Acessibilidade / Reportar erro

‘Homens que ensinaram a América ler’: a educação de adultos no Brasil e México (1947-1956)1 1 A expressão utilizada neste título faz referência a uma matéria do jornal The Unesco Courier (1958) intitulada ‘Fighters for literacy’, que descreveu a atuação de intelectuais empenhados em combater o analfabetismo adulto em diversos países.

‘Hombres que enseñaron a América a leer’: educación para adultos en Brasil y México (1947-1956)

Resumo:

Este texto tem por objetivo analisar a relação estabelecida entre Jaime Torres Bodet e Manuel Bergström Lourenço Filho, nas campanhas de alfabetização de adultos no México e Brasil, que culminaram com a realização do VI Seminário Interamericano de Alfabetização e Educação de Adultos, no Brasil em 1949. Trata-se, portanto, de uma investigação acerca da circulação de ideias que nortearam a educação de adultos no Brasil e México, em tempos em que o México se colocava como referência exitosa para toda a América Latina, sobretudo, pelas experiências levadas a cabo pela Unesco, OEA e Crefal. Em relação às opções teórico-metodológicas, trata-se de um trabalho embasado na História Conectada, tomando como fontes: jornais, revistas e fotografias. Por fim, pode-se concluir que a relação entre esses homens se constituiu no movimento campanhista de erradicação do analfabetismo adulto, levado a cabo em seus respectivos países pela Unesco, que resultou na realização de congressos e, consequentemente, em uma vasta produção intelectual e didática sobre o tema.

Palavras-chave:
educação de adultos; Jaime Torres e Lourenço Filho; campanhas de alfabetização de adultos; Unesco; Crefal

Resumen:

Este texto tiene como objetivo analizar la relación establecida entre Jaime Torres Bodet y Manuel Bergström Lourenço Filho, en las campañas de alfabetización de adultos en México y Brasil, que culminaron con la celebración del VI Seminário Interamericano de Alfabetização e Educação de Adultos en Brasil en 1949. Es, por lo tanto, una investigación sobre la circulación de ideas que guió la educación de adultos en Brasil y México, en un momento en que México se estaba colocando como una referencia exitosa para toda América Latina, sobre todo, debido a las experiencias llevadas a cabo por el Unesco, OEA y Crefal. En relación a las opciones teóricas y metodológicas, es un trabajo basado en la Historia Conectada, tomando como fuentes: periódicos, revistas y fotografías. Finalmente, se puede concluir que la relación entre estos hombres se constituyó en la campaña para erradicar el analfabetismo de adultos, llevada a cabo en sus respectivos países por la Unesco, que resultó en la celebración de congresos y, en consecuencia, en un vasto desarrollo intelectual y didáctica sobre el tema.

Palabras clave:
educación de adultos; Jaime Torres y Lourenço Filho; campañas de alfabetización de adultos; Unesco; Crefal

Abstract:

This text aims to analyze the relationship established between Jaime Torres Bodet and Manuel Bergström Lourenço Filho in adult literacy campaigns that took place in Mexico and Brazil, which culminated with the 6th Inter-American Seminar on Adult Literacy and Education being held in Brazil, in 1949. It is, therefore, an investigation about the circulation of ideas that guided adult education in Brazil and Mexico, at a time when Mexico was standing as a successful reference for all of Latin America, above all, due to the experiences carried out by UNESCO, the OAS and the Crefal. Regarding theoretical and methodological options, this is a work based on Connected History and took newspapers, magazines and photographs as sources. Finally, it can be concluded that the relationship between those men was constituted in the campaign movement to eradicate adult illiteracy, carried out in their respective countries by UNESCO, which resulted in congresses being held and, consequently, in a vast intellectual and didactic production on the topic.

Keywords:
adult education; Jaime Torres and Lourenço Filho; adult literacy campaigns; Unesco; Crefal

Introdução

Para alguns dos delegados aqui presentes - disse no seu discurso -, vindos de países onde o analfabetismo praticamente desapareceu, pode parecer anacrônico que existam povos nos quais, ao lado de uma elite universitária, e sob os restos de cultura uma grande linhagem, milhões de jovens e adultos nem mesmo possuem o domínio do alfabeto.[...] Entendemos que a organização que se projeta é um primeiro passo e, por isso, apreciamos e aplaudimos. Mas sentimos que deverá seguir esse primiero passo uma reunião que afronte corajosamente essas três questões: O que estão dispostos a fazer dos países mais ricos e tecnicamente preparados para ajudar outros a elevar o nível educacional de seus habitantes? Como conciliaremos tal ajuda com o dever de respeitar a liberdade de cada nação na escolha de seus métodos internos para organizar o ensino em seu território?E de que forma coordenaremos essa liberdade -que julgamos inalienável- com a urgência de decidir sobre os objetivos gerais da educação do homem? (Bodet, 1969Bodet, J. T. (1969). Años contra eltiempo. México, MX: Porrúa., p. 1, tradução nossa)2 2 “Para algunos de los delegados aquí presentes - dijo en su discurso -, venidos de países en que el analfabetismo prácticamente ha desaparecido, podrá parecer ana crónico que haya pueblos en los que, al lado de una élite universitaria, y sobre los restos de culturas de gran linaje, millones de jóvenes y adultos no posean siquiera el dominio del alfabeto.[…] Entendemos que la organización que se proyecta es un primer paso y, como tal, lo apreciamos y lo aplaudimos. Pero sentimos que deberá seguir a ese primer paso una reunión que afronte valientemente estas tres cuestiones: ¿Qué están dispuestos a hacer los países más ricos y técnicamente más preparados para ayudar a que eleven los otros el nivel de instrucción de sus habitantes? ¿Cómo conciliaremos tal ayuda con el deber de respetar la libertad de cada nación en la elección de sus métodos internos para organizar la enseñanza en su territorio? ¿Y de qué modo coordinaremos esa libertad -que juzgamos inalie nable- con la urgencia de decidir acerca de los fines generales de la educación del hombre?”. .

O discurso do político, filósofo e escritor mexicano Jaime Torres Bodet, por ocasião da Conferência Preparatória3 3 A Unesco foi criada ao final da conhecida historicamente Conferencia Preparatória, realizada entre 1º a 16 de novembro de 1945, no Instituto de Engenheiros Civis de Londres, como uma agência especializada da Organização das Nações Unidas (ONU). Entre os 37 países membros estavam Brasil e México, respectivamente representados por José Joaquim de Lima e Silva Muniz de Aragão, Paulo Estevão de Berrêdo Carneiro, Antônio Arruda Carneiro Leão e Jaime Torres Bodet. No final da conferência, representantes de 37 Estados assinaram a Constituição que deu à luz a Unesco. da Unesco, em Londres em 1945, reverberou o alerta para o tema da educação de adultos, logo nos primeiros anos de fundação da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). Nesse pronunciamento, seus argumentos estavam pautados nas disparidades sociais e econômicas entre os países4 4 Nesse período era o total eram 20 Estados-membros: Arábia Saudita, Austrália, Brasil, Canadá, Checoslováquia, China, Dinamarca, Egito, Estados Unidos, França, Grécia, Índia, Líbano, México, Noruega, Nova Zelândia, República Dominicana, Reino Unido, África do Sul e Turquia. signatários da Unesco, pois sua voz nesse organismo fazia ecoar as demandas educacionais do México e, notadamente, dos demais países da América Latina, especialmente nos anos em que ele esteve a frente desse organismo (1948-1952).

Este texto é ambientado nesse período histórico, avançando até 1956, ano da publicação da Cartilha do povo: para ensinar a ler rapidamente, de Manuel Bergström Lourenço Filho, e tem por objetivo analisar a relação estabelecida entre Jaime Torres Bodet e Lourenço Filho, nas campanhas de alfabetização de adultos no México e Brasil, no período entre 1947 e 1956, que culminaram com a realização do VI Seminário Interamericano de Alfabetização e Educação de Adultos, no Brasil em 1949.

Os antecedentes desta história residem no passado do México, que desenvolveu experiências outras em matéria de educação de adultos, que resultaram na criação da Secretaría de Educación Pública (SEP) em 1921 (Miranda, 2014Miranda, F. L. (2014). México, la UNESCO y el Proyecto de Educación Fundamental para América Latina, 1945-1951. Signos Históricos, (31), 88-115.). Com a tônica do social, construiu-se nesse país um modelo de educação de adultos, com características especialmente revolucionárias5 5 A esse respeito, ver Peres & Pérez (2009). , a partir de 1910. Essas condições históricas constituíram as bases para a construção de escolas rurais, missões culturais, escolas normais rurais e granjas-escolares, respaldadas no conceito de educação fundamental - recém-criado, à época, pela Unesco, especialmente com a criação em 1951 do primeiro Centro Regional de Educación Fundamental para la América Latina [Crefal]Centro Regional de Educación Fundamental para la América Latina [Crefal]. (1952). Educación fundamental: ideario, principios, orientaciones metodológicas. Pátzcuaro, MX. 6 6 Esse centro passou por diversas mudanças de paradigma e nomenclatura, de Centro Regional de Educación Fundamental para la América Latina (Crefal) passou a ser denominado de Centro de Cooperación Regional para la Educación de Adultos en América Latina y el Caribe (Crefal), a partir de outubro de 1990 até os dias atuais. , em Pátzcuaro, Michoacán, México.

A ideia de educação fundamental, apoiada pela Unesco, tem como marco a teoria da modernização e responde ao formato das organizações internacionais da época, a partir de uma noção: “[...] suficientemente ampla e geral e de um diagnóstico de toda a região, se elabora um conjunto de técnicas e estratégias de intervenção, as quais são replicadas como uma ‘receita’ nos diferentes países” (Fernández, Welti, & Guida, 2009Fernández, M. del C., Welti, M. E., & Guida, M. E. (2009). La educación rural en la Argentina: propuesta de capacitación de maestros rurales (1958-1972). In T.G. Peres & O. L. Pèrez (Org.), Educación rural en Iberoamérica: experiencia histórica y construcción de sentido (p. 242-264). Madrid, ES: Anroart., p. 249-250, tradução nossa, grifo do autor)7 7 “[...] suficientemente amplia y general y de un diagnóstico de toda la región, se elaboran un conjunto de técnicas y estrategias de intervención que luego se replican amodo de ‘receta’ en los distintos países”. . Isso sem levar em conta as particularidades dos diferentes contextos, neste caso, as experiências brasileiras e mexicanas. No entanto, para criar um conceito padrão, uma definição universal, um grupo de trabalho composto por representantes das secretarias das Nações Unidas e das instituições especializadas, reunidas em Paris em novembro de 1950, sancionou o seguinte:

O nome de educação fundamental é dado ao mínimo de educação geral que tem por objetivo ajudar crianças e adultos, que não usufruem dos benefícios de uma boa instrução escolar, para compreender os problemas peculiares do meio em que vivem, para formecer uma ideia exata dos seus direitos e deveres cívicos e individuais e para participar de forma mais eficaz no progresso social e econômico da comunidade a que pertencem.Essa educação é fundamental porque proporciona o mínimo de conhecimento teórico e técnico necessário para alcançar um padrão de vida adequado. É um requisito prévio indispensável para que a atividade de serviços especializados (higiene, agricultura, etc.) seja plenamente eficaz. (Centro Regional de Educación Fundamental para la América Latina [Crefal], 1952Centro Regional de Educación Fundamental para la América Latina [Crefal]. (1952). Educación fundamental: ideario, principios, orientaciones metodológicas. Pátzcuaro, MX., p. 14-15, tradução nossa)8 8 “Se da el nombre de educación fundamental al mínimo de educación general que tiene por objeto ayudar a los niños y a los adultos, que no disfrutan de las ventajas de una buena instrucción escolar, a comprender los problemas peculiares del medio en que viven, a formarse una idea exacta de sus derechos y deberes cívicos e individuales y a participar más eficazmente en el progreso social y económico de la comunidad a que pertenecen. Esa educación es fundamental porque proporciona el mínimo de conocimientos teóricos y técnicos indispensables para alcanzar un nivel de vida adecuado. Es un requisito previo indispensable que para la actividad de los servicios especializados (higiene, agricultura, etc.) pueda ser plenamente eficaz”. .

