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Estado e sociedade na construção de capacidades para fortalecer práticas de governança territorial1 1 Este texto resulta de estudos teóricos realizados no processo de execução do projeto de pesquisa O patrimônio territorial como referência no processo de desenvolvimento de territórios ou regiões, nas versões financiadas pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul (FAPERGS) e a Universidade Federal do Paraná (UFPR), merecendo os agradecimentos dos autores pelo apoio. O agradecimento é extensivo aos membros da Equipe de Pesquisa do referido projeto, pelas inspirações sobre a temática do presente artigo, resultantes dos debates coletivos, contribuindo para qualificá-lo.

Resumo

Parte-se do entendimento de que processos de articulação territorial, com vistas à prospecção do futuro desejado territorialmente, exigem práticas de governança colaborativa, horizontal e democrática, envolvendo agentes estatais e representações dos setores sociais, produtivo-empresarial e universitários. Ambientes de alta complexidade, aliados à transformação digital contemporânea, alteraram significativamente a agenda dos territórios, permitindo questionar as competências e capacidades dos atores territoriais para atuar em processos de articulação territorial. Isso ratifica a visão de que essa complexidade sistêmica seja assimilada por intermédio de um hibridismo metodológico, multirreferencial, que contemple processos de coprodução e pesquisa-ação. O objetivo deste artigo é gerar aportes teórico-metodológicos para abordar os desafios postos ao Estado e à sociedade na construção de capacidades para as práticas de governança territorial. O texto está estruturado na forma de um ensaio teórico, referenciado na produção acadêmica latino-americana sobre o tema.

Palavras-chave:
Estado; Sociedade; Governança Territorial; Capacidades; Articulação Territorial

Abstract

This research assumes that processes of territorial articulation, in order to achieve the desired territorial future, require democratic, horizontal, and collaborative practices of territorial governance, involving state agents and representatives from the social, productive-business and academic sectors. Highly complex environments together with the current digital transformation have significantly changed the agenda across territories. These issues have led to questioning the competencies and capabilities of the territorial actors with regard to their performances in the processes of territorial articulation. Against this backdrop, the notion has been ratified that this systemic complexity is assimilated through a methodological, multi-referential hybridism, which includes processes of co-production and action research. The objective of this article is to produce theoretical and methodological contributions in order to address the challenges posed to the state and society in building capabilities for practices of territorial governance. The text has been structured as a theoretical essay referenced in Latin American academic production regarding the subject.

Keywords:
State; Society; Territorial Governance; Capabilities; Territorial Articulation

Introdução

No primeiro trimestre de 2021, iniciou-se uma investigação com o propósito de elaborar estudos, propor e validar um instrumental metodológico mais adequado à perspectiva de análise territorial, de modo a contribuir na produção de diagnósticos territoriais que favoreçam a prospecção de alternativas inovadoras e sustentáveis de desenvolvimento, tendo o patrimônio territorial como referência. Esse debate resultou em dois textos publicados no início do segundo semestre de 2021: (i) Dallabrida, Rotta e Büttenbender (2021 DALLABRIDA, V. R.; ROTTA, E.; BÜTTENBENDER, P. L. Pressupostos epistêmico-teóricos convergentes com a abordagem territorial. Revista Brasileira de Gestão e Desenvolvimento Regional , v. 17, n. 2, p. 256-273, mai.-ago. 2021.), no qual são apresentados os pressupostos epistêmico-teóricos da pesquisa; (ii) Dallabrida et al. (2021), em que são explicitadas as categorias conceituais e os pressupostos metodológicos convergentes com a abordagem territorial do desenvolvimento.

Em consonância com a base epistêmica, assumiu-se no projeto um referencial teórico sustentado em quatro categorias conceituais: território, governança territorial, patrimônio territorial e desenvolvimento territorial. Tomou-se como orientação as categorias de análise do método geográfico de Santos (1997 SANTOS, M. Espaço e Método. 4. ed. São Paulo: Nobel, 1997.) e fez-se uma relação com a dinâmica territorial do desenvolvimento. Assim, as quatro categorias conceituais são organizadas da seguinte maneira:

  1. categoria de partida, o território, como estrutura socioterritorial localizada histórica e territorialmente, cujas partes se inter-relacionam;

  2. categoria de intermediação, as práticas de governança territorial, como processo em que são confrontados diferentes interesses/intenções, com o propósito de construir convergências quanto ao futuro desejado territorialmente, partindo da compreensão de que a forma assumida historicamente por uma estrutura resulta de conversações societárias horizontais;

  3. categoria resultante, o patrimônio territorial, como forma assumida pela estrutura socioterritorial, formatando o arranjo espacial com suas diferentes dimensões;

  4. categoria de funcionalidade, o desenvolvimento territorial (ou local/regional), como função da forma, partindo do entendimento de que, do confronto entre diferentes projetos de futuro, resultam configurações espaciais demarcadas administrativamente (municípios, regiões, países) ou por relações de identidade, ancoragem e pertencimento a um lugar (territórios), fazendo parte da utopia desejada territorialmente e sua concretude momentânea como realidade possível (DALLABRIDA, 2020aDALLABRIDA, V. R. Patrimônio Territorial: abordagens teóricas e indicativos metodológicos para estudos territoriais. Desenvolvimento em Questão, v. 18, n. 52, p. 12-32, jul. 2020b.).

O desafio de assumir uma dinâmica de planejamento e gestão territorial referenciada em pressupostos epistêmico-teórico-metodológicos convergentes com a abordagem territorial implica o emprego de procedimentos de articulação territorial que não os contrariem. Assim sendo, uma questão merece atenção: quais fundamentos metodológicos devem ser assumidos pelos atores no processo de articulação com vistas à realização do diagnóstico e planejamento territorial? Essa interrogação remete a questões essenciais do tema estudado, como a prática da governança territorial. Le Galès (2014)LE GALÈS, P. Governance. In: BOUSSAGUET, L.; JACQUOT, S.; RAVINET, P. (Orgs.). Dictionnaire des politiques publiques. 4. ed. Paris: Sciences Po Les Presses, 2014. p. 299-307. define governança como um processo de coordenação de atores, de grupos sociais e de instituições, com o propósito de alcançar objetivos definidos e discutidos coletivamente.2 2 Tem-se, aqui, conhecimento tanto das convergências quanto das especificidades de dois conceitos, governança e governamentalidade, sendo este último cunhado por Michel Foucault. Cf. FOUCAULT, M. Governmentality. In: BURCHELL, G.; GORDON, C.; MILLER, P. (Eds.). The Foucault effect: studies in governmentality. Chicago. Illinois: University of Chicago Press, 1991. p. 87-104.

A governança remete então a um conjunto tanto público quanto privado de instituições, redes, diretivas, regulamentos, normas, usos políticos e sociais que contribui para a estabilidade de uma sociedade e de um regime político, sua orientação, capacidade de dirigir e de fornecer serviços e assegurar sua legitimidade (LE GALÈS, 2014LE GALÈS, P. Governance. In: BOUSSAGUET, L.; JACQUOT, S.; RAVINET, P. (Orgs.). Dictionnaire des politiques publiques. 4. ed. Paris: Sciences Po Les Presses, 2014. p. 299-307., p. 301).

