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Ruffato: um escritor e um projeto de nação

Ruffato: a writer and a project of nation

Ruffato: un escritor y un proyecto de nación

resumo

Este artigo visa examinar o projeto de escrita do Ruffato e seu lugar na série literária brasileira, tendo em vista a relação literatura e sociedade. Para isso, parte-se de um livro como elo metonímico da trajetória literária do autor ─ eles eram muitos cavalos, publicado em 2005, com recepção crítica que o toma como um marco da literatura brasileira contemporânea. Discute-se, pois, o lugar do autor e seu trânsito pelo país e pelo mundo assim como sua intervenção no espaço público.

Palavras-chave:
escrita; nação; espaço público; Luiz Ruffato

abstract

This article aims at analyzing Ruffato’s writing project and its place in the Brazilian literary canon, focusing on the relationship between literature and society. The article examines how Ruffato’s book there were many horses, published in 2005, is used as a metonymic axis within the author’s literary trajectory, and how its critical reception is understood as a landmark of Brazilian contemporary literature. Therefore, the symbolic place of Ruffato and his transit through the country and around the world are discussed, as well as his intervention in the public sphere.

Keywords:
writing; nation; public sphere; Luiz Ruffato

resumen

Este artículo tiene como objetivo examinar el proyecto de escritura de Ruffato y su lugar en la serie literaria brasileña, teniendo en cuenta la relación entre literatura y sociedad. Para esto, se parte de un libro como vínculo metonímico de la la trayectoria literaria del autor ─ Ellos eran muchos caballos, publicado en Brasil en 2005, considerado por la crítica como punto de referencia de la literatura brasileña contemporánea. Para hablar de ello, se reflexiona sobre el lugar del autor y su tránsito por el país y el mundo, así como su intervención en el espacio público.

Palabras clave:
escritura; nación; espacio público; Luiz Ruffato

Quando se lê o texto “Até aqui, tudo bem! (como e por que sou romancista - versão século 21)”, de Luiz Ruffato (2008aRuffato, Luiz (2008). Até aqui, tudo bem! (como e por que sou romancista - versão século 21). In: MARGATO, Izabel; GOMES, Renato Cordeiro (Org.). Espécies de espaço: territorialidades, literatura, mídia. Belo Horizonte: Editora da UFMG.), entabula-se imediatamente seu diálogo com outro, publicado ainda no século XIX, “Como e por que sou romancista”, de José de Alencar (1990ALENCAR, José de (1990). Como e por que sou romancista. Campinas: Pontes.). Levanta-se, assim, a questão da leitura na formação do escritor e sua função social.

Deve-se apontar, nas duas narrativas confessionais, para as cenas de leitura que indiciam a formação dos leitores/meninos. Em Alencar, liam-se os poucos romances vindos de longe, a mãe e a vizinhança eram ouvintes, e a leitura podia se transformar em momento de evasão, marcado pela emoção.

Aos onze anos não conhecia uma só palavra de língua estrangeira, nem aprendera mais do que as chamadas primeiras letras. Muitos meninos, porém, que nessa idade tagarelam em várias línguas e já babujam nas ciências não recitam uma página de Frei Francisco de São Luís, ou uma ode do Padre Caldas, com a correção, a nobreza, eloquência e alma que Januário sabia transmitir a seus alunos. Essa prenda que a educação deu-me para tomá-la pouco depois, valeu-me em casa o honroso cargo de ledor, com que me eu desvanecia, como nunca me sucedeu ao depois no magistério ou no parlamento. Era eu quem lia para minha boa mãe não somente as cartas e os jornais, como os volumes de uma diminuta livraria romântica formada ao gosto do tempo (Alencar, 1990ALENCAR, José de (1990). Como e por que sou romancista. Campinas: Pontes., p. 24).

Não havendo visitas de cerimônia, sentava-se minha boa mãe e sua irmã D. Florinda com os amigos que apareciam, ao redor de uma mesa redonda de jacarandá, no centro da qual havia um candeeiro. Minha mãe e minha tia se ocupavam com trabalhos de costuras, e as amigas para não ficarem ociosas as ajudavam. Dados os primeiros momentos à conversação, passava-se à leitura e era eu chamado ao lugar de honra. Lia-se até a hora do chá, e tópicos havia tão interessantes que eu era obrigado à repetição. Compensavam esse excesso, as pausas para dar lugar às expansões do auditório, o qual desfazia-se em recriminações contra algum mau personagem, ou acompanhava de seus votos e simpatias o herói perseguido. Uma noite daquelas em que eu estava mais possuído do livro, lia com expressão uma das páginas mais comoventes da nossa biblioteca. As senhoras, de cabeça baixa, levavam o lenço ao rosto e poucos momentos depois não puderam conter os soluços que rompiam-lhes o seio. Com a voz afogada pela comoção e a vista empanada pelas lágrimas, eu também, cerrando ao peito o livro aberto, disparei em pranto e respondia com palavras de consolo às lamentações de minha mãe e suas amigas3 3 Esclareça-se que o livro lido por Alencar nesse momento é Oscar e Amanda (The Children of the Abbey), da escritora irlandesa Regina Maria Roche (1764-1845), publicado pela primeira vez em 1796. (Alencar, 1990ALENCAR, José de (1990). Como e por que sou romancista. Campinas: Pontes., p. 27-28).

Ruffato, formado para ser operário, lia sozinho e, pela leitura, que lhe provocava inquietação, descobria o mundo:

Quanto a mim... Bem, quanto a mim, posso dizer a meu favor que tudo se encaminhava segundo os preceitos de meus pais: estudante mediano, cavalgava-me, até que, num início de ano letivo, refugiando minha timidez numa biblioteca, passeava meus olhos displicentes pela lombada dos livros, quando a bibliotecária, confundindo distração com interesse, pescou-me, felicíssima, depositando em minhas mãos um livro, que por polidez não recusei. Carreguei-o para casa, abri-o em dois ou três dias de profunda excitação, li-o, deitado numa poltrona de napa amarela, as janelas escancaradas para a imóvel tarde anil de verão. Nunca me deixarei de lembrar daquela semana, daquele verão, daquela poltrona, daquele livro, do barulho líquido que vinha do puxado de telhas de amianto onde minha mãe, esfregando mudas de roupa no tanque, calada intuía o veneno que exalava das aparentemente inocentes páginas impressas, que, consumindo-me em febres, me conduziam a abismos de onde ninguém volta incólume. Eu tinha 12 anos e pela primeira vez me dava conta de que o mundo era maior que o meu bairro, maior que minha cidade, maior talvez que as montanhas que azulavam lá longe. E isso descobri pelas palavras de um escritor ucraniano, então soviético, Anatoly Kuznetzov,4 4 Escritor ucraniano que nasceu em Kiev (1929) e morreu em Londres (1979), cuja obra citada é Babi Yar: an document in the forme of novel. e seu romance-documentário, Bábi Iar, que narra o genocídio de milhares de judeus num campo de extermínio nas proximidades de Kiev. [...] e devorei a esmo romances brasileiros e estrangeiros, afundando-me, cada vez mais, na areia movediça da inquietação (Ruffato, 2008aRuffato, Luiz (2008). Até aqui, tudo bem! (como e por que sou romancista - versão século 21). In: MARGATO, Izabel; GOMES, Renato Cordeiro (Org.). Espécies de espaço: territorialidades, literatura, mídia. Belo Horizonte: Editora da UFMG., p. 319-320).