Uma das tarefas da Unesco era a de fomentar a educação fundamental, enquanto o mínimo necessário de educação para a população adulta. Baseado neste conceito, foram desenvolvidas a Campanha de Educação de Adolescentes e Adultos (CEAA) no Brasil e, no caso mexicano, a Campaña Nacional pro alfabetización, entre 1947 e 1963. Os princípios da educação fundamental se fizeram conhecidos, especialmente, com a realização do VI Seminário Interamericano de Alfabetização e Educação de Adultos, realizado no Hotel Quitandinha, Petrópolis, Rio de Janeiro, de 27 de julho a 2 de setembro de 1949. Nessa ocasião se fizeram presentes diversas referências intelectuais em matéria de educação de adultos.

Em relação às opções teórico-metodológicas, este texto se pauta nos pressupostos da história conectada. Essa referência historiográfica consiste em teoria/método que estabelece conexões pela abertura do diálogo. Neste sentido, assumimos a tarefa do historiador encarregado de “[...] exumar as ligações históricas ou, antes, para ser mais exato, a de explorar as connected histories” (Gruzinski, 2003Gruzinski, S. (2003). O historiador, o macaco e a centaura: a “história cultural” no novo milênio. Estudos Avançados, 17(49), 321., p. 19). Para tanto, tivemos que nos converter em uma: “[...] espécie de eletricista encarregado de restabelecer as conexões internacionais e intercontinentais” (Gruzinski, 2003Gruzinski, S. (2003). O historiador, o macaco e a centaura: a “história cultural” no novo milênio. Estudos Avançados, 17(49), 321., p. 19). A metáfora do eletricista, encarregado de restabelecer as conexões internacionais e intercontinentais, oferecida pelo historiador francês Serge Gruzinski, é utilizada para conectar uma trama de relações sobre a educação de adultos no espaço Brasil/México.

A partir disso, formulamos alguns questionamentos: Como se estabeleceu a relação entre Lourenço Filho e Jaime Torres Bodet, em prol da educação de adultos na América Latina? Como e porque o Brasil se apropriou das iniciativas mexicanas para educação de adultos? De que natureza foi o material usado para alfabetizar adultos em ambos os países? O que representou a realização do VI Seminário Interamericano de Alfabetização e Educação de Adultos no Brasil?

“Viejito... Pero aprendiendo”9 9 Este trecho foi retirado de uma fotografia, que mostra um cartaz educativo do Crefal. Tem o sentido de que nunca é tarde para se alfabetizar um adulto. : a campanha de educação de adultos no Brasil e o exemplo mexicano

Campanha brasileira de alfabetização

Uma campanha no Brasil destinada a letrar analfabetos de todas as idades para ler e escrever resultou no estabelecimento desde o início de 1947 de quase 14.000 escolas. Isso foi anunciado pelo brasileiro e Diretor-geral da Educação Dr. Lourenço Filho, delegado da Segunda Conferência Geral da Unesco, em uma coletiva de imprensa na Cidade do México em 25 de novembro, que declarou que era em grande parte devido ao exemplo do México que o Brasil iniciou sua campanha de Educação Fundamental (Brazil campaign for literacy, 1948Brazil Campaign for Literacy. (1948). The Unesco Courier, I(1), 4., p. 4, tradução nossa)10 10 “Brazil Campaign for Literacy - A campaign in Brazil aimed at teaching illiterates of all ages to read and write has resulted in the establishment since the beginning of 1947 ofnearly 14, 000 schools. This was announced by the’ Brazilian Dire’ Ctor-Generarof' Education, Dr. Lourenço Filho, delegate to Unesco's Second General Conference, at a press conference in Mexico City on November 25, who declared that it was largely due to Mexico’s example that Brazil embarked on its campaign of Fundamental Education”. .

Na entrevista cedida por Lourenço Filho ficou evidente que o exemplo mexicano, em seu conjunto de iniciativas, sobressaltou no cenário mundial e, consequentemente, despertou o interesse de conhecidos educadores. Como foi o caso de Lourenço Filho que viajou para o México duas vezes, cumprindo um plano de trabalho institucional, especialmente por ocasião da II Conferência Geral da Unesco (1947) e a I Reunião do Conselho Interamericano Cultural (1951), sem deixar de percorrer o país em busca de observar o desenvolvimento da educação de adultos, sobretudo no meio rural. Evidências disso foram as imagens das ações do Crefal encontradas no acervo de Lourenço Filho, a exemplo dessa em que aparece um cartaz que anuncia: “Viejito... pero aprendiendo” (Figura 1):

Figura 1
Ação de educação de adultos no Crefal, 1951.

No governo do presidente Eurico Gaspar Dutra (1946-1951), Clemente Mariani (então ministro da Educação e Saúde, no período entre 1946 e 1950), em 1° de fevereiro de 1947, instalou o Serviço de Educação de Adultos, nomeando o professor Lourenço Filho como coordenador da Campanha de Educação de Adultos. De acordo com ele, as propostas da Unesco e a Organização dos Estados Americanos (OEA) deveriam ser seguidas: “[...] nas suas linhas capitais” (Lourenço Filho, 1947Lourenço Filho, M. B. (1947). A campanha de educação de adultos. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, 11(29), 5-14. , p. 14), pois nesse período, as Campanhas de Jovens e Adultos consolidavam os pressupostos e as recomendações de caráter uni versal da Unesco. De acordo com Paiva (1987Paiva, V. P. (1987). Educação popular e educação de adultos. São Paulo, SP: Loyola. ), com o surgimento da Unesco o Brasil passa a sofrer pressões externas para investir nesta problemática. A Unesco, portanto, denunciava ao mundo as profundas desigualdades entre os países e: “[...] alertava para o papel que deveria desempenhar a educação, em especiala educação de adultos, no processo de desenvolvimento das nações categorizadas como ‘atrasadas’” (Haddad & Di Pierro, 2000Haddad. S., & Di Pierro.M. C. (2000). Escolarização de jovens e adultos. Revista Brasileira de Educação, (14), 108-194., p. 111, grifo do autor).

Jaime Torres Bodet propôs a criação, pela Unesco, de centros regionais de educação de adultos: “[...] a população mundial somava 2,378 milhões de pessoas. Destes, 1,200 milhões não sabia ler e escrever. A urgência e necessidade de cuidar deste vasto número de analfabetos eram óbvias.” (Guerra, 2002Guerra, R. A. (2002). El pensamiento de Jaime Torres Bodet: una visión humanista de la educación de adultos (1ª ed.). Michoacán, MX: Crefal. , p. 12, tradução nossa)11 11 “[...] la población mundial sumaba 2,378 millones de personas. De éstas, 1,200 millones no sabían leer y escribir. La urgencia y la necesidad de atender a este inmenso número de analfabetos eran obvias” . Por conseguinte, considerou-se que essa rede de centros de educação de adultos permitiria reduzir, em todo o mundo, esse número de analfabetos.

Este investimento da Unesco em campanhas de erradicação do analfabetismo adulto incluiu a criação de selos postais. A matéria escrita por C. W. Hill, intitulada-Les timbres, alliés de l’ ou A. B. C selos, aliados do A. B. C.-, congrega informações sobre selos postais confeccionados com o propósito de representarem a imagem dos seus respectivos países, enquanto nações empenhadas em combater o analfabetismo na população adulta. A figura 2 abaixo mostra os selos da campanha de alfabetização no Brasil e no México.

Figura 2
Selos da campanha de alfabetização de adultos no Brasil e no México.

Dos selos brasileiro e mexicano, respectivamente, pode-se ler:

A realização de campanhas em larga escala para a educação de adultos não é tarefa fácil em um país como Brasil, onde existem imensos setores com população de cerca de uma por milha quadrada. Mas é isso que o governo vem fazendo desde 1947, após as estatísticas revelarem que 50% da população adulta era analfabeta. Decidindo sobre uma solução em massa, o Governo iniciou um plano para a abertura de 10.000 escolas para analfabetos adultos e adolescentes. O selo simboliza a luz da educação (The Unesco Courier (1958Postage stamps help to fight illiteracy. (1958b). The Unesco Courier , 29. b, p. 29, tradução nossa)12 12 “Carrying out large-scale campaigns for adult education is no easy task in a country like Brazil where there are immense tracts with a population of about one per square mile. But this is what the Government has been doing since 1947 after statistics revealed that over 50 per cent of the adult population was illiterate. Deciding on a masssolution, the Government initiated a plan for opening 10,000 evening schools for adult and adolescent illiterates. Stamp symbolizes light of education”. .

Removendo a venda do analfabetismo simboliza, neste selo mexicano, o esforço educacional em larga escala feito pelo México nos últimos anos. Uma das conquistas mais notáveis dos governos foi a câmara nacional paragem iniciada e desenvolvida entre 1943 e 1946 por Jaime Torres Bodet, ministro da Educação, que mais tarde (1948-53) se tornou Diretor General da Unesco (The Unesco Courier (1958Postage stamps help to fight illiteracy. (1958b). The Unesco Courier , 29. b, p. 29, tradução nossa)13 13 “Removing the bandage of illiteracy symbolizes, on this Mexican stamp, the large-scale educational effort made by Mexico in recent years. One of the most remarkable achievements was the nation-wide campaign initiated and developed between 1943 and 1946 by Jaime Torres Bodet. Minister of Education who later (1948-53) became Director General of Unesco”. .

Em ambos os casos, o autor considerou a atuação de Lourenço Filho e Jaime Torres Bodet como fundamentais nas campanhas em larga escala de combate ao analfabetismo adulto. No caso do selo brasileiro, lê-se: ‘Brasil correio A B C - Campanha de Educação de Adultos’, ilustrado por um homem, propositalmente adulto, realizando uma leitura e no plano de fundo uma explosão de luz que faz alusão à luz trazida pelo conhecimento escolar. No caso do selo mexicano, pode-se ler: ‘Quitemos la venda! Campaña Nacional pro alfabetización’, ilustrado por mãos que retiram a venda dos olhos de um adulto, indicando a necessidade de ler o mundo.

Doravante, as organizações multilaterais, notadamente a Unesco, por intermédio de comitês e comissões, com suas recomendações, resoluções, convenções e acordos internacionais em assuntos educacionais postulavam, imprescindivelmente, orientar ou mesmo intervir nas políticas educacionais nacionais gerais e específicas uniformemente, mediante a convergência de princípios, preceitos teóricos, materiais de ensino e aprendizado, procedimen tos didáticos, pedagógicos e educativos e destinatários das políticas públicas de educação de jovens e adultos. Segundo Araújo, Alcoforado e Ferreira (2015Araújo, M. M., Alcoforado, J. L. M., & Ferreira, A. G. (2015). A educação supletiva nas Campanhas de Jovens e Adultos no Brasil e em Portugal (Século XX). Revista Educação em Questão, 53(39), 12-44. ), nas décadas de 1940 e de 1950, foram oficializadas, no Brasil, no período de 16anos (1947-1963): “[...] as Campanhas de Educação de Adultos, destinadas, par ticularmente, a grupos de jovens e adultos com idade entre 14 a 35 anos que não haviam frequentado a escola ou tinham abandonado precocemente” (Araújo, et al., 2015Araújo, M. M., Alcoforado, J. L. M., & Ferreira, A. G. (2015). A educação supletiva nas Campanhas de Jovens e Adultos no Brasil e em Portugal (Século XX). Revista Educação em Questão, 53(39), 12-44. , p. 17).

