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Ernesto Benedicto Ottoni e a construção da carreira médica: entre leituras, práticas e produção do conhecimento (1841-1881)

Ernesto Benedicto Ottoni and the Construction of a Medical Career: Between Readings, Practices, and Knowledge Production (1841-1881)

Ernesto Benedicto Ottoni y la construcción de la carrera de Medicina: entre lecturas, prácticas y producción de conocimiento (1841-1881)

RESUMO

O artigo busca reconstituir a trajetória do médico Ernesto Benedicto Ottoni, entre 1841 e 1881. Personagem pouco reconhecido pela historiografia, sua biografia, contudo, traz elementos relevantes para uma reflexão sobre a carreira médica no século XIX. A proposta se insere na perspetiva de outros estudos que, a partir de casos particulares, contemplam as diversas formas de inserção dos médicos na sociedade imperial. Pretende-se mostrar os recursos que esse médico mobilizou para construir seus espaços de atuação, os quais envolviam tanto o reconhecimento acadêmico, como o exercício de funções junto ao Estado e relações familiares e sociais, aspectos inerentes ao exercício da profissão médica do período.

Palavras-chave:
Ernesto Ottoni; carreira médica; século XIX; biografia; Medicina

ABSTRACT

This article reconstructs the trajectory of physician Ernesto Benedicto Ottoni between 1841 and 1881. Ottoni’s career has thus far received little attention from historians, but his biography highlights important elements of nineteenth-century medical careers. This analysis builds on other studies that discuss the different relationships between medical doctors and imperial society, and argues that Ottoni mobilized various resources to build his spaces of action. These resources included academic recognitions, connections with the State, and familial and social relationships, all of which were inherent aspects of the medical profession during this period.

Keywords:
Ernesto Ottoni; Medical Career; Nineteenth Century; Biography; Medicine.

RESUMEN

El artículo busca reconstruir la trayectoria del médico Ernesto Benedicto Ottoni, entre 1841 y 1881. Este personaje es poco reconocido por la historiografía, su biografía, sin embargo, trae elementos resaltantes para una reflexión sobre la carrera médica en el siglo XIX. La propuesta se insiere en la perspectiva de otros estudios que, a partir de casos particulares, contemplan las diversas formas de inserción de los médicos en la sociedad imperial. Se pretende mostrar los recursos que ese médico movilizó para construir sus espacios de actuación, los cuales involucraban tanto el reconocimiento académico, como el ejercicio de las funciones junto al Estado y las relaciones familiares y sociales, aspectos inherentes al ejercicio de la profesión médica de ese período.

Palavras-clave:
Ernesto Ottoni; carrera de medicina; siglo XIX; biografía; medicina

O artigo tem como propósito abordar a trajetória do médico Ernesto Benedicto Ottoni, procurando identificar aspectos de sua carreira médica no século XIX. Dos elementos biográficos mobilizados no decorrer do texto, interessam em particular aqueles que remetem aos espaços onde Ottoni atuou e os trabalhos publicados. Desse modo, tomando o nome próprio como um fio condutor, buscou-se reconstituir “as linhas que convergem para o nome” e o “tecido social em que o indivíduo está inserido” (GINZBURG; PONI, 1989GINZBURG, Carlo; PONI, Carlo. O nome e o como: troca desigual e mercado historiográfico. In: GINZBURG, Carlo. A micro-história e outros ensaios. Lisboa: Difel; Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1989. p. 169-178., p. 175).

Adotando essa abordagem, trabalhos recentes têm buscado compreender os espaços de atuação dos médicos e as práticas de sociabilidade que delinearam suas trajetórias. De forma geral, esses estudos se voltam para casos de médicos que desenvolveram suas carreiras em espaços fora do ambiente do Rio de janeiro. Ainda que não viessem a integrar as elites médicas da Corte1 1 De acordo com Flávio Edler, tais elites eram constituídas por um grupo seleto formado pelos professores da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, os membros da Academia Imperial de Medicina; aqueles que se organizavam em torno de periódicos especializados e por aqueles que ocupavam os principais cargos na burocracia estatal e também cargos políticos (EDLER, 2014, p. 25). , alguns chegaram a obter reconhecimento nas regiões onde atuavam, o que implicava mobilizar uma série de estratégias que não se restringiam ao campo da formação, nem tampouco ao diploma (MARTINS, 2021MARTINS, Marcos Lobato. Medicina e política em uma cidade imperial: Joaquim Vieira de Andrade no Serro (MG). Projeto História, São Paulo, v. 71, p. 324-350, maio-ago. 2021.; SILVA; MAGALHÃES, 2021MAGALHÃES, Sônia Maria de; SILVA, Leicy Francisca da. O fortalecimento da profissão médica e militar no Brasil: trajetória de Thomaz Cardoso de Almeida (1809-1875). Fênix. Revista de História e Estudos Culturais, v. 18, n. 2, p. 244-268, jul.-dez. 2021.; FRANCO; NOGUEIRA, 2021FRANCO, Sebastião; NOGUEIRA, André. Entre livros, lentes e miasmas: as teses médicas da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro e a epidemia de cólera (1855-1856). Revista Brasileira de História da Ciência, Rio de Janeiro, v. 9, n. 1, p. 67-84, 2016.; PROENÇA, 2021PROENÇA, Anne Thereza de Almeida. A presença dos médicos no Vale do Paraíba fluminense do século XIX: personagens e espaços de análise. Revista Brasileira de História da Ciência, v. 14, n. 2, p. 120-143, jul.-dez. 2021.).

A esse respeito, Odaci Coradini aponta para uma questão conceitual importante para se pensar a formação e a transformação da elite médica no Brasil, qual seja, o fato de que essa se ancora, ao menos formalmente, na titulação escolar, numa sociedade que não tem a profissão como seu principal princípio de hierarquização” (CORADINI, 1997aCORADINI, Odaci Luiz. Grandes famílias e elite profissional na medicina do Brasil. História, Ciências, Saúde - Manguinhos, v. 3, n. 3, p. 425-466, nov. 1996-fev. 1997a., p. 428). Com base nos estudos de Bourdieu, o autor observa que os princípios de legitimação e hierarquização dos campos acadêmico, escolar e científico estão relacionados a dois eixos principais: de um lado, o “capital escolar ou científico, com seu ethos e suas regras próprias, e correlações com origens e trajetórias sociais que predispõem a estratégias de investimentos orientadas nesse sentido”; do outro, princípios de legitimação e hierarquização que não decorrem tanto do capital escolar, mas da origem e posição social; e relações com a cultura dominante e o poder econômico, político e cultural. No tocante à profissão médica no Brasil, o autor argumenta que o segundo polo é “parte estrutural do conjunto de princípios de legitimação que concorrem para as definições e a hierarquização do campo escolar e/ou científico” (­CORADINI, 1997aCORADINI, Odaci Luiz. Grandes famílias e elite profissional na medicina do Brasil. História, Ciências, Saúde - Manguinhos, v. 3, n. 3, p. 425-466, nov. 1996-fev. 1997a., p. 428).

Nesse caso, o que se coloca em pauta são os condicionamentos sociais que influíram nas trajetórias profissionais e os recursos sociais capazes de propiciar notabilidade, tais como participação política, desempenho nas burocracias públicas e organizações corporativas, a condição de professor e reconhecimento alcançado no exercício da clínica. O papel exercido por cada um desses recursos é variável e a trajetória profissional e ascensão social podem ter como base apenas um ou dois desses recursos, ou combinação de uma variedade deles (CORADINI, 1997bCORADINI, Odaci Luiz. O recrutamento da elite, as mudanças na composição social e a crise da medicina no Rio Grande do Sul. História, Ciências, Saúde - Manguinhos, v. 4, n. 2, p. 265-286 jul.-out. 1997b., p. 270). Conforme demonstrou Edmundo Coelho em seu já clássico estudo sobre as profissões imperiais, a renda e os prestígios dos médicos não atendiam apenas aos requisitos de competência profissional. “Os critérios que distribuíam renda, prestígio e poder eram todos de natureza extraprofissional: hábitos culturais, extração social da clientela, relações pessoais e outros assemelhados”. Quanto ao prestígio alcançado por determinados médicos, este decorria de um conjunto de fatores, tais como domínio de uma língua estrangeira, certa cultura humanística e conhecimento de teorias médicas em voga na Europa (COELHO, 1999COELHO, Edmundo Campos. As profissões imperiais: medicina, engenharia e advocacia no Rio de Janeiro, 1822-1930. Rio de Janeiro: Record, 1999., p. 75-90).

