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A educação sexual no confessionário: mediação da ciência pelos católicos nos impressos Lar Católico e Família Cristã (década de 1950)

Educación sexual en el confesionario: mediación de la ciencia por los católicos en los impresos Lar Católico y Família Cristã (años 50)

Resumo:

A proposta do artigo é analisar os discursos católicos sobre educação sexual durante a década de 1950 a partir de seções de correspondência com leitores publicados nos impressos Lar Católico e Família Cristã. Consideramos que tais seções, escritas e mantidas por Maria Madalena Ribeiro de Oliveira e Padre Videns, respectivamente, eram espaços privilegiados de mediação e evangelização dos leigos. Os anos 1950 são um período marcado por transformações institucionais significativas na Igreja Católica, em particular por maior aproximação junto aos discursos científicos e a evangelização através do apostolado laico. Dentre os preceitos da ‘boa educação sexual’ estava a recomendação da prática da leitura, que servia de guia tanto para incorporar os preceitos científicos considerados válidos quanto para reafirmar o valor da moral e preservar as diferenças sexuais.

Palavras-chave:
educação sexual; catolicismo; imprensa; leitura

Resumen:

El propósito del artículo es analizar los discursos católicos sobre educación sexual durante la década de 1950 a partir de secciones de correspondencia con lectores en los impresos de Lar Católico y Família Cristã. Consideramos que estas secciones, escritas y mantenidas por María Madalena Ribeiro de Oliveira y el Padre Videns, respectivamente, fueron espacios privilegiados para la mediación laica y la evangelización. Los años 1950 se caracterizan por cambios institucionales significativos en la Iglesia Católica, en particular por un enfoque más cercano a los discursos científicos y la preocupación por el apostolado laico. Entre las recomendaciones para una ‘buena educación sexual’ estaba la recomendación de practicar la lectura, que sirvió de guía tanto para incorporar preceptos científicos considerados válidos como para reafirmar el valor de la moral y preservar las diferencias sexuales.

Palabras clave:
educación sexual; catolicismo; imprenta; lectura

Abstract:

The aim of the article is to analyze Catholic discourses on sex education during the 1950s from readers’ letters sections with readers in the journals Lar Católico and Família Cristã. We consider that these sections, written and kept by Maria Madalena Ribeiro de Oliveira and Father Videns, respectively, were privileged spaces for lay mediation and evangelization. The 1950s are a period marked by significant institutional transformations in the Catholic church, specially by a closer approach to scientific discourses and the growing evangelization through the lay apostolate. Among the prescriptions for ‘good sex education’ was the recommendation of the practice of reading, which served as a guide not only to incorporate the scientific precepts considered valid but also to reaffirm the value of morals and preserve sexual differences.

Keywords:
sex education; catholicism; press; reading

Introdução

Ao longo da primeira metade do século XX, a educação sexual mobilizou diferentes grupos, entre médicos, educadores, higienistas e sacerdotes. As campanhas de educação sexual eram empreendidas como ‘cruzadas profiláticas’ que visavam a um só tempo combater as perversões sexuais, as doenças venéreas, a criminalidade e os desarranjos familiares, contribuindo para a formação de uma ‘ciência sexual’ no Brasil (Carrara, 1996Carrara, S. (1996). Tributo a Vênus: a luta contra a sífilis no Brasil, da passagem do século aos anos 40. Rio de Janeiro, RJ: Editora Fiocruz.; Oliveira, 2012Oliveira, C. (2012). “Libertar o brasileiro de seu captiveiro moral”: identidade nacional, educação sexual e família no Brasil da década de 1930.Psicologia & Sociedade, 24(3), p. 507-516.). Alcançar o público leigo através da leitura tornava-se estratégia fundamental para propagar a educação, sobretudo a partir da primeira década do século XX, quando se verifica grande crescimento da produção de livros sobre educação sexual voltadas a esse público (Reis & Ribeiro, 2004Reis, G. V., & Ribeiro, P. R. M. (2004). A institucionalização do conhecimento sexual no Brasil. In P. R. M. Ribeiro (Org.), Sexualidade e educação: aproximações necessárias (p. 27-71). São Paulo, SP: Arte & Ciência.).

Entre os grupos que procuravam atuar como autoridade sobre o tema, os católicos se destacavam enfatizando a importância da família na formação moral dos indivíduos (Felicio, 2012Felicio, L. A. (2012). A moralização do sexo: os debates sobre a educação sexual para o projeto de nação brasileira na I Conferência Nacional de Educação (Dissertação de Mestrado). Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro.)1 1 Destaca-se a participação no I Congresso Nacional de Educação, em 1927, organizado pela Associação Brasileira de Educação, fundada por Heitor Lyra da Silva, e que teve participação de intelectuais, educadores como Fernando de Azevedo, Anísio Teixeira e Lourenço Filho, além de médicos e grupos de orientação católica ligados ao Centro Dom Vital, liderado por Alceu Amoroso Lima (Felicio, 2012). . Procuramos neste artigo tratar da participação dos religiosos nos debates sobre a educação sexual a partir da análise das seções ‘Intercâmbio com as leitoras’, publicada no jornal Lar Católico (1912-1984) e ‘Confie-me seu problema’, da revista Família Cristã (1934-atual). Ambas as seções buscavam responder perguntas enviadas pelos leitores e, desta forma, incentivar a participação do público leitor. Além disso, apresentavam uma dinâmica interessante e particular de evangelização dos fiéis ao abordar diversos temas à luz da doutrina católica, incluindo a educação sexual. A década de 1950 corresponde ao período em que tais seções ganharam maior destaque nos impressos católicos aqui analisados2 2 A década de 1950 corresponde ao início da publicação de ‘Intercâmbio com as leitoras’, do jornal Lar Católico, em 1954. No entanto, o recorte temporal da análise também diz respeito às limitações de acesso às fontes: no caso de Família Cristã, só tivemos acesso aos números publicados a partir da década de 1950, o que não permitiu mapear quando começou a publicação de ‘Confie-me seu problema’. Família Cristã foi consultada na Biblioteca Nacional e Lar Católico na Hemeroteca Digital da mesma instituição. .

Se a participação dos religiosos no debate sobre a educação nacional é longa3 3 Não cabe aqui discutir a longa trajetória da participação dos católicos na educação, mas na discussão sobre a educação superior no país, é a partir do século XIX que se verifica a perda de espaço da educação religiosa e a concorrência entre projetos distintos, como o modelo liberal e o positivista. Nos discursos anteriores às universidades no Brasil, os católicos buscaram preservar a hegemonia religiosa no ensino superior ao privilegiar disciplinas como a filosofia tomista e a influência do aristotelismo no direito, nas letras e na teologia (Romano, 1979; Vergara, 2003). , pode-se dizer que a década de 1950 torna-se de particular interesse por evidenciar na atuação dos religiosos as profundas tensões entre tradição e modernidade que o período abriga. Com efeito, esse momento é marcado por um intenso debate sobre a modernização dos costumes, cujas mudanças esbarravam em fronteiras morais conservadoras, criando a necessidade de enfatizar qual deveria ser o papel do homem e da mulher no casamento e, por extensão, na sociedade (Pinsky, 2014Pinsky, C. B. (2014). Mulheres dos anos dourados. São Paulo, SP: Contexto.). Em outros termos, buscamos discutir a seguinte questão: num período de rápidas transformações dos costumes, como a educação sexual se apresentava no discurso religioso estabelecendo novas relações entre religião e ciência? Que estratégias foram criadas pelos católicos para fazer frente às explicações não religiosas sobre os assuntos sexuais na formação dos leigos? Este período também é atravessado por transformações importantes tanto na esfera institucional da Igreja Católica, com maior abertura do papa Pio XII às contribuições científicas ao trabalho pastoral, quanto no âmbito da modernização da produção material dos impressos, importante recurso de evangelização dos fiéis.

Durante os anos 1950, o Brasil se mantinha como um país majoritariamente católico: o país tinha 51.944.397 habitantes, dos quais 93% se declaravam ‘católicos romanos’ (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística [IBGE], 1959Instituto Brasileiro de Geografia e Estatistica [IBGE]. (1959). Anuário estatístico do Brasil. Rio de Janeiro, RJ: Conselho Nacional de Estatística.). Essa expressão marcou, assim como em outros países de tradição católica como Itália, Áustria e Escócia, a importância e influência da religião no debate público sobre a educação sexual (Sauerteig & Davidson, 2009Sauerteig, L. D. H., & Davidson, R. (Orgs.). (2009). Shaping sexual knowledge: a cultural history of sex education in twentieth century Europe. London, UK: Routledge.). Através da mobilização dos meios de comunicação de massa - sobretudo da imprensa - na promoção de uma educação sexual considerada adequada, os católicos desempenharam forte protagonismo no debate público sobre a temática, rejeitando medidas educativas que deslocassem da família o papel central na formação sexual de crianças, adolescentes e jovens. Embora reconhecessem a importância dos preceitos de higiene e profilaxia, compreendiam a educação sexual como parte de uma educação geral que deveria ser direcionada para a formação da castidade. Portanto, competia aos pais desempenhar o protagonismo na formação das crianças e adolescentes nos assuntos sexuais, a fim de ensiná-los a “[...] defender-se [...]”, a “[...] guardar a pureza da alma [...]” e a “[...] dominar os impulsos [...]” segundo a vontade (Negromonte, 1958Negromonte, A. (1958). A educação sexual: para pais e educadores (9a ed.). Rio de Janeiro, RJ: José Olympio. , p. 31-32).

A valorização da educação sexual como um campo de atuação religiosa também está relacionada a novas orientações pastorais decorrentes de mudanças institucionais importantes no seio da Igreja Católica. O papado de Pio XII (1939-1958), nesse sentido, é fundamental para compreender esse movimento de abertura eclesiástica a questões seculares tratadas pela ciência. Compreendemos que esse movimento não foi alheio a outro fenômeno: o fortalecimento da própria ciência no cenário internacional, sobretudo no contexto pós-Segunda Guerra e a criação da Unesco. Como afirma Maio (2004Maio, M. C. (2004). Ciência política e relações internacionais: ensaios sobre Paulo Carneiro. Rio de Janeiro, RJ: Editora Fiocruz., p. 147), “[...] a ciência assumiria então papel central na construção de um mundo liberal-democrático [...]”, em contraposição ao nacionalismo xenófobo que gerara o conflito. Pode-se dizer que este período foi marcado pela internacionalização da ciência como divisa do próprio desenvolvimento, em diversas esferas, e regida pelos Estados-nações. Até o final da Guerra Fria, a ciência aparece como autoridade em matéria de saberes, nela reconhecendo um magistério superior sobre o mundo sublunar (Pestre, 2015Pestre, D. (2015). Les savoirs du social. In D. Pestre (Ed.), Histoire des sciences et des savoirs (Vol. 3). Paris, FR: Seuil. ). É marcadamente nesse momento que a ciência se tornava também uma autoridade política e uma legitimidade consensuada entre as nações, que diariamente retiraria a prova de sua força através de novas capacidades técnico-científicas.

O debate sobre a educação sexual católica em interseção com a ciência aparece de modo mais explícito na imprensa. Vale ressaltar que os anos 1950, mítica e nostalgicamente denominados de ‘anos dourados’, foram marcados pelo desenvolvimento do consumo de massas de novos bens culturais, como o crescimento da produção de livros e de novas mídias que impactariam sobre os padrões de comportamento da sociedade. A americanização do estilo de vida nas cidades, as novas expressões artísticas e a crescente profissionalização e modernização técnica da imprensa integram o cenário político de maior experiência democrática após o Estado Novo varguista (Ribeiro, 2003Ribeiro, A. P. G. (2003). Jornalismo, literatura e política: a modernização da imprensa carioca nos anos 1950. Estudos Históricos, 1(31), 147-160.).