As campanhas de educação de adultos, que aconteceram concomitantes em outros países do mundo, tiveram sua importância na medida em que foram definidos os princípios básicos sobre os quais a educação de adultos em todo o mundo deveria ser fundada. Conforme a lista de projetos associados à Unesco em países da América Latina, o Brasil despontava em primeiro lugar e o México em quarto lugar: “1 Brazil - Campanha de Educação de Adultos; 4 Mexico - Ensayo Piloto de Educación Fundamental de Nayarit” (The Unesco Courier (1958Postage stamps help to fight illiteracy. (1958b). The Unesco Courier , 29. b, p. 29). No caso brasileiro, as deliberações da campanha acabaram por resultar no projeto de desenvolvimento de Missões Culturais, inspiradas nas experiências mexicanas de educação voltadas ao meio rural.

Em matéria publicada pelo El Correo de la UNESCO (Educación fundamental por Jonh Bowers, 1948Educación fundamental por Jonh Bowers. (1948). El Correo de la Unesco , I(1), 4., p. 4, tradução nossa)14 14 “The campaign will also be extended through comunal centres and cultural missions, and it is expected that the, number of students will exceed one million in 1948”. , Lourenço Filho declara que: “A campanha também será estendida por meio de centros e missões culturais, e espera-se que o número de alunos excederá um milhão em 1948”. Em outra matéria - Fight ers for literacy ou Lutadores pela alfabetização -Jaime Torres Bodet e Lourenço Filho dividem a mesma página do jornal The UNESCO Courier. Na matéria, ambos foram destacados pelo envolvimento nas campanhas de educação de adultos em seus respectivos países (Figura 3):

Figura 3
Jaime Torres Bodet e Lourenço Filho na mesma página do The UNESCO Courier.

No artigo, Jaime Torres Bodet é descrito como um grande concretizador da política pública contra o analfabetismo, culminando com a criação de 60 mil centros de ensino coletivo, além de impressos de natureza diversa (jornais, livros e cartilhas) destinados ao projeto de alfabetização de jovens e adultos. O artigo louva a tradução das cartilhas para os dialetos indígenas, ágrafos até aquele momento e, por fim, informa que em apenas dois anos o resultado do projeto foi de pouco mais de 1,2 milhões de pessoas alfabetizadas, o que rendeu ao México visibilidade internacional.

Lourenço Filho, por sua vez, foi saudado pelo título de ‘Maestro de las Américas’, conferido a ele pelo seu conhecimento dos sistemas de ensino nos países da América Latina, pela sua projeção nas mais diversas áreas de produção intelectual e nos mais distintos órgãos governamentais, nos idos dos anos de 1920 e 1960. O artigo enfatizou que sua atuação determinou os rumos da educação de adultos no Brasil no século XX, sobretudo pela atuação junto à Unesco, especialmente quando esteve à frente da Campanha. Os resultados considerados positivos dessa liderança, que nos primeiros três anos atingiram cerca de 2milhões de adultos e adolescentes matriculados, conferiu ao Brasil reconhecimento internacional, o resultou na escolha do paíspara sediar o VI Seminário Interamericano de Alfabetização e Educação de Adultos. Ambos os artigos podem ser lidos, respectivamente:

Quando Jaime Torres Bodet se tornou Diretor-geral da Unesco, em 1948, ele já tinha uma distinta carreira como poeta, romancista, ensaísta, educador, diplomata internacional e político. Um dos pontos altos de sua carreira é certamente uma das fases mais brilhantes da história da Educação mexicana, foi o período de 1943 a 1946, quando serviu como Ministro da Educação de seu país e iniciou e desenvolveu uma ampla campanha contra o analfabetismo. Nenhuma campanha desse escopo ou originalidade já havia sido realizada no México. JaimeTorres Bodet fez um apelo para todos os mexicanos instruídos para se tornarem professores ‘emergenciais’ de pelo menos um de seus compatriotas analfabetos. Ele visitou cidades e vilas despertando e inspirando as pessoas. Logo, mais de 60.000 centros de ensino coletivo foram organizados por advogados, médicos, homens de negócios, industriais, agricultores e proprietários de terras pelo presidente do México, Ávila Camacho e sua esposa, juntaram-se como professores para tornar a campanha um sucesso. Colunas especiais de jornais foram impressos e mais de 10.000.000 de livros e cartilhas de leitura elementar começaram a inundar o país. Para aqueles índios do México que não falavam espanhol, Jaime Torres Bodet preparou edições especiais em seus idiomas, que nunca haviam sido escritos antes, ele chamou equipes de linguistas para fazer isso. Quando os resultados foram tabulados após apenas dois anos de trabalho, verificou-se que mais de 1.200.000 de mexicanos foram ensinados a ler e escrever. As campanhas de sucesso incentivam outros países latino-americanos a adotarem métodos semelhantes (The Unesco Courier (1958Fighters for literacy. (1958a). The Unesco Courier , 22-23. a, p. 22-23, tradução nossa)15 15 “When Jaime Torres Bodet became Director-General of Unesco, in 1948, he had already behind him a distinguished career as poet, novelist, essayist, educationist, diplomat and international statesman. One of the high points of his career and certainly one of the most brilliant phases in the history of Mexican education was the period (from 1943 to 1946) when He served as his country's Minister of Education and initiated and developed a nation- unesco wide campaign against illiteracy. No campaign of such scope or originality had ever before been undertaken in Mexico. Torres Bodet appealed to all educated Mexicans to become ‘emergency’ teachers for at least one of their illiterate country men, and He toured towns and villages arousing and inspiring the people. Soon, over 60,000 collective teaching centres were organized and lawyers, doctors, business men, industrialists, farmers and landowners led by the President of Mexico, Avila Camacho, and his wife, joined in as teachers to make the campaign a success. Special wall newspapers were printed and over 10,000,000 elementary Reading books and primers began flooding the country. For those of Mexico's Indians who did not speak Spanish, Torres Bodet had special primers prepared in thei rlanguages and where these languages had never before been written down He called in teams o flinguists to do this. When the results were tabulated after only two years of work, it was found that over 1,200,000 Mexicans had been taught to read and write. The successful campaigns encouraged other Latin American countries toadopt similar methods”. .

O Brasil iniciou um ataque em larga escala em 1947, lançando uma ampla campanha de educação de adultos. A área tremenda e escassamente povoada do país há um índice de analfabetismo adulto de mais de 55% que consiste em um problema cuja solução exigia concepções e métodos ousados de educação fundamental e liderança vigorosa. O homem que deu liderança e força motriz para a campanha foi Manoel Lourenço Filho. Um dos principais educadores da Unesco, autor e professor de psicologia no Brasil, Lourenço Filho já dedica seus esforços há mais de um quarto de século à causa da educação em seu país. O custo dos primeiros três anos da campanha de educação de adultos, 100 milhões de cruzeiros (55.000.000), foi justificado pelos resultados. Em 1947, havia 10.416 escolas ‘Campanha’ em operação; no ano seguinte, 14.300, e em 1949 o número alcançado 15.300. Nos primeiros três anos, cerca de 2.000.000 de adultos e adolescentes matriculados e mais de 1.000.000 de pessoas foram ensinadas ler e escrever. A abordagem brasileira dos problemas da educação fundamental foi observada com interesse em outros países: o cuidadoso equilíbrio mantido entre a escola e a educação de adultos; o edifício em uma base sólida de fatos estatísticos e a ligação dos diversos interesses das comunidades em alfabetização, melhorou a saúde e a agricultura. Com liderança bem-sucedida de Lourenço Filho a campanha ganhou reconhecimento internacional e, em 1949 no Seminário Interamericano de Alfabetização e Educação de Adultos, ele foi saudado como El Maestro de las Americas (Professor das Américas) (The Unesco Courier, 1958Fighters for literacy. (1958a). The Unesco Courier , 22-23. a, p. 22-23, tradução nossa)16 16 Brazil began a full-scale attack on illiteracy in 1947 by launching a nation wide adult education campaign. The country's tremendous and sparsely populated área and an adult illiteracy figure of over 55 per cent created problems whose solution called for bold conceptions and methods of fundamental educationand for vigorous leadership. The man who gave leadership and driving force to the campaign was Manoel Lourenço Filho. One of unesco Brazil's leading educators, author and professor of psychology, Lourenço Filho had already devoted his efforts for more than a quarter of a century to the cause of education in his country. The cost of the first three years of the adult education campaign, 100 millions cruzeiros (55,000,000), was justified by the results. In 1947, there were 10,416 ‘Campaign’ schools in operation; in the following year, 14,300, and in 1949 the number reached 15,300. In the first three years about 2,000,000 adults and adolescents enrolled and more than 1,000,000 people were taught to read and write. Brazil’s approach to fundamental education problems was watched with interest in other countries: the careful balance maintained between school and adult education; the building on a solid basis of statistical fact and the linking together of the varied interests of communities in literacy, better health and farming. Lourenço Filho's successful leadership of the campaign won him international recognition, and at the 1949 Inter-American Seminar on Illiteracy and Adult Education, hew as hailed as El Maestro de las Americas (Teacher of the Americas)”. .

Com Jaime Torres Bodet à frente da Unesco, o México despontou como um pioneiro laboratório de experiências educativas em larga escala, aperfeiçoando investigações que almejavam igualar a qualidade e os níveis de ensino dos sistemas educativos internacionais, perspectivando uma margem de resultados mais efetivos no tocante à alfabetização em idade escolar e extraescolar. Assim, Jaime Torres Bodet e Lourenço Filho foram sujeitos que atuaram em seus respectivos países ante as políticas nacionais e internacionais de combate ao analfabetismo e campanhas de educação de adultos. Segundo a Unesco, eles foram homens: “[...] que ensinaram seu povo a ler na América” (The Unesco Courier (1958Fighters for literacy. (1958a). The Unesco Courier , 22-23. a, p. 21, tradução nossa)17 17 “[...] que enseñaron a leer a su Pueblo en América”. e, por isso, em certa medida sofreram influência mútua, com a troca de referenciais educacionais. As experiências mexicanas, com seus métodos e teorias, serviram de referência para outras campanhas de educação de adolescentes e adultos em outros países, inclusive o Brasil.

Nas décadas de 1940 e 1950, Brasil e México eram os países com a população mais numerosa da América Latina, pois juntos reuniam aproximadamente a metade dos habitantes. Por isso, os números absolutos de analfabetos adultos eram preocupantes em ambos os países. Nos anos 1950, o Brasil tinha uma taxa de analfabetismo de 51% entre a população com mais de 15 anos, e o México de 43%. No entanto, essa sistematização estatística deve ser questionada. Longe de serem neutras, “[...] as estatísticas expressam posições e interesses bem delimitados pela maneira como são organizados os dados, nas categorias formuladas, na decisão do que incluir e de que cálculos fazer” (Gil, 2007Gil, N. L. (2007). A dimensão da educação nacional: um estudo sócio- istórico das estatísticas oficiais da escola brasileira (Tese de Doutorado). Faculdade de Educação. Universidade de São Paulo, São Paulo., p. 19). Em relação às estatísticas educacionais utilizadas pela Unesco, essas usufruíram de crescente interesse nesse momento histórico porque sintetizavam dois dos signos da modernidade à qual, então, o Brasil e o México buscavam-se alinhar-se: a racionalidade científica e a escola elementar.