Partindo desses pressupostos, procuro, a partir de uma documentação diversa, reconstituir elementos da trajetória de Ernesto Ottoni, entre 1841OTTONI, Ernesto Benedicto. Algumas considerações sobre o clima da província de Minas Gerais e sobre as moléstias que mais acometem seus habitantes. Tese apresentada e sustentada perante a Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Tipografia Imperial e Constitucional De J. Villeneuve E Comp., 1841. e 1881, compreendendo o período entre a sua formação e sua morte. O caso particular permite olhar para uma carreira médica “periférica”, desenvolvida em parte fora do ambiente da Corte. Pretende-se mostrar os recursos que esse médico mobilizou para o exercício de seu ofício, que envolveram tanto o reconhecimento acadêmico, como o exercício de funções junto ao Estado e relações familiares e sociais. A análise levará em conta três tipos de parâmetro: os inerentes ao campo científico onde o indivíduo se movimentou, os parâmetros externos (contexto intelectual, político, institucional, social) e aqueles mais específicos, relacionados à “superfície social” do indivíduo estudado (CHRISTINE, 2001CHRISTINE, Laurière. Biographie et archives. Un cas de figure: Paul Rivet. Gradhiva: Revue d’Histoire et d’Archives de l’Anthropologie, n. 30-31, p. 135-142, 2001., p. 136).

Do Serro ao Rio de Janeiro: formação e defesa da tese

Ernesto Ottoni era filho de Jorge Ottoni e D. Rosália de Souza Maia, núcleo familiar de uma importante família do Serro. O casal teve 12 filhos, sendo o primogênito Teófilo Ottoni personagem que se destacou na vida política do Império, como deputado e fundador da Companhia do Mucuri (ARAÚJO; SILVA, 2011ARAÚJO, Valdei Lopes; SILVA, Weder Ferreira da. Fragmentos de um periódico perdido: a Sentinela do Serro e o sentido da “republicanização” (1830-1832). Varia Historia, Belo Horizonte, v. 27, n 45. p. 75-95, jun. 2011.; DUARTE, 2002aDUARTE, Regina Horta. Conquista e civilização na Minas oitocentista. In: OTONI, Teófilo. Notícia sobre os selvagens do Mucuri. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2002a, p. 2-37.). Apesar de poucos recursos, por esforços do pai, alguns de seus filhos foram estudar no Rio de Janeiro. Teófilo, Cristiano e Jorge Ottoni foram para a Marinha, enquanto Ernesto se formou em medicina, curso que também seria a opção do irmão mais moço, Eloy Ottoni (OTTONI, 1907OTTONI, Carlos. Memória biográfica lida no Instituto Histórico e Geográfico Mineiro e publicada em comemoração do 1º centenário do seu nascimento, 1807-1890. Revista do Arquivo Público Mineiro, Belo Horizonte: Imprensa Oficial, Ano XII, p. 710-726, 1907., p. 714-715). Se a respeito de Teófilo Ottoni há diversas pesquisas, o mesmo não se pode dizer de Ernesto. A bibliografia disponível sobre sua trajetória é escassa, limitando-se a algumas notas biográficas em obras dedicadas às efemérides. Por meio desses estudos, sabe-se que Ernesto se formou pela Faculdade do Rio de Janeiro, em 1841, clinicou por muitos anos na província de São Paulo e foi médico no Hospital da Marinha da Corte, além de ter publicado trabalhos sobre o cólera (VEIGA, 1897VEIGA, José Pedro Xavier. Efemérides mineiras (1664-1897), v. IV- out. a dez. Ouro Preto, Imprensa Oficial do Estado de Minas, 1897., p. 440-441; SENNA, 1905SENNA, Nelson Coelho. Traços biográficos de serranos ilustres, já falecidos precedidos de um bosquejo histórico sobre a fundação da cidade do Serro (Minas Geraes). Revista do Arquivo Público Mineiro, Belo Horizonte, Imprensa Oficial de Minas Gerais, n. 1, v. 10, p. 167-210, jan.-jun. 1905., p. 202).

O ingresso na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro deve ter ocorrido em 1835. Em sua tese, Ernesto Ottoni confirma ter frequentado seis anos letivos, devendo bondade aos preceptores “daquele estabelecimento - uma aprovação unânime et cum laude - em todas as matérias”.2 2 OTTONI, Ernesto Benedicto. Algumas considerações sobre o clima da província de Minas Gerais e sobre as moléstias, que mais acometem seus habitantes. Rio de Janeiro, Tipografia Imperial e Constitucional de J. Villeneuve e Comp., 1841. Dedicatória, [s.p.]. A grafia de todas as fontes foi atualizada para a atualmente utilizada. A escrita de um trabalho final por parte dos alunos naquela instituição era, antes de tudo, o cumprimento de uma obrigação regimental e, de acordo com os estatutos vigentes à época, poderiam versar sobre qualquer tema.3 3 Os estatutos de 1837 estabeleciam que as teses poderiam contemplar qualquer matéria do curso. Em 1854, houve algumas mudanças e a tese “consistiria em proposições concernentes a três questões, sendo cada uma relativa a cada seção do curso médico”, desde que aprovadas pela Congregação. Na reforma de 1884, foi mantido o controle da congregação sobre os pontos, os quais deviam versar sobre as “doutrinas importantes das ciências professadas na faculdade” (GONDRA, 2004, p. 128-135) Em cumprimento ao protocolo, em 17 de dezembro de 1841, o estudante apresentou, perante seus mestres, a tese “Algumas considerações sobre o clima da província de Minas Gerais e sobre as moléstias que mais acometem seus habitantes”. A escolha do tema não era fortuita. Afinal, após o término do curso ele pretendia retornar aos “pátrios lares”, e o conhecimento do clima e seus efeitos sobre a saúde era uma das “principais habilitações” para servir aos comprovincianos.4 4 OTTONI, Ernesto. Op. cit., 1841. Prefácio, [s.p.].

Ao longo da exposição, Ernesto Ottoni se atém à topografia, elementos geográficos e o papel desempenhado por esses fatores no clima da província. Contempla ainda as condições alimentares e as principais enfermidades da região, tais como as bronquites, coqueluches e pneumonias; as doenças de pele, como as erisipelas, o sarampo e a sarna; e as “febres biliosas e intermitentes”.5 5 Ibidem, p. 21-22. Apesar de apontar que existiam alguns males que afligiam as populações da província, principalmente as classes pobres e os escravos, tal fato era atribuído mais às condições de higiene e alimentação do que aos efeitos do clima. Ao fim, concluía ser o clima de Minas muito favorável à saúde.6 6 Ibidem, p. 33.

Diante dos objetivos aqui propostos não se procederá a uma análise da tese de Ernesto Ottoni. De toda forma, o tema escolhido permite inferir que durante sua formação ele incorporou alguns pressupostos em voga na medicina do período. A compreensão da doença ligada ao meio ambiente e aos fatores climáticos eram teorias correntes à época (KURY, 2007KURY, Lorelai. Descrever a pátria, difundir o saber. In: KURY, Lorelai (org.). Iluminismo e Império no Brasil: O Patriota (1813-1814). Rio de Janeiro: Fiocruz; Biblioteca Nacional, 2007. p. 141-178., p. 160-161), concepção que se fazia presente na formação dos alunos, que compartilhavam uma “constelação interiorizada de crenças, valores e técnicas durante o processo de formação” (EDLER, 2011EDLER, Flavio Coelho. Medicina no Brasil imperial: clima, parasitas e patologia tropical. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2011., p. 17).

