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“Nós, deuses no exílio!”: Heine, Nietzsche e os “erros” do homem sobre si mesmo*

“We, Gods in Exile!” Heine, Nietzsche and the “Errors” of the Man on Himself

Resumo

A partir da concepção de que filosofia, para Nietzsche, é a arte da transfiguração, o texto analisa como Nietzsche incorpora e transfigura Os deuses no exílio, de Heinrich Heine. Nietzsche teria invertido a perspectiva do problema posto por Heine, bem como o seu procedimento expositivo: se o poeta traz o que seria uma humanização e aburguesamento dos antigos deuses como ato de degradação cósmica pelo qual a ascensão do cristianismo seria culpada, Nietzsche analisa a equivocada autodivinização do homem por meio da moral como megalomania trágica, cuja consequência seria a invocação do sofrimento da existência terrena e a esperança numa vida melhor, supraterrena.

Palavras-chave:
morte de Deus; transfiguração; mitologia; autodivinização

Abstract

Taking Nietzsche´s comprehension of philosophy as the art of transfiguration, the text analyses how the philosopher incorporates and transfigures The Gods in Exile, from Heinrich Heine. The philosopher would have inverted the perspective of the problem settled by Heine and his expositive procedure: if the poet bring us what would be an humanization and a “gentifrication” of the ancient gods as a cosmic degradation act by which the ascension of Christianity would be blamed, Nietzsche analyses the mistaken autodivinization of man through morals as a tragic megalomania, whose consequence would be the invocation of a suffering at the core of earthly existence and a hope in a better, ethereal life.

Keywords:
death of God; transfiguration; mythology; autodivinization

É bem conhecido o fato de que nas obras e no espólio de Nietzsche, do início ao fim de seu percurso intelectual, há o uso variado da mitologia antiga, e esse recurso assume posição proeminente em seu universo de pensamento. Se se considerar que a ascendência acadêmica de Nietzsche remete à filologia clássica, esse fato não há de nos admirar. A figura talvez mais significativa, e em todo caso mais conhecida da mitologia antiga em seus escritos, é a do Deus grego Dioniso, presente desde a dualidade ontopoetológica do dionisíaco e apolíneo no Nascimento da tragédia (1872) até a autoidentificação final do autor com Dioniso, que se tem no modo como ele assina seu “bilhete da loucura” a Catulle Mendès e Cosima Wagner, redigido em 1o de janeiro de 1889 em Turim - pouco antes de seu colapso psíquico.1 1 Para desse modo contemplar a “fusão do Crucificado com Dioniso”, cf. Detering, 2010, p. 153. Os Ditirambos de Dioniso, que à época o filósofo preparava para publicação, a qual, no entanto, ele já não pôde presenciar de plena consciência, dão testemunham disso.2 2 A esse respeito cf. Groddeck, 1991.

Ora, vou aqui deixar de parte o Dioniso tantas vezes tematizado pela pesquisa Nietzsche, bem como os ditirambos em alemão a ele dedicados, voltando-me para outro tema que, como espero mostrar, não será mitopoética ou mitofilosoficamente menos estimulante ou menos frutífero. A seguir, trata-se, por um lado, de um recorte fragmentado de meu trabalho com A gaia ciência de Nietzsche (1882/87), livro de cujo comentário eu assumi, em 2015, a responsabilidade de realizar, no contexto do projeto “Nietzsche-Kommentar”, da Heidelberger Akademie, com previsão de publicação em dois volumes (NK 3/2 e 3/3) para 2020. Por outro lado, seleciono aqui um recorte com vistas à obra de Heinrich Heine, Os deuses em exílio (Die Götter im Exil), sobre a qual Nietzsche se debruçou, e na qual de próprio punho anotou um “incorporado” [einverleibt] - para fazer uso de uma de suas palavras preferidas, que em A gaia ciência aparece com mais frequência do que em qualquer outra obra.3 3 Uma busca na eKGWB na Nietzsche Source (http://www.nietzschesource.org/) resulta em, ao todo, 100 ocorrências do radical einverleib* (incorpor*) em A gaia ciência; quando pesquisado com diferentes flexões, o termo aparece dez vezes (nos aforismos 1, 11, 21, 43, 57, 110, 135 e 361). A metáfora da incorporação, segundo Nietzsche, pode bem ser relacionada à “transfiguração”. No prefácio retrospectivo, acrescentado à edição de 1887 de A gaia ciência, numa definição pouco convencional de “filosofia”, Nietzsche afirma que ela seria a “arte da transfiguração”, e isto significa, “um filósofo que mereça esse nome tem de passar por muitas filosofias” - e deve ter “incorporado” essas filosofias e ter transmutado “entranhas” filosóficas em suas próprias (FW/GC, Prefácio, KSA 3.349). A esse respeito, pode-se recordar as Epistulae Morales de Sêneca, onde, na carta 84, compara-se a apropriação produtiva do que foi lido com a ingestão e digestão de um alimento.4 4 Cf. Sêneca, 1811, p. 32.

Pode-se acrescentar que o “filósofo” do qual Nietzsche fala tem, evidentemente, de ser “travejado” (hidurchgegangen) por uma série de artes, literaturas e mitologias. A instância de fala autoral, que desde o início do prefácio apresenta-se, irônica e distanciadamente, como “senhor Nietzsche”, não aparece apenas como “nós, filósofos”, mas assinala-se ainda como “poeta”, transmutando-se (de novo) no último parágrafo como “nós, artistas”, o que na sequência, e expressamente como “Olímpio da aparência”, reconhece-se como uma sucessão da Grécia antiga (FW/GC, Prefácio, KSA 3.346). Nesse mesmo sentido ele invoca a forma mítica de Baubo, companheira de Demétrio, que desempenha um papel especial nos mistérios eleusianos, e, com Nietzsche, atua de modo paradoxal como figuração de uma “verdade encriptada”, que anseia pelo “véu” da bela “aparência” estética (FW/GC, Prefácio, KSA 3.346).5 5 A esse respeito, com mais detalhes, cf. Kaufmann, 2016, p. 75-106, em especial p. 83-102. Também isso se permite compreender como ato de “transfiguração”, como sugere um registro de 1885, no qual esse conceito é pensado em relação com a “força” de transmutação e com a “arte das máscaras” (NF/FP 34[192] de abril-junho de 1885, KSA 11.485).

