Acessibilidade / Reportar erro

Efeitos da Participação em Coros Comunitários Infantis nas Crianças

Effets de la Participation aux Chorales Communautaires d’Enfants sur les Enfants

RESUMO

Efeitos da Participação em Coros Comunitários Infantis nas Crianças – Este artigo explora a possibilidade de desenvolvimento de competências musicais, sociais e pessoais em crianças, refletindo sobre efeitos da sua participação em projetos corais comunitários. Analisam-se dois projetos, idealizados por adultos em que as crianças são sujeitos ativos de práticas artísticas, que potenciam a música como instrumento de desenvolvimento sociocultural e afetivo destas. Através de uma abordagem etnográfica, acompanhou-se estes projetos, realizaram-se grupos focais e entrevistas a participantes. Os dados recolhidos sugerem que os envolvidos reconhecem efeitos positivos nas crianças nas competências pessoais e sociais e na sua capacidade de fruição e construção do gosto musical.

Palavras-chave:
Crianças; Coros Infantis; Intervenção Musical Comunitária; Artes; Educação

RÉSUMÉ

Effets de la Participation aux Chorales Communautaires d’Enfants sur les Enfants – Cet article explore la possibilité de développer des compétences musicales, sociales et personnelles chez les enfants, en réfléchissant aux effets de leur participation à des projets chorales communautaires. Deux projets, idéalisés par des adultes, dans lesquels les enfants sont des sujets actifs de pratiques artistiques, qui valorisent la musique comme instrument de leur développement socioculturel et affectif, sont analysés. Grâce à une approche ethnographique, ces projets ont été suivis, des groupes de discussion et des entretiens avec les participants ont été réalisés. Les données recueillies suggèrent que les personnes impliquées reconnaissent des effets positifs sur les enfants en compétences personnelles et sociales et de leur capacité à apprécier et à développer leur goût musical.

Mots-clés:
Enfants; Chœurs d’Enfants; Intervention Musicale Communautaire; Art; Éducation

ABSTRACT

Effects on Children of Participation in Children's Community Choirs – This article explores the possibility of developing musical, social and personal skills in children, reflecting on the effects of their participation in community choir projects. Two projects, designed by adults, in which children are active subjects of artistic practices, which enhance music as an instrument for their sociocultural and affective development, are analysed. Through an ethnographic approach, these projects were monitored and focus groups and interviews with participants were conducted. The data collected suggest that those involved recognise positive effects on children in terms of personal and social skills and their ability to enjoy and build musical taste.

Keywords:
Children; Children's Choirs; Community Musical Intervention; Arts; Education

Introdução

Procura-se, neste trabalho, conhecer e analisar possíveis efeitos da participação de crianças em projetos de música comunitária. O objeto sobre o qual se centrou esta investigação foi a análise dos projetos Escola a Cantar e Coro Infantil Casa da Música, ambos projetos de música coral comunitária infantil da responsabilidade da Casa da Música1 1 A Casa da Música é um equipamento cultural dedicado exclusivamente à música, criado no contexto da Porto 2001 Capital Europeia da Cultura. É um dos principais projetos que a Porto 2001 deixou à cidade e ao país, inaugurada a 15 de abril de 2005. Em janeiro de 2006 instituiu-se a Fundação Casa da Música, tendo como entidades fundadoras o Estado Português, o Município do Porto, a Grande Área Metropolitana do Porto e 38 entidades de direito privado (Ramalho, 2012). , desenhados de forma a cumprir as preocupações comunitárias do Serviço Educativo da Casa da Música. Com estes projetos pretende-se promover uma extensão à comunidade, no sentido de contribuir para a promoção da inclusão e da igualdade de oportunidades (Boal-Palheiros, 2014BOAL-PALHEIROS, Graça. Som da Rua, um projecto musical de intervenção social. In: CONGRESSO INTERNACIONAL PEDAGOGIA SOCIAL, 27., 2014, Porto. Anais [...]. Porto: Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico do Porto, 2014. P. 378-385.; Bartleet; Higgins 2018BARTLEET, Brydie-Leigh; HIGGINS, Lee. Introduction: An Overview of Community Music in the Twenty-First Century. In: BARTLEET, Brydie-Leigh; HIGGINS, Lee (Ed.). The Oxford Handbook of Community Music. Oxford: Oxford University Press, 2018. P. 1-20.). As questões educativas encontram-se, desde o início, presentes nas preocupações programáticas da Casa da Música, que justifica a sua intervenção através do reconhecimento de que os serviços educativos constituem hoje uma área estratégica para muitas organizações culturais, quer porque permitem concretizar uma visão programática das artes e da cultura como ferramentas para a coesão e integração social, quer porque através deles se constroem também as trajetórias e as reputações da instituição e dos seus membros (Ramalho, 2012RAMALHO, Joana L. O papel da cultura na produção de cidade: a Casa da Música no Porto. 2012. Tese (Doutorado em Ciências Sociais) – Instituto de Ciências Sociais, Universidade de Lisboa, Lisboa, 2012.; Boal-Palheiros, 2014BOAL-PALHEIROS, Graça. Som da Rua, um projecto musical de intervenção social. In: CONGRESSO INTERNACIONAL PEDAGOGIA SOCIAL, 27., 2014, Porto. Anais [...]. Porto: Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico do Porto, 2014. P. 378-385.).

A investigação que aqui se apresenta teve como objetivos centrais identificar diferentes efeitos dos projetos Escolas a Cantar/Coro Infantil da Casa da Música (EaC/CICM) nas crianças do 1º ciclo do Ensino Básico. Mais especificamente, procurou-se perceber em que medida projetos como estes poderiam contribuir para: democratizar o acesso a uma cultura legítima e a um bem cultural legítimo (Bourdieu, 2010BOURDIEU, Pierre. A distinção: uma crítica social da faculdade do juízo. Coimbra: Edições 70, 2010.), que é a música, através do alargamento da educação musical; favorecer o desenvolvimento pessoal e social e as competências artísticas musicais das crianças participantes; e promover, nas crianças participantes, novas visões da música e o gosto em fruir e participar em práticas musicais.

Pretendeu-se, igualmente, perceber os diversos contornos que os projetos foram adquirindo nos diferentes contextos – as três escolas e a Casa da Música.

Breve descrição dos projetos

O projeto CICM foi desenhado de forma a cumprir as preocupações comunitárias do Serviço Educativo da Casa da Música, um projeto de extensão à comunidade. Nesse sentido, o Serviço Educativo, partindo do princípio orientador de que a música deverá ser acessível a todos, pensou que o CICM deveria envolver crianças que, à partida, não tinham acesso direto a uma formação artística de qualidade.

Assim, no ano letivo de 2016/2017, o Projeto Escola a Cantar (EaC) começou em três escolas do 1º ciclo do ensino básico da rede pública da área metropolitana do Porto: em Matosinhos, em Vila Nova de Gaia e no Porto. Desenvolveu-se, com estas três escolas, um processo de formação coral que envolveu cerca de 350 crianças, educadores, famílias e comunidades. Neste projeto, uma dupla de formadores da Casa da Música trabalhou com todos os/as alunos/as destas escolas, do primeiro ao quarto ano, em sessões semanais com duração de 60 minutos.

Deste percurso resultaram três grupos corais, um por escola, de onde sairiam as vozes do Coro Infantil Casa da Música, pois, no final do ano letivo 2016/2017, as crianças dos três projetos escolares que mostraram mais apetência vocal e interesse pela atividade coral foram convidadas a pertencer ao CICM, onde iriam desenvolver, de forma mais intensa, as suas capacidades vocais.

A partir do ano letivo 2017/2018 o trabalho passou, portanto, a ser desenvolvido através de dois projetos – os três das escolas, que continuaram o seu trabalho com todos os/as alunos/as, e que eram também o local de recrutamento de novas vozes, e o do CICM. São, assim, quatro entidades a evoluir numa geografia alargada, orientadas pelo Serviço Educativo da Casa da Música. A exploração de reportórios corais, composição coletiva e incentivo ao sucesso curricular são alicerces destes projetos.

O Coro Infantil Casa da Música é hoje um dos grupos residentes da instituição, com ensaios aos sábados de manhã na Casa da Música. A sua estreia pública decorreu num dos concertos maiores de 2017: no Dia Mundial da Música, na Sala Suggia, juntou-se à Orquestra Sinfónica do Porto Casa da Música, ao Coro Nacional de España e ao Coro Lira para interpretar o War Requiem de Benjamin Britten. Formado por 49 crianças, este coro resulta e é parte integrante de uma dinâmica iniciada no ano 2017/2018 e que se deseja manter no futuro.

Efeitos das experiências educativas musicais

Admite-se que as experiências educativas musicais se podem expandir para além dos limites da própria aprendizagem da música, incluindo o desenvolvimento de competências pessoais, como a criatividade e a autoexpressão (Camara, 2003CAMARA, Aintzane. El canto colectivo en la escuela: una vía para la socialización y el bienestar personal. Revista de Psicodidáctica, n. 15-16, p. 105-110, 2003. Disponível em: https://dialnet.unirioja.es/servlet/articulo?codigo=853037. Acesso em: 05 jun. 2021.
https://dialnet.unirioja.es/servlet/arti...
; Carminatti; Krug, 2010CARMINATTI, Juliana; KRUG, Jeferson. A prática de canto coral e o desenvolvimento de habilidades sociais. Pensamiento psicológico, v. 7, n. 14, p. 81-96, 2010. Disponível em: https://dialnet.unirioja.es/descarga/articulo/3265166.pdf. Acesso em: 05 ago. 2021.
https://dialnet.unirioja.es/descarga/art...
; Kirschner; Tomasello, 2010KIRSCHNER, Sebastian; TOMASELLO, Michael. Joint music making promotes prosocial behavior in 4-year-old children. Evolution and Human Behavior, v. 31, n. 5, p. 354-364, 2010. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.evolhumbehav.2010.04.004 Acesso em: 22 set. 2021.
https://doi.org/10.1016/j.evolhumbehav.2...
; Wills, 2011WILLS, Ruth. The magic of music: a study into the promotion of children’s well-being through singing. International Journal of Children's Spirituality, v. 16, n. 1, p. 37-46, 2011. Disponível em: https://doi.org/10.1080/1364436X.2010.540750. Acesso em: 15 mar. 2021.
https://doi.org/10.1080/1364436X.2010.54...
), a motricidade; o desenvolvimento do raciocínio espacial (Jucan; Simion, 2015JUCAN, Dana; SIMION, Anca. Music Background in the Classroom: Its Role in the Development of Social-emotional Competence in Preschool Children. Procedia-Social and Behavioral Sciences, n. 180, p. 620-626, 2015. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.sbspro.2015.02.169. Acesso em: 22 set. 2021.
https://doi.org/10.1016/j.sbspro.2015.02...
), a coordenação rítmica, competências percetivas, que podem ser relevantes para aprendizagens nas áreas da matemática e da alfabetização (Anvari; Trainor; Woodside; Levy, 2002ANVARI, Sima; TRAINOR, Laurel; WOODSIDE, Jennifer; LEVY, Betty. Relations among musical skills, phonological processing, and early reading ability in preschool children. Journal of experimental child psychology, v. 83, n. 2, p. 111-130, 2002.) e as competências éticas de disciplina e responsabilidade desenvolvidas através de um compromisso estabelecido com o trabalho desenvolvido (Dakon; Cloete, 2018DAKON, Jacob M.; CLOETE, Elene. The Violet experience: Social interaction through eclectic music learning practices. British Journal of Music Education, v. 35, n. 1, p. 57-72, 2018. Disponível em: https://doi.org/10.1017/S0265051717000122. Acesso em: 05 ago. 2021.
https://doi.org/10.1017/S026505171700012...
). Também as apresentações ao público permitem desenvolver uma sensação de realização, orgulho, autoconfiança e respeito por si próprio (Arslan, 2014ARSLAN, Asuman A. A Study into the Effects of Art Education on Children at the Socialisation Process. Procedia-Social and Behavioral Sciences, n. 116, p. 4114-4118, 2014. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.sbspro.2014.01.900. Acesso em: 05 jun. 2021.
https://doi.org/10.1016/j.sbspro.2014.01...
; Dakon; Cloete, 2018DAKON, Jacob M.; CLOETE, Elene. The Violet experience: Social interaction through eclectic music learning practices. British Journal of Music Education, v. 35, n. 1, p. 57-72, 2018. Disponível em: https://doi.org/10.1017/S0265051717000122. Acesso em: 05 ago. 2021.
https://doi.org/10.1017/S026505171700012...
). Existem, ainda, argumentos que apontam para que o envolvimento ativo com a música na infância poderá ainda contribuir para melhorar o autocontrolo de emoções, uma vez que pode promover o desenvolvimento emocional (por exemplo, a regulação do humor), podendo ainda potenciar experiências de grande intensidade afetiva relacionadas com música (Sloboda, 1991SLOBODA, John. Music structure and emotional response: Some empirical findings. Psychology of music, v. 19, n. 2, p. 110-120, 1991. Disponível em: https://doi.org/10.1177/0305735691192002. Acesso em: 11 mar. 2021.
https://doi.org/10.1177/0305735691192002...
; Hallam, 2010HALLAM, Susan. The power of music: Its impact on the intellectual, social and personal development of children and young people. International Journal of Music Education, v. 28, n. 3, p. 269-289, 2010. Disponível em: http://dx.doi.org/10.1177/0255761410370658. Acesso em: 22 set. 2021.
http://dx.doi.org/10.1177/02557614103706...
; Miranda; Gaudreau, 2011MIRANDA, Dave; GAUDREAU, Patrick. Music listening and emotional well-being in adolescence: A person-and variable-oriented study. Revue Européenne de Psychologie Appliquée/European Review of Applied Psychology, v. 61, n. 1, p. 1-11, 2011.; Wills, 2011WILLS, Ruth. The magic of music: a study into the promotion of children’s well-being through singing. International Journal of Children's Spirituality, v. 16, n. 1, p. 37-46, 2011. Disponível em: https://doi.org/10.1080/1364436X.2010.540750. Acesso em: 15 mar. 2021.
https://doi.org/10.1080/1364436X.2010.54...
).