Outro aspecto que se depreende da leitura da dissertação é a influência que certos catedráticos e médicos da Corte tiveram sobre o médico. Um deles foi Francisco de Paula Cândido, professor de Física Médica no período em que estudou, o qual “teve a bondade” de compartilhar suas notas sobre as “irritações crônicas gastrointestinais” frequentes em Minas.7 7 Ibidem, p. 21. Ele se refere também ao Dr. Cruz Jobim, outro reconhecido médico da Corte, que ocupou a presidência da Academia de Medicina do Rio de Janeiro. Durante o curso de medicina, ele teve acesso a um importante trabalho apresentado por Jobim em uma das sessões da Sociedade (LIMA, 2019LIMA, Silvio Cezar de Souza. Cruz Jobim e as doenças da classe pobre: o corpo escravo e a produção do conhecimento médico na primeira metade do século XIX. Almanack [online], n. 22, p. 250-278, 2019. Disponível em: https://doi.org/10.1590/2236-463320192207. Acesso em: 18 jan. 2022.
https://doi.org/10.1590/2236-46332019220...
), o “Discurso sobre as moléstias que mais afligem a classe pobre do Rio de Janeiro”. As informações disponíveis no estudo de Cruz Jobim lhe serviram de base para considerações acerca da alimentação na província de Minas e sua influência sobre suas principais moléstias. Ernesto Ottoni observava que um dos principais alimentos usados pela população de Minas, ricos, pobres, livres ou escravos era “quase exclusivamente o milho”. Nesse sentido, estava em acordo com a opinião de Jobim sobre os prejuízos do uso exclusivo de alimentos “como a farinha de mandioca, milho e feijão”,8 8 JOBIM, José Martins da Cruz. Discurso sobre as moléstias, que mais afligem a classe pobre do Rio de Janeiro; lido na sessão pública da sociedade de Medicina, 30 de junho de 1835. Rio de Janeiro: Tip. Fluminense de Brito e Comp., 1835, p. 27. mas considerava que a farinha de milho era preferível à da mandioca.9 9 OTTONI, Ernesto. Op. cit., p. 16. Forma de homenagem, a menção e comentários aos trabalhos de outros médicos da Corte acabava ainda por referendar o conhecimento produzido sobre as patologias específicas do país, o saber médico praticado na faculdade de medicina e os trabalhos dos periódicos de medicina do período, instituições que contribuíram para a legitimação da medicina acadêmica da época. Eram nelas, afinal, onde, além de se produzir um conhecimento sobre as enfermidades endêmicas do país, os discípulos eram “treinados” e o saber socializado (EDLER, 2009EDLER, Flavio Coelho. A natureza contra o hábito: a ciência médica no Império. Acervo, v. 22, n. 1, p. 153-166, nov. 2009.).

Além dos trabalhos de catedráticos da Faculdade de Medicina, Ottoni igualmente se utilizou de sua rede de contatos pessoais para a escrita da tese, obtendo informações concedidas por outros médicos, como o Dr. Tristão Candido Mayer, natural de Diamantina e seu colega de faculdade, sobre as febres intermitentes.10 10 MAYER, Tristão Candido. Considerações sobre a febre intermitente particularmente sobre a intermitente benigna. Rio de Janeiro: Tipografia Imparcial de Francisco de Paula Brito, 1839, p. 10. Ernesto utiliza-se ainda de dados fornecidos por outros médicos que atuaram na região, como o mapa de observações meteorológicas, realizadas na Cidade Diamantina pelo Sr. Dr. José Agostinho Vieira de Mattos”.11 11 OTTONI, Ernesto. Op. cit., p. 8. Desse ponto de vista, o trabalho apresentado por Ernesto Ottoni pode ser entendido não apenas como resultado de sua formação, mas também das contribuições dos catedráticos, médicos da Corte e aqueles que exerceram a medicina na província de Minas.

A tese não passou despercebida pelos membros da Academia Imperial de Medicina. A Revista Médica Brasileira, periódico da agremiação, destacou o estudo do aluno do Serro perante os demais daquele ano. Segundo a opinião exarada pelo periódico, a tese merecia atenção tanto pelo “ótimo objeto sobre que versa, como por ter sido feita e escrita da melhor maneira possível”. Ali se encontravam “muito interessantes notícias meteorológicas e médicas sobre a Provincia de Minas, mas também linguagem pura, e um belo estilo, objetos que são mui difíceis encontrarem-se juntos”. Por tais razões, “honrando muito o seu autor, e merecendo toda a importância”, deveria ser por todos lida.12 12 Teses defendidas perante a Faculdade de Medicina no ano de 1841 continuado do número antecedente. Revista Médica Brasileira, n. 11, p. 608-611, mar. 1842, p. 611. A seção do periódico não continha assinatura.

Serviços prestados na província de São Paulo

Após obter o diploma, pouco se sabe do paradeiro de Ernesto Ottoni. Tudo indica que permaneceu na Corte. Em 25 de setembro de 1847, ele partiu do Rio de Janeiro para a região do Mucuri, em Minas Gerais, acompanhado de um índio.13 13 Movimento do Porto. Entradas do dia 25. Jornal do Comercio. Rio de Janeiro, n. 226, set. 1847, p. 3. Durante esse período, ele ainda tratou dos doentes da Colônia Militar da Lagoa da Arara, deixando com eles diretórios e “ampla provisão de medicamentos”.14 14 Navegação do Mucuri. Anuário Político, Histórico e Estatístico do Brasil. Segundo Ano. Rio de Janeiro: Firmin Didot Irmãos, 1847, p. 476. Tal fato, como se verá mais adiante, indica a participação do médico na Empresa de Colonização do Mucuri e as relações próximas que manteve com Teófilo Ottoni. Depois desse período, reencontramos nosso personagem na província de São Paulo. Ele chegou na sede da província em 1850, onde, além de se dedicar à clínica, realizou exames de corpos de delitos a serviço da Câmara. Entre os anos de 1850 e 1855, o médico solicitou em diversas ocasiões o pagamento das custas dos corpos de delito, chegando a cobrar, em 1855, 140 mil réis pelos seus serviços.15 15 Tais informações constam dos seguintes documentos: Atas da Câmara da Cidade de São Paulo, 1852. Publicação da subdivisão de documentação histórica, v. XXXIX. Departamento de Cultura (Divisão de Documentação Histórica e Social), 1939, p. 18; Atas da Câmara da Cidade de São Paulo, 1855. Publicação da subdivisão de documentação histórica, v. XLI. Departamento de Cultura (Divisão de Documentação Histórica e Social), 1940, p. 38-39.

Dos motivos que levaram Ernesto Ottoni a São Paulo, pouco sabemos. É plausível que ele tenha buscado ali sorte diferente dos médicos da Corte, onde as condições de trabalho não eram as melhores, devido a uma clientela escassa e a um ambiente de concorrência acirrada em torno da reduzida clientela, e “aguçada pela livre atuação de outras categorias de curadores” (EDLER, 2014EDLER, Flavio Coelho. Ensino e profissão médica na corte de Pedro II. Santo André: Universidade Federal do ABC, 2014., p. 54). Exceção à regra eram os médicos que atendiam ao reduzido círculo da elite e que complementavam os ganhos de consultório com o exercício de cargos públicos. Dessa forma, as possibilidades de trabalho oferecidas pelas cidades do interior do Rio de Janeiro ou de outras províncias surgiam para alguns como uma alternativa a esse ambiente competitivo (COELHO, 1999COELHO, Edmundo Campos. As profissões imperiais: medicina, engenharia e advocacia no Rio de Janeiro, 1822-1930. Rio de Janeiro: Record, 1999., p. 73-75). Tais aspectos podem ter contribuído para o Dr. Ottoni praticar medicina em São Paulo. No que diz respeito a uma possível influência familiar, ou relação próxima que o médico estabeleceu com pessoa de influência em São Paulo nesse período, as fontes são silenciosas.

A partir das atas da Câmara de São Paulo, sabe-se que, além da clínica e dos serviços de corpo de delito, o médico do Serro ficaria responsável por outras incumbências, ocupando papel importante nos assuntos sanitários da cidade e da província. Em 1851, ele integrou uma comissão, juntamente com o médico João Thomaz e os engenheiros Soares e Bastide, com o intuito de examinar se o matadouro público, edificado diante da casa da Pólvora, podia ou não prejudicar a saúde pública. Com base no parecer da comissão, rescindiu-se o contrato feito para construção do matadouro no local indicado, propondo que fosse construído nas imediações da Chácara do Corel.16 16 Atas da Câmara da Cidade de São Paulo, 1850-51. Publicação da subdivisão de documentação histórica, v. XXXVIII. Departamento de Cultura (Divisão de Documentação Histórica e Social), 1939, p. 234.

No ano seguinte, a pedido do presidente da província, José Thomaz Nabuco de Araújo, foi solicitado ao Cirurgião do Partido da Câmara e a Ernesto Ottoni a “remessa de uma informação circunstanciada” do “estado sanitário” do Município. Em fevereiro de 1852, após a descoberta da existência de uma fonte de água no Bexiga, a Câmara deliberou sobre a criação de uma comissão, composta pelo Farmacêutico Joaquim Pires Garcia, pelo vereador Leandro e pelo Dr. Ottoni para examinar a “água férrea”, visando a seu encanamento e disponibilidade ao público. Em 1855, participou de outro grupo de trabalho, formado pelos médicos Carlos Rath, também engenheiro, e João Thomaz de Mello, “encarregados de examinarem a água que corre pelos tubos de ferro para os chafarizes” da cidade.17 17 Atas da Câmara da Cidade de São Paulo, 1855. Op. cit., p. 82.

