhos de brancos e negros dos uzos do Rio de Janeiro e Serro do Frio. Introdução histórica e catálogo descritivo por Lygia da Fonseca Fernandes Cunha. Edição comemorativa do quinto centenário do Infante D. Henrique. Rio de Janeiro: Biblioteca Nacional/Ministério da Educação e Cultura. 1960.
  • 36
    Ajudá (capital Glehue), Aladá (capital Aladá) e Daomé (capital Abomé) são três reinosdistintos. A disputa entre Aladá e Ajudá ainda não tinha sido resolvida quando o Daomé conquista Aladá em 1724. Com a queda de Aladá, três mil refugiados são enviados a Ajudá, muitos morrem outros tantos são vendidos aos europeus. Não há notícia da chegada de aladás à cidade do Rio de Janeiro, mas eles podem estar entre os minas. No período de 1718 a 1726 são ao todo batizados 681 adultos minas na Freguesia da Sé da cidade do Rio de Janeiro: 57 em 1718; 64 em 1719; 50 em 1720; 95 em 1721; 107 em 1722; 73 em 1723; 125 em 1724; 79 em 1725 e 31 em 1726. Arquivo da Cúria Metropolitana do Rio de Janeiro, Livro de Batismo de Escravos da Freguesia da Sé, 1718-1726.
  • 37
    Segundo Robin Law, os mahis são mencionados como adversários do reino do Daomé pela primeira vez em 1732. Aparecem nos Archives Départementales de la Loire-Atlantique (Nantes, c. 739, Mallet de la Mine, Nantes, 08.01.1732) e na correspondência de João Basílio, administrador da Fortaleza de Ajudá (08. 09.1732), citado por Verger em Fluxo e reflux do tráfico de escravos entre o golfo do Benin e a Bahia de Todos os Santos dos século XVIII a XIX. 3a edição. São Paulo: Editora Corrupio. 1987.p. 154Os savalus aparecem em 1733 na documentação dos Archives Nationales (Paris) como "sabalours" (c. 6/25, Levet Whydah, 26.08.1733). Robin Law. Slave Coast...
  • 38
    Ambas as expressões são recorrentes na documentação referente aos membros de ummesmo grupo étnico ou de procedência. É interessante o registro de uma cantiga feito por Debret quase um século mais tarde. Segundo ele, "entre os moçambiques as palavras do canto fúnebre são especialmente notáveis pelo seu sentido inteiramente cristão (...). Dou aqui o texto Moçambique em português: "nós estamos chorando o nosso parente, não enxergamos mais; vai em baixo da terra até o dia do juízo, hei de século seculorum amem."
  • 39
    Quero aqui lembrar que o compromisso deve ser entendido como um relato dos acordos e impasses que surgem no interior de um campo de lutas. Se de um lado demonstra as estratégias para controle da Irmandade, por outro aponta para formas de administração das tensões internas. Sobre essa análise ver Mariza de Carvalho Soares. Devotos da cor ..., capítulo V.
  • 40
    A implantação do Império de Santo Elesbão lembra a criação do culto a Mawu no Daomé. Este, entretanto, é tema para outra oportunidade.
  • 41
    Arquivo da Irmandade de Santo Elesbão e Santa Efigênia. Compromisso da Irmandade(1740) capítulo 1 da Folia.
  • 42
    Luiz de Vasconcellos. "Memórias públicas e econômicas da cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro para o uso do vice-rei Luiz de Vasconcellos por observação curiosa dos anos de 1779 até o de 1789." Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. tomo XLVII, parte 1, ano 1884. p. 27.
  • 43
    "Regra ou estatutos por modo de hum dialogo onde, se dá noticia das Caridades e
  • 44
    Sufragaçoes das Almas que uzam os pretos Minnas, com seus Nacionaes no Estado do Brazil, expecialmente no Rio de Janeiro, por onde se hao de regerem e governarem fora de todo oabuzo gentilico e supersticiozo; composto por Francisco Alves de Souza pretto e natural do Reino de Makim, hum dos mais excelentes e potentados daquêla oriunda Costa da Minna". BN(MA)9,3,11. Sobre esse documento ver Mariza de Carvalho Soares. "Apreço e imitação no diálogo do gentio convertido" Ipotesi. Revista de estudos literários. V. 4, nº 1, jan-jun, 2000. pp.111-123.
  • 45
    BN (MA) 9,3,11.
  • 46
    Os mahis estão na irmandade desde os anos de 1740. No ano de 1755 o rei Pedro da Costa sepulta um filho e o regente Ignácio Gonçalves do Monte, um escravo. A igreja é inaugurada em 1754 e o ano de 1755 corresponde aos primeiros sepultamentos em seu cemitério. Arquivo da Cúria Metropolitana do Rio de Janeiro, Livro de óbitos e testamento da Freguesia da Sé, 1746-1776.