A força de transmutação e a arte do mascaramento, que estão em ação no trato criativo de Nietzsche com suas leituras, com frequência não significa que ele não as tenha visitado intensivamente e as processado extensivamente. Um rápido contato pode bastar para que se ressalte algum elemento e que ele seja disposto em outras conexões. Foi de maneira bastante oportuna que Andreas Urs Sommer descreveu essa transmutação do que foi lido: “Com frequência Nietzsche deixava de mostrar interesse pela visão de um autor como um todo, pelo todo da ideia ou pelo enredo de sua obra, tendo interesse pelo que se mostrava útil ao próprio desdobramento de seu pensamento, para a sua própria escrita. [Nietzsche] cultivava um trato caprichoso, de fusão com o que era lido, mas também de aguçamento do que era lido. Instrumentalizava-o para seus próprios fins, e para tanto praticava o contrário do método que repetidas vezes exortava em seus próprios escritos, o da leitura ‘ruminante’”.6 6 Cf. Sommer, A., 2016, p. 18. Também aqui, manifestamente, subjaz a metáfora da incorporação, embora Sommer, de maneira correta, não atribua a Nietzsche nenhuma recepção ruminante, mas sim uma recepção apressada, uma “nutrição espiritual”, com vistas à sua própria produção textual.

Ora, o modo como concretamente se realiza o “percorrer-incorporador-transfigurante” pelos Deuses no exílio de Heine em Nietzsche mostra-se, em primeiro lugar, num aforismo do quinto livro de Aurora, obra publicada em 1881, e cuja história de surgimento encontra-se estreitamente ligada a Gaia ciência, já que esta originalmente se destinava a ser a “continuação direta de Aurora” (Carta a Elisabeth Nietzsche de janeiro de 1882, KSB 6.163), sua segunda parte, portanto.7 7 As referências intertextuais desses textos do Nietzsche “intermediário” a Os Deuses no exílio de Heine até agora se mantiveram amplamente despercebidas. Em vez disso, o foco da pesquisa concentrou-se nas relações entre a narrativa sobre os deuses, de Heine, e a do Nietzsche dos primórdios; cf. Höhn, 1997; p. 134-152; Waldmann, 2003, p. 7-10; Bohrer, 2015, p. 222-232. O referido aforismo de Aurora - o 425 -, já em seu título alude ao texto de Heine; trata-se da citação que faz as vezes de título do meu presente artigo: “Nós, deuses no exílio!”. Heine publicou o texto aludido pela primeira vez em 1853, em francês, com o título de Les dieux en exil, no periódico - conhecido de Nietzsche - Revue des Deux Mondes. Nesse mesmo ano, o escrito recebeu sua versão alemã como Die Götter im Elend (Os deuses na miséria) na revista Blättern für literarische Unterhaltung (de Elend [miséria], diga-se, é bem a questão no texto de Nietzsche). E ainda antes de que em 1854 fosse publicada a versão definitiva em alemão - a primeira edição francesa apareceria em breve - com o título Die Götter im Exil, Os deuses no exílio, no primeiro volume dos Vermischte Schriften [Miscelânea], de Heine, chegava ao mercado, pela Berliner Verlag, uma versão não autorizada de Gustav Hempel, que se apresentava sob a tradução de “Aus dem Französischen” [do francês], intitulada Die verbannten Götter [Os deuses exilados].8 8 Sobre a história do surgimento, publicação, tradução e recepção da obra, cf. Höhn, 2004, p. 462-466. Seja o caso de que Nietzsche conhecesse a versão publicada na Revue, e de sua parte reproduzisse o termo francês “exil” através do alemão “Verbannung” [“exílio”, “banimento”], ou seja o caso de que ele se referisse à tradução “roubada”, que soa de modo semelhante (e por certo que no catálogo da Biblioteca pessoal de Nietzsche9 9 Campioni, 2003, p. 282: na biblioteca constam apenas dois volumes de Heine: Heine, 1844 (adquirido em 1868, contendo uma série de marcas de leitura); Heine, 1869 (adquirido em 1878). nem o termo nem a outra versão são referidos): seja como for, da relação evidentemente livre e produtivamente interpretativa de Nietzsche com Heine não se deve entender que o autor do Zaratustra tivesse um conhecimento aprofundado do poeta; é possível até mesmo que ele tivesse familiaridade apenas com o título da obra. Seguindo uma indicação minha, o comentário de Jochen Schmidt a Aurora, de 2015SCHMIDT, J. Kommentar zu Nietzsches Morgenröthe, in: Historischer und kritischer Kommentar zu Friedrich Nietzsches Werken, vol. 3 / 1: SCHMIDT, J. Kommentar zu Nietzsches Morgenröthe / KAUFMANN, S. Kommentar zu Nietzsches Idyllen aus Messina. Org. pela Heidelberger Akademie der Wissenchaften, Berlin/Boston: De Gruyter, 2015., cita o escrito de Heine como texto de referência,10 10 Cf. Schmidt; Kaufmann, 2015, p. 366. mas não elucida o modo como Nietzsche veio a “incorporar” o título, fazendo dele algo seu.