Se a imprensa se tornou um recurso privilegiado de evangelização para os católicos desde as últimas décadas do século XIX, interessa-nos observar de que maneira a proposta de educação sexual católica realizada nos impressos reflete as novas orientações institucionais da igreja de meados do XX, impactando na forma de se relacionar diretamente com os fiéis. Essas mudanças aparecem nas publicações impressas Lar Católico e Família Cristã selecionadas no presente estudo, pela sua importância representativa e circulação. Através das respectivas colunas, dois intelectuais mediadores católicos - Maria Madalena Ribeiro de Oliveira e o padre Videns- se correspondiam com leitores leigos, criando assim espaços que se destacavam como importante recurso de (in)formação dos leigos nos assuntos da doutrina católica.A partir de suas seções, é possível observar como agentes católicos se valeram da mídia impressa para defender ou condenar comportamentos sexuais, controlando as leituras sobre o sexo como forma de promover a educação sexual considerada adequada aos fiéis.

A Igreja Católica na década de 1950

Apesar de o Concílio Vaticano II, convocado em 1961, ser apontado como o principal marco do diálogo da igreja com o mundo secularizado, os anos 1950 sinalizam algumas mudanças na orientação da Igreja Católica. Se o ‘lado sombrio’ do papado de Pio XII (1939-1958) foi também destacado (Costa, 2006Costa, M. T. (2006).Um itinerário no século: mudança, disciplina e ação em Alceu Amoroso Lima. São Paulo, SP: Edições Loyola., p.112), é possível indicar que ele constituiu um período de transição importante de uma postura da igreja até então combativa às questões seculares para um diálogo ‘extramuros’ com outros campos, dentre eles a ciência (Soffiati, 2016). Essa conduta é observada, por exemplo, na encíclica Humanis Generis (Pio XII, 1950Pio XII.. (1950). Carta encíclica Humani Generis. Recuperado de: http://w2.vatican.va/content/pius-xii/pt/encyclicals/documents/hf_p-xii_enc_12081950_humani-generis.html#_ftnref10
http://w2.vatican.va/content/pius-xii/pt...
), em que o papa esclarecia que a teologia não representava ‘empecilho ao progresso e obstáculo à ciência’, e na sua participação em diversos congressos internacionais de psicologia4 4 Como exemplo, o I Congresso Internacional de Histopatologia do Sistema Nervoso (1952) e o V Congresso Internacional de Psicoterapia e Psicologia Clínica (1953). .

A aproximação junto a associações profissionais católicas é considerada um marco importante da modernização da igreja por reconhecer a incorporação da ciência aos cuidados pastorais dos fiéis (Desmazières, 2011Desmazières, A. (2011). L’inconscient au paradis: comment les catholiques ont reçu la psychanalyse (1920-1965). Paris, FR: Payot.). Sem pretender adentrar em assuntos especializados, Pio XII buscava valorizar as contribuições da ciência e, ao mesmo tempo, ressaltar seus limites ao afirmar que o conhecimento médico e científico não deveria estar acima da moral, mas caminhar com ela, levando em conta os interesses da ciência, mas também os do paciente e da comunidade. Citava a psicanálise como exemplo desse diálogo, ao esclarecer que esta não era condenada pela igreja, tendo em vista que “[...] existem métodos psicanalistas que não estão contaminados com o vício do pansexualismo e que todos [...] têm em comum princípios e métodos psíquicos que não são contrários à ética natural ou à moral cristã” (Pio XII, 1952Pio XII.. (1952). Discours du Pape Pie XII aux participants au Congrès International d’Histopathologie du Système Nerveux. Recuperado de: https://w2.vatican.va/content/pius-xii/fr/speeches/1952/documents/hf_p-xii_spe_19520914_istopatologia.html
https://w2.vatican.va/content/pius-xii/f...
).

A Igreja Católica no Brasil acompanha esse movimento. De acordo com Scott Mainwaring (2004Mainwaring, S. (2004). A Igreja Católica e a política no Brasil, 1916-1985. São Paulo, SP: Brasiliense.), a modernização se configura através da passagem da igreja da neocristandade (1916-1955), marcada por uma postura combativa e antissecular5 5 Idealizada pelo cardeal dom Leme, a neocristandade se caracterizava por uma reação à fragilidade política e institucional da igreja desde sua ruptura com o Estado republicano, além de uma recusa em incorporar as práticas religiosas populares e uma reafirmação da hierarquia eclesiástica. O movimento contou com a participação de intelectuais católicos leigos, como Alceu Amoroso Lima e Jackson Figueiredo, na divulgação de projetos políticos relacionados à religião através da revista A Ordem e de órgãos e associações católicas importantes, como o Centro Dom Vital, a Liga Eleitoral Católica, a Confederação da Imprensa Católica e a Ação Católica, com a intenção de ampliar a participação dos católicos nas instituições e no próprio Estado (Mainwaring, 2004; Costa, 2006). , para uma igreja reformista (1955-1964), caracterizada por uma maior abertura junto a questões contemporâneas, em sintonia com as orientações romanas. Alguns fatores específicos do contexto político brasileiro também explicam as transformações na organização institucional católica: o crescimento do número de protestantes e espíritas, a ‘ameaça comunista’, o fortalecimento dos movimentos populares e a instabilidade das alianças políticas com os governos democráticos pós-Vargas. Tais fenômenos contribuíram para que a igreja constatasse sua dificuldade de dialogar com as massas e a necessidade de revisar suas próprias ações pastorais (Mainwaring, 2004Mainwaring, S. (2004). A Igreja Católica e a política no Brasil, 1916-1985. São Paulo, SP: Brasiliense.).

Dentre os órgãos e associações católicos mobilizados com a formação dos leigos, destacava-se a Ação Católica Brasileira6 6 Criada pelo cardeal dom Leme, em 1935, e presidida por Alceu Amoroso Lima, a Ação Católica Brasileira era inspirada na Ação Católica Italiana, fundada em 1922 pelo papa Pio XI, e tinha a intenção de participar “[...] ativamente na missão apostólica da Igreja [...]” na defesa dos valores católicos através da política (Souza, 2006, p. 48). Os grupos eram organizados por sexo e faixa etária, a saber: Homens da Ação Católica (HAC), para homens a partir de 30 anos e casados; Liga Feminina da Ação Católica (LFAC), para mulheres a partir de 30 anos e casadas; Juventude Católica Brasileira (JCB), para rapazes de 14 a 30 anos; e Juventude Feminina Católica (JFC), para moças de 14 a 30 anos. A partir dos anos 1950, essa forma de organização se tornou cada vez mais especializada e mais focada em grupos sociais. Foram então criadas a Juventude Estudantil Católica (JEC), a Juventude Universitária Católica (JUC) e Juventude Operária Católica (JOC), a Juventude Agrária Católica (JAC) e a Juventude Independente Católica (JIC). , cuja ‘militância leiga’ retirava do clero a exclusividade na formação pastoral e incorporava os próprios leigos como agentes formadores na doutrina (Souza, 2006Souza, N. (2006). Ação católica, militância leiga no Brasil: méritos e limites. Revista de Cultura Teológica, 55, 39-59.). As novas estratégias de formação dos fiéis estavam ligadas a uma ‘renovação catequética’ que passava a compreender a iniciação cristã como um processo de caráter contínuo e permanente e, portanto, não deveria se limitar à infância, mas ocorrer também durante a fase adulta. Havia ainda uma preocupação com a repercussão da educação cristã na vida cotidiana dos fiéis (Lima, 2016Lima, L. A. (2016). A catequese do Vaticano II aos nossos dias. São Paulo, SP: Paulus. ). É neste sentido que podemos entender que a educação sexual passou a compor a educação mais ampla dos fiéis católicos, tornando-se uma ‘disciplina necessária’ (Negromonte, 1958Negromonte, A. (1958). A educação sexual: para pais e educadores (9a ed.). Rio de Janeiro, RJ: José Olympio. ). O monsenhor Álvaro Negromonte foi um dos principais porta-vozes católicos desse novo modo de fazer catequese, e dedicou boa parte de sua vida à produção de manuais de catecismo para pais e professores, a exemplo de A educação sexual (cuja 1ª edição é publicada em 1939) e Noivos e esposos (1955). Tais livros buscavam oferecer ferramentas aos educadores católicos para que pudessem promover uma orientação moral de crianças e adolescentes. Enquanto Negromonte abordava o assunto em livros, outros atores se destacavam por uma evangelização mais ativa na imprensa. É o caso de Maria Madalena Ribeiro de Oliveira e do padre Videns, que assinavam seções de correspondência com os leitores nos impressos Lar Católico e Família Cristã. Como veremos adiante, ambos recomendavam os livros de Negromonte a seus consulentes.

É preciso dizer, no entanto, que a defesa de uma educação sexual e de um diálogo mais amplo com a sociedade secularizada no período não constituía consenso entre os próprios católicos. A partir da categorização proposta por Scott Mainwaring (2004Mainwaring, S. (2004). A Igreja Católica e a política no Brasil, 1916-1985. São Paulo, SP: Brasiliense.) sobre os grupos católicos, podemos identificar nossos autores como modernizadores conservadores, grupo que projetava maior diálogo com as mudanças sociais através de um trabalho pastoral mais ativo. Esses católicos se diferiam tanto dos tradicionalistas, que rejeitavam totalmente a secularização, quanto dos reformistas, mais progressistas e defensores das mudanças sociais como um fim em si mesmo, aproximando-se dos grupos de esquerda do país. Como modernizadores conservadores, tanto Maria Madalena Ribeiro de Oliveira quanto o padre Videns atuaram como mediadores católicos engajados na educação sexual, ora tecendo críticas aos católicos pelo ‘excesso de pudor’ com que tratavam o sexo, ora condenando uma educação sexual exclusivamente científica e alheia aos valores morais cristãos.

O confessionário em revista: a imprensa como recurso evangelizador

A mobilização do laicato pelas associações católicas encontrava nos meios de comunicação de massa, principalmente na imprensa, um importante recurso a serviço da evangelização. É o caso de Lar Católico (1912-1986)7 7 O primeiro número de Lar Católico foi publicado em 1891 e sua circulação foi interrompida no ano seguinte. A revista teve a publicação retomada em 1912, dando início a segunda fase do jornal, mantida até 1986. e Família Cristã (1934-), publicações que tinham a família como público leitor alvo e abordavam diversos assuntos para além da doutrina católica, como política, história, geografia, moda e culinária. Ambos os impressos se destacavam por manter seções assíduas de participação direta dos leitores. Em Lar Católico, havia a seção ‘Intercâmbio com as leitoras’, assinada por Maria Madalena Ribeiro de Oliveira e publicada desde 1954 no suplemento quinzenal ‘Página Feminina’, onde predominavam assuntos como namoro, casamento, família, estudos, trabalho e dicas domésticas. Já em Família Cristã, a interação com os leitores se dava em ‘Confie-me seu problema’, seção onde um padre que assinava sob o pseudônimo de Videns respondia dúvidas dos leitores sobre temas gerais da doutrina, incluindo a educação sexual.