No caso brasileiro, ganhou destaque internacional o envolvimento da professora Zilma Coelho Pinto e do seu planejamento pedagógico em favor da alfabetização, assistência social e profissionalização, durante a primeira CEAA, em Cachoeiro de Itapemirim, Espírito Santo, entre 1947 e 1963. A alfabetização proposta pela professora Zilma “[...] envolveu outros conteúdos, a saber: valores e comportamentos pautados em preocupações com a higiene, a saúde e a moral” (Costa, 2017Costa, D. M. V. (2017). Civilizar o campo: educação, saúde e iniciação profissional nos cursos de alfabetização da professora Zilma Coelho Pinto, no estado do Espírito Santo (1947-1963). Comunicações, 24(3), 279-305., p. 279). O caso da professora ganhou uma página no El Correo de la Unesco, com a denominada “La ‘loca de la escuela’: campaña contrael analfabetismo en el Brasil” (Figura 4). Segundo a publicação:

O começo foi muito difícil e Dona Zilma teve que mostrar muita paciência e energia para levantar a modesta soma com que empreender sua campanha, enfrentando impassivelmente as zombarias e críticas de muitos. Havia quem a chamasse de ‘a louca de Itapemirim’; também que a batizou com o nome ridículo de ‘a mendiga’[...] Mas Dona Zilma não desanimou com tão pouco: ora a pé, ora a cavalo, organizava coletas em todos os bairros da cidade e nas roças vizinhas (El Correo de la Unesco, 1950Seminario de enseñanza primaria en Montevideo. (1950). El Correo de la Unesco , 3(10), 2., p. 12, tradução nossa, grifo do autor)18 18 “El comienzo fué harto difícil y doña Zilma debió dar prueba de gran paciencia y energía para reunir la modesta suma con que emprender su campaña, afrontando impasible las burlas y las criticas de muchos. Hubo quien la llamaba ‘la loca de Itapemirim’; también quien la bautizó con el nombre irrisorio de ‘la mendiga’ […] Pero doña Zilma no se desanimaba por tan poca cosa: a pie unas veces, otras a caballo, fué organizando colectas en todos los barrios de la ciudad y en los campos vecinos”. .

Figura 4
Zilma Coelho Pinto, em Cachoeiro de Itapemirim, Espírito Santo, 1947.

A participação ativa da professora Zilma, na CEAA, construiu uma boa relação entre ela e o professor Lourenço Filho. Costa (2017Costa, D. M. V. (2017). Civilizar o campo: educação, saúde e iniciação profissional nos cursos de alfabetização da professora Zilma Coelho Pinto, no estado do Espírito Santo (1947-1963). Comunicações, 24(3), 279-305.) encontrou, nos documentos pessoais arquivados por sua família, uma carta enviada e assinada por Lourenço Filho, que acredita se tratar de um prefácio de um livro sobre a campanha dirigida pela professora. Nela, Lourenço Filho não mede palavras para elogios à atuação de Zilma, tal relação de certa forma explica a divulgação das ações dessa professora nas páginas do jornal El Correo de la Unesco. Aqui nos resta interrogar: Qual o envolvimento de Lourenço Filho e Jaime Torres Bodet com o mercado editorial de alfabetização de adultos?

“Para ensinar a ler rapidamente”19 19 Lema/expressão retirado da Cartilha do povo: para ensinar a ler rapidamente, de Lourenço Filho (1956). : as cartilhas de alfabetização de adultos no Brasil e México

Que a Cartilha do povo, como o seu próprio título indica, continue a concorrer para a educação de crianças e adultos, mesmos os mais distanciados dos grandes centros, ensinando a ler e escrever milhões de brasileiros, da forma mais simples. A educação popular não se resume, certamente, nesse aprendizado. A leitura e a escrita representam apenas um instrumento, não trazem em si mesmas uma finalidade. Educar o povo será dar-lhe também o civismo, a capacidade de produção, a saúde, o emprego sadio das horas de lazer (Lourenço Filho, 1956Lourenço Filho, M. B. (1956). Cartilha do povo: para ensinar a ler rapidamente. São Paulo, SP: Melhoramentos., p. 2).

As palavras acima foram extraídas da recomendação ‘Aos senhores professores’, que abre a Cartilha do povo: para ensinar a ler rapidamente, de Lourenço Filho (1956Lourenço Filho, M. B. (1956). Cartilha do povo: para ensinar a ler rapidamente. São Paulo, SP: Melhoramentos.). Ele teve uma relação estreita com o mercado editorial da época, traduzida em inúmeros títulos publicados, prefaciados ou organizados. Segundo Silva e Guimarães (2017Silva, R. R. N., & Guimarães, J. F. S. (2017). “Para ensinar a ler rapidamente”: a Cartilha do povo e os seus leitores no meio rural sergipano (1940-1950). In Anais do Congresso Brasileiro de História da Educação (p. 4380-4393). João Pessoa, PB. Recuperado de: https://drive.google.com/drive/folders/1vVImmMHMKniTKJWj36SyEONLM5MAdJv0
https://drive.google.com/drive/folders/1...
), a proposta de alfabetização de Lourenço Filho sintetizada em Cartilha do povo “[...] correspondeu à tentativa de responder às demandas de erradicação do analfabetismo, sobretudo no que diz respeito a crianças e adultos” (Silva & Guimarães, 2017Silva, R. R. N., & Guimarães, J. F. S. (2017). “Para ensinar a ler rapidamente”: a Cartilha do povo e os seus leitores no meio rural sergipano (1940-1950). In Anais do Congresso Brasileiro de História da Educação (p. 4380-4393). João Pessoa, PB. Recuperado de: https://drive.google.com/drive/folders/1vVImmMHMKniTKJWj36SyEONLM5MAdJv0
https://drive.google.com/drive/folders/1...
, p. 4382). A preocupação maior do autor consistia em ofertar, portanto, um instrumento de educação de alcance popular, correspondente à técnica do ler e do escrever, entendida como uma maneira de aquisição de cultura letrada.

Ao assumir a direção da CEAA, o intelectual levou a cabo as ações do setor de orientação pedagógica, supervisionando a elaboração do material que seria posto em circulação pela campanha. Conforme previsto pela Unesco em suas recomendações, ao menos o material inicial da Campanha, destinado ao primeiro ciclo de alfabetização, indicava preocupações gerais com a formação e a adaptação do cidadão ao ambiente social. Avultam-se, então, regras para a boa preservação da “[...] saúde, que variam desde o cuidado com moscas, mosquitos e piolhos, vetores de doenças, até indicações de oito horas de sono diárias para o restabelecimento do trabalhador” (Azevedo, 2019Azevedo, F. V. (2019). A educação de adultos no itinerário intelectual de Jaime Torres Bodet e Lourenço Filho: mediações entre campanhas locais e o debate transnacional (1944-1949) (Tese de Doutorado). Universidade Estadual de Santa Catarina (UDESC), Florianópolis., p. 93).

Ao fomentar o processo de ampla distribuição do material dirigido à alfabetização e leitura dos adultos alcançados pelo movimento campanhístico em voga, Lourenço Filho posiciona a campanha nos quadros comparativos com os demais países da América Latina. Com isso, o localismo brasileiro tendia a circular internacionalmente com o objetivo da partilha de experiências pedagógicas.

A experiência mexicana serviu de modelo para o Brasil, inclusive no aspecto editorial. Nesse período, o Ministério da Educação: “[...] fez imprimir quinhentos mil ‘Guias de Leituras’ com o fito de servir ao plano nacional de alfabetização de adultos, [...] a exemplo do que já se fez em outros países do mundo, especialmente o México” (Brasil, 1947, p. 08, grifo do autor). A partir dos estudos de García (2014García, A. A. L. (2014). La alfabetización en México: campañas y cartillas, 1921-1944. Traslaciones. Revista Latinoamericana De Lectura Y Escritura, 1(2), 126‐149. ), a Campanha Nacional contra o analfabetismo, levada a cabo no México por Jaime Torres Bodet, possui pontos de similitudes com a campanha brasileira, a saber: luta contra o inimigo comum do analfabetismo; apelo ao voluntariado; uso de cartilhas específicas para adultos, entre outras características.

Segundo o relatório A educação rural no México, construído por Lourenço Filho, a máxima ‘Saber ler e escrever’, enquanto o mínimo necessário para o indivíduo: “[...] não se logrou obter por igual para todos os mexicanos - julgamos indispensável propor a questão em termos nacionais” (Lourenço Filho, 1952Lourenço Filho, M. B. (1952). A educação rural no México. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos , 17(45), 108-198., p. 162). O problema do analfabetismo no México recaía em problemas sociais, como o alcoolismo, a criminalidade, a mendicância e o desenvolvimento precário da agricultura e das indústrias. Neste contexto, a campanha contra o analfabetismo deveria visar, de modo particular, as populações rurais e indígenas, sobretudo os falantes das línguas maya, tarasco, otomi náhuatl, náhuatl, uma vez que:

[...] as populações rurais, onde era, e é, ainda hoje, maior a taxa de analfabetos, e onde também comunidades inteiras da população indígena não praticam o espanhol. Para que o ensino a essas populações pudesse alcançar, foi criado um instituto especial, que se incumbiu de redigir cartilhas em idiomas maya, tarasco, otomi náhuatl (variante de Puebla) e náhuatl (variante de Morelos). Um grupo de cinqüenta professores, conhecedores desses idiomas nativos, foram preparados para transmitir aos mestres rurais os processos de ensino mais recomendáveis, em cada caso (Lourenço Filho, 1952Lourenço Filho, M. B. (1952). A educação rural no México. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos , 17(45), 108-198., p. 162, grifo do autor).

À época, parte da problemática indígena era seu completo desconhecimento do idioma oficial, o espanhol, o que impedia seu status educacional e cívico. Para tentar resolver este problema, foram elaboradas cartilhas apropriadas para a alfabetização da população indígena em quatro idiomas diferentes: náhuatl/español, otomí/español, maya/español, tarasco/español.

Foi nesse contexto que a Unesco organizou, em conjunto com o governo do Brasil e a OEA, o VI Seminário Interamericano de Alfabetização e Educação de Adultos, em 1949.

“América se alfabetizará - aportación quedará nuestro país”20 20 Esta expressão foi retirada do jornal mexicano Novidades (1949), como uma aposta nas campanhas de alfabetização. : o VI Seminário Interamericano de Alfabetização e Educação de Adultos

América se alfabetizará - a contribuição que dará nosso país

O México levará ao Seminário de Estudos Práticos sobre a alfabetização na América, que por iniciativa do Secretário-Geral da Unesco, Jaime Torres Bodet, foi inaugurado hoje na cidade do Rio de Janeiro, todo o acervo técnico e as experiências coletadas em nosso país e nos cursos dos trabalhos da Campanha Nacional contra o analfabetismo.Nossas autoridades docentes têm o propósito de colocar à disposição das nações irmãs do Continente, que se interessaram profundamente pela obra educacional que se desenvolve no país, miniciosas informações acerca das realizações alcançadas em nosso meio, no que diz respeito à incorporação cultural dos analfabetos. [...] O professor Bonilla levará consigo uma ampla documentação acerca da forma como está sendo atacado o tremendo problema dos analfabetos em nosso país, incluindo filmes ilustrativos, gráficos e vários elementos ilustrativos (Novidades, 1949, p. 1, tradução nossa)21 21 “América se alfabetizará - aportación quedará nuestro país. México llevará al Seminario de Estudios Prácticos sobre alfabetización en América, que a iniciativa del secretario general de la Unesco, Jaime Torres Bodet, se inauguró hoy en la ciudad de Rio Janeiro, todo el acervo técnico y las experiencias recogidas en nuestro país y en el curso de los trabajos de la Campaña Nacional contra el analfabetismo. Nuestras autoridades docentes tienen el propósito de poner a disposición de las naciones hermanas del Continente que se han interesado vivamente por la obra educacional que se desenvolve en el país, minuciosa información acerca de las realizaciones alcanzadas en nuestro medio en lo que toca a la incorporación cultural de los iletrados. [...] El profesor Bonilla lleva consigo amplia documentación acerca de la forma en que ha atacado en nuestro país el tremendo problema de los analfabetos, incluyendo películas ilustrativas, gráficas y diversos elementos ilustrativos”. .