Como conceito derivativo, governança territorial é aqui compreendida como processos de articulação de atores no âmbito de um território, de base colaborativa, envolvendo os agentes estatais e representações dos setores sociais, produtivo-empresarial e universitário, em relações pautadas pela horizontalidade e prática democrática, com vistas à resolução de problemas de caráter público e/ou ao planejamento do futuro desejado territorialmente (DALLABRIDA, 2015 DALLABRIDA, V. R. Governança territorial: do debate teórico à avaliação da sua prática. Análise Social, v. 215, n. l (2.º), p. 304-328, 2015.).3 3 Ver outros enfoques sobre governança territorial em: FARINÓS, J. D. Gobernanza territorial para el desarrollo sostenible: estado de la cuestión y agenda. Boletín de la A.G.E., n. 46, p. 11-32, 2008.

A questão levantada impõe o desafio de uma reflexão teórica que possa inspirar tanto o processo de investigação que fundamenta este artigo quanto outros com objetivos similares. Tal reflexão deve servir de trilha metodológica ou orientação pedagógica à articulação territorial como prática de governança territorial. Essa é a contribuição pretendida com este texto. Metodologicamente, na forma de ensaio teórico, ele se baseia na produção acadêmica de pesquisadores membros do projeto de pesquisa indicado em nota e nas contribuições da literatura latino-americana disponível sobre o tema, abordando os seguintes tópicos: (i) aportes teórico-práticos sobre planejamento na perspectiva da abordagem territorial; (ii) processo de articulação e planejamento territorial na contemporaneidade; (iii) construção de capacidades no processo de articulação territorial; (iv) considerações finais.

Planejamento na perspectiva da abordagem territorial

O debate sobre abordagem territorial do desenvolvimento emerge como uma proposta para superar o enfoque setorial das atividades econômicas, amenizar a dicotomia espacial entre o rural e o urbano, campo versus cidade, e reconhecer o protagonismo dos atores da sociedade civil, atendendo à perspectiva bottom up de ação. “O território é visto e entendido como espaço e campo em que estes processos se afirmam e transcorrem, convertendo-se desta forma em uma unidade importante para o planejamento e implementação de ações de desenvolvimento” (SCHNEIDER et al., 2010 SCHNEIDER, S. et al. Análisis multidimensional y escalar del desarrollo territorial en Brasil. Eutopía, n. 1, p. 25-49, nov. 2010., p. 28).

A compreensão do planejamento na perspectiva de reconhecer o protagonismo dos atores da sociedade civil não se filia a nenhum dos extremos admitidos por vertentes teóricas que ou ressaltam o papel exclusivo do Estado ou rechaçam o Estado e representações do setor produtivo-empresarial, dando exclusividade ao papel dos atores sociais. Ela propugna um caminho alternativo, a saber, a defesa de que processos de articulação territorial com vistas à prospecção do futuro desejado territorialmente devem resultar de práticas de governança territorial colaborativas, envolvendo agentes estatais e representações dos setores sociais, produtivo-empresarial e universitário, em relações pautadas pela horizontalidade e pela prática democrática. A presença do Estado em processos dessa natureza é fundamental para aportar políticas públicas que permitam preservar direitos do cidadão, além de contribuir para a efetividade da coesão e integração social.

As práticas de governança territorial exigem equilíbrio entre as dimensões econômica, social e ambiental nos processos de desenvolvimento, o que implica o fato de que necessitam estar alicerçadas em arquiteturas com capacidades e dinâmicas democráticas, participativas e cooperativas (BÜTTENBENDER; SAUSEN, 2020 BÜTTENBENDER, P. L; SAUSEN, J. O. Innovative development management practices in a border region: a construct proposal of innovative governance and territorial development. Revista Brasileira de Gestão e Desenvolvimento Regional, v.16, n. 2, p. 446-458, 2020.). Complementando, Saquet (2018 SAQUET, M. A descoberta do território e outras premissas do desenvolvimento territorial. Rev. Bras. Estud. Urbanos Reg., v. 20, n. 3, p.479-505, set.-dez. 2018.) destaca que as práticas de governança territorial são necessariamente de caráter participativo, dialógico e reflexivo, envolvendo e valorizando as diferenças, as desigualdades e as identidades de cada lugar e território, sem se desligar do mundo. São destacadas as relações próximas, a solidariedade, a cultura popular, a ancoragem, a produção artesanal, as práticas agroecológicas, as condições edafoclimáticas específicas dos ecossistemas, entre outras características.

Considerando as ponderações feitas por Schneider e Saquet, um processo de articulação socioinstitucional com vistas ao planejamento e à gestão territorial exige que se estabeleça um diálogo com a acepção de território. Aqui, assume-se a posição de que se trata de uma construção social, em que suas partes se inter-relacionam, tomando uma forma resultante de processos históricos e contemporâneos de articulação societária ou práticas de governança territorial, arranjo representado pelo seu patrimônio territorial (DALLABRIDA, 2020a DALLABRIDA, V. R. Território e Governança Territorial, Patrimônio e Desenvolvimento Territorial: estrutura, processo, forma e função na dinâmica territorial do desenvolvimento. -G&DR- Revista Brasileira de Gestão e Desenvolvimento Regional , v. 16, n. 2, p. 63-78, mai.-ago. 2020a.; DALLABRIDA, 2020bDALLABRIDA, V. R. Patrimônio Territorial: abordagens teóricas e indicativos metodológicos para estudos territoriais. Desenvolvimento em Questão, v. 18, n. 52, p. 12-32, jul. 2020b.).

Para Souza (2009 SOUZA, M. L. “Território” da divergência (e da confusão): em torno das imprecisas fronteiras de um conceito fundamental. In: SAQUET, M. A.; SPÓSITO, E. S. (org.). Territórios e territorialidades: teorias, processos e conflitos. São Paulo: Expressão Popular, 2009. p. 57-62.), o território é compreendido e definido por meio da resposta a uma pergunta: quem domina ou influencia quem nesse espaço, e como? Segundo o autor, a dimensão política é aquela que, antes de qualquer outra, define o perfil do território: “Em cada caso concreto, ao se examinarem os fatores por trás de processos de territorialização, descobriremos, recuando no tempo e escavando o suficiente, um emaranhado de razões e motivações” (SOUZA, 2009 SOUZA, M. L. “Território” da divergência (e da confusão): em torno das imprecisas fronteiras de um conceito fundamental. In: SAQUET, M. A.; SPÓSITO, E. S. (org.). Territórios e territorialidades: teorias, processos e conflitos. São Paulo: Expressão Popular, 2009. p. 57-62., p. 60). Estas últimas emanam, paralelamente, tanto dos agentes estatais quanto das representações sociais e produtivo-empresariais, bem como, em alguns casos, de agentes universitários, no intuito de contribuir com ações de investigação na perspectiva da pesquisa-ação.4 4 Sobre o tema, ver: TRIPP, D. Pesquisa-ação: uma introdução metodológica. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 31, n. 3, p. 443-466, set./dez. 2005.

Assim, é nas “razões e motivações” que se justificaram no passado (ou se justificam no presente) os rumos do processo de territorialização (apropriação, dominação e produção do território) ou desterritorialização (formas de expropriação e exclusão territorial) e se expressou (ou expressa) a dimensão de poder, ou seja, quem e como influenciou/influencia processos.

É possível falar de um bairro, uma região ou município como expressão de um território, desde que o processo de planejamento resulte de uma intencionalidade conscientemente manifestada e assumida pelos agentes estatais e de representações dos setores sociais, produtivo-empresarial e universitário, das quais se originam manifestações de poder. Em decorrência disso, há um grande desafio a ser enfrentado na articulação voltada ao planejamento e gestão territorial: pactuar pela via democrática a intencionalidade de empreender um processo de diagnóstico - referenciado no patrimônio territorial - que se torne parâmetro e sirva para definir princípios e diretrizes na prospecção de um projeto de futuro desejado territorialmente.