Não parece ser por acaso que o escritor do século XXI retoma a encenação do menino que lê perto da mãe, fato que explicitaria a diferença dos efeitos da leitura em cada um dos leitores: no primeiro, o “ledor” e os ouvintes, partilhando a comoção, “disparam em prantos” numa catarse coletiva. No caso de Ruffato, a mãe não participa da cena de leitura, antes se preocupa com seus riscos. E o menino descobre o mundo fora de casa e da pequena cidade e por ele se inquieta. Em lugar dos romances românticos, lê, em um primeiro tempo, romance político relativo ao holocausto.

Percebe-se, por meio desses relatos, que Ruffato parece percorrer o mesmo caminho de Alencar, ao fazer alusão à confissão desse leitor, mas, conscientemente, opera uma espécie de ruptura com o projeto literário do escritor romântico. Ao escrever sua versão de “Como e por que sou romancista”, Ruffato retoma a história literária, explicitando continuidades e mudanças nos rumos do romance em sua trajetória do século XIX ao século XXI.

Assim como Alencar evidencia sua filiação ao romance romântico e a um ideal de nação, Ruffato, influenciado por autores socialistas, antecipa o que seria sua principal matéria de romance: “Eu pensava sobre o universo que conheço, o do trabalhador urbano, os sonhos e pesadelos da classe média baixa” (Ruffato, 2008aRuffato, Luiz (2008). Até aqui, tudo bem! (como e por que sou romancista - versão século 21). In: MARGATO, Izabel; GOMES, Renato Cordeiro (Org.). Espécies de espaço: territorialidades, literatura, mídia. Belo Horizonte: Editora da UFMG., p. 320). Tal proposta expressa nos convida a examinar mais detidamente o projeto de escrita do Ruffato e seu lugar na série literária brasileira, tendo em vista a relação literatura e sociedade.

Para isso, consideraremos um elo metonímico da trajetória literária do autor o livro eles eram muitos cavalos, publicado em 2005, com recepção crítica que o toma como um marco da literatura brasileira contemporânea.

Nesse sentido, vale lembrar sua inserção no conjunto da obra do autor que o assina. É curioso que, depois de escrever eles eram muitos cavalos, na escrita da pentalogia Inferno provisório, Ruffato proceda a um desmanche de livros escritos anteriormente, como que exibindo os bastidores da composição da narrativa urbana, em seu duplo sentido de texto e cidade. Ao misturar os textos de Histórias de remorsos e rancores (1998Ruffato, Luiz (1998). Histórias de remorsos e rancores. São Paulo: Boitempo.) e de (os sobreviventes) (2000Ruffato, Luiz (2000). (os sobreviventes). São Paulo: Boitempo.) a outros inéditos para compor Mamma, son tanto felice (2005Ruffato, Luiz (2005a). Mamma, son tanto felice. Rio de Janeiro: Record.), O mundo inimigo (2005Ruffato, Luiz (2005b). O mundo inimigo. Rio de Janeiro: Record.), Vista parcial da noite (2006Ruffato, Luiz (2006). Vista parcial da noite. Rio de Janeiro: Record.), O livro das impossibilidades (2008bRuffato, Luiz (2008b). O livro das impossibilidades. Rio de Janeiro: Record.) e Domingos sem Deus (2011Ruffato, Luiz (2011). Domingos sem Deus. Rio de Janeiro: Record.), Ruffato como que encena uma história de migração entre cidades do interior e a capital paulista. Em um movimento inverso, focaliza a cidade de chegada, fragmentando também a ideia de origem. O Beco do Pinto, espaço interiorano “gerador” de histórias várias, é desmanchado revelando a impossibilidade do retorno ou, mais do que isso, a impossibilidade da origem. Na verdade, a cidade tem muitos becos que se cruzam labirinticamente, como o texto que se constrói e se desmancha em diferentes composições.

A esse respeito, o próprio Ruffato dá o seguinte depoimento:

Na verdade, desde o princípio eu tinha como projeto construir uma reflexão sobre a história política do Brasil. Eu só não sabia ainda como, quando escrevi o meu primeiro livro, Histórias de remorsos e rancores. Mas eu já intuía que aquilo não era uma coletânea de contos, tanto que conceituei o texto de “histórias”. Quando saiu o segundo livro (os sobreviventes), percebi que as “histórias” poderiam ser costuradas umas às outras, organizando-se num amplo painel. Mas, então, fui atropelado pela escritura do Eles eram muitos cavalos, que ao fim e ao cabo é uma radicalização da forma que procurava para o Inferno provisório. Assim, a partir de 2001, retomei os dois primeiros livros e os adequei ao projeto (Ruffato apud Pardo, 2007PARDO, Carmen Villarino (2007). Eles eram muitos cavalos no(s) processo(s) de profissionalização de Luiz Ruffato. In: HARRISON, Marguerite Itamar (Org.). Uma cidade em camadas: ensaios sobre o romance eles eram muitos cavalos, de Luiz Ruffato. Vinhedo: Horizonte, p. 155-187., p.168-169).

O “atropelamento” causado pelo livro eles eram muitos cavalos, dado como “radicalização da forma que procurava para o Inferno provisório”, põe em causa o próprio gênero narrativo, seja na forma do romance em pauta, seja no conjunto dos outros, e pode ser tomado como uma antissaga. Se Érico Veríssimo, por exemplo, conta, em O tempo e o vento, publicado em três partes de 1949 a 1961, a história do Rio Grande do Sul e sua genealogia, por meio de grandes aventuras e guerras, Ruffato conta a história de um grupo outro, que, sem nome e sobrenome, é responsável também pela história de uma região e do país.

Curioso pensar como se delineia o mapa ou como se delineiam os mapas da escrita/leitura da obra do escritor mineiro de Rodeiro/Cataguases, ora paulista com trânsito internacional, sem deixar de mencionar aí dois livros posteriores que alargam as fronteiras da migração: Estive em Lisboa e lembrei de você (2009) e Flores artificiais (2014aRuffato, Luiz (2014a). Flores artificiais. São Paulo: Companhia das letras.).

Assim, se Alencar busca a origem da nação que então se formava, sobretudo com a série indígena e mais regional, Ruffato, não deixando de considerar um projeto nacional, lida com um possível desmanche dessa origem, sua impossibilidade, enquanto põe em causa o próprio gênero em sua grandeza épica.

No mosaico geográfico, social e cultural de eles eram muitos cavalos, vê-se uma metonímia de tal processo, a começar pela referência expressa ao Romanceiro da Inconfidência, de Cecília Meireles, já uma releitura da tentativa frustrada de se instalar a República brasileira. Aí, ao lado dos bravos heróis alencarianos e dos Terra e Cambará de Érico Veríssimo, em sua trajetória de formação de nomes de família, instalam-se os anônimos “cavalos”: “Eles eram muitos cavalos, / mas ninguém mais sabe seus nomes, / sua pelagem, sua origem” (Meireles, 1972MEIRELES, Cecília (1972). Romanceiro da Inconfidência. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira., p. 228). Para Ruffato, até a metáfora animal perde sua nobreza: “e a gente feito mosca pousada na bosta/esperando a hora do pipoco feito formiga no formigueiro/esperando a hora do coturno” (Ruffato, 2001Ruffato, Luiz (2001). eles eram muitos cavalos. São Paulo: Boitempo., p. 101, grifo nosso).