A matéria escrita no jornal mexicano Novidades explicita a intenção de Jaime Torres Bodet em levar ao VI Seminário Interamericano de Alfabetização e Educação de Adultos22 22 Até o momento não foram encontradas informações sobre os seminários realizados anteriormente. , realizado no Hotel Quitandinha, Petrópolis, Rio de Janeiro, de 27 de julho a 02 de setembro de 1949, as experiências sociais e técnicas vivenciadas no México, que incluíam filmes ilustrativos e gráficos utilizados na Campaña Nacional pro Alfabetización em curso no país. O então secretário de Educação Pública do México, Manuel Gual Vidal, enviou uma delegação ao Seminário de Alfabetização, chefiada pelo professor Guillermo Bonilla, conhecido como El Maestro, organizador das famosas Missões Culturais de alfabetização no México e então diretor de educação extracurricular.

O ano de 1949 foi notadamente singular para a educação de adultos no cenário global. O setor de educação extraescolar da Unesco elencou dois eventos importantes que colocaram em pauta o tema, sendo o primeiro a Conferência realizada em Elsinore23 23 Realizada em julho de 1949, a Conferência de Elsinore, na Dinamarca, foi uma das primeiras iniciativas que colocaram na agenda internacional a pauta da educação de adultos. Na ocasião estavam presentes mais de 150 educadores, o evento foi o marco inicial da escalada internacional de Jaime Torres Bodet, então presidente da conferência e diretor-geral da Unesco, contra o analfabetismo adulto. e o segundo o VI Seminário Interamericano de Alfabetização e Educação de Adultos. Nesse sentido, as recomendações e acordos que foram deliberadas a partir dessas reuniões: “[...] representam uma vontade de mudança por parte das nações e do corpo de especialistas convocados, mas também um embate por disputas pela visibilidade dos projetos políticos e pedagógicos em debate” (Azevedo, 2019Azevedo, F. V. (2019). A educação de adultos no itinerário intelectual de Jaime Torres Bodet e Lourenço Filho: mediações entre campanhas locais e o debate transnacional (1944-1949) (Tese de Doutorado). Universidade Estadual de Santa Catarina (UDESC), Florianópolis., p. 111). Estes espaços legitimados pela Unesco serviam para discussão do destino da educação de adultos mundialmente, além de se constituírem em um lugar de circulação de referências legitimadas para tratar do assunto.

O VI Seminário Interamericano de Alfabetização e Educação de Adultos aconteceu com a cola boração da Unesco, OEA, Organização Internacional do Trabalho [OIT], da Organização Mundial da Saúde [OMS], do Escritório Internacional de Educação24 24 Atual Departamento Internacional de Educação, situado em Genebra no Escritório das Nações Unidas. de Genebra (dirigido naquele momento por Jean Piaget) e, no caso brasileiro, do Instituto Brasileiro de Educação Ciência e Cultura [IBECC]. Estes organismos internacionais fomentaram uma agenda única na alfabetização e educação de adultos no continente americano, reforçando o projeto coletivo transnacional de atenção aos altos índices de analfabetismo estatisticamente levantados, que deixam as sombras dos problemas nacionalmente localizados e se unem ao clamor global levantado por Torres Bodet na reunião de abertura do Seminário sediado no Brasil. O acontecimento foi divulgado no The UNESCO Courier, com a seguinte chamada: The latin american struggle against illireracy, ou seja, ‘A luta latino-americana contra o analfabetismo’ (Figura 5):

Figura 5
Matéria do The UNESCO Courier sobre o Seminário Interamericano de Alfabetização e Educação de Adultos, Rio de Janeiro, 1949.

Apenas diante do recorte do ano de 1949, torna-se evidente o espaço que a alfabetização de adultos ocupa na agenda institucional da Unesco. Principal entidade direcionadora dos meios de universalização da educação, a Unesco foi o órgão responsável por estabelecer o diálogo entre as partes interessadas e o intercâmbio de conhecimento, a fim de: “[...] nortear os principais objetivos da bandeira educacional, organizando seminários e conferências para o debate e nivelamento de novas ideias, pesquisas e resultados de campo” (Azevedo, 2019Azevedo, F. V. (2019). A educação de adultos no itinerário intelectual de Jaime Torres Bodet e Lourenço Filho: mediações entre campanhas locais e o debate transnacional (1944-1949) (Tese de Doutorado). Universidade Estadual de Santa Catarina (UDESC), Florianópolis., p. 112). Dentre as recomendações da Unesco estava a organização de seminários internacionais sobre a educação de adolescentes e adultos, conforme publicado no El Correo de la UNESCO:

A fim de realizar os objetivos da Unesco e colocar em prática as recomendações da Conferência (sugere-se) a criação de um órgão de cooperação entre as instituições e as pessoas que dirigem a educação de adultos no mundo inteiro. Se subentende que uma organização desse gênero deve, nas atuais circunstâncias, fazer uso das facilidades oferecidas pela Unesco e operar por meio dela.[...] Outra resolução importante, adotada pela Conferência, sublinha, a fim de estender o movimento de educação de adultos a todo o mundo, a necessidade de organizar seminários internacionais para o estudo dos problemas particulares da educação de adultos.‘Se trata de uma função da Unesco’, declara a resolução, ‘V recomendamos encarecidamente que a Unesco organize a partir de agora um seminário a ser realizado em 1950’.(El Correo de la Unesco, 1949Educación de adultos. (1949a). El Correo de la Unesco, II(6), 8.a, p. 8, tradução nossa, grifo do autor)25 25 “Con el fin de realizar los objetivos de la Unesco y llevar a la práctica las recomendaciones de la Conferencia (se sugiere) la creación de un organismo de cooperación entre las instituciones y las personas que dirigen la educación de adultos en el mundo entero. Se sobreentiende que una organización de este género debe, en las presentes circunstancias, servirse de las facilidades que le ofrece la Unesco y funcionar a través de ésta. [...] Otra resolución importante, adoptada por la Conferencia, subraya, con el fin de extender el movimiento de educación de adultos al mundo entero, la necesidad de organizar seminários internacionales para el estudio de los problemas particulares de la educación de adultos. ‘Se trata de una función de la Unesco’, declara la resolución, ‘V recomendamos encarecidamente a la Unesco que organice desde ahora un seminário que se celebrará en 1950”. .

Por ocasião desse seminário, estiveram presentes delegados, observadores e técnicos de países americanos (Guatemala, México, Venezuela, notadamente), incluso o Ministro da Educação Nacional da Colômbia e membro do Conselho Executivo da Unesco, Guillermo Nannetti. Segundo o jornal El Correo de la UNESCO, esse educador se tratava de: “[...] especialista em educação fundamental e educação de adultos. Atualmente está encarre de dirigir o grupo de educação de adultos do Seminário, para o estudo do analfabetismo na América” (El Correo de la Unesco, 1949Un problema mundial. (1949c). El Correo de la Unesco , II (6), 1.c, p. 12, tradução nossa)26 26 “[...] un experto en educación fundamental y educación de adultos. Actualmente está encargado de dirigir el grupo sobre educacion de adultos del Seminario, para el estudio del analfabetismo en América”. . A fotografia abaixo mostra Guillermo Nannetti, Lourenço Filho e demais educadores no referido seminário (Figura 6):

Figura 6
Francisco Jarussi, F. J. Rex, Carmela Tejada, Lourenço Filho e Guillermo Nannetti no Seminário Interamericano de Alfabetização e Educação de Adultos, 1949.

Guillermo Nannetti juntamente com demais especialistas compuseram, durante as cinco semanas do seminário, o primeiro Manual de educación de adultos, posteriormente publicado em português e espanhol. O manual tratava os aspectos fundamentais da educação de adultos (Tejada, 1950Tejada, C. (1950). The Interamerican Seminar on Literacy and Adult Education - Rio de Janeiro. Washington, DC: Pan American Union (Division of Educacion - Department of Culturals Affairs).), são eles: objetivos e conteúdo; método; a ação de grupos sociais primários; instituições e meios; educadores de adultos. Os nomes dos principais convidados para esse seminário foram divulgados em uma nota publicada em 1º de outubro de 1949 pelo El Correo de la UNESCO. Nela, estas personalidades estão listadas:

[…] o organizador das famosas ‘Missões Culturais’ de alfabetização no México, Professor Guillermo Bonilla Segura, conhecido simplesmente em todo o seu país como ‘El Maestro’;o jovem e enérgico Ismael Rodríguez Bou, pesquisador pedagógico de Porto Rico; o grande e agudo espírito estatístico da Argentina, Ernesto Nelson; o psicólogo suíço Jean Piaget; a especialista em cartilhas alfabetização Aun Nolan Ciar, dos Estados Unidos, e o Coronel George Selwyn Simpson, com seus 35 anos de experiência no ensino de alfabetização no Exército Britânico.O Governo do Brasil enviou para este seminário seus especialistas em pedagogia: Fernando Tude de Souza, Antonio Almeida Júnior, Mário Teixeira de Freitas e Mário Paulo de Brito. O Dr. ‘Lourenço Filho’, que com tanto êxito dirigiu no Brasil, durante dois anos e meio, a campanha contra o analfabetismo no Brasil, deixou seu gabinete, no décimo quarto andar do ultramoderno Ministério da Educação e Saúde, para assumir a direção do seminário internacional.(El Correo de la Unesco, 1949bEn Quitandinha los educadores fijan sus planes para la campaña latinoa mericana de “alfabetización”. (1949b). El Correo de la Unesco , II(9), 2., p. 2, tradução nossa, grifo do autor)27 27 “[...] el organizador de las célebres ‘Misiones Culturales’ de alfabetización en México, Profesor Guillermo Bonilla Segura, conocido sencillamente en todo su país como ‘El Maestro’; el joven y enérgico Ismael Rodríguez Bou, investigador pedagógico de Puerto Rico; el agudo y gran espíritu estadístico de la Argentina, Ernesto Nelson; el psicólogo suizo Jean Piaget; la especialista en cartillas de alfa betización, Aun Nolan Ciar, de los Estados Unidos, y el Coronel George Selwyn Simpson, con sus 35 años de experiencia en la enseñanza de la alfabetización en el Ejército británico. El Gobierno del Brasil envió a este seminario a sus expertos en pedagogía: Fernando Tude de Souza, Antonio Almeida Júnior, Mário Teixeira de Freitas, y Mario Paulo de Brito. El Dr. ‘Lourenço Filho’, que con tanto éxito dirigió en el Brasil, por espacio de dos años y medio, la campaña contra el analfa betismo, dejó su despacho, en el decimocuarto piso del ultramoderno Ministerio de Educação e Saude, para encargarse de la dirección del seminario internacional” .