Trata-se de um desafio hercúleo propor um processo de planejamento participativo sustentado na acepção de território. Ao apresentar novas alternativas de desenvolvimento, predomina ainda um enfoque projetista, em que se sobrevaloriza a visão planificadora, sem dar atenção às capacidades e aos conhecimentos locais, muito menos aos conflitos e tensões próprias do território. Portanto, urge situar o processo de planejamento territorial na acepção de coprodução de conhecimentos. Falar em coprodução é admitir a premissa de que conhecimento e ação são interdependentes. Tal acepção tem origem nas vertentes construtivistas, segundo as quais, imaginativa ou materialmente, as pessoas fazem o mundo, as sociedades, as instituições e, da mesma forma, a ciência e o conhecimento. Além disso, a noção de coprodução permite romper a dicotomia entre saberes especializados e saberes locais, suas intersecções e seus processos de adaptação mútua (MILLER; WYBORN, 2020 MILLER, C.; WYBORN, C. Co-production in global sustainability: histories and theories. Environmental Science & Policy, v. 113, p. 88-95, nov. 2020.). A sociedade civil, o Estado e o mercado podem encontrar caminhos complementares e alternativos, com a colaboração de governos que se conectam com outros governos e com o setor não governamental, por meio de parcerias, redes, alianças, comitês, consórcios, conselhos, agências, entre outras alternativas colaborativas que possam desenvolver estratégias em conjunto na promoção da gestão territorial (SCHOMMER et al., 2011 SCHOMMER, P. C. et al. Coprodução e inovação social na esfera pública em debate no campo da gestão social. In: SCHOMMER, P.C.; BOULLOSA, R. de F. (Org). Gestão social como caminho para a redefinição da esfera pública. Florianópolis: UDESC, 2011. p. 31-70.).

Sendo assim, tanto a noção de governança territorial - o processo colaborativo e societário de articulação de atores no âmbito de um território - quanto a de coprodução - processo de articulação territorial em que o conhecimento e a ação são interdependentes e os saberes especializados e locais se interseccionam - indicam que a articulação com vistas à definição do futuro nos territórios só pode ser realizada como uma ação integrada entre planejadores (agentes estatais e/ou os pesquisadores acadêmicos) e sociedade impactada.

Planejamento territorial participativo e desafios da sua prática

Adota-se a compreensão de que o futuro desejado territorialmente implica processos de articulação territorial com foco no planejamento, por meio de iniciativas inovadoras e cooperadas. Mas qual o significado do ato de planejar?

Para Guzmán et al. (2001 GUZMÁN, R. S. et al. Planificación del Desarrollo. Bogotá: Fundación Universidad de Bogotá Jorge Tadeu Lozano, 2001.), planejar é atuar no presente com uma visão de futuro, buscando os meios para obter as mudanças desejadas e possíveis. Mesmo não desconsiderando a visão cepalina de planejamento dos anos 1960 e 1970, foi a partir dos anos 1980 que mecanismos gerenciais e participativos de planejamento passaram a fazer parte da agenda das reformas estatais na América Latina e no Brasil, no lugar do planejamento para o desenvolvimento. Esses novos mecanismos, ancorados nas transformações sociais, econômicas, tecnológicas e culturais, trouxeram maior vinculação às expectativas democráticas de redução das desigualdades sociais e de melhoria do desempenho da administração pública. Entre os desafios, um deles é a necessidade de compreender o planejamento de forma multidimensional (MENEZES et al., 2020 MENEZES, E. C. O. et al. Planejamento municipal em debate: trajetória e prioridades no município de Florianópolis. Administração Pública e Gestão Social, v. 12, n. 1, p. 1-22, 2020.).

No contexto atual, conforme Guzmán et al. (2001 GUZMÁN, R. S. et al. Planificación del Desarrollo. Bogotá: Fundación Universidad de Bogotá Jorge Tadeu Lozano, 2001.), o planejamento parece caminhar para um processo que se realiza individual, grupal, empresarial e institucionalmente durante um tempo, denominado horizonte de planejamento, e em um espaço, com determinados métodos, instrumentos e recursos. Esse processo é entendido como uma sucessão de fases e momentos inter-relacionados, não lineares, que devem gerar melhorias, nem sempre alcançadas.

Em relação aos momentos, Becker (1998 BECKER, D. F. Os limites desafiadores do planejamento. REDES, v. 3, n. 2, p. 87-105, dez. 1998., p. 103) afirma que o processo de elaboração/formulação de um projeto de desenvolvimento possui cinco fases: (i) fase de elaborar um entendimento compartilhado sobre a realidade/objeto de planejamento ou pré-plano; (ii) fase de desenhar o futuro desejado; (iii) fase de caracterizar a realidade dada; (iv) fase de contrapor o futuro desejado ao presente dado (o que se quer e o que se tem ou o confronto da qualidade do futuro à quantidade do presente); (v) fase de definir, organizar e estruturar a ação, decidindo prioridades, bem como de formular estratégias de ação e de destinar recursos, abrangendo sua operacionalização.

Para Matus (1996 MATUS, C. Estratégias Políticas. Chimpanzé, Maquiavel e Ghandi. São Paulo: FUNDAP, 1996.), planejar o desenvolvimento territorializado exige negociação entre atores com interesses reais e distintos, mas conciliáveis. Os acordos resultam, então, de negociação. Trata-se de um processo de planejamento participativo que respeita as diferenças, sem anulá-las. Para diferenciar as posturas extremas, na dialética conflito-consenso, Matus (1996 MATUS, C. Estratégias Políticas. Chimpanzé, Maquiavel e Ghandi. São Paulo: FUNDAP, 1996., p. 16) sugere três tipos de estratégias: (i) “jogo de cooperação”, em que prevalecem a persuasão, a negociação de soma positiva, o acordo, a criação de instâncias de prevenção de conflitos e a intenção de abrir espaços de consenso que desobstruam potenciais discórdias; (ii) “jogo de oposição”, em que dominam a negociação de soma zero, a medição de forças, a luta para acumular mais força, o confronto tenso, a dissuasão, o desgaste do adversário e a procura da fraqueza do outro, prevalecendo a lógica aliado-adversário; e (iii) “jogo de confrontação violenta”, no qual o objetivo é anular a força do outro e impor-lhe uma vontade, prevalecendo a lógica agressiva amigo-inimigo, para deixar o outro sem qualquer liberdade de ação e escolha. Essas diferentes posturas têm influência direta na capacidade de territórios, regiões ou municípios construírem projetos políticos de desenvolvimento mediante processos do tipo colaborativo-participativo. Ainda segundo Matus (1996 MATUS, C. Estratégias Políticas. Chimpanzé, Maquiavel e Ghandi. São Paulo: FUNDAP, 1996.), as posturas resultantes do jogo de cooperação parecem ter uma contribuição maior, pois ocorrem num contexto de confiança, via estratégias marcadas pela persuasão, sedução e transparência, com a meta de produzir acordo, utilizando como meios o convencimento/coordenação e tendo como atores “eu” e o “outro” - metaforicamente, um jogo entre amigos.