Fazer música em conjunto parece ter efeitos positivos também no desenvolvimento de competências sociais, constituindo uma forma muito clara de conseguir melhores níveis de coordenação entre elementos de um grupo e de partilha de emoções (Kirschner; Tomasello, 2010KIRSCHNER, Sebastian; TOMASELLO, Michael. Joint music making promotes prosocial behavior in 4-year-old children. Evolution and Human Behavior, v. 31, n. 5, p. 354-364, 2010. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.evolhumbehav.2010.04.004 Acesso em: 22 set. 2021.
https://doi.org/10.1016/j.evolhumbehav.2...
), por meio do desenvolvimento de relações de amizade, de sentimentos de segurança e de respeito mútuo, porque proporcionam às crianças formas de conhecer novas pessoas e fazer novos amigos (Dickens; Douglas, 2013DICKENS, Luke; DOUGLAS, Lonie. Rap, rhythm and recognition: Lyrical practices and the politics of voice on a community music project for young people experiencing challenging circumstances. Emotion, Space and Society, n. 9, p. 59-71, 2013. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.emospa.2012.11.003. Acesso em: 05 ago. 2021.
https://doi.org/10.1016/j.emospa.2012.11...
; Dakon; Cloete, 2018DAKON, Jacob M.; CLOETE, Elene. The Violet experience: Social interaction through eclectic music learning practices. British Journal of Music Education, v. 35, n. 1, p. 57-72, 2018. Disponível em: https://doi.org/10.1017/S0265051717000122. Acesso em: 05 ago. 2021.
https://doi.org/10.1017/S026505171700012...
), podendo ser um fator importante para a coesão comunitária (Azizinezhad; Hashemi; Darvishi, 2013AZIZINEZHAD, Masoud; HASHEMI, Masoud; DARVISHI, Sohrab. Music as an education-related service to promote learning and skills acquisition. Procedia-Social and Behavioral Sciences, n. 93, p. 142-145, 2013. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.sbspro.2013.09.167. Acesso em: 05 jun. 2021.
https://doi.org/10.1016/j.sbspro.2013.09...
).

Será importante distinguir este tipo de competências intrapessoais (Finnäs, 1989FINNÄS, Leif. How can musical preferences be modified? A research review. Bulletin of the Council for Research in Music Education, Champaign, University of Illinois Press, n. 102, p. 1-58, 1989.), ou não musicais (pessoais e sociais), dos chamados efeitos musicais (Koopman, 2007KOOPMAN, Constantijn. Community music as music education: On the educational potential of community music. International Journal of Music Education, v. 25, n. 2, p. 151-163, 2007. Disponível em: https://doi.org/10.1177/0255761407079951. Acesso em: 15 nov. 2021.
https://doi.org/10.1177/0255761407079951...
) ou intramusicais (Finnäs, 1989FINNÄS, Leif. How can musical preferences be modified? A research review. Bulletin of the Council for Research in Music Education, Champaign, University of Illinois Press, n. 102, p. 1-58, 1989.), isto é, aqueles que se focam nos aspetos constitutivos da música.

Este tipo de experiências parece poder contribuir para o desenvolvimento de competências musicais de qualidade, especialmente no que diz respeito a uma maior capacidade de interpretação, a ser musicalmente mais competente e aberto, e a ter uma consciência crítica sobre música (Swanwick; Lawson, 1999SWANWICK, Keith; LAWSON, Doroty. “Authentic” Music and its Effect on the Attitudes and Musical Development of Secondary School Students. Music Education Research, v. 1, n. 1, p. 47-60, 1999. Disponível em: https://doi.org/10.1080/1461380990010105. Acesso em: 12 nov. 2021.
https://doi.org/10.1080/1461380990010105...
). Estas competências são potenciadas por experiências divertidas, lúdicas, criativas e envolvendo movimento (vs. uma postura física mais rígida), que facilitam o desenvolvimento da capacidade de interação e trabalho de equipa com os colegas (Finnäs, 1989FINNÄS, Leif. How can musical preferences be modified? A research review. Bulletin of the Council for Research in Music Education, Champaign, University of Illinois Press, n. 102, p. 1-58, 1989.; Dakon; Cloete, 2018DAKON, Jacob M.; CLOETE, Elene. The Violet experience: Social interaction through eclectic music learning practices. British Journal of Music Education, v. 35, n. 1, p. 57-72, 2018. Disponível em: https://doi.org/10.1017/S0265051717000122. Acesso em: 05 ago. 2021.
https://doi.org/10.1017/S026505171700012...
).

Um dos aspetos para o qual as atividades musicais, relativamente a competências musicais, parecem poder contribuir é para a construção do gosto e do juízo de gosto (Alpert, 1982ALPERT, Judith. The effect of disc jockey, peer, and music teacher approval of music on music selection and preference. Journal of Research in Music Education, v. 30, n. 3, p. 173-186, 1982.; Finnäs, 1989FINNÄS, Leif. How can musical preferences be modified? A research review. Bulletin of the Council for Research in Music Education, Champaign, University of Illinois Press, n. 102, p. 1-58, 1989.; Carper, 2001CARPER, Kenneth. The effects of repeated exposure and instructional activities on the least preferred of four culturally diverse musical styles with kindergarten and pre-k children. Bulletin of the Council for Research in Music Education, Champaign, University of Illinois Press, n. 151, p. 41-50, 2001.; McKoy, 2002MCKOY, Constance. L. A review of research on instructional approach and world music preference. Update: Applications of Research in Music Education, v. 22, n. 1, p. 36-43, 2002.; Bourdieu, 2010BOURDIEU, Pierre. A distinção: uma crítica social da faculdade do juízo. Coimbra: Edições 70, 2010.; Hennion, 2011HENNION, Antoine. Music and Mediation. Toward a New Sociology of Music. In: CLAYTON, Martin; HERBERT, Trevor; MIDDLETON, Richard (Ed.). The Cultural Study of Music. A Critical Introduction. 2. ed. Abingdon-on-Thames: Routledge, 2011. P. 249-260. Disponível em: https://hal-mines-paristech.archives-ouvertes.fr/hal-00771905. Acesso em: 22 set. 2021.
https://hal-mines-paristech.archives-ouv...
; Arriaga-Sanz et al., 2017ARRIAGA-SANZ, Cristina et al. Songs are taught, songs are learnt: musical preferences in early childhood. Music Education Research, v. 19, n. 3, p. 309-326, 2017. Disponível em: https://doi.org/10.1080/14613808.2016.1214694. Acesso em: 02 jun. 2021.
https://doi.org/10.1080/14613808.2016.12...
). Importa assim refletir sobre os efeitos que estas atividades podem ter sobre as preferências e consumos musicais das crianças envolvidas. Também sobre esta questão existe uma grande variedade de posições que importa analisar.

Vários estudos (Finnäs, 1989FINNÄS, Leif. How can musical preferences be modified? A research review. Bulletin of the Council for Research in Music Education, Champaign, University of Illinois Press, n. 102, p. 1-58, 1989.; Arriaga-Sanz et al., 2017ARRIAGA-SANZ, Cristina et al. Songs are taught, songs are learnt: musical preferences in early childhood. Music Education Research, v. 19, n. 3, p. 309-326, 2017. Disponível em: https://doi.org/10.1080/14613808.2016.1214694. Acesso em: 02 jun. 2021.
https://doi.org/10.1080/14613808.2016.12...
; Dobrota; Ercegovac, 2017DOBROTA, Snježana; ERCEGOVAC, Ina. Music preferences with regard to music education, informal influences and familiarity of music amongst young people in Croatia. British Journal of Music Education, v. 34, n. 1, p. 41-55, 2017. Disponível em: https://doi.org/10.1017/S0265051716000358. Acesso em: 05 ago. 2021.
https://doi.org/10.1017/S026505171600035...
) revelam que a grande maioria das canções preferidas pelas crianças são populares, da moda, com tempo rápido e ritmos diferentes, temas claros e progressões de acordes resolvidos de forma direta e facilmente previsível, melodias coerentes, ausência de dissonâncias pronunciadas, com um grau moderado de complexidade, provenientes, na sua maioria, dos meios de comunicação social e com base em imagens de écrans (televisões, telemóveis, jogos).

É importante distinguir preferência musical (um termo volátil e indefinido que implica as reações à música que refletem o grau de gosto ou desagrado, e não uma análise cognitiva ou reflexão estética) e o conceito de gosto musical, utilizado para indicar uma preferência mais duradoura em relação a determinados tipos de música (Finnäs, 1989FINNÄS, Leif. How can musical preferences be modified? A research review. Bulletin of the Council for Research in Music Education, Champaign, University of Illinois Press, n. 102, p. 1-58, 1989.). O gosto musical é, para Pierre Bourdieu, um conceito muito importante e classificatório. Ele afirma mesmo que:

[...] nada há que permita, tanto quanto os gostos musicais, afirmar a sua ‘classe’ [...] A prática das escolhas do gosto musical aparece então como extremamente classificadora [...] devido à raridade das condições de aquisição das disposições correspondentes, de atividades como a frequência de concertos ou a prática de um instrumento musical ‘nobre’ [...] (Bourdieu, 2010, p. 64BOURDIEU, Pierre. A distinção: uma crítica social da faculdade do juízo. Coimbra: Edições 70, 2010.).

Assim, quanto ao que intitula de universo dos gostos singulares, Bourdieu afirma ser possível distinguir três universos de gostos que correspondem normalmente também a níveis escolares e a classes sociais. São eles:

[...] o gosto legítimo, ou seja, o gosto pelas obras legítimas [...] e às quais os estetas mais seguros podem associar as obras de arte mais legítimas em vias de legitimação, cinema, jazz...[...][que] aumenta com o nível escolar, alcançando a sua frequência mais elevada nas frações da classe dominante mais ricas em capital escolar; o gosto médio, que reúne as obras menores das artes maiores [...] e as obras maiores das artes menores [...] [que] é mais frequente nas classes médias do que nas classes populares ou nas frações ‘intelectuais’ da classe dominante; e, por último, o gosto popular, aqui representado pela escolha de obras de música dita ligeira ou música erudita desvalorizada pela divulgação e sobretudo canções totalmente desprovidas de ambição ou pretensão artística [...] que encontra a sua frequência máxima nas classes populares e varia em razão inversa do capital escolar (Bourdieu, 2010, p. 60-62BOURDIEU, Pierre. A distinção: uma crítica social da faculdade do juízo. Coimbra: Edições 70, 2010.).

Por outras palavras, as diferenças de gosto musical, por estarem condicionadas à disposição estética – e esta, por sua vez, condicionada a níveis de rendimento e escolaridade –, contribuem também para divisões de classe social (Calvi; Souza; Santini, 2009CALVI, Juan; SOUZA, Rosali; SANTINI, Rose. A organização do consumo de música na internet através da classificação do gosto cultural: estudo de caso do sistema de recomendação last.fm. In: CONGRESO ISKO-ESPAÑA, 9., 2009, Valencia. Actas [...]. Valencia, 2009. P. 663-675. Disponível em: https://dialnet.unirioja.es/servlet/articulo?codigo=2924551. Acesso em: 05 jun. 2021.
https://dialnet.unirioja.es/servlet/arti...
). Assim, se se olhar o gosto como

[...] representação social de quem somos ou de quem gostaríamos de ser, o trabalho de moldar este gosto é uma espécie de atalho entre estes dois mundos, o da pertença (quem somos ou projetamos ser) e o da referência (quem gostaríamos de ser ou a imagem que gostaríamos de projetar) (Calvi; Souza; Santini, 2009, p. 143CALVI, Juan; SOUZA, Rosali; SANTINI, Rose. A organização do consumo de música na internet através da classificação do gosto cultural: estudo de caso do sistema de recomendação last.fm. In: CONGRESO ISKO-ESPAÑA, 9., 2009, Valencia. Actas [...]. Valencia, 2009. P. 663-675. Disponível em: https://dialnet.unirioja.es/servlet/articulo?codigo=2924551. Acesso em: 05 jun. 2021.
https://dialnet.unirioja.es/servlet/arti...
).