Para se procurar entender como Nietzsche veio a incorporá-lo, em primeiro lugar é o caso de esboçar rapidamente o conteúdo e o estilo dos Deuses no exílio de Heine. Como veremos, ao contrário do que se tem no texto de Nietzsche, em Heine se trata do destino do qual padeceram “as divindades greco-romanas, assim que a cristandade se alçou a uma posição de domínio sobre o mundo”11 11 Heine, 1854, p. 217. , declarando os deuses antigos como maus espíritos, evento que o eu-autor fictício de Heine situa no século III. Mas como observa Sigmund Freud em seu ensaio O inquietante, pouco foi tematizado o modo pelo qual “os deuses se convertem em demônios após o colapso de sua religião”.12 12 Freud, 2000, p. 259. Sobre as palavras de Freud acerca dos Deuses no exílio de Heine, cf. Kupferberg, 2011, p. 50-53. Esse processo recebe breve menção no início do texto, sem suscitar interesse posterior, até por já ter sido suficientemente abordado em outras passagens. O texto de Heine, ao contrário, que além disso pode ser lido como uma paródia de mitografia, ocupa-se com a existência de divindades no exílio, sobre as quais o autor fictício reivindica um conhecimento mais ou menos preciso de supostas lendas, antigas crônicas e relatos orais.

A espirituosidade característica desse “relato mitográfico”, que enaltece o seu “estilo popular” (Heine, 1854HEINE, H. Die Götter im Exil. In: HEINE, H. Vermischte Schriften, vol. 1. Hamburg: Hoffmann und Campe,1854., p. 220), ao tempo mesmo que suprime sua fundamentação acadêmica (Heine, 1854HEINE, H. Die Götter im Exil. In: HEINE, H. Vermischte Schriften, vol. 1. Hamburg: Hoffmann und Campe,1854., p. 250), resulta, no tocante ao seu conteúdo, sobretudo da discrepância cômica entre a sublimidade das formas divinas antigas e o caráter profano do domicílio e das atividades que vieram a abraçar, numa condição de incógnito involuntário. Assim se realiza a mitografia erudito-popular de Heine, mediante a qual, após a vitória do cristianismo, “muitos desses pobres emigrantes, que agora estavam completamente sem abrigo e ambrosia, [...] tinham de se agarrar a um trabalho manual burguês”, “para pelo menos conseguir o amado pão”, por exemplo, “entre nós, na Alemanha, são pagos em lascas de madeira e bebem cerveja em vez de néctar” (Heine, 1854HEINE, H. Die Götter im Exil. In: HEINE, H. Vermischte Schriften, vol. 1. Hamburg: Hoffmann und Campe,1854., p. 221). Enquanto Apolo é descrito como pastor de gado na Baixa Áustria, Marte, o deus da guerra, como camponês do início do século XVI, Baco como abade de um mosteiro beneditino no Tirol e Mercúrio como um comerciante holandês na Frísia Oriental, o que narrador tem para contar de Plutão e Netuno é que eles não tiveram de emigrar, mas sim que eles, “mesmo após a vitória do cristianismo”, permaneceram “em seu elemento” (Heine, 1854HEINE, H. Die Götter im Exil. In: HEINE, H. Vermischte Schriften, vol. 1. Hamburg: Hoffmann und Campe,1854., p. 248). Já de Júpiter, pai dos Deuses, ao contrário, o narrador teria perdido quase todo e qualquer vestígio, exceção feita à narrativa oral de um amigo seu, caçador de baleias norueguês com pernas de pau, segundo o qual russos do mesmo ofício teriam se deparado, cem anos antes, numa ilha do alto mar do Norte (sem localização precisa), chamada “Ilha do Coelho”, com um notável “ancião” de fala grega, que foi identificado por um “erudito russo”, que com eles viajava, como sendo indubitavelmente Júpiter (Heine, 1854HEINE, H. Die Götter im Exil. In: HEINE, H. Vermischte Schriften, vol. 1. Hamburg: Hoffmann und Campe,1854., p. 264).

Mesmo se se quisesse ler o texto de Heine tendo como pano de fundo o seu próprio destino no exílio e/ou a sua autoencenação contida na confissão “eu, pobre ex-Deus” (Heine, 1854HEINE, H. Die Götter im Exil. In: HEINE, H. Vermischte Schriften, vol. 1. Hamburg: Hoffmann und Campe,1854., p. 69), a diferença em relação ao modo de consideração subjetivado e antropologizado de “Nós, deuses no exílio” é algo por demais manifesto. Enquanto o Deuses no exílio do poeta reserva aos emigrantes divinos uma perspectiva externa pseudomitográfica, e deles nada é dito a partir de experiência própria, no caso de Nietzsche, é evidente que está falando um dos deuses banidos referidos no título, quando na verdade - este é o ponto crucial do texto - ali não se tem nenhum deus. Citando o próprio aforismo:

Nós, deuses no exílio! - Devido a erros quanto à sua proveniência, seu caráter único, seu destino e a exigências estabelecidas com base nesses erros, a humanidade ergueu-se alto e sempre “superou a si própria”: mas devido aos mesmos erros apareceu no mundo uma indizível quantidade de sofrimento, perseguição mútua, suspeita, incompreensão e ainda maior miséria do indivíduo consigo e em si. Os homens tornaram-se criaturas sofredoras em consequência de suas morais: o que obtiveram com isso foi, tudo somado, o sentimento de que no fundo seriam bons e significativos demais para a Terra e nela se achariam apenas temporariamente. “O sofredor altivo” ainda é, por enquanto, o mais elevado tipo humano (M/A 425, KSA 3.261).

A diferença essencial em relação ao texto de Heine revela-se já no título, com o equacionamento entre “nós” e os deuses exilados; ainda que esse “nós” não apareça no título, com a instância de fala sendo formulada no enunciado sobre “a humanidade”, de modo puro e simples, em terceira pessoa, aquele “nós-deuses no exílio” faz referência à “humanidade” em relação à qual o falante ao mesmo tempo se distancia, tendo se deslocado a um metaplano de reflexão, e neste descreve seu estado até ali. Em razão de “erros” que não foram precisamente especificados quanto à própria soberania moral, os homens cada vez mais caíram na “miséria” e no mútuo dissenso; como resultado, tal como deuses banidos, sentiram-se estrangeiros num mundo imperfeito, e desse modo padeceram por sua própria autossuperestimação. Essa conexão é justamente algo que o falante procura compreender; mas ele não tem proposta de solução para a sua condição miserável, ainda que, mediante a construção adverbial temporal “ainda é, por enquanto”, acene para um futuro outro e melhor. Mantém-se aberta a questão sobre se ele próprio pode ser o tipo de homem então mais elevado do “sofredor altivo” - e não obstante não seriam todos, mas somente os homens mais elevados aqueles a se sentir como “deuses no exílio”; mesmo que a questão assim se mantenha aberta, a forma “nós” do título sugere que o texto deva ser lido como autorreflexão.