Essa última citação refere-se à fala da personagem “O Crânio”, que, não por acaso é um leitor:

ele é romântico/me confessou uma vez que escreve poesia/um dia te mostro ele falou/disse que pode emprestar o caderno pros manos do rap/ conheço o povo todo a gente mostra pra eles porem música/ele falou não minha poesia não é pra cantar é pra ler/ e declamou uns versos de um livro que eu lembro o riquinho achou na rua/era uma coisa complicada pra caralho não entendi porra nenhuma/mas disse que gostei ele riu fingindo acreditar/eu falei o crânio é foda (Ruffato, 2001Ruffato, Luiz (2001). eles eram muitos cavalos. São Paulo: Boitempo., p. 102).

Misturam-se as vozes do “crânio”, em minúsculas mesmo, com sua referência a um tipo de literatura, e a voz do narrador, amigo dos rappers, responsáveis por outro tipo de produção cultural. Tal mistura, como outras ocorrentes no livro - ver, por exemplo, o vocabulário (entre o culto e o popular) -, aponta para o lugar do próprio escritor em seu trânsito espacial e temporal. Esse trânsito forma mapas, configurando trajetórias diversas, histórias em cruzamento. Entre tais histórias, figuram “a velha, esbugalhada, tenaz, grudada na poltrona número 3 da linha Garanhuns - São Paulo (fragmento 6, p. 16); o garoto que “ficou sócio num assessoria de comunicação” e “virou pau-mandado na prefeitura” (fragmento 8, p. 19); a mulher e seus filhos/ratos (fragmento 9, p. 20); a professora que, diante dos alunos, presencia a destruição da pequena escola (fragmento 11, p. 28); o índio “esticado sob a marquise de uma loja de material de construção na Avenida Santo Amaro, abraçado a um casco branco vazio, a tudo alheio, a tudo” (fragmento 14, p. 33). Não se trata de buscar dar conta das várias histórias, mas de exemplificar como, em seu emaranhado de gerentes e seguranças, pastores evangélicos e garotas de programa, entregadores de pizza e executivos, a narrativa “(de)forma” um conceito idealizado de nação, ainda que o tenha como horizonte. Aliás, esse emaranhado atinge a obra do autor, a série literária brasileira, bem como o conceito de romance e da própria literatura.

Em vista disso, importa continuar investigando as histórias de leitura que atravessam o livro em questão. Para isso, nos valeremos de alguns fragmentos do romance. No fragmento 10: “O que quer uma mulher”, retoma-se diretamente, desde o título, a pergunta de Freud: “O que quer a mulher?”,5 5 Em seus estudos sobre o feminino, depois, retomados por Lacan, Freud formula tal pergunta hoje popularizada. além de remeter aos conceitos de poder foucaultianos desenvolvidos em Microfísica do poder, o que realça a condição acadêmica do personagem masculino e do próprio autor como leitores. Nesse caso trata-se de focalizar um tipo de leitor especializado cujos desejos se contrapõem ao de sua mulher, que é tomada pela necessidade de sobrevivência e por demandas do senso-comum:

Fala baixo... os meninos... vão acabar acordando... Calma... calma o que? estou cansada muito cansada de viver com um lunático que a única coisa que dá valor na vida é a esses livros que só servem para encher a casa de fungos e adoecer as crianças só pra isso e a esse esse esse estilo de vida essa essa opção pela pobreza ah tenha paciência o que há dez anos me fascinava hoje me aborrece (Ruffato, 2001Ruffato, Luiz (2001). eles eram muitos cavalos. São Paulo: Boitempo., p. 25).

O distanciamento dos personagens de Ruffato evidencia também um distanciamento da pergunta formulada por Freud, na medida em que o desejo que move a mulher figura no fragmento em questão como necessidade e demanda, o que transformaria o lado mais enigmático da questão em miudezas do cotidiano.

O homem leitor, na fala misturada do narrador e da mulher, é caricaturado como um sujeito lunático, desleixado e conformado no dia a dia:

Quem esse homem, meu Deus? Cara gorda, ponte-móvel barriga de barril roupas desleixadas sem amigos que gasta as manhãs de sábado lavando o cachorro e o quintalzinho latinhas de cerveja e tira-gostos espetados no palito [...] e que dorme em sua cama e que é o pai de seus filhos e que meu deus já não reconhece quem é esse homem quem? (Ruffato, 2001Ruffato, Luiz (2001). eles eram muitos cavalos. São Paulo: Boitempo., p. 27-28).

Ao lado da pergunta do título, formula-se outra, que, mantendo a voz interrogativa feminina, projeta, por sua vez, o universo do homem em sua limitação. Aquilo que seria a abertura do personagem para um mundo intelectualizado é reduzido aos afazeres cotidianos das pessoas comuns.

No fragmento 15, Fran é uma atriz fracassada, que transita entre o sofá e o telefone, à espera de um telefonema de um agente que lhe ofereceria um papel em uma peça. Outra vez o foco está sobre a mulher, mas agora é ela a leitora de livros, ainda que de autoajuda.

Atirada no sofá, beberica uma segunda dose de uísque-caubói, verifica a campainha do telefone, Está alto sim, no máximo, o celular teve que devolver, a conta muito alta, tira o fone do gancho, Está, está ligado sim, folheia “As setes leis espirituais do sucesso”, Deepak Chopra, as letras rebelam-se, as linhas pululam (Ruffato, 2001Ruffato, Luiz (2001). eles eram muitos cavalos. São Paulo: Boitempo., p. 35-36).

A ideia de fracasso ratifica-se no desconforto do personagem durante a leitura, desconforto esse projetado na materialidade da página impressa.

Outro tipo de leitor é o que aparece em “O evangelista” (fragmento 27), quando o personagem retoma a palavra evangélica do Novo Testamento para se dirigir àqueles que seriam os cegos, leprosos e prostitutas de hoje à espera da palavra da salvação no deserto-metrópole que emerge na praça:

A seus olhos, caótica, a praça da Sé espicha-se, indolente. Sozinho, perfila-se à boca das escadas-rolantes que esganam as profundezas do metrô. À esquerda salpicam os degraus da Catedral desempregados, bêbados, mendigos, drogados, meninos cheirando cola, fumando crack, batedores de carteira, batedores de celular, batedores de cabeça, aposentados, velhacos (Ruffato, 2001Ruffato, Luiz (2001). eles eram muitos cavalos. São Paulo: Boitempo., p. 56-57).

Mas o evangelista é construído pelo autor como aquele que não conhece o caminho a percorrer, não sabe pronunciar a palavra certa, para levar os miseráveis à salvação: “Onde a inspiração divina? [...] Como falar a corações de pedra?” (Ruffato, 2001Ruffato, Luiz (2001). eles eram muitos cavalos. São Paulo: Boitempo., p. 57). Assim, torna-se mais um espectador da miséria que, angustiado, não opera milagres, não transforma o que está ao seu redor. Diferentemente das pregações públicas de Jesus, a palavra do evangelista não encontra eco nos ouvintes, e sequer está completa: “Auxilie-me nessa hora, Senhor. Faça nascer da minha boca a” (Ruffato, 2001Ruffato, Luiz (2001). eles eram muitos cavalos. São Paulo: Boitempo., p. 56). Diante do que pode ser o malogro da palavra não pronunciada, o evangelista chega à conclusão: “Senhor, não sou digno” (Ruffato, 2001Ruffato, Luiz (2001). eles eram muitos cavalos. São Paulo: Boitempo., p. 59).