Os nomes citados demonstram a rede de políticos, educadores e intelectuais nacionais e internacionais envolvidos nesse seminário. O Quadro 1mostra os grupos, temas e nomes dos presidentes do seminário (Quadro 1):

Quadro 1
Grupos, temas e nomes dos presidentes do Seminário Interamericano de Alfabetização e Educação de Adultos, 1949

Aqui também se faz necessário mencionar que o professor suíço Jean Piaget28 28 Há outras versões sobre os motivos da vinda de Jean Piaget ao Brasil e sua participação do VI Seminário Interamericano de Alfabetização e Educação de Adultos no Rio de Janeiro, em 1949. Segundo Vasconcelos (1996), Nilton Campos (ocupante da cátedra de Psicologia da Faculdade Nacional de Filosofia) e Lourenço Filho o convidaram para participar desse seminário. Porém, é certo o fato de que Jean Piaget representava a Unesco e, por solicitação de Nilton Campos, Maurício de Medeiros, Peregrino Jor e Farias Goes Sobrinho, o Conselho Universitário da Universidade do Brasil, concedeu-lhe o título de doutor honoris causa.Na ocasião, proferiu, nas dependências da Faculdade Nacional de Filosofia, uma conferência sobre epistemologia genética. A esse respeito, ver Vasconcelos (1996). participou do seminário enquanto representante designado por Jaime Torres Bodet, pois conforme acima anotado, ele ocupava o cargo maior Escritório Internacional de Educação da ONU. Segundo o discurso de Lourenço Filho, por ocasião da abertura do evento: “Aqui nos sentimos amparados pela Organização das Nações Unidas, cujo Secretário-Geral teve a gentileza de enviar seu digno representante.” (Lourenço Filho, 1950Lourenço Filho, M. B. (1950). Eco del Seminario del Río. Educación Fundamental, 2 (1). , p. 19, tradução nossa)29 29 “Aquí nos sentimos amparados por la Organización de las Naciones Unidas, cuyo Secretario General tuvo la amabilidad de enviar a su digno representante”. . E continuou: “[...] cujo eminente Diretor da UNESCO, Dr. Jaime Torres Bodet, nos enviou uma mensagem tão expressiva e mandou apresentar uma grande figura, o Professor Jean Piaget” (Lourenço Filho, 1950Lourenço Filho, M. B. (1950). Eco del Seminario del Río. Educación Fundamental, 2 (1). , p. 19, tradução nossa)30 30 “[...] cuyo eminente Director de la UNESCO el Dr. Jaime Torres Bodet, nos envió tan expresivo mensaje y mandó para presentarle una gran figura, el Profesor Jean Piaget”. . A Figura 7 mostra o professor suíço no referido evento:

Figura 7
Da esquerda para a direita: Jean Piaget, Lourenço Filho; Ernesto Nelson e Teixeira de Freitas de pé falando sobre estatísticas no Brasil.

A participação de Jean Piaget nesse seminário, dada sua importância intelectual, conferiu mais robustez teórica ao evento. No entanto, aqui nos interrogamos: Esse intelectual teria alguma reflexão pedagógica voltada para a educação de adultos? Seus estudos sobre a epistemologia genética e as fases da criança se aplicavam - de igual maneira - para os adultos analfabetos? Parte da resposta para estas perguntas está nas reflexões de Di Pierro, Joia & Ribeiro (2001Di Pierro, M. C., Joia, O., & Ribeiro, V. M. (2001). Visões da educação de jovens e adultos no Brasil. Cadernos CEDES, 21(55), 58-77. ). Segundo esses autores, a Campanha de 1947

[...] deu também lugar à instauração no Brasil de um campo de reflexão pedagógica em torno do analfabetismo e suas consequências psicossociais; entretanto, ela não chegou a produzir nenhuma proposta metodológica específica para a alfabetização de adultos, nem um paradigma pedagógico próprio para essa modalidade de ensino. Isso só viria a ocorrer no início dos anos [19]60, quando o trabalho de Paulo Freire passou a direcionar diversas experiências de educação de adultos organizadas por distintos atores, com graus variados de ligação com o aparato governamental (Di Pierro, Joia & Ribeiro, 2001Di Pierro, M. C., Joia, O., & Ribeiro, V. M. (2001). Visões da educação de jovens e adultos no Brasil. Cadernos CEDES, 21(55), 58-77. , p. 61).

Outra hipótese para responder a essas questões reside no equívoco de se considerar que o processo de alfabetização seria o mesmo em qualquer idade, ou seja, o uso de métodos e teorias que eram idênticas às utilizadas com crianças no ensino primário para a educação de adultos. Só então, a partir de Paulo Freire e o conjunto de experiências dos programas do Movimento de Cultura Popular do Recife, do Movimento de Educação de Base (MEB), ambos iniciados em 1961, dos Centros Populares de Cultura da União Nacional dos Estudantes, que foi possível a construção de um arcabouço teórico e, sobretudo, metodológico em matéria de educação de adultos.

Por certo, esse evento denotou a relação de proximidade que se estabeleceu entre Lourenço Filho e Jaime Torres Bodet, por intermédio desse seminário. Tal proximidade também se mostrou em uma matéria publicada no El Correo de la UNESCO, intitulada ‘Un problema mundial’:

É de se esperar que a qualidade dos participantes e a boa organização do Seminário confiado ao professor brasileiro ‘Lourenço Filho’, contribuam em alto nível para o êxito desta empresa.

Por sua vez, a Unesco tem insistido com especial ênfase no caráter mundial que deve ter o Seminário. O Dr. ‘Jaime Torres Bodet’, em nome da Instituição, convidou todos os países a enviarem seus representantes (El Correo de la Unesco, 1949Un problema mundial. (1949c). El Correo de la Unesco , II (6), 1.c, p. 1, tradução nossa, grifo do autor)31 31 “Es de esperar que la calidad de los participantes y la buena organización del Seminario encomendada al profesor brasileño ‘Lourenço Filho’, contribuirán en alto grado al éxito de esta empresa. Por su parte, la Unesco ha insistido con especial acento en el carácter mundial que ha de tener el Seminario. El Dr. ‘Jaime Torres Bodet’, en nombre de la Institución, ha invitado a todos los países a que envien sus representantes”. .

Segundo o pronunciamento de Lourenço Filho por ocasião desse seminário, a educação de adultos, especialmente nos países latino-americanos, era insuficiente na medida em que era incapaz de cooperar com a elevação do padrão de vida. “[...] isso explica inclusive a indiferença das pessoas para com ela, a escassa frequência escolar e a falta de prestígio social do professor, bem como a insuficiente remuneração destes” (El Correo de la Unesco, 1950Seminario de enseñanza primaria en Montevideo. (1950). El Correo de la Unesco , 3(10), 2., p. 2, tradução nossa)32 32 “[…] ello hasta a explicar la indiferencia del pueblo hacia la misma, la escasa frecuentación escolar y la falta de prestigio social del maestro, así como la insuficiente remuneración de éstos”. . A mensagem inaugural de Jaime Torres Bodet convergiu com o discurso de Lourenço Filho, quando enfatizou em forma de questionamentos o papel da educação de adultos nos países da América Latina.

Como intensificar as campanhas de alfabetização sem descuidar a reforma adequada dos programas das escolas primárias? Como outorgar maior credibilidade aos planos de estudo, segundo a diversidade das regiões, e como adaptá-los de forma mais racional às necessidades das coletividades rurais? E, por último, Como tornar realidade o princípio da escolaridade obrigatória? Se trata, em suma, de eliminar progressivamente o analfabetismo e elevar, passo a passo, o nível de vida graças a um sistema de educação que abarque todos - e com simultânea eficácia - o ensino primário (El Correo de la Unesco, 1950Seminario de enseñanza primaria en Montevideo. (1950). El Correo de la Unesco , 3(10), 2., p. 2, tradução nossa)33 33 “¿Cómo intensificar las campañas de alfabetización sin descuidar la reforma adecuada de los programas de las escuelas primarias? ¿Cómo otorgar mayor credibilidad a los planes de estudio, según la diversidad de las regiones, y cómo adaptarlos de manera más racional a las necesidades de las colectividades rurales? Y, por último ¿Cómo dar realidad al principio de la escolaridad obligatoria? Se trata, en suma, de eliminar progresivamente el analfabetismo y de elevar, paso a paso, el nivel de vida gracias a un sistema de educación que abarque todo -y con simultánea eficacia-, la enseñanza primaria”. .

As perguntas de Jaime Torres Bodet pareciam transparecer os anseios do organismo internacional que conduzia. A saber: a relação equilibrada entre as campanhas de alfabetização de adultos e a reforma dos programas da escola primária; o sentido dos currículos, de acordo com a diversidade das regiões, especialmente em relação às necessidades das comunidades rurais e, finalmente, a realização do alcance total da escolaridade obrigatória. Em suma, seu discurso estava pautado nos princípios de educação fundamental da Unesco, na medida em que pretendia eliminar progressivamente o analfabetismo e elevar o padrão de vida da população adulta, especialmente nas áreas rurais.

Por fim, podemos considerar que após cinco semanas de estudos, debates e pesquisas, o seminário deliberou uma série de recomendações para a Unesco e para a OEA, dentre elas podemos citar: aperfeiçoar os dados estatísticos em matéria de educação de adultos; desenvolver uma estratégia de ação conjunta nas Américas em relação à educação, ciência e cultura; ofertar aos países signatários os meios necessários para o desenvolvimento de investigações sobre o tema; estruturar um centro interamericano para a elaboração de materiais de formação de professores de adultos; fomentar nas universidades pesquisas com respeito à comunidade local; realizar pesquisas sobre os métodos em voga nos países americanos para tornar a educação de adultos parte do sistema educacional e possibilitar aos adultos obterem certificados ou diplomas; preparar um plano de atividades a ser submetido ao próximo Congresso Interamericano.

Considerações finais

Para fazer a connected history foi preciso assumir o ofício de eletricista encarregado de instalar fios condutores adequados para estabelecer as complexas relações estabelecidas entre Jaime Torres Bodet e Lourenço Filho. Este texto teve como ponto de partida alguns questionamentos sobre a educação de adultos no Brasil e no México e, em que pese os limites, foram respondidos ao longo desta narrativa.

Em síntese, a relação entre esses homens se constituiu no movimento campanhista de erradicação do analfabetismo adulto, em curso em seus países, que resultaram na realização do VI Seminário Interamericano de Alfabetização e Educação de Adultos e, consequentemente, em uma vasta produção intelectual e didática sobre o tema.

Esse seminário se constituiu em um espaço para o debate público acerca do tema, na medida em que as reuniões, os grupos de trabalhos, os jantares, os encontros entre esses agentes públicos (cônsul, delegados, técnicos, embaixadores e diplomatas) serviam para o estabelecimento de uma rede de relações. A atuação desses sujeitos foi decisiva na constituição de seus grupos e espaços de ação, nas redes organizacionais, em torno da Unesco, em que se moveram e atuaram e, por fim, na constituição de projetos políticos para a educação de adultos.

A relação de proximidade entre a Unesco e o Crefal, sobretudo pelo papel desempenhado por Jaime Torres Bodet, indica um dos motivos pelo qual o Brasil se apropriou das iniciativas mexicanas para educação de adultos. Assim, Jaime Torres Bodet e Lourenço Filho, dadas as diferenças de cada um, fôramos intelectuais que se influenciaram mutuamente e despontaram em seus respectivos países no combate ao analfabetismo da população adulta. A máxima ‘luta contra o analfabetismo’ é o maior ponto de similitude que uniu ambos ao campo educacional e pedagógico. Para tanto, Unesco, OEA e Crefal se constituíram no lugar onde a produção intelectual por eles feita ganha o selo de legitimidade e, consequentemente, por meio das publicações oriundas de seminários.