  • 47
    O fato de ser designado como um "verdadeiro maquino" faz ainda pensar que, entre os assim cotidianamente designados, existiriam alguns mais verdadeiros que outros.
  • 48
    De acordo com a ata da Congregação Mahi, sua morte ocorre no dia 25 de dezembro de 1783. A diferença de dois dias pode ser uma mera confusão ou indicar um tempo pela disputa do morto e de seu legado.
  • 49
    Arquivo da Cúria Metropolitana do Rio de Janeiro, Livro de óbitos e testamentos da Freguesia do Santíssimo Sacramento - 1776-1784.
  • 50
    Esse testamento, encontrado depois da publicação do livro Devotos da cor no qual existe um capítulo sobre a Congregação Mahi, apresenta novas informações além das obtidas através da ata da irmandade que trata da sua morte.
  • 51
    O prazo normal para essas prestações de conta gira em torno de dois ou três anos, e o dito testamento ainda não foi localizado.
  • 52
    A referência a seu avô como "rei" pode indicar tanto um tipo de poder político centralizado quanto a idéia apresentada por Law de um conjunto de pequenos grupos independentes.
  • 53
    Um Manoel dos Santos Martins está entre os compradores do terreno onde é construída a igreja. O uso do mesmo sobrenome não significa parentesco entre eles e sim a possibilidade de, conforme costume, serem ambos escravos de um mesmo senhor.
  • 54
    BN(MA)9,3,11. É praxe em todos os testamentos a viúva aparecer como testamenteira acompanhada de mais um ou dois membros da irmandade que se encarregam de todas as providências a serem tomadas. Esse é um encargo da irmandade e não das organizações de menor porte, existentes no interior da igreja. Apenas a irmandade tem existência jurídica de modo a poder assumir esse tipo de encargo. Isso faz suspeitar que a viúva estaria se aliando à direção da irmandade (controlada pelos dagomés) em oposição ao grupo da Congregação Mahi até então governada por seu marido. Daí sua pretensão de ser a imperatriz da Costa da Mina, cargo que só pode ser atribuído à mulher que acompanha o Imperador da irmandade e não a simples rainhas de folias nacionais.
  • 55
    Sobre recursos feitos às autoridades régias e ao próprio monarca ver A. J. R. Russell-Wood. "Acts of grace': Portuguese monarchs and their subjects of African descent in eighteenth-century Brazil". Journal of American Studies 32, 307-332. Cambridge University Press. 2000.
  • 56
    Por volta do ano de 1758, Tegbesu manda decapitar o agau do exército daomeano sobsuspeita de pretender deserdar para o país mahi. Mas ao mesmo tempo, a esposa preferida de Tegbesu é uma mulher mahi, que vem a ser a mãe de Kpengla, seu sucessor no trono do reino. Robin Law. The slave coast ...p 328. Sobre esses laços familiares ver Archibald Dalzel. The history of Dahomy an inland kingdom of Africa. Compiled from authentic memoires by Archibald Dalzel. A second printing with a new introduction by J. D. Fage. Frank Cass & Co. Ltd. 1967. pp. 76, 165, 192.
  • 57
    Archibald Dalzel. The history of Dahomy... p. 214.
  • 58
    Embora ainda não seja possível fornecer números exatos, os testamentos mostram que os minas, individualmente ou em grupo reúnem o maior patrimônio entre os africanos aforriados. Sobre isso ver trabalhos recentes de Sheila de Castro Faria. "Mulheres forras - riqueza e estigma social". Tempo, vol.5, no 9, jul/2000. pp. 65-92.
  • 59
    É oportuno lembrar que a primeira embaixada do Daomé ao Brasil é enviada por Tegbesue chega à cidade de Salvador, então capital da colônia do Brasil em 1750. Pierre Verger.
  • 60
    Fluxo e refluxo... pp. 257-263.
  • 61
    Livro de batismo de livres - Freguesia da Sé (1744-1761), 05.05.1745.
  • 62
    Ao longo do século XIX se generaliza o uso da palavra crioulo para todos os afrodescendentes escravos, forros ou livres nascidos no âmbito da sociedade colonial e depois imperial.
  • 63
    Se as tradições são apagadas pelo tempo, pela ocidentalização ou pela mestiçagem isso ocorre como resultado de um processo extremamente mais complexo e lento que o da vida de uma geração. Faço aqui uma referência ao debate que deriva dos trabalhos de Sidney W. Mintz e Richard Price. The birth of African-American culture: an anthropological perspective. (1a edição 1976). Boston. 1992.
  • 64
    BN(MS)9,3,11.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jun 2002
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