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TEMPO E MOVIMENTO EM UM MERCADO DE FRONTEIRA: CIUDAD DEL ESTE, PARAGUAI1 1 Uma versão preliminar deste trabalho foi apresentada no Colóquio Internacional "Quantificação e temporalidade: perspectivas etnográficas sobre a economia", organizado pelo Núcleo de Pesquisas em Cultura e Economia e realizado no Museu Nacional/UFRJ, Rio de Janeiro, 24-26 de agosto de 2005.

TIME AND MOVEMENT IN A FRONTIER MARKET: CIUDAD DEL ESTE, PARAGUAY

Resumo

Como funciona um mercado no qual os compradores provêm de outro país e onde muitos dos comerciantes e trabalhadores moram do outro lado da fronteira? O artigo analisa a dinâmica comercial de Ciudad del Este, importante centro comercial de artigos importados localizado no Paraguai na fronteira com o Brasil. A partir das relações entre mobilidade, territorialidade e temporalidade, a descrição etnográfica acompanha os múltiplos atores envolvidos no comércio de fronteira em seus deslocamentos ao longo de um dia trabalho e aborda outras configurações temporais e espaciais relevantes. Considerando que o mercado pressupõe um espaço e um tempo nos quais sucedem suas transações, os mercados de fronteira apresentam uma complexidade especial, pois tanto revelam quanto relativizam as configurações espaço-temporais do Estado.

Palavras-chave
Mercado; Fronteira; Espaço; Tempo; Circuitos comerciais

Abstract

When buyers come from another country and when many traders and workers live on the other side of the border, how does a marketplace function? The article analyzes the commercial dynamic of Ciudad del Este, an important market for imported goods located in Paraguay at the Brazilian border. Relating mobility, territoriality and temporality, the ethnographic description follows the actors' movement through the border during a working day and addresses other temporal and spatial relevant configurations. Considering that marketplaces presuppose a space and a time in which transactions occur, border marketplaces present a particular complexity, since they both reveal and relativize the space-time configurations of the State.

Keywords
Market; Border; Space; Time; Commercial circuits

Como local de trocas, o mercado supõe um espaço e um tempo nos quais acontecem as transações. Porém, a relação dos vendedores, compradores e demais participantes com o tempo e o espaço de um mercado particular depende das atividades e posições que esses participantes ocupam ou realizam. Vender ou comprar supõe relações diferenciadas com o espaço do mercado (como estar fixo em um ponto ou circular, por exemplo), e essas ações definem distintas temporalidades para quem as realiza (permanecer no local ou passar por ele). Estas características dos mercados assumem uma complexidade singular nas fronteiras estatais. Nelas as definições territoriais e temporais dos Estados revelam-se de forma nítida e passam a constituir variáveis relevantes na constituição do espaço e do tempo das trocas.

O presente trabalho analisa a dinâmica comercial da paraguaia Ciudad del Este, importante centro comercial de artigos importados, localizado na fronteira com o Brasil, à luz das relações entre mobilidade, territorialidade e temporalidade. A escolha destes três aspectos parte da hipótese de que, para entender a dinâmica comercial de Ciudad del Este, é necessário compreender os diversos movimentos que operam na sua estruturação e funcionamento. Falar de movimento implica, por sua vez, a abordagem de dimensões espaciais e temporais.

Com base em um trabalho de campo realizado por mais de dez meses, entre 1999 e 2001 (período que, salvo quando indicado, é o presente etnográfico do texto), apresentarei de forma geral aquela região para, em seguida, concentrar-me na descrição do movimento na Ponte da Amizade, que une as margens brasileira e paraguaia do rio Paraná, ao longo de um dia de trabalho. Explorarei algumas particularidades temporais de seu funcionamento que estão na base da relação diferenciada que os distintos atores mantêm com aquele espaço com a ajuda de três elementos. São eles: um determinado tipo de publicidade que circulava então pelas ruas de Ciudad del Este; a fórmula utilizada pelos compradores para descrever a jornada empreendida desde suas cidades de origem; e a categoria utilizada pelos vendedores para descrever a jornada no mercado.

CIUDAD DEL ESTE E O CENÁRIO FRONTEIRIÇO

Falar do Paraguai e de Ciudad del Este no Brasil remete a um conjunto de estereótipos e pressupostos que correspondem, de fato, a dois leques de imagens diferentes. O primeiro deles associa-se a produtos e qualidades. O segundo, a margens e ilegalidades. Ambos os aspectos estão vinculados à dinâmica comercial desenvolvida na fronteira. Seja por se tratar do lugar de procedência de muitos dos produtos que contribuíram, em nosso país, para a transformação do gentílico "paraguaio" em um adjetivo que qualifica algo que não é como deveria ser - algo que é falso ou adulterado;2 2 Para uma análise do lugar de Ciudad del Este na construção dos estereótipos brasileiros sobre o Paraguai, ver Rabossi (2010a). Para outra interpretação da origem dos estereótipos sobre o Paraguai, ver Silveira (2007; 2009). seja por se tratar do lugar onde grupos de origens diversas (brasileiros e paraguaios, árabes, chineses, coreanos e indianos, entre outros) trabalham em atividades que têm movimentado milhões de pessoas, produtos e dólares, envolvendo todo um leque possível de afazeres que possam render algum dinheiro.

Localizada no extremo Oeste do Paraguai, Ciudad del Este é separada pelo rio Paraná da cidade brasileira de Foz do Iguaçu. À sua frente, do outro lado do rio Iguaçu, localiza-se a cidade de Puerto Iguazú, na Argentina. Na confluência destes dois rios encontram-se os limites internacionais dos três países. Sobre eles, foram erguidas as duas pontes que os unem: a Ponte da Amizade (Ciudad del Este-Foz do Iguaçu) e a ponte Tancredo Neves (Foz do Iguaçu-Puerto Iguazú).

Ciudad del Este é a capital do Estado do Alto Paraná - um dos 17 estados que formam o Paraguai - e a segunda cidade do país em importância demográfica e econômica. Com uma população de 222.274 habitantes em 2002,3 3 Se agregarmos a este número a população dos distritos articulados na dinâmica urbana de Ciudad del Este, tais como Hernandarias (63.248), Minga Guazú (48.006) e Presidente Franco (52.826), o conjunto apresenta uma população total de 386.354 pessoas (DGEEC, 2004: 102 e ss.). Os resultados do censo que começou a ser realizado em 2012 ainda não foram publicados. a cidade se desenvolveu, desde a sua fundação, em 1957, como uma alternativa dinâmica à tradicional importância da capital, Assunção. Com jornais locais, universidades, um aeroporto internacional e uma importante infraestrutura urbana - ainda que precária e desigual - Ciudad del Este é fundamental no Paraguai contemporâneo. Foz do Iguaçu também teve um desenvolvimento significativo nas últimas décadas e, em muitos aspectos, mais acabado do que o da cidade paraguaia; ao menos no que diz respeito à mídia, à infraestrutura urbana e mesmo ao acesso a determinados bens e serviços. Foz do Iguaçu, por sua vez, é muito menos significativa para a dinâmica estadual e nacional brasileira. Com uma população de 256.088 habitantes, no ano de 2010, Foz era a sexta cidade do Estado do Paraná, uma das 27 unidades federativas que compõem o Brasil. Comparada com as anteriores, a argentina Puerto Iguazú é uma pequena cidade, com pouca ou nenhuma autonomia em termos de produção ou reprodução de uma esfera pública local. Com 42.849 habitantes, em 2010, era a quarta cidade da Província de Misiones, um dos 23 estados da Argentina.

As cidades de Puerto Iguazú e Foz do Iguaçu são destino obrigatório para visitar as Cataratas do Iguaçu, importante ponto turístico da América Latina.4 4 Foz do Iguaçu é um dos principais destinos turísticos do Brasil, tanto de visitantes nacionais como internacionais. Entre os anos 2007 e 2013, Foz do Iguaçu foi, intercaladamente com Florianópolis, segundo e terceiro destinos dos turistas internacionais em viagens de lazer no Brasil - sendo o Rio de Janeiro o primeiro destino (Ministério de Turismo, 2014). A dinâmica econômica de Puerto Iguazú gravita em torno do turismo e do comércio a ele vinculado. O turismo também ocupa um lugar fundamental na dinâmica econômica de Foz do Iguaçu. No entanto, outras duas atividades são cruciais para entender seu desenvolvimento: o comércio de produtos brasileiros para os países vizinhos (principalmente, para o Paraguai) e a produção de energia elétrica. Localizada alguns quilômetros ao norte de Ciudad del Este e Foz do Iguaçu, a represa hidrelétrica de Itaipu produz energia de forma compartilhada entre os dois países.

Se a importância do turismo para os lados argentino e brasileiro deriva do atrativo natural que compartilham - as cataratas -, o comércio e a geração de energia que compartilham Foz do Iguaçu e Ciudad del Este foram o resultado de apostas políticas, de desenvolvimentos governamentais e empresariais e, fundamentalmente, do trabalho de milhares de pessoas. Entre elas estão os imigrantes vindos do Paraguai e do Brasil que ajudaram a levantar a hidrelétrica a partir da década de 1970 e, desde então junto com imigrantes de diversas partes do mundo, transformaram os mercados localizados nas cabeceiras da ponte que une ambas as cidades em um dos espaços comerciais mais dinâmicos do continente.

O movimento na Ponte da Amizade é bastante intenso. Em grande parte, isto se deve aos diversos serviços de transporte que operam pela ponte, levando e trazendo pessoas e mercadorias. No ano de 2001, em média 18.500 veículos e 20 mil pedestres atravessavam a ponte diariamente em ambos os sentidos.5 5 Dados fornecidos pelo Departamento Nacional de Estradas de Rodagem (DNER) aos meios de comunicação em setembro de 2001. Uma análise do movimento na ponte com os dados oficiais da DNER está em Rabossi (2004: 40-42 e 306). Mas esses números não correspondiam a 18.500 veículos ou 20 mil pessoas diferentes, compondo cifras que se desagregavam de diversas maneiras. Por um lado, havia os que cruzavam a ponte somente uma vez e não voltavam mais naquele dia (a minoria), havia os que iam e voltavam uma vez ao dia (que trabalhavam em Ciudad del Este ou em Foz do Iguaçu e viviam do outro lado da ponte) e, por último, aqueles que cruzavam a ponte várias vezes num mesmo dia, seja carregando mercadorias, transportando pessoas ou dirigindo. Por esta razão, o movimento registrado na ponte corresponde mais ao de uma ponte urbana do que ao de uma rodovia - o corredor formado pela Rota Internacional VII (Paraguai) e pela BR-277 (Brasil), que ligam o centro do Paraguai à costa atlântica brasileira.6 6 A descrição da mesma como uma "ponte urbana" foi feita pelo diretor local do departamento de estradas brasileiro (comunicação pessoal).

Tanto movimento se tornava compreensível a partir das áreas comerciais próximas à Ponte da Amizade. A posição ocupada por cada uma delas na dinâmica citadina era distinta, resultado da história e da orientação de cada cidade em termos de atividades e de espaços. Em Foz do Iguaçu, a área próxima à ponte é periférica dentro da cidade, sendo que o centro, que concentra a maior quantidade de serviços (os escritórios centrais dos serviços públicos e privados e o centro comercial da cidade) está localizado a alguns quilômetros dali. Contrariamente, a área de Ciudad del Este próxima à ponte constitui o centro da cidade, onde se concentram os serviços privados (a maior quantidade de entidades bancárias e comércios) e, em seu limite, os principais escritórios públicos.