Essas comissões eram subordinadas à Câmara Municipal, a quem cabia zelar pelos assuntos ligados à urbanização da cidade de São Paulo. A higiene e o melhoramento das ruas, a construção de matadouros e cemitérios fora da cidade foram temas que marcaram os serviços dessas comissões, envolvendo autoridades municipais e a participação de engenheiros e médicos. A cidade de São Paulo vivenciou problemas comuns a outras urbes no século XIX, advindos de condições precárias de higiene das ruas, ausência de um sistema de esgotos, problemas relativos a cemitérios e matadouros, associados a insalubridade, doenças e mortalidade. A constituição de grupos de trabalho composta por médicos, engenheiros e, em determinadas ocasiões, vereadores, era uma das formas de contornar os problemas sanitários, o abastecimento de água e a higiene de diversos espaços, como açougues, prisões e cemitérios. (MANTOVANI, 2015MANTOVANI, Rafael. Modernizando a ordem em nome da saúde: doenças, política e administração urbana em São Paulo, 1805-1840. Tese (Doutorado em Sociologia) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Programa de Pós-Graduação em Sociologia, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2015., p. 122-157; CAMARGO, 2015CAMARGO, Luís Soares de. Viver e morrer em São Paulo: a vida, a doença e a morte na cidade do século XIX. Tese (Doutorado em História), PUC-SP, São Paulo, 2015., p. 71-73). A década de 1850 foi caracterizada por uma atuação mais efetiva em relação ao estado sanitário da cidade, com a atuação da Inspetoria de Higiene, cujos relatórios visavam a subsidiar a administração para resolver as questões de salubridade (JORGE, 2006JORGE, Karina Camarneiro. Urbanismo no Brasil império: a saúde pública na cidade de São Paulo no século XIX (hospitais, lazaretos e cemitérios). Campinas: PUC-Campinas, 2006., p. 144-146).

Foi nesse contexto que Ernesto Ottoni prestou serviços à Câmara Municipal e integrou comissões sanitárias designadas pelos Presidentes de província com o intuito de controlar as enfermidades que atingiram a região no século XIX, como cólera, lepra e febre amarela (MANTOVANI; MARQUES, 2019MANTOVANI, Rafael; MARQUES, Maria Cristina da Costa. Os Flagelos paulistas do século XIX. In: FRANCO, Sebastião Pimentel Franco; PIMENTA, Tânia Salgado; MOTA, André (orgs.). No Rastro das províncias: as epidemias no Brasil oitocentista. Vitória: EDUFES, 2019. p. 414-449.). Em resposta à demanda do Governo Imperial, para a criação de comissões nas províncias, com o propósito de estudar as causas que influíam na propagação da febre amarela, em São Paulo foi constituída, em 1852, uma comissão com essa finalidade, composta por Ernesto Ottoni, e pelos médicos João Thomaz de Mello e Guilherme Ellys.18 18 São Paulo (província), vice-presidente (Soares de Souza). Relatório, 13 set. 1852, p. 4. O relatório apresenta referências incompletas. Ottoni ainda integrou outro grupo relacionado ao cólera. Ele assinou, juntamente com o presidente da comissão, Francisco Maria de Souza Furtado de Mendonça, delegado de polícia da capital, um parecer informando que, desde novembro de 1855, o estado sanitário de Santos era “o melhor possível”. Para a manutenção das condições sanitárias de controle da enfermidade, deliberava em aconselhar ao presidente da província “o levantamento do cordão sanitário” do Rio das Pedras e o estabelecimentos de quarentenas, dentre outras providências.19 19 Expediente da Presidência, 11 dez. 1855. Correio Paulistano, São Paulo n. 347, 18 dez. 1855, p. 3.

Além da febre amarela e do cólera, outras doenças impactavam o estado sanitário da província, uma delas era morfeia, uma das denominações da lepra no período (CABRAL, 2006, p. 36). Em relatório elaborado pela comissão constituída com a finalidade de elaborar o regulamento policial e sanitário da cidade, Ernesto Ottoni e os demais membros consideravam que tais normas deveriam ser elaboradas posteriormente, pois a morfeia era um assunto de maior urgência. Na ocasião, o presidente de província, José Antônio Saraiva, louvava os esforços do “distinto médico Dr. Ottoni”, por indicar as medidas higiênicas para remover as causas e diminuir os efeitos daquela doença, indicando a necessidade da construção de um lazareto para os morféticos da cidade.20 20 Discurso com que o ilustríssimo e excelentíssimo senhor dr. José Antônio Saraiva, Presidente da província de S. Paulo, abriu a Assembleia Legislativa Provincial no dia 15 de fevereiro de 1855. Correio Paulistano, São Paulo, n. 193, 17 fev. 1855.

Suas recomendações sobre a lepra constam de um extenso relatório elaborado para formular um “regulamento policial e sanitário para os morféticos mendigos”, endereçado em forma de ofício ao presidente da província. A principal medida preconizada pelo médico era que fosse fundado um “estabelecimento regular” onde os doentes encontrassem “sustento necessário e tratamento metódico”. Observando as condições de higiene e de salubridade, indicava que o prédio fosse construído na Fazenda de Santa Ana, local que reunia as condições ideais, por ser terreno elevado e seco, “afastado de moradores e exalações nocivas, provido de águas potáveis”.21 21 Arquivo do Estado de São Paulo. Ofícios diversos. 8 jan. 1855. Disponível em: http://www.arquivoestado.sp.gov.br/site/acervo/repositorio_digital/oficios_diversos. Meus agradecimentos a Lucas Samuel Quadros, pela transcrição do documento. Tais princípios iam ao encontro das formas preconizadas ao combate a diversas doenças que eram atribuídas à infecção pelos miasmas (CHALHOUB, 1996CHALHOUB, Sidney. Cidade febril: cortiços e epidemias na Corte Imperial. São Paulo: Companhia das Letras, 1996., p. 64-65). O relatório indica que o médico estava a par do debate sobre a enfermidade, situando sua história, hipóteses e formas de transmissão com base na literatura médica sobre o tema, tendo como uma de suas principais referências o Dr. João Maurício Faivre, médico que contribuiu para estabelecer a lepra como uma entidade patológica na medida do período (CABRAL, 2006CABRAL, Dilma. Morféia ou elefantíase-dos-gregos: a singularização de uma doença na primeira metade do século XIX. História Unisinos, v. 10, p. 35-44, 2006., p. 37).

O parecer de Ottoni foi divulgado posteriormente no Correio Paulistano.22 22 Ofício do Sr. Dr. Ottoni, dirigido ao exmo. Sr. Presidente da província, sobre o estabelecimento do Hospital dos Lázaros nesta província. Correio Paulistano, São Paulo, n. 180, 31 jan. 1855, p. 1-3. Com base nele, a Assembleia provincial de São Paulo chegou a aprovar os recursos para a construção do edifício, mas a proposta não saiu do papel. A despeito disso, o relatório de Ottoni teve seu mérito reconhecido. Na Assembleia Provincial de 17 de março de 1857, o barão de Itararé comentava sobre a planta enviada pelo “membro importante da irmandade da Nossa Senhora da Consolação, o Sr. Dr. Ernesto Benedicto Ottoni”, o qual tão incansável e zeloso se mostrou aqui em melhorar a sorte dos infelizes morféticos”.23 23 Assembleia provincial. 34a Sessão ordinária, aos 17 de março de 1857. Correio Paulistano, São Paulo, n. 519, 24 mar. 1857, p. 1. Pela sua dedicação e caridade, ele ainda seria nomeado pela Misericórdia de São Paulo de “médico dos lázaros”. Além de ocupar cargos de Estado, Ernesto Ottoni também integrou a Guarda Nacional, enquanto capitão cirurgião-mor daquela província.24 24 Diário do Rio de Janeiro, n. 36, 19 maio 1854, p. 2. Na estrutura da corporação, tal posto era importante, e os indicados eram nomeados pelo “Governo da Corte e pelos presidentes em Conselho nas províncias”.25 25 LEI DE 18 DE AGOSTO DE 1831. Legislação informatizada. Disponível em: https://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei_sn/1824-1899/lei-37497-18-agosto-1831-564307-publicacaooriginal-88297-pl.html. Acesso em: 6 fev. 2022.

Os serviços prestados por Ernesto Ottoni durante o período no qual exerceu medicina em São Paulo, não se restringiram, portanto, à clínica e aos corpos de delito. O médico ocupou posições de destaque no âmbito das instituições sanitárias da cidade e província de São Paulo, obtendo reconhecimento e respeito de autoridades políticas e religiosas. Embora o diploma tenha aberto o caminho para a posição que adquiriu, seu reconhecimento profissional e indicação para a Guarda Nacional, ao que tudo indica, eram igualmente resultado de determinadas relações com a presidência de província e outras autoridades naquele contexto. O caso em estudo confirma o papel de determinadas “redes de relações personificadas”, que eram garantidoras do valor do diploma médico (CORADINI, 1997a). Apesar da posição que adquiriu em São Paulo, Ernesto Ottoni deixaria a província, motivado por outras razões, que extravasavam o exercício da medicina.