Com isso, Nietzsche (não se sabe se conscientemente ou não) inverte a perspectiva do problema e o procedimento expositivo de Heine: se este põe diante dos olhos o que seria uma humanização e aburguesamento dos antigos deuses como ato de degradação cósmica, da qual a ascensão do cristianismo seria culpada, o texto de Nietzsche analisa a autodivinização do homem por meio da moral como megalomania trágica, cuja consequência seria a invocação do sofrimento da existência terrena e a esperança numa vida melhor, supraterrena. Mesmo em Nietzsche, os pensamentos sobre o cristianismo não estão muito distantes do modo como ele alude e transfigura o aforismo 425 do livro V de Aurora no aforismo 115 do livro III de A gaia ciência. Os “erros” do homem acerca de sua origem “mais elevada”, “divina”, erros que no texto mencionado são referidos de modo apenas genérico, são aqui delineados de maneira mais precisa sob o título de “Os quatro erros”. Seu saber incompleto sobre si mesmo, seu autoengano sobre suas próprias propriedades, sua arrogância para com tudo o quanto é natural, animal, bem como sua contínua invenção de novos valores acabaram por conduzir o homem a conceitos ilusórios como “humanidade, humanismo e ‘dignidade humana’” (FW/GC 115, KSA 3.474). A referência ao cristianismo e à sua participação nesses “erros” humanos é facilmente estabelecida, sobretudo quando se considera o campo contextual do terceiro livro, no qual a célebre e infame tese da morte do deus cristão surge como símbolo, tal como ela é representada, de forma particularmente proeminente, pela figura do título da parábola “O homem louco” (FW/GC 125, KSA 3.480).

Também e precisamente nessa medida se estabelece uma significativa relação de transfiguração com Os Deuses no exílio, de Heine: enquanto Heine apresenta a vitória do cristianismo no século III como razão para a emigração dos deuses antigos, apresentando a sua história até quase os tempos atuais e sem pôr em dúvida o domínio duradouro da religião cristã, Nietzsche já tematiza uma cesura epocal num momento posterior: o declínio do cristianismo no século XIX. A principal metáfora desse fenômeno é formulada como a “morte de Deus”, que de sua parte pressupõe que esse Deus (o cristão) tenha vivido algum dia. Mas, em A gaia ciência, a morte de Deus de modo algum se mostra como um processo fechado ou isento de consequências. Nos primeiros dois livros da obra ainda não se fala em morte de Deus; não obstante, já ali esse Deus parece ter perdido onipotência e onipresença. É assim que, no primeiro aforismo do primeiro livro, o filósofo ressalta que o “agora” tem uma série de “coisas”, “que mesmo em Deus já não mais são possíveis” (FW/GC 1, KSA 3.370), enquanto que, no nono aforismo, se fala das profundidades ocultas da alma humana, cuja distância “ninguém sabe, nem mesmo Deus” (FW/GC 9, KSA 3.381). No aforismo 59 do segundo livro de A gaia ciência, ainda uma vez o lugar de fala do título, a saber “Nós, artistas!”, mais uma vez se faz expressamente presente, como “veneradores de Deus”, e mesmo como os “viciados em Deus” (FW/GC 59, KSA 3.422-424), ao passo que só mesmo no aforismo de abertura do terceiro livro se terá o comunicado lapidar: “Deus está morto” (FW/GC 108, KSA 3.467).13 13 Precisamente essa formulação - que é bem o mais célebre enunciado vindo da pena de Nietzsche -, encontra-se no aforismo 125, onde ele se vale da figura-título do “homem louco”.

Ora, mas com isso ainda não se fez muito nesse aforismo, que é o de número 108. O cerne do breve texto encontra-se num viés lendário semelhante ao que se tem em Deuses no exílio de Heine: “Depois que Buda morreu, sua sombra ainda se mostrou numa caverna durante séculos, - uma sombra imensa e terrível. Deus está morto; considerando como são os homens, porém, durante séculos ainda haverá cavernas em que a sua sombra será mostrada” (FW/GC 108, KSA 3.468). Emoldurado se faz esse passo, que não pouco se deixa associar à alegoria da caverna de Platão, com o título de “novos embates”, o mesmo se podendo dizer do enunciado final, que é oportunamente combativo: “Quanto a nós - nós teremos de vencer também a sua sombra [de Deus]!” (FW/GC 108, KSA 3.468). Se, no caso de Heine, o narrador revela as fontes fictícias de seu saber mitográfico, no caso de Nietzsche, ao contrário, ele cala sobre suas fontes reais: das sombras de Buda na caverna, Nietzsche pôde ficar sabendo pela leitura de A religião de Buda e seu surgimento (Die Religion des Buddha und ihre Entstehung, 1857-1859), de Carl Friedrich Koeppen, livro que, já em 1870, ele tomara de empréstimo da biblioteca da Universidade da Basileia.14 14 Cf. Crescenzi, 1994, p. 401. Koeppen relata que “também sua sombra o crente deixou para trás. Outrora ela se mostrava em diferentes cavernas e grutas”; mas Koeppen não pretende esconder o que toma por intrujice de sacerdote: “Semelhante truque de prestidigitação ainda hoje é aplicado por monges de mosteiros célebres das ‘cinco torres’ na província chinesa de Schansi” (Koeppen, 1857KOEPPEN, C. F. Die Religion des Buddha und ihre Entstehung. Berlin: F. Schneider 1857., p. 523). A esse respeito, Koeppen acrescenta, em nota de rodapé: tão logo “se trazia fogo à caverna, a fim de oferecer incenso em sacrifício, as sombras se esvaneciam, e tornava-se a se revelar, ao que que se apagavam as chamas, a origem do fenômeno” (Koeppen, 1857KOEPPEN, C. F. Die Religion des Buddha und ihre Entstehung. Berlin: F. Schneider 1857., p. 524).