O jornal Lar Católico era publicado semanalmente em Juiz de Fora pela Congregação do Verbo Divino, os denominados padres verbitas8 8 A Congregação do Verbo Divino (Societas Verbi Divini, S. V. D.) foi fundada em 1875, na cidade de Styel (Países Baixos) pelo padre Arnaldo Janssen. Os padres verbitas migraram para o Brasil em 1895, a fim de prestar assistência religiosa aos colonos alemães radicados no país. Desembarcaram inicialmente em Santa Leopoldina, Espírito Santo, e posteriormente instalaram a sede da congregação em Juiz de Fora, Minas Gerais. , e tinha assinantes em todo o país, principalmente nos Estados de Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo9 9 Na década de 1950, Lar Católico tinha aproximadamente 32 mil assinantes. Os exemplares eram vendidos por meio de assinatura anual ao valor de 55 cruzeiros (Cr$ 55,00) e entregues nas casas dos leitores através do correio. . Já Família Cristã (1934-) é uma revista mensal publicada em São Paulo pela Pia Sociedade Filhas de São Paulo, as irmãs paulinas10 10 A Pia Sociedade Filhas de São Paulo foi fundada em 1915, na cidade de Alba (Itália) pelo padre Tiago Alberione e colaboração da irmã Tecla Merlo. O Brasil foi um dos primeiros países estrangeiros a receber as irmãs paulinas, que chegaram a São Paulo em 1931. , e até hoje se mantém como uma das principais publicações católicas do país. Circulava em 13 países (Itália, Brasil, Argentina, Estados Unidos, Japão, México, Colômbia, Ilhas Filipinas, França, Espanha, Chile, Portugal, Irlanda), sendo o Brasil o de maior tiragem - 110 mil exemplares mensais - depois da Itália, país de origem das irmãs paulinas e da revista (Panoramas..., 1957Panoramas mundiais: revista católica mais lida. (1957, junho). Família Cristã, 6., p. 6)11 11 Nos anos 1950, os exemplares avulsos eram vendidos a três cruzeiros (Cr$ 3,00) e a assinatura anual custava 25 cruzeiros (Cr$ 25,00). .

Ambos os impressos pertenciam a congregações religiosas, o que configura certa particularidade à imprensa católica. A Congregação do Verbo Divino e a Pia Sociedade Filhas de São Paulo são ordens religiosas que têm a comunicação como missão evangelizadora e isso lhes conferiu uma atuação importante na constituição da imprensa católica no Brasil desde o século XIX12 12 Muitas congregações religiosas se estabeleceram no Brasil entre o final do século XIX e início do XX. Tal processo de imigração se relaciona com o projeto de romanização da Igreja Católica e de reafirmação da hierarquia eclesiástica sobre as práticas religiosas populares (Bittencourt, 2016). . Assim, os católicos buscavam incorporar novas estratégias à produção e circulação de impressos para combater o secularismo da ‘imprensa ímpia’ e garantir uma esfera de atuação política e social (Gonçalves, 2008). Tal como afirmado por Aline Dalmolin (2012Dalmolin, A. R. (2012). O discurso sobre aborto em revistas católicas: Rainha e Família Cristã (1980-1990) (Tese de Doutorado). Universidade do Vale do Rio dos Sinos, São Leopoldo.), o propósito missionário de levar a igreja até os fiéis através dos recursos comunicativos mais modernos permitiu que as publicações mantidas por congregações alcançassem maior tempo de circulação em contraste com outros tipos de impressos católicos, como boletins informativos e diocesanos. A incorporação de novidades técnicas pelas congregações religiosas em suas publicações conferiu maior longevidade a Lar Católico e Família Cristã.

Apesar da diversificação dos meios de comunicação de massa durante os ‘anos dourados’, a imprensa se mantinha como principal suporte na produção e circulação de conhecimento devido a transformações técnicas e tecnológicas que modernizaram o jornalismo (Ribeiro, 2003Ribeiro, A. P. G. (2003). Jornalismo, literatura e política: a modernização da imprensa carioca nos anos 1950. Estudos Históricos, 1(31), 147-160.). As revistas, em especial, se tornavam símbolos da ‘era do consumo’ e anunciavam as novidades do desenvolvimento econômico e do cenário político democrático da época, ao mesmo tempo em que materializavam essas mudanças em suas páginas por meio de aspectos materiais e gráficos (Corrêa, 2015Corrêa, T. S. (2015). A era das revistas de consumo. In A. L. Martins & T. R. Lucca, História da imprensa no Brasil (p. 207-210). São Paulo, SP: Contexto.).

Pela natureza informativa desses periódicos e pela segmentação que caracteriza seu público, podemos interpelar esses impressos13 13 Não obstante a denominação de jornal de Lar Católico, ambos os periódicos se inserem dentro da acepção mais geral de ‘revista’, tal como analisa Ana Luiza Martins (2001, 2003). como fontes privilegiadas para a análise das tensões sociais e culturais relacionadas aos papéis sexuais durante a década de 1950. Compreendidos como bens culturais específicos de mediação, voltados a um público leitor que se quer moldar e ao mesmo tempo espelhar, tais impressos permitem observar aspectos como a reafirmação das funções do homem e da mulher no casamento, da família enquanto garantia da harmonia conjugal e da ordem social. Ainda, possibilitam observar como a censura permanecia muito presente na abordagem dos assuntos sexuais. A reafirmação de padrões sexuais tradicionais era constante nas propostas de educação sexual católica, que visavam conformar a sexualidade no casamento e corrigir os desvios da função sexual reprodutiva.

Mais ainda, as seções de correspondência com os leitores atuavam como confessionários em revista na instrução sexual dos leigos, ao incentivar leitores constrangidos em procurar pessoalmente um médico ou padre para confessar suas angústias íntimas a escreverem sob a garantia do anonimato. Embora ‘Intercâmbio com as leitoras’ e ‘Confie-me seu problema’ não apresentem informações muito detalhadas sobre os autores das cartas enviadas às redações dos impressos, como nome, idade, estado civil ou localidade, tais seções nos apresentam com clareza os assuntos que mais mobilizavam os leigos na busca por aconselhamento sentimental e espiritual e os conselhos dados. A educação sexual aparece articulada a questões mais amplas relacionadas a casamento, ao namoro, à família e ao discernimento vocacional. A partir das narrativas confidenciais dos leitores, Maria Madalena e Videns aconselhavam, censuravam e apresentavam soluções possíveis aos problemas confessados por homens e mulheres em suas cartas, sempre de forma individualizada e em conformidade com a doutrina da Igreja Católica, apresentada em uma linguagem clara e objetiva.

Nesse sentido, nossos personagens são tratados aqui a partir das práticas de ‘mediação cultural’ que exercem, uma vez que atuavam como produtores e divulgadores do conhecimento sexual do ponto de vista religioso. Tal como proposto por Gomes & Hansen (2016Gomes, A. C., & Hansen, P. S. (Orgs.). (2016). Intelectuais mediadores: práticas culturais e ação política. Rio de Janeiro, RJ: Civilização Brasileira.) para a análise dos intelectuais mediadores, tais personagens ocupavam uma posição estratégica na produção e comunicação de ideias ao atuar nas fronteiras entre os processos de criação e os de recepção do conhecimento. Em sua função específica de tratar da educação sexual junto a um público não especializado, tais agentes utilizavam as seções de correspondência como um canal de comunicação direta com os leitores. ‘Intercâmbio com as leitoras’ e ‘Confie-me seu problema’ se caracterizavam como um espaço dialógico nos impressos com os leitores, demonstrando uma estratégia de aproximação com o seu público, ainda que nos informe pouco sobre a identidade real desses sujeitos. As seções também demarcam uma natureza de mediação interessante, pois ao mesmo tempo em que abrem espaço para a voz aos leitores eleitoras, tais diálogos com o público são também uma criação mediatizada, depurada, selecionada, editada ou mesmo inventada pelos editores14 14 Seguimos aqui as considerações de Elina Absalyamova e Valérie Stiénon sobre a voz dos leitores. Debruçando-se sobre o caso da imprensa francesa do século XIX, as autoras afirmam que a voz dos leitores é uma ‘construção mediática’, bem como uma manifestação discursiva. Como afirmam: “É necessário, portanto, considerando a poética específica do prisma midiático, manter a medida de um equilíbrio entre a objetivação desses discursos e a adesão às informações veiculadas pelas palavras na imprensa” (Absalyamova & Stiénon, 2018, p. 15, tradução nossa). “Il convient, donc, en considérant la poétique propre au prisme médiatique, de garder la mesure d’un équilibre entre objectivation de ces discours et adhesion aux informations portées par les paroles dans la presse”. .

Também podemos considerar Maria Madalena e padre Videns como ocupantes de uma posição intermediária entre as elites intelectuais e as massas leitoras para quem se endereçavam, num modelo de ‘popularização’ ou divulgação que fora engendrado através da imprensa (mas também a partir de outros meios)15 15 Esse modelo que serviu ao consumo da ciência se estabeleceu no século anterior nos países ocidentais (Lightman, 2010). . As seções nos permitem analisar como os mediadores concebiam suas audiências e quais estratégias utilizavam para alcançá-las. No caso da educação sexual realizada em Lar Católico e Família Cristã, a correspondência com os leitores era o recurso utilizado para alcançar e promover a instrução sexual individual dos leigos. Ainda que os mediadores compartilhassem das mesmas estratégias na busca por legitimidade e aproximação junto aos fiéis, é possível observar uma diferença quanto à posição que ocupavam na hierarquia eclesiástica e que se refletia no tipo de relação que estabeleciam com seus consulentes. A seção assinada por Maria Madalena era publicada em um suplemento feminino e, portanto, as mulheres eram seu principal público interlocutor. A conselheira aproveitava ainda para projetar uma imagem de amiga junto a suas consulentes e, assim, estabelecer uma relação de confiança e intimidade. Além disso, Maria Madalena utilizava a seção para divulgar e vender os livros de sua autoria, como a coleção de ‘Cadernos de preparação para o casamento’, que podia ser adquirida por reembolso postal através da própria seção por 200 cruzeiros (Cr$200,00). Essa dinâmica nos permite concluir que ‘Intercâmbio com as leitoras’ atuava não só como espaço de aconselhamento, mas também de divulgação literária e expansão das atividades pastorais de Maria Madalena dedicadas à formação de homens e mulheres para o casamento.

Padre Videns, por sua vez, assumia uma postura mais tradicional de confessor e autoridade. Em suas respostas, é possível observar um aconselhamento mais rigoroso e até mesmo censor na forma como abordava as questões junto a seus consulentes. Ainda que as mulheres também constituíssem maioria entre os leitores que escreviam para ‘Confie-me seu problema’, seu público era mais diversificado que o de Maria Madalena, pois também respondia cartas enviadas por homens. As cartas respondidas por Videns tratavam de assuntos mais gerais e seus consulentes eram esclarecidos de forma mais explícita à luz da doutrina católica, com menções a documentos oficiais da igreja e versículos bíblicos.