No Vale do Mucuri: comércio, doenças e medicina

Em 1856, Ernesto Ottoni se valeu de uma nota no Correio Paulistano para se despedir de amigos e pessoas que o honravam.26 26 Correio Paulistano, n. 362, 8 fev. 1854, p. 4. De lá iniciaria o percurso que o levaria novamente ao Rio de Janeiro e de volta à província de Minas. Ainda na Corte envolveu-se nos negócios da Companhia de Comércio e Navegação do Rio Mucuri. Fundada em 1847, sob a direção principal de Teófilo Ottoni e com apoio dos fazendeiros do Termo de Minas Novas, o principal objetivo da empresa era “ligar o centro-oeste da província de Minas Gerais ao litoral. Isso deveria ser viabilizado por meio da navegação do rio Mucuri e da construção de estradas paralelas aos trechos não navegáveis” (DUARTE, 2002aDUARTE, Regina Horta. Conquista e civilização na Minas oitocentista. In: OTONI, Teófilo. Notícia sobre os selvagens do Mucuri. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2002a, p. 2-37., p. 269). A colonização do Vale do Mucuri, onde foi fundada a freguesia da Filadélfia, envolvia constituição de núcleos urbanos, de portos e incentivo à imigração estrangeira. Além dos colonos que afluíam para a região, a partir de 1856, por meio de acordos com o governo central, vieram imigrantes alemães, belgas, portugueses, franceses e chineses (SILVA, 2009SILVA, Weder Ferreira da. Colonização, política e negócios: Teófilo Benedito Ottoni e a trajetória da Companhia do Mucuri (1847-1863). Dissertação (Mestrado em História), Programa de Pós-Graduação em História - Universidade Federal de Ouro Preto, Mariana, 2009., p. 136-143).

Em 1858, a serviço da companhia, Ernesto Otonni levou colonos do Rio de Janeiro para a região por meio de uma prancha rebocada pelo vapor Peruipe, os quais após um período em Santa Clara seguiram para Urucu.27 27 Correspondência. Correio Mercantil, Rio de Janeiro, n. 199, 24 jul. 1858, p. 1. No ano seguinte, ele foi incumbido pelo irmão mais velho da compra de muares no mercado de gado de Sorocaba, atravessando com o rebanho as províncias de São Paulo e Minas, realizando “bons negócios pelo caminho com muito de seus muares” e, após viagem de oito meses, chegou a Filadélfia.28 28 AVÉ-LALLEMANT, Robert.Viagens pelas províncias da Bahia,Pernambuco,Alagoas e Sergipe:1859. Trad. Eduardo de Lima Castro. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Edusp, 1980, p. 184. Além das funções de médico da Companhia, foi nomeado também como subdelegado da Filadélfia, tendo por função arbitrar sobre diversas questões da empresa.29 29 Relatório que o subdelegado do distrito de Filadelfia, o dr. E. B. Ottoni dirigiu ao delegado do Município do ano findo. Correio Mercantil, Rio de Janeiro, n. 50, 18 fev. 1859, p. 1.

Sua chegada à região ocorreu em um momento difícil para os colonos, em particular os estrangeiros. A presença “descontrolada de colonos, a precariedade da organização da Companhia e a carestia extrema transformaram o suposto paraíso tropical de abundância e promessa; em cenário infernal de doença, desilusão, violência, fome e morte” (DUARTE, 2002bDUARTE, Regina Horta. Olhares estrangeiros: viajantes no vale do rio Mucuri. Revista Brasileira de História, v. 22, n. 44, p. 267-288, 2002b., p. 269). Tal situação levou a uma fuga em massa dos colonos, e a empresa passou por diversas dificuldades de ordem econômica, tornando-se inviável sem o financiamento do poder imperial (SILVA, 2009SILVA, Weder Ferreira da. Colonização, política e negócios: Teófilo Benedito Ottoni e a trajetória da Companhia do Mucuri (1847-1863). Dissertação (Mestrado em História), Programa de Pós-Graduação em História - Universidade Federal de Ouro Preto, Mariana, 2009., p. 164-176).

Nesse cenário, Ernesto Ottoni se viu diante das críticas do médico e viajante ­ Avé-Lallemant, que o acusou de se portar mais “humanamente com seus muares” do que com os imigrantes no Mucuri30 30 AVÉ-LALLEMANT, Robert. Op. cit., p. 184-191. Na sua passagem pela região do Mucuri, o viajante estrangeiro teceu diversas observações sobre o estado lastimável em que se encontravam os imigrantes, em especial os alemães e holandeses, publicando um folheto em Hamburgo com repercussões internacionais onde denunciava tais fatos (DUARTE, 2002aDUARTE, Regina Horta. Conquista e civilização na Minas oitocentista. In: OTONI, Teófilo. Notícia sobre os selvagens do Mucuri. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2002a, p. 2-37., p. 183). Afirmando ser alvo de perseguição política, Teófilo Ottoni afirmava em relatório sobre a situação dos colonos do Mucuri que havia tomado providências, enviando o irmão dr. Ernesto Ottoni para socorrer os doentes de Santa Clara e na Colônia Militar do Urucu, que sofriam os efeitos de uma grave epidemia. Mas, conforme ele próprio reconhecia, a situação se tornava ainda mais difícil em razão da falta de médico e botica.31 31 OTTONI, Teófilo Benedito. A colonização do Mucuri: memória justificativa em que se explica o estado atual dos colonos estabelecidos no Mucuri e as causas dos recentes acontecimentos naquela colônia. Rio de Janeiro: Tip. Brasiliense de Maximiano Gomes Ribeiro, 1859. p. 31. Após a averiguação das denúncias, o emissário do governo, Sebastião Machado, inocentou os diretores da companhia. Apesar de Teófilo Ottoni manter a imagem e prestígio, seu projeto malogrou e, em março de 1861, o Governo encampou a Companhia (DUARTE, 2002bDUARTE, Regina Horta. Olhares estrangeiros: viajantes no vale do rio Mucuri. Revista Brasileira de História, v. 22, n. 44, p. 267-288, 2002b., p. 37). A liquidação seria mediada por dois comissários árbitros. José Cândido Mendes, indicado pelo governo central e, pela parte dos acionistas, Ernesto Ottoni, que desde agosto de 1861 já se encontrava no Rio de Janeiro.32 32 Boletim do expediente do Governo. Ministério do Império, Tomo 29, dez. 1861, p. 21.

De volta à Corte: médico da Armada e sócio honorário do Instituto dos Acadêmicos

Retornando à Corte, além de participar do processo de liquidação da Companhia do Mucuri, Ernesto Ottoni foi contratado pelo quartel general da Marinha, em 1865, conforme proposto pelo cirurgião-mor da Armada33 33 O periódico não traz a informação sobre quem era o ocupante do cargo de cirurgião-mor. Durante a pesquisa também não localizei esse dado. , para servir no hospital da marinha da Corte, como 2º cirurgião da Comissão.34 34 Notícias diversas. Correio Mercantil, n. 322, 26 nov. 1865, p. 1. Era a segunda vez que Ernesto Ottoni ocuparia uma função ligada à carreira militar. As instituições militares de saúde representaram um campo de atuação importante para os médicos no século XIX, facultando-lhes reconhecimento social e também uma forma de obtenção de recursos (SILVA; MAGALHÃES, 2021MAGALHÃES, Sônia Maria de; SILVA, Leicy Francisca da. O fortalecimento da profissão médica e militar no Brasil: trajetória de Thomaz Cardoso de Almeida (1809-1875). Fênix. Revista de História e Estudos Culturais, v. 18, n. 2, p. 244-268, jul.-dez. 2021., p. 253-256). A medicina militar assumia “importância estratégica na medida em que o Exército e a Marinha estavam empenhados em preservar a frágil unidade nacional ameaçada por convulsões políticas internas e externas” (FERREIRA, 1994FERREIRA, Luiz Otávio. João Vicente Torres Homem: descrição da carreira médica no século XIX. Physis − Revista de Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 4, n. 1, p. 57-78, 1994., p. 64). Cabe lembrar que no período em que Ernesto serviu no Hospital, o Brasil estava envolvido na Guerra do Paraguai (1864-1870), e as intervenções do Brasil na Bacia Platina impulsionaram a montagem do corpo de saúde do exército (SILVA, 2012SILVA, Carlos Leonardo Bahiense da. Doutores e canhões: o corpo de saúde do Exército Brasileiro na Guerra do Paraguai (1864-1870). Tese (Doutorado em História das Ciências e da Saúde) - Casa de Oswaldo Cruz / Fiocruz, Rio de Janeiro, 2012.).