Desilusões desse tipo não são operadas pelo orador no texto de Nietzsche, e em vez disso o que se tem é a sombra de Buda na caverna a se fazer “imensa e terrível”.15 15 A questão de se tratar de “uma enorme e assustadora sombra“ de Buda, parece um acréscimo do próprio Nietzsche. Campioni, 2010, p. 84, que faz referência à tradução francesa de autoria de Stanislas Juliens (1853) de um relato sobre o peregrino budista Hiouen-Thsang, do século VII (Histoire de la vie de Hiouen-Thsang et de ses voyages dans l´Inde: depuis l´an 629 jusqu´en 645), tradução esta que era conhecida de Koeppen e na qual se lê “a luz corria pela caverna e as sombras ofuscantes de Buda esboçavam-se majestosamente na parede” (Die Schatten Gottes, p. 84). Porém, em razão de seu caráter positivo-sublime, essa descrição, mencionada também no ensaio Le Bouddhisme, de autoria de Ernest Renan (1866) alinha-se bem à formulação presente no texto de Nietzsche. Decisiva lhe é tão-somente a transferência de Buda para o Deus cristão, que ele toma por evidentemente morto; a sua troglodítica existência como sombra, porém, ele a tem por análoga e possível ainda “por milhares de anos”. Também aqui o homem desempenha o papel principal - como no aforismo 425 de Aurora e no 115 de A gaia ciência: a continuidade da existência de Deus, provavelmente ao longo de séculos, como sombra na caverna, não se faz seguir por algo como a essência “infinita” de Deus, e sim muito mais pela “espécie de homem”. Contra essa “espécie” volta-se o “nós” da elocução do texto, mesmo quando ele por fim declara uma “guerra das sombras” ao Deus morto. Esse quadro aponta para uma ansiada transfiguração da essência do homem que se supera a si mesmo, tal como a “naturalização” que se tem em vista no subsequente fragmento 109.

Também as “sombras de Deus” vêm de novo assomar nesse fragmento, desta feita num emprego explicitamente metafórico. De concreto, o que aqui se tem são cosmologias vitalistas, mas igualmente mecanicistas, que apreendem o universo ao modo de organismo ou de máquina, atribuindo-lhe “antropomorfismos estéticos” como “ordem, divisão, forma, beleza, sabedoria” (FW/GC 109, KSA 3.468), além dos pressupostos de fins, de leis e de matéria na natureza, os quais o narrador designa como “sombras de Deus”: ao modo de resíduo de antigas representações metafísico-religiosas na ciência natural antiga. Também ele se dá de forma combativa para exclamar, ao final: “Quando é que todas essas sombras de Deus não mais nos obscurecerão a vista? Quando é que teremos desdivinizado de todo a natureza? Quando poderemos começar a naturalizar os seres humanos com uma pura natureza, de forma recém descoberta e redimida!” (FW/GC 109, KSA 3.468). Chama a atenção o fato de, na folha de correção de Nietzsche, constar primeiro “desumanizar” em vez de “desdivinizar”, o que o filósofo alterou manualmente pouco antes da impressão; também o enunciado que caracteriza as concepções cosmológicas esboçadas como “sombras de Deus” foi por ele acrescentado nessa ocasião.

Figura 1 -
Página de correção da primeira edição (1882) de A gaia ciência, Cb 139

A antropomorfização do universo, contra a qual o texto se volta, em última instância remete à representação metafísico-religiosa de um Deus criador divino, e nessa medida é apreendida como “divinização” da natureza. A ela o “nós” do narrador vem utopicamente contrapor uma “naturalização” do homem, que, diante do pano de fundo filosófico-moral do fragmento 425 de Aurora e o do 115 de A gaia ciência, pode ser entendida como “desdivinização” do homem, e com isso, em todo caso, como superação de seus “erros” sobre si mesmo.

Significativo é, porém, o que Nietzsche substituiu e acrescentou na folha de correção ao fragmento 109 de A gaia ciência (Figura 1), e igualmente - sobretudo se se tiver em vista nosso tópico aqui, que aparentemente posso ter perdido de vista - o que ele remove sem substituir. A folha de correção remete ainda ao enunciado final descartado: “Não foi desta vez que Prometeu se livrou de seu abutre!”16 16 A esse respeito, cf. Brusotti, 1997, p. 424. Esse enunciado, que metaforicamente descreve o status quo da história da humanidade, recorreu ao mito antigo de Prometeu, segundo o qual o Titã, depois que entregou o fogo celeste ao homem, contra a vontade de Zeus, como forma punição, foi acorrentado a uma rocha no Cáucaso; ali, uma águia ou (em terminologia que vigorou até o século XIX) um abutre ficou a lhe devorar o fígado, que sempre tornava a crescer. Como motivo para o frontispício da primeira edição de O nascimento da tragédia (Figura 2), Nietzsche elegeu uma ilustração trazendo o Prometeu recém-liberto junto do abutre, tendo este sido morto por uma flechada do semideus Héracles. No texto da obra, Nietzsche igualmente fazia referência à tragédia de Ésquilo, Prometeu acorrentado.