Em diálogo com Michel Foucault, compreendemos a confissão enquanto ritual discursivo “[...] que se desenrola numa relação de poder, pois não se confessa sem a presença ao menos virtual de um parceiro, que não é simplesmente o interlocutor, mas a instância que requer a confissão [...]” e que, por isso, “[...] produz em quem a articula modificações intrínsecas: inocenta-o, resgata-o, purifica-o, livra-o de suas faltas, libera-o, promete-lhe a salvação” (Foucault, 2017Foucault, M. (2017). História da sexualidade 1: a vontade de saber (4a ed). Rio de Janeiro, RJ: Paz e Terra., p. 69-70). Embora apenas um dos mediadores fosse um padre, portanto um confessor nos moldes mais tradicionais da doutrina, compreendemos que as seções de correspondência com os leitores se assemelhavam a um confessionário, uma vez que os leigos recorriam a tais interlocutores na busca de orientação, aconselhamento e redenção. A dinâmica do confessionário em revista nos lembra da importância fundamental da confissão para a vivência religiosa dos católicos enquanto um sacramento de cura, através do qual seria possível se reconciliar com Deus. Ainda que os leigos não recebessem uma penitência e a expurgação de seus pecados pelos mediadores católicos nos confessionários dos impressos, a interação realizada nas seções de correspondência permite entrever uma relação de autoridade estabelecida entre os agentes evangelizadores e os leigos, uma vez que estes últimos escreviam para as seções de correspondência por reconhecer nos conselheiros uma autoridade capaz de aconselhá-los e resolver seus problemas individuais de forma anônima, quando tinham vergonha de confessar suas intimidades e dúvidas a alguém. De todo modo, os mediadores católicos ressaltavam que sua ajuda não dispensava a procura por um confessor pessoalmente.

Mais do que acessar as possíveis apropriações dos leitores, a intenção de analisar as seções de correspondência é identificar os conselhos dados pelos mediadores e sua postura em relação aos temas que mobilizavam os leigos a escrever para as revistas. As seções nos informam o que, segundo os conselheiros e confessores, os leigos deveriam fazer de acordo com as situações narradas, com especial destaque para a leitura. O hábito de ler era considerado indispensável para ‘cultivar o espírito’ e, desta forma, fortalecer a vontade diante das imoralidades e más influências que poderiam corromper os fiéis. Assim, também é possível ter acesso aos títulos sobre educação sexual indicados aos leitores, para quais casos este tipo de literatura era recomendado e quais os critérios de avaliação e seleção dessas leituras.

A educação sexual segundo a moral católica

Para os católicos, a educação sexual tinha como principal finalidade a preparação para o casamento e a educação dos filhos, enquanto extensão da vocação matrimonial. A formação nos assuntos sexuais deveria ser uma formação moral, ou seja, “[...] de acordo com a reta razão e a vontade positiva de Deus” (Negromonte, 1954Negromonte, A. (1954). O caminho da vida: moral cristã (12a ed.). Rio de Janeiro, RJ: José Olympio., p. 18). Segundo a doutrina católica, o ato moral é definido como a ação humana orientada pela consciência e a ênfase na dimensão moral do sexo era constantemente mobilizada por padres e leigos enquanto aspecto fundamental da educação sexual católica. A educação sexual era apresentada, portanto, como sinônimo de uma ‘educação da pureza’ capaz de ensinar os fiéis a ter domínio de si e guardar a integridade do corpo e do espírito através do controle dos instintos sexuais (Pio XII, 1953Pio XII. (1953). Discours du pape Pie XII aux participants au Congrès International de Pychothérapie et de Psychologie Clinique. Recuperado de: https://w2.vatican.va/content/pius-xii/fr/speeches/1953/documents/hf_p-xii_spe_19530413_psicoterapia.html
https://w2.vatican.va/content/pius-xii/f...
; Negromonte, 1958Negromonte, A. (1958). A educação sexual: para pais e educadores (9a ed.). Rio de Janeiro, RJ: José Olympio. ).

Além disso, os religiosos ressaltavam a importância de compreender a educação sexual enquanto parte de uma formação mais ampla e integrada a outros aspectos da moral católica. Os jovens deveriam ser educados “[...] para o matrimônio com a mesma seriedade com que preparamos as crianças para a Primeira Comunhão” (Oliveira, 1959Oliveira, M. M. R. (1959). Amor e paz: primeira e segunda fase de preparação ao casamento ou iniciação dos filhos e das filhas menores e maiores de vinte anos nos mistérios da vida (2a ed.). Juiz de Fora, MG: [s.n.]., p. 9), mas esta educação sexual não poderia se limitar apenas aos conhecimentos científicos sobre o sexo. Mais do que “[...] um curso de biologia, fisiologia ou sexologia [...]”, a instrução dos fiéis católicos no assunto deveria se fundamentar na doutrina (Negromonte, 1958Negromonte, A. (1958). A educação sexual: para pais e educadores (9a ed.). Rio de Janeiro, RJ: José Olympio. , p. 27-28). O ensinamento apenas do ponto de vista biológico e científico era acusado de ser um ‘culto ao erotismo’ e uma falha grave, pois ignorava a dimensão moral do sexo. Desta forma, os católicos buscavam disputar diretamente com médicos e cientistas pela autoridade na educação sexual. Freud, Havelock Ellis, Wilhelm Steckel e outros autores eram denunciados de transformar os vícios sexuais em “[...] teorias científicas [...]” e desprezar as “[...] exigências da natureza [...]”, isto é, a reprodução (Negromonte, 1958Negromonte, A. (1958). A educação sexual: para pais e educadores (9a ed.). Rio de Janeiro, RJ: José Olympio. , p. 22-23).

Compete destacar que, embora tais autores fossem alvo de críticas religiosas, muitas vezes compartilhavam da moral sexual defendida pelos católicos, circunscrita apenas em relações sexuais entre homem e mulher e com fins reprodutivos. Assim como a religião, a ciência médica compreendia a reprodução como única finalidade do ato sexual e quaisquer práticas dissociadas do casamento eram classificadas como ‘vícios’ que precisavam ser corrigidos. É o exemplo da higiene, que defendia a continência sexual como profilaxia de doenças venéreas, e da psicanálise, que propunha o casamento como terapia corretiva da homossexualidade e da masturbação (Carvalho, 2019Carvalho, C. C. (2019). Entre o consultório e o confessionário: as leituras da educação sexual segundo a psicanálise e o catolicismo (década de 1950) (Dissertação de Mestrado). Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro.).

Desta forma, as relações entre católicos e cientistas são muito ambíguas. De um lado, os católicos acusavam a ciência de oferecer uma instrução sexual incompleta e perigosa. De outro, incorporavam certas noções científicas, sobretudo da biologia e da psicologia, para reafirmar os papéis a serem desempenhados pelo homem e pela mulher no casamento e na família a partir das diferenças sexuais. Essa ambiguidade causava dúvidas nos próprios leigos, que escreviam para os impressos católicos em busca de orientação sobre o que a doutrina tinha a dizer sobre o assunto. Nesse sentido, as seções de correspondência com os leitores assumiam papel importante na formação religiosa dos fiéis, ao esclarecer suas inquietações particulares enviadas para as revistas. Em resposta a um de seus consulentes, Videns afirmava que a igreja não condenava a instrução nos assuntos, mas uma ‘pedagogia sexual’ baseada apenas em critérios científicos. Para provar seu argumento, mencionava ainda a encíclica Divini Illius Magistri (Pio XI, 1929Pio XI.. (1929). Carta encíclica Divini Illius Magistri. Recuperado de: https://www.vatican.va/content/pius-xi/pt/encyclicals/documents/hf_p-xi_enc_31121929_divini-illius-magistri.html
https://www.vatican.va/content/pius-xi/p...
), sobre a educação cristã da juventude, que alertava para o fato de que muitos pecados contra os ‘bons costumes’ eram cometidos por fraqueza da vontade, e não pela ignorância no assunto. A educação sexual católica deveria ser individual, realizada por alguém preparado e em diálogo com os princípios educacionais religiosos, a fim de evitar que os jovens fossem expostos a situações de pecado (Videns, 1958bVidens. (1958b, agosto). Confie-me seu problema. FamíliaCristã , 4., p. 4).

A compreensão de que o acesso a informações incorretas poderia ser ainda mais perigoso ao espírito do que a ignorância era mobilizada pelos católicos para reafirmar a necessidade de falar sobre o assunto. Além disso, havia a preocupação com discursos ditos ‘perigosos’ por não abordar a dimensão moral do sexo, como a ciência. Em Noivos e esposos: problemas do matrimônio, um dos livros recomendados aos leitores de Lar Católico e Família Cristã, o padre Negromonte denunciava a ‘propaganda antimatrimonial’ presente em livros e folhetos de divulgação científica, acusada de ‘desmoralizar a fidelidade conjugal’, ‘exaltar o amor livre’, além de promover ‘culto à pornografia e a obscenidade’. Segundo o autor, a melhor maneira de combater tais discursos seria através dos mesmos recursos comunicativos, isto é, livros e revistas (Negromonte, 1955Negromonte, A. (1955). Noivos e esposos: problemas do matrimônio (5a ed.). Rio de Janeiro, RJ: José Olympio.). Daí a importância da leitura como recurso educativo fundamental à formação dos fiéis nos assuntos sexuais e das revistas enquanto suporte de divulgação dos títulos avaliados como adequados.

As tensões entre catolicismo e ciência aparecem de forma ainda mais clara no que diz respeito aos critérios de seleção de leituras sobre educação sexual. Em primeiro lugar, o hábito de ler era valorizado como a principal maneira para se proteger das más influências e configurava um dos principais conselhos dados por Maria Madalena e Videns aos fiéis com quem se comunicavam em ‘Intercâmbio com as leitoras’ e ‘Confie-me seu problema’. Entre os livros indicados aos leigos nestas seções, destacava-se leituras mais amplas de teologia que poderiam orientar os fiéis, mas também livros exclusivamente dedicados à temática da educação sexual, como A educação sexual e Noivos e esposos, assinados pelo monsenhor Álvaro Negromonte; e a coleção de ‘Cadernos de preparação para o casamento’, de Maria Madalena. Livros estrangeiros também estavam na lista, a exemplo de A serviço do amor, assinado por doutor Carnot e Edith Carnot; e a coleção ‘Intimidade conjugal’, de Pierre Foyer, que também tinha edições distintas para homens e mulheres.

A defesa de que a educação sexual alinhada aos valores católicos deveria formar homens e mulheres para o casamento era acompanhada de um critério rigoroso na seleção de leituras sobre o assunto. Os livros deveriam ser específicos segundo o público-alvo: as edições femininas não podiam ser lidas por homens e vice-versa. É o exemplo de A serviço do amor, um dos livros mais recomendados por Videns e Maria Madalena a seus leitores. De autoria do médico francês doutor J. Carnot, a edição feminina também era assinada por sua filha Edith Carnot como estratégia de estabelecer maior proximidade junto às leitoras, que deveriam encontrar no livro um guia para instruí-las ‘cientificamente’ para o amor. Uma vez que a reprodução era reafirmada pelos católicos como o principal sentido do ato sexual, as mulheres eram alvo de uma atenção ainda mais especial. Em Amor e paz, Maria Madalena enfatizava que “[...] a jovem que deseja casar-se deve, antes de tudo, preparar-se para ser uma boa mãe [...] e estar bem informada, de modo que possa cuidar, com eficiência, da educação sexual de seus filhos” (Oliveira, 1959Oliveira, M. M. R. (1959). Amor e paz: primeira e segunda fase de preparação ao casamento ou iniciação dos filhos e das filhas menores e maiores de vinte anos nos mistérios da vida (2a ed.). Juiz de Fora, MG: [s.n.]., p. 11).

A maternidade era elogiada como uma ‘necessidade fisiológica’ do corpo da mulher para a procriação e, portanto, aparecia de forma exclusiva nas edições femininas dos livros. Do mesmo modo, os autores e mediadores ressaltavam que os jovens com idade própria do casamento demandavam uma formação mais detalhada do que aqueles que não pretendiam se casar em breve, o que também sinalizava uma preocupação com a faixa etária dos leitores. Maria Madalena alertava no prefácio de seus livros que estes não deveriam cair em ‘mão imatura’, a fim de não sugestionar as leitoras.