Reconhece-se, desta forma, o peso de fatores socioeconómicos e socio-emocionais na formação de hábitos, atitudes e do gosto musicais, especialmente dos mais novos. A relação entre preferências musicais e a formação do gosto musical e vários fatores, como participação em grupos pares, origem familiar, idade, género e influência da comunicação social tem sido estudada no contexto de diferentes investigações (Finnäs, 1989FINNÄS, Leif. How can musical preferences be modified? A research review. Bulletin of the Council for Research in Music Education, Champaign, University of Illinois Press, n. 102, p. 1-58, 1989.). Nesse sentido, o conhecimento compartilhado é reconhecido como um poderoso determinante das preferências culturais das crianças, tanto porque se trata do estabelecimento de uma comunicação efetiva e afetiva, como, também, sendo transmitida por outros através de interações sociais, serve como um marcador de identidade de grupo social (Soley; Spelke, 2016SOLEY, Gaye; SPELKE, Elizabeth S. Shared cultural knowledge: Effects of music on young children’s social preferences. Cognition, n. 148, p. 106-116, 2016. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.cognition.2015.09.017. Acesso em: 11 nov. 2021.
https://doi.org/10.1016/j.cognition.2015...
). O conhecimento de produtos culturais, como as canções, surge, normalmente, através da exposição a esses produtos. No entanto, embora o conhecimento cultural dependa da interação com as culturas, essa exposição pode chegar de várias formas nas sociedades contemporâneas. As preferências emergem, assim, de várias fontes e não só da exposição, incluindo (no caso da música) da sensibilidade auditiva, às condições socioculturais e até mesmo da personalidade de cada ouvinte (Soley; Spelke, 2016, p. 107SOLEY, Gaye; SPELKE, Elizabeth S. Shared cultural knowledge: Effects of music on young children’s social preferences. Cognition, n. 148, p. 106-116, 2016. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.cognition.2015.09.017. Acesso em: 11 nov. 2021.
https://doi.org/10.1016/j.cognition.2015...
). Analisando o papel que as influências socioemocionais podem ter sobre o desenvolvimento de preferências e gosto musical, é possível perceber que a carga emocional das músicas parece influenciar as preferências musicais e o desenvolvimento do gosto, na medida em que o grau de emoção sentido ao escutar uma peça parece ter uma correlação positiva com a preferência (Finnäs, 1989FINNÄS, Leif. How can musical preferences be modified? A research review. Bulletin of the Council for Research in Music Education, Champaign, University of Illinois Press, n. 102, p. 1-58, 1989.). Admite-se que os gostos musicais das crianças/jovens se desenvolvem, principalmente, através do contato com os pares e da exposição aos meios de comunicação, afastando-se, frequentemente, do gosto dos seus professores de música, professores de instrumento, professores generalistas e pais (Finnäs 1989FINNÄS, Leif. How can musical preferences be modified? A research review. Bulletin of the Council for Research in Music Education, Champaign, University of Illinois Press, n. 102, p. 1-58, 1989.; Fung; Lee; Chung, 1999FUNG, Victor; LEE, Ming; CHUNG, Ester. Music style preferences of young students in Hong Kong. Bulletin of the Council for Research in Music Education, Champaign, University of Illinois Press, n. 153, p. 50-64, 1999.; Quadros Júnior; Lorenzo, 2013QUADROS JÚNIOR, João; LORENZO, Oswaldo. Preferência musical e classe social: um estudo com estudantes de ensino médio de Vitória, Espírito Santo. Revista da ABEM, v. 21, n. 31, p. 35-50, 2013. Disponível em: http://www.abemeducacaomusical.com.br/revistas/revistaabem/index.php/revistaabem/article/view/70/56. Acesso em: 15 nov. 2021.
http://www.abemeducacaomusical.com.br/re...
). O que as crianças parecem procurar na música, seja ela ouvida dentro ou fora da escola, é a possibilidade de desenvolver competências e confiança para serem capazes de escolher e fruir autonomamente a sua música (Hargreaves; Marshall, 2003HARGREAVES, David J.; MARSHALL, Nigel A. Developing identities in music education. Music Education Research, v. 5, n. 3, p. 263-273, 2003. Disponível em: https://doi.org/10.1080/1461380032000126355. Acesso em: 22 set. 2021.
https://doi.org/10.1080/1461380032000126...
).

As preferências e o gosto musical parecem também poder variar entre diferentes populações de acordo com hábitos social e culturalmente condicionados. Vários estudos (Greer; Dorow; Randall, 1974GREER, R. Douglas; DOROW, Laura; RANDALL, Andrew. Music listening preferences of elementary school children. Journal of Research in Music Education, v. 22, n. 4, p. 284-291, 1974. Disponível em: https://doi.org/10.2307/3344766. Acesso em: 05 set. 2021.
https://doi.org/10.2307/3344766...
; Hargreaves 1984HARGREAVES, David J. The effects of repetition on liking for music. Journal of research in Music Education, v. 32, n. 1, p. 35-47, 1984. Disponível em: http://dx.doi.org/10.2307/3345279. Acesso em: 15 nov. 2021.
http://dx.doi.org/10.2307/3345279...
; LeBlanc; Colman; McCrary; Sherrill; Malin, 1988LEBLANC, Albert; COLMAN, James; MCCRARY, Jan; SHERRILL, Carolyn; MALIN, Sue. Tempo preferences of different age music listeners. Journal of research in music education, v. 36, n. 3, p. 156-168, 1988.; Finnäs, 1989FINNÄS, Leif. How can musical preferences be modified? A research review. Bulletin of the Council for Research in Music Education, Champaign, University of Illinois Press, n. 102, p. 1-58, 1989.) mostram, quanto aos hábitos de escuta da música sobre a construção do gosto, que o efeito da familiaridade com a música e a audição repetida tendem a aumentar o gosto por música mais complexa. Por outro lado, ouvir repetidamente música simples e muito conhecida conduz frequentemente à diminuição da preferência por essa mesma música. É possível perceber, também, que o desenvolvimento de atitudes de desaprovação em relação a determinados tipos de música poderá ser minorado se houver uma intervenção precoce, com crianças, sobretudo se forem utilizadas estratégias lúdicas e criativas de ensino-aprendizagem (Alpert, 1982ALPERT, Judith. The effect of disc jockey, peer, and music teacher approval of music on music selection and preference. Journal of Research in Music Education, v. 30, n. 3, p. 173-186, 1982.; Carper, 2001CARPER, Kenneth. The effects of repeated exposure and instructional activities on the least preferred of four culturally diverse musical styles with kindergarten and pre-k children. Bulletin of the Council for Research in Music Education, Champaign, University of Illinois Press, n. 151, p. 41-50, 2001.; McKoy, 2002MCKOY, Constance. L. A review of research on instructional approach and world music preference. Update: Applications of Research in Music Education, v. 22, n. 1, p. 36-43, 2002.).

No que diz respeito à variável origens socioculturais, de forma geral os estratos socioculturais mais elevados mostram uma maior preferência por música erudita, mais idas a concertos, etc. Os jovens que tocam ou tocaram um instrumento mostram também uma preferência mais elevada para a música mais erudita. As atitudes mais negativas em relação à música contemporânea são tendencialmente maiores nos contextos em que há uma falta clara de estimulação musical (Peery; Peery, 1986PEERY, Craig; PEERY, Irene. Effects of exposure to classical music on the musical preferences of preschool children. Journal of Research in Music Education, v. 34, n. 1, p. 24-33, 1986.; Finnäs, 1989FINNÄS, Leif. How can musical preferences be modified? A research review. Bulletin of the Council for Research in Music Education, Champaign, University of Illinois Press, n. 102, p. 1-58, 1989.; Tanner; Asbridge; Wortley, 2008TANNER, Julien; ASBRIDGE, Mark; WORTLEY, Scot. Our favourite melodies: musical consumption and teenage lifestyles 1. The British Journal of Sociology, v. 59, n. 1, p. 117-144, 2008. Disponível em: https://doi.org/10.1111/j.1468-4446.2007.00185. Acesso em: 15 mar. 2021.
https://doi.org/10.1111/j.1468-4446.2007...
).

Recordando Bourdieu (2010)BOURDIEU, Pierre. A distinção: uma crítica social da faculdade do juízo. Coimbra: Edições 70, 2010., o desafio do tipo de projetos como os que aqui se analisam será procurar que crianças, cujos habitus de classe as posiciona como próximas de um gosto das classes populares, através de pontes simbólicas constituídas pelo contacto com diferentes tipos de música, possam tornar-se também herdeiras legítimas de uma cultura musical tradicionalmente ligada ao que Bourdieu (2010)BOURDIEU, Pierre. A distinção: uma crítica social da faculdade do juízo. Coimbra: Edições 70, 2010. chama a nobreza cultural. Isto é, que estes projetos permitam o desenvolvimento de um bilinguismo cultural nas crianças envolvidas (Stoer; Cortesão,1999STOER, Stephen; CORTESÃO, Luiza. Levantando a Pedra. Porto: Edições Afrontamento, 1999.).

Reconhece-se que “[...] o prazer da música é adquirido e não inato, [...] a música pode ser aprendida e pode-se passar a apreciar géneros que inicialmente não eram entendidos” (Jucan; Simion, 2015, p. 621JUCAN, Dana; SIMION, Anca. Music Background in the Classroom: Its Role in the Development of Social-emotional Competence in Preschool Children. Procedia-Social and Behavioral Sciences, n. 180, p. 620-626, 2015. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.sbspro.2015.02.169. Acesso em: 22 set. 2021.
https://doi.org/10.1016/j.sbspro.2015.02...
). As experiências musicais positivas e envolventes podem levar as crianças a querer participar em novas práticas musicais, contribuindo para moldar o seu gosto musical. Vários estudos têm sido feitos descrevendo a formação do gosto musical, através de experiências que incluem a prática ativa da música durante a infância (Finnäs, 1989FINNÄS, Leif. How can musical preferences be modified? A research review. Bulletin of the Council for Research in Music Education, Champaign, University of Illinois Press, n. 102, p. 1-58, 1989.; Arriaga-Sanz et al., 2017ARRIAGA-SANZ, Cristina et al. Songs are taught, songs are learnt: musical preferences in early childhood. Music Education Research, v. 19, n. 3, p. 309-326, 2017. Disponível em: https://doi.org/10.1080/14613808.2016.1214694. Acesso em: 02 jun. 2021.
https://doi.org/10.1080/14613808.2016.12...
). A educação artística garante o desenvolvimento de uma área fundamental de conhecimento que mobiliza tanto as capacidades sensoriais e racionais como imaginativas e emocionais, criando essa misteriosa amálgama de prazer e saber que é a expressão artística (Ruiz, 2005, p. 3RUIZ, Clarissa. La Educación artística, factor vinculante de la cultura y la educación. Lineamentos de política para la educación artística en Colombia. In: CONFERENCIA REGIONAL DE AMÉRICA LATINA Y EL CARIBE, 2005, Bogotá, Colombia. Anais [...]. Bogotá: UNESCO, 2005. Disponível em: http://www.lacult.unesco.org/docc/PonenciaColombia.pdf. Acesso em: 15 nov. 2021.
http://www.lacult.unesco.org/docc/Ponenc...
). Nesse sentido, defende-se que o valor da prática artística desde a infância vai além da apropriação de valores estéticos e da construção do gosto.

No entanto, a relação entre as preferências musicais e o trabalho com música parece ser ambígua (Dobrota; Ercegovac, 2017DOBROTA, Snježana; ERCEGOVAC, Ina. Music preferences with regard to music education, informal influences and familiarity of music amongst young people in Croatia. British Journal of Music Education, v. 34, n. 1, p. 41-55, 2017. Disponível em: https://doi.org/10.1017/S0265051716000358. Acesso em: 05 ago. 2021.
https://doi.org/10.1017/S026505171600035...
), sendo influenciada pelas características particulares do ouvinte (idade, formação musical, personalidade, conhecimento ou experiência musical), pelas caraterísticas da música (tempo, ritmo, timbre,…) e pelo contexto em que a música é ouvida (familiaridade e audição repetida, experiências afetivas e influências sociais) (North; Hargreaves, 1997NORTH, Adrien; HARGREAVES, David. Liking, arousal potential, and the emotions expressed by music. Scandinavian journal of psychology, v. 38, n. 1, p. 45-53, 1997.; Schäfer; Sedlmeier, 2009SCHÄFER, Thomas; SEDLMEIER, Peter. From the functions of music to music preference. Psychology of Music, v. 37, n. 3, p. 279-300, 2009. Disponível em: https://doi.org/10.1177/0305735608097247. Acesso em: 11 mar. 2021.
https://doi.org/10.1177/0305735608097247...
). A interação destes fatores contribui para formar preferências musicais que, ao longo do tempo, podem-se tornar um padrão específico de gosto musical (North; Hargreaves, 1997NORTH, Adrien; HARGREAVES, David. Liking, arousal potential, and the emotions expressed by music. Scandinavian journal of psychology, v. 38, n. 1, p. 45-53, 1997.; Arriaga-Sanz et al., 2017ARRIAGA-SANZ, Cristina et al. Songs are taught, songs are learnt: musical preferences in early childhood. Music Education Research, v. 19, n. 3, p. 309-326, 2017. Disponível em: https://doi.org/10.1080/14613808.2016.1214694. Acesso em: 02 jun. 2021.
https://doi.org/10.1080/14613808.2016.12...
).