Figura 2 -
Ilustração no frontispício da primeira edição de O nascimento da tragédia

Se o herói trágico Prometeu, na tragédia que leva seu nome, pode ser tomado como exemplo para a tese de que por trás de todas as figuras da tragédia grega encontra-se, em última instância, Dioniso,17 17 “Esse ímpeto titânico, como a se tornar o Atlas de cada indivíduo, a suportá-lo com costas largas, é o que há em comum entre o prometeico e o dionisíaco. O Prometeu de Ésquilo é, nesse sentido, uma máscara dionisíaca [...]” (GT/NT 9. KSA 1.71). a sentença final riscada na folha de correção do aforismo 109 de A gaia ciência já evidencia outro aspecto. Prometeu parece ali muito mais uma forma simbólica mítica para o homem moderno, que busca um acesso desobstruído à natureza “pura”; com isso, o abutre de Prometeu faz referência à “sombra de Deus”, que, com a correção, por fim aparece a seu lado. Mesmo quando Nietzsche elimina esse resquício mitológico, torna-se evidente que, ao final do texto, a ansiada “naturalização” do homem também pode ser lida como sua própria “divinização” ou “titanização”. A isso vem se adequar uma declaração do “homem louco”, em narrativa semelhante à do aforismo 125. Diferentemente das instâncias de fala dos aforismos 108 e 109, do início do livro III de A gaia ciência, surge o homem louco, que, segundo uma imagem transfigurada do cínico Diógenes, surge “em pleno meio-dia”, de lanterna em punho, na praça do mercado, à procura de Deus (FW/GC 125, KSA 3.480), não como aquele que combate as sombras de Deus (fosse para tanto ele iria a uma caverna), mas como autoacusador do “assassinato de Deus” cometido coletivamente pelo homem moderno, e como arauto das consequências desse ato, que é de gravidade inaudita. Enquanto o visitante circunstancial do mercado ri do homem louco por não “acreditar em Deus” e presume ironicamente que o Deus cristão talvez apenas se encontre - como os deuses antigos em Heine - no exílio, tendo “ido de navio? Emigrado?” (FW/GC 125, KSA 3.480), pois ante essa reação o homem louco insiste: “Deus está morto! Deus continua morto! E nós o matamos!”. E finalmente ele introduz a pergunta: “Não será a grandeza desse ato grande demais para nós?” (FW/GC 125, KSA 3.481). A prometeização do homem na sentença final riscada do aforismo 109 em todo o caso se dá a entender como resposta afirmativa a essa pergunta.

Evidentemente, a divinização solicitada ou ansiada pelo homem diferencia-se de sua autoconcepção como “Deuses no exílio”, que, no aforismo 425 de Aurora, é referida como “erro” antropológico, cujas “quatro raízes” tornam a ser reveladas no aforismo 115 de A gaia ciência. Pois, uma vez que essa divinização antiga, “falsa”, do homem, em última instância, se baseia num ideário cristão, sua nova divinização, “correta”, pressupõe precisamente o declínio do cristianismo. Também no aforismo 337 do livro IV, sob o título de “A futura ‘humanidade’”, esboça-se uma apoteose da humanidade futura, “uma felicidade que até agora o ser humano não conheceu - [...] uma felicidade que, tal como o sol no princípio da noite, continuamente se desfaz de sua inesgotável riqueza” (FW/GC 337, KSA 3.564). Essa imagem será retomada logo depois, no aforismo 342, na conclusão do quarto livro, e com ela se finda A gaia ciência em sua primeira edição, de 1882, contendo, já como uma espécie de teaser - quase que em reprodução literal -, o início de Assim falava Zaratustra (FW/GC 342, KSA 3.571), e isso nos faz pensar no além-do-homem, cuja “doutrina” Zaratustra anuncia, fazendo-o sintomaticamente no capítulo “A virtude dadivosa”, da primeira parte do Zaratustra, com as palavras: “Mortos estão todos os deuses: agora queremos que viva o além-do-homem” (Za/ZA, Da virtude dadivosa, KSA 4.102). No capítulo “Dos poetas”, da segunda parte, “deuses” e “além-do-homem” são referidos num mesmo fôlego (Za/ZA, Dos poetas, KSA 4.164), tal como já se tinha (como bem se pode constatar) em A gaia ciência.