Além de atuar na divulgação de livros, as seções de correspondência da imprensa católica também se destacam por apresentar os temas mais específicos nos quais a educação sexual era apontada como necessária. Tendo em vista que as mulheres representavam o público leitor predominante em Lar Católico e Família Cristã, não surpreende que a maioria das correspondências abordasse temas relativos ao casamento e à família, como namoro, discernimento vocacional, estudos e trabalho. A partir das perguntas enviadas, os mediadores católicos aproveitavam para aconselhar ou mesmo censurar seus consulentes. Os pecados contra a pureza eram alertados como sendo os mais ‘graves’ e, portanto, as consulentes eram aconselhadas a ter muita cautela com as situações de pecado no namoro, como o excesso de carícias, situações a sós com o namorado e inclusive o beijo. Muitas vezes, ‘dar uma pausa sentimental’ e terminar o namoro era a decisão mais prudente a ser tomada quando não era possível controlar as ‘paixões baixas’ ou quando não havia firmeza de que o namoro pudesse constituir um casamento. Era importante se preparar para a vida matrimonial, mesmo que ainda tivessem solteiras, a fim de saber escolher o pretendente adequado, cumprindo adequadamente com a vocação familiar, além de evitar a ameaça do divórcio16 16 O debate sobre o divórcio no Brasil ganhou mais destaque no período, com crescimento do número de mulheres separadas nos censos demográficos entre as décadas de 1940 a 1960, e se tornou legalizado apenas em 1977 (Pinsky, 2014). A Igreja Católica era uma das instituições mais ativas nas campanhas antidivorcistas e ainda considera o casamento um sacramento indissolúvel, embora tenha simplificado o processo canônico para os casos de nulidade matrimonial a partir de 2015, durante o pontificado de Francisco. , considerado ‘ilícito’ em qualquer situação (Videns, 1958a Videns. (1958a, junho). Confie-me seu problema. Família Cristã, 5.).

A preparação para o casamento deveria incluir o aprendizado de ‘aptidões práticas’, como corte e costura e economia doméstica. Os estudos e o trabalho eram considerados boas distrações para o espírito, com destaque para trabalhos sociais e profissões que reforçavam a ‘vocação feminina’ para ofícios relacionados ao cuidado do outro, como a enfermagem. Ainda assim, tais atividades eram mais incentivadas às mulheres solteiras enquanto as casadas eram aconselhadas a se dedicar integralmente ao lar e à educação dos filhos (Oliveira, 1954Oliveira, M. M. R. (1954, 14 de novembro). Intercâmbio com as leitoras. Lar Católico, 46, 6., p. 3).

Outro aspecto das leituras que mobilizava muitos leitores que enviavam cartas às revistas católicas era sobre o que poderia ser lido. Tão importante quanto ler era saber selecionar as leituras segundo critérios morais alinhados com a doutrina católica. Embora os mediadores reforçassem a importância de ler obras assinadas por autores católicos, alguns dos livros recomendados aos leitores eram assinados por médicos e outros especialistas, e não somente por religiosos ou leigos17 17 Além da divulgação literária direta e individualizada nas seções ‘Confie-me seu problema’ e ‘Intercâmbio com as leitoras’, a leitura também aparecia em colunas de resenhas literárias, como ‘No mundo dos livros’ de Família Cristã, que classificavam os livros de acordo com o público leitor específico que estes buscavam alcançar (moças, rapazes, pais, mães, educadores), ou ainda como ‘condenáveis’, ‘desaconselháveis’ ou ‘recomendáveis apenas para pessoas de critério’. . Essa dinâmica sinalizava não apenas um esforço de controlar as leituras, mas também de mediação entre a ciência e os leigos. Os próprios leitores escreviam curiosos em busca de opiniões e sugestões sobre títulos específicos, a fim de saber se eram adequados ou não e quais pecados poderiam ser cometidos por leituras imorais. Em resposta a consulente Indecisa, Videns enumerava os perigos das más leituras:

a) É pecado grave ler livros e revistas imorais porque excitam fortemente o prazer sensual. Tal leitura só é lícita para fins de estudos necessários ao próprio ofício. [...]

b) Ler coisas um tanto indecentes, por si só é pecado venial. Pode tornar-se mortal se a leitura é feita por má intenção ou se por experiência tem-se a certeza de consentir na tentação.

Deve-se desaconselhar especialmente aos jovens a leitura de romances eróticos que ameaçam a moralidade cristã. Com maior razão, proíba-se a leitura de revistas obscenas e pornográficas cujo veneno ofusca o esplendor da pureza e paralisa as energias da alma (Videns, 1956 Videns. (1956, março). Confie-me seu problema. Família Cristã, 4., p. 4, grifo do autor).

Embora seja difícil saber se de fato os correspondentes seguiam os conselhos dados nas seções, a curiosidade era mobilizada na educação a respeito dos critérios que deveriam orientar a boa leitura, sobretudo diante da concorrência com outras publicações, num momento de expansão da leitura no país (El Far, 2006El Far, A. (2006). O livro e a leitura no Brasil. Rio de Janeiro, RJ: Jorge Zahar Editor.). As seções, assim, podem ser compreendidas como um recurso privilegiado de mediação cultural, tendo em vista que Maria Madalena e Videns aproveitavam da própria curiosidade dos leitores para recomendar ou censurar certos tipos de leitura18 18 Os perigos atribuídos às más leituras constituem uma longa tradição na história do catolicismo, a exemplo do Index Librorum Prohibitorum, o índice de livros proibidos pela Igreja Católica, criado durante o Concílio de Trento. O Index foi publicado até 1966 e, embora não tenha sido possível identificar as edições mais recentes do século XX, é de conhecimento que alguns livros de educação sexual, inclusive escritos por padres como o francês Marc Oraison (que também era médico) e publicados com o selo de nihil obstat [nada obsta], também foram incluídos no índice, acusados de violarem a moral sexual católica (Desmazières, 2011, p. 176-177). No Brasil, o esforço mais conhecido de censura foi a publicação do guia literário Através dos romances: um guia para as consciências, escrito pelo frei Pedro Sinzig. Publicado pela primeira vez em 1917 pela Editora Vozes, era uma espécie de ‘manual do veto’ que classificava uma quantidade considerável de livros e autores avaliados como adequados ou condenáveis (Paiva, 1997). .

Há uma forma de circularidade entre os redatores-produtores dos periódicos e a fabricação de seus receptores (relação entre produção e recepção tem uma forma circular nessas seções). Muitas vezes, é difícil se apropriar da voz dos leitores por esse motivo. No entanto, até que ponto estes estão presos a esse circuito relacional? Embora seja difícil saber, podemos ao menos inferir que havia uma gama de leituras possíveis para as/os consulentes dos impressos a respeito do sexo, incluindo aquelas leituras proibidas. Ou seja, tais leituras, aconselhadas ou não, estavam entre as possibilidades acessíveis aos leitores. O que significava que elas e eles liam ou tinham conhecimento de tais livros (incluindo, portanto, o desejo e intenção de ler ou a curiosidade). A importância em enfatizar certas leituras indica justamente que havia um escrutínio necessário por parte dos conselheiros católicos diante dessas brechas abertas pelos novos padrões culturais e de comportamentos sexuais. Trata-se, portanto, de falar dos desejos e da curiosidade desses leitores e leitoras.

A lista de leituras proibidas incluía livros e revistas. As revistas populares e simbólicas dos costumes conservadores da época, como Cruzeiro, Grande Hotel, Querida e Capricho, eram classificadas como ‘sensacionalistas demais’ pela “[...] falta de pudor na exposição dos problemas sexuais” (Videns, 1955a Videns. (1955a, abril). Confie-me seu problema. Família Cristã, 7., p. 7). Muitos livros eram avaliados como ‘desaconselháveis’ ou ‘condenáveis’ pelos mediadores católicos, a exemplo de A Religiosa, de Diderot, O mártir da Gólgota, de Henrique Perez Escrich, além de romances de Émile Zola e livros ‘esotéricos’ ou publicados por editoras protestantes.

Enquanto certas obras literárias eram condenáveis pelas imoralidades e pelo excesso de imaginação que despertavam em seus leitores, as obras de cunho científico também eram colocadas sob a mira da censura católica acusadas de abordar ‘assuntos delicados com pouco critério moral’. Dependendo do grau de instrução dos leitores, poderiam ser admitidos apenas para fins de estudo, tal como ressaltado a Indecisa e também a consulente Ana Maria, ao perguntar se podia ler Nossa vida sexual, do médico alemão Fritz Kahn19 19 Fritz Kahn (1888-1968) foi um médico alemão judeu conhecido por ter publicado diversas obras de divulgação científica, popularizadas pelas ilustrações elaboradas de sua própria autoria. . O gosto pela leitura desta última consulente era elogiado, porém acompanhado de uma advertência: “[...] acautele-se em não ler tudo o que se lhe apresenta. Porque se os livros são bons amigos e até lenitivo às nossas dores, às vezes poderá encontrar entre eles um falso amigo, um veneno para sua alma” (Videns, 1955b Videns. (1955b, outubro). Confie-me seu problema. Família Cristã, 14. , p. 14). Quanto ao livro em questão, Videns a orientava que não o lesse, pois, o livro abordava “[...] assuntos delicados com pouco critério moral [...]” e, portanto, poderia “[...] ser prejudicial em vez que útil”. Por fim, recomendava à leitora outras obras elogiadas por apresentar os mesmos assuntos com ‘dignidade’: A serviço do amor, do doutor Carnot e os livros do padre Negromonte A educação sexual e Noivos e esposos (Videns, 1955b Videns. (1955b, outubro). Confie-me seu problema. Família Cristã, 14. , p. 14).

Em A serviço do amor, encontramos um bom exemplo da apropriação do discurso científico pelos católicos em seu modelo de educação sexual. Assinado por um médico, o livro esclarecia que o prazer sexual constituía uma função fisiológica ‘dada por Deus’ para garantir a transmissão da vida, tão natural quanto o prazer no comer e no beber. Logo, não haveria nada de imoral em sua essência. O autor também reforçava que o desconhecimento sobre as ‘realidades do casamento’ tornava as mulheres ‘mais expostas’ a traumas psíquicos causados pelo excesso de pudor ou pela falta de conhecimento, como a frigidez (Carnot & Carnot, 1955Carnot, E., & Carnot, J. (1955). A serviço do amor (edição feminina) (Prof. José Warken, trad., 3a ed.). São Paulo, SP: Livraria Catedral. ). Para os católicos, a ausência total de prazer era considerada uma ameaça tão grave à harmonia conjugal quanto às imoralidades que pudessem dissociar o sexo da reprodução. Embora não seja possível identificar se o autor do livro era católico ou não, importa considerar que o livro apresenta algo consensual para a medicina: o sexo normal deveria estar associado ao casamento e à reprodução. Desta forma, a ciência era mobilizada pelos católicos para reafirmar o caráter natural do prazer, apesar de esclarecer que este deveria ser o meio, e não a finalidade do ato sexual. A recomendação frequente desse livro por Maria Madalena às leitoras de Lar Católico ressalta a estratégia dos católicos de incorporar o conhecimento científico à instrução sexual dos fiéis de modo a prepará-los adequadamente para o casamento e prevenir possíveis desordens afetivas que poderiam comprometer a felicidade e a harmonia matrimonial, sobretudo em sua dimensão sexual.