Foz do Iguaçu foi fundada como colônia militar em 1889, e o centro administrativo e comercial cresceu ao redor do lugar de sua fundação. As terras próximas à Ponte da Amizade permaneceram marginais ao desenvolvimento urbano. Logo após a inauguração da ponte, em 1965, essa área começou a se urbanizar, com o desenvolvimento dos bairros de Vila Portes e Jardim Jupira, direcionados ao comércio com o Paraguai.

A fundação de Puerto Presidente Stroessner, em 1957 - nome original de Ciudad del Este - vincula-se à construção do corredor entre o centro do Paraguai e os portos oceânicos nos quais o governo brasileiro havia facilitado as exportações e importações paraguaias: Santos, em 1941, e Paranaguá, em 1956. A eleição do local para a fundação da cidade foi determinada pelo local escolhido para a construção da ponte que atravessaria o rio Paraná. O fato de o prédio da Aduana, ao lado da rodovia que chega à Ponte da Amizade, ser o primeiro edifício de importância em Puerto Presidente Stroessner reflete a centralidade dessa conexão para o desenvolvimento da cidade. Ao lado dessa rodovia, na saída da ponte, está localizado o centro comercial da cidade ou, como é chamado por lá, o microcentro. Em seus estabelecimentos comerciais, galerias, shoppings e postos de venda de rua, são oferecidas mercadorias, em sua maioria compostas por produtos importados de diversas partes do mundo, especialmente do Sudeste Asiático. Um enorme mercado.

O COMÉRCIO DE FRONTEIRA EM MOVIMENTO

Considerando a origem, o lugar de residência e o local de trabalho das pessoas que participam do comércio de Ciudad del Este, o movimento na Ponte da Amizade é de uma enorme complexidade. Descrever este movimento talvez seja a melhor maneira de entender a dinâmica daquele espaço. Tentarei apresentar, a partir da descrição de um dia de trabalho, o funcionamento dos mercados localizados nas cabeceiras da ponte.

De madrugada, no microcentro, estão os guardas privados que cuidam dos negócios, todos eles paraguaios residentes em Ciudad del Este ou em suas imediações. À medida que amanhece, os negócios vão abrindo. Chegam seus donos ou seus responsáveis; muitos são chineses, árabes e paraguaios, mas também há brasileiros, coreanos e indianos.7 7 Segundo dados levantados por uma pesquisa do Banco Central do Paraguai, de junho de 1998, a distribuição por origem dos donos dos comércios era a seguinte: paraguaio, 28%; oriental, 27%; árabe, 24%; brasileiro, 11%; outros/não especificados, 10%. Isto é, 72% dos comerciantes do microcentro eram de origem estrangeira. Destes, 30% residiam em Foz do Iguaçu (Penner, 1998). Em 2001, havia aproximadamente 1.750 comércios funcionando no microcentro. Em 1994/1995, anos do auge comercial, havia 7 mil. Vários deles vivem em Foz de Iguaçu e, portanto, têm que atravessar a ponte. Os moradores de Ciudad del Este - muitos chineses e árabes residem no centro da cidade - chegam a pé. Outros vêm de bairros mais nobres, mais afastados.

Do lado brasileiro também começa o movimento. Os paraguaios, donos e empregados das exportadoras localizadas em Vila Portes, cruzam até Foz do Iguaçu em seus veículos ou a pé, assim como os paseros que, a essa altura, já começaram seu ir e vir pela ponte.8 8 Pasero (em espanhol), no Paraguai, é a pessoa que passa mercadoria através do limite internacional para ser vendida do outro lado. Na fronteira aqui analisada, os paseros e paseras só trabalham no fluxo de mercadorias, sentido Foz do Iguaçu-Cuidad del Este. Muitos deles são mulheres. Os demais comerciantes de Vila Portes e Jardim Jupira que vivem em Foz de Iguaçu, assim como os empregados, chegam dos bairros localizados nesta mesma cidade. Vários comerciantes - especialmente árabes - também vivem nesses mesmos bairros.

Em Ciudad del Este, os seguranças particulares chegam a pé ou em pequenas caminhonetes que fazem a distribuição dos empregados nos locais que vigiam. Antes ou simultaneamente aos donos, chegam os empregados dos comércios. Os paraguaios - são mulheres em sua maioria - vêm de diversos bairros da cidade. Os brasileiros em proporções similares cruzam de Foz do Iguaçu, constituindo, até setembro de 2001, o grosso dos empregados do comércio do microcentro.9 9 Em 2001, eram 5 mil os brasileiros que trabalhavam nos comércios do centro (80% do total de 6.250 empregados). Em um estudo para o Banco Interamericano de Desenvolvimento realizado em 1995, fala-se em 23.950 empregados no comércio do microcentro, 65% dos quais vivendo em Foz do Iguaçu (Penner, 1998). Em algumas áreas do centro, muitos dos postos de comida de rua são de brasileiros que também vêm de Foz do Iguaçu, este é também o caso de alguns restaurantes e lanchonetes dentro das galerias. Ainda que existam, são poucos os brasileiros que trabalham no microcentro e vivem em Ciudad del Este.

Muitos donos e encarregados dos negócios que vivem em Foz do Iguaçu cruzam a fronteira em seus veículos. Alguns chegam nos ônibus interurbanos que circulam entre Foz do Iguaçu e Ciudad del Este. A maioria dos empregados brasileiros que trabalha em Ciudad del Este chega de ônibus em Vila Portes e atravessa a ponte caminhando ou de mototáxi.

De bairros próximos e mais afastados do microcentro chegam todos aqueles que trabalham nas ruas do centro que, salvo poucas exceções, são paraguaios: vendedores de rua,10 10 Mesitero (em espanhol) é o vendedor de rua que trabalha em um lugar específico. O nome deriva da pequena mesa (mesita) desmontável sobre a qual ele coloca a mercadoria. Em 2001, havia mais de 1.500 mesiteros regularmente, número que dobrava nos dias de maior atividade. ambulantes, vendedores de loteria, carregadores, engraxates (em sua maioria, crianças). Ali também chegam os cambistas que se dedicam à compra e venda de moedas - todos eles homens e paraguaios - e se instalam em seus respectivos lugares, alguns com seus bancos ou cadeiras nos quais se sentarão durante o dia, à espera de clientes.11 11 Em 2001, havia 600 cambistas trabalhando nas ruas.

Os taxistas, mototaxistas12 12 Serviço de táxi em motocicleta. Em 2001, havia 150 do lado paraguaio e 300 do lado brasileiro, trabalhando nas associações autorizadas. Segundo estimativas, mais de mil mototáxis trabalhavam no transporte de mercadorias e pessoas. e kombistas13 13 Pessoa que dirige uma kombi no transporte alternativo de Ciudad del Este. O nome deriva de kombi, a caminhonete Volkswagen utilizada para tal transporte. Em 2001 havia entre 600 e 1.000 kombistas. paraguaios (todos homens) também se preparam para começar seu dia de trabalho. Os taxistas chegam a suas paradas oficiais, os mototaxistas ocupam seus pontos regulares e os kombistas começam a descer rumo à ponte, esperando encontrar clientes entre os compradores que retornam a Foz do Iguaçu com suas mercadorias.

Os laranjas brasileiros14 14 Pessoa que ganha dinheiro colocando à disposição dos outros seu direito de trazer mercadorias do exterior como se fossem suas. Por este motivo, só podem ser brasileiros. - mais mulheres do que homens - cruzam até Ciudad del Este, onde se situarão na entrada de alguma galeria ou autoservice15 15 Os autoservices funcionam como supermercados de produtos não perecíveis expostos em prateleiras, com preços públicos, nos quais não é necessária a figura do empregado que atende cliente por cliente. O surgimento e a expansão dos autoservices estão relacionados à massificação das vendas de determinados produtos, atrelada à figura dos sacoleiros. ou, se não, em alguma das lanchonetes localizadas dentro das galerias. Ali esperam por algum patrão (sacoleiro conhecido) ou por outro comprador que os contrate para cruzar a ponte. Os sacoleiros são aqueles que viajam até lá para comprar mercadorias mais tarde revendidas em suas cidades de origem.16 16 A palavra sacoleiro deriva de sacola que, em português, significa saco. A sacola, protótipo do comércio de Ciudad del Este, tem a mesma trama dos sacos de juta, mas em material plástico. Os sacoleiros do Paraguai também são chamados de muambeiros que, segundo o Dicionário Aurélio (2001), são aqueles que negociam com muamba (contrabando). Eles vão chegando nos respectivos ônibus interestaduais. As pessoas que cruzam a ponte nesse tipo de ônibus esperaram poder passar toda a mercadoria em uma única viagem. Para tanto, além de precisarem aguardar que todos terminem suas compras e carreguem-nas no ônibus, elas devem esperar o momento mais propício para cruzar, ou seja, quando a fiscalização na alfândega brasileira estiver menos rigorosa. Outros compradores cruzam a ponte caminhando, em mototáxi ou em ônibus locais. Alguns o fazem várias vezes por dia, multiplicando o número de passagens para se adequar à quota estabelecida pela lei brasileira de ingresso de mercadorias para uso pessoal. Outros contratam laranjas para passar com eles, multiplicando o número de pessoas para diminuir as viagens. Todos retornam a Foz, acumulam suas mercadorias nos guarda-volumes perto da ponte ou em algum hotel próximo e voltam a cruzar a ponte, caminhando, em algum mototáxi ou aproveitando o retorno de um táxi ou kombi paraguaios.17 17 Pelas regulamentações em uso, os táxis paraguaios voltando a Ciudad del Este não podem levar passageiros do lado brasileiro. Por este motivo, uma maneira de salvar el viaje (como escutei de vários taxistas) era cobrar um preço módico para atravessar a ponte. Assim, se no sentido Foz do Iguaçu-Ciudad del Este cobravam-se entre R$ 5 e R$ 15 em 2001, em sentido contrário, o valor cobrado era de R$ 1. Assim farão até completarem as compras. A variedade é a norma entre os compradores: os homens são maioria, mas as mulheres não são poucas. Entre eles, há jovens e velhos, mas a maioria está na faixa dos 30 aos 50 anos.

Esse movimento continuará até às 16h. A partir daí, pouco a pouco, os negócios começam a fechar suas portas, e os caminhos percorridos serão refeitos para o regresso à casa, esteja ela em algum dos bairros de Ciudad del Este ou de Foz do Iguaçu ou nas cidades de origem dos sacoleiros. Aquilo que foi convergindo durante o dia começa a divergir lentamente, com o entardecer.