Esse homem, em praça pública, questiona-se sobre sua função e seu lugar na sociedade. Podemos nos perguntar se, nesse sentido, ele se aproximaria do intelectual contemporâneo quando reconhece sua impossibilidade de ser guia dos oprimidos como preconizava Sartre (1994SARTRE, Jean-Paul (1994). Em defesa dos intelectuais. Tradução Sergio Goes de PaulaSão Paulo: Ática.) sobre o intelectual moderno. Contudo, ao escrever sobre sua dificuldade de intervenção no espaço público, o escritor, como um tipo de intelectual, não abdica de tal função. Nesse sentido a literatura acabaria por se tornar o lugar do exercício de pensar em público.

Em “Fé” (fragmento 31), observa-se a inserção da oração a Santo Expedito da mesma forma que ela é encontrada nas igrejas onde seriam deixadas pelos fiéis depois de terem recebido as graças pedidas. Desse modo, descreve-se inclusive o ritual que rege essa prática religiosa: “mandei imprimir e distribuí um milheiro destas orações em agradecimento e para propagar os benefícios do grande Santo Expedito. Mande você também imprimir imediatamente após o pedido” (Ruffato, 2001Ruffato, Luiz (2001). eles eram muitos cavalos. São Paulo: Boitempo., p. 65).

Em livro sobre a leitura literária, Ivete Walty e Maria Zilda Cury (2012WALTY, Ivete; CURY, Maria Zilda (2012). Movimentos de leitura. Belo Horizonte: UFMG.) assim se pronunciam sobre o jogo enunciativo do fragmento em pauta:

A oração inserida no romance mantém o seu processo enunciativo em que alguém se dirige ao santo exortando-o a ajudá-lo em uma dificuldade, mas, ao mesmo tempo, o alarga e o desloca. À cadeia enunciativa acrescenta-se a figura do autor, Luiz Ruffato, e a de nós leitores, o que modifica a construção de sentidos, saindo do universo religioso e entrando no universo ficcional. Na verdade, constrói-se um entrelugar discursivo, uma vez que quebra a expectativa própria ao gênero oração e até mesmo ao gênero narrativo daquilo que se chama romance. Num romance em que cada capítulo/fragmento apresenta faces da cidade e de sua população, o texto da oração, inusitado, deslocado, mesmo assim é uma dessas faces. A oração, publicada como se fosse em corrente, por alguém que teria alcançado a graça demandada, traz ainda outra cena enunciativa: o registro da gráfica que efetuou o serviço, seu telefone e o preço do milheiro. Essa estratégia configura-se como propaganda, outro gênero discursivo evidenciando mais uma malha dessa ampla rede (Walty e Cury, 2012WALTY, Ivete; CURY, Maria Zilda (2012). Movimentos de leitura. Belo Horizonte: UFMG., p. 25).

A oração, segundo explicação presente nela mesma, é evocada quando a pessoa está “com algum problema de difícil solução e precisa de ajuda urgente” (Ruffato, 2001Ruffato, Luiz (2001). eles eram muitos cavalos. São Paulo: Boitempo., p. 65). No fragmento em questão, a evocação aparece, mas o motivo dela não, pois o espaço para o pedido encontra-se em branco para ser preenchido pelos devotos que a lerão, remetendo sempre a um “problema de difícil solução”. Se articularmos tal necessidade com a impotência do evangelista no fragmento 27, podemos pensar que a dificuldade suplanta o nível individual e alcança a coletividade em uma sociedade caótica e miserável.

Nessa mesma esteira, o fragmento 38, “Leia o salmo”, é apresentado como uma espécie de simpatia popular:

leia o salmo 38 durante três dia seguidos três vezes ao dia faça dois pedidos difíceis e um impossível anuncie no terceiro dia observe o que acontecerá no quarto dia (Ruffato, 2001Ruffato, Luiz (2001). eles eram muitos cavalos. São Paulo: Boitempo., p. 73).

Observe-se a repetição da busca de saídas para situações enfrentadas por aqueles que se valem desse tipo de oração. Mais uma vez aparece a impotência já registrada no fragmento “O evangelista”, pois o salmo referido não evoca a salvação, ao contrário, acentua a miserabilidade dos miseráveis a tal ponto que os torna indignos de Deus, como se pode ver nos versículos 5 e 6: “Fazei-me conhecer, Senhor, o meu fim, e o número de meus dias, para que eu veja como sou efêmero. / A largura da mão: eis a medida de meus dias, diante de vós minha vida é como um nada; todo homem não é mais que um sopro” (Salmos 38SALMOS. In: Bíblia Ave Maria. São Paulo: Ave Maria, [s.d.]. On-line. Disponível em: Disponível em: http://www.bibliacatolica.com.br/biblia-ave-maria/salmos/38/ . Acesso em: 5 out. 2016.
http://www.bibliacatolica.com.br/biblia-...
, 5).

A relação estabelecida nos três fragmentos anteriores dá-nos a perceber que o aspecto religioso é tratado como uma solução mágica buscada para superação das dificuldades da vida cotidiana. Desse modo, figura-se o autor implícito em sua relação com o empírico, lendo tanto o texto bíblico em suas versões populares, como orações a santos de devoção e textos de autoajuda. Tal repertório se amplia no fragmento 24, intitulado “Uma estante”, que não é mais do que uma lista de obras das mais diversas. Um repertório eclético de leituras possíveis que também conta histórias de pontos de vista distintos: clássicos universais e brasileiros, autoajuda, manuais técnicos, sociológicos e políticos, de diferentes tons ideológicos, best sellers, poemas, prosa e teatro, entretenimento, histórias infantojuvenis e textos espiritualistas:

VIDA DE MARIONETES - Ingmar Bergman

GABRIELA CRAVO E CANELA - Jorge Amado

MEMÓRIAS DE UM AMANTE DESASTRADO - Groucho Marx

GERÊNCIA DE MARKETING - John A. Haward

GESTAPO - Sven Hassel (Ruffato, 2001Ruffato, Luiz (2001). eles eram muitos cavalos. São Paulo: Boitempo., p. 51).

Uma multiplicidade de textos, uma multiplicidade de leitores, incluídos ainda nas listas de empregos (fragmento 18) e anúncios amorosos (fragmento 42), ambos intitulados “Na ponta do dedo”. Cada vez mais, sobressai o lugar do anônimo, mesmo que em alguns casos mencione-se o primeiro nome ou o pseudônimo.

ALEMÃO − homem branco, 46 anos, 1,77 m, 56 kg, cabelos loiros, olhos azuis, branco. Aposentado, gosta de viajar. Deseja se corresponder com mulheres morenas.

AMOR QUASE PERFEITO - se você acredita que nada somos sem olhar - o amor - do outro... Até 30 anos, mais ou menos 75 kg, 1,75m de altura, não goste do meio, másculo, afetuoso, não fumante, bom nível, bonito. Eu, maduro, especial.

[...]

IVONETE - branca, 19 anos, 1,58m, 48 kg, cabelos e olhos castanhos. Estudante, pisciana, meiga e carinhosa. Deseja se corresponder com homens de 19 a 25 anos, brancos, de signos da Água (Peixes, Câncer e Escorpião) (Ruffato, 2001Ruffato, Luiz (2001). eles eram muitos cavalos. São Paulo: Boitempo., p.90)

Enunciadores e enunciatários se desenham nos anúncios, já que estes são endereçados a um tipo de pessoa na busca de partilha de gostos e preferências sexuais. Com todos esses textos, uma rede se forma e aí se inclui o leitor figurado por Ruffato, que difere daquele do texto jornalístico, já que este é deslocado para o livro em meio a tantos outros gêneros narrativos.