Assim, planejar implica ter visão, representação mental ou imagem-objetivo do futuro desejado e possível. Ela deve expressar as aspirações fundamentais dos diferentes atores territoriais e do Estado em suas instâncias (municipal, macrorregional, provincial, federal). A visão deve ser alcançável e definir-se como processo de mudança (GUZMÁN et al., 2001 GUZMÁN, R. S. et al. Planificación del Desarrollo. Bogotá: Fundación Universidad de Bogotá Jorge Tadeu Lozano, 2001.). No planejamento territorial, a situação desejada corresponde a tudo o que se pode projetar, porém não é necessariamente realizável. A situação possível se refere àquilo que está dentro do desejado e é realizável, quer dizer, é possível de ser feito.

O Estado tem um papel de destaque nesses processos, embora não seja único. Em uma visão otimista e contemporânea, o planejamento territorial tende, cada vez mais, a ocorrer em processos de coprodução, cocriação e colaboração entre sociedade civil, Estado e mercado, seguindo caminhos complementares e alternativos, na forma de estratégias conjuntas de desenvolvimento (SCHOMMER et al., 2011 SCHOMMER, P. C. et al. Coprodução e inovação social na esfera pública em debate no campo da gestão social. In: SCHOMMER, P.C.; BOULLOSA, R. de F. (Org). Gestão social como caminho para a redefinição da esfera pública. Florianópolis: UDESC, 2011. p. 31-70.; RONCONI; DEBITER; DE MATIA, 2011 RONCONI, L. F. A.; DEBETIR, E.; DE MATTIA, C. Conselhos Gestores de Políticas Públicas: Potenciais Espaços para a Coprodução dos Serviços Públicos. Contabilidade, Gestão e Governança, v. 14, n. 3, p.46-59, set.-dez. 2011.; AGRANOFF; MCGUIRE, 2003 AGRANOFF, R; MCGUIRE, M. Collaborative public management: new strategies for local governments. Washington, D.C.: Georgetown University Press, 2003.). Assim ocorrendo, o planejamento territorial considera o contexto territorial e as necessidades dos cidadãos como diretrizes centrais. Todavia, experiências já analisadas evidenciam que a coordenação dos recursos e, por consequência, das ações de financiamento concentram-se no Estado, que, no caso brasileiro, ainda não apresenta um recorte territorial e federativo favorável à coordenação de ações no nível territorial (MENEZES et al., 2020 MENEZES, E. C. O. et al. Planejamento municipal em debate: trajetória e prioridades no município de Florianópolis. Administração Pública e Gestão Social, v. 12, n. 1, p. 1-22, 2020.). Eis um desafio a ser superado.

Guzmán et al. (2001 GUZMÁN, R. S. et al. Planificación del Desarrollo. Bogotá: Fundación Universidad de Bogotá Jorge Tadeu Lozano, 2001.) vão além ao afirmar que o planejamento define o tipo de sociedade desejada, fixando sua direção, seus caminhos e o modo de implementá-los. Eles ressaltam, no entanto, que é necessário ter poder de decisão e vontade política para executar, pois existe uma relação estreita entre planejamento e liderança: quem planeja dirige e quem dirige planeja. Ou seja, o planejamento precisa manter uma relação intrínseca com a tomada de decisão para que as opções escolhidas se convertam em decisões passíveis de serem implementadas. O planejamento exige uma autoridade capaz de arbitrar sobre os diversos interesses e propósitos de diferentes atores. Nesse sentido, o Estado, em todas as suas instâncias, tem um papel preponderante.

Pode-se concluir que os processos de articulação territorial que objetivam o planejamento, por meio de iniciativas inovadoras e cooperadas, sustentam-se nos seguintes princípios: equidade participativa, cooperação, inclusão, solidariedade, pluralismo, bem comum e autonomia, com respeito às identidades, às necessidades, aos anseios e aos sonhos das pessoas, além da promoção e/ou preservação sustentável da vida em todas as suas dimensões.

O processo de articulação e planejamento territorial na contemporaneidade

É importante recordar que na atualidade há a transição de uma situação de territórios contíguos para territórios transpassados e impactados por diferentes redes internas e externas. A transição da sociedade dos objetos, dos territórios contíguos, para a economia, ou sociedade dos signos, implica transição dos atuais territórios-zona, mais tradicionais e associados à contiguidade espacial de áreas e fronteiras demarcadas e com grupos enraizados, para territórios-rede, combinação articulada de redes, na forma de malha (HAESBAERT, 2011 HAESBAERT, R . O território e a nova des-territorialização do Estado. In: DIAS, L. C.; FERRARI, M. (Orgs.). Territorialidades humanas e redes sociais. Florianópolis: Insular, 2011. p. 17-37.; COVAS; COVAS, 2014 COVAS, A.; COVAS, M. M. A construção social dos territórios-rede: a inteligência territorial da 2ª ruralidade. São Paulo: Editora LiberArs, 2014. ).

O desafio está em compreender as consequências dessa nova realidade no planejamento e gestão dos territórios, regiões ou municípios. Isso exige uma nova metodologia de planejamento, mas não exclui a orientação da ação coletiva no território, exercida de forma democrática e colaborativa. De qualquer forma, uma das demandas é que se contemple a noção de território-rede.

O território-rede (T-R) de uma comunidade inteligente, ou uma ação integrada de base territorial, é administrado por um agente-principal, o ator-rede, que é uma estrutura de ligação tendo em conta a realização do bem comum e a colaboração. O papel de ator-rede, em geral, é assumido por agentes estatais, no entanto, não exclui a possibilidade de outros atores territoriais. Em quaisquer dos casos, para serem bem-sucedidos, necessitam que sejam cumpridas algumas condições fundamentais: (i) delimitação e mapeamento do território inteligente; (ii) metodologia apropriada de intervenção-ação; (iii) geoeconomia dos espaços de cooperação; (iv) agenda política para a comunidade inteligente.

Delimitação e mapeamento do território inteligente

A transformação digital permite que processos de governança territorial se estendam para além das fronteiras habituais de um território e facilita a prática de estratégias de cooperação territorial descentralizada. Entre os fatores que delimitam o território inteligente e a ação integrada de base territorial, é importante destacar que:

  • As geografias do desejo e a pluralidade de interesses determinam a variedade dos recursos e dos atores que atuarão, bem como o conjunto de expectativas;

  • A importância da multiescalaridade e da administração multiníveis determina o stock de recursos e a escala das operações;

  • A qualidade das equipes técnicas e a eficácia das administrações dependem do grau e da qualidade da cooperação empreendida, sem esquecer que só há competência se há continuidade;

  • As parcerias são imprescindíveis e o investimento em capital social não se confunde com simples arranjos de conveniência;

  • Todos os projetos liberam recursos ociosos que se convertem, muitas vezes, em contrarrecursos, sendo necessário o emprego de gestão e mediação prudentes;

  • O paradoxo da vizinhança realmente existe: vizinhos cooperam pouco e mal, sendo necessária uma gestão inteligente e criativa;

  • O processo cognitivo é muito frágil, aprende-se pouco e mal, porque existe o medo de errar e ser censurado politicamente;

  • A governança multinível não pode ser relegada a plano secundário, porque se desperdiça um recurso precioso, convertendo-se em inércias no sistema (COVAS; COVAS, 2015a COVAS, A.; COVAS, M. M. Multiterritorialidades I: temas e problemas de governança e desenvolvimento territoriais. Lisboa: Editora Colibri, 2015a.).