Ernesto foi um dos responsáveis pela clínica cirúrgica do Hospital da Marinha da Corte, atividade interrompida em razão de seu estado de saúde, obrigando-o, em novembro de 1877, a pedir licença sem vencimentos da corporação para tratar da saúde onde lhe conviesse por três meses.35 35 JORNAL do Comércio, n. 309, 17 nov. 1877, p. 3. Posteriormente, solicitou um novo pedido de licença, mas não foi atendido. O requerimento havia sido formulado em Baependi, mas seria indeferido, pois seriam dispensados os serviços de “todos os médicos paisanos”.36 36 Parte não editorial. A Reforma: Órgão Democrático, Rio de Janeiro, n. 34, 10 fev. 1878, p. 3. Em 26 de janeiro de 1878, Ernesto Ottoni era “dispensado” dos serviços do Hospital, juntamente com outros médicos e enfermeiros37 37 Notícias diversas. O Globo: Órgão da Agência Americana Telegráfica dedicado aos interesses do Commercio, Lavoura e Industria, Rio de Janeiro, ano VI, n. 22, 26 jan. 1878, p. 1. , em cumprimento a uma portaria que determinava o desligamento dos médicos “contratados e extranumerários” por motivos orçamentários.38 38 Hospital da Marinha. Jornal do Comércio, Rio de Janeiro, 23 jan. 1878, p. 1.

Durante os anos em que serviu à Marinha, Ernesto Ottoni se tornou sócio honorário do Instituto Acadêmico, sendo diplomado em uma das reuniões em março de 1868.39 39 CORREIO Mercantil, n. 75, 16 mar. 1868, p. 1. A Sociedade Instituto Acadêmico era uma associação com finalidades científicas, formada pelos estudantes da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, que editou, a partir de 1867, alguns números de sua revista trimestral (EDLER, 2011EDLER, Flavio Coelho. Medicina no Brasil imperial: clima, parasitas e patologia tropical. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2011., p. 204-205). O fato de ter se tornado sócio honorário pode ser visto como uma demonstração do reconhecimento do médico mineiro por parte dos demais membros da agremiação ou, hipótese mais plausível, ter sido favorecido por relações familiares. Reforça essa hipótese o fato de que um dos membros do Instituto era Joaquim Vieira de Andrade, natural do Serro, filho de Joaquim da Silva Pereira de Andrade e de Anna Felizarda de Pina, ligada à família dos Ottoni (MARTINS, 2021MARTINS, Marcos Lobato. Medicina e política em uma cidade imperial: Joaquim Vieira de Andrade no Serro (MG). Projeto História, São Paulo, v. 71, p. 324-350, maio-ago. 2021., p. 329). Por coincidência, Vieira de Andrade era vice-presidente do Instituto Acadêmico quando Ernesto foi eleito sócio honorário. Outro sócio honorário provinha da mesma família, o médico Eloy Benedicto Ottoni, irmão de Enresto.

Seja como for, fazer parte de uma instituição que congregava outros médicos trazia uma certa distinção ao ofício. Ainda mais, porque foi o Instituto que lhe possibilitou divulgar suas experiências clínicas como cirurgião da Marinha. Na sessão de 26 de julho de 1868, presidida por Joaquim Vieira de Andrade, ele apresentou a Memória sobre as raças consideradas como elemento etiológico das moléstias em geral e da cólera-morbo em particular.40 40 Não há evidências de que a memória chegou a ser publicada. O texto não foi localizado na revista do Instituto dos Acadêmicos e nem nos demais periódicos da época. A exposição foi bem recebida no Instituto, que a acolheu como prova de “consideração e apreço” do sócio honorário.41 41 Instituto Acadêmico. Diário do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, n. 214, 5 ago. 1868, p. 1.

Nessa condição, o médico escreveu três artigos no periódico publicado pela agremiação nos quais tratava do cólera. Com isso almejava, quem sabe, obter reconhecimento de outros médicos ou divulgar suas ideias para um público mais amplo, incluindo-se no rol de outros médicos que publicaram seus trabalhos na época. A publicação de memórias, artigos e manuais no Império foi um importante instrumento de divulgação e consolidação do saber médico. Vários médicos viam na imprensa leiga e médica a possibilidade não só de divulgar suas ideias, mas também conferir destaque perante seus pares (PROENÇA, 2021PROENÇA, Anne Thereza de Almeida. A presença dos médicos no Vale do Paraíba fluminense do século XIX: personagens e espaços de análise. Revista Brasileira de História da Ciência, v. 14, n. 2, p. 120-143, jul.-dez. 2021., p. 135-137; FERREIRA, 1999FERREIRA, Luiz Otávio. Os periódicos médicos e a invenção de uma agenda sanitária para o Brasil. História, Ciências, Saúde - Manguinhos, v. 6, n. 2, p. 331-351, 1999.). Conforme observou Flávio Edler, a participação dos médicos em fóruns acadêmicos legitimadores e a publicação de manuais ou artigos médicos, componentes do “currículo científico” dos doutores, era uma maneira de obter uma credibilidade extra na medicina da época (EDLER, 2011EDLER, Flavio Coelho. Medicina no Brasil imperial: clima, parasitas e patologia tropical. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2011., p. 18).

Apesar de escritos em épocas diferentes, os estudos foram publicados conjuntamente no terceiro número da revista do Instituto: o primeiro se referia a observações sobre o cólera no Hospital da Marinha da Corte em 1867, com data de 12 de junho daquele ano; o segundo, sem indicação de data, trata-se de um breve relato do cólera em 1868; e o terceiro, de 12 de junho de 1868, uma resposta ao relatório do Presidente da Junta de Higiene Pública, na parte relativa à estatística do cólera.

Os dois primeiros estudos ser referiam às observações obtidas no Hospital da Marinha da Corte. Com relação à epidemia de cólera de 1867, o médico observa que, embora a doença não tivesse vitimado a maioria da população, como ocorreu na primeira invasão, em 1855, o mesmo não se aplicava à classe militar. A partir do mapa elaborado sobre os doentes da Enfermaria especial da Marinha da Corte, inaugurada com a finalidade de tratar os acometidos por cólera, ele conseguiu estabelecer de onde provinham os principais enfermos.

Ao expor os fatores relacionados à moléstia, Ernesto Ottoni faz menção ao papel exercido pela cor dos indivíduos, referindo-se indiretamente à memória apresentada ao Instituto Acadêmico. Na sua opinião, apesar da ausência de dados estatísticos, não havia provas de que as raças predisponham sempre a esta ou aquela moléstia; devendo a mortalidade ser atribuída a outros fatores, como as condições higiênicas e individuais.42 42 OTTONI, Ernesto Benedicto. Observações sobre o cólera-morbo de 1867 no Hospital de Marinha da Corte, seguida de Breve notícia do cólera-morbo de no mesmo Hospital, dada ao Instituto Acadêmico; e da resposta ao relatório do Presidente da Junta de Higiene Pública na parte relativa à estatística do Cólera de 1867. Revista do Instituto Acadêmico, n. 2, p. 43-74, out. 1868, p. 46. No que se refere ao contágio, indicava como causa provável da transmissão do “vírus colérico” a dejecções dos indivíduos, o que podia ser constatado a partir das suas observações e também pela literatura médica da época.43 43 Ibidem, p. 48 Essa hipótese sobre a etiologia do cólera era compartilhada por outros médicos na década de 1860. Em 1867, por exemplo, do Dr. José de Goes Sequeira publicou, pela Gazeta Médica da Bahia, um trabalho no qual afirmava que o contágio era comprovado “pela infeção das pessoas, que não estavam em alguma relação com os mesmos coléricos, mas que tinham cuidado e lavado roupas manchadas pelas evacuações d’esses enfermos”, e salientava que “Pettenkofer e Delbruck observaram muitos casos da infeção proveniente d’esta causa”,44 44 SEQUEIRA, José de Goés. Influência nociva das dejecções coléricas. Meios que convém empregar para neutralizar ou evitar seus efeitos. Gazeta Médica da Bahia, v. 1, p. 64-67, 1867. sendo ambos os autores mencionados também por Ernesto Ottoni.

O segundo estudo, “Breve notícia do cóleras-morbos no hospital de marinha em 1868”, foi escrito nos mesmos moldes do primeiro. Nele são apresentados os casos de cólera observados pelo médico, acrescidos de um “quadro estatístico”. O médico informa que, de 9 de janeiro a 6 de fevereiro daquele ano, “entraram na Enfermaria Especial 70 doentes acometidos de cólera-morbo desde os primeiros sintomas do mal, até a algidez incompleta e completa, destes faleceram 26, restabeleceram 3, e 9 foram transferidos para o Hospital da Gamboa”.

