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Circulação de ideias e suas apropriações: uma reflexão sobre a história do urbanismo na América Latina em diálogo com perspectivas das histórias conectadas e teorias decoloniais

Circulation of ideas and its appropriations: a reflection on the history of urbanism in Latin America in dialogues with connected histories perspective and decolonial theories

Resumo

Este artigo discute teorias e abordagens metodológicas em diálogo com outros campos disciplinares para refletir sobre a história do pensamento urbanístico na América Latina, tendo em vista o trânsito de ideias e as apropriações locais de conceitos urbanísticos. Tratar do urbanismo na América Latina impõe uma reflexão metodológica sobre como abordar uma vasta região, uma diversidade de situações, de culturas urbanas e de práticas urbanísticas, mas em que, simultaneamente, é possível identificar problemáticas comuns em um mesmo recorte temporal. Neste sentido, o trabalho ora apresentado se organiza em três eixos: o primeiro põe em discussão as formas de recorte e os modos de análise propostos pela história transnacional ou conectada; o segundo evidencia uma problemática configurada pelos estudos pós-coloniais e teorizada como decolonial a partir da particularidade da América Latina que pode lançar luz à variação dos modelos urbanísticos que perpassam as experiências urbanísticas nela realizadas; e, por fim, o terceiro eixo examina a proposta do estudo das práticas culturais, e suas categorias de análise, para pensar os mecanismos de apropriação.

Palavras-chave:
História do Urbanismo na América Latina; Histórias Conectadas; Teorias Decoloniais; Circulação de Ideias; Práticas Culturais; Transculturação

Abstract

This paper intends to discuss the history of urbanistic thought in Latin America through dialogue with theories and methodological approaches of different disciplinary fields. Dealing with urban planning in Latin America requires a methodological reflection on how to approach a vast area, with a diversity of urban situations and cultures as well a diversity of urban practices. Although, at the same time, common problems can be identified in the same time cut. Thus, this paper is organized in three axes: the first one discusses the frames and focus of analysis proposed by the transnational history or connected history; the second one highlights a problematic set up by postcolonial studies and terrorized as decolonial based on the particularity of Latin America that can iluminate the variation of urban models that permeate the urban experiences carried out in it; and finally, the third examines the proposal of the study of cultural practices, and its categories of analysis, to think about the mechanisms of appropriation.

Keywords:
History of Urbanism in Latin America; Connected Histories; Decolonial Theories; Circulation of Ideas; Cultural Practices; Transculturation

Introdução

A perspectiva da circulação das ideias como lugar de análise para a construção da história da arquitetura e do urbanismo vem pavimentando um caminho profícuo ao tratar de questões sobre modelos e referências urbanísticos, a relação entre os modelos e as práticas profissionais, assim como sobre os trânsitos nacionais e internacionais de ideias sobre a cidade e o urbanismo. Refletir sobre a história do pensamento urbanístico na América Latina nos remete simultaneamente a esse conjunto de reflexões já produzidas a respeito dos trânsitos de ideias e das novas problemáticas e enfoques, sobretudo se quisermos pensar um conjunto que ultrapasse os limites das histórias nacionais.

A presença de modelos urbanísticos, de técnicas de planejamento, de conceitos ou ideias em situações e lugares distintos de sua formulação nos leva a questionar a circulação desses ideários e sua recepção em contextos variados. É comum encontrarmos na bibliografia uma perspectiva em que os modelos, ou as ideias originais, surgem em um momento - ou por intermédio de um personagem - singular e sua realização se configuraria em manifestações desviantes ou deturpadas. Dar ênfase às trocas intelectuais e à circulação de ideias seria um caminho alternativo em que se busca, antes, a compreensão da construção destas últimas como resultado dos contextos em que estão inseridas e de sua apropriação em tempo e espaços distintos, afastando-se de uma abordagem em que há uma hierarquia valorativa entre os momentos, a fim de salientar as apropriações inventivas dos agentes sociais.