É importante, também, reconhecer o papel da tecnologia e dos meios de comunicação no acesso a múltiplas expressões culturais e musicais de diversas sociedades, permitindo que diferentes estilos musicais alcancem o público imediatamente (North; Hargreaves, 1997NORTH, Adrien; HARGREAVES, David. Liking, arousal potential, and the emotions expressed by music. Scandinavian journal of psychology, v. 38, n. 1, p. 45-53, 1997.). As crianças não são consumidoras passivas: pensam, julgam, opinam e fazem valer critérios de valor, embora confirmando muitas vezes os preconceitos vigentes na sociedade no que diz respeito a género, classe, etnia e gerações.

Isto conduziu a uma deslocalização do contexto de aprendizagem não formal que determina a construção de preferências, em termos de música que as crianças escutam. Portanto, atualmente é mais complexo determinar onde as crianças aprendem. Tudo isso é um desafio para os/as professores/as de música hoje, que têm de se preparar para responder significativamente a estas mudanças e precisam de ferramentas para os/as ajudar a compreender o seu ambiente e tomar as decisões apropriadas que beneficiem os/as seus/suas alunos/as, valorizando esta diversidade, criando um ambiente educativo estimulante que favoreça a aquisição de competências musicais (Arriaga, 2014; Riaño; Cabedo, 2013 apud Arriaga-Sanz et al., 2017ARRIAGA-SANZ, Cristina et al. Songs are taught, songs are learnt: musical preferences in early childhood. Music Education Research, v. 19, n. 3, p. 309-326, 2017. Disponível em: https://doi.org/10.1080/14613808.2016.1214694. Acesso em: 02 jun. 2021.
https://doi.org/10.1080/14613808.2016.12...
). Interessa, nesse sentido, refletir sobre as variáveis que podem ser trabalhadas em situações de ensino/aprendizagem, sobretudo no que poderá ser relevante para influenciar as preferências musicais e o gosto entre os jovens que recebem instrução de música geral (Finnäs, 1989FINNÄS, Leif. How can musical preferences be modified? A research review. Bulletin of the Council for Research in Music Education, Champaign, University of Illinois Press, n. 102, p. 1-58, 1989.).

Assim, no trabalho com a música, mais do que procurar desenvolver o gosto, enquanto perceção e apreciação estéticas, será importante desenvolver, ainda que fragmentariamente, alguma (consciência de) autonomia social, no sentido de permitir capacidade de reflexão crítica do indivíduo sobre si e sobre sua realidade e do desenvolvimento de laços sociais mais consistentes (Fabiano; Silva, 2012FABIANO, Luís; SILVA, Franciele. Massificação cultural, práticas educativas e autonomia social. Revista Diálogo Educacional, Curitiba, v. 12, n. 37, p. 1065-1084, 2012. Disponível em: https://periodicos.pucpr.br/index.php/dialogoeducacional/article/view/4900. Acesso em: 05 ago. 2021.
https://periodicos.pucpr.br/index.php/di...
). Mais do que, a prazo, pretender conquistar públicos para a cultura, dever-se-á procurar criar o que Santos (2003)SANTOS, Helena. A propósito dos públicos culturais: uma reflexão ilustrada para um caso português. Revista Crítica de Ciências Sociais, n. 67, p. 75-97, 2003. denomina de um novo conceito, o de coprodução de sentidos de inclusão social, uma inclusão social

[...] assente na aceitação e valorização da diversidade, na cooperação entre diferentes e na aprendizagem da multiplicidade; um processo através do qual a sociedade, nas suas mais diversas dimensões, se adapta de forma a poder incluir todos os indivíduos que, por sua vez, se preparam para desempenhar um ou vários papéis nessa sociedade (Guerra, 2012, p. 96GUERRA, Paula. Da exclusão social à inclusão social: eixos de uma mudança paradigmática. Revista Angolana de Sociologia, v. 10, p. 91-110, 2012. Disponível em: https://repositorio-aberto.up.pt/handle/10216/74479. Acesso em: 22 set. 2021.
https://repositorio-aberto.up.pt/handle/...
).

Relativamente aos dados analisados na presente investigação, parece de facto verificar-se, como se verá adiante, que os diferentes atores envolvidos nos projetos EaC e CICM reconhecem que estes têm sobre as crianças efeitos positivos ao nível dos chamados efeitos não musicais (Koopman, 2007KOOPMAN, Constantijn. Community music as music education: On the educational potential of community music. International Journal of Music Education, v. 25, n. 2, p. 151-163, 2007. Disponível em: https://doi.org/10.1177/0255761407079951. Acesso em: 15 nov. 2021.
https://doi.org/10.1177/0255761407079951...
) ou intrapessoais (quer pessoais quer sociais) (Finnäs, 1989FINNÄS, Leif. How can musical preferences be modified? A research review. Bulletin of the Council for Research in Music Education, Champaign, University of Illinois Press, n. 102, p. 1-58, 1989.), mas que estes também são sentidos ao nível das famílias, das escolas e da comunidade. Relativamente aos efeitos musicais (Koopman, 2007KOOPMAN, Constantijn. Community music as music education: On the educational potential of community music. International Journal of Music Education, v. 25, n. 2, p. 151-163, 2007. Disponível em: https://doi.org/10.1177/0255761407079951. Acesso em: 15 nov. 2021.
https://doi.org/10.1177/0255761407079951...
) ou intramusicais (Finnäs,1989FINNÄS, Leif. How can musical preferences be modified? A research review. Bulletin of the Council for Research in Music Education, Champaign, University of Illinois Press, n. 102, p. 1-58, 1989.), é possível perceber que são reconhecidas repercussões deste tipo sobretudo nas crianças, mas também nas famílias e mesmo nas professoras titulares.

Processos metodológicos

Procurar analisar os processos e resultados de projetos de intervenção na comunidade pode constituir-se como uma estratégia importante, no sentido de esclarecer as lógicas subjacentes aos projetos e às atividades desenvolvidas, assim como fornecer informações razoavelmente confiáveis, sobre méritos, potencialidades e fragilidades destes projetos específicos, que operam em circunstâncias também específicas (Newcomer; Hatry; Wholey, 2015NEWCOMER, Kathryn; HATRY, Harry; WHOLEY, Joseph S. (Ed.). Handbook of practical program evaluation. Hoboken: John Wiley & Sons, 2015.). No contexto da presente investigação, ancorada numa abordagem qualitativa (Patton, 2002PATTON, Michael Q. Qualitative Research & Evaluation Methods. Newbury Park, CA: Sage, 2002.), ao procurar perceber os efeitos que os projetos EaC e CICM tiveram sobre os diversos atores envolvidos, pretende-se, mais do que procurar resultados absolutos, perceber a sua validade ecológica, ou seja, a forma como, em cada contexto particular, produziram-se alguns resultados. O foco no acompanhamento dos processos nesta investigação permite, ainda, atender a questões de validade interna, identificando-se uma conexão causal que pode ser estabelecida entre os efeitos pretendidos e os efeitos obtidos pelos projetos, qual a extensão dessa relação, não descurando a identificação de efeitos não intencionais (bons ou maus) (Newcomer; Hatry; Wholey, 2015NEWCOMER, Kathryn; HATRY, Harry; WHOLEY, Joseph S. (Ed.). Handbook of practical program evaluation. Hoboken: John Wiley & Sons, 2015.).

No quadro de um paradigma interpretativo, reconhecendo a interdependência do sujeito e do objeto de conhecimento em ciências sociais, bem como a realidade como socialmente construída pelos participantes, a necessidade da compreensão dos significados das ações, assim como a perceção das emoções, significados e razões para as ações dos indivíduos que estão envolvidos num projeto de música com a comunidade (Langston; Barrett, 2008LANGSTON, Thomas W.; BARRETT, Margaret S. Capitalizing on community music: A case study of the manifestation of social capital in a community choir. Research studies in music education, v. 30, n. 2, p. 118-138, 2008.), optou-se inicialmente por métodos de pesquisa que permitissem descrever e não explicar, no sentido de identificar a forma como são construídos os significados pessoais e sociais (Silva, 2013SILVA, Eugénio. As metodologias qualitativas de investigação nas Ciências Sociais. Revista Angolana de Sociologia, n. 12, p. 77-99, 2013. Disponível em: https://journals.openedition.org/ras/740. Acesso em: 11 mar. 2021.
https://journals.openedition.org/ras/740...
; Aires, 2015AIRES, Luísa. Paradigma qualitativo e práticas de investigação educacional. Porto: Universidade Aberta, 2015.). Neste contexto, a escolha recaiu sobre a realização de um estudo de caso múltiplo (Stake, 2013STAKE, Robert E. Multiple case study analysis. New York: Guilford Press, 2013.; Bond, 2015BOND, Vanessa. Sounds to share: The state of music education in three Reggio Emilia–inspired North American preschools. Journal of Research in Music Education, v. 62, n. 4, p. 462-484, 2015. Disponível em: https://doi.org/10.1177/0022429414555017. Acesso em: 05 jun. 2021.
https://doi.org/10.1177/0022429414555017...
). Cruzando-o com a observação etnográfica, procuraram-se aprofundar as perceções dos participantes sobre a experiência e o seu efeito percebido, criando oportunidades de escuta dos discursos e opiniões dos atores envolvidos através da organização de grupos de discussão focalizada (3 com crianças de cada escola e 1 com as crianças do CICM; 3 com professoras titulares de cada escola e um com os professores de música EaC/CICM) e de entrevistas (2, aos dois responsáveis do projeto). Pretendia-se conseguir, em vez da recolha de “evidências descontextualizadas” (Hamilton; Corbett-Whittier, 2012HAMILTON, Lorna; CORBETT-WHITTIER, Connie. Using case study in education research. Thousand Oaks: Sage Publications, 2012.), perceber melhor não só as caraterísticas dos contextos e comunidades, como também dos indivíduos e aprofundar a compreensão das situações, dos comportamentos e das atitudes em contextos reais (Morgan; Spanish, 1984MORGAN, David L.; SPANISH, Margaret T. Focus groups: A new tool for qualitative research. Qualitative sociology, v. 7, n. 3, p. 253-270, 1984.; Gondim, 2002GONDIM, Sónia. Grupos focais como técnica de investigação qualitativa: Desafios metodológicos. Paidéia, v. 12, n. 24, p. 149-161, 2002. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/paideia/v12n24/04. Acesso em: 05 set. 2021.
http://www.scielo.br/pdf/paideia/v12n24/...
). Posteriormente, uma vez recolhidos os dados, procedeu-se à sua análise. Optou-se pela análise temática, um método que permite identificar e organizar de forma sistemática as perceções sobre padrões de significado (temas) num conjunto de dados (Braun; Clarke, 2006BRAUN, Virginia; CLARKE, Victoria. Using thematic analysis in psychology. Qualitative research in psychology, v. 3, n. 2, p. 77-101, 2006. Disponível em: 10.1191/1478088706qp063oa. Acesso em: 05 jun. 2021.
https://doi.org/10.1191/1478088706qp063o...
; Braun; Clarke; Hayfield; Terry, 2012BRAUN, Virginia; CLARKE, Victoria; HAYFIELD, Nikki; TERRY, Gareth. Thematic analysis. In: LIAMPUTTONG, P. (Ed.). Handbook of Research Methods in Health Social Sciences, Singapore: Springer, 2012. p. 843-860.), temas esses considerados importantes em relação às questões de pesquisa exploradas (Braun; Clarke; Hayfield; Terry, 2012BRAUN, Virginia; CLARKE, Victoria; HAYFIELD, Nikki; TERRY, Gareth. Thematic analysis. In: LIAMPUTTONG, P. (Ed.). Handbook of Research Methods in Health Social Sciences, Singapore: Springer, 2012. p. 843-860.). Os temas que emergiram das narrativas recolhidas através das notas de campo, dos grupos focais e das entrevistas foram reunidos numa tentativa de se obter uma visão abrangente das diversas experiências recolhidas, procurando-se conseguir uma coerência ancorada na forma como os dados foram cuidadosamente analisados e articulados, entrelaçando-os com a teoria, no sentido de que esta articulação permitisse construir argumentos válidos para as opções a fazer dos temas (Aronson, 1995ARONSON, Jody. A pragmatic view of thematic analysis. The qualitative report, v. 2, n. 1, p. 1-3, 1995. Disponível em: https://nsuworks.nova.edu/tqr/vol2/iss1/3. Acesso em: 02 jun. 2021.
https://nsuworks.nova.edu/tqr/vol2/iss1/...
).