Covas e Covas (2015a COVAS, A.; COVAS, M. M. Multiterritorialidades I: temas e problemas de governança e desenvolvimento territoriais. Lisboa: Editora Colibri, 2015a.) aprofundam a importância da gestão rigorosa de todos esses fatores, pois são eles que fazem variar o perímetro da comunidade inteligente ou ação integrada inteligente. Está em causa uma nova cultura pública do bem comum colaborativo. E o que pode impedir essa nova cultura pública? Entre outros fatores, encontram-se o poder das corporações, o narcisismo dos líderes, as burocracias políticas, a manipulação da comunicação social, a trivialização do espaço público, a desafeição pela política e a cacofonia discursiva.

Quanto ao mapeamento do território inteligente, destaca-se o fato de que hoje, em plena era digital, as plataformas vão além dos limites físicos, sendo cada vez mais difícil dizer o que é interno (insourcing) e externo (outsourcing) a uma comunidade territorial (COVAS; COVAS, 2020 COVAS, M. M.; COVAS, A. Cidades inteligentes e criativas e smartificação dos territórios: apontamentos para reflexão. Desenvolvimento Regional em Debate, v. 10 (ed. esp.), p. 40-59, 2020. ). Isso quer dizer que só cooperativamente é possível resolver um problema que antes podia ser resolvido por simulação, ocultação ou negação, pois a existência de uma barreira tornava factível muitos arranjos de conveniência. Ou seja, o ator-rede está, agora, incumbido de procurar formas cooperativas de governo e novas dinâmicas de cooperação que darão origem a muitas combinações de soma positiva.

Acrescente-se que o valor cognitivo da inteligência territorial será muito valorizado se forem construídos e monitorados pontos de aproximação necessários ao mapeamento do território, por exemplo: (i) os planos de ordenamento territorial; (ii) a delimitação das áreas de paisagem protegida; (iii) a requalificação dos espaços circundantes dos equipamentos e infraestruturas; (iv) as marcas de referência dos produtos, a certificação de serviços e destinos e a acreditação de estruturas coletivas para a promoção dos territórios; (v) a criação de parcerias sólidas com os centros de investigação e de programas de intervenção comunitária, visando ao reconhecimento dos territórios e a uma geografia desejada. Esse mapeamento, com pontos de referência e aproximação, é a fonte de inteligência coletiva que os atores-rede devem transformar em recursos e ativos cognitivos do desenvolvimento territorial.

Finalmente, em territórios sem limites, com mercados abertos e uma base populacional muito mais móvel, é fundamental uma ação política mais atenta à economia circular e à produção de externalidades, pois há o risco real de as externalidades negativas colocarem em causa a relação de boa vizinhança e cooperação com os territórios geograficamente contíguos.

Metodologia apropriada de intervenção-ação

A metodologia do planejamento do território inteligente e a definição do seu ator-rede propõem atenção aos seguintes elementos:

  • Escolha de um (ou mais) signo distintivo territorial: pensemos, por exemplo, numa área de paisagem protegida (APP), um parque natural ou geoparque (COVAS; COVAS, 2020 COVAS, M. M.; COVAS, A. Cidades inteligentes e criativas e smartificação dos territórios: apontamentos para reflexão. Desenvolvimento Regional em Debate, v. 10 (ed. esp.), p. 40-59, 2020. , 2019 COVAS, A.; COVAS, M. M. A Inteligência dos Territórios: os terroirs como espaços de inovação colaborativa. Informe GEPEC, v. 23 (ed. esp.), p. 40-54, 2019.; COVAS; COVAS; DALLABRIDA, 2019 COVAS, A.; COVAS, M. M.; DALLABRIDA, V. R . Os Signos Distintivos Territoriais e a Smartificação do Território: uma abordagem exploratória. Biblio3W - Revista Bibliográfica de Geografía y Ciencias Sociales, v. XXIV, n. 1.268, 2019.; DALLABRIDA, COVAS; COVAS, 2017 DALLABRIDA, V. R.; COVAS, M. M.; COVAS, A. Inovação, desenvolvimento e espaço urbano: uma relação necessária mas não suficiente. Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionais, v. 19, n. 2, p. 360-378, mai.-ago. 2017.);

  • Associação de produtores e/ou clube de amigos da APP: pensemos, por exemplo, nas competências funcionais e institucionais que podem ser identificadas e mobilizadas;

  • Cesta de produtos e serviços da APP: pensemos, por exemplo, nos endemismos, nos alimentos tradicionais, nos percursos de natureza, nos serviços de ecossistema, na gastronomia, na fauna e flora, nas ervas aromáticas e medicinais, nas artes da paisagem;

  • Projeto associativo, comunitário e de voluntariado associado à APP: pensemos, por exemplo, na oferta de institutional food, nos serviços pedagógicos, recreativos e terapêuticos prestados aos mais jovens ou aos mais idosos;

  • Projeto de território inteligente associado à geoeconomia agroflorestal, agrorrecreativa e agropaisagística: pensemos, por exemplo, na silvicultura preventiva dos fogos florestais, no condomínio de aldeias, no parcelamento da propriedade agroflorestal ou na gestão das áreas integradas de gestão paisagística (COVAS; COVAS: 2020 COVAS, M. M.; COVAS, A. Cidades inteligentes e criativas e smartificação dos territórios: apontamentos para reflexão. Desenvolvimento Regional em Debate, v. 10 (ed. esp.), p. 40-59, 2020. ; 2019 COVAS, A.; COVAS, M. M. A Inteligência dos Territórios: os terroirs como espaços de inovação colaborativa. Informe GEPEC, v. 23 (ed. esp.), p. 40-54, 2019.);

  • Projeto de investigação ligado à provisão de serviços ambientais e ecossistêmicos: pensemos, por exemplo, no desenho de uma convenção territorial para a proteção de recursos naturais e a provisão de serviços de ecossistema que são essenciais para o bem-estar e a qualidade de vida, desde a gestão de bacias hidrográficas à irrigação e à provisão de amenidades ribeirinhas;

  • Projeto de economia circular para o território-rede: pensemos, por exemplo, no fato de que na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma. Isso é o que passa a ocorrer, também, com os territórios-rede, pois, doravante, os bens de mérito e reputação são aqueles que revelam taxas de circularidade mais elevadas e os territórios que os acolhem serão, por isso, devidamente premiados;

  • Projeto educativo, científico e cultural da APP: pensemos, por exemplo, na sua articulação internacional com outras APP por meio da participação conjunta em programas e projetos de organizações internacionais relacionados às alterações climáticas, à restauração da biodiversidade e dos ecossistemas.

Geoeconomia dos espaços de cooperação

Quanto a uma geoeconomia dos espaços de cooperação, saliente-se que, numa determinada comunidade intermunicipal ou sub-região, não se pode limitá-la a uma simples candidatura ao investimento em exploração agrícola ou unidade industrial. É necessário relacionar esses investimentos no plano mesoeconômico e regional e perguntar: qual é o valor acrescentado que daí resulta? Qual é o espaço de cooperação empresarial e institucional que é organizado e mobilizado e em que medida um determinado programa de investimentos acrescenta valor à geoeconomia dessa comunidade ou sub-região? (COVAS; COVAS, 2020 COVAS, M. M.; COVAS, A. Cidades inteligentes e criativas e smartificação dos territórios: apontamentos para reflexão. Desenvolvimento Regional em Debate, v. 10 (ed. esp.), p. 40-59, 2020. ; 2019 COVAS, A.; COVAS, M. M. A Inteligência dos Territórios: os terroirs como espaços de inovação colaborativa. Informe GEPEC, v. 23 (ed. esp.), p. 40-54, 2019.; 2015b COVAS, A.; COVAS, M. M. Sociedade do conhecimento, escalas de governo e governança territorial: um ensaio exploratório e prospetivo para a sociedade portuguesa. -DRd Desenvolvimento Regional em Debate , v. 5, n. 2, p. 25-47, jul. -dez. 2015b. ). Ou seja, na aldeia global, já não há o dentro e o fora. A geoeconomia dos espaços de cooperação será desafiada a programar e a desenhar estratégias cooperativas que reduzam as vulnerabilidades próprias e aumentem o campo de possibilidades para gerar capital social entre atores que até então mal se conheciam e pouco interagiam.