Que todos os deuses estão mortos já é uma constatação que não se encontra em A gaia ciência. Nessa obra se fala muito mais e tão-somente da morte do Deus cristão - numa extensão de continuidade narrativa que mantém a perspectiva dos deuses no exílio de Heine - a conduzir diretamente a um retorno das divindades antigas e emigradas, isto é, das figuras míticas. O aforismo 143 de A gaia ciência, sob o título de “Grande vantagem do politeísmo”, sob uma retrospectiva da antropologia da religião, não se limita a enaltecer a “invenção de deuses, heróis e super-homens (Uebermenschen) de toda espécie [...], e de centauros, sátiros” ao modo de um “inestimável exercício prévio para a justificação do amor próprio e da soberania do indivíduo” com vistas à “humana liberdade e variedade de pensamento”, que o monoteísmo, por sua vez, mantivera obstruída (FW/GC 143, KSA 3.490). Para além disso, juntamente com as citadas figuras míticas da Antiguidade, tem-se ainda outras a compor o ideário moderno de A gaia ciência: é desse modo que a coruja “de Minerva” esvoaça pelo Humano, demasiado humano, de Nietzsche (1878), pelo crepúsculo lírico do “prelúdio em rimas alemãs” (FW/GC, Brincadeira, astúcia e vingança, KSA 3.365), e eu narrativo do aforismo 22, depois de ter despertado de um sonho que o transportara para a corte francesa da época de Montaigne, suspeita que Morfeu, o “deus dos sonhos”, pareceu querer “divertir-se com meus hábitos” (FW/GC 22, KSA 3.395). A instância de fala do aforismo 60, tornada conhecida pelo ensaio sobre o estilo de Nietzsche de Derrida (1986DERRIDA, J. “Die Sporen. Die Stile Nietzsches”. In: HAMACHER, W. Nietzsche aus Frankreich. Frankfurt am Main/Berlin: Philo, 1986.), no qual ele faz atentar ao modo como um “velho abalador da terra”, como Poseidon, “canta a sua ária [...] no tom surdo de um touro que muge” (FW/GC 60, KSA 3.424); ocultas “ninfas e deuses da floresta [...] e às vezes até divindades mais altas” sendo, segundo o aforismo 105, responsáveis pela ânsia dos artistas alemães por um “mundo melhor, mais leve, mais meridional, mais ensolarado” (FW/GC 105, KSA 3.463); já o aforismo 237, valendo-se da psicologia dos tipos, volta-se para um contemporâneo fictício, “que tem sempre um biscoito para Cérbero” (FW/GC 237, KSA 3.513), como no mito de Psique, quando, por encomenda de Afrodite, roubou, do Hades, uma caixa cheia da beleza de Perséfones. “A maravilhosa arte e energia de criar deuses” (FW/GC 143, KSA 3.490), com a morte de Deus, reaparece ou continua a se fazer aparecer também na “arte da transfiguração” de A gaia ciência, bem como em outros textos posteriores de Nietzsche. É desse modo que se anuncia, por exemplo, o eu falante no breve ensaio, de maio/junho de 1888, presente no espólio, intitulado “Sobre a história do conceito de Deus” (NF/FP 17[4] de maio - junho de 1888, KSA 13.523), que tem em vista um politeísmo futuro ou uma “nova mitologia”: “muitos novos deuses ainda são possíveis!... Quanto a mim, se o instinto religioso, isto é, o instinto formador de deus, quiser de novo se fazer vivaz, quão outro, quão diferente se manifestará a mim desta feita o divino!...” (NF/FP 17[4] de maio - junho de 1888, KSA 13.525).18 18 Para tanto, como Nietzsche se utiliza dessa referência para AC/AC 16-19, KSA 6.182-185, deixando de fora o aforismo em que evoca o “instinto religioso”, “formador de Deus” (cf. Sommer, 2013, p. 182, l. 9 e p. 185, l. 29); cf. Sommer, 2016, p. 349. Na mesma passagem, Sommer elucida: “Que em Nietzsche se tenha de fato uma opção por um Deus ‘além de bem e mal’, tal se dá a sugerir por uma série de textos do espólio (cf. Nachlass/FP 1882, KSA 10, 3 [1] 432, 105, 15-17). Entretanto, o que salta aos olhos é que, com referência a isso, em sua obra publicada o filósofo parece se dar por satisfeito com alusões obscuras”. - Quanto à pergunta sobre “em que medida Nietzsche considera ao menos a possibilidade de “muitos novos deuses” após a morte do Deus cristão-moral monoteísta, cf. Figl, 2000), p. 82.