Por fim, esses sujeitos se constituíram em referências sobre o tema, ou seja, foram intérpretes autorizados das políticas latino-americanas de alfabetização de adultos de seus respectivos países, especialmente pela produção do material didático utilizado em ambas as campanhas. Nesta perspectiva, assumem nas atividades da Unesco, OEA e Crefal a notoriedade legitimada por suas ações locais, e, se nos campos educacionais de seus países, tais intelectuais desenvolveram seus ofícios direcionados às ações políticas de instituição de campanhas e elaborações de impressos em matéria de educação de adultos.

Referências

  • Araújo, M. M., Alcoforado, J. L. M., & Ferreira, A. G. (2015). A educação supletiva nas Campanhas de Jovens e Adultos no Brasil e em Portugal (Século XX). Revista Educação em Questão, 53(39), 12-44.
  • Azevedo, F. V. (2019). A educação de adultos no itinerário intelectual de Jaime Torres Bodet e Lourenço Filho: mediações entre campanhas locais e o debate transnacional (1944-1949) (Tese de Doutorado). Universidade Estadual de Santa Catarina (UDESC), Florianópolis.
  • Bodet, J. T. (1969). Años contra eltiempo México, MX: Porrúa.
  • Brazil Campaign for Literacy. (1948). The Unesco Courier, I(1), 4.
  • Brasil. Ministério da Educação e Saúde. Departamento Nacional de Educação. Campanha de Educação de Adultos. (1947). Documentos iniciais da Campanha (Publicação nº 04, jan. 1947, LF, 40f). Rio de Janeiro, RJ: Arquivo Lourenço Filho. CPDOC.
  • Costa, D. M. V. (2017). Civilizar o campo: educação, saúde e iniciação profissional nos cursos de alfabetização da professora Zilma Coelho Pinto, no estado do Espírito Santo (1947-1963). Comunicações, 24(3), 279-305.
  • Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil [CPDOC]. (2020). Recuperado de: https://cpdoc.fgv.br/
    » https://cpdoc.fgv.br/
  • Centro Regional de Educación Fundamental para la América Latina [Crefal]. (1952). Educación fundamental: ideario, principios, orientaciones metodológicas Pátzcuaro, MX.
  • Di Pierro, M. C., Joia, O., & Ribeiro, V. M. (2001). Visões da educação de jovens e adultos no Brasil. Cadernos CEDES, 21(55), 58-77.
  • Educación de adultos. (1949a). El Correo de la Unesco, II(6), 8.
  • Educación fundamental por Jonh Bowers. (1948). El Correo de la Unesco , I(1), 4.
  • En Quitandinha los educadores fijan sus planes para la campaña latinoa mericana de “alfabetización”. (1949b). El Correo de la Unesco , II(9), 2.
  • Fernández, M. del C., Welti, M. E., & Guida, M. E. (2009). La educación rural en la Argentina: propuesta de capacitación de maestros rurales (1958-1972). In T.G. Peres & O. L. Pèrez (Org.), Educación rural en Iberoamérica: experiencia histórica y construcción de sentido (p. 242-264). Madrid, ES: Anroart.
  • Fighters for literacy. (1958a). The Unesco Courier , 22-23.
  • García, A. A. L. (2014). La alfabetización en México: campañas y cartillas, 1921-1944. Traslaciones. Revista Latinoamericana De Lectura Y Escritura, 1(2), 126‐149.
  • Gil, N. L. (2007). A dimensão da educação nacional: um estudo sócio- istórico das estatísticas oficiais da escola brasileira (Tese de Doutorado). Faculdade de Educação. Universidade de São Paulo, São Paulo.
  • Gruzinski, S. (2003). O historiador, o macaco e a centaura: a “história cultural” no novo milênio. Estudos Avançados, 17(49), 321.
  • Guerra, R. A. (2002). El pensamiento de Jaime Torres Bodet: una visión humanista de la educación de adultos (1ª ed.). Michoacán, MX: Crefal.
  • Haddad. S., & Di Pierro.M. C. (2000). Escolarização de jovens e adultos. Revista Brasileira de Educação, (14), 108-194.
  • The Latin American struggle against illireracy. (1949). The Unesco Courier , I(1), 11.
  • Lourenço Filho, M. B. (1947). A campanha de educação de adultos. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, 11(29), 5-14.
  • Lourenço Filho, M. B. (1952). A educação rural no México. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos , 17(45), 108-198.
  • Lourenço Filho, M. B. (1950). Eco del Seminario del Río. Educación Fundamental, 2 (1).
  • Lourenço Filho, M. B. (1956). Cartilha do povo: para ensinar a ler rapidamente São Paulo, SP: Melhoramentos.
  • Miranda, F. L. (2014). México, la UNESCO y el Proyecto de Educación Fundamental para América Latina, 1945-1951. Signos Históricos, (31), 88-115.
  • Novidades. (1949). América se alfabetizará - aportación quedará nuestro país. Novidades, 1.
  • Paiva, V. P. (1987). Educação popular e educação de adultos São Paulo, SP: Loyola.
  • Peres, T. G., & Pérez, O. L. (2009). Educación rural en iberoamérica: experiência histórica y construcción de sentido Madrid, ES: Anroart .
  • Postage stamps help to fight illiteracy. (1958b). The Unesco Courier , 29.
  • Un problema mundial. (1949c). El Correo de la Unesco , II (6), 1.
  • Seminario de enseñanza primaria en Montevideo. (1950). El Correo de la Unesco , 3(10), 2.
  • Silva, R. R. N., & Guimarães, J. F. S. (2017). “Para ensinar a ler rapidamente”: a Cartilha do povo e os seus leitores no meio rural sergipano (1940-1950). In Anais do Congresso Brasileiro de História da Educação (p. 4380-4393). João Pessoa, PB. Recuperado de: https://drive.google.com/drive/folders/1vVImmMHMKniTKJWj36SyEONLM5MAdJv0
    » https://drive.google.com/drive/folders/1vVImmMHMKniTKJWj36SyEONLM5MAdJv0
  • Tejada, C. (1950). The Interamerican Seminar on Literacy and Adult Education - Rio de Janeiro Washington, DC: Pan American Union (Division of Educacion - Department of Culturals Affairs).
  • UNESCO Digital Library. (2020). Recuperado de: https://unesdoc.unesco.org/
    » https://unesdoc.unesco.org/
  • Vasconcelos, M. S. (1996). A difusão das idéias de Piaget no Brasil São Paulo, SP: Casa do Psicólogo.
  • 1
    A expressão utilizada neste título faz referência a uma matéria do jornal The Unesco Courier (1958) intitulada ‘Fighters for literacy’, que descreveu a atuação de intelectuais empenhados em combater o analfabetismo adulto em diversos países.
  • 2
    “Para algunos de los delegados aquí presentes - dijo en su discurso -, venidos de países en que el analfabetismo prácticamente ha desaparecido, podrá parecer ana crónico que haya pueblos en los que, al lado de una élite universitaria, y sobre los restos de culturas de gran linaje, millones de jóvenes y adultos no posean siquiera el dominio del alfabeto.[…] Entendemos que la organización que se proyecta es un primer paso y, como tal, lo apreciamos y lo aplaudimos. Pero sentimos que deberá seguir a ese primer paso una reunión que afronte valientemente estas tres cuestiones: ¿Qué están dispuestos a hacer los países más ricos y técnicamente más preparados para ayudar a que eleven los otros el nivel de instrucción de sus habitantes? ¿Cómo conciliaremos tal ayuda con el deber de respetar la libertad de cada nación en la elección de sus métodos internos para organizar la enseñanza en su territorio? ¿Y de qué modo coordinaremos esa libertad -que juzgamos inalie nable- con la urgencia de decidir acerca de los fines generales de la educación del hombre?”.
  • 3
    A Unesco foi criada ao final da conhecida historicamente Conferencia Preparatória, realizada entre 1º a 16 de novembro de 1945, no Instituto de Engenheiros Civis de Londres, como uma agência especializada da Organização das Nações Unidas (ONU). Entre os 37 países membros estavam Brasil e México, respectivamente representados por José Joaquim de Lima e Silva Muniz de Aragão, Paulo Estevão de Berrêdo Carneiro, Antônio Arruda Carneiro Leão e Jaime Torres Bodet. No final da conferência, representantes de 37 Estados assinaram a Constituição que deu à luz a Unesco.
  • 4
    Nesse período era o total eram 20 Estados-membros: Arábia Saudita, Austrália, Brasil, Canadá, Checoslováquia, China, Dinamarca, Egito, Estados Unidos, França, Grécia, Índia, Líbano, México, Noruega, Nova Zelândia, República Dominicana, Reino Unido, África do Sul e Turquia.
  • 5
    A esse respeito, ver Peres & Pérez (2009Peres, T. G., & Pérez, O. L. (2009). Educación rural en iberoamérica: experiência histórica y construcción de sentido. Madrid, ES: Anroart . ).
  • 6
    Esse centro passou por diversas mudanças de paradigma e nomenclatura, de Centro Regional de Educación Fundamental para la América Latina (Crefal) passou a ser denominado de Centro de Cooperación Regional para la Educación de Adultos en América Latina y el Caribe (Crefal), a partir de outubro de 1990 até os dias atuais.
  • 7
    “[...] suficientemente amplia y general y de un diagnóstico de toda la región, se elaboran un conjunto de técnicas y estrategias de intervención que luego se replican amodo de ‘receta’ en los distintos países”.
  • 8
    “Se da el nombre de educación fundamental al mínimo de educación general que tiene por objeto ayudar a los niños y a los adultos, que no disfrutan de las ventajas de una buena instrucción escolar, a comprender los problemas peculiares del medio en que viven, a formarse una idea exacta de sus derechos y deberes cívicos e individuales y a participar más eficazmente en el progreso social y económico de la comunidad a que pertenecen. Esa educación es fundamental porque proporciona el mínimo de conocimientos teóricos y técnicos indispensables para alcanzar un nivel de vida adecuado. Es un requisito previo indispensable que para la actividad de los servicios especializados (higiene, agricultura, etc.) pueda ser plenamente eficaz”.
  • 9
    Este trecho foi retirado de uma fotografia, que mostra um cartaz educativo do Crefal. Tem o sentido de que nunca é tarde para se alfabetizar um adulto.
  • 10
    “Brazil Campaign for Literacy - A campaign in Brazil aimed at teaching illiterates of all ages to read and write has resulted in the establishment since the beginning of 1947 ofnearly 14, 000 schools. This was announced by the’ Brazilian Dire’ Ctor-Generarof' Education, Dr. Lourenço Filho, delegate to Unesco's Second General Conference, at a press conference in Mexico City on November 25, who declared that it was largely due to Mexico’s example that Brazil embarked on its campaign of Fundamental Education”.
  • 11
    “[...] la población mundial sumaba 2,378 millones de personas. De éstas, 1,200 millones no sabían leer y escribir. La urgencia y la necesidad de atender a este inmenso número de analfabetos eran obvias”
  • 12
    “Carrying out large-scale campaigns for adult education is no easy task in a country like Brazil where there are immense tracts with a population of about one per square mile. But this is what the Government has been doing since 1947 after statistics revealed that over 50 per cent of the adult population was illiterate. Deciding on a masssolution, the Government initiated a plan for opening 10,000 evening schools for adult and adolescent illiterates. Stamp symbolizes light of education”.
  • 13
    “Removing the bandage of illiteracy symbolizes, on this Mexican stamp, the large-scale educational effort made by Mexico in recent years. One of the most remarkable achievements was the nation-wide campaign initiated and developed between 1943 and 1946 by Jaime Torres Bodet. Minister of Education who later (1948-53) became Director General of Unesco”.
  • 14
    “The campaign will also be extended through comunal centres and cultural missions, and it is expected that the, number of students will exceed one million in 1948”.
  • 15