Efeitos das experiências educativas musicais nas crianças

Analisar os efeitos que os participantes nos projetos EaC e CICM reconhecem em si mesmos e/ou em outros atores implicados, através das perceções que eles têm sobre os processos desenvolvidos, mostrou-se, desde o início, uma tarefa complexa. Da análise dos dados surgiu clara a ideia de que muitos intervenientes tinham, não só, uma opinião a dar como também olhares muito particulares não só sobre o tipo de efeitos que reconheciam existir, como também reconheciam a existência desses efeitos em diferentes atores. No processo de triangulação das informações, surgiu como clara a necessidade de escutar o que cada um tinha a dizer (Santos, 2003SANTOS, Helena. A propósito dos públicos culturais: uma reflexão ilustrada para um caso português. Revista Crítica de Ciências Sociais, n. 67, p. 75-97, 2003.). Mostrou-se, assim, como um desafio conseguir entrelaçar os fios que compõem uma narrativa, como Braun e Clarke (2006)BRAUN, Virginia; CLARKE, Victoria. Using thematic analysis in psychology. Qualitative research in psychology, v. 3, n. 2, p. 77-101, 2006. Disponível em: 10.1191/1478088706qp063oa. Acesso em: 05 jun. 2021.
https://doi.org/10.1191/1478088706qp063o...
chamam a atenção, narrativa essa assumidamente construída por quem conta a história, por quem recolhe os temas e decide esculpir peças não reconhecidas de evidência narrativa e que são selecionadas, editadas e dispostas para desenhar a fronteira dos argumentos que se pretendem defender, mas que respeite as narrativas de cada ator, sem as atomizar, sem lhes retirar as intensões dos seus discursos.

De acordo com os dados analisados, percebeu-se que os efeitos dos projetos EaC e CICM surgem claramente como sendo mais significativos nas crianças, o que parece ser natural, uma vez que se trata de projetos de música coral infantil, cujos principais protagonistas são as crianças. De facto, os efeitos sobre estas são amplamente reconhecidos pelas próprias crianças, pelas professoras titulares, pelos músicos/as/formadores/as e pelos responsáveis do projeto. Os dados recolhidos indicam, assim, que os envolvidos nestes projetos reconhecem o valor da música como significativo. Reconhecem também, tal como Koopman (1997)KOOPMAN, Constantijn. Aims in music education: A conceptual study. Philosophy of Music Education Review, v. 5, n. 2, p. 63-79, 1997. defende, que todos devem ter a oportunidade de participar em atividades musicais e que as capacidades musicais podem ser desenvolvidas nas crianças através destas atividades. No entanto, também se consegue perceber, pela análise dos dados, que o tipo de efeitos que são reconhecidos varia de acordo com as perspetivas de cada ator.

No quadro síntese que se segue (Figura 1) é possível observar os efeitos que os diferentes participantes reconhecem que o projeto EaC teve nas crianças.

Figura 1
Projeto EaC.

Para as crianças, os efeitos que reconhecem em si mesmas são os efeitos musicais (Koopman, 2007KOOPMAN, Constantijn. Community music as music education: On the educational potential of community music. International Journal of Music Education, v. 25, n. 2, p. 151-163, 2007. Disponível em: https://doi.org/10.1177/0255761407079951. Acesso em: 15 nov. 2021.
https://doi.org/10.1177/0255761407079951...
) ou intramusicais (Finnäs, 1989FINNÄS, Leif. How can musical preferences be modified? A research review. Bulletin of the Council for Research in Music Education, Champaign, University of Illinois Press, n. 102, p. 1-58, 1989.). As crianças fazem referência ao facto de sentirem que o projeto, através de uma experiência que consideram divertida e de que gostam muito, permitiu-lhes um alargamento da sua cultura musical, pois conheceram novas músicas e aprenderam a gostar de músicas que não conheciam, a desenvolver capacidades de fruição musical:

– Já gostavas muito de música?

MEB/9: eu gosto muito mais agora…

– Por que é que gostas muito mais agora?

MEB/9: porque… por causa… (silencio e fica a pensar) […] eu não sei explicar (silêncio) […] eu aprendi novas músicas […] e porque gosto muito de ouvir músicas e cantar […] e aprendi novas músicas […].

Sentem também que conseguiram fazer aprendizagens musicais (aprenderam a cantar, melhoraram a sua postura em palco).

De acordo com os discursos produzidos no grupo focal com os/as músicos/as formadores/as do EaC e o responsável 1, este projeto teve efeitos musicais, contribuindo para o alargamento da cultura musical das crianças. Referem a melhoria da postura, da capacidade de memória, da coordenação motora e da participação espontânea no trabalho musical com qualidade/descoberta da música, o interesse em desenvolver competências musicais e a qualidade vocal. Mas, também, referem significativos efeitos ao nível do desenvolvimento sociocultural das crianças (contextualização do trabalho através de apresentações às comunidades, tornando-o mais significativo para as crianças e permitindo-lhas, igualmente, o contacto com um universo cultural diferente). Os/as músicos/as formadores/as, reconhecem, ainda, efeitos a nível pessoal, pela alegria e prazer que as crianças mostravam no contexto do trabalho do EaC.

As professoras titulares e a responsável 2 conseguem reconhecer sobretudo resultados nas crianças ao nível do seu desenvolvimento pessoal (melhoria da capacidade de concentração, autoconfiança, postura, capacidade de trabalho, responsabilidade, sucesso académico e desenvolvimento de competências socioemocionais). As professoras e a responsável 2, tal como Arslan (2014)ARSLAN, Asuman A. A Study into the Effects of Art Education on Children at the Socialisation Process. Procedia-Social and Behavioral Sciences, n. 116, p. 4114-4118, 2014. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.sbspro.2014.01.900. Acesso em: 05 jun. 2021.
https://doi.org/10.1016/j.sbspro.2014.01...
, consideram que esse tipo de experiências musicais contribuiu para as crianças se desenvolverem de forma positiva, tanto academicamente como na sua vida social, por meio do desenvolvimento de competências de disciplina e responsabilidade através do compromisso estabelecido com o trabalho no coro. Mas as professoras titulares também reconhecem efeitos a nível musical, afirmando que o projeto EaC contribuiu para o alargamento da cultura musical das crianças, efeitos também amplamente referidos por diversos autores como Calvi, Souza e Santini (2009)CALVI, Juan; SOUZA, Rosali; SANTINI, Rose. A organização do consumo de música na internet através da classificação do gosto cultural: estudo de caso do sistema de recomendação last.fm. In: CONGRESO ISKO-ESPAÑA, 9., 2009, Valencia. Actas [...]. Valencia, 2009. P. 663-675. Disponível em: https://dialnet.unirioja.es/servlet/articulo?codigo=2924551. Acesso em: 05 jun. 2021.
https://dialnet.unirioja.es/servlet/arti...
e Bourdieu (2010)BOURDIEU, Pierre. A distinção: uma crítica social da faculdade do juízo. Coimbra: Edições 70, 2010., assim como para o desenvolvimento da capacidade de fruição musical, aspeto também reconhecido por Swanwick e Lawson (1999)SWANWICK, Keith; LAWSON, Doroty. “Authentic” Music and its Effect on the Attitudes and Musical Development of Secondary School Students. Music Education Research, v. 1, n. 1, p. 47-60, 1999. Disponível em: https://doi.org/10.1080/1461380990010105. Acesso em: 12 nov. 2021.
https://doi.org/10.1080/1461380990010105...
.

O que parece ser comum a todos os atores é que reconhecem muito menos reflexos do projeto nas crianças ao nível do desenvolvimento de competências sociais, sendo as crianças as que mais destacam o trabalho em equipa e colaborativo (embora as professoras também refiram este aspeto).

No que diz respeito aos efeitos que os participantes reconhecem nas crianças, no contexto do projeto CICM, é possível perceber que se trata, sobretudo, de efeitos não musicais, a nível do desenvolvimento pessoal, embora também se perceba que há reconhecimento de efeitos ao nível do desenvolvimento sociocultural e mesmo, embora em menor número, de efeitos musicais.

Figura 2
CICM.

No que diz respeito ao projeto CICM, as crianças também reconhecem que se trata de uma experiência muito positiva, referindo esta participação no projeto de uma forma muito emocional, falando da realização de um sonho, de como se sentem felizes e valorizando o prazer e a brincadeira que experimentam no projeto. Referem, nos seus discursos, amplos e diversos efeitos do projeto nelas próprias, quer ao nível do seu desenvolvimento pessoal (um espaço de descobertas de realização pessoal, crescimento, de bem-estar, aprendizagens), assim como a sensação de realização pessoal, transformação, conquistas, de desenvolvimento da capacidade de expressão pessoal e de inteligência, permitindo-lhas desenvolver uma sensação de realização, orgulho e autoconfiança e respeito por si próprias

FCICM/11: Cantar traz-me felicidade […] e o arco-íris. Quer dizer que são várias cores e que cada cor… é um sentimento pronto, e eu sinto sentimentos quando estou a cantar […] e são bons!

Isto sobretudo nos momentos de apresentação perante um público. O facto de estas crianças se apresentarem numa sala de espetáculos conceituada, perante públicos que não conhecem, mas de que também fazem parte as suas famílias, tem, claramente, nos seus discursos, um efeito muito forte, revelando que se sentiram nervosos, mas que as suas famílias valorizaram as suas performances:

MCICM/11 M.: eu acho que as coisas correram melhor no concerto do que nos ensaios porque era a pressão do público.

FCICM/10.: sim porque no War Requiem era nossa experiência, a nossa primeira vez, não é? [...] mas era uma coisa mais séria e como era a primeira vez eu acho que estava mais nervosa […] agora acho que já estava mais à vontade, não sei […] FCICM/9.: uma coisa que eu fiquei muito admirada é que eu já sabia que a minha mãe ia mais bonita do que o costume, mas não sabia que o meu pai ia de fato… MCICM/10.: foi mais […] acho que foi mais fácil! [...] porque não estávamos nervosos […], mas o […] nervosismo às vezes faz […] ficarmos no sítio certo e […] cantar bem […].

FCICM/10.: eu acho que eu estive nervosa igual […] só que acho que nós não reparamos, mas para nós foi muito mais fácil este! O meu pai diz que sentiu imensa evolução desde o nosso 1º concerto até agora! Está muito melhor… FCICM/9: a minha avó disse-me assim: aí estavas muito bonita!!! O meu pai disse: Parabéns filha! e eu disse ao meu pai: pai gostaste? Sim gostei e muito, muito.

Reconhecem, também, alguns efeitos ao nível do seu desenvolvimento sociocultural. Porque a sua experiência de trabalho no CICM lhes permitiu conseguir melhores níveis de coordenação e partilha de emoções entre as crianças deste coro, tal como afirmam Kirschner e Tomasello (2010)KIRSCHNER, Sebastian; TOMASELLO, Michael. Joint music making promotes prosocial behavior in 4-year-old children. Evolution and Human Behavior, v. 31, n. 5, p. 354-364, 2010. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.evolhumbehav.2010.04.004 Acesso em: 22 set. 2021.
https://doi.org/10.1016/j.evolhumbehav.2...
, permitiu também o desenvolvimento de relações de amizade. Através do projeto afirmam ter conseguido conhecer pessoas, fazerem amigos com os quais sentem o que Barrett e Smigiel (2007)BARRETT, Margaret S.; SMIGIEL, Heather M. Children's perspectives of participation in music youth arts settings: Meaning, value and participation. Research Studies in Music Education, v. 28, n. 1, p. 39-50, 2007. Disponível em: https://doi.org/10.1177/1321103X070280010204. Acesso em: 05 jun. 2021.
https://doi.org/10.1177/1321103X07028001...
chamam unidade de propósito, uma vez que as crianças referem a perceção de um amor semelhante entre elas e um compromisso com a música. Reconhecem, ainda, que o projeto lhes poderá permitir conhecer o mundo e constatam o alargamento da sua experiência do coro a outros contextos das suas vidas.

FCICM/10: Acho que esta experiência nos permite conhecer o mundo…

FCICM/11: senti que nós, com o coro infantil, cantando vamos conhecer mais pessoas, turistas…

Por fim, também há referências ao desenvolvimento de competências musicais (competências especificamente musicais e interesse pela música), mas como sendo um tipo de efeito que sentem ter menos relevância para elas, no contexto do trabalho que fazem no CICM.