Este artigo discute teorias e abordagens metodológicas em diálogo com outros campos disciplinares com o propósito de contribuir nos estudos sobre a história do pensamento urbanístico na América Latina, tendo em vista o trânsito de ideias e as apropriações locais de conceitos urbanísticos. Tratar do urbanismo na América Latina impõe uma reflexão metodológica sobre como abordar uma vasta região, uma diversidade de situações, de culturas urbanas, de práticas urbanísticas, mas em que se mostra possível identificar problemáticas comuns em um mesmo recorte temporal. Destaca-se que este trabalho se organiza em três eixos, a fim de (i) discutir as formas de recorte e os modos de análise propostos pela história transnacional ou conectada; (ii) evidenciar uma problemática configurada pelos estudos pós-coloniais e teorizado como decolonial em decorrência da particularidade da América Latina para lançar luz à variação dos modelos urbanísticos; e (iii) examinar a proposta do estudo das práticas culturais para refletir sobre os mecanismos das apropriações, com ênfase nas ações inventivas dos agentes sociais.

1. A perspectiva das histórias conectadas como mudança de foco e escala de análise

A ênfase nas trocas intelectuais e na circulação de ideias, com o enfoque voltado a redes profissionais, encontros, contatos, deslocamentos, agentes que transitam por espaços variados, como a figura do estrangeiro, do migrante, do viajante, do expert, compõe uma gama de elementos cuja visibilidade é resultante de um reenquadramento analítico que ganhou corpo no debate entre historiadores. Em 2001, o editorial da reconhecida revista francesa Annales. Histoire, Sciences Sociales, em um volume intitulado Une histoire à l’èchelle globale (ANNALES, 2001ANNALES. Une histoire à l’échelle globale. Annales. Histoire, Sciences Sociales. 56ᵉ année, n. 1, p. 3-4, 2001.), expressou a intenção de construir novos recortes espaçotemporais, ao direcionar a atenção para a história das conexões e das circulações, e ao ressaltar que se trata não apenas de uma mudança de escala, mas de uma variação focal.

No mesmo volume da revista, Roger Chartier, no artigo La Conscience de la globalité, analisa as propostas para a história conectada com base em uma dupla trama de questões. Por um lado, aborda-se a recusa do enquadramento do Estado-nação como entidade social e cultural como forma de delimitação espacial e temporal; propõe-se, antes, uma “unidade histórica em uma rede de relações e trocas que as constituem, independentemente da soberania estatal”1 1 Todos os textos em língua estrangeira foram traduzidos pela autora deste artigo. (CHARTIER, 2001CHARTIER, R. La Conscience de la globalité (commentaire). Annales. Histoire, Sciences Sociales . 56ᵉ année, n. 1, p. 119-123, 2001., p. 120), com destaque para temas como os contatos, os encontros, as aculturações e as mestiçagens. Por outro lado, salienta-se a reflexão sobre a variação de escalas na história, com a recusa de uma superioridade epistemológica de tal ou qual escala e a proposição de um acordo com relação ao referencial de escala em função daquilo que o historiador quer observar. Desse modo, segundo Chartier, “o que importa é a eleição de um quadro de estudos capaz de dar visibilidade às histórias conectadas que relacionam as populações, as culturas, as economias e os poderes” (CHARTIER, 2001CHARTIER, R. La Conscience de la globalité (commentaire). Annales. Histoire, Sciences Sociales . 56ᵉ année, n. 1, p. 119-123, 2001., p. 121). O autor atenta para a necessidade de uma reflexão acerca das categorias de análise para a história conectada que responda a questões sobre a “relação entre apropriação e aculturação, entre reempregos inventivos e extrações culturais” (id., p. 123), ou ainda para os mecanismos de interação e negociação que operam nos contatos culturais. E lança uma pergunta: “Como situar a mestiçagem cultural entre colonização e globalização dos imaginários?” (id., ibid.).