Ainda assim, a recomendação de livros científicos revela alguns ruídos entre os católicos quanto aos critérios de seleção e condenação desse tipo de literatura sexual, a exemplo da divergência de opiniões em torno do livro A educação sexual e afetiva, do médico psicanalista e pedagogo francês, André Berge20 20 André Berge (1902-1995) foi um dos fundadores da École des parents et éducateurs de Paris e se dedicou a pesquisas sobre a psicanálise e a psicopedagogia à educação sexual de crianças e adolescentes (Giami, 2007). Também foi um dos articuladores do diálogo entre catolicismo e psicanálise na França (Desmazières, 2011). . O livro versava sobre “[...] o desenvolvimento harmonioso e sadio do homem e da mulher [...]” a partir de três pilares: a pedagogia, a psicologia e a moral, e destinava-se aos casados, aos jovens em preparação para o casamento e a qualquer pessoa interessada “[...] na solução dos problemas humanos causados pelos conflitos do amor e do sexo, e dos problemas sociais gerados ou geradores dessas desordens pessoais” (Berge, 1957Berge, A. (1957). A educação sexual e afetiva. Rio de Janeiro, RJ: Agir., orelha do livro). O prefácio, escrito pelo frei dominicano Pedro Secondi, frisava a autoridade de Berge enquanto homem de ciência católico ao mesmo tempo em que esclarecia que sua abordagem era científica: “[...] o autor é certamente cristão, mas [...] quer trazer-nos somente o resultado de seus estudos de médico e de sua experiência atenta de pai, no domínio científico e prático” (Berge, 1957Berge, A. (1957). A educação sexual e afetiva. Rio de Janeiro, RJ: Agir., p. 10)21 21 O referido livro fazia parte de uma coleção intitulada ‘Família’, que pretendia abordar “[...] à luz dos novos dados de psicologia moderna, as questões atinentes à família, como [...] a preparação para o casamento, os problemas conjugais e a educação” (Berge, 1957, orelha do livro). Outros dois livros do autor - Como educar pais e filhos? e Defeitos das crianças - faziam parte dessa coleção, que também contava com títulos de autores brasileiros, como Alceu Amoroso Lima, Maria Junqueira Schmidt e Gustavo Corção. .

Mas o fato de ser um especialista no assunto também era considerado um critério de que A educação sexual e afetiva constituía uma leitura ‘condenada’. Esta é a postura de Videns que, na condição de padre, enfatizava que o livro não deveria ser lido justamente por abordar o tema apenas do ponto de vista científico, e não religioso. Aos leitores que escreviam para Família Cristã pedindo opinião sobre este título, dava o seguinte esclarecimento:

Apesar de André Berge ser bom escritor, psicólogo e especialista dos problemas da infância, juventude e família, este seu livro é reprovado. [...] Ao longo de toda a sua exposição, o autor teima em permanecer no campo inteiramente natural. Defende alguns princípios condenados pela Igreja. Embora escrito com nobreza, o livro prejudica a quem não tiver uma formação moral muito segura (Videns, 1959Videns. (1959, abril). Confie-me seu problema. Família Cristã, 5., p. 5).

Nem mesmo o fato de a obra ter sido publicada por uma editora católica, a Agir, representava uma garantia de que constituía uma boa leitura. Videns concluía sua censura afirmando que “[...] infelizmente, por falta de tempo dos responsáveis que deveriam conhecer todas as obras que distribuem, ou por outro motivo, acontece que também há livros não bons em editoras católicas”. Seu conselho, portanto, era a de que o livro não deveria “[...] entrar nos lares cristãos” (Videns, 1959Videns. (1959, abril). Confie-me seu problema. Família Cristã, 5., p. 5).

Considerações finais

A mediação cultural realizada na imprensa católica e a indicação de leituras através das seções de correspondência com os leitores permitem extrair algumas conclusões sobre o modelo católico de educação sexual. Em primeiro lugar, a educação sexual religiosa buscava competir com um conhecimento sexual acusado de ser ‘imoral’ e ‘pornográfico’ por não abordar o tema à luz da moral cristã. Ao mesmo tempo, pretendia preencher uma lacuna deixada pelos próprios católicos na formação dos fiéis nos assuntos sexuais. A constatação de que a religião estava perdendo espaço frente a outros discursos como o da medicina e da psicanálise mobilizou iniciativas que incorporavam a educação sexual às estratégias de evangelização e que tinham a imprensa periódica como principal instrumento de divulgação do conhecimento sexual segundo princípios católicos, a exemplo das congregações religiosas responsáveis pela publicação de Lar Católico e Família Cristã. Os impressos atuavam de forma estratégica, sobretudo nas seções de correspondência que mobilizavam a participação dos leigos ao garantir seu anonimato e oferecer conselhos e palavras amigas às angústias individuais. Ainda que não informem muito sobre o perfil do público participativo nas seções, a atuação dos conselheiros, enquanto intelectuais mediadores, se apresenta como uma dinâmica fundamental na instrução nos assuntos sexuais, uma vez que atuavam de forma individual e atenta às situações confessadas nas seções. Em especial, a leitura como instrumento de formação.

Um outro aspecto que podemos destacar é que, nos discursos desses impressos, a educação sexual tinha como finalidade preparar os fiéis para o casamento, reafirmando as funções específicas do homem e da mulher na família. O casamento e a família eram, na visão dos católicos, ameaçados por influências não religiosas e ‘modernas’ divulgadas nos meios de comunicação de massa e na literatura sexual então em voga. A ênfase nas diferenças sexuais justificava uma orientação distinta para o homem e a mulher, em reação às mudanças nos papéis sociais que se anunciavam nos anos 1950, como o trabalho feminino e os métodos contraceptivos. O funcionamento dos órgãos sexuais, a maternidade como função da ‘natureza’ feminina e as diferenças psicológicas dos comportamentos masculinos e femininos eram alguns dos aspectos científicos mobilizados pelos católicos, a fim de reafirmar as diferenças sexuais não apenas segundo a Criação divina, mas também de acordo com as especificidades da ‘natureza’ de cada sexo a partir de suas evidências científicas22 22 A reafirmação das diferenças sexuais pelo discurso científico é tema amplamente discutido pela historiografia, com destaque para Laqueur (2001), Schiebinger (2004) e Rohden (2009). .

Apesar de certa apropriação dos discursos científicos sobre a educação sexual, a posição dos católicos em relação à ciência era ambígua. De um lado, os católicos reconheciam a importância do conhecimento científico sobre o corpo e inclusive recomendavam aos leigos alguns livros escritos por médicos e especialistas. De outro, criticavam a educação sexual estritamente do ponto de vista biológico, que ignorava a dimensão moral e espiritual da união sexual. Portanto, tornava-se necessário prescrever leituras que não ameaçassem a integridade moral dos fiéis. A aceitação de alguns autores que seriam em parte ‘representantes’ da ciência pode ser vista tanto como uma adequação ao discurso científico, tendo em vista maior abertura da igreja a questões seculares, como também uma estratégia de concorrer com livros já ‘populares’ que circulavam e que os leigos poderiam ter fácil acesso nas livrarias e bancas de jornais.

Os conselhos dados aos leigos por Maria Madalena e Videns nas seções ‘Intercâmbio com as leitoras’ e ‘Confie-me seu problema’ também reforçam a importância da leitura para a educação sexual. Não apenas na divulgação de publicações consideradas alinhadas à doutrina católica, mas também no controle do que os leigos poderiam ler com restrições ou não deveriam ler em hipótese alguma. Embora houvesse um consenso de que a moral deveria ser o ponto de partida da educação sexual católica, isso não se mantinha quanto aos critérios de avaliação dos livros de educação sexual.

Nesse sentido, compreendemos os mediadores católicos que atuavam nas seções de correspondência como ‘modernizadores conservadores’ (Mainwaring, 2004Mainwaring, S. (2004). A Igreja Católica e a política no Brasil, 1916-1985. São Paulo, SP: Brasiliense.), uma vez que reconheciam a importância em abordar e instruir os fiéis nos assuntos sexuais, criticando os grupos mais conservadores que ignoravam a questão, porém mantinham uma postura menos progressista no que concernia ao tema das liberdades individuais. Embora admitissem a importância do prazer sexual para a manutenção da harmonia conjugal e dos estudos para as mulheres, a educação sexual promovida pelos intelectuais mediadores católicos tinha como finalidade reafirmar os valores cristãos do casamento e da família em um contexto histórico em que outros discursos ameaçavam ocupar esse lugar de autoridade na orientação das relações íntimas entre os sexos.

Mesmo aqueles que reconheciam a importância da educação sexual segundo a doutrina oficial da igreja, como o padre Videns, tinham certas reservas com uma abordagem estritamente científica do sexo e condenavam os autores - mesmo que fossem católicos - que abordavam a questão apenas sob esse prisma. Já Maria Madalena e monsenhor Negromonte, que embora não colaborasse nos impressos era muito indicado aos leitores, ressaltavam as contribuições da ciência sob a condição de que estivesse amalgamada à religião, de modo a reafirmar o sentido moral do sexo e a autoridade eclesiástica no tratamento da questão sexual. Embora a valorização da educação sexual seja considerada uma postura moderna dos católicos por substituir o silêncio que durante muito tempo predominou sobre o tema, isso não significou o desaparecimento do conservadorismo religioso: o ato sexual continuava a ser reafirmado e valorizado por sua função reprodutiva e circunscrita no casamento enquanto suas finalidades ‘secundárias’, como o prazer, somente eram aceitas como legítimas quando não atentassem contra o fim último da Criação divina.