Ambos os responsáveis 1 e 2 reconhecem que se trata de um projeto exigente que implica grande responsabilização, dedicação e compromisso por parte das crianças. A responsável 2 chama a atenção sobretudo para os reflexos que o projeto CICM tem nas crianças ao nível do desenvolvimento pessoal, visível na capacidade que foram demostrando de adaptação às exigências do projeto, no desenvolvimento de relações afetivas entre as crianças, assim como na capacidade de acolher e integrar novos membros do CICM, tal como afirmado por Dickens e Douglas (2013)DICKENS, Luke; DOUGLAS, Lonie. Rap, rhythm and recognition: Lyrical practices and the politics of voice on a community music project for young people experiencing challenging circumstances. Emotion, Space and Society, n. 9, p. 59-71, 2013. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.emospa.2012.11.003. Acesso em: 05 ago. 2021.
https://doi.org/10.1016/j.emospa.2012.11...
e por Dakon e Cloete (2018)DAKON, Jacob M.; CLOETE, Elene. The Violet experience: Social interaction through eclectic music learning practices. British Journal of Music Education, v. 35, n. 1, p. 57-72, 2018. Disponível em: https://doi.org/10.1017/S0265051717000122. Acesso em: 05 ago. 2021.
https://doi.org/10.1017/S026505171700012...
. No entanto, consideram que se verificaram repercussões importantes ao nível sociocultural sobretudo pelo contacto com um universo cultural diferente, trabalho de equipa e um orgulho em pertencer a este projeto e pelo contacto que o projeto proporcionou com um universo cultural diferente, assim como, na sua opinião, também a nível musical (desenvolvimento musical, orgulho nas aprendizagens musicais conseguidas), uma vez que as crianças claramente desenvolveram competências musicais na sua experiência no CICM, efeito também referido por Swanwick e Lawson (1999)SWANWICK, Keith; LAWSON, Doroty. “Authentic” Music and its Effect on the Attitudes and Musical Development of Secondary School Students. Music Education Research, v. 1, n. 1, p. 47-60, 1999. Disponível em: https://doi.org/10.1080/1461380990010105. Acesso em: 12 nov. 2021.
https://doi.org/10.1080/1461380990010105...
em relação a experiências deste tipo de projetos. Os/as músicos/as formadores/as olham esta questão de um ângulo diferente dos restantes atores. Falam mais em expectativas futuras que têm sobre os impactos do projeto nas crianças e, a este nível, referem expectativas a nível do desenvolvimento pessoal das crianças, esperando que esta seja uma experiência que elas recordem como positiva; uma semente ao nível do desenvolvimento da capacidade de trabalho de equipa, sensibilidades, capacidade de escuta e crescimento pessoal que contribua para desenvolver a capacidade de fruição musical das crianças. Os/as músicos/as formadores/as referem ainda sentir preocupações no que diz respeito à forma como o projeto CICM se está a desenvolver. Afirmam que este projeto poderá ter efeitos positivos a nível pessoal sobretudo se houver no trabalho uma preocupação de que se consiga um equilíbrio entre a exigência de qualidade dos produtos e da qualidade dos processos. Percebendo a necessidade de visibilidade do projeto como uma questão fundamental, temem que possa existir uma dificuldade de articular os objetivos de um projeto comunitário com a expectativa de criação rápida de um coro de nível profissional, embora reconheçam que estes riscos estão a ser acautelados. Isto porque consideram fundamental fazer com que as crianças “sejam de facto protagonistas dos processos, sem ignorar a qualidade dos produtos desenvolvidos” (Guimarães; Neves, 2013, p. 156GUIMARÃES, Joana; NEVES, Tiago. A comunidade dança?: reflexão sobre projetos de intervenção artística em contextos rurais. Educação, Sociedade & Cultura, n. 40, p. 147-163, 2013. Disponível em: https://www.fpce.up.pt/ciie/sites/default/files/ESC40_J_Guimaraes_T_Neves.pdf. Acesso em: 22 set. 2021.
https://www.fpce.up.pt/ciie/sites/defaul...
). Mostram ainda preocupações de que se possa verificar a utilização do projeto comunitário como instrumento de promoção de uma instituição poderosa, afirmando que é necessário ter uma atitude de vigilância crítica no acompanhamento e desenvolvimento do projeto.

Efetivamente, ao olhar para os dados relativos à forma como as crianças do EaC e do CICM se referem às suas preferências musicais ou como analisam e descrevem a razão do gostarem mais ou menos de determinados tipos de músicas, percebe-se que a forma como o fazem é diferente nestes dois contextos. Estas, de forma geral, reconhecem que a experiência de coro (no EaC ou no CICM) lhes proporcionou uma possibilidade de contacto com músicas novas, o que lhes permitiu maior prazer na fruição musical. Sobretudo no que diz respeito ao CICM, pode-se notar um alargamento do leque dos consumos musicais ou mesmo uma mudança nestes consumos. Nota-se que existe uma clara diferença entre a forma como as crianças dos dois contextos definem o seu gosto musical, o que entendem por boa música e também sobre o impacto que o trabalho teve nos seus consumos musicais. No entanto, há aspetos diferentes que poderão ser significativos.

Figura 3
Diferenças entre os projetos: desenvolvimento do gosto e juízo de gosto.

No EaC, os critérios utilizados são, por um lado, os efeitos que a música tem sobre as próprias crianças, tal como afirmam Soley e Spelk, (2016)SOLEY, Gaye; SPELKE, Elizabeth S. Shared cultural knowledge: Effects of music on young children’s social preferences. Cognition, n. 148, p. 106-116, 2016. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.cognition.2015.09.017. Acesso em: 11 nov. 2021.
https://doi.org/10.1016/j.cognition.2015...
, que implicam ação e que têm qualidades emocionais, embora também reconheçam a importância de qualidades musicais com bom som, boa letra, bem cantada e com harmonia.

MEA/7: […] hum [...] é uma música que calma […] (mexendo os dedos com um ar pensativo) […]

FEA/10: uma música que nós gostamos?

FEB/9: sentimento […] alegria […]

MEC/10: tem de ser divertida!

FEB/10: é uma música que […] que não foi criada para […] para ser famosa […]

MEB/9: foi criada com sentimento!

FEB/6: isso!! [...] uma música boa não é criada para ter fama é para ter sentimento […].

É importante salientar que, em relação a este projeto, nas afirmações que fazem parecem existir diferenças nos consumos musicais entre as crianças. Como North e Hargreaves (1997)NORTH, Adrien; HARGREAVES, David. Liking, arousal potential, and the emotions expressed by music. Scandinavian journal of psychology, v. 38, n. 1, p. 45-53, 1997. afirmam, aliás, as crianças não são consumidoras passivas, pensam, julgam, opinam e fazem valer critérios de valor. Assim percebe-se que, apesar de os consumos musicais serem bastante diversos de escola para escola, os seus gosto e juízos de gosto parecem confirmar preconceitos vigentes na sociedade no que diz respeito a questões de género, pertenças socioculturais e geracionais (Finnäs, 1989FINNÄS, Leif. How can musical preferences be modified? A research review. Bulletin of the Council for Research in Music Education, Champaign, University of Illinois Press, n. 102, p. 1-58, 1989.; Dobrota; Ercegovac, 2017DOBROTA, Snježana; ERCEGOVAC, Ina. Music preferences with regard to music education, informal influences and familiarity of music amongst young people in Croatia. British Journal of Music Education, v. 34, n. 1, p. 41-55, 2017. Disponível em: https://doi.org/10.1017/S0265051716000358. Acesso em: 05 ago. 2021.
https://doi.org/10.1017/S026505171600035...
; Arriaga-Sanz et al., 2017ARRIAGA-SANZ, Cristina et al. Songs are taught, songs are learnt: musical preferences in early childhood. Music Education Research, v. 19, n. 3, p. 309-326, 2017. Disponível em: https://doi.org/10.1080/14613808.2016.1214694. Acesso em: 02 jun. 2021.
https://doi.org/10.1080/14613808.2016.12...
). Na escola A as crianças utilizam, na sua definição de boa música, conceitos como estilos de música, instrumentos utilizados, harmonia, inspiração, os consumos musicais que dizem ter são jazz, música eletrónica, metal, rock e músicas cantadas no coro. Nas escolas B e C as crianças valorizam, na definição de boa música, conceitos mais pessoais, como o facto de não ser criada só para o sucesso, mas sim ter sentimento, dar alegria, ser divertida, dar vontade de dançar, ter uma boa letra e ser bem interpretada. Referem consumir sobretudo músicas pop/funk da moda, mas também músicas cantadas no coro. Isto pode levar a pensar que, uma vez que se trata de grupos de crianças provenientes de meios socioculturais diferentes (a escola A tem uma população mais próxima da classe média e há referências a ouvir música com as famílias, enquanto que nas outras duas escolas predominam crianças provenientes de estratos socioculturais mais baixos), o efeito na alteração do tipo de consumo musical das crianças poderá ter sido maior quando o contato prévio com outros tipos de música já acontecia nos seus meios culturais de origem. As crianças das escolas B e C têm um consumo de estilos musicais mais restrito, muito mais ligado a um tipo de música comercial e de acesso através dos meios de comunicação. No entanto, em todos os grupos se verifica que as músicas que trabalham no contexto do coro passaram a fazer parte das músicas de que gostam de ouvir, alargando o leque de estilos musicais. No CICM, as crianças utilizam critérios de qualidade também emocionais e de qualidade musical, embora os conceitos utilizados mostrem o contacto com um universo musical diferente do primeiro: falam de qualidades emocionais da música como energia, felicidade, carga dramática e conforto e em qualidades musicais como a sonoridade e movimento das músicas.

O contacto com as músicas e os contextos em que são escutadas parecem, de facto, influenciar o gosto e o juízo de gosto, tal como Finnäs (1989)FINNÄS, Leif. How can musical preferences be modified? A research review. Bulletin of the Council for Research in Music Education, Champaign, University of Illinois Press, n. 102, p. 1-58, 1989. refere. No CICM, as crianças referem gostar de um conjunto de autores e obras com que estiveram em contacto durante o trabalho no projeto, de que falam com clara familiaridade, explicando de forma natural porque gostam e de que é que gostam nas obras de que falam. Sobre o gosto musical, as crianças do CICM fazem referências a um reportório claramente erudito que reflete muito as obras e os compositores trabalhados durante o primeiro ano de trabalho do coro.

FCICM/9: eu gosto muito do Old Abram Brown (Benjamin Britten), porque há uma parte em que nós podemos cantar muito alto, que nós podemos cantar assim forte, eu gosto muito! Sinto-me muito confortável.

MCICM/9: a que eu gosto mais é do War Requiem (Benjamin Britten), porque é mais dramático!

É possível perceber, através da forma como se exprimem, que são crianças com uma boa capacidade de análise do seu gosto musical, explicando de forma clara por que é que gostam de cada música, analisando a sonoridade das composições, a energia e os sentimentos que transmitem. O facto de o trabalho do CICM consistir muito no desenvolvimento de competências musicais, e especificamente corais, mas não deixando de trabalhar as questões ligadas à cultura musical, poderá, eventualmente, contribuir para se perceber a forma como as crianças conseguem mobilizar autores e obras de forma natural e também analisar o seu gosto por algumas músicas. De facto, diversos autores, como Finnäs (1989)FINNÄS, Leif. How can musical preferences be modified? A research review. Bulletin of the Council for Research in Music Education, Champaign, University of Illinois Press, n. 102, p. 1-58, 1989., Carper (2001)CARPER, Kenneth. The effects of repeated exposure and instructional activities on the least preferred of four culturally diverse musical styles with kindergarten and pre-k children. Bulletin of the Council for Research in Music Education, Champaign, University of Illinois Press, n. 151, p. 41-50, 2001., McKoy (2002)MCKOY, Constance. L. A review of research on instructional approach and world music preference. Update: Applications of Research in Music Education, v. 22, n. 1, p. 36-43, 2002. e Arriaga-Sanz et al. (2017)ARRIAGA-SANZ, Cristina et al. Songs are taught, songs are learnt: musical preferences in early childhood. Music Education Research, v. 19, n. 3, p. 309-326, 2017. Disponível em: https://doi.org/10.1080/14613808.2016.1214694. Acesso em: 02 jun. 2021.
https://doi.org/10.1080/14613808.2016.12...
reconhecem uma ligação entre o trabalho de competências musicais e o desenvolvimento do gosto e do juízo de gosto.

O que parece ser possível perceber, analisando as questões do gosto e do juízo de gosto em ambos os projetos, é que tudo leva a crer que ambos contribuíram (à sua maneira, com diferentes intensidades, de acordo com cada contexto) para um alargamento da cultura musical das crianças. As crianças não deixaram de considerar as suas referências musicais anteriores, mas acrescentaram outras diferentes. Isto parece apoiar a ideia de que, de facto, as preferências emergem de várias fontes e não só da exposição e da sensibilidade auditiva, mas também das condições socioculturais, e até mesmo a personalidade de cada ouvinte, variando entre diferentes populações de acordo com hábitos social e culturalmente condicionados (Finnäs, 1989FINNÄS, Leif. How can musical preferences be modified? A research review. Bulletin of the Council for Research in Music Education, Champaign, University of Illinois Press, n. 102, p. 1-58, 1989.), mas que também, como Jucan e Simion (2015, p. 621)JUCAN, Dana; SIMION, Anca. Music Background in the Classroom: Its Role in the Development of Social-emotional Competence in Preschool Children. Procedia-Social and Behavioral Sciences, n. 180, p. 620-626, 2015. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.sbspro.2015.02.169. Acesso em: 22 set. 2021.
https://doi.org/10.1016/j.sbspro.2015.02...
defendem, “[...] o prazer da música é adquirido e não inato, [...] música pode ser aprendida e pode-se passar a apreciar géneros que inicialmente não eram entendidos”, permitindo certo desenvolvimento de algum “bilinguismo cultural” nas crianças envolvidas (Stoer; Cortesão, 1999STOER, Stephen; CORTESÃO, Luiza. Levantando a Pedra. Porto: Edições Afrontamento, 1999.). De facto, mais do que trabalhar o gosto, enquanto perceção e apreciação estéticas, nestes projetos parece conseguir-se alguma (consciência de) autonomia social em frações de grupos sociais (Santos, 2003SANTOS, Helena. A propósito dos públicos culturais: uma reflexão ilustrada para um caso português. Revista Crítica de Ciências Sociais, n. 67, p. 75-97, 2003.).