Serge Gruzinski (2001GRUZINSKI, S. Les Mondes mêlés de la monarchie catholique et autres “connected histories”. Annales. Histoire, Sciences Sociales. 56ᵉ année, n. 1, p. 85-117, 2001.) contribui para o mesmo número da revista com o artigo “Les Mondes mêlés de la Monarquie Catholique et autres ‘connected histories’”, em que discute a perspectiva da história conectada e apresenta categorias de análise específicas pautadas em um recorte e um objeto de pesquisa precisos: o quadro configurado pela monarquia católica do século XVI, que associava reinos europeus, regiões e outros continentes. O autor problematiza a rigidez dos quadros geográficos e cronológicos das tradições historiográficas e identifica aspectos etnocêntricos escondidos nesses procedimentos. Para Gruzinksi (2001GRUZINSKI, S. Les Mondes mêlés de la monarchie catholique et autres “connected histories”. Annales. Histoire, Sciences Sociales. 56ᵉ année, n. 1, p. 85-117, 2001., p. 86), “[...] não sem razão os estudos culturais e os estudos pós-coloniais colocaram em questão uma história que era a projeção do Ocidente, de suas categorias, de suas ambições, visão dos seus fantasmas sobre o resto do mundo”.

O que esse autor propõe é uma visada que restabeleça as conexões ao tratar da problemática do contato entre civilizações e culturas, com o objetivo de evitar a mobilização de “categorias ocidentais ao serviço do etnocentrismo” (2001, p. 86). Desse modo, apresenta-se a história conectada como um caminho alternativo à história global e à história comparada.

Ao elencar a monarquia católica do século XVI como um “campo de observação”, Gruzinksi depara com o processo por ele chamado de “dilatação dos espaços europeus”, que foi seguido pela difusão mundial dos saberes e dos imaginários europeus, mas uma análise complexificada evidencia que esse processo “é acompanhado constantemente da descoberta simultânea de outra sociedade e de outros saberes” (GRUZINSKI, 2001GRUZINSKI, S. Les Mondes mêlés de la monarchie catholique et autres “connected histories”. Annales. Histoire, Sciences Sociales. 56ᵉ année, n. 1, p. 85-117, 2001., p. 94). Assim, ao variar o foco de pesquisa, salientam-se a constituição de “mundos mesclados” e a conformação de “sociedades mestiças”, em que as noções de “local” e “global” se imbricam e se redefinem continuamente. Afirma Gruzinski (2001GRUZINSKI, S. Les Mondes mêlés de la monarchie catholique et autres “connected histories”. Annales. Histoire, Sciences Sociales. 56ᵉ année, n. 1, p. 85-117, 2001., p. 115-116):

Por todos os lugares vigoram os sistemas compostos de dominação e de organização do trabalho, dos conjuntos do saber e de técnicas de origens múltiplas, de representações híbridas de si, do espaço e do tempo, das misturas de crenças. Mas, como todas essas misturas se desenrolam simultaneamente no interior do movimento da grande monarquia, elas nos incitam a refletir sobre a maneira com que o político no senso ampliado, isto é, abordado dentro dessa perspectiva global, age sobre as manifestações locais de mestiçagem.

Esse historiador vai, assim, apresentando questões que vêm à luz pela variação de escala e de visada, em uma busca simultânea de outras categorias para análise.

O debate sobre uma perspectiva mais ampla da história, que ao mesmo tempo não reproduzisse antigos esquemas e categorias, teve espaço e difusão pela proeminente revista Annales, sem ter se restringido a ela. O historiador estadunidense Thomas Bender, ao organizar o livro Rethinking American history in a global age, publicado em 2002, compila uma série de artigos que apontam limites e possibilidades para a história estadunidense e propõe seu “reenquadramento”, de modo que a centralidade da nação seja repensada, e a exploração de novos focos e escalas obscurecidos pela ênfase e centralidade da nação. Ele argumenta que “a nação se tornou o lugar de diferenciação e antagonismos em um sistema de nações” (BENDER, 2002BENDER, T. Historians, the nation and the plenitude of narratives. In: BENDER, T. (org.). Rethinking American history in a global age. Berkeley: University of California Press, 2002., p. 7). A partir de sua problematização da nação como unidade natural para a análise histórica, busca, de outro modo, “solidariedades e conexões alternativas”. Tal perspectiva acompanha uma ampliação da espacialização e demanda um ajuste de recorte e foco. Segundo Bender (2002BENDER, T. Historians, the nation and the plenitude of narratives. In: BENDER, T. (org.). Rethinking American history in a global age. Berkeley: University of California Press, 2002., p. 8):

Em vez de deslocar nosso foco da nação para qualquer outra unidade social/territorial, poderíamos imaginar um espectro de escalas sociais, tanto maior ou menor que a nação e sem a excluir. […] deveríamos pensar como mundos sociais interagindo uns com os outros e, assim, promovendo múltiplos contextos de vida, instituições e ideias.