Considerando este ir e vir, o movimento na Ponte da Amizade torna-se compreensível e corrobora sua descrição como "ponte urbana", sugerida pelo diretor do Departamento de Estradas de Rodagem (DER) brasileiro. No entanto, este movimento não é uma demonstração da irrelevância do limite internacional, sendo, antes, decorrente da sua existência. De fato, a expansão quantitativa do movimento responde a uma preocupação qualitativa: minimizar os riscos a partir da adequação relativa ao que estabelece a lei. O paradoxo está no fato de que a multiplicação gerada por esta preocupação - transportes e laranjas - dificulta o controle. A quantidade de pessoas e veículos impõe de fato um limite ao controle sistemático da fronteira, em parte pela impossibilidade concreta de realizá-lo, em parte porque a decisão de colocá-lo em prática tem implicações diversas. Tratar-se-ia de enfrentar milhares de pessoas, de interromper o fluxo entre os dois países, de deter o movimento de uma série de circuitos a partir dos quais milhares de pessoas ganham a vida. Empreender tais ações requereria, além da infraestrutura necessária para poder realizá-los, a decisão política de intervir em um espaço no qual se cruzam interesses municipais, estaduais, nacionais e internacionais.18 18 Para uma análise das transformações no comércio de fronteira durante a década passada, ver Cardin (2010) e Pinheiro-Machado (2010).

Ciudad del Este e Foz do Iguaçu compartilham algo mais que a Ponte da Amizade. Em ambas as cidades, as áreas comerciais próximas à ponte estão direcionadas ao outro lado da fronteira. No entanto, a forma como estão organizadas e os produtos que vendem são bem diferentes. Os próprios nomes das lojas já expressam isto. Em Foz do Iguaçu, são casas de exportação e comércios: vendem e levam produtos brasileiros ao outro lado da fronteira, às vezes diretamente, outras, por intermédio de pessoas que realizam o transporte, os paseros. Em Ciudad del Este, são casas de importação e comércios: trazem e vendem produtos de outras partes do mundo e, em teoria, os compradores vêm à cidade para buscá-los. Para ingressar com eles em seu país, os compradores às vezes utilizam pessoas que realizam o transporte e que assumem a propriedade da mercadoria, os laranjas. Vistos de Ciudad del Este, os compradores são pessoas de passagem pela cidade - todos turistas, como são chamados por lá. Mas há os turistas-turistas - os "verdadeiros turistas" - e os compristas - como são chamados aqueles que ganham a vida revendendo esses produtos, os também chamados sacoleiros. A diferença entre estes dois tipos de agentes tem uma matriz histórica: se a cidade começou como um centro comercial para turistas-turistas, em um determinado momento passou a ser um centro de provisão de mercadorias para revendedores.19 19 O lugar de Ciudad del Este como centro de provisão de artigos importados para o mercado brasileiro foi ocupado, ao longo da década passada, por São Paulo. Para uma análise das transformações urbanas e comerciais ocorridas em São Paulo e sua articulação com circuitos de compradores de diversas partes do Brasil, ver Freire da Silva (2014).

O TEMPO DAS OFERTAS: ACELERAÇÃO E DESLOCAMENTO

Se a descrição anterior nos permite ter uma visão geral do movimento comercial de Ciudad del Este, a dinâmica diária soma outras complexidades a este quadro. O primeiro elemento a ter em mente é a variação dos horários de início e finalização das atividades. Durante o ano de 2001, algumas lojas começavam suas atividades às 5h, mas, em média, o movimento nas ruas do centro começava a partir das 7h e terminava às 16h, estendendo-se até depois das 18h o fechamento de postos e locais de vendas. No entanto, médias são generalidades estatísticas e, em um espaço tão sensível às variações, as particularidades talvez sejam mais significativas.

Vou me concentrar em um tipo de publicidade muito recorrente em Ciudad del Este para analisar essas variações: as folhas de propaganda, entregues na rua aos visitantes que iam chegando à cidade. Distribuídas nos horários de maior movimento, trazem impressas as ofertas das lojas e as imagens dos produtos em promoção.

Vejamos, por exemplo, uma folha de propaganda do Mercado Bom Bom, um autoservice localizado no Shopping Ásia, no microcentro de Ciudad del Este. Além de nos informar sobre as ofertas daquela semana de julho de 2001, trazia os horários em que a loja funcionava: "Seg. Quinta e Sexta 6:00 Hrs. - Terça, Quartas às 5:00 e Sábados às 4:30 Hrs. - Fechamos todos os dias às 17:00 Hrs."

A antecipação do início das atividades, no ano de 2001, começou a ser notada em junho. Os sacoleiros estavam chegando antes, e os negócios se acomodaram a seus horários. Alguns sacoleiros e comerciantes diziam que se tratava de encurtar a jornada em Ciudad del Este e empreender o retorno no mesmo dia, poupando gastos de alojamento em Foz do Iguaçu. Outros assinalavam que se procurava, simplesmente, evitar os controles, já que de madrugada havia menos fiscais da Receita Federal trabalhando na Ponte da Amizade.20 20 A adequação horária ao momento em que os controles eram menos estritos foi observada em sentido inverso em outubro de 2001. O movimento das kombis e caminhonetes que traziam produtos do Brasil era realizado da madrugada até às sete da manhã, momento em que os empregados da alfândega paraguaia começavam sua jornada de trabalho. Assim, as exportadoras de comestíveis localizadas em Foz do Iguaçu, seja em Vila Portes - muitas delas, propriedades de paraguaios - ou as outras casas de exportação de Jardim Jupira, começavam suas atividades entre as três e as quatro horas da manhã.

O certo era que nos sábados - o dia de maior movimento de sacoleiros - os autoservices abriam muito cedo. Se para os empregados que vinham de Foz do Iguaçu chegar a essa hora já era um grande esforço, para os paraguaios que viviam na mesma cidade isto era ainda mais difícil. Em Ciudad del Este, as 4h30 do anúncio eram ainda mais de madrugada do que em Foz do Iguaçu, já que em território paraguaio o fuso horário fazia com que fosse uma hora mais cedo. Abrindo às 3h30, os preparativos para o dia de trabalho começavam quase na noite do dia anterior e, como em alguns lugares não havia meios de transporte público funcionando neste horário, alguns comércios e autoservices eram obrigados a buscar seus empregados.

Os folhetos de propaganda entregues nas ruas de Ciudad del Este permitem vislumbrar dois aspectos particularmente significativos da temporalidade do comércio desta cidade: sua aceleração e seu deslocamento.21 21 Para uma análise da relação entre propaganda, experiência do espaço e tempo na cidade, ver Cronin (2003).

A aceleração - ou melhor, a velocidade na mudança das ofertas - pode ser percebida em algo que aparecia em muitas das propagandas impressas: elas vinham com a data de validade das promoções, as quais geralmente se restringiam àquele mesmo e único dia. Algumas só tinham a data impressa. Outras tinham uma legenda do tipo, "Preços válidos somente para o dia [data]", ou inclusive mais precisas, "Preços válidos somente para esta quarta-feira [data]". Eram poucas as que promoviam produtos "enquanto durassem os estoques".

A aceleração expressa nas ofertas válidas para o mesmo dia da publicidade realizava-se na velocidade das vendas e na reposição de mercadorias. Quando esse movimento começou a desacelerar em alguns ramos de produtos, a prática de datar as folhas de propaganda começou a deixar de ser tão recorrente. Em 1999, quando comecei a pesquisa em Ciudad del Este, esta prática era generalizada independentemente do ramo ou do tipo de negócio. Já em 2001, quase todos os autoservices haviam deixado de imprimir a data nas folhas de propaganda de suas promoções, e esta prática restringira-se quase que exclusivamente às casas de informática. Em alguns casos, a variação da demanda de determinados produtos também contribuía para essa aceleração. Este foi o caso, por exemplo, no início de 2001, com a crise energética no Brasil e a consequente explosão na demanda por lâmpadas de baixo consumo.

O deslocamento do comércio do microcentro pode ser percebido nos horários de funcionamento dos negócios impressos nas propagandas dos estabelecimentos comerciais: a hora indicada era sempre a brasileira. O horário do comércio do microcentro é aquele de seus compradores e não aquele do lugar onde está situado, algo que estabelece um deslocamento particular entre espaço e tempo no centro da cidade. De fato, muita gente que compra em Ciudad del Este nem sequer sabe que ali há uma hora a menos em relação a Foz do Iguaçu.

"Mas, é uma hora mais cedo?" Assim como o espaço não possui a cor que no mapa nos permite distinguir o Paraguai do Brasil, tampouco o tempo tem qualquer marca do fuso horário assumido a cada lado da fronteira. Ambas as percepções somente são possíveis a partir dos mecanismos que as produzem e naturalizam. A fronteira é um desses mecanismos, associada a todas as técnicas e procedimentos para sua produção (controles, alfândegas, funcionários etc.). No microcentro de Ciudad del Este, passa-se algo de peculiar. Apesar da presença das instituições que encarnam essas técnicas e se encarregam de implementar os procedimentos para a emergência de um espaço e de um tempo específicos, sua implementação não é um fato, e, sim, o fantasma que possibilita determinada economia política de tolerâncias e arbitrariedades. Nesta economia, os funcionários destas instituições ocupam um lugar privilegiado que lhes permite usufruir da situação.

Antes de ser o resultado óbvio da presença do comprador que vem do outro lado da fronteira, essa configuração espaço-temporal deriva de um processo de transformação que remonta à década de 1980 e teve como consequência a adoção do horário brasileiro para o funcionamento comercial. Um indício deste processo foi o comentário recorrente em relação à mudança de horário do comércio, que vez por outra surgia nas conversas com aqueles que trabalhavam em Ciudad del Este. Antes, as lojas funcionavam até tarde da noite, pelo menos até meia-noite ou uma hora da madrugada. Na década de 1970, quando o movimento comercial de Ciudad del Este se consolidou, o trabalho e suas pausas tinham outros ritmos. Se algumas horas à noite era o que faltava para poder sair - como o expressaram vários vendedores - havia outras atividades e horários para o descanso e a diversão, como por exemplo, os intervalos depois do almoço ou uma pausa às tardes para jogar futebol.

Por que se deixou de trabalhar à noite? Os turistas deixaram de frequentar aquele espaço? Não. Mudaram os horários porque mudaram os "turistas" e junto com a mudança do horário e dos turistas modificou-se também o comércio do microcentro. As palavras de Jackson Lima, jornalista e guia turístico, a este respeito são reveladoras. Entre 1977 e 1981, ele trabalhou em Foz do Iguaçu, de onde saiu para retornar em 1987. Neste ínterim, o comércio de Ciudad del Este se transformou profundamente:

O charme anterior do comércio paraguaio é que funcionava à noite - o forte era à noite. Isso, no regime de compras para o turismo, significava que o comércio noturno era uma adição às excursões noturnas que iam para o cassino. Quando voltei com os colegas [em 1987], organizei uma ida ao Paraguai à noite e tudo estava mudado. Todas as lojas fechadas. Ciudad del Este havia se civilizado à brasileira. Horários brasileiros. Das 9h às 18h, e não segundo a maneira paraguaia que incluía a "santa siesta". Daí comecei a notar que tudo havia mudado.

A mudança de horário é um índice dessa transformação "à brasileira". A língua é outra - as folhas de propaganda sempre são escritas em português. Outro índice é a proliferação de empregados brasileiros nos comércios. Já com o dinheiro, ocorre algo ligeiramente diferente. Em 1999, todas as ofertas - assim como os preços nos comércios - eram feitas em dólares americanos. Mas em 2001, após alguns anos de desvalorização da moeda brasileira, os dólares começaram a ceder espaço às ofertas em reais como forma de atrair mais clientes. Contudo, expressando seus preços em dólares ou em reais, os comerciantes de Ciudad del Este atuavam em função do comprador brasileiro.

