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Cadernos Nietzsche contemplam artigos sobre conhecimento e estética

A edição atual dos Cadernos Nietzsche contém artigos que, de forma geral, abordam questões e problemas que poderíamos associar à estética e à epistemologia. Também é possível afirmar uma preocupação dos autores em apresentar o panorama histórico e intelectual com o qual Nietzsche manteve contato, apontando para as possíveis influências que outros pensadores exerceram sobre o filósofo, sejam elas de um ponto de vista poético ou do conhecimento, por exemplo. É importante destacar não apenas esse conjunto de nomes que precederam Nietzsche em muitos aspectos de seu pensamento, como também perceber um diálogo cruzado entre os textos que ora publicamos.

Pietro Gori, em seu artigo “A caminho de uma filosofia sem alma. Uma abordagem psicofísica sobre a crítica da subjectividade de Nietzsche”, também considerando o contexto intelectual e científico da época de Nietzsche, associa a crítica à noção do eu com a psicologia científica. Assim, Friedrich Lange e Ernst Mach seriam dois nomes importantes, na medida em que propuseram um direcionamento das ciências cognitivas rumo a uma psicologia sem alma, de sorte a distanciá-la da metafísica da substância, como acontece com a crítica do sujeito efetuada por Nietzsche. Vânia Dutra, no artigo “Da questão filosófica à introdução de uma perspectiva: uma análise do problema do método em Husserl e Feyerabend a partir de Nietzsche”, também estabelecendo um diálogo de Nietzsche com dois importantes filósofos da tradição, propõe-se a abordar o problema da formulação da questão filosófica, argumentando ser determinante de uma indagação acerca do mundo ou de algo a ele pertencente a adoção de uma perspectiva prévia. Desse modo, ela se utiliza do perspectivismo nietzschiano para compreender a diferença nas respostas de Husserl e Feyerabend ao método como problema.

O Artigo “Transfigurações do passado: aspectos do problema do tempo na segunda Consideração extemporânea”, de Eduardo Nasser, analisa a forma pela qual esse importante escrito de Nietzsche sobre a história foi acolhido no cenário filosófico contemporâneo, sobretudo no que se refere à transição do tempo abstrato para o tempo vivido. Nessa esfera, a maior virtude da obra teria sido evidenciar o futuro enquanto um modo temporal dominante na existência humana. Pondo sob perspectiva essa linha de interpretação, o autor defende que Nietzsche está na verdade interessado em combater os efeitos devastadores da percepção do tempo para o homem - um problema que já o perseguia -, encontrando, para tanto, recursos preciosos numa apropriação valorativa da história.

Na sequência, abrindo as abordagens de uma perspectiva estética, Henry Burnett propõe um diálogo com Paolo D’Iorio acerca de obra recente deste autor, na qual ele defende a hipótese de que a filosofia de Nietzsche tem início com a obra Humano, demasiado humano; hipótese também defendida por Olivier Ponton. Para esses autores, a chamada “fase wagneriana”, simbolizada por O nascimento da tragédia, deveria ser colocada em suspenso, por tratar-se de um momento hesitante e sem continuidade. É a matização dessas interpretações que será defendida no artigo “‘Da alma dos artistas e escritores’: Coisa humana, demasiadamente humana?”. Anna Hartmann Cavalcanti, no artigo “Poesia e linguagem na primeira recepção de Nietzsche dos escritos de August Wilhelm Schlegel”, mostra como dois textos desse autor do romantismo alemão, Lições sobre belas-letras e arte e o Ensaio Bürger, teriam impacto no jovem Nietzsche, em especial nas questões da arte e da linguagem, assim como na análise da obra do poeta Gottfried August Bürger. O interesse pela estética romântica de August Schlegel teria permanecido até o período de elaboração de O Nascimento da tragédia.

Guillaume Métayer, em “A república do gênios”, explora a tentativa de Nietzsche, tal como expressa em Humano, demasiado humano, de levar adiante a bandeira das luzes, num diálogo com Petrarca, Erasmon e Voltaire. O objetivo do filósofo teria sido o de fazer surgir a coerência tipológica de um homem das Luzes herdeiro do Renascimento, fundado sobre a ideia de uma mobilidade tanto nacional, social, quanto literária e filosófica. Para isso, ele mesmo se inscreve nessa “história monumental” dos “espíritos livres”, filósofos-poetas, “libertadores” anti-escolásticos e reformadores de seu tempo, esboçando a figura do “bom europeu”.

Finalizando esta edição, José Nicolao Julião resenha a tradução que André Itaparica realizou da Segunda Consideração Extemporânea de Nietzsche, Sobre a utilidade e a desvantagem da história para a vida. Trata-se, sem dúvida, de um marco importante da pesquisa Nietzsche no Brasil, na medida em que esse texto é bastante conhecido entre os estudiosos do filósofo, e, como afirma o autor da resenha sobre a tradução, “é a mais completa e bem sucedida tradução desse tratado de Nietzsche, que nos permitirá um grande avanço, renovando as pesquisas, possibilitando outras winterpretações”.

Márcio José Silveira Lima

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Ago 2017
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