Eis alguns exemplos de espaços de cooperação que podem ser objeto de economias de rede e aglomeração, se, para tal, estiver presente a capacidade de organizar as correspondentes plataformas colaborativas: (i) territórios inteligentes (smart city, smart region); (ii) cadeias de valor; (iii) redes e plataformas de ciência e tecnologia; (iv) redes de economia verde e circular; (v) redes de extensão e cooperação empresarial; (vi) redes comunitárias de prevenção e proteção civil; (vii) geoeconomia de sistemas (dos tipos agroflorestais, agroalimentares, agroturísticos ou agropaisagísticos).

Em todos os casos, trata-se de aumentar a sinergia e reduzir a entropia das relações entre espaços, adequando a respectiva intensidade-rede ao ritmo de gestação de novos projetos comuns e colaborativos. O objetivo é, portanto, gerir com intencionalidade uma matriz de fluxos muita rica e não uma coleção de projetos desconectados entre si, assim como as suas propriedades emergentes, quais sejam: (i) a multiescalaridade e a subsidiariedade da governança multinível; (ii) a multifuncionalidade e a capilaridade das economias de rede e aglomeração; (iii) as internalidades e circularidades do ciclo de vida dos produtos; (iv) as externalidades positivas e negativas e a ética dos bens comuns e coletivos; (v) as condicionalidades e as competências institucionais para lidar com elas; (vi) a criatividade e o design do espaço colaborativo e cultural (COVAS; COVAS, 2013a COVAS, A.; COVAS, M. M. A construção social dos territórios-rede da 2ª ruralidade. Dos territórios-zona aos territórios-rede. Construir um território de múltiplas territorialidades. Revista de Geografia e Ordenamento do Território, n. 3, p. 43-66, jun. 2013a.; 2013b COVAS, A.; COVAS, M. M. Em busca de uma racionalidade territorial multiníveis nos processos de governança regional: o exemplo da região do Algarve. Desenvolvimento Regional em Debate , v. 3, n. 2, p. 66-85, 2013b.).

Agenda política da comunidade inteligente

Na contemporaneidade, já se reconhecem as tarefas esperadas: (i) geografias desejadas e comunidades de destino (A); (ii) gramática dos bens comuns e plataformas digitais colaborativas (B); (iii) territórios-rede, ações integradas, comunidades intermunicipais e atores-rede (C). Aqui se entrevê o que é designado como método ABC, as três grandes missões que as pessoas têm à frente hoje. A seguir, encontra-se uma possível agenda da nova economia das comunidades e plataformas inteligentes.

  • Geografia desejada dos territórios e comunidades de destino (A);

  • Princípio ativo das redes, cooperação e delimitação dos bens comuns (A);

  • Plataformas colaborativas e formação do ator-rede (A);

  • Economias de rede e aglomeração das comunidades inteligentes (B);

  • Oferta integrada de bens e serviços complementares da comunidade (B);

  • Integração de externalidades, internalidades e circularidades (B);

  • Inovação de processos e produtos como signos distintivos territoriais (C);

  • Rede de cuidados e serviços, ambulatórios de proximidade (C);

  • Ecossistema digital de base territorial, um meio acolhedor e inovador (C) (COVAS; COVAS, 2020 COVAS, M. M.; COVAS, A. Cidades inteligentes e criativas e smartificação dos territórios: apontamentos para reflexão. Desenvolvimento Regional em Debate, v. 10 (ed. esp.), p. 40-59, 2020. ).

Para gerir adequadamente essa agenda política do território, o ator-rede terá de desempenhar exemplarmente o papel de agente-principal da sua comunidade ou território inteligente, isto é, deverá ser uma liderança efetiva na mobilização dos pares. São requeridas dele as seguintes ações: (i) boa utilização da informação e conhecimento para consolidar uma geografia desejada e uma comunidade de destino; (ii) noção muito criteriosa no que concerne ao bom uso das redes de cooperação horizontais e verticais e respectivas plataformas colaborativas; (iii) sentido crítico muito apurado, não só no que diz respeito à inovação de processos e produtos, mas também à essência dos lugares em matéria de marketing territorial e produtos associados; (iv) abordagem muito aberta em relação ao capital social e, em particular, ao empreendedorismo intergeracional e transgeracional; (v) finalmente, atenção muito compreensiva em relação às novas referências socioculturais da terceira década do século XXI e sua transferência para os territórios-rede, às ações integradas de base territorial e às comunidades intermunicipais e suas comunidades de destino. Em suma, é imprescindível que o ator-rede respeite, escrupulosamente, os pressupostos gerais que informam o funcionamento dos territórios-rede, “o decálogo de grandes princípios” que serviu de inspiração a uma metodologia de trabalho (COVAS; COVAS, 2020 COVAS, M. M.; COVAS, A. Cidades inteligentes e criativas e smartificação dos territórios: apontamentos para reflexão. Desenvolvimento Regional em Debate, v. 10 (ed. esp.), p. 40-59, 2020. ; 2015b COVAS, A.; COVAS, M. M. Sociedade do conhecimento, escalas de governo e governança territorial: um ensaio exploratório e prospetivo para a sociedade portuguesa. -DRd Desenvolvimento Regional em Debate , v. 5, n. 2, p. 25-47, jul. -dez. 2015b. ).5 5 Proposta de metodologia e práticas de investigação-ação aplicadas em Portugal entre 2011-2012, a exemplo do Projeto Querença (Loulé-Algarve, Portugal), articulado por parte dos autores deste artigo. Se esses princípios e condições estruturais forem preenchidos, os atores locais poderão desempenhar com efetividade as suas funções de curadores e animadores do território.

Nessa abordagem são privilegiados, na relação entre o ator e o sistema, as condições sistêmicas e os seus benefícios de contexto. Em síntese, comunidades inteligentes que buscam delimitar um território de ação direta precisam se sustentar em pilares que designem uma futura economia de rede e cooperação entre si, tais como: (i) ação integrada de base territorial ou comunidade intermunicipal que articule processos territoriais; (ii) atores-rede que criem meios inovadores através de plataformas colaborativas; (iii) oferta integrada intermunicipal de bens e serviços comuns e complementares; (iv) aglomerações produtivas e cadeias de valor que formem a base econômica de uma região. Essas capacidades são dominadas pelos atores nos processos de articulação territorial, em todos os territórios? Nem sempre.

Construção de capacidades, desafios e problemáticas no processo de articulação territorial

O desenvolvimento territorial é um processo com características multidimensionais, abrangendo, assim, as dimensões econômica, social, cultural, ambiental, institucional, rural e urbana. Ele incorpora a ideia de uma nova governança e inclui o papel ativo do Estado na construção de diálogos e mudanças no ato de acionar o conjunto das organizações do território, com um eixo no fortalecimento de capacidades.