Brasileiro, sim. Mas se considerarmos que grande parte dos turistas-turistas que chegavam à cidade anteriormente também eram brasileiros, seria melhor chamar essa transformação de "à sacoleira" do que "à brasileira". Tais mudanças, como veremos a seguir, também supuseram a introdução de outras temporalidades.

BATE E VOLTA: CIUDAD DEL ESTE NOS CIRCUITOS SACOLEIROS

Bate e volta era o nome que costumavam usar os sacoleiros e os motoristas que os transportavam para se referir ao percurso de um lugar específico rumo a Ciudad del Este e o retorno ao ponto de partida

Alugados ou dirigidos pelos donos, os ônibus de turismo que realizavam as viagens a Ciudad del Este eram o meio privilegiado para o bate e volta. Em geral, eles incluíam, além da viagem, a negociação com policiais e fiscais ao longo da rodovia. A figura do guia era fundamental nessa tarefa,22 22 A centralidade da figura do guia nas excursões de compras do outro lado da fronteira também é assinalada por Konstantinov, no caso dos compradores búlgaros que se deslocam até a Turquia para se abastecerem de mercadorias. Nesse caso, trata-se de donas de agências de viagens, mulheres entre 25 e 45 anos, búlgaras, antigas empregadas da Agência Nacional de Turismo - Balkantourist - que detinha o monopólio do turismo transfronteiriço nos tempos socialistas (Kostantinov, 1996). Um detalhe a ser explorado, de fato: quase todos os guias que conheci trabalhando com sacoleiros eram mulheres. realizada com o dinheiro das passagens - no caso de o guia estar incluído no preço - ou da "caixinha" - o dinheiro coletado na hora da partida para que o guia dispusesse de uma ferramenta de negociação no caso de o ônibus ser parado.23 23 Nos ônibus de linhas regulares, alguns motoristas ocupam essa posição, e "uma caixinha" lhes é entregue para que levem em consideração o fato de haver pessoas transportando mercadorias - algo que implica detectar controles que possam ser evitados, passar decididamente se preciso for, e parar nos pontos indicados pelos "compristas" para descarregar a mercadoria.

Bate e volta sintetiza a forma totalizante como as viagens de compras a Ciudad del Este são experimentadas pelos sacoleiros. A intensidade da experiência não se limita às compras nas ruas ou nas lojas da cidade nem à passagem pela fronteira, mas corresponde, antes, às idas e voltas propriamente ditas, que são também motivo de ansiedade. Na ida, devido aos acidentes e roubos; na volta, devido aos acidentes e controles e extorsões dos funcionários públicos.24 24 Estes elementos foram explorados em Rabossi (2004: 265 e ss.). Neste sentido, o bate e volta é algo mais que uma simples forma de nomear a trajetória de ida e volta entre a cidade de origem e o local das compras, correspondendo à unidade de medida desses circuitos comerciais tal como experimentados pelos sacoleiros. Algo que parece caracterizar os circuitos comerciais em geral, tal como aparece na descrição de Jacques Le Goff da unidade utilizada na Idade Média para os denominado empréstimos marítimos: "[...] esses empréstimos eram quase sempre limitados a uma viagem ou, mais exatamente, a uma ida e volta que se pode dizer ter constituído na Idade Média a unidade de operação comercial marítima" (Le Goff, 1991Le Goff, Jacques. (1991 [1986]). Mercadores e banqueiros da Idade Média. São Paulo: Martins Fontes.: 18).

Se na seção anterior, à luz do movimento na ponte, foi emergindo a importância do comprador brasileiro na transformação do comércio de Ciudad del Este, as viagens dos compradores nos permitirão compreender melhor suas variações semanais e sazonais. Visto ao longo da semana, o movimento no microcentro de Ciudad de Este está marcado por distintas intensidades. São as quartas-feiras e os sábados os dias de maior movimento, quando o fluxo de compristas brasileiros é maior.25 25 De acordo com uma matéria de 1994 - ano do auge do funcionamento comercial de Ciudad del Este - a diferença entre quartas e sábados e os demais dias da semana era mais que o dobro. Seguindo a informação fornecida pela Receita Federal, a matéria diz o seguinte: "Nos dias de pico de movimento na ponte, às quartas e sábados, mais de 50 mil brasileiros cruzam a fronteira - contra uma média de 20 mil nos dias considerados normais - apostando na possibilidade de escapar da fiscalização." (Folha de S. Paulo, 1994). As descrições daqueles que trabalhavam em Ciudad del Este corroboravam esta imagem. Kleber, um brasileiro que por anos foi mesitero, expressava esta questão graficamente: "Você não sabe o que era o movimento lá! Sábados? Tinha três filas de ônibus de turismo, e lá em Cidade do Este chegavam até o elevado lá acima [km 4 1/2]. E caminhar? Só assim! [baixa os ombros, cola os braços ao corpo e dá passos que não chegam a ultrapassar o outro pé] Caminhar na ponte era impossível! Carregando as mercadorias... só assim" [volta a caminhar da mesma maneira]. Mas, por que quartas e sábados? O comprador deixa na terça a cidade onde vive, compra na quarta em Ciudad del Este e empreende o regresso. Chega na quinta na cidade de origem, entrega ou coloca à venda a mercadoria e sexta-feira sai outra vez rumo a Ciudad del Este. Sábado compra e retorna, chega de volta no domingo e segunda-feira entrega ou coloca à venda a mercadoria. Esse ritmo, associado à organização da semana, é a explicação mais corrente entre sacoleiros e trabalhadores de Ciudad del Este para a intensidade do movimento às quartas e sábados.

Os sete dias da semana não são iguais, e com o domingo como dia de descanso no calendário católico, quartas e sábados configuram o par de dias opostos imediatamente anteriores ao dia de descanso. Em relação às viagens a Ciudad del Este, quartas e sábados terminam sendo a equação que libera mais dias ou frações de dias hábeis para colocar à venda a mercadoria.26 26 Comparemos, por exemplo, com outras situações de aumento na intensidade do movimento que presenciei no campo, desta vez em Foz do Iguaçu. Em agosto de 2000, vários argentinos trabalhavam com veículos, levando compradores argentinos de Puerto Iguazú aos comércios de Foz do Iguaçu (especialmente aos bairros de Puerto Meira, Vila Yolanda e Boicy). Os dias de maior movimento eram as sextas-feiras à tarde e os sábados, nos quais alguns motoristas chegavam a realizar até três viagens. Precisamente, as sextas-feiras à tarde e os sábados são dias associados ao perfil do comprador: habitantes de Puerto Iguazú que, tendo terminado a semana de trabalho, realizam as compras do mês, da quinzena ou da semana.

Esta organização do tempo talvez sirva para explicar uma convergência singular. Segundo o parágrafo escrito em 1761 por Jaques Savary des Bruslons, esta parecia ser a organização das feiras em Paris, no século XVIII: "É verdade que, nas grandes cidades, as feiras tendem a ser diárias, como em Paris, onde, em princípio (e muitas vezes de fato), só deveriam realizar-se às quartas e aos sábados" (apud Braudel, 1996Braudel, Fernand. (1996 [1979]). Civilização material, economia e capitalismo, séculos XV-XVIII. São Paulo: Martins Fontes (vol. 2: O jogo das trocas).: 16). De fato, não é somente na Paris do século XVIII, mas também em muitos outros espaços que os mercados - as feiras - acontecem duas vezes por semana.27 27 Esta era a frequência da feira de Caruaru (Pernambuco) antes de ser tornar massiva e permanente, já em inícios do século XX. Para uma análise da relação entre o polo de confecções do Agreste Pernambucano e Ciudad del Este, ver Rabossi (2008). Claro que nos locais onde a semana é outra, a periodicidade dos mercados também difere. Na África Ocidental, a semana de mercado varia entre dois e oito dias; na China, entre dez e doze. Dependendo da quantidade de dias, as combinações e as frequências são variáveis.28 28 Sobre a semana na África Ocidental e a periodicidade dos mercados, ver Thomas (1924); Hill (1966), Hodder (1971), Smith (1971). Sobre a China, ver Skinner (1964; 1965); Rozelle, Benzinger & Huang (2002). Uma apresentação sucinta das possíveis combinações na demarcação dessas semanas está em Gregory (1994: 934-935).

No entanto, a dinâmica temporal derivada da organização da semana não é a única variável para entender essas intensidades. Para alguns sacoleiros, mais importante é o número: compra-se nas quartas e nos sábados precisamente por se tratar dos dias com maior número de sacoleiros, o que diminui a probabilidade de ser parado na alfândega devido à quantidade de pessoas em circulação. Pouco importa saber por que em algum momento isto começou a ocorrer às quartas e sábados: compra-se nesses dias porque todo mundo faz o mesmo. Mais do que a organização temporal, são o resguardo e a proteção proporcionados pelo grande número de compradores que justificam o ritmo semanal.

Em 1999, quando comecei esta pesquisa, o movimento às quartas e sábados era, para mim, verdadeiramente incrível: filas e filas de ônibus na Ponte da Amizade, milhares de pessoas andando pelas ruas de Ciudad del Este e juntando suas mercadorias em Foz do Iguaçu para empreender o retorno a seus lugares de origem. À luz desses dias, o movimento durante o resto da semana parecia modesto. Em comparação, durante os oito meses de trabalho de campo, em 2001, foram muito poucos os sábados e as quartas-feiras verdadeiramente movimentados. Sempre havia muito mais movimento nesses dias do que nos demais, no entanto, a nostalgia "daqueles sábados e quartas de outros tempos" era, antes, um indício da decadência comercial vigente, no entender de comerciantes e mesiteros.

Contudo, durante o ano de 2001, independentemente do fluxo concreto de compristas, as quartas e os sábados eram os dias de maior atividade no microcentro. Não somente se viam muito mais laranjas ou transportes que trabalhavam diretamente com os sacoleiros, mas também comerciantes, mesiteros e ambulantes, cambistas e até os postos de comida se adequavam à intensidade destes dias, que se ampliava como impulsos elétricos pelo território brasileiro. Quintas-feiras e domingos eram dias de maior atenção da polícia brasileira: maior presença policial nas rodovias e nos terminais de ônibus das cidades dos sacoleiros, maiores cuidados daqueles que voltavam com suas mercadorias.29 29 Na pesquisa, esta presença policial nem sempre era resultado de decisões institucionais, mas da decisão de seus membros de aproveitarem o movimento de sacoleiros cobrando seus pedágios particulares. Precisamente, essa dinâmica extorsiva respondia ao aumento de intensidade no fluxo de sacoleiros. .

Assim, a dinâmica instaurada pela frequência das quartas e sábados escapava dos motivos dos compristas para viajar nesses dias e se consolidava como uma textura de atividades desigualmente distribuídas ao longo da semana. De uma perspectiva sincrônica, a causalidade pouco importava: a questão era que o funcionamento do microcentro estava sincronizado por essa intensidade. Às segundas-feiras, por exemplo, um dia "meio morto" (como tais dias eram descritos particularmente em 2001), muitos mesiteros e ambulantes, assim como cambistas e comerciantes, simplesmente não iam ao microcentro. Preferiam permanecer em suas casas - onde não gastavam com viagens nem com comida - ou aproveitavam para trabalhar em alguma outra coisa.