    “When Jaime Torres Bodet became Director-General of Unesco, in 1948, he had already behind him a distinguished career as poet, novelist, essayist, educationist, diplomat and international statesman. One of the high points of his career and certainly one of the most brilliant phases in the history of Mexican education was the period (from 1943 to 1946) when He served as his country's Minister of Education and initiated and developed a nation- unesco wide campaign against illiteracy. No campaign of such scope or originality had ever before been undertaken in Mexico. Torres Bodet appealed to all educated Mexicans to become ‘emergency’ teachers for at least one of their illiterate country men, and He toured towns and villages arousing and inspiring the people. Soon, over 60,000 collective teaching centres were organized and lawyers, doctors, business men, industrialists, farmers and landowners led by the President of Mexico, Avila Camacho, and his wife, joined in as teachers to make the campaign a success. Special wall newspapers were printed and over 10,000,000 elementary Reading books and primers began flooding the country. For those of Mexico's Indians who did not speak Spanish, Torres Bodet had special primers prepared in thei rlanguages and where these languages had never before been written down He called in teams o flinguists to do this. When the results were tabulated after only two years of work, it was found that over 1,200,000 Mexicans had been taught to read and write. The successful campaigns encouraged other Latin American countries toadopt similar methods”.
  • 16
    Brazil began a full-scale attack on illiteracy in 1947 by launching a nation wide adult education campaign. The country's tremendous and sparsely populated área and an adult illiteracy figure of over 55 per cent created problems whose solution called for bold conceptions and methods of fundamental educationand for vigorous leadership. The man who gave leadership and driving force to the campaign was Manoel Lourenço Filho. One of unesco Brazil's leading educators, author and professor of psychology, Lourenço Filho had already devoted his efforts for more than a quarter of a century to the cause of education in his country. The cost of the first three years of the adult education campaign, 100 millions cruzeiros (55,000,000), was justified by the results. In 1947, there were 10,416 ‘Campaign’ schools in operation; in the following year, 14,300, and in 1949 the number reached 15,300. In the first three years about 2,000,000 adults and adolescents enrolled and more than 1,000,000 people were taught to read and write. Brazil’s approach to fundamental education problems was watched with interest in other countries: the careful balance maintained between school and adult education; the building on a solid basis of statistical fact and the linking together of the varied interests of communities in literacy, better health and farming. Lourenço Filho's successful leadership of the campaign won him international recognition, and at the 1949 Inter-American Seminar on Illiteracy and Adult Education, hew as hailed as El Maestro de las Americas (Teacher of the Americas)”.
  • 17
    “[...] que enseñaron a leer a su Pueblo en América”.
  • 18
    “El comienzo fué harto difícil y doña Zilma debió dar prueba de gran paciencia y energía para reunir la modesta suma con que emprender su campaña, afrontando impasible las burlas y las criticas de muchos. Hubo quien la llamaba ‘la loca de Itapemirim’; también quien la bautizó con el nombre irrisorio de ‘la mendiga’ […] Pero doña Zilma no se desanimaba por tan poca cosa: a pie unas veces, otras a caballo, fué organizando colectas en todos los barrios de la ciudad y en los campos vecinos”.
  • 19
    Lema/expressão retirado da Cartilha do povo: para ensinar a ler rapidamente, de Lourenço Filho (1956Lourenço Filho, M. B. (1956). Cartilha do povo: para ensinar a ler rapidamente. São Paulo, SP: Melhoramentos.).
  • 20
    Esta expressão foi retirada do jornal mexicano Novidades (1949Novidades. (1949). América se alfabetizará - aportación quedará nuestro país. Novidades, 1. ), como uma aposta nas campanhas de alfabetização.
  • 21
    “América se alfabetizará - aportación quedará nuestro país. México llevará al Seminario de Estudios Prácticos sobre alfabetización en América, que a iniciativa del secretario general de la Unesco, Jaime Torres Bodet, se inauguró hoy en la ciudad de Rio Janeiro, todo el acervo técnico y las experiencias recogidas en nuestro país y en el curso de los trabajos de la Campaña Nacional contra el analfabetismo. Nuestras autoridades docentes tienen el propósito de poner a disposición de las naciones hermanas del Continente que se han interesado vivamente por la obra educacional que se desenvolve en el país, minuciosa información acerca de las realizaciones alcanzadas en nuestro medio en lo que toca a la incorporación cultural de los iletrados. [...] El profesor Bonilla lleva consigo amplia documentación acerca de la forma en que ha atacado en nuestro país el tremendo problema de los analfabetos, incluyendo películas ilustrativas, gráficas y diversos elementos ilustrativos”.
  • 22
    Até o momento não foram encontradas informações sobre os seminários realizados anteriormente.
  • 23
    Realizada em julho de 1949, a Conferência de Elsinore, na Dinamarca, foi uma das primeiras iniciativas que colocaram na agenda internacional a pauta da educação de adultos. Na ocasião estavam presentes mais de 150 educadores, o evento foi o marco inicial da escalada internacional de Jaime Torres Bodet, então presidente da conferência e diretor-geral da Unesco, contra o analfabetismo adulto.
  • 24
    Atual Departamento Internacional de Educação, situado em Genebra no Escritório das Nações Unidas.
  • 25
    “Con el fin de realizar los objetivos de la Unesco y llevar a la práctica las recomendaciones de la Conferencia (se sugiere) la creación de un organismo de cooperación entre las instituciones y las personas que dirigen la educación de adultos en el mundo entero. Se sobreentiende que una organización de este género debe, en las presentes circunstancias, servirse de las facilidades que le ofrece la Unesco y funcionar a través de ésta. [...] Otra resolución importante, adoptada por la Conferencia, subraya, con el fin de extender el movimiento de educación de adultos al mundo entero, la necesidad de organizar seminários internacionales para el estudio de los problemas particulares de la educación de adultos. ‘Se trata de una función de la Unesco’, declara la resolución, ‘V recomendamos encarecidamente a la Unesco que organice desde ahora un seminário que se celebrará en 1950”.
  • 26
    “[...] un experto en educación fundamental y educación de adultos. Actualmente está encargado de dirigir el grupo sobre educacion de adultos del Seminario, para el estudio del analfabetismo en América”.
  • 27
    “[...] el organizador de las célebres ‘Misiones Culturales’ de alfabetización en México, Profesor Guillermo Bonilla Segura, conocido sencillamente en todo su país como ‘El Maestro’; el joven y enérgico Ismael Rodríguez Bou, investigador pedagógico de Puerto Rico; el agudo y gran espíritu estadístico de la Argentina, Ernesto Nelson; el psicólogo suizo Jean Piaget; la especialista en cartillas de alfa betización, Aun Nolan Ciar, de los Estados Unidos, y el Coronel George Selwyn Simpson, con sus 35 años de experiencia en la enseñanza de la alfabetización en el Ejército británico. El Gobierno del Brasil envió a este seminario a sus expertos en pedagogía: Fernando Tude de Souza, Antonio Almeida Júnior, Mário Teixeira de Freitas, y Mario Paulo de Brito. El Dr. ‘Lourenço Filho’, que con tanto éxito dirigió en el Brasil, por espacio de dos años y medio, la campaña contra el analfa betismo, dejó su despacho, en el decimocuarto piso del ultramoderno Ministerio de Educação e Saude, para encargarse de la dirección del seminario internacional”
  • 28
    Há outras versões sobre os motivos da vinda de Jean Piaget ao Brasil e sua participação do VI Seminário Interamericano de Alfabetização e Educação de Adultos no Rio de Janeiro, em 1949. Segundo Vasconcelos (1996Vasconcelos, M. S. (1996). A difusão das idéias de Piaget no Brasil. São Paulo, SP: Casa do Psicólogo.), Nilton Campos (ocupante da cátedra de Psicologia da Faculdade Nacional de Filosofia) e Lourenço Filho o convidaram para participar desse seminário. Porém, é certo o fato de que Jean Piaget representava a Unesco e, por solicitação de Nilton Campos, Maurício de Medeiros, Peregrino Jor e Farias Goes Sobrinho, o Conselho Universitário da Universidade do Brasil, concedeu-lhe o título de doutor honoris causa.Na ocasião, proferiu, nas dependências da Faculdade Nacional de Filosofia, uma conferência sobre epistemologia genética. A esse respeito, ver Vasconcelos (1996Vasconcelos, M. S. (1996). A difusão das idéias de Piaget no Brasil. São Paulo, SP: Casa do Psicólogo.).
  • 29
    “Aquí nos sentimos amparados por la Organización de las Naciones Unidas, cuyo Secretario General tuvo la amabilidad de enviar a su digno representante”.
  • 30
    “[...] cuyo eminente Director de la UNESCO el Dr. Jaime Torres Bodet, nos envió tan expresivo mensaje y mandó para presentarle una gran figura, el Profesor Jean Piaget”.
  • 31
    “Es de esperar que la calidad de los participantes y la buena organización del Seminario encomendada al profesor brasileño ‘Lourenço Filho’, contribuirán en alto grado al éxito de esta empresa. Por su parte, la Unesco ha insistido con especial acento en el carácter mundial que ha de tener el Seminario. El Dr. ‘Jaime Torres Bodet’, en nombre de la Institución, ha invitado a todos los países a que envien sus representantes”.
  • 32
    “[…] ello hasta a explicar la indiferencia del pueblo hacia la misma, la escasa frecuentación escolar y la falta de prestigio social del maestro, así como la insuficiente remuneración de éstos”.
  • 33
    “¿Cómo intensificar las campañas de alfabetización sin descuidar la reforma adecuada de los programas de las escuelas primarias? ¿Cómo otorgar mayor credibilidad a los planes de estudio, según la diversidad de las regiones, y cómo adaptarlos de manera más racional a las necesidades de las colectividades rurales? Y, por último ¿Cómo dar realidad al principio de la escolaridad obligatoria? Se trata, en suma, de eliminar progresivamente el analfabetismo y de elevar, paso a paso, el nivel de vida gracias a un sistema de educación que abarque todo -y con simultánea eficacia-, la enseñanza primaria”.
  • 34
    The expression used in this title refers to an article in the newspaper The UNESCO Courier (1958) entitled ‘Fighters for literacy’, which described the work of intellectuals committed to fighting adult illiteracy in several countries.
  • Como citar este artigo: Silva, R. R. N., Mesquita, I. M., & Nery, A. C. B. ‘Homens que ensinaram a América ler’: a educação de adultos no Brasil e México (1947-1956). (2021). Revista Brasileira de História da Educação, 21. DOI: http://dx.doi.org/10.4025/rbhe.v21.2021.e155.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Fev 2020
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    27 Maio 2020
  • Aceito
    25 Jun 2020
  • Publicado
    23 Dez 2020
Sociedade Brasileira de História da Educação Universidade Estadual de Maringá - Av. Colombo, 5790 - Zona 07 - Bloco 40, CEP: 87020-900, Maringá, PR, Brasil, Telefone: (44) 3011-4103 - Maringá - PR - Brazil
E-mail: rbhe.sbhe@gmail.com