Essa rede de leituras e leitores - de textos filosóficos, sociológicos, religiosos, de autoajuda ou de anúncios de jornais -, como se delineou até então neste artigo, supera, no entanto, o conjunto de histórias do livro eles eram muitos cavalos. Ruffato lê os livros lidos por seus personagens os mais diversos; lê Alencar, que leu os romances franceses e ingleses; lê Cecília Meireles, que lê a história de Minas Gerais e os árcades. Dessa forma, a produção do autor em cena insere-se na história da literatura brasileira, recuperando outras cenas enunciativas com seus sujeitos, espaços e tempos. Por isso mesmo, o leitor pode inferir em cada um desses momentos o projeto literário dos escritores. E na contemporaneidade o projeto literário do próprio Ruffato.

Nesse caso, ao retomar os autores antes citados, percebem-se escolhas literárias que incluem um projeto de nação. Se Alencar constrói uma origem para a terra brasileira, associando-a ao índio e ao português ou debruçando-se sobre o sertanejo, o gaúcho e outros tipos regionais brasileiros, além de focalizar a cidade e suas relações político-sociais, Ruffato traça uma trajetória dos trabalhadores migrantes em sua busca de ampliação do universo. As ideias de origem e a de nação já não são as mesmas do escritor romântico, dado que o momento histórico é outro. A esse respeito declara o próprio autor:

Sobre o que escrever era a pergunta que me parecia fácil responder. Obviamente, eu pensava sobre o universo que conheço, o do trabalhador urbano, os sonhos e pesadelos da classe média baixa, esse recorte social indefinido, com todos os seus preconceitos e toda sua tragédia. [...] Mas, curiosamente, quando fui pesquisar na história da literatura brasileira os meus antecessores, imensa a minha decepção. Poucos, ou melhor, pouquíssimos autores, haviam se debruçado sobre essa questão. Por quê? Porque, penso contribuir para essa reflexão, de um lado o trabalhador urbano não suscita o glamour, por exemplo, que suscita o malandro ou o bandido − personagem sempre presente na ficção nacional, representado do ponto de vista da classe média como um desestabilizador da ordem social; de outro lado, absorvidos pela inflexível hierarquização da sociedade brasileira, os indivíduos oriundos de classe média baixa necessitam negar suas origens para serem aceitos na sociedade (Ruffato, 2008Ruffato, Luiz (2008b). O livro das impossibilidades. Rio de Janeiro: Record., p. 320-321).

Confirma-se aí o escritor como um leitor de seus antecessores e o traçado de seu plano de trabalho. Se consideramos dois conceitos de nação - o pedagógico e o performativo - formulados por Homi Bhabha (1998BHABHA, Homi K. (1998). O local da cultura. Tradução de Myriam Ávila, Eliana Lourenço de Lima Reis, Gláucia Renate Gonçalves. Belo Horizonte: Editora da UFMG.), podemos nos perguntar onde se situa o projeto do autor de que tratamos. Verifica-se em Alencar uma busca de unidade nacional, marcada com o sacrifício de um fragmento em função do estabelecimento da pátria sonhada, o que se configuraria como o projeto pedagógico de nação que, para Bhabha, constrói-se na verticalidade, com a consideração da ideia de todos em um, e tem sua existência em “uma temporalidade continuísta, cumulativa” (Bhabha, 1998BHABHA, Homi K. (1998). O local da cultura. Tradução de Myriam Ávila, Eliana Lourenço de Lima Reis, Gláucia Renate Gonçalves. Belo Horizonte: Editora da UFMG., p. 207). Na cena de Iracema, em que Poti vai com Martim visitar Batuirité, seu grande avô, exemplifica-se esse sacrifício:

- Poti é chegado à cabana do grande Maranguabe, pai de Jatobá, e trouxe seu irmão branco para ver o maior guerreiro das nações.

O velho soabriu as pesadas pálpebras e passou do neto ao estrangeiro um olhar baço. Depois o peito arquejou e os lábios murmuraram:

- Tupã quis que estes olhos vissem antes de se apagarem o gavião branco junto da narceja (Alencar, 1973ALENCAR, José de (1973). Iracema. São Paulo: Ática., p. 69).

Acresce-se a isso a nota do autor na qual se explica que “- Batuireté chama assim o guerreiro branco ao passo que trata o neto por narceja; ele profetiza nesse paralelo a destruição de sua raça pela raça branca” (Alencar, 1973ALENCAR, José de (1973). Iracema. São Paulo: Ática., p. 69). A chegada daquilo que é dado como a civilização dá-se ao final da narrativa com a fundação do povoado:

Muitos guerreiros de sua raça acompanharam o chefe branco para fundar com ele a mairi dos cristãos. Veio também um sacerdote de sua religião, de negras vestes, para plantar a cruz na terra selvagem (Alencar, 1973ALENCAR, José de (1973). Iracema. São Paulo: Ática., p. 96).

A essa cena, segue-se o batismo de Poti no ritual católico com a substituição dos símbolos indígenas pelos portugueses, o que indiciaria o nascimento da nação brasileira:

Poti foi o primeiro que ajoelhou aos pés do sagrado lenho; não sofria ele que nada mais o separasse do seu irmão branco. Deviam ter ambos um só deus, como tinham um só coração. Ele recebeu com o batismo o nome do santo, cujo era o dia; e o do rei, a quem ia servir e sobre os dous o seu, na língua dos novos irmãos. Sua fama cresceu e ainda hoje é o orgulho da terra, onde ele primeiro viu a luz (Alencar, 1973ALENCAR, José de (1973). Iracema. São Paulo: Ática., p. 96).

Observe-se como tais passagens exemplificam aquilo que Stuart Hall, retomando a teoria de Bhabha, afirma sobre a nação moderna e seus pilares constitutivos, a língua, a religião e outras instituições:

A formação de uma cultura nacional contribuiu para criar padrões de alfabetização universais, generalizou uma única língua vernacular como o meio dominante de comunicação em toda nação, criou uma cultura homogênea e manteve instituições culturais nacionais, como, por exemplo, um sistema educacional nacional (Hall, 1997HALL, Stuart (1997). Identidades culturais na pós-modernidade. Tradução Tomaz Tadeu da Silva e Guacira Lopes Louro. Rio de Janeiro: DP&A., p. 54).

Se esse conceito tradicional de nação idealiza sua origem, cria suas tradições e um mito fundacional, Iracema é justamente um exemplo disso. Por isso, vimos com Hall que

As identidades nacionais não subordinam todas as outras formas de diferença e não estão livres do jogo do poder, de divisões e contradições internas, de lealdades e de diferenças sobrepostas. Assim, quando vamos discutir se as identidades nacionais estão sendo deslocadas devemos ter em mente a forma pela qual as culturas nacionais contribuem para costurar as diferenças numa única identidade (Hall, 1997HALL, Stuart (1997). Identidades culturais na pós-modernidade. Tradução Tomaz Tadeu da Silva e Guacira Lopes Louro. Rio de Janeiro: DP&A., p. 70).