De uma perspectiva diacrônica, a causalidade - o fluxo dos compristas e seus motivos - não permite somente entender a intensidade das quartas e sábados. Também pode constituir uma pista das mudanças futuras, pois é precisamente por eles e para eles que o comércio de Ciudad del Este foi se direcionando até chegar à situação contemporânea, marcada por sua dependência do fluxo de turistas-compristas. Por esta razão, os domingos eram particularmente apreciados por alguns mesiteros e comerciantes. Considerados como os dias da semana que escapavam a essa temporalidade sacoleira, os domingos eram dias de turistas de verdade, turistas-turistas.30 30 Talvez seja esta a nova temporalidade que começa a ganhar força após anos de controle acirrado sobre os ônibus sacoleiros e com o funcionamento da nova alfândega em Foz do Iguaçu, que começou a operar em 2006.

Se o fluxo de sacoleiros que chega à cidade pautava o ciclo semanal, ele também marcava as intensidades do ciclo anual. A época anterior às festas de fim de ano era o momento de maior movimento, especialmente em novembro e dezembro.31 31 Um grande protesto ocorrido em setembro de 2001, que incluiu o fechamento da ponte por manifestantes paraguaios, mais tarde, por brasileiros, começou precisamente diante da perspectiva de que o fluxo de fim de ano seria interrompido por conta de alguns reparos na Ponte da Amizade. Até o chanceler paraguaio solicitou ao governo brasileiro postergar as obras, a pedido dos comerciantes de Ciudad del Este que, em suas próprias palavras, "[...] argumentaram ao governo nacional que o auge das vendas aos turistas acontece nos últimos quatro meses (de setembro a dezembro)" (ABC, 11/09/2001). As luzes de Natal (os pisca-pisca) e os brinquedos para as crianças eram as marcas das festas, ao passo que produtos que tinham saída durante todo o ano aumentavam significativamente suas vendas, como as bebidas, por exemplo.

Há outras datas em que o movimento se intensifica ou, pelo menos, em que esta é a expectativa: o início das aulas - cuja data era diferente em cada país - as férias de inverno, o Dia da Criança. Além dessas intensidades marcadas por datas, havia também uma diferenciação sazonal das ofertas que se condensava em determinados produtos. Quando chegava o outono, alguns pontos e comércios começavam a vender artigos de inverno: luvas, meias de lã, gorros e mantas. Quando se aproximava a primavera, um dos artigos por excelência do verão começava a ganhar os pontos de venda e os comércios: os ventiladores. Algumas dessas ofertas sobrepunham-se às festas: os presentes para o verão como, por exemplo, toda a gama de produtos para brincar na água (desde bóias e flutuadores até piscinas infláveis).

Os brinquedos, assim como a música - anteriormente em fitas cassete, durante meu trabalho de campo, em CD - também se inscreviam em outra temporalidade, aquela marcada pela moda. Algo que se expressava tanto em personagens específicos (os Teletubbies de 1999 foram substituídos pelos Pokemon no ano 2000), como em produtos (os rollerball de 1999 passaram a dividir com os scooter o lugar privilegiado dos brinquedos sobre rodas durante o ano de 2001).

A variação nas intensidades e a diversidade das relações que emergem à luz do movimento diário, semanal, sazonal e anual iluminam a complexidade do funcionamento do comércio de Ciudad del Este. Sua trama emerge no entrecruzamento de uma série de circuitos que conectam bairros e cidades, atravessando caminhos e fronteiras. Seu ritmo se alterna entre momentos frenéticos e outros de tranquilidade. Diariamente, semanalmente, anualmente.

À diferença de outros mercados nos quais o ritmo da produção marca a periodicidade (como ocorre nos mercados camponeses, por exemplo), em Ciudad del Este são os compradores que o fazem. As viagens e as compras impõem uma temporalidade particular e determinam a relação dos sacoleiros com Ciudad del Este. Observada a partir dos circuitos e da experiência sacoleira, Ciudad del Este não é mais do que o ponto que articula idas e voltas. Bate e volta. Lugar de passagem e de ritmos frenéticos, Ciudad del Este é o pivô que articula esses circuitos sacoleiros. Sua centralidade reside, precisamente, naquilo que a torna destino de tantas pessoas: o lugar de compras e oportunidades no qual milhares ganham suas vidas com o comércio. Antes de um lugar de relações e distensões, trata-se de um lugar de passagens e tensões. Quando os sacoleiros tinham um tempo para sentar, desfrutavam-no em algum dos bares perto da ponte em Foz do Iguaçu, após terem atravessado a fronteira com a mercadoria comprada.

PASSANDO: O MUNDO OBSERVADO A PARTIR DA RUA

Gregorio é mesitero, isto é, vendedor de rua no Paraguai. Ele nasceu em 1960 em Doctor Botrell, uma localidade rural perto de Villa Rica. Viajou para Puerto Presidente Stroessner, em 1977, para trabalhar na construção da barragem de Itaipu, onde seu irmão ingressara algum tempo antes. Em 1979, quando o trabalho em Itaipu acabou, ele começou a trabalhar como vendedor de rua, atividade na qual continua até hoje. Em uma de nossas conversas, ele descreveu do seguinte modo o dia a dia dos mesiteros:

A maioria abre seu ponto às seis, alguns o fazem às cinco, alguns às sete. O mais tarde que abrem é às oito. Para nós, como vou lhe dizer, [...] para dizer que trabalhamos muito, não trabalhamos. Às vezes chegamos e estamos à espera de clientes, certo? Estamos sentados lá na rua, ou jogando damas, dominó. [...] Isso, para passar o tempo, [...] às quatro, às cinco horas da tarde fechamos tudo outra vez, guardamos a mercadoria e vamos embora, cada um para sua casa. Assim nós passamos na rua.

O verbo "passar" aparece duas vezes no parágrafo anterior. Na primeira delas, associada à palavra tempo, sugere a realização de atividades - os jogos - como forma de ocupar o tempo que transcorre na espera pelos clientes. Na segunda vez, o verbo "passar" remete à experiência total de estar na rua: montando e desmontando a banca, fazendo e esperando, vendendo e jogando.

Essa forma de descrever o cotidiano apareceu recorrentemente nas falas, não só de mesiteros como de muitos dos que trabalhavam no comércio de Ciudad del Este. Forma que, de fato, captura a experiência baseada na permanência no microcentro à espera de compradores e de outras oportunidades de trabalho. Para quem está em Ciudad del Este, o ritmo instaurado pelo movimento sacoleiro tem outras consequências e se insere em outras estruturas temporais. Mais do que no frenesi dos bate e volta, o dia a dia se alterna entre momentos de atenta dedicação e outros de pouca atividade, algo que caracteriza o ritmo irregular de todos aqueles que lá estão em função do movimento comercial, seja vendendo, fazendo câmbio, carregando ou transportando.

Claro que a pouca atividade mencionada só se refere às atividades concretas de venda ou transporte, mas não ao leque de atividades sociais do dia a dia, incluindo diversas formas de relacionamento que se dão, entre outras coisas, através de jogos, atividades associativas ou bebidas. A consideração de Gregório de que "muito não trabalhamos" corresponde à restrição do trabalho exclusivamente ao momento das vendas. Porém, se estar na rua durante toda a jornada é condição necessária para a realização das vendas que justificam o dia, o trabalho implica esse "passar na rua" como experiência total e contínua, independente dos ritmos de atividade ou inatividade. Quando isto era levado em conta, a descrição do trabalho mudava de registro, destacando-se o sacrifício que significava esse "passar na rua". Algo que aparecia recorrentemente entre os participantes do mercado de Ciudad del Este, inclusive nas falas do próprio Gregório:

Às vezes, as pessoas dizem que não trabalhamos, por não fazermos um trabalho pesado dizem que ganhamos a vida fácil. Não é assim. Aqui nós sofremos de tudo. Sofremos frio, chuva, calor. Às vezes, nos molhamos todos, eh! Aqui nós chamamos de aguaceiro, passa e chove, e você fica todo molhado, certo? E estar no asfalto, certo? Receber o calor [...]. Há muita doença na rua, por culpa disso tudo. Não é como as pessoas dizem que estamos ganhando fácil a vida. [...] É muito perigoso trabalhar nas ruas.

Independentemente das dimensões em que esse "passar na rua" é considerado e dos significados a elas associados, o ritmo irregular do dia a dia está caracterizado por todas essas outras atividades além de vender, comprar, carregar ou transportar. A partir delas diferentes formas de sociabilidade se reproduzem e torna-se possível observar como se estabelecem determinadas clivagens entre os distintos grupos que atuam em Ciudad del Este. Estes aspectos excedem os limites deste artigo, contudo é fundamental levá-los em conta para entender a relação diferenciada dos distintos atores com o espaço social do mercado no qual atuam. A relação dos sacoleiros está pautada pela temporalidade das compras e das passagens. No entanto, as relações dos paraguaios que trabalham no centro da cidade, dos brasileiros que trabalham nos comércios, bem como dos comerciantes libaneses, chineses ou coreanos, entre tantos outros, estão associadas às diferentes arenas de sociabilidade reproduzidas no dia a dia do mercado e vinculadas à diferente espacialização das atividades e dos grupos e com as formas de relação, de produção e reprodução de fronteiras e distinções sociais.32 32 Para o caso específico dos imigrantes do Oriente Médio, ver Rabossi (2010b). Alguns elementos gerais para enquadrar essas interações foram explorados em Rabossi (2010c).

ESPAÇOS E TEMPO DAS TROCAS

Comecei este trabalho dizendo que, como lugar de trocas, o mercado supõe um espaço e um tempo nos quais ocorrem as transações.33 33 A atenção às dinâmicas espaço-temporais é constitutiva dos trabalhos sobre mercados, tal como aparece em alguns clássicos da antropologia (Malinowski & De la Fuente, 1957; Skinner, 1964; Bohannan & Bohannan, 1968; Geertz, 1979). Como lugares de intercâmbios, os mercados não podem ser pensados fora de sua espacialidade. Como práticas de intercâmbio, o que se passa ali não pode ser pensado fora de sua temporalidade. Para uma análise da relação entre consumo e temporalidade que permite pensar as variações sazonais aqui analisadas, ver Appadurai (1997: cap. 4). Claro que as articulações espaço-temporais variam de acordo com os diferentes arranjos nos quais as transações acontecem. Por exemplo, o tempo das trocas acompanha a descontinuidade da espacialização das feiras: o dia da feira é o momento em que a feira ocupa seu lugar, sendo desmontada ao final. Já os distritos comerciais e as galerias instauram uma continuidade espacial, cuja descontinuidade temporal segue as convenções que regulam as atividades diárias e que, de fato, o comércio ajuda a pautar: não por acaso um dos nomes do tempo regular do trabalho na cidade é "horário comercial". As lojas e os supermercados "24 horas" quebraram essa temporalidade, instaurando uma oferta localizada e contínua. No caso da Internet, o espaço é virtual e o tempo é contínuo, ainda que em termos da concretização das trocas as variações contem mais do que as regularidades: a continuidade da oferta é, de fato, uma continuidade para o comprador e, em muitos casos, os empregados geralmente cumprem horários convencionais, processando os pedidos e as vendas em horários comerciais.34 34 Há uma enorme quantidade de trabalhos sobre cada uma destas formas de relacionamento entre tempo e espaço. Limito-me a indicar aqueles que me ajudaram no desenvolvimento das ideias aqui apresentadas. Sobre a dinâmica das feiras na Idade Média, ver Braudel (1996:15 e ss.) e sobre os comércios que começam a ganhar o espaço das feiras nas cidades da Idade Média, ver Braudel (1996: 45 e ss.). Para a dinâmica das feiras do Nordeste brasileiro e o comércio nas usinas e nas cidades, ver Palmeira (2014) e Garcia (1977; 1984). Sobre o lugar das arcadas e galerias na cidade moderna, ver Hetherington (1997). Sobre a emergência dos grandes mercados (supermercados), ver Miller (1981). Sobre os shopping centers como tecnologia de vendas, ver Harvard Project on the City (2000: 124-183). Para uma discussão mais geral sobre o lugar dos shopping centers na dinâmica da cidade, ver Rybczynski (1996: cap. 9). Sobre o comércio na Internet, ver Miller & Slater (2000, em especial o capítulo 6, Doing bussines online). Contudo, as consequências espaciais e temporais destes arranjos para as pessoas dependem do que elas fazem: se esperam pelos compradores no posto de venda durante todo o dia de trabalho ou deambulam procurando um produto são meros exemplos disto.35 35 Nos casos reportados nos quais a distinção entre comprar e vender não define papéis e identidades diferenciais entre vendedores e público (Geertz, 1979: 185), as práticas espaciais e as temporalidades do ato de vender e de comprar são diferentes.