Considerações finais

De acordo com a análise realizada, é possível afirmar que estes dois projetos conseguiram, pelo menos parcialmente e em alguns dos envolvidos (crianças e algumas famílias), criar o que Teixeira Lopes designa de regimes de familiaridade, essenciais para a transformação das práticas e a construção de novos comportamentos. Estes projetos contribuíram para construir novas formas de relação com a música, com efeitos nos esquemas cognitivos de perceção e de classificação que estão na base da produção das identidades (Lopes, 2009, p. 10LOPES, João Teixeira. Da democratização da Cultura a um conceito e prática alternativos de Democracia Cultural. Saber & Educar, v. 14, 2009. Disponível em: http://dx.doi.org/10.17346/se.vol14.121. Acesso em: 15 nov. 2021.
http://dx.doi.org/10.17346/se.vol14.121...
), mais diretamente nas crianças, mas também nos adultos envolvidos. Isto é, estes projetos parecem estar a contribuir para democratizar o acesso a uma cultura legítima e a um bem cultural legítimo (Bourdieu, 2010BOURDIEU, Pierre. A distinção: uma crítica social da faculdade do juízo. Coimbra: Edições 70, 2010.), que é a música, através do alargamento da educação musical. Isto, embora se reconheça que os projetos apresentam alguns desencontros socioculturais entre artistas e destinatários dos projetos, desencontros esses que devem ser reconhecidos e cuidados no sentido de conseguir uma maior adequação às características específicas, às competências e às expetativas das crianças e adultos nos projetos. Reconhece-se também, e isto sobretudo no caso do CICM, uma necessária reflexão crítica sobre interesses e dificuldades de compatibilização entre a missão artística dos agentes e instituições culturais e as missões sociais e cívicas em que se envolvem (Ferreira, 2015, p. 55FERREIRA, Claudino. O envolvimento cultural comunitário. CesContexto, Coimbra, n. 12, p. 48-56, 2015.).

Esta é provavelmente uma das grandes contribuições que projetos como o EaC e o CICM podem trazer. Trata-se de projetos que fazem uma intervenção musical comunitária com crianças e que se constituem como espaços de contacto de crianças com outros universos musicais. A principal missão deste tipo de trabalho será a de contribuir para alargar o leque do universo musical e cultural dos envolvidos, sendo que alargar significa sempre a ideia de abrir horizontes, de fazer o que Freire (2018)FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 3º ed. Porto: Edição Afrontamento, 2018. designa como síntese cultural. Trata-se, portanto da aquisição de um bilinguismo cultural (Stoer; Cortesão, 1999STOER, Stephen; CORTESÃO, Luiza. Levantando a Pedra. Porto: Edições Afrontamento, 1999.), de uma prática emancipatória que, partindo das (e respeitando as) caraterísticas de grupos sociais específicos, possa estabelecer pontes e potenciar um diálogo crítico entre diferentes universos culturais, neste caso os saberes musicais dos profissionais de música e os da comunidade. Assim, parecem ser projetos que estão a favorecer o desenvolvimento pessoal e social e as competências artísticas musicais das crianças participantes, assim como promover, nas crianças participantes, novas visões da música e o gosto em fruir e participar em práticas musicais. Mas este tipo de intervenção terá sempre de contribuir para que, de facto, haja transformação. O contacto de uma instituição cultural poderosa, como é a Casa da Música, não poderá representar nunca a alienação das culturas das comunidades com que trabalha. No entanto, o respeito por essas culturas tão pouco poderá significar que as populações com que se trabalha, porque pertencentes a um universo cultural específico, com consumos e gostos musicais próprios, não tenham o direito de fruir a sua música, e de também contactar e conhecer outros universos culturais, aos quais, provavelmente, sem este tipo de projetos não teriam acesso. Reconhecendo as comunidades como espaços plurais de inevitável coesão e conflito (Ferreira; Coimbra; Menezes, 2012FERREIRA, Pedro; COIMBRA, Joaquim; MENEZES, Isabel. “Diversity within diversity”- exploring connections between community, participation and citizenship. JSSE-Journal of Social Science Education, v. 11, n. 3, p. 120-134, 2012. Disponível em: https://doi.org/10.4119/jsse-616. Acesso em: 05 ago. 2021.
https://doi.org/10.4119/jsse-616...
), percebe-se que a agenda destes projetos mobiliza intencionalmente essa diversidade na construção cooperativa, entre iguais, de algo novo (Matarasso, 2019MATARASSO, François. A Restless Art: How participation won, and why it matters. London: Calouste Gulbenkian Foundation, 2019.). Ao ficar-se limitado ao já conhecido, se apenas se der espaço para o gosto do mercado, sem o questionar, se não se promover a abertura de novos canais de fruição e expressão para adultos e crianças, como Ostetto (2004, p. 16)OSTETTO, Luciana E. Mas as crianças gostam!” Ou sobre gostos e repertórios musicais. Luciana In: OSTETTO, Luciana E.; LEITE, Maria Isabel. Arte, infância e formação de professores: autoria e transgressão. Campinas: Papirus, 2004. P. 41-60. afirma, tudo permanecerá no mesmo lugar e a existência deste tipo de projetos não será nunca significativa2 2 Este estudo foi apoiado por fundos nacionais através da FCT – Fundação para a Ciência e a Tecnologia, I.P., no âmbito do Financiamento Plurianual do Centro de Investigação e Intervenção Educativas (CIIE) 2020-2023 (projetos com as referências UIDB/00167/2020 e UIDP/00167/2020). .

Nota

  • 1
    A Casa da Música é um equipamento cultural dedicado exclusivamente à música, criado no contexto da Porto 2001 Capital Europeia da Cultura. É um dos principais projetos que a Porto 2001 deixou à cidade e ao país, inaugurada a 15 de abril de 2005. Em janeiro de 2006 instituiu-se a Fundação Casa da Música, tendo como entidades fundadoras o Estado Português, o Município do Porto, a Grande Área Metropolitana do Porto e 38 entidades de direito privado (Ramalho, 2012RAMALHO, Joana L. O papel da cultura na produção de cidade: a Casa da Música no Porto. 2012. Tese (Doutorado em Ciências Sociais) – Instituto de Ciências Sociais, Universidade de Lisboa, Lisboa, 2012.).
  • 2
    Este estudo foi apoiado por fundos nacionais através da FCT – Fundação para a Ciência e a Tecnologia, I.P., no âmbito do Financiamento Plurianual do Centro de Investigação e Intervenção Educativas (CIIE) 2020-2023 (projetos com as referências UIDB/00167/2020 e UIDP/00167/2020).
  • Este texto inédito também se encontra publicado em inglês neste número do periódico.