A outra modalidade de nação preconizada por Bhabha, a performativa, em sua “estratégia repetitiva e recorrente”, parte do princípio de que qualquer construção nacional está sempre em processo, em disseminação, fazendo-se necessário um “plebiscito diário” (Renan apud Bhabha, 1998BHABHA, Homi K. (1998). O local da cultura. Tradução de Myriam Ávila, Eliana Lourenço de Lima Reis, Gláucia Renate Gonçalves. Belo Horizonte: Editora da UFMG., p. 225) para se falar de identidade nacional. Muda-se o conceito de Estado-nação, que se dá, na verdade, na tensão entre o pedagógico e o performativo, entre a conjunção e a disjunção, tensão esta fruto da pluralidade dos pertencimentos e das identidades.

Nesse panorama, como Ruffato trabalha com a fragmentação e o anonimato, com as migrações geográficas e culturais, podemos nos perguntar se ele se aliaria a uma narrativa liminar decorrente dessa tensão.

Vê-se que, enquanto Alencar situa-se no momento da formação do Estado-nação, quando a literatura estava a serviço desse projeto, Ruffato vivencia a contemporaneidade e se pergunta: “O que significa ser escritor num país situado na periferia do mundo?”, frase com que introduz seu discurso, em 2013, na abertura da Feira de Frankfurt, que tanta polêmica causou.

O fato de formular tal pergunta já liga literatura e preocupação social, literatura e desejo de nação. Mesmo que escreva uma antissaga, questionando origens e multiplicando pertencimentos - igrejas várias, grupos sociais e profissionais diversos, gostos culturais díspares -, há, tanto no livro eles eram muitos cavalos quanto na pentalogia Inferno provisório,6 6 Também publicada em 2016 pela Companhia das Letras, em um único volume e edição revista. uma linha de busca, que anuncia a possibilidade de resposta e sua frustração. Busca-se um lugar melhor, uma solução, mas ela se mostra fugidia e utópica. O sonho existe tanto para os personagens quanto para o autor, que também sobre isso se pronuncia: “quero afetar o leitor, modificá-lo para transformar o mundo. Trata-se de uma utopia, eu sei, mas me alimento de utopias” (Ruffato, 2015, p. 21).

O autor acredita no poder de transformação da literatura como portadora de um vírus que se inocularia no leitor como a febre que o atingiu enquanto jovem estudante na experiência da primeira leitura de um romance. Instala-se aí a questão do gênero, associada a uma percepção de tempo e espaço. Resulta disso a estranheza do autor diante do desafio de se escrever algo chamado romance marcado pela fragmentação e por um possível desenraizamento. Observemos o paradoxo que move o projeto literário de Ruffato: a origem e as migrações, o local e o regional, o nacional e o universal, o provinciano e o cosmopolita, tudo isso na circulação dos grupos sociais atravessados pelas relações de poder.

Trabalhando com a mobilidade como um operador de leitura de Inferno provisório, Marcelo Antonio Ribas Hauck, depois de discorrer sobre os diversos tipos de mobilidade que marcam a obra de Ruffato, debruça-se sobre a mobilidade do próprio autor e afirma:

Ele mesmo em trânsito, Ruffato, além de ficcionista, exercita seu fazer literário como crítico, seja escrevendo, por exemplo, para o jornal de resenhas Rascunho, seja como organizador de coletâneas de contos. Para uma dessas coletâneas, juntamente com Simone Ruffato, escreve uma introdução que pode moldar uma chave de leitura para seus próprios textos. Em “Por uma história sem começo nem foz”, prefácio à coletânea Fora da ordem e do progresso (2004), aponta, de forma breve, duas distintas maneiras de se pensar a história: uma iluminista, eminentemente progressista; e outra, através da qual pretende organizar a antologia, que toma história como sincronicidade. A primeira pauta-se por relatos de causa e efeito, tem caráter diacrônico e é protagonizada por grandes heróis e anti-heróis. Já a segunda delas, de natureza sincrônica, remete a acontecimentos simultâneos no espaço e no tempo, é descompassada e tem como agentes “anônimos personagens, destituídos de heroísmos, tragicamente marginais à cronologia, agentes e pacientes sem o saber. [...] histórias fora da ordem e do progresso” (Ruffato, 2004Ruffato, Luiz (Org.). (2004) Fora da ordem e do progresso. São Paulo: Geração., p. 11). (Hauck, 2014HAUCK, Marcelo Antônio Ribas (2014). Migrações textuais e geográficas em Inferno provisório, de Luiz Ruffato. Tese (Doutorado em Literaturas de Língua Portuguesa) − Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais − PUC Minas, Belo Horizonte, 2013., p. 11-12).

Observe-se que a questão da narrativa, especialmente do gênero romance, liga-se a diferentes conceitos de história e a diferentes percepções de mundo. Ao retomarem a frase/lema da bandeira brasileira, os autores determinam seu lugar de enunciação marcado pelo deslocamento e pela rasura da história iluminista e positivista, o que se configura como a explosão do continuum da história, na postulação de Benjamim (1987BENJAMIN, Walter (1987). Sobre o conceito de história. Magia e técnica, arte e política: ensaios sobre literatura e história da cultura. Tradução Sergio Paulo Rouanet. São Paulo: Brasiliense, p. 222-232.). Contar histórias em pedaços, que se conectam e se desconectam postulando outros sentidos, seria essa a proposta do autor ao compor essa saga rompida?

Continuando a pensar sobre o lugar do autor e seu trânsito pelo país e pelo mundo, não há como deixar de retomar a pergunta que abre o já citado discurso proferido por Ruffato na Feira de Frankfurt:

O que significa ser escritor num país situado na periferia do mundo, um lugar onde o termo capitalismo selvagem definitivamente não é uma metáfora? Para mim, escrever é compromisso. Não há como renunciar ao fato de habitar os limiares do século XXI, de escrever em português, de viver em um território chamado Brasil (Ruffato, 2013RUFFATO, Luiz (2013). Discurso para a abertura da Feira de Frankfurt. Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, n. 1.357, p. 20-21, nov./dez. Disponível em: Disponível em: https://goo.gl/axtktd . Acesso em: 5 out. 2016.
https://goo.gl/axtktd...
, p. 20).

Com essa pergunta, ratifica-se uma questão que tem raízes na história da literatura brasileira e a atravessa até hoje. Quando Alencar lê os franceses e os toma como modelo, buscando aquilo que Pascale Casanova (2002CASANOVA, Pascale (2002). A república mundial das letras. Tradução Marina Appenzellers. São Paulo: Estação Liberdade.) chama de capital literária de então; quando Machado de Assis questiona o uso da cor local como elemento de identidade literária brasileira; quando Oswald cria o movimento Pau-Brasil e a antropofagia; ou Mário de Andrade critica Drummond por sua suposta submissão a Anatole France, além da postulação de um trânsito entre o local e o universal, o que está em pauta é a relação da literatura do país com a de outros países. Por sua vez, Roberto Schwarz em sua reflexão sobre as “ideias fora do lugar”, em diálogo com Silviano Santiago na defesa do entrelugar das literaturas latino-americanas, e as de Antonio Candido em “Literatura e subdesenvolvimento”, retoma, mesmo que de forma deslocada, a velha questão. Mais recentemente, em conferência sobre a trajetória do uso da palavra formação na história da cultura brasileira, Silviano Santiago (2014SANTIAGO, Silviano (1978). Uma literatura nos trópicos. São Paulo: Perspectiva.), termina por conclamar o sujeito brasileiro e a nação a tomarem “assento no plenário do planeta”:

Faz-se urgente dar uma posição à “inserção da linguagem-Brasil em contexto universal”, para retomar palavras premonitórias de Hélio Oiticica no texto “Brasil diarreia” (Arte brasileira hoje, 1973). Inserir a linguagem-Brasil em contexto universal traduz a vontade de situar um problema que se alienaria fosse ele local, pois problemas locais não significam nada - se se fragmentam quando expostos a uma problemática universal. Tornam-se irrelevantes se situados somente em relação a interesses locais. E Hélio conclui: “A urgência dessa ‘colocação de valores’ num contexto universal é o que deve preocupar realmente àqueles que procuram uma saída’ para o problema brasileiro” (Santiago, 2014SANTIAGO, Silviano (2014). A formação da perspectiva pós-colonial: um depoimento. Conferência proferida na Faculdade de Letras da Universidade Federal de Minas Gerais., p. 22).