Em nossas transações, operamos cotidianamente com esses diferentes arranjos ancorados em diferentes parâmetros convencionais. O "horário comercial" é um deles, a "semana laboral" é outro; todos eles coordenados pelo tempo standard do lugar onde estamos: tempos nacionais ajustados ao standard-time zone system, cuja referência é o meridiano de Greenwich.36 36 Uma descrição sobre a estandardização do tempo e o estabelecimento do Greenwich Mean Time (GTM) está em Zerubavel (1982).

As definições territoriais e temporais dos Estados revelam-se de forma marcada em seus espaços fronteiriços. No caso das fronteiras onde existem mercados operando com pessoas que provêm do outro lado do limite, a complexidade destas definições revela-se com maior nitidez. Ciudad del Este e Foz do Iguaçu são mercados de fronteira unidos pela Ponte da Amizade. É impossível falar de um sem falar do outro. Contudo, ao observá-los conjuntamente, é possível ver as diferenças profundas que os articulam: de onde provêm as mercadorias vendidas, quem são os sujeitos ativos na passagem através da fronteira (o vendedor ou o comprador), onde está localizada a infraestrutura das passagens. Apesar de as formas das passagens parecerem as mesmas, os balizamentos legais nos quais se inserem estabelecem diferenças que se refletem nas estruturas e nas ficções utilizadas para realizá-los.

O mundo comercial de Ciudad del Este é constituído por um vocabulário de comércio e de fronteira, articulado em eixos semânticos definidos: vendas, passagens e personagens em movimento. Mesiteros e autoservices; ambulantes e galerias; importadoras; cambistas; taxistas, mototaxistas, kombistas e ônibus de turismo; laranjas; turistas, compristas, muambeiros e sacoleiros. Analisando o movimento, vimos que esse comércio pensa não somente nos compradores que vêm do Brasil, mas é modulado a partir deles; algo que tem consequências fundamentais nas atividades e no modo como o comércio funciona: seu horário, sua língua, seus produtos e, cada vez mais, sua moeda.

Observando as dinâmicas temporais apresentadas, gostaria de sublinhar uma questão aparentemente óbvia: o tempo nacional é um padrão espacializado. Em outras palavras, ao falarmos de horário em um determinado país, estamos falando de espaço e de regra, isto é, de um cronômetro sancionado ativo em um espaço delimitado. A fronteira é o limite ou, no caso de países com dimensão ampla como o Brasil, os limites dessa continuidade temporal serão as fronteiras dos Estados onde se convencionou o início do fuso horário seguinte. Este padrão temporal espacializado, observado desde o comércio de fronteira, nos permite elaborar algumas observações mais gerais sobre os processos de territorialização e relativizar, por sua vez, sua natureza e eficácia.

A fronteira constitui a inscrição territorial de uma dimensão espacial, mas também temporal e econômica.37 37 Essas três dimensões são aquelas que me interessam sublinhar neste texto, contudo há outras dimensões que possuem papel fundamental na constituição territorial do Estado. Isto é, além de serem produzidas com e por seus mapas e suas bandeiras, suas línguas e suas constituições, essas totalidades que são os Estados modernos também são produzidas territorialmente a partir de seus regimes de propriedade e de suas moedas, suas regras jurídicas e sua ordem fiscal, seu fuso horário e sua organização temporal. Independentemente da organização da produção e da distribuição, essa territorialidade estatal é a matriz dos intercâmbios no duplo sentido do termo: como articulação de variáveis que a produzem e como molde que formata esses intercâmbios.38 38 Atividades que tiram proveito dos diferenciais emergentes dessa territorialidade estatal se encontram (ou encontravam) presentes tanto em países socialistas quanto capitalistas, com regimes centralizados ou descentralizados, funcionando com sistemas de preços regulados ou desregulados. Esclareço este aspecto para assinalar que a relação entre espaços e mercados transcende as formas de organização da produção e da distribuição.

Assinalo isto não para reificar a dimensão estatal, mas sobretudo para reintroduzi-la em nossa compreensão das dinâmicas apresentadas neste texto, que parecem contradizê-la mais que confirmá-la. No final das contas, a existência do limite não impede a circulação de pessoas, mercadorias e dinheiro vindos do outro lado da fronteira nas ruas de Ciudad del Este, nem o funcionamento de uma complexa rede de aprovisionamento de mercadorias importadas que se espalha pelo Brasil inteiro por mais de 20 anos. Nem mesmo consegue garantir que o horário utilizado pelas lojas corresponda ao horário oficial do país em que se localizam.

Uma conclusão possível é a de que o limite é insignificante ou irrelevante. Outra conclusão poderia ser que a eficácia do limite ainda está em construção. Ambas, porém, tangenciariam uma questão crucial para o entendimento de dinâmicas fronteiriças como as de Ciudad del Este: o fato de o movimento ocorrer precisamente em função da existência da fronteira. Contudo, isto não se deve à mera existência da fronteira, mas à sedimentação de diversos processos históricos que tornaram possível a existência de um lugar com as características singulares de Ciudad del Este. Esses processos históricos envolvem projetos governamentais, fluxos migratórios, desenvolvimentos comerciais e empresariais, controles e tolerâncias, entre muitos outros elementos (Rabossi, 2004Rabossi, Fernando. (2004). Nas ruas de Ciudad del Este: vidas e vendas num mercado de fronteira. Tese de Doutorado. PPGAS-Museu Nacional/Universidade Federal do Rio de Janeiro.). Os processos históricos que modelaram aquele espaço, no entanto, não iluminam o cotidiano no qual ele é produzido e reproduzido. Precisamente aqui, a descrição etnográfica, ancorada nas dimensões espaciais e temporais exploradas ao longo do texto, nos ajuda a visualizar a complexidade e a multiplicidade de atores, circuitos e relações que constituem aquele espaço.

A dinâmica instaurada pelo limite internacional - derivada da presença contígua de territórios sujeitos a regimes legais diferenciais dos quais derivam os controles das importações e as políticas impositivas, entre tantos outros aspectos - desenvolve-se apesar desse limite internacional; isto é, apesar dos controles instaurados para regular o fluxo das mercadorias e das pessoas. Isto produz uma situação singular: um espaço de inter-relações que se estrutura a partir das diferenças. Ambos os elementos pressupõem a existência do outro e não se anulam mutuamente.39 39 Alguns autores caracterizaram o espaço no qual se encontram os limites internacionais entre Brasil, Paraguai e Argentina como possuidor de uma unidade específica. Reinaldo Penner fala em “uma só área urbana das Três Fronteiras” (Penner, 1998: 5). Carmen Ferradás, em um “complex tri-national urban space” e, mais adiante, em uma “unusual world city” (Ferradás, 1998: 12 e 18). A expressão mais clara a este respeito aparece em um trabalho de pesquisadores do Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social: “À revelia das causas institucionais e/ou econômicas que provocam alterações nas oportunidades e reforçam a demarcação das fronteiras, o cotidiano das relações estabelece um pacto, ainda que informal, de cooperação e parcerias, não propriamente entre os três países, mas, sim, entre as três fronteiras. Um espaço que não pertence a nenhum país, um espaço do Mundo. Isto significa a própria negação da fronteira” (Kleinke et al., 1997: 160). O fato de haver inter-relações, no entanto, não significa o pertencimento a uma entidade comum, tampouco apaga os limites que estruturam tais relações. As dinâmicas espaciais e temporais que emergiram da análise do movimento são uma demonstração disto, descortinando um universo no qual as superposições e a multiplicidade são a regra.