Referências

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  • WALDMANN, P. Der verborgene Winkel der sterbenden Götter. Temporalisierung als ästhetischer Ausdruck im Werk von Heinrich Heine Würzburg: Königshausen und Neumann , 2003.
  • 1
    Para desse modo contemplar a “fusão do Crucificado com Dioniso”, cf. Detering, 2010DETERING, H. Der Antichrist und der Gekreuzige. Friedrich Nietzsche letzte Texte. Göttingen: Wallstein Verlag, 2010., p. 153.
  • 2
    A esse respeito cf. Groddeck, 1991GRODDECK, W. Friedrich Nietzsche. “Dionysos-Dithyramben”. Berlin: De Gruyter , 1991. .
  • 3
    Uma busca na eKGWB na Nietzsche Source (http://www.nietzschesource.org/) resulta em, ao todo, 100 ocorrências do radical einverleib* (incorpor*) em A gaia ciência; quando pesquisado com diferentes flexões, o termo aparece dez vezes (nos aforismos 1, 11, 21, 43, 57, 110, 135 e 361).
  • 4
    Cf. Sêneca, 1811SÊNECA, -. Uebersetzung der sämmtlichen Briefe des L.A. Seneca mit erklärenden Anmerkungen begleitet von D. J. Olshausen, vol. 2. Kiel: Schmidt, 1811., p. 32.
  • 5
    A esse respeito, com mais detalhes, cf. Kaufmann, 2016KAUFMANN, S. “Ob ‘Wahrheit noch Wahrheit bleibt, wenn man ihr die Schleier abzieht?’. Das Verhältnis von Philosophie und Kunst in der Vorrede zur ‘Fröhliche Wissenschaft’, in: GRÄTZ, K. & KAUFMANN, S. (org.) Nietzsche zwischen Philosophie und Literatur. Von der ‘Fröhliche Wissenschaft’ zu ‘Also sprach Zarathustra. Heidelberg: Winter Verlag, 2016., p. 75-106, em especial p. 83-102.
  • 6
    Cf. Sommer, A., 2016SOMMER, A. U. Kommentar zur Nietzsches Jenseits von Gut und Böse. Historischer und kritischer Kommentar zur Friedrich Nietzsches Werken, vol. 5/1, org. pela Heidelberger Akademie der Wissenschaften. Berlin/Boston: De Gruyter , 2016. , p. 18.
  • 7
    As referências intertextuais desses textos do Nietzsche “intermediário” a Os Deuses no exílio de Heine até agora se mantiveram amplamente despercebidas. Em vez disso, o foco da pesquisa concentrou-se nas relações entre a narrativa sobre os deuses, de Heine, e a do Nietzsche dos primórdios; cf. Höhn, 1997HÖHN, G. “Farceur” “Fanatiker des Ausdrucks”. Nietzsche, ein verkappter Heineaner. In: Heine-Jahrbuch 36, 1997, p. 134-152.; p. 134-152; Waldmann, 2003WALDMANN, P. Der verborgene Winkel der sterbenden Götter. Temporalisierung als ästhetischer Ausdruck im Werk von Heinrich Heine. Würzburg: Königshausen und Neumann , 2003., p. 7-10; Bohrer, 2015BOHRER, K.-H. Das Erscheinen des Dionysos. Antike Mythologie und moderne Metapher. Frankfurt a. M.: Suhrkamp, 2015. , p. 222-232.
  • 8
    Sobre a história do surgimento, publicação, tradução e recepção da obra, cf. Höhn, 2004HÖHN, G. Die Götter im Exil. In: HÖHN, G. Heine-Handbuch. Stuttgart: Springer-Verlag, 2004., p. 462-466.
  • 9
    Campioni, 2003CAMPIONI, G. (org.). Nietzsches persönliche Bibliothek. Berlin: De Gruyter, 2003., p. 282: na biblioteca constam apenas dois volumes de Heine: Heine, 1844HEINE, H. Neue Gedichte. Hamburg: Hoffmann und Campe , 1844. (adquirido em 1868, contendo uma série de marcas de leitura); Heine, 1869HEINE, H. Letzte Gedichte und Gedanken. Hamburg: Hoffmann und Campe , 1869. (adquirido em 1878).
  • 10
    Cf. Schmidt; Kaufmann, 2015SCHMIDT, J. Kommentar zu Nietzsches Morgenröthe, in: Historischer und kritischer Kommentar zu Friedrich Nietzsches Werken, vol. 3 / 1: SCHMIDT, J. Kommentar zu Nietzsches Morgenröthe / KAUFMANN, S. Kommentar zu Nietzsches Idyllen aus Messina. Org. pela Heidelberger Akademie der Wissenchaften, Berlin/Boston: De Gruyter, 2015., p. 366.
  • 11
    Heine, 1854HEINE, H. Die Götter im Exil. In: HEINE, H. Vermischte Schriften, vol. 1. Hamburg: Hoffmann und Campe,1854., p. 217.
  • 12
    Freud, 2000FREUD, S. Das Unheimliche. In: FREUD, S. Psychologische Schriften. Studienausgabe. Frankfurt am Main: Fischer, 2000., p. 259. Sobre as palavras de Freud acerca dos Deuses no exílio de Heine, cf. Kupferberg, 2011KUPFERBERG, Y. Dimensionen des Witzes um Heinrich Heine. Zur Säkularisierung der poetischen Sprache. Würzburg: Königshausen und Neumann, 2011., p. 50-53.
  • 13
    Precisamente essa formulação - que é bem o mais célebre enunciado vindo da pena de Nietzsche -, encontra-se no aforismo 125, onde ele se vale da figura-título do “homem louco”.
  • 14
    Cf. Crescenzi, 1994CRESCENZI, L. “Verzeichnis der von Nietzsche aus der Universitätsbibliothek in Basel entliehenen Bücher”. In: Nietzsche-Studien 23, 1994., p. 401.
  • 15
    A questão de se tratar de “uma enorme e assustadora sombra“ de Buda, parece um acréscimo do próprio Nietzsche. Campioni, 2010CAMPIONI, G. “Die Schatten Gottes. Aus dem Italienischen von Leonie Schröde“. In: GENTILI, C. & NIELSEN, C. (org.) Der Tod Gottes und die Wissenschaft. Zur Wissenschaftskritik Nietzsches. Berlin/New York: De Gruyter , 2010., p. 84, que faz referência à tradução francesa de autoria de Stanislas Juliens (1853) de um relato sobre o peregrino budista Hiouen-Thsang, do século VII (Histoire de la vie de Hiouen-Thsang et de ses voyages dans l´Inde: depuis l´an 629 jusqu´en 645), tradução esta que era conhecida de Koeppen e na qual se lê “a luz corria pela caverna e as sombras ofuscantes de Buda esboçavam-se majestosamente na parede” (Die Schatten Gottes, p. 84). Porém, em razão de seu caráter positivo-sublime, essa descrição, mencionada também no ensaio Le Bouddhisme, de autoria de Ernest Renan (1866) alinha-se bem à formulação presente no texto de Nietzsche.
  • 16
    A esse respeito, cf. Brusotti, 1997BRUSOTTI, M. Die Leidenschaft der Erkenntnis. Philosophie und ästhetische Lebensgestaltung bei Nietzsche von Morgenröthe bis Also sprach Zarathustra. Berlin/New York: De Gruyter, 1997., p. 424.
  • 17
    “Esse ímpeto titânico, como a se tornar o Atlas de cada indivíduo, a suportá-lo com costas largas, é o que há em comum entre o prometeico e o dionisíaco. O Prometeu de Ésquilo é, nesse sentido, uma máscara dionisíaca [...]” (GT/NT 9. KSA 1.71).
  • 18
    Para tanto, como Nietzsche se utiliza dessa referência para AC/AC 16-19, KSA 6.182-185, deixando de fora o aforismo em que evoca o “instinto religioso”, “formador de Deus” (cf. Sommer, 2013SOMMER, A. U. Kommentar zu Nietzsches Der Antichrist, Ecce Homo, Dionysos-Dithyramben, Nietzsche contra Wagner. Historischer und kritischer Kommentar zu Friedrich Nietzsches Werken. vol. 6/2. Org. pela Heidelberger Akademie der Wissenschaften. De Gruyter: Berlin / Boston 2013, p. 182, l. 9 e p. 185, l. 29); cf. Sommer, 2016SOMMER, A. U. Kommentar zur Nietzsches Jenseits von Gut und Böse. Historischer und kritischer Kommentar zur Friedrich Nietzsches Werken, vol. 5/1, org. pela Heidelberger Akademie der Wissenschaften. Berlin/Boston: De Gruyter , 2016. , p. 349. Na mesma passagem, Sommer elucida: “Que em Nietzsche se tenha de fato uma opção por um Deus ‘além de bem e mal’, tal se dá a sugerir por uma série de textos do espólio (cf. Nachlass/FP 1882, KSA 10, 3 [1] 432, 105, 15-17). Entretanto, o que salta aos olhos é que, com referência a isso, em sua obra publicada o filósofo parece se dar por satisfeito com alusões obscuras”. - Quanto à pergunta sobre “em que medida Nietzsche considera ao menos a possibilidade de “muitos novos deuses” após a morte do Deus cristão-moral monoteísta, cf. Figl, 2000FIGL, J. “‘Tod Gottes’ und die Möglichkeit ‘neuer Götter’”. In: Nietzsche-Studien 29, 2000.), p. 82.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Jun 2020
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2020

Histórico

  • Recebido
    20 Out 2019
  • Aceito
    18 Dez 2019
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