A apropriação das palavras de Oiticica por Silviano Santiago possibilita questionar - entre outras perguntas que tal posição suscita - como se define ou se determina a linguagem-Brasil? Que lugares de fala a compõem?

Um desses lugares de fala é o de Ruffato, quando, depois de afirmar: “Eu acredito, talvez até ingenuamente, no papel transformador da literatura”, discorre sobre a dificuldade de se conviver com a diferença em um mundo narcísico e, declarando-se utópico em sua crença, propõe: “penso que o destino último de todo ser humano deveria ser unicamente esse, o de alcançar a felicidade na Terra. Aqui e agora” (Ruffato, 2014bRuffato, Luiz (2014b). Escritor brasileiro fala sobre o romance “Flores Artificiais”. Entrevista a Rodrigo Simon. São Paulo: Univesp. On-line. Disponível em: Disponível em: https://goo.gl/i8yOQ3 . Acesso em: 21 ago. 2015.
https://goo.gl/i8yOQ3...
, p. 21). Configura-se, assim, mais que um projeto de nação, um projeto messiânico de nação. Tal postura gerou críticas como a de Marcos Vinicius de Freitas:

Sua [de Ruffato] concepção de literatura não poderia ser mais clara: trata-se de uma arma de luta política, de um instrumento para transformar o mundo de acordo com seu desejo, já que ele se alimenta de utopias que são figurações do desejo, não realidades. Estranhamente, seu próprio realismo é que sai estropiado da definição final, uma vez que a realidade ali se transforma apenas em pretexto para uma vontade de poder, que de realista não tem nada, pois, ao contrário, se assenta na utopia (Freitas, 2014FREITAS, Marcos Vinicius de (2014). Ruffato em Frankfurt: de que literatura fala o autor? Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, n. 1.357, p. 15-19, nov./dez. Disponível em: Disponível em: https://goo.gl/axtktd . Acesso em: 5 out. 2016.
https://goo.gl/axtktd...
, p. 19).

Marcos Freitas afirma que “a literatura não tem função de transformar o mundo, mas de colocar perguntas para tentar compreendê-lo” (Freitas, 2014FREITAS, Marcos Vinicius de (2014). Ruffato em Frankfurt: de que literatura fala o autor? Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, n. 1.357, p. 15-19, nov./dez. Disponível em: Disponível em: https://goo.gl/axtktd . Acesso em: 5 out. 2016.
https://goo.gl/axtktd...
, p. 19). Em vista disso, em trecho anterior de seu ensaio, Freitas já postulara:

Para dizer em poucas palavras, entendo que o discurso de Ruffato em Frankfurt - ao jogar sobre a plateia uma explicação dos nossos problemas históricos no lugar mesmo da literatura - constitui exemplo acabado do sociologismo de que padece e sempre padeceu a literatura brasileira (com exceções espasmódicas), o que a impede de estabelecer verdadeira comunicação com outras literaturas e com pessoas de outras culturas e lugares (Freitas, 2014FREITAS, Marcos Vinicius de (2014). Ruffato em Frankfurt: de que literatura fala o autor? Suplemento Literário de Minas Gerais, Belo Horizonte, n. 1.357, p. 15-19, nov./dez. Disponível em: Disponível em: https://goo.gl/axtktd . Acesso em: 5 out. 2016.
https://goo.gl/axtktd...
, p. 16).

Observemos que Freitas fala de um outro lugar, com proposição que se quer diferente daquela de Ruffato, mas que, como ele, reivindica um diálogo internacional que avalize a literatura brasileira. É esse o mesmo movimento da revista Granta, que traz o selo da internacionalidade e da tradição, conferindo à publicação o status da Universidade de Cambridge e de sua tradicional origem em 1889. Afiança-se ainda que os textos dos autores dados como “os melhores jovens escritores brasileiros” serão divulgados também pela Granta em inglês e em espanhol, o que lhe assegurará um público de “oitenta mil aficionados da literatura na América Latina, Espanha, Estados Unidos e Reino Unido, alcance inédito para estes jovens brasileiros” (Granta, 2012GRANTA (2012). Os melhores jovens escritores brasileiros. Rio de Janeiro: Alfaguara, v. 9., p. 5).

Depois de listar os autores e resumir seus contos com temática que se afastam das questões explicitamente sociais, reitera-se a importância da revista para o estabelecimento do cânone nacional e internacional, em um movimento circular; a revista antecipa nomes que vão ser incorporados à cena literária, assim como seu anterior pertencimento a essa cena já lhes abre caminho para serem selecionados (Walty, 2014WALTY, Ivete Lara Camargos (2014). Três pesos, três medidas? Valor e cânone na série literária brasileira contemporânea. Letras de Hoje, Porto Alegre, v. 49, n. 4, p. 453-460, out./dez., p. 456).

Não se trata de escolher uma das tendências aqui descritas - uma linguagem localista ou uma linguagem universalista -, mas de compreender que tais tendências constituem forças significativas da história literária brasileira ao lado de outras tantas. O que importa ressaltar, no caso, mais que a ideia de inserção em um mercado global, são as tentativas de interação com o outro, seja exibindo as mazelas do país, seja incluindo nos mapas narrativos questões psíquicas e existenciais ou mesmo espaços estrangeiros. Mesmo porque o próprio Ruffato já fez esse caminho com a publicação de Estive em Lisboa e lembrei de você (2009) e de Flores artificiais (2014a). No primeiro caso, continua a temática da migração e dos deslocamentos marcados pelo movimento colonizador em suas relações de poder. No segundo caso, o horizonte se estende tanto no jogo de narradores como nos espaços múltiplos delineados em seus contos. Além da questão migratória geográfica, intensificam-se outros movimentos, como o diálogo direto com a literatura universal, desde o título que seria a mistura de Flores do mal com Paraísos artificiais, de Baudelaire, até a ideia de artificialidade que engloba a relação dos conceitos de real e ficcional. Diz o autor em entrevista: “O leitor pode refletir sobre um paradoxo muito interessante que a literatura oferece. Quanto mais artificial a história que você conta mais próxima do real ela é; quanto mais real ela é, mais artificial ela é” (Ruffato, 2014bRuffato, Luiz (2014b). Escritor brasileiro fala sobre o romance “Flores Artificiais”. Entrevista a Rodrigo Simon. São Paulo: Univesp. On-line. Disponível em: Disponível em: https://goo.gl/i8yOQ3 . Acesso em: 21 ago. 2015.
https://goo.gl/i8yOQ3...
, s.p.).

Por essas e outras razões, pode-se questionar os conceitos de real e ficção, sem querer subordiná-los a uma ideia de representação, já que a própria realidade não tem esse estatuto de verdade que se pretende dar a ela. Em função disso, o próprio conceito de literatura varia no tempo e no espaço.