NOTAS

  • 1
    Uma versão preliminar deste trabalho foi apresentada no Colóquio Internacional "Quantificação e temporalidade: perspectivas etnográficas sobre a economia", organizado pelo Núcleo de Pesquisas em Cultura e Economia e realizado no Museu Nacional/UFRJ, Rio de Janeiro, 24-26 de agosto de 2005.
  • 2
    Para uma análise do lugar de Ciudad del Este na construção dos estereótipos brasileiros sobre o Paraguai, ver Rabossi (2010a)Rabossi, Fernando. (2010a). Made in Paraguai: notas sobre la producción de Ciudad del Este. Papeles de Trabajo - Revista Electrónica del IDAES, 6 (Buenos Aires). Disponível em: <http://www.idaes.edu.ar/papelesdetrabajo/paginas/Documentos/7%20Rabossi.pdf>. Acesso em 18 jun. 2014.
    http://www.idaes.edu.ar/papelesdetrabajo...
    . Para outra interpretação da origem dos estereótipos sobre o Paraguai, ver Silveira (2007Silveira, Mauro César. (2007). As marcas do preconceito no jornalismo brasileiro e a história do Paraguay Illustrado. Intercom - Revista Brasileira de Ciências da Comunicação, 30/2, p. 41-66.; 2009)Silveira, Mauro César. (2009). A batalha de papel: A charge como arma na guerra contra o Paraguai. Florianópolis: Ed. UFSC..
  • 3
    Se agregarmos a este número a população dos distritos articulados na dinâmica urbana de Ciudad del Este, tais como Hernandarias (63.248), Minga Guazú (48.006) e Presidente Franco (52.826), o conjunto apresenta uma população total de 386.354 pessoas (DGEEC, 2004DGEEC. (2004). Paraguay. Resultados finales, Censo Nacional de Población y Viviendas (Año 2002 - Distrital). Assunção: Dirección General de Estadísticas, Encuestas y Censos.: 102 e ss.). Os resultados do censo que começou a ser realizado em 2012 ainda não foram publicados.
  • 4
    Foz do Iguaçu é um dos principais destinos turísticos do Brasil, tanto de visitantes nacionais como internacionais. Entre os anos 2007 e 2013, Foz do Iguaçu foi, intercaladamente com Florianópolis, segundo e terceiro destinos dos turistas internacionais em viagens de lazer no Brasil - sendo o Rio de Janeiro o primeiro destino (Ministério de Turismo, 2014Ministério de Turismo. (2014). Estudo da demanda turística internacinal, 2007-2013. Brasília: Ministério de Turismo.).
  • 5
    Dados fornecidos pelo Departamento Nacional de Estradas de Rodagem (DNER) aos meios de comunicação em setembro de 2001. Uma análise do movimento na ponte com os dados oficiais da DNER está em Rabossi (2004: 40-42 e 306)Rabossi, Fernando. (2004). Nas ruas de Ciudad del Este: vidas e vendas num mercado de fronteira. Tese de Doutorado. PPGAS-Museu Nacional/Universidade Federal do Rio de Janeiro..
  • 6
    A descrição da mesma como uma "ponte urbana" foi feita pelo diretor local do departamento de estradas brasileiro (comunicação pessoal).
  • 7
    Segundo dados levantados por uma pesquisa do Banco Central do Paraguai, de junho de 1998, a distribuição por origem dos donos dos comércios era a seguinte: paraguaio, 28%; oriental, 27%; árabe, 24%; brasileiro, 11%; outros/não especificados, 10%. Isto é, 72% dos comerciantes do microcentro eram de origem estrangeira. Destes, 30% residiam em Foz do Iguaçu (Penner, 1998Penner, Reinaldo. (1998). Movimiento comercial y financiero de Ciudad del Este: Perspectivas dentro del proceso de integración. Assunção: Departamento de Economía Internacional/Gerencia de Estudios Económicos/Banco Central del Paraguay.). Em 2001, havia aproximadamente 1.750 comércios funcionando no microcentro. Em 1994/1995, anos do auge comercial, havia 7 mil.
  • 8
    Pasero (em espanhol), no Paraguai, é a pessoa que passa mercadoria através do limite internacional para ser vendida do outro lado. Na fronteira aqui analisada, os paseros e paseras só trabalham no fluxo de mercadorias, sentido Foz do Iguaçu-Cuidad del Este. Muitos deles são mulheres.
  • 9
    Em 2001, eram 5 mil os brasileiros que trabalhavam nos comércios do centro (80% do total de 6.250 empregados). Em um estudo para o Banco Interamericano de Desenvolvimento realizado em 1995, fala-se em 23.950 empregados no comércio do microcentro, 65% dos quais vivendo em Foz do Iguaçu (Penner, 1998Penner, Reinaldo. (1998). Movimiento comercial y financiero de Ciudad del Este: Perspectivas dentro del proceso de integración. Assunção: Departamento de Economía Internacional/Gerencia de Estudios Económicos/Banco Central del Paraguay.).
  • 10
    Mesitero (em espanhol) é o vendedor de rua que trabalha em um lugar específico. O nome deriva da pequena mesa (mesita) desmontável sobre a qual ele coloca a mercadoria. Em 2001, havia mais de 1.500 mesiteros regularmente, número que dobrava nos dias de maior atividade.
  • 11
    Em 2001, havia 600 cambistas trabalhando nas ruas.
  • 12
    Serviço de táxi em motocicleta. Em 2001, havia 150 do lado paraguaio e 300 do lado brasileiro, trabalhando nas associações autorizadas. Segundo estimativas, mais de mil mototáxis trabalhavam no transporte de mercadorias e pessoas.
  • 13
    Pessoa que dirige uma kombi no transporte alternativo de Ciudad del Este. O nome deriva de kombi, a caminhonete Volkswagen utilizada para tal transporte. Em 2001 havia entre 600 e 1.000 kombistas.
  • 14
    Pessoa que ganha dinheiro colocando à disposição dos outros seu direito de trazer mercadorias do exterior como se fossem suas. Por este motivo, só podem ser brasileiros.
  • 15
    Os autoservices funcionam como supermercados de produtos não perecíveis expostos em prateleiras, com preços públicos, nos quais não é necessária a figura do empregado que atende cliente por cliente. O surgimento e a expansão dos autoservices estão relacionados à massificação das vendas de determinados produtos, atrelada à figura dos sacoleiros.
  • 16
    A palavra sacoleiro deriva de sacola que, em português, significa saco. A sacola, protótipo do comércio de Ciudad del Este, tem a mesma trama dos sacos de juta, mas em material plástico. Os sacoleiros do Paraguai também são chamados de muambeiros que, segundo o Dicionário Aurélio (2001), são aqueles que negociam com muamba (contrabando).
  • 17
    Pelas regulamentações em uso, os táxis paraguaios voltando a Ciudad del Este não podem levar passageiros do lado brasileiro. Por este motivo, uma maneira de salvar el viaje (como escutei de vários taxistas) era cobrar um preço módico para atravessar a ponte. Assim, se no sentido Foz do Iguaçu-Ciudad del Este cobravam-se entre R$ 5 e R$ 15 em 2001, em sentido contrário, o valor cobrado era de R$ 1.
  • 18
    Para uma análise das transformações no comércio de fronteira durante a década passada, ver Cardin (2010)Cardin, Eric Gustavo. (2010). A expansão do capital e as dinâmicas da fronteira. Tese de Doutorado em Sociologia. Universidade Estadual Paulista (Unesp), Araraquara. e Pinheiro-Machado (2010)Pinheiro-Machado, Rosana. (2010). Caminos del contrabando. La fiscalización en el Puente de la Amistad y sus efectos en la cotidianidad de la Triple Frontera. In: Giménez Béliveau, Verónica & Montenegro, Silvia (orgs.). La Triple Frontera: dinámicas culturales y procesos transnacionales. Buenos Aires: Espacio Cultural, p. 99-117..
  • 19
    O lugar de Ciudad del Este como centro de provisão de artigos importados para o mercado brasileiro foi ocupado, ao longo da década passada, por São Paulo. Para uma análise das transformações urbanas e comerciais ocorridas em São Paulo e sua articulação com circuitos de compradores de diversas partes do Brasil, ver Freire da Silva (2014)Freire da Silva, Carlos. (2014). Das calçadas às galerias: mercados populares do centro de São Paulo. Tese de Doutorado. Programa de Pós-Graduação em Sociologia/Universidade de São Paulo..
  • 20
    A adequação horária ao momento em que os controles eram menos estritos foi observada em sentido inverso em outubro de 2001. O movimento das kombis e caminhonetes que traziam produtos do Brasil era realizado da madrugada até às sete da manhã, momento em que os empregados da alfândega paraguaia começavam sua jornada de trabalho. Assim, as exportadoras de comestíveis localizadas em Foz do Iguaçu, seja em Vila Portes - muitas delas, propriedades de paraguaios - ou as outras casas de exportação de Jardim Jupira, começavam suas atividades entre as três e as quatro horas da manhã.
  • 21
    Para uma análise da relação entre propaganda, experiência do espaço e tempo na cidade, ver Cronin (2003)Cronin, Anne. (2003). Advertising and commercial space: the material and symbolic organisation of the city's histories and futures. Trabalho apresentado no Seminario "Renovações urbanas: violência, consumo e cultura na cidade", Rio de Janeiro, Instituto de Pluralismo Cultural, UCAM, 29 de setembro a 1 de outubro..
  • 22
    A centralidade da figura do guia nas excursões de compras do outro lado da fronteira também é assinalada por Konstantinov, no caso dos compradores búlgaros que se deslocam até a Turquia para se abastecerem de mercadorias. Nesse caso, trata-se de donas de agências de viagens, mulheres entre 25 e 45 anos, búlgaras, antigas empregadas da Agência Nacional de Turismo - Balkantourist - que detinha o monopólio do turismo transfronteiriço nos tempos socialistas (Kostantinov, 1996Konstantinov, Yulian. (1996). Patterns of reinterpretation: trader-tourism in the Balkans (Bulgaria) as a picaresque metaphorical enactment of post-totalitarianism. American Ethnologist, 23/4, p. 762-782.). Um detalhe a ser explorado, de fato: quase todos os guias que conheci trabalhando com sacoleiros eram mulheres.
  • 23
    Nos ônibus de linhas regulares, alguns motoristas ocupam essa posição, e "uma caixinha" lhes é entregue para que levem em consideração o fato de haver pessoas transportando mercadorias - algo que implica detectar controles que possam ser evitados, passar decididamente se preciso for, e parar nos pontos indicados pelos "compristas" para descarregar a mercadoria.
  • 24
    Estes elementos foram explorados em Rabossi (2004: 265 e ss.)Rabossi, Fernando. (2004). Nas ruas de Ciudad del Este: vidas e vendas num mercado de fronteira. Tese de Doutorado. PPGAS-Museu Nacional/Universidade Federal do Rio de Janeiro..
  • 25
    De acordo com uma matéria de 1994 - ano do auge do funcionamento comercial de Ciudad del Este - a diferença entre quartas e sábados e os demais dias da semana era mais que o dobro. Seguindo a informação fornecida pela Receita Federal, a matéria diz o seguinte: "Nos dias de pico de movimento na ponte, às quartas e sábados, mais de 50 mil brasileiros cruzam a fronteira - contra uma média de 20 mil nos dias considerados normais - apostando na possibilidade de escapar da fiscalização." (Folha de S. Paulo, 1994). As descrições daqueles que trabalhavam em Ciudad del Este corroboravam esta imagem. Kleber, um brasileiro que por anos foi mesitero, expressava esta questão graficamente: "Você não sabe o que era o movimento lá! Sábados? Tinha três filas de ônibus de turismo, e lá em Cidade do Este chegavam até o elevado lá acima [km 4 1/2]. E caminhar? Só assim! [baixa os ombros, cola os braços ao corpo e dá passos que não chegam a ultrapassar o outro pé] Caminhar na ponte era impossível! Carregando as mercadorias... só assim" [volta a caminhar da mesma maneira].
  • 26
    Comparemos, por exemplo, com outras situações de aumento na intensidade do movimento que presenciei no campo, desta vez em Foz do Iguaçu. Em agosto de 2000, vários argentinos trabalhavam com veículos, levando compradores argentinos de Puerto Iguazú aos comércios de Foz do Iguaçu (especialmente aos bairros de Puerto Meira, Vila Yolanda e Boicy). Os dias de maior movimento eram as sextas-feiras à tarde e os sábados, nos quais alguns motoristas chegavam a realizar até três viagens. Precisamente, as sextas-feiras à tarde e os sábados são dias associados ao perfil do comprador: habitantes de Puerto Iguazú que, tendo terminado a semana de trabalho, realizam as compras do mês, da quinzena ou da semana.