Os processos de governança territorial oportunizam facilitar a gestão de dinâmicas sociais heterogêneas e complexas, marcadas pelas características de sua gente, suas infraestruturas e seus recursos tecnológicos. Nenhum ator por si só, seja o Estado, seja a sociedade civil ou o setor produtivo-empresarial, pode resolver unilateralmente todos os problemas nos territórios. Assim, mesmo que, por vezes, existam críticas à ação do Estado, elas também podem ser feitas aos demais atores que procuram soluções isoladamente ou somente segundo seus interesses setoriais. Assim, torna-se importante refletir e agir no âmbito dos processos complexos, marcados por um constante movimento de pessoas e decisões, com tensões nos modos de fazer e nos interesses. A proposta é afastar-se das miradas estáticas, simples, indo para as múltiplas relações em que ninguém tem absoluto controle de todos os processos e pensar, ao mesmo tempo, em como as pessoas coordenam, facilitam e dialogam para que os processos ocorram.

O desenvolvimento territorial implica mudar as maneiras de governar e põe o território como um lugar para incorporar inovações de gestão e inovações sociais, no entanto, essa perspectiva contém outra forte necessidade: o fortalecimento e a construção de capacidades, não como complemento, mas como estratégia de um enfoque que contribua para alcançar as transformações desejadas. Para processos políticos que contemplam uma nova maneira de fazer articulações e tomar decisões, é fundamental a construção de capacidades que ordenem a agenda de trabalho, não de qualquer maneira, mas com mudanças metodológicas, que, por sua vez, implicam concepções epistemológicas distintas.

Há elementos que exigem explicação, os quais são a base da reflexão do enfoque pedagógico: a forma de se relacionar dentro dos territórios, de propor diálogos democráticos e lideranças flexíveis, de gerar confiança e cogerar conhecimentos a partir do pensamento coletivo (COSTAMAGNA; SPINELLI; PÉREZ, 2013 COSTAMAGNA, P.; SPINELLI, E.; PÉREZ, R. Elementos estratégicos de un enfoque pedagógico para el Desarrollo Territorial. Buenos Aires: ConectaDEL, 2013.). Esses temas não foram abordados no decorrer das últimas décadas. Isso exige definir marcos metodológicos para gerir dinâmicas territoriais impregnadas de interesses, lógicas, sentimentos e emoções, já que as decisões nos territórios não são somente racionais, nem lineares. A essa ideia, soma-se outro poderoso argumento: a necessidade de valorização da forma como os territórios aprendem.

Nesse marco, o enfoque pedagógico para o desenvolvimento territorial defende uma forma de entender e atuar na construção de processos de aprendizagens para a mudança no território de modo coerente, como um aprendizado social e político (COSTAMAGNA; SPINELLI; PÉREZ, 2013 COSTAMAGNA, P.; SPINELLI, E.; PÉREZ, R. Elementos estratégicos de un enfoque pedagógico para el Desarrollo Territorial. Buenos Aires: ConectaDEL, 2013.). Busca-se, com isso, a densidade de vínculos em um entramado institucional articulado, com projetos conjuntos, trabalhos em rede, com um aumento das oportunidades para todos e todas, em um esquema de novas aprendizagens. Assim, os elementos mais importantes do enfoque pedagógico para o desenvolvimento territorial são: (i) passar da formação tradicional, vinculada ao esquema educativo formal, a uma formação mais inovadora, abrindo-se a distintos espaços do território e ao conceito de práxis; (ii) passar à construção de capacidades, considerando a não neutralidade; (iii) instituir processos de cogeração de conhecimentos e revalorização do contexto.

Mediante o enfoque pedagógico para o desenvolvimento territorial, fortalece-se um caminho de múltiplas interações, como a investigação-ação (KARLEN; LARREA, 2015 KARLEN, J.; LARREA, M. Desarrollo territorial e investigación acción. Innovación a través del diálogo. Bilbao: Orkestra-Publicaciones Universidad Deusto , 2015.), que aporta elementos como a reivindicação do investigador social como ator gerador de mudanças, a interpretação do conflito como situação natural no processo articulação territorial, a orientação para a construção de conhecimento coletivo na ação e a interpretação do diálogo como processo básico do espaço público, visto como espaço de diálogo para o desenvolvimento territorial.

A investigação-ação e o enfoque pedagógico para o desenvolvimento territorial outorgam a possibilidade de trabalhar em problemas de médio e longo prazo - são perspectivas que se conectam, como estratégia de construção de capacidades para o desenvolvimento territorial, com um marco metodológico alternativo ao que ocorre de forma hegemônica nos âmbitos acadêmicos.

O facilitador no processo de articulação territorial

Tomando como referência experiências internacionais, passa-se à valorização de equipes que gestionam a complexidade, emergindo a pessoa do facilitador do desenvolvimento territorial ou a equipe dos atores e facilitadores, entendida como pessoas que atuam no processo, criando condições para que reflitam, decidam e passem à ação.6 6 Com sentido similar ao atribuído ao facilitador, autores da escola francesa de desenvolvimento territorial destacam o papel dos “operadores territoriais”, conforme abordado em: LANDEL, P. A.; PECQUEUR, B. L´operateur territorial, vecteur du changement. In: ASRDLF (Ed.). 48 Colloque Association de Science Régionale de Langue Française, Fort de France, 2011. Essas pessoas, que também são atores e não sujeitos neutros, têm papéis como os de criar espaços de diálogo, construir visões compartilhadas, gerir situações de conflito, conectar teorias e práticas (COSTAMAGNA, 2015 COSTAMAGNA, P . Política y formación en el desarrollo territorial. Aportes al enfoque pedagógico y a la investigación acción con casos de estudio en Argentina, Perú y País Vasco. Bilbao: Orkestra-Publicaciones Universidad Deusto, 2015. ; COSTAMAGNA; LARREA, 2015 COSTAMAGNA, P.; LARREA, M. La Gobernanza Multinivel en los procesos de desarrollo territorial. Elementos para una estrategia de trabajo colaborativo. Desarollo y Territorio, p. 45-53, 2015.). Quando não existem pessoas que atuam dessa maneira, as condições para avançar não são criadas e os processos se debilitam.

Assim, considerando o papel do articulador e do ator no processo de articulação territorial, fica evidente a necessidade de pessoas que tracionem processos emergentes, porque estes não ocorrem espontaneamente, sendo necessário trabalhar de maneira mais ativa, já que são as capacidades fortalecidas ou as novas capacidades que permitem superar as restrições que existem quando se está diante de um novo processo de governança (COSTAMAGNA; LARREA, 2015 COSTAMAGNA, P.; LARREA, M. La Gobernanza Multinivel en los procesos de desarrollo territorial. Elementos para una estrategia de trabajo colaborativo. Desarollo y Territorio, p. 45-53, 2015.).

Na concepção ampla de território aqui assumida, aparecem as instituições, tanto públicas quanto privadas, que se vinculam e se relacionam de distintas maneiras, o que constitui territórios mais ou menos ativos. A experiência internacional sugere que, quando têm comportamento sinérgico e articulado, esses ambientes atuam para potencializar processos de aprendizagem e cooperação. Assim, a articulação territorial assume uma importância fundamental.

Não obstante, nem todos os territórios estão igualmente preparados para enfrentar o desafio de cooperar, já que, em geral, existe uma enorme disparidade territorial, logo, a gestão precisa ser pensada contextualmente. De novo, esses processos não emergem espontaneamente nem de qualquer maneira; faz-se necessário o trabalho de pessoas em espaços compartilhados, daí o valor da política, da liderança e dos facilitadores na construção de capacidades.

Em grandes linhas e sabendo da existência de nuances, é possível indagar: que tipos de sistemas institucionais podem ser encontrados nos territórios?