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  • Videns. (1958b, agosto). Confie-me seu problema. FamíliaCristã , 4.
  • Videns. (1959, abril). Confie-me seu problema. Família Cristã, 5.
  • 1
    Destaca-se a participação no I Congresso Nacional de Educação, em 1927, organizado pela Associação Brasileira de Educação, fundada por Heitor Lyra da Silva, e que teve participação de intelectuais, educadores como Fernando de Azevedo, Anísio Teixeira e Lourenço Filho, além de médicos e grupos de orientação católica ligados ao Centro Dom Vital, liderado por Alceu Amoroso Lima (Felicio, 2012Felicio, L. A. (2012). A moralização do sexo: os debates sobre a educação sexual para o projeto de nação brasileira na I Conferência Nacional de Educação (Dissertação de Mestrado). Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro.).
  • 2
    A década de 1950 corresponde ao início da publicação de ‘Intercâmbio com as leitoras’, do jornal Lar Católico, em 1954. No entanto, o recorte temporal da análise também diz respeito às limitações de acesso às fontes: no caso de Família Cristã, só tivemos acesso aos números publicados a partir da década de 1950, o que não permitiu mapear quando começou a publicação de ‘Confie-me seu problema’. Família Cristã foi consultada na Biblioteca Nacional e Lar Católico na Hemeroteca Digital da mesma instituição.
  • 3
    Não cabe aqui discutir a longa trajetória da participação dos católicos na educação, mas na discussão sobre a educação superior no país, é a partir do século XIX que se verifica a perda de espaço da educação religiosa e a concorrência entre projetos distintos, como o modelo liberal e o positivista. Nos discursos anteriores às universidades no Brasil, os católicos buscaram preservar a hegemonia religiosa no ensino superior ao privilegiar disciplinas como a filosofia tomista e a influência do aristotelismo no direito, nas letras e na teologia (Romano, 1979Romano, R. (1979). Brasil: Igreja contra Estado. São Paulo, SP: Kayrós.; Vergara, 2003Vergara, M. R. (2003). A revista brasileira: vulgarização científica e construção da identidade nacional na passagem da Monarquia para a República (Tese de Doutorado). Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.).
  • 4
    Como exemplo, o I Congresso Internacional de Histopatologia do Sistema Nervoso (1952Pio XII.. (1952). Discours du Pape Pie XII aux participants au Congrès International d’Histopathologie du Système Nerveux. Recuperado de: https://w2.vatican.va/content/pius-xii/fr/speeches/1952/documents/hf_p-xii_spe_19520914_istopatologia.html
    https://w2.vatican.va/content/pius-xii/f...
    ) e o V Congresso Internacional de Psicoterapia e Psicologia Clínica (1953Pio XII. (1953). Discours du pape Pie XII aux participants au Congrès International de Pychothérapie et de Psychologie Clinique. Recuperado de: https://w2.vatican.va/content/pius-xii/fr/speeches/1953/documents/hf_p-xii_spe_19530413_psicoterapia.html
    https://w2.vatican.va/content/pius-xii/f...
    ).
  • 5
    Idealizada pelo cardeal dom Leme, a neocristandade se caracterizava por uma reação à fragilidade política e institucional da igreja desde sua ruptura com o Estado republicano, além de uma recusa em incorporar as práticas religiosas populares e uma reafirmação da hierarquia eclesiástica. O movimento contou com a participação de intelectuais católicos leigos, como Alceu Amoroso Lima e Jackson Figueiredo, na divulgação de projetos políticos relacionados à religião através da revista A Ordem e de órgãos e associações católicas importantes, como o Centro Dom Vital, a Liga Eleitoral Católica, a Confederação da Imprensa Católica e a Ação Católica, com a intenção de ampliar a participação dos católicos nas instituições e no próprio Estado (Mainwaring, 2004Mainwaring, S. (2004). A Igreja Católica e a política no Brasil, 1916-1985. São Paulo, SP: Brasiliense.; Costa, 2006Costa, M. T. (2006).Um itinerário no século: mudança, disciplina e ação em Alceu Amoroso Lima. São Paulo, SP: Edições Loyola.).
  • 6
    Criada pelo cardeal dom Leme, em 1935, e presidida por Alceu Amoroso Lima, a Ação Católica Brasileira era inspirada na Ação Católica Italiana, fundada em 1922 pelo papa Pio XI, e tinha a intenção de participar “[...] ativamente na missão apostólica da Igreja [...]” na defesa dos valores católicos através da política (Souza, 2006Souza, N. (2006). Ação católica, militância leiga no Brasil: méritos e limites. Revista de Cultura Teológica, 55, 39-59., p. 48). Os grupos eram organizados por sexo e faixa etária, a saber: Homens da Ação Católica (HAC), para homens a partir de 30 anos e casados; Liga Feminina da Ação Católica (LFAC), para mulheres a partir de 30 anos e casadas; Juventude Católica Brasileira (JCB), para rapazes de 14 a 30 anos; e Juventude Feminina Católica (JFC), para moças de 14 a 30 anos. A partir dos anos 1950, essa forma de organização se tornou cada vez mais especializada e mais focada em grupos sociais. Foram então criadas a Juventude Estudantil Católica (JEC), a Juventude Universitária Católica (JUC) e Juventude Operária Católica (JOC), a Juventude Agrária Católica (JAC) e a Juventude Independente Católica (JIC).
  • 7
    O primeiro número de Lar Católico foi publicado em 1891 e sua circulação foi interrompida no ano seguinte. A revista teve a publicação retomada em 1912, dando início a segunda fase do jornal, mantida até 1986.
  • 8
    A Congregação do Verbo Divino (Societas Verbi Divini, S. V. D.) foi fundada em 1875, na cidade de Styel (Países Baixos) pelo padre Arnaldo Janssen. Os padres verbitas migraram para o Brasil em 1895, a fim de prestar assistência religiosa aos colonos alemães radicados no país. Desembarcaram inicialmente em Santa Leopoldina, Espírito Santo, e posteriormente instalaram a sede da congregação em Juiz de Fora, Minas Gerais.
  • 9
    Na década de 1950, Lar Católico tinha aproximadamente 32 mil assinantes. Os exemplares eram vendidos por meio de assinatura anual ao valor de 55 cruzeiros (Cr$ 55,00) e entregues nas casas dos leitores através do correio.
  • 10
    A Pia Sociedade Filhas de São Paulo foi fundada em 1915, na cidade de Alba (Itália) pelo padre Tiago Alberione e colaboração da irmã Tecla Merlo. O Brasil foi um dos primeiros países estrangeiros a receber as irmãs paulinas, que chegaram a São Paulo em 1931.
  • 11
    Nos anos 1950, os exemplares avulsos eram vendidos a três cruzeiros (Cr$ 3,00) e a assinatura anual custava 25 cruzeiros (Cr$ 25,00).
  • 12
    Muitas congregações religiosas se estabeleceram no Brasil entre o final do século XIX e início do XX. Tal processo de imigração se relaciona com o projeto de romanização da Igreja Católica e de reafirmação da hierarquia eclesiástica sobre as práticas religiosas populares (Bittencourt, 2016).
  • 13
    Não obstante a denominação de jornal de Lar Católico, ambos os periódicos se inserem dentro da acepção mais geral de ‘revista’, tal como analisa Ana Luiza Martins (2001Martins, A. L. (2001). Revistas em revista: imprensa e práticas culturais em tempos de República, São Paulo (1890-1922). São Paulo, SP: Edusp., 2003Martins, A. L. (2003). Da fantasia à história: folheando páginas revisteiras. História, 22(1), 59-79.).
  • 14
    Seguimos aqui as considerações de Elina Absalyamova e Valérie Stiénon sobre a voz dos leitores. Debruçando-se sobre o caso da imprensa francesa do século XIX, as autoras afirmam que a voz dos leitores é uma ‘construção mediática’, bem como uma manifestação discursiva. Como afirmam: “É necessário, portanto, considerando a poética específica do prisma midiático, manter a medida de um equilíbrio entre a objetivação desses discursos e a adesão às informações veiculadas pelas palavras na imprensa” (Absalyamova & Stiénon, 2018, p. 15, tradução nossa). “Il convient, donc, en considérant la poétique propre au prisme médiatique, de garder la mesure d’un équilibre entre objectivation de ces discours et adhesion aux informations portées par les paroles dans la presse”.
  • 15
    Esse modelo que serviu ao consumo da ciência se estabeleceu no século anterior nos países ocidentais (Lightman, 2010Lightman, B. (2010). Victorian popularizers of science: designing Nature for new audiences. Chicago, IL: University of Chicago Press. ).
  • 16
    O debate sobre o divórcio no Brasil ganhou mais destaque no período, com crescimento do número de mulheres separadas nos censos demográficos entre as décadas de 1940 a 1960, e se tornou legalizado apenas em 1977 (Pinsky, 2014Pinsky, C. B. (2014). Mulheres dos anos dourados. São Paulo, SP: Contexto.). A Igreja Católica era uma das instituições mais ativas nas campanhas antidivorcistas e ainda considera o casamento um sacramento indissolúvel, embora tenha simplificado o processo canônico para os casos de nulidade matrimonial a partir de 2015, durante o pontificado de Francisco.
  • 17
    Além da divulgação literária direta e individualizada nas seções ‘Confie-me seu problema’ e ‘Intercâmbio com as leitoras’, a leitura também aparecia em colunas de resenhas literárias, como ‘No mundo dos livros’ de Família Cristã, que classificavam os livros de acordo com o público leitor específico que estes buscavam alcançar (moças, rapazes, pais, mães, educadores), ou ainda como ‘condenáveis’, ‘desaconselháveis’ ou ‘recomendáveis apenas para pessoas de critério’.
  • 18
    Os perigos atribuídos às más leituras constituem uma longa tradição na história do catolicismo, a exemplo do Index Librorum Prohibitorum, o índice de livros proibidos pela Igreja Católica, criado durante o Concílio de Trento. O Index foi publicado até 1966 e, embora não tenha sido possível identificar as edições mais recentes do século XX, é de conhecimento que alguns livros de educação sexual, inclusive escritos por padres como o francês Marc Oraison (que também era médico) e publicados com o selo de nihil obstat [nada obsta], também foram incluídos no índice, acusados de violarem a moral sexual católica (Desmazières, 2011Desmazières, A. (2011). L’inconscient au paradis: comment les catholiques ont reçu la psychanalyse (1920-1965). Paris, FR: Payot., p. 176-177). No Brasil, o esforço mais conhecido de censura foi a publicação do guia literário Através dos romances: um guia para as consciências, escrito pelo frei Pedro Sinzig. Publicado pela primeira vez em 1917 pela Editora Vozes, era uma espécie de ‘manual do veto’ que classificava uma quantidade considerável de livros e autores avaliados como adequados ou condenáveis (Paiva, 1997)Paiva, A. (1997). A voz do veto: a censura católica à leitura de romances. Belo Horizonte, MG: Autêntica..
  • 19
    Fritz Kahn (1888-1968) foi um médico alemão judeu conhecido por ter publicado diversas obras de divulgação científica, popularizadas pelas ilustrações elaboradas de sua própria autoria.
  • 20
    André Berge (1902-1995) foi um dos fundadores da École des parents et éducateurs de Paris e se dedicou a pesquisas sobre a psicanálise e a psicopedagogia à educação sexual de crianças e adolescentes (Giami, 2007Giami, A. (2007). Une histoire de l’éducation sexuelle en France: une médicalisation progressive de la sexualité (1945-1980). Sexologies, 16(3), 219-229.). Também foi um dos articuladores do diálogo entre catolicismo e psicanálise na França (Desmazières, 2011Desmazières, A. (2011). L’inconscient au paradis: comment les catholiques ont reçu la psychanalyse (1920-1965). Paris, FR: Payot.).
  • 21
    O referido livro fazia parte de uma coleção intitulada ‘Família’, que pretendia abordar “[...] à luz dos novos dados de psicologia moderna, as questões atinentes à família, como [...] a preparação para o casamento, os problemas conjugais e a educação” (Berge, 1957Berge, A. (1957). A educação sexual e afetiva. Rio de Janeiro, RJ: Agir., orelha do livro). Outros dois livros do autor - Como educar pais e filhos? e Defeitos das crianças - faziam parte dessa coleção, que também contava com títulos de autores brasileiros, como Alceu Amoroso Lima, Maria Junqueira Schmidt e Gustavo Corção.
  • 22
    A reafirmação das diferenças sexuais pelo discurso científico é tema amplamente discutido pela historiografia, com destaque para Laqueur (2001Laqueur, T. (2001). Inventando o sexo: corpo e gênero dos gregos a Freud. Rio de Janeiro, RJ: Relume Dumará.), Schiebinger (2004) e Rohden (2009).
  • 47
    Como citar este artigo: Carvalho, C. C.; Kodama, K. A educação sexual no confessionário: mediação da ciência pelos católicos nos impressos “Lar Católico e Família Cristã” (década de 1950). (2020). Revista Brasileira de História da Educação, 20. DOI: http://dx.doi.org/10.4025/rbhe.v20.2020.e133
  • 49
    Nota: O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (Capes) - Código de Financiamento 001/This study was financed in part by the Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (Capes) - Finance Code 001.