  • 27
    Esta era a frequência da feira de Caruaru (Pernambuco) antes de ser tornar massiva e permanente, já em inícios do século XX. Para uma análise da relação entre o polo de confecções do Agreste Pernambucano e Ciudad del Este, ver Rabossi (2008)Rabossi, Fernando. (2008). En la ruta de las confecciones. Crítica en Desarrollo, 2, p. 151-171..
  • 28
    Sobre a semana na África Ocidental e a periodicidade dos mercados, ver Thomas (1924)Thomas, Northcote W. (1924). The week in West Africa. Journal of the Royal Anthropological Institute, 54, p. 183-209.; Hill (1966)Hill, Polly. (1966). Notes on traditional market authority and market periodicity in West Africa. Journal of African History, VII/2, p. 349-366., Hodder (1971)Hodder, Bramwell W. (1971). Periodic and daily markets in West Africa. In: Melliassoux, Claude (org.). The development of Indigenous trade and market in West Africa. Londres: Oxford University Press, p. 347-358., Smith (1971)Smith, Robert H. T. (1971). West-African market-places: temporal periodicity and locational spacing. In: Melliassoux, Claude (org.). The development of Indigenous trade and market in West Africa. Londres: Oxford University Press, p. 319-346.. Sobre a China, ver Skinner (1964Skinner, G. William. (1964). Marketing and social structure in rural China: Part I. The Journal of Asian Studies, 24/1, p. 3-43.; 1965)Skinner, G. William. (1965). Marketing and social structure in rural China: Part III. The Journal of Asian Studies, 24/3, p. 363-399.; Rozelle, Benzinger & Huang (2002)Rozelle, Scott; Benzinger, Vince & Huang, Jikun. (2002). Continuity and change in China's rural periodic markets. Working Paper 02-009. Department of Agricultural and Resource Economics. Davis: University of California Press.. Uma apresentação sucinta das possíveis combinações na demarcação dessas semanas está em Gregory (1994: 934-935)Gregory, Chris A. (1994). Exchange and reciprocity. In: Ingold, Tim (org.). Companion encyclopedia of anthropology. Londres: Routledge, p. 911-939..
  • 29
    Na pesquisa, esta presença policial nem sempre era resultado de decisões institucionais, mas da decisão de seus membros de aproveitarem o movimento de sacoleiros cobrando seus pedágios particulares. Precisamente, essa dinâmica extorsiva respondia ao aumento de intensidade no fluxo de sacoleiros. .
  • 30
    Talvez seja esta a nova temporalidade que começa a ganhar força após anos de controle acirrado sobre os ônibus sacoleiros e com o funcionamento da nova alfândega em Foz do Iguaçu, que começou a operar em 2006.
  • 31
    Um grande protesto ocorrido em setembro de 2001, que incluiu o fechamento da ponte por manifestantes paraguaios, mais tarde, por brasileiros, começou precisamente diante da perspectiva de que o fluxo de fim de ano seria interrompido por conta de alguns reparos na Ponte da Amizade. Até o chanceler paraguaio solicitou ao governo brasileiro postergar as obras, a pedido dos comerciantes de Ciudad del Este que, em suas próprias palavras, "[...] argumentaram ao governo nacional que o auge das vendas aos turistas acontece nos últimos quatro meses (de setembro a dezembro)" (ABC, 11/09/2001ABC. (2001). Piden a Brasil postergar para enero a reparación del puente. ABC Color, Assunção, 11 setembro, p. 4.).
  • 32
    Para o caso específico dos imigrantes do Oriente Médio, ver Rabossi (2010b)Rabossi, Fernando. (2010b). Interações e estereótipos: os "árabes" de Foz do Iguaçu e Ciudad del Este a partir do comércio de fronteira. In: Pacelli, Ademir; Vainer, Carlos; Póvoa Neto, Helion & Santos, Miriam de Oliveira (orgs.). A experiência migrante: entre deslocamentos e reconstruções. Rio de Janeiro: Garamond, p. 249-265.. Alguns elementos gerais para enquadrar essas interações foram explorados em Rabossi (2010c)Rabossi, Fernando. (2010c). Cómo pensamos la Triple Frontera? In: Giménez Béliveau, Verónica & Montenegro, Silvia (orgs.). La Triple Frontera: dinámicas culturales y procesos transnacionales. Buenos Aires: Espacio Cultural, p. 21-45..
  • 33
    A atenção às dinâmicas espaço-temporais é constitutiva dos trabalhos sobre mercados, tal como aparece em alguns clássicos da antropologia (Malinowski & De la Fuente, 1957Malinowski, Bronislaw & De la Fuente, Julio. (1957 [1941]). La economía de un sistema de mercados en México. Un ensayo de etnografía contemporánea y cambio social en un valle mexicano. Acta Anthropologica, Acta Antropologica, 1/2, Época 2.; Skinner, 1964Skinner, G. William. (1964). Marketing and social structure in rural China: Part I. The Journal of Asian Studies, 24/1, p. 3-43.; Bohannan & Bohannan, 1968Bohannan, Paul & Laura Bohannan. (1968). Tiv economy. Evanston: Northwestern University Press.; Geertz, 1979Geertz, Clifford. (1979). Suq: the bazaar economy in Sefrou. In: Geertz, Clifford; Geertz, Hildred & Rosen, Lawrence (orgs.). Meaning and order in Moroccan society. Three essays in cultural analysis. Cambridge: Cambridge University Press, p. 123-310.). Como lugares de intercâmbios, os mercados não podem ser pensados fora de sua espacialidade. Como práticas de intercâmbio, o que se passa ali não pode ser pensado fora de sua temporalidade. Para uma análise da relação entre consumo e temporalidade que permite pensar as variações sazonais aqui analisadas, ver Appadurai (1997: cap. 4)Appadurai, Arjun. (1997). Modernity at large: cultural dimensions of globalization. Minneapolis/Londres: University of Minnesota Press..
  • 34
    Há uma enorme quantidade de trabalhos sobre cada uma destas formas de relacionamento entre tempo e espaço. Limito-me a indicar aqueles que me ajudaram no desenvolvimento das ideias aqui apresentadas. Sobre a dinâmica das feiras na Idade Média, ver Braudel (1996:15 e ss.)Braudel, Fernand. (1996 [1979]). Civilização material, economia e capitalismo, séculos XV-XVIII. São Paulo: Martins Fontes (vol. 2: O jogo das trocas). e sobre os comércios que começam a ganhar o espaço das feiras nas cidades da Idade Média, ver Braudel (1996: 45 e ss.)Braudel, Fernand. (1996 [1979]). Civilização material, economia e capitalismo, séculos XV-XVIII. São Paulo: Martins Fontes (vol. 2: O jogo das trocas).. Para a dinâmica das feiras do Nordeste brasileiro e o comércio nas usinas e nas cidades, ver Palmeira (2014)Palmeira, Moacir. (2014 [1971]). Feira e mudança econômica. Vibrant - Virtual Brazilian Anthropology, 11/1. Disponível em: <http://www.vibrant.org.br/issues/v11n1/moacir-palmeira-feira-e-mudanca-economica/>. Acesso em 10 dez. 2014.
    http://www.vibrant.org.br/issues/v11n1/m...
    e Garcia (1977Garcia, Marie France. (1977). O Bacuru: étude de cas de un marché situé dans une usina. Dissertação de Mestrado. PPGAS-Museu Nacional/Universidade Federal de Rio de Janeiro.; 1984)Garcia, Marie France. (1984). Feira e trabalhadores rurais: As feiras do Brejo e do Agreste Paraibano. Tese de Doutorado. PPGAS-Museu Nacional/Universidade Federal de Rio de Janeiro.. Sobre o lugar das arcadas e galerias na cidade moderna, ver Hetherington (1997)Hetheringhton, Kevin. (1997). The badlands of modernity: heterotopia and social ordering. Londres: Routledge.. Sobre a emergência dos grandes mercados (supermercados), ver Miller (1981)Miller, Michael B. (1981). The bon marché: bourgeois culture and the department store, 1869-1920. Princeton: Princeton University Press.. Sobre os shopping centers como tecnologia de vendas, ver Harvard Project on the City (2000: 124-183)Harvard Project on the City. (2000). Shopping (Tae-Wook Cha, Chuihua Judy Chung, Jutiki Gunter, Daniel Herman, Hiromi Hosoya, Sze Tsung Leong, Kiwa Matsushita, John Mcmorrough, Juan Palop-Casado, Markus Schaefer, Tran Vinh, Srdjan Jovanovich Weiss and Louise Wyman). In: Koolhaas, Rem et al.. Mutations. Barcelona: ACTAR, p. 124-183.. Para uma discussão mais geral sobre o lugar dos shopping centers na dinâmica da cidade, ver Rybczynski (1996: cap. 9)Rybczynski, Witold. (1996). Vida nas cidades. Expectativas urbanas no Novo Mundo. Rio de Janeiro/São Paulo: Record.. Sobre o comércio na Internet, ver Miller & Slater (2000, em especial o capítulo 6, Doing bussines online)Miller, Daniel & Slater, Don. (2000). The Internet: an ethnographic approach. Oxford/Nova York: Berg..
  • 35
    Nos casos reportados nos quais a distinção entre comprar e vender não define papéis e identidades diferenciais entre vendedores e público (Geertz, 1979Geertz, Clifford. (1979). Suq: the bazaar economy in Sefrou. In: Geertz, Clifford; Geertz, Hildred & Rosen, Lawrence (orgs.). Meaning and order in Moroccan society. Three essays in cultural analysis. Cambridge: Cambridge University Press, p. 123-310.: 185), as práticas espaciais e as temporalidades do ato de vender e de comprar são diferentes.
  • 36
    Uma descrição sobre a estandardização do tempo e o estabelecimento do Greenwich Mean Time (GTM) está em Zerubavel (1982)Zerubavel, Eviatar. (1982). The standardization of time: a sociohistorical perspective. The American Journal of Sociology, 88/1, p. 1-23..
  • 37
    Essas três dimensões são aquelas que me interessam sublinhar neste texto, contudo há outras dimensões que possuem papel fundamental na constituição territorial do Estado.
  • 38
    Atividades que tiram proveito dos diferenciais emergentes dessa territorialidade estatal se encontram (ou encontravam) presentes tanto em países socialistas quanto capitalistas, com regimes centralizados ou descentralizados, funcionando com sistemas de preços regulados ou desregulados. Esclareço este aspecto para assinalar que a relação entre espaços e mercados transcende as formas de organização da produção e da distribuição.
  • 39
    Alguns autores caracterizaram o espaço no qual se encontram os limites internacionais entre Brasil, Paraguai e Argentina como possuidor de uma unidade específica. Reinaldo Penner fala em “uma só área urbana das Três Fronteiras” (Penner, 1998Penner, Reinaldo. (1998). Movimiento comercial y financiero de Ciudad del Este: Perspectivas dentro del proceso de integración. Assunção: Departamento de Economía Internacional/Gerencia de Estudios Económicos/Banco Central del Paraguay.: 5). Carmen Ferradás, em um “complex tri-national urban space” e, mais adiante, em uma “unusual world city” (Ferradás, 1998Ferradás, Carmen. (1998). How a green wilderness became a trade wilderness: the story of a Southern Cone frontier. PoLAR - Political and Legal Anthropology Review, 21/2, p. 11-25.: 12 e 18). A expressão mais clara a este respeito aparece em um trabalho de pesquisadores do Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social: “À revelia das causas institucionais e/ou econômicas que provocam alterações nas oportunidades e reforçam a demarcação das fronteiras, o cotidiano das relações estabelece um pacto, ainda que informal, de cooperação e parcerias, não propriamente entre os três países, mas, sim, entre as três fronteiras. Um espaço que não pertence a nenhum país, um espaço do Mundo. Isto significa a própria negação da fronteira” (Kleinke et al., 1997Kleinke, Maria L. U.; Cardoso, Nelson A.; Ultramari, Clovis & Moura, Rosa. (1997). O paraíso dos outros. In: Catello, Iara R. et al. (orgs.). Fronteiras na América Latina: espaços em transformação. Porto Alegre: Ed. UFRGS/Fundação de Economia e Estatística Siegfried Emanuel Heuser, p.151-162.: 160). O fato de haver inter-relações, no entanto, não significa o pertencimento a uma entidade comum, tampouco apaga os limites que estruturam tais relações.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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    » http://www.vibrant.org.br/issues/v11n1/moacir-palmeira-feira-e-mudanca-economica/
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    May-Aug 2015

Histórico

  • Recebido
    14 Mar 2013
  • Aceito
    20 Maio 2014
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