A terceira colaboração de Ottoni à revista do Instituto foi a “Resposta ao relatório do presidente da Junta da Higiene Pública na parte relativa à estatística do cholera-morbus no Hospital De Marinha Da Corte em 1867”. Nele, argumentava que o então Presidente da Junta, o Dr. Pereira Rêgo, errou em seu relatório, ao elevar “para 40 o número dos mortos com a adição de 5 indivíduos que faleceram em Villegaignon”. Os cinco casos deveriam figurar na estatística dos doentes tratados na Enfermaria Especial criada naquela fortaleza.45 45 Ibidem, p. 66.

Da mesma forma, o médico refutou a relação entre raça e doença proposta por Pereira Rêgo. Segundo apontava o relatório do presidente da Junta de Higiene, o cólera acometia com “mais frequência os pretos e brancos que não as outras cores, sendo porém mais grave nos pretos e caboclos em os quais a proporção da mortalidade comparativamente ao número dos atacados excede a dos outros”.46 46 Anexo I. Relatórios do presidente da Junta Central de Higiene Pública e inspector de saúde do porto. In: BRASIL. Ministério do Império. Ministro (José Joaquim Fernandes Torres). Relatório do Ano de 1867 apresentado à Assembleia Geral na 2a Sessão da 13ª Legislatura (Publicado em 1868), p. 38. Fiando-se na estatística, Ottoni afirmava que se “em 101 doentes foram acometidos 31 brancos na raça que menos avulta na Armada, e de serem acometidos apenas 23 caboclos, na raça mais numerosa, parece que não se pôde concluir daí que os caboclos fossem mais predispostos para o cólera-morbo que os brancos”. Desse modo, o argumento central para o desenvolvimento das enfermidades como o cólera, a febre amarela e o sarampo residiam nas “condições higiênicas individuais”. 47 47 OTTONI, Ernesto Benedicto. Observações sobre o cólera-morbo… Op. cit., p. 68-70.

Além dos artigos, as experiências clínicas de Ernesto Ottoni também foram objetos de comentários. Na Revista Médica, um artigo do Dr. Miranda de Azevedo sobre a chyluria, moléstia caracterizada pela “emissão de urinas ordinariamente brancas como o chylo, outras vezes opalescentes, rosadas, ou cor de café-com-leite, outras ainda sanguinolentas”, menciona o fato de o médico mineiro considerar a raridade da doença entre os mais velhos.48 48 AZEVEDO, Miranda. Chyluria. Estudo bibliográfico. Revista Médica, Rio de Janeiro, n. 19, p. 299-302, 15 nov. 1875, p. 299. Em abril de 1878, o Jornal do Comércio publicou uma nota do Instituto Farmacêutico, informando que o médico obteve “ótimos resultados do emprego do pé de perdiz, reduzido a pó, na cicatrização de feridas atônitas”.49 49 Instituto Farmacêutico, 12 abr. 1878, p. 2. Tais referências provavelmente advinham das suas atividades clínicas, aspecto infelizmente pouco elucidado pela documentação consultada.

A morte e o legado da carreira médica

Após se afastar de suas funções junto à Marinha, Ernesto Ottoni continuou a exercer a clínica. Na listagem de médicos e cirurgiões do Almanak Laemmert, seu nome aparece na edição de 1881, indicando que ele atendia na Rua Farani, em Botafogo, e em Petrópolis.50 50 Almanak Laemmert: Administrativo, Mercantil e Industrial da Corte e Provincia do Rio de Janeiro para o ano de 1858, inclusive a cidade de Santos, da província de São Paulo para o ano de 1881. Rio de Janeiro: Em casa dos editores-proprietários Eduardo e Henrique Laemmert, 1881, p. 695. Naquele mesmo ano, conforme anunciava um jornal da província mineira, em 8 de outubro de 1881 o “ilustre serrano” faleceu e seu corpo foi sepultado no Cemitério de São Francisco Xavier51 51 Falecimento. A província de Minas: Órgão do partido Conservador, Ouro Preto, n. 70, 16 out. 1881, p. 2. , onde jaziam corpos de homens públicos e profissionais liberais da época (MOTTA, 2014MOTTA, Antônio. No território da morte: cenários, pompas e urbanidade nos cemitérios do Rio. Revista do Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro, n. 8, p. 237-255, 2014.). Embora não se faça menção à causa mortis, Cristiano Ottoni relata em sua autobiografia que o irmão sofria há anos de uma anemia (OTTONI, 2014OTTONI, Cristiano Benedito. Autobiografia de C. B. Ottoni: natural da Vila do Príncipe, depois da cidade do Serro, na província de Minas Gerais. Brasília: Senado Federal, Conselho Editorial, 2014. Disponível em: Disponível em: http://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id/562752 . Acesso em: 14 jan. 2022.
http://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id...
, p. 26).

Ao longo da vida, Ernesto Ottoni conseguiu obter certas posses. Conforme indica seu testamento, deixou aos seus testamenteiros quatro casas e oito apólices de empréstimo.52 52 GAZETA de Notícias, Rio de Janeiro, n. 283, 12 out. 1881, p. 1. Como médico, os ganhos obtidos vieram da clínica, mas também dos cargos que ocupou em São Paulo e no Rio de Janeiro. Como mencionado anteriormente, tais bens não lhe foram proporcionados apenas pela carreira médica. Como outros esculápios que conciliavam a carreira com outras atividades, além de participar dos negócios da companhia do Mucuri, buscou aumentar seu patrimônio de outras maneiras, como a aquisição de ações da companhia da Estrada de Ferro D. Pedro II.53 53 Distribuição das ações da companhia da Estrada de Ferro D. Pedro II a Ernesto Ottoni. Jornal do Comercio, Rio de Janeiro, Suplemento ao n. 81, 2 jul. 1855, p. 1.

Além das questões materiais, Ernesto Ottoni não deixou de investir no seu “currículo científico”, participando no Instituto dos Acadêmicos, o que de certa forma lhe conferia notoriedade, pelo menos entre os membros daquela associação. Além disso, o Instituto viabilizou a divulgação de seus trabalhos, aspecto, como já se notou, que adquiria relevância para a carreira médica na época. Por fim, não menos importante, teve também suas experiências clínicas citadas por outros médicos.

As fontes mobilizadas aqui, ainda que não sejam capazes de responder a determinadas questões sobre o percurso do médico serrano, permitem a reconstrução de elementos da trajetória de um personagem pouco conhecido pela historiografia, que atuou em diferentes instituições e espaços, transitando entre a Corte, São Paulo e Minas Gerais. Desvendar aspectos da carreira médica de Ernesto Ottoni permite acompanhar a partir de evidências empíricas os aspectos que caracterizavam a prática da medicina no século XIX e as diversas estratégias para alcançar posições no competitivo mercado da cura do período. Nesse sentido, o caso aqui analisado, além das suas singularidades, mostra o papel de outros fatores que extravasavam o papel da formação escolar no ambiente médico do Império.