Referências

  • AIRES, Luísa. Paradigma qualitativo e práticas de investigação educacional Porto: Universidade Aberta, 2015.
  • ALPERT, Judith. The effect of disc jockey, peer, and music teacher approval of music on music selection and preference. Journal of Research in Music Education, v. 30, n. 3, p. 173-186, 1982.
  • ANVARI, Sima; TRAINOR, Laurel; WOODSIDE, Jennifer; LEVY, Betty. Relations among musical skills, phonological processing, and early reading ability in preschool children. Journal of experimental child psychology, v. 83, n. 2, p. 111-130, 2002.
  • ARONSON, Jody. A pragmatic view of thematic analysis. The qualitative report, v. 2, n. 1, p. 1-3, 1995. Disponível em: https://nsuworks.nova.edu/tqr/vol2/iss1/3 Acesso em: 02 jun. 2021.
    » https://nsuworks.nova.edu/tqr/vol2/iss1/3
  • ARRIAGA-SANZ, Cristina et al. Songs are taught, songs are learnt: musical preferences in early childhood. Music Education Research, v. 19, n. 3, p. 309-326, 2017. Disponível em: https://doi.org/10.1080/14613808.2016.1214694 Acesso em: 02 jun. 2021.
    » https://doi.org/10.1080/14613808.2016.1214694
  • ARSLAN, Asuman A. A Study into the Effects of Art Education on Children at the Socialisation Process. Procedia-Social and Behavioral Sciences, n. 116, p. 4114-4118, 2014. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.sbspro.2014.01.900 Acesso em: 05 jun. 2021.
    » https://doi.org/10.1016/j.sbspro.2014.01.900
  • AZIZINEZHAD, Masoud; HASHEMI, Masoud; DARVISHI, Sohrab. Music as an education-related service to promote learning and skills acquisition. Procedia-Social and Behavioral Sciences, n. 93, p. 142-145, 2013. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.sbspro.2013.09.167 Acesso em: 05 jun. 2021.
    » https://doi.org/10.1016/j.sbspro.2013.09.167
  • BARRETT, Margaret S.; SMIGIEL, Heather M. Children's perspectives of participation in music youth arts settings: Meaning, value and participation. Research Studies in Music Education, v. 28, n. 1, p. 39-50, 2007. Disponível em: https://doi.org/10.1177/1321103X070280010204 Acesso em: 05 jun. 2021.
    » https://doi.org/10.1177/1321103X070280010204
  • BARTLEET, Brydie-Leigh; HIGGINS, Lee. Introduction: An Overview of Community Music in the Twenty-First Century. In: BARTLEET, Brydie-Leigh; HIGGINS, Lee (Ed.). The Oxford Handbook of Community Music Oxford: Oxford University Press, 2018. P. 1-20.
  • BOAL-PALHEIROS, Graça. Som da Rua, um projecto musical de intervenção social. In: CONGRESSO INTERNACIONAL PEDAGOGIA SOCIAL, 27., 2014, Porto. Anais [...] Porto: Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico do Porto, 2014. P. 378-385.
  • BOND, Vanessa. Sounds to share: The state of music education in three Reggio Emilia–inspired North American preschools. Journal of Research in Music Education, v. 62, n. 4, p. 462-484, 2015. Disponível em: https://doi.org/10.1177/0022429414555017 Acesso em: 05 jun. 2021.
    » https://doi.org/10.1177/0022429414555017
  • BOURDIEU, Pierre. A distinção: uma crítica social da faculdade do juízo. Coimbra: Edições 70, 2010.
  • BRAUN, Virginia; CLARKE, Victoria. Using thematic analysis in psychology. Qualitative research in psychology, v. 3, n. 2, p. 77-101, 2006. Disponível em: 10.1191/1478088706qp063oa. Acesso em: 05 jun. 2021.
    » https://doi.org/10.1191/1478088706qp063oa
  • BRAUN, Virginia; CLARKE, Victoria; HAYFIELD, Nikki; TERRY, Gareth. Thematic analysis. In: LIAMPUTTONG, P. (Ed.). Handbook of Research Methods in Health Social Sciences, Singapore: Springer, 2012. p. 843-860.
  • CALVI, Juan; SOUZA, Rosali; SANTINI, Rose. A organização do consumo de música na internet através da classificação do gosto cultural: estudo de caso do sistema de recomendação last.fm. In: CONGRESO ISKO-ESPAÑA, 9., 2009, Valencia. Actas [...] Valencia, 2009. P. 663-675. Disponível em: https://dialnet.unirioja.es/servlet/articulo?codigo=2924551 Acesso em: 05 jun. 2021.
    » https://dialnet.unirioja.es/servlet/articulo?codigo=2924551
  • CAMARA, Aintzane. El canto colectivo en la escuela: una vía para la socialización y el bienestar personal. Revista de Psicodidáctica, n. 15-16, p. 105-110, 2003. Disponível em: https://dialnet.unirioja.es/servlet/articulo?codigo=853037 Acesso em: 05 jun. 2021.
    » https://dialnet.unirioja.es/servlet/articulo?codigo=853037
  • CARMINATTI, Juliana; KRUG, Jeferson. A prática de canto coral e o desenvolvimento de habilidades sociais. Pensamiento psicológico, v. 7, n. 14, p. 81-96, 2010. Disponível em: https://dialnet.unirioja.es/descarga/articulo/3265166.pdf Acesso em: 05 ago. 2021.
    » https://dialnet.unirioja.es/descarga/articulo/3265166.pdf
  • CARPER, Kenneth. The effects of repeated exposure and instructional activities on the least preferred of four culturally diverse musical styles with kindergarten and pre-k children. Bulletin of the Council for Research in Music Education, Champaign, University of Illinois Press, n. 151, p. 41-50, 2001.
  • DAKON, Jacob M.; CLOETE, Elene. The Violet experience: Social interaction through eclectic music learning practices. British Journal of Music Education, v. 35, n. 1, p. 57-72, 2018. Disponível em: https://doi.org/10.1017/S0265051717000122 Acesso em: 05 ago. 2021.
    » https://doi.org/10.1017/S0265051717000122
  • DICKENS, Luke; DOUGLAS, Lonie. Rap, rhythm and recognition: Lyrical practices and the politics of voice on a community music project for young people experiencing challenging circumstances. Emotion, Space and Society, n. 9, p. 59-71, 2013. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.emospa.2012.11.003 Acesso em: 05 ago. 2021.
    » https://doi.org/10.1016/j.emospa.2012.11.003
  • DOBROTA, Snježana; ERCEGOVAC, Ina. Music preferences with regard to music education, informal influences and familiarity of music amongst young people in Croatia. British Journal of Music Education, v. 34, n. 1, p. 41-55, 2017. Disponível em: https://doi.org/10.1017/S0265051716000358 Acesso em: 05 ago. 2021.
    » https://doi.org/10.1017/S0265051716000358
  • FABIANO, Luís; SILVA, Franciele. Massificação cultural, práticas educativas e autonomia social. Revista Diálogo Educacional, Curitiba, v. 12, n. 37, p. 1065-1084, 2012. Disponível em: https://periodicos.pucpr.br/index.php/dialogoeducacional/article/view/4900 Acesso em: 05 ago. 2021.
    » https://periodicos.pucpr.br/index.php/dialogoeducacional/article/view/4900
  • FERREIRA, Claudino. O envolvimento cultural comunitário. CesContexto, Coimbra, n. 12, p. 48-56, 2015.
  • FERREIRA, Pedro; COIMBRA, Joaquim; MENEZES, Isabel. “Diversity within diversity”- exploring connections between community, participation and citizenship. JSSE-Journal of Social Science Education, v. 11, n. 3, p. 120-134, 2012. Disponível em: https://doi.org/10.4119/jsse-616 Acesso em: 05 ago. 2021.
    » https://doi.org/10.4119/jsse-616
  • FINNÄS, Leif. How can musical preferences be modified? A research review. Bulletin of the Council for Research in Music Education, Champaign, University of Illinois Press, n. 102, p. 1-58, 1989.
  • FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido 3º ed. Porto: Edição Afrontamento, 2018.
  • FUNG, Victor; LEE, Ming; CHUNG, Ester. Music style preferences of young students in Hong Kong. Bulletin of the Council for Research in Music Education, Champaign, University of Illinois Press, n. 153, p. 50-64, 1999.
  • GREER, R. Douglas; DOROW, Laura; RANDALL, Andrew. Music listening preferences of elementary school children. Journal of Research in Music Education, v. 22, n. 4, p. 284-291, 1974. Disponível em: https://doi.org/10.2307/3344766 Acesso em: 05 set. 2021.
    » https://doi.org/10.2307/3344766
  • GONDIM, Sónia. Grupos focais como técnica de investigação qualitativa: Desafios metodológicos. Paidéia, v. 12, n. 24, p. 149-161, 2002. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/paideia/v12n24/04 Acesso em: 05 set. 2021.
    » http://www.scielo.br/pdf/paideia/v12n24/04
  • GUERRA, Paula. Da exclusão social à inclusão social: eixos de uma mudança paradigmática. Revista Angolana de Sociologia, v. 10, p. 91-110, 2012. Disponível em: https://repositorio-aberto.up.pt/handle/10216/74479 Acesso em: 22 set. 2021.
    » https://repositorio-aberto.up.pt/handle/10216/74479
  • GUIMARÃES, Joana; NEVES, Tiago. A comunidade dança?: reflexão sobre projetos de intervenção artística em contextos rurais. Educação, Sociedade & Cultura, n. 40, p. 147-163, 2013. Disponível em: https://www.fpce.up.pt/ciie/sites/default/files/ESC40_J_Guimaraes_T_Neves.pdf Acesso em: 22 set. 2021.
    » https://www.fpce.up.pt/ciie/sites/default/files/ESC40_J_Guimaraes_T_Neves.pdf
  • HALLAM, Susan. The power of music: Its impact on the intellectual, social and personal development of children and young people. International Journal of Music Education, v. 28, n. 3, p. 269-289, 2010. Disponível em: http://dx.doi.org/10.1177/0255761410370658 Acesso em: 22 set. 2021.
    » http://dx.doi.org/10.1177/0255761410370658
  • HAMILTON, Lorna; CORBETT-WHITTIER, Connie. Using case study in education research Thousand Oaks: Sage Publications, 2012.
  • HARGREAVES, David J. The effects of repetition on liking for music. Journal of research in Music Education, v. 32, n. 1, p. 35-47, 1984. Disponível em: http://dx.doi.org/10.2307/3345279 Acesso em: 15 nov. 2021.
    » http://dx.doi.org/10.2307/3345279
  • HARGREAVES, David J.; MARSHALL, Nigel A. Developing identities in music education. Music Education Research, v. 5, n. 3, p. 263-273, 2003. Disponível em: https://doi.org/10.1080/1461380032000126355 Acesso em: 22 set. 2021.
    » https://doi.org/10.1080/1461380032000126355
  • HENNION, Antoine. Music and Mediation. Toward a New Sociology of Music. In: CLAYTON, Martin; HERBERT, Trevor; MIDDLETON, Richard (Ed.). The Cultural Study of Music A Critical Introduction. 2. ed. Abingdon-on-Thames: Routledge, 2011. P. 249-260. Disponível em: https://hal-mines-paristech.archives-ouvertes.fr/hal-00771905 Acesso em: 22 set. 2021.
    » https://hal-mines-paristech.archives-ouvertes.fr/hal-00771905
  • JUCAN, Dana; SIMION, Anca. Music Background in the Classroom: Its Role in the Development of Social-emotional Competence in Preschool Children. Procedia-Social and Behavioral Sciences, n. 180, p. 620-626, 2015. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.sbspro.2015.02.169 Acesso em: 22 set. 2021.
    » https://doi.org/10.1016/j.sbspro.2015.02.169
  • KIRSCHNER, Sebastian; TOMASELLO, Michael. Joint music making promotes prosocial behavior in 4-year-old children. Evolution and Human Behavior, v. 31, n. 5, p. 354-364, 2010. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.evolhumbehav.2010.04.004 Acesso em: 22 set. 2021.
    » https://doi.org/10.1016/j.evolhumbehav.2010.04.004
  • KOOPMAN, Constantijn. Aims in music education: A conceptual study. Philosophy of Music Education Review, v. 5, n. 2, p. 63-79, 1997.
  • KOOPMAN, Constantijn. Community music as music education: On the educational potential of community music. International Journal of Music Education, v. 25, n. 2, p. 151-163, 2007. Disponível em: https://doi.org/10.1177/0255761407079951 Acesso em: 15 nov. 2021.
    » https://doi.org/10.1177/0255761407079951
  • LANGSTON, Thomas W.; BARRETT, Margaret S. Capitalizing on community music: A case study of the manifestation of social capital in a community choir. Research studies in music education, v. 30, n. 2, p. 118-138, 2008.
  • LEBLANC, Albert; COLMAN, James; MCCRARY, Jan; SHERRILL, Carolyn; MALIN, Sue. Tempo preferences of different age music listeners. Journal of research in music education, v. 36, n. 3, p. 156-168, 1988.
  • LOPES, João Teixeira. Da democratização da Cultura a um conceito e prática alternativos de Democracia Cultural. Saber & Educar, v. 14, 2009. Disponível em: http://dx.doi.org/10.17346/se.vol14.121 Acesso em: 15 nov. 2021.
    » http://dx.doi.org/10.17346/se.vol14.121
  • MATARASSO, François. A Restless Art: How participation won, and why it matters. London: Calouste Gulbenkian Foundation, 2019.
  • MCKOY, Constance. L. A review of research on instructional approach and world music preference. Update: Applications of Research in Music Education, v. 22, n. 1, p. 36-43, 2002.
  • MIRANDA, Dave; GAUDREAU, Patrick. Music listening and emotional well-being in adolescence: A person-and variable-oriented study. Revue Européenne de Psychologie Appliquée/European Review of Applied Psychology, v. 61, n. 1, p. 1-11, 2011.
  • NEWCOMER, Kathryn; HATRY, Harry; WHOLEY, Joseph S. (Ed.). Handbook of practical program evaluation Hoboken: John Wiley & Sons, 2015.
  • MORGAN, David L.; SPANISH, Margaret T. Focus groups: A new tool for qualitative research. Qualitative sociology, v. 7, n. 3, p. 253-270, 1984.
  • NORTH, Adrien; HARGREAVES, David. Liking, arousal potential, and the emotions expressed by music. Scandinavian journal of psychology, v. 38, n. 1, p. 45-53, 1997.
  • OSTETTO, Luciana E. Mas as crianças gostam!” Ou sobre gostos e repertórios musicais. Luciana In: OSTETTO, Luciana E.; LEITE, Maria Isabel. Arte, infância e formação de professores: autoria e transgressão. Campinas: Papirus, 2004. P. 41-60.
  • PATTON, Michael Q. Qualitative Research & Evaluation Methods Newbury Park, CA: Sage, 2002.
  • PEERY, Craig; PEERY, Irene. Effects of exposure to classical music on the musical preferences of preschool children. Journal of Research in Music Education, v. 34, n. 1, p. 24-33, 1986.
  • QUADROS JÚNIOR, João; LORENZO, Oswaldo. Preferência musical e classe social: um estudo com estudantes de ensino médio de Vitória, Espírito Santo. Revista da ABEM, v. 21, n. 31, p. 35-50, 2013. Disponível em: http://www.abemeducacaomusical.com.br/revistas/revistaabem/index.php/revistaabem/article/view/70/56 Acesso em: 15 nov. 2021.
    » http://www.abemeducacaomusical.com.br/revistas/revistaabem/index.php/revistaabem/article/view/70/56
  • RAMALHO, Joana L. O papel da cultura na produção de cidade: a Casa da Música no Porto. 2012. Tese (Doutorado em Ciências Sociais) – Instituto de Ciências Sociais, Universidade de Lisboa, Lisboa, 2012.
  • RUIZ, Clarissa. La Educación artística, factor vinculante de la cultura y la educación. Lineamentos de política para la educación artística en Colombia. In: CONFERENCIA REGIONAL DE AMÉRICA LATINA Y EL CARIBE, 2005, Bogotá, Colombia. Anais [...] Bogotá: UNESCO, 2005. Disponível em: http://www.lacult.unesco.org/docc/PonenciaColombia.pdf Acesso em: 15 nov. 2021.
    » http://www.lacult.unesco.org/docc/PonenciaColombia.pdf
  • SANTOS, Helena. A propósito dos públicos culturais: uma reflexão ilustrada para um caso português. Revista Crítica de Ciências Sociais, n. 67, p. 75-97, 2003.
  • SCHÄFER, Thomas; SEDLMEIER, Peter. From the functions of music to music preference. Psychology of Music, v. 37, n. 3, p. 279-300, 2009. Disponível em: https://doi.org/10.1177/0305735608097247 Acesso em: 11 mar. 2021.
    » https://doi.org/10.1177/0305735608097247
  • SILVA, Eugénio. As metodologias qualitativas de investigação nas Ciências Sociais. Revista Angolana de Sociologia, n. 12, p. 77-99, 2013. Disponível em: https://journals.openedition.org/ras/740 Acesso em: 11 mar. 2021.
    » https://journals.openedition.org/ras/740
  • SLOBODA, John. Music structure and emotional response: Some empirical findings. Psychology of music, v. 19, n. 2, p. 110-120, 1991. Disponível em: https://doi.org/10.1177/0305735691192002 Acesso em: 11 mar. 2021.
    » https://doi.org/10.1177/0305735691192002
  • SOLEY, Gaye; SPELKE, Elizabeth S. Shared cultural knowledge: Effects of music on young children’s social preferences. Cognition, n. 148, p. 106-116, 2016. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.cognition.2015.09.017 Acesso em: 11 nov. 2021.
    » https://doi.org/10.1016/j.cognition.2015.09.017
  • STAKE, Robert E. Multiple case study analysis New York: Guilford Press, 2013.
  • STOER, Stephen; CORTESÃO, Luiza. Levantando a Pedra Porto: Edições Afrontamento, 1999.
  • SWANWICK, Keith; LAWSON, Doroty. “Authentic” Music and its Effect on the Attitudes and Musical Development of Secondary School Students. Music Education Research, v. 1, n. 1, p. 47-60, 1999. Disponível em: https://doi.org/10.1080/1461380990010105 Acesso em: 12 nov. 2021.
    » https://doi.org/10.1080/1461380990010105
  • TANNER, Julien; ASBRIDGE, Mark; WORTLEY, Scot. Our favourite melodies: musical consumption and teenage lifestyles 1. The British Journal of Sociology, v. 59, n. 1, p. 117-144, 2008. Disponível em: https://doi.org/10.1111/j.1468-4446.2007.00185 Acesso em: 15 mar. 2021.
    » https://doi.org/10.1111/j.1468-4446.2007.00185
  • WILLS, Ruth. The magic of music: a study into the promotion of children’s well-being through singing. International Journal of Children's Spirituality, v. 16, n. 1, p. 37-46, 2011. Disponível em: https://doi.org/10.1080/1364436X.2010.540750 Acesso em: 15 mar. 2021.
    » https://doi.org/10.1080/1364436X.2010.540750

Editado por

Editoras responsáveis: Taís Ferreira; Melissa Ferreira; Fabiana de Amorim Marcello

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Dez 2022
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    29 Abr 2022
  • Aceito
    09 Ago 2022
Universidade Federal do Rio Grande do Sul Av. Paulo Gama s/n prédio 12201, sala 700-2, Bairro Farroupilha, Código Postal: 90046-900, Telefone: 5133084142 - Porto Alegre - RS - Brazil
E-mail: rev.presenca@gmail.com