  • Sistemas institucionais tradicionais, com um significativo grau de isolamento entre atores e organizações, que se relacionam mobilizados por interesses setoriais e ainda não começaram o debate sobre a necessidade de mudar e se modernizar, nem dispõem de pessoas que facilitem diálogos e aprendizagens;

  • Sistemas institucionais em início de processo de mudança, que apresentam um nível médio de articulação entre as partes e já alcançaram alguns avanços quanto à inovação do sistema institucional;

  • Sistemas institucionais com processo de mudança em curso, os quais apresentam bom nível de interação entre atores, um entramado institucional com um bom diálogo, fomentam a criação de oportunidades de cooperação e relações intersetoriais, aproveitando os conhecimentos, as experiências e avanços de cada um dos setores.

Essa descrição pode ser parte de possíveis estratégias de mudança que se apregoam, atendendo, também, ao aspecto de como se aprende para a transformação nos territórios.

Necessidade de seguir aprendendo com a incerteza

Para a nova governança, não existe um só olhar. A multidisciplinariedade do desenvolvimento territorial convida ao encontro de outros e outras, reconhecendo distintas perspectivas e interesses. Não significa ter um único posicionamento, mas entender a necessidade de diálogos, no significado amplo da palavra. Só para tomar como exemplo, a irrupção da pandemia exige uma transição a cenários que ainda não se sabe como terão sua configuração finalizada.

Isso exige reconhecer um novo componente para o enfoque do desenvolvimento territorial: a incerteza, a qual modifica a forma de pensar, planejar e agir. Já não é possível planejar diante da onipresença da incerteza sobre o futuro; de todo modo, é necessário propor processos combinados, nos quais parte das soluções devem ser pensadas coletivamente e a partir dos territórios onde estão os problemas emergentes. O mais adequado será seguir aprendendo. Assim, será imprescindível revisar processos, refletir sobre a complexidade das relações e ir gerando propostas. Em tais situações, não se pode ter soluções predeterminadas, nas quais a trajetória de execução seja interpretada em termos de implementação do planejado de forma tradicional.

Observando experiências internacionais, percebe-se que os territórios que alcançaram os melhores resultados são os que tiveram experiências de diálogo na crise, trabalhadas segundo um viés de encontro entre política, pessoas e ciência. Urge visualizar organizações próximas dos problemas, que tanto busquem soluções de maneira conjunta e cooperativa, sustentadas em métodos democráticos e sistemas participativos, quanto se contraponham, se necessário, aos grupos nos quais a crise não tenha gerado empatia nem exigido a elaboração de lógicas distintas. É necessária uma construção social e política aberta a um enfoque que proponha coconstrução e novos papéis, em um cenário de gestão de conhecimento inovador e inclusivo.

Considerações finais

Pensar e trabalhar em governança para a mudança nos territórios exige marcos metodológicos inovadores que permitam gerir dinâmicas territoriais impregnadas de interesses, lógicas, sentimentos e emoções. Para isso, é preciso construir e fortalecer capacidades, partindo de marcos epistemológicos nos quais o diálogo, em seu amplo sentido, se posicione no centro do processo de articulação e planejamento territorial.

É importante assumir que esses processos não ocorrem de forma espontânea, mas envolvem novos personagens que impulsionam processos emergentes, nos quais os facilitadores ocupam um papel de destaque, criando condições para que os atores territoriais reflitam, decidam e passem à ação, conforme seus papéis: criar espaços de diálogo, construir visões compartilhadas e administrar situações de conflito, conectando teoria e prática.

Além da grandeza do desafio que é planejar por meio de processos de governança, há um adicional: planejar territórios transpassados e impactados por diferentes redes, internas e externas, ou seja, territórios-rede e inteligentes. Entre as novas exigências, o planejamento e o desenvolvimento territorial devem passar a considerar as hiperligações entre a economia digital e a economia criativa, pois o futuro transitará entre tecnologia, arte e território, gerando processos criativos, transformando os territórios e impactando as cadeias de valor.

Os processos de articulação territorial, abarcando Estado e sociedade, aduzem ao uso de práticas pedagógicas capazes de dinamizar processos de aprendizagem coletiva que visem ao desenvolvimento das capacidades mencionadas no texto, sustentadas em métodos democráticos e sistemas participativos que caracterizem mecanismos de planejamento e de gestão sustentáveis, com engajamento e pertencimento de seus cidadãos. O estabelecimento e o fortalecimento de mecanismos institucionalizados de governança nos territórios-rede tornam-se essenciais para a formação de um capital social coletivo que garanta a autogestão e o autocontrole pela sociedade, em combinação com o Estado, para a manutenção de práticas inovadoras e sustentáveis de governança territorial.

Os desafios adicionais que se colocam para a pesquisa são: avaliar como os territórios-rede irão introduzir, instituir e manter dinâmicas aceleradas e ativas de participação em processos de aprendizagem, ante as transformações que estão vivenciando na atualidade. Certamente, quanto mais capacitadas estiverem as coletividades na prática da governança territorial, considerando a sempre necessária e importante participação cidadã e o papel preponderante do Estado, mais qualificadas serão as práticas de articulação para o desenvolvimento territorial.

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  • SOUZA, M. L. “Território” da divergência (e da confusão): em torno das imprecisas fronteiras de um conceito fundamental. In: SAQUET, M. A.; SPÓSITO, E. S. (org.). Territórios e territorialidades: teorias, processos e conflitos. São Paulo: Expressão Popular, 2009. p. 57-62.
  • 1
    Este texto resulta de estudos teóricos realizados no processo de execução do projeto de pesquisa O patrimônio territorial como referência no processo de desenvolvimento de territórios ou regiões, nas versões financiadas pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul (FAPERGS) e a Universidade Federal do Paraná (UFPR), merecendo os agradecimentos dos autores pelo apoio. O agradecimento é extensivo aos membros da Equipe de Pesquisa do referido projeto, pelas inspirações sobre a temática do presente artigo, resultantes dos debates coletivos, contribuindo para qualificá-lo.
  • 2
    Tem-se, aqui, conhecimento tanto das convergências quanto das especificidades de dois conceitos, governança e governamentalidade, sendo este último cunhado por Michel Foucault. Cf. FOUCAULT, M. Governmentality. In: BURCHELL, G.; GORDON, C.; MILLER, P. (Eds.). The Foucault effect: studies in governmentality. Chicago. Illinois: University of Chicago Press, 1991. p. 87-104.
  • 3
    Ver outros enfoques sobre governança territorial em: FARINÓS, J. D. Gobernanza territorial para el desarrollo sostenible: estado de la cuestión y agenda. Boletín de la A.G.E., n. 46, p. 11-32, 2008.
  • 4
    Sobre o tema, ver: TRIPP, D. Pesquisa-ação: uma introdução metodológica. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 31, n. 3, p. 443-466, set./dez. 2005.
  • 5
    Proposta de metodologia e práticas de investigação-ação aplicadas em Portugal entre 2011-2012, a exemplo do Projeto Querença (Loulé-Algarve, Portugal), articulado por parte dos autores deste artigo.
  • 6
    Com sentido similar ao atribuído ao facilitador, autores da escola francesa de desenvolvimento territorial destacam o papel dos “operadores territoriais”, conforme abordado em: LANDEL, P. A.; PECQUEUR, B. L´operateur territorial, vecteur du changement. In: ASRDLF (Ed.). 48 Colloque Association de Science Régionale de Langue Française, Fort de France, 2011.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    05 Ago 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    17 Set 2021
  • Aceito
    17 Mar 2022
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