Fontes documentais

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  • 1
    De acordo com Flávio Edler, tais elites eram constituídas por um grupo seleto formado pelos professores da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, os membros da Academia Imperial de Medicina; aqueles que se organizavam em torno de periódicos especializados e por aqueles que ocupavam os principais cargos na burocracia estatal e também cargos políticos (EDLER, 2014, p. 25).
  • 2
    OTTONI, Ernesto Benedicto. Algumas considerações sobre o clima da província de Minas Gerais e sobre as moléstias, que mais acometem seus habitantes. Rio de Janeiro, Tipografia Imperial e Constitucional de J. Villeneuve e Comp., 1841. Dedicatória, [s.p.]. A grafia de todas as fontes foi atualizada para a atualmente utilizada.
  • 3
    Os estatutos de 1837 estabeleciam que as teses poderiam contemplar qualquer matéria do curso. Em 1854, houve algumas mudanças e a tese “consistiria em proposições concernentes a três questões, sendo cada uma relativa a cada seção do curso médico”, desde que aprovadas pela Congregação. Na reforma de 1884, foi mantido o controle da congregação sobre os pontos, os quais deviam versar sobre as “doutrinas importantes das ciências professadas na faculdade” (GONDRA, 2004, p. 128-135)
  • 4
    OTTONI, Ernesto. Op. cit., 1841. Prefácio, [s.p.].
  • 5
    Ibidem, p. 21-22.
  • 6
    Ibidem, p. 33.
  • 7
    Ibidem, p. 21.
  • 8
    JOBIM, José Martins da Cruz. Discurso sobre as moléstias, que mais afligem a classe pobre do Rio de Janeiro; lido na sessão pública da sociedade de Medicina, 30 de junho de 1835. Rio de Janeiro: Tip. Fluminense de Brito e Comp., 1835, p. 27.
  • 9
    OTTONI, Ernesto. Op. cit., p. 16.
  • 10
    MAYER, Tristão Candido. Considerações sobre a febre intermitente particularmente sobre a intermitente benigna. Rio de Janeiro: Tipografia Imparcial de Francisco de Paula Brito, 1839, p. 10.
  • 11
    OTTONI, Ernesto. Op. cit., p. 8.
  • 12
    Teses defendidas perante a Faculdade de Medicina no ano de 1841 continuado do número antecedente. Revista Médica Brasileira, n. 11, p. 608-611, mar. 1842, p. 611. A seção do periódico não continha assinatura.
  • 13
    Movimento do Porto. Entradas do dia 25. Jornal do Comercio. Rio de Janeiro, n. 226, set. 1847, p. 3.
  • 14
    Navegação do Mucuri. Anuário Político, Histórico e Estatístico do Brasil. Segundo Ano. Rio de Janeiro: Firmin Didot Irmãos, 1847, p. 476.
  • 15
    Tais informações constam dos seguintes documentos: Atas da Câmara da Cidade de São Paulo, 1852. Publicação da subdivisão de documentação histórica, v. XXXIX. Departamento de Cultura (Divisão de Documentação Histórica e Social), 1939, p. 18; Atas da Câmara da Cidade de São Paulo, 1855. Publicação da subdivisão de documentação histórica, v. XLI. Departamento de Cultura (Divisão de Documentação Histórica e Social), 1940, p. 38-39.
  • 16
    Atas da Câmara da Cidade de São Paulo, 1850-51. Publicação da subdivisão de documentação histórica, v. XXXVIII. Departamento de Cultura (Divisão de Documentação Histórica e Social), 1939, p. 234.
  • 17
    Atas da Câmara da Cidade de São Paulo, 1855. Op. cit., p. 82.
  • 18
    São Paulo (província), vice-presidente (Soares de Souza). Relatório, 13 set. 1852, p. 4. O relatório apresenta referências incompletas.
  • 19
    Expediente da Presidência, 11 dez. 1855. Correio Paulistano, São Paulo n. 347, 18 dez. 1855, p. 3.
  • 20
    Discurso com que o ilustríssimo e excelentíssimo senhor dr. José Antônio Saraiva, Presidente da província de S. Paulo, abriu a Assembleia Legislativa Provincial no dia 15 de fevereiro de 1855. Correio Paulistano, São Paulo, n. 193, 17 fev. 1855.
  • 21
    Arquivo do Estado de São Paulo. Ofícios diversos. 8 jan. 1855. Disponível em: http://www.arquivoestado.sp.gov.br/site/acervo/repositorio_digital/oficios_diversos. Meus agradecimentos a Lucas Samuel Quadros, pela transcrição do documento.
  • 22
    Ofício do Sr. Dr. Ottoni, dirigido ao exmo. Sr. Presidente da província, sobre o estabelecimento do Hospital dos Lázaros nesta província. Correio Paulistano, São Paulo, n. 180, 31 jan. 1855, p. 1-3.
  • 23
    Assembleia provincial. 34a Sessão ordinária, aos 17 de março de 1857. Correio Paulistano, São Paulo, n. 519, 24 mar. 1857, p. 1.
  • 24
    Diário do Rio de Janeiro, n. 36, 19 maio 1854, p. 2.
  • 25
    LEI DE 18 DE AGOSTO DE 1831. Legislação informatizada. Disponível em: https://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei_sn/1824-1899/lei-37497-18-agosto-1831-564307-publicacaooriginal-88297-pl.html. Acesso em: 6 fev. 2022.
  • 26
    Correio Paulistano, n. 362, 8 fev. 1854, p. 4.
  • 27
    Correspondência. Correio Mercantil, Rio de Janeiro, n. 199, 24 jul. 1858, p. 1.
  • 28
    AVÉ-LALLEMANT, Robert.Viagens pelas províncias da Bahia,Pernambuco,Alagoas e Sergipe:1859. Trad. Eduardo de Lima Castro. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Edusp, 1980, p. 184.
  • 29
    Relatório que o subdelegado do distrito de Filadelfia, o dr. E. B. Ottoni dirigiu ao delegado do Município do ano findo. Correio Mercantil, Rio de Janeiro, n. 50, 18 fev. 1859, p. 1.
  • 30
    AVÉ-LALLEMANT, Robert. Op. cit., p. 184-191.
  • 31
    OTTONI, Teófilo Benedito. A colonização do Mucuri: memória justificativa em que se explica o estado atual dos colonos estabelecidos no Mucuri e as causas dos recentes acontecimentos naquela colônia. Rio de Janeiro: Tip. Brasiliense de Maximiano Gomes Ribeiro, 1859. p. 31.
  • 32
    Boletim do expediente do Governo. Ministério do Império, Tomo 29, dez. 1861, p. 21.
  • 33
    O periódico não traz a informação sobre quem era o ocupante do cargo de cirurgião-mor. Durante a pesquisa também não localizei esse dado.
  • 34
    Notícias diversas. Correio Mercantil, n. 322, 26 nov. 1865, p. 1.
  • 35
    JORNAL do Comércio, n. 309, 17 nov. 1877, p. 3.
  • 36
    Parte não editorial. A Reforma: Órgão Democrático, Rio de Janeiro, n. 34, 10 fev. 1878, p. 3.
  • 37
    Notícias diversas. O Globo: Órgão da Agência Americana Telegráfica dedicado aos interesses do Commercio, Lavoura e Industria, Rio de Janeiro, ano VI, n. 22, 26 jan. 1878, p. 1.
  • 38
    Hospital da Marinha. Jornal do Comércio, Rio de Janeiro, 23 jan. 1878, p. 1.
  • 39
    CORREIO Mercantil, n. 75, 16 mar. 1868, p. 1.
  • 40
    Não há evidências de que a memória chegou a ser publicada. O texto não foi localizado na revista do Instituto dos Acadêmicos e nem nos demais periódicos da época.
  • 41
    Instituto Acadêmico. Diário do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, n. 214, 5 ago. 1868, p. 1.
  • 42
    OTTONI, Ernesto Benedicto. Observações sobre o cólera-morbo de 1867 no Hospital de Marinha da Corte, seguida de Breve notícia do cólera-morbo de no mesmo Hospital, dada ao Instituto Acadêmico; e da resposta ao relatório do Presidente da Junta de Higiene Pública na parte relativa à estatística do Cólera de 1867. Revista do Instituto Acadêmico, n. 2, p. 43-74, out. 1868, p. 46.
  • 43
    Ibidem, p. 48
  • 44
    SEQUEIRA, José de Goés. Influência nociva das dejecções coléricas. Meios que convém empregar para neutralizar ou evitar seus efeitos. Gazeta Médica da Bahia, v. 1, p. 64-67, 1867.
  • 45
    Ibidem, p. 66.
  • 46
    Anexo I. Relatórios do presidente da Junta Central de Higiene Pública e inspector de saúde do porto. In: BRASIL. Ministério do Império. Ministro (José Joaquim Fernandes Torres). Relatório do Ano de 1867 apresentado à Assembleia Geral na 2a Sessão da 13ª Legislatura (Publicado em 1868), p. 38.
  • 47
    OTTONI, Ernesto Benedicto. Observações sobre o cólera-morbo… Op. cit., p. 68-70.
  • 48
    AZEVEDO, Miranda. Chyluria. Estudo bibliográfico. Revista Médica, Rio de Janeiro, n. 19, p. 299-302, 15 nov. 1875, p. 299.
  • 49
    Instituto Farmacêutico, 12 abr. 1878, p. 2.
  • 50
    Almanak Laemmert: Administrativo, Mercantil e Industrial da Corte e Provincia do Rio de Janeiro para o ano de 1858, inclusive a cidade de Santos, da província de São Paulo para o ano de 1881. Rio de Janeiro: Em casa dos editores-proprietários Eduardo e Henrique Laemmert, 1881, p. 695.
  • 51
    Falecimento. A província de Minas: Órgão do partido Conservador, Ouro Preto, n. 70, 16 out. 1881, p. 2.
  • 52
    GAZETA de Notícias, Rio de Janeiro, n. 283, 12 out. 1881, p. 1.
  • 53
    Distribuição das ações da companhia da Estrada de Ferro D. Pedro II a Ernesto Ottoni. Jornal do Comercio, Rio de Janeiro, Suplemento ao n. 81, 2 jul. 1855, p. 1.
  • 54
    Este artigo é decorrente de uma pesquisa financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais-Fapemig-MG.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Ago 2023
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2023

Histórico

  • Recebido
    21 Fev 2022
  • Aceito
    09 Maio 2022
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