No século XIX, como mostram muitos autores: “para compreender o vínculo que se estabelece de antemão entre o Estado e a literatura deve-se sublinhar o fato de que, por meio da língua, eles contribuem mutuamente, reforçando-se, para se fundar” (Casanova, 2002CASANOVA, Pascale (2002). A república mundial das letras. Tradução Marina Appenzellers. São Paulo: Estação Liberdade., p. 53). Mesmo se, em nossos dias, não sejam mais esses o lugar e o papel da literatura, não se pode retirar de alguns escritores o objetivo de debruçar-se sobre a história do país, ressaltando suas mazelas na esperança de corrigi-las. É desse movimento que fala Silviano Santiago, no ensaio “Uma literatura anfíbia”:

Por um lado, o trabalho literário busca dramatizar objetivamente a necessidade do resgate dos miseráveis afim de elevá-los à condição de seres humanos (já não digo à condição de cidadãos) e, por outro lado, procura avançar ─ pela escolha para personagens da literatura de pessoas do círculo social dos autores ─ uma análise da burguesia econômica nos seus desacertos e injustiças seculares. Dessa dupla e antípoda tônica ideológica ─ de que os escritores não conseguem desvencilhar-se em virtude do papel que eles, como vimos, ainda ocupam na esfera pública da sociedade brasileira ─ advém o caráter anfíbio da nossa produção artística (Santiago, 2004SANTIAGO, Silviano (2004). Uma literatura anfíbia. O cosmopolitismo do pobre: crítica literária e crítica cultural. Belo Horizonte: Editora da UFMG, p. 64-73., p. 66).

Silviano Santiago refere-se ao lugar do escritor enquanto intelectual a interferir no espaço público, em sua função de mediação já evidenciada por Antonio Candido (1981CANDIDO, Antonio (1981). Formação da literatura brasileira. Belo Horizonte: Itatiaia.) quando falava da precariedade da formação do público leitor na constituição do que chama, em A formação da literatura brasileira, de sistema literário no país. Isso significaria que, a despeito das transformações sofridas pela sociedade brasileira em sua relação com o mundo ocidental em processo de globalização, as relações de poder que a regem ainda exigem do escritor uma intervenção política.

É justamente porque o país são vários que várias são as tendências de sua cultura e de sua literatura. Ruffato faz do romance desenraizado e fragmentado a percepção de um tempo e de um espaço, ou melhor, de diferentes tempos e espaços em movimento; um romance que, mais que a história da classe operária no Brasil, é o cruzamento de histórias várias em seu jogo de busca de visibilidade.

Interessante voltar ao diálogo dos escritores com que iniciamos este artigo, retomando seus projetos literários sobretudo no que diz respeito à questão da nação. Se, por um lado, Alencar parece buscar uma origem que dê inteireza à nação que nascia no contexto da colonização, por outro ele já aponta para a ruptura que marca tal origem: a ideia do sacrifício do indígena e do sofrimento indiciado na figura de Moacyr, o filho da dor. Por sua vez, Ruffato, contando a história da classe média trabalhadora, mesmo que lide com tensões e desequilíbrios de poder, continua perseguindo um desejo de nação: um país sem injustiças sociais, “a felicidade na terra”.

Nessa procura, Ruffato desnuda o destino dos muitos “peris” que circulam, anonimamente na cidade, presos à condição desumana de vida, revelando a impossibilidade de sucesso dos migrantes que, ao chegarem à metrópole, misturam-se na vivência de situações limítrofes.

Veio a Rota, sirene esgoelando, pneus solfejando, os peemes desembarcaram distribuindo sarrafo sem piedade nem dó, e o povinho ralo, sebo nas canelas, sumiu num trovoar, os deixa-disso quisemos explicar aquilo era índio, índio mesmo, de verdade, portanto os troços de fora, mas os cassetetes nem a, miraram no lombo da negada e o peri lá, sozinho, pelado, bêbado, débil. Agarrado, algemado, arremessado, mofou no fundo de uma cela. Depois, tempos, voltou em-dentro duma camisa de seda sintética estampada, surrada, calça jeans russa, chinelos havaiana, o idêntico riso abobado (Ruffato, 2001Ruffato, Luiz (2001). eles eram muitos cavalos. São Paulo: Boitempo., p. 31).

Como Poti que perdeu seu nome indígena em detrimento do português, Peri passa a ser peri, que, com nome em minúsculas, torna-se um substantivo comum, perdendo sua roupagem e sua heroicidade. A roupa do não índio lhe cai mal e exibe ironicamente o lado consumista da sociedade.

Mais do que discutir o fragmento relativo ao índio, a essa altura importa ressaltar a continuação da retomada de Alencar por um leitor/escritor que vai deixando indícios de suas leituras na escrita ética desse romance; indícios sonoros, gráficos, imagéticos, que levam à vida social aí encenada. Dedo apontado, os narradores móveis e diversificados transitam entre as histórias, as contadas no livro e as contadas pela série literária brasileira.

Referências

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  • SARTRE, Jean-Paul (1994). Em defesa dos intelectuais. Tradução Sergio Goes de PaulaSão Paulo: Ática.
  • SCHWARZ, Roberto (1987). Nacional por subtração. In: SCHWARZ, Roberto. Que horas são? São Paulo: Companhia das letras.
  • SCHWARZ, Roberto (2000). As ideias fora do lugar. In: SCHWARZ, Roberto. Ao vencedor as batatas: forma literária e processo social nos inícios do romance brasileiro. São Paulo: Duas cidades.
  • WALTY, Ivete Lara Camargos (2007). Anonimato e resistência em eles eram muitos cavalos, de Luiz Ruffato. In: HARRISON, Marguerite (Org.). Uma cidade em camadas: ensaios sobre o romance eles eram muitos cavalos, de Luiz Ruffato. Vinhedo: Horizonte, p. 56-67.
  • WALTY, Ivete Lara Camargos (2014). Três pesos, três medidas? Valor e cânone na série literária brasileira contemporânea. Letras de Hoje, Porto Alegre, v. 49, n. 4, p. 453-460, out./dez.
  • WALTY, Ivete; CURY, Maria Zilda (2012). Movimentos de leitura. Belo Horizonte: UFMG.
  • 3
    Esclareça-se que o livro lido por Alencar nesse momento é Oscar e Amanda (The Children of the Abbey), da escritora irlandesa Regina Maria Roche (1764-1845), publicado pela primeira vez em 1796.
  • 4
    Escritor ucraniano que nasceu em Kiev (1929) e morreu em Londres (1979), cuja obra citada é Babi Yar: an document in the forme of novel.
  • 5
    Em seus estudos sobre o feminino, depois, retomados por Lacan, Freud formula tal pergunta hoje popularizada.
  • 6
    Também publicada em 2016 pela Companhia das Letras, em um único volume e edição revista.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Ago 2017

Histórico

  • Recebido
    07 Nov 2016
  • Aceito
    27 Jan 2017
Grupo de Estudos em Literatura Brasileira Contemporânea, Programa de Pós-Graduação em Literatura da Universidade de Brasília (UnB) Programa de Pós-Graduação em Literatura, Departamento de Teoria Literária e Literaturas, Universidade de Brasília , ICC Sul, Ala B, Sobreloja, sala B1-8, Campus Universitário Darcy Ribeiro , CEP 70910-900 – Brasília/DF – Brasil, Tel.: 55 61 3107-7213 - Brasília - DF - Brazil
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