  • 23
    Their participation at the I National Education Congress in 1927 is worthy of note. The Congress was organized by the Brazilian Association of Education, founded by Heitor Lyra da Silva, and included the participation of intellectuals; educators such as Fernando de Azevedo, Anísio Teixeira and Lourenço Filho; doctors; and Catholic orientation groups linked to the Dom Vital Center, led by Alceu Amoroso Lima (Felicio, 2012Felicio, L. A. (2012). A moralização do sexo: os debates sobre a educação sexual para o projeto de nação brasileira na I Conferência Nacional de Educação (Dissertação de Mestrado). Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro.).
  • 24
    The 1950s were when the publication of the ‘Intercâmbio com as leitoras’ section in the Lar Católico newspaper began (1954). However, the time period analyzed meant that we had limited access to sources: in the case of Familia Cristã, we were only able to retrieve the issues published from the 1950s onwards, which did not allow us to map when the publication of ‘Confie-me seu problema’ actually began. Familia Cristã was consulted in the Biblioteca Nacional, and Lar Católico in the Digital Media Library of the same institution.
  • 25
    Discussing the long trajectory of Catholics’ participation in education is not applicable here. However, when analyzing higher education in Brazil, from the 19th century onwards religious education can be seen to lose space and there is competition between different projects such as the liberal and the positivist models. Prior to the existence of universities in Brazil, Catholics sought to maintain a religious hegemony in higher education with their discourse, favoring subjects such as Thomist philosophy and the influence of Aristotelianism in Law, Literature, and Theology (Romano, 1979Romano, R. (1979). Brasil: Igreja contra Estado. São Paulo, SP: Kayrós.; Vergara, 2003Vergara, M. R. (2003). A revista brasileira: vulgarização científica e construção da identidade nacional na passagem da Monarquia para a República (Tese de Doutorado). Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.).
  • 26
    For example, the First International Congress of Histopathology of the Nervous System (1952)Pio XII.. (1952). Discours du Pape Pie XII aux participants au Congrès International d’Histopathologie du Système Nerveux. Recuperado de: https://w2.vatican.va/content/pius-xii/fr/speeches/1952/documents/hf_p-xii_spe_19520914_istopatologia.html
    https://w2.vatican.va/content/pius-xii/f...
    and the Fifth International Congress of Psychotherapy and Clinical Psychology (1953Pio XII. (1953). Discours du pape Pie XII aux participants au Congrès International de Pychothérapie et de Psychologie Clinique. Recuperado de: https://w2.vatican.va/content/pius-xii/fr/speeches/1953/documents/hf_p-xii_spe_19530413_psicoterapia.html
    https://w2.vatican.va/content/pius-xii/f...
    ).
  • 27
    Idealized by Cardinal Dom Leme, neo-Christendom was characterized as a reaction to the political and institutional fragility of the church after its rupture with the republican State, a refusal to incorporate popular religious practices, and a reaffirmation of ecclesiastical hierarchy. The movement included the participation of lay Catholic intellectuals - such as Alceu Amoroso Lima and Jackson Figueiredo - in the dissemination of religious-related political projects through magazine A Ordem, and of important Catholic organizations and associations such as the Dom Vital Center, the Catholic Electoral League, the Confederation of Catholic Press, and Catholic Action, with the aim of increasing the participation of Catholics in institutions and in the State itself (Mainwaring, 2004Mainwaring, S. (2004). A Igreja Católica e a política no Brasil, 1916-1985. São Paulo, SP: Brasiliense.; Costa, 2006Costa, M. T. (2006).Um itinerário no século: mudança, disciplina e ação em Alceu Amoroso Lima. São Paulo, SP: Edições Loyola.).
  • 28
    Created by Cardinal Dom Leme in 1935 and presided by Alceu Amoroso Lima, the Brazilian Catholic Action was inspired on the Italian Catholic Action founded in 1922 by Pope Pius XI and was aimed at participating “[...] actively in the apostolic mission of the church [...]” and defending Catholic values through politics (Souza, 2006, p. 48). The groups were organized by gender and age group: Catholic Action Men (HAC), for married men or men over 30; Women's Catholic Action League (LFAC), for married women or women over 30; Brazilian Catholic Youth (JCB), for boys and men aged 14-30; and Catholic Women's Youth (JFC), for girls and women aged 14-30. From the 1950s, this form of organization became increasingly specialized and more focused on social groups. The Catholic Student Youth (JEC), Catholic University Youth (JUC), Catholic Workers’ Youth (JOC), Catholic Agricultural Youth (JAC), and Catholic Independent Youth (JIC) were then created.
  • 29
    The first issue of Lar Católico was published in 1891 and its circulation was interrupted the following year. Publication resumed in 1912, launching its second phase, which continued until 1986.
  • 30
    The Society of the Divine Word (Societas Verbi Divini, S.V.D.) was founded in 1875 in the city of Styel (Netherlands) by Father Arnold Janssen. The Verbites emigrated to Brazil in 1895 in order to provide religious assistance to German settlers living in the country. They first arrived in Santa Leopoldina, in the state of Espírito Santo, and later established the congregation's headquarters in Juiz de Fora, Minas Gerais.
  • 31
    By the 1950s, Lar Católico had approximately 32,000 subscribers. The copies were sold through an annual subscription costing 55 cruzeiros (Cr$ 55.00) and was delivered by mail.
  • 32
    The Pious Society of Daughters of St. Paul was founded in 1915 in the city of Alba (Italy) by Father Tiago Alberione, in collaboration with Sister Tecla Merlo. Brazil was one of the first foreign countries to host the Pauline Sisters, who arrived in São Paulo in 1931.
  • 33
    In the 1950s, single copies were sold for three cruzeiros (Cr$ 3.00) and the annual subscription cost 25 cruzeiros (Cr$ 25.00).
  • 34
    Many religious congregations established themselves in Brazil between the late 19th century and early 20th century. This immigration process is related to the Catholic church’s Romanization project and the reaffirmation of ecclesiastical superiority over popular religious practices (Bittencourt, 2016)Bittencourt, A. B. (2016). A era das congregações - pensamento social, educação e catolicismo.Pro-Posições, 28(3), 29-59..
  • 35
    Despite Lar Católico being called a newspaper, as Ana Luiza Martins states (2001Martins, A. L. (2001). Revistas em revista: imprensa e práticas culturais em tempos de República, São Paulo (1890-1922). São Paulo, SP: Edusp., 2003Martins, A. L. (2003). Da fantasia à história: folheando páginas revisteiras. História, 22(1), 59-79.), both periodicals fall into the more general category of ‘magazine’.
  • 36
    Here, we echo the considerations of Elina Absalyamova and Valérie Stiénon about the readers’ voice. Focusing on the 19th century French press, the authors state that the readers’ voice is a ‘media construction’ as well as a discursive manifestation. They state: “Therefore, considering the specific poetics of the media prism, a measure must be maintained of the balance between the objectification of these discourses and the adherence to the information conveyed by the words in the press” (Absalyamova & Stiénon, 2018Absalyamova, E., & Stiénon, V. (Dir.). (2018). Les voix du lecteur dans la presse française au XIX e siècle. Limoges, FR: Pulim., p. 15, free translation). “Il convient, donc, en considérant la poétique propre au prisme mediatique, de garder la mesure d'un équilibre entre objection de ces discours et adhesion aux informations portées par les paroles dans la presse”.
  • 37
    This model, which served the consumption of science, was established in the previous century in Western countries (Lightman, 2010Lightman, B. (2010). Victorian popularizers of science: designing Nature for new audiences. Chicago, IL: University of Chicago Press. ).
  • 38
    The debate about divorce in Brazil gained more prominence during this period, with an increase in the number of separated women in the demographic censuses carried out between the 1940s and 1960s, but divorce was only legalized in 1977 (Pinsky, 2014Pinsky, C. B. (2014). Mulheres dos anos dourados. São Paulo, SP: Contexto.). The Catholic church was one of the most active institutions in anti-divorce campaigns, and still considers marriage an indissoluble sacrament, although it simplified the canonical process for cases of marriage annulment in 2015 during Pope Francis’ pontificate.
  • 39
    In addition to the direct and individualized literary dissemination in the sections ‘Confie-me seu problema’ and ‘Intercâmbio com as leitoras’, the activity of reading also appeared in literary review columns such as ‘No mundo dos livros’ (In the World of Books) in Família Cristã, which classified books according to the specific readership they wanted to reach (girls, boys, fathers, mothers, educators), or even as “reprehensible”, “inadvisable”, or “recommendable only to people of strong judgement”.
  • 40
    The dangers attributed to evil literature have a long tradition in the history of Catholicism, as demonstrated by the Index Librorum Prohibitorum, the index of books prohibited by the Catholic church created during the Council of Trent. The Index was published until 1966 and although it was not possible for us to find the most recent 20th century editions, it is a known fact that certain books on sex education, including those written by priests such as Frenchman Marc Oraison (who was also a doctor) and published with the seal of nihil obstat [nothing stands in the way], were also included in the index for violating Catholic sexual morality (Desmazières, 2011Desmazières, A. (2011). L’inconscient au paradis: comment les catholiques ont reçu la psychanalyse (1920-1965). Paris, FR: Payot., pp. 176-177). In Brazil, the best-known censorship effort was the publication of literary guide Através dos romances: um guia para as consciências (Through the Novels: A Guide for Consciences), written by Friar Pedro Sinzig. First published in 1917 by Editora Vozes, it was a kind of ‘veto manual’, which classified a considerable number of books and authors as either appropriate or inappropriate (Paiva, 1997Paiva, A. (1997). A voz do veto: a censura católica à leitura de romances. Belo Horizonte, MG: Autêntica.).
  • 41
    Fritz Kahn (1888-1968) was a German Jewish doctor known for having published several scientific works made popular by his own elaborate illustrations.
  • 42
    André Berge (1902-1995) was one of the founders of the École des parents et éducateurs de Paris and dedicated himself to research on psychoanalysis and psycho-pedagogy for the sexual education of children and adolescents (Giami, 2007Giami, A. (2007). Une histoire de l’éducation sexuelle en France: une médicalisation progressive de la sexualité (1945-1980). Sexologies, 16(3), 219-229.). He was also one of the coordinators of the dialogue between Catholicism and psychoanalysis in France (Desmazières, 2011Desmazières, A. (2011). L’inconscient au paradis: comment les catholiques ont reçu la psychanalyse (1920-1965). Paris, FR: Payot.).
  • 43
    This book was part of a collection titled ‘Família’ (Family), aimed at addressing “[...] issues concerning the family such as [...] preparation for marriage, marital problems and education in the light of new data from modern psychology” (Berge, 1957, dust-jacket). Two other books by him - Como educar pais e filhos? (How to Educate Parents and Children) and Defeitos das crianças (Children’s Problems) - were part of this collection, which also featured titles by Brazilian authors such as Alceu Amoroso Lima, Maria Junqueira Schmidt, and Gustavo Corção.
  • 44
    The reaffirmation of sexual differences by scientific discourse is a theme widely discussed in historiography, particularly in Laqueur (2001Laqueur, T. (2001). Inventando o sexo: corpo e gênero dos gregos a Freud. Rio de Janeiro, RJ: Relume Dumará.), Schiebinger (2004Schiebinger, L. (2004). Nature's body: gender in the making of modern science. New Brunswick, NJ: Rutgers University Press.) and Rohden (2009Rohden, F. (2009). Uma ciência da diferença: sexo e gênero na medicina da mulher (2a ed.). Rio de Janeiro, RJ: Editora Fiocruz.).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    28 Set 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    02 Nov 2019
  • Aceito
    24 Jun 2020
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