Bender advoga, portanto, um enquadramento analítico para a história americana, colocando em evidência os aspectos relacionais, ou as conexões, chamadas ora de história conectada, ora de transnacional.

Ao discutir as abordagens da história comparada e conectada para a América Latina, Maria Ligia Prado (2005PRADO, M. L. C. Repensando a história comparada da América Latina. Revista de História, São Paulo, n. 153, p. 11-33, 2005.) aponta suas implicações e limites e confia na possibilidade de uma história comparada e conectada. A história comparada foi alvo de críticas por parte de historiadores que viam nesse procedimento um risco de ressurgimento de visões eurocêntricas, mesmo que com a intenção de alargar os horizontes pela comparação de situações distintas. A centralidade da nação, por vezes, salientou um campo de antagonismos e diferenciações entre elas. Em algumas ocasiões, estudos comparativos procederam de modo a construir um modelo “ideal” e a avaliar os “desvios em graus variados ao modelo edificado” (PRADO, 2005PRADO, M. L. C. Repensando a história comparada da América Latina. Revista de História, São Paulo, n. 153, p. 11-33, 2005., p. 15), o que refletiria uma determinação de um polo em relação aos outros.

A análise da autora sobre o trabalho e a proposta de história conectada de Sanjay Subrahmanyam - historiador que, com Serge Gruzinski, organizou o seminário Penser le monde, que deu origem à edição temática nos Annales - evidencia a escolha pela conexão com vistas a evitar o estabelecimento de polos em que haja um determinante e outro subordinado. O deslocamento para o foco nas conexões modifica a escala de análise, mas não exclui a nação; como já mencionado por Bender, trata-se antes do modo segundo o qual se realiza a comparação. Recorrendo à formulação de Marc Bloch,2 2 BLOCH, M. Pour une Histoire Comparée des societés européennes. In: BLOCH, M. Mélanges historiques. Paris: SEVPEN, 1963. v. 1. Prado (2005PRADO, M. L. C. Repensando a história comparada da América Latina. Revista de História, São Paulo, n. 153, p. 11-33, 2005., p. 17-18) delimita os procedimentos para a história comparada.

Para Bloch, deviam-se escolher dois ou mais fenômenos que parecessem, à primeira vista, apresentar certas analogias entre eles, em um ou vários meios sociais diferentes; em seguida, descrever as curvas de sua evolução, constatar as semelhanças e, na medida do possível, explicá-las à luz da aproximação entre uns e outros. De preferência, propunha estudar paralelamente sociedades vizinhas e contemporâneas, sociedades sincrônicas, próximas umas das outras no espaço.

Maria Ligia Prado pauta-se especificamente nos estudos sobre a América Latina, em que é possível elencar questões que perpassam os variados países de maneira sincrônica - “Colonização Ibérica, Independência Política, formação dos Estados Nacionais, proeminência inglesa e depois norte-americana” -, e confia em que um modo preciso de comparação, ao aproximar casos variados, pode revelar semelhanças e diferenças dentro de um mesmo processo. Simultaneamente, ela reconhece na história conectada uma possibilidade de novos recortes, em que se buscariam objetos capazes de evidenciar os pontos de contato entre os casos variados, e, portanto, novas categorias, como o conceito de mestiçagem, a figura do mediador entre grupos e sociedades ou o conceito de transferência cultural.

Particularmente na história do urbanismo, a difusão de ideias, modelos e práticas urbanísticas tem sido um tema relevante. Entender como e os caminhos pelos quais algumas ideias se difundiram é uma problemática constante entre trabalhos que se dedicam a compreender as ideias e práticas comuns em diferentes países. Stephen Ward (2000WARD, S. V. Re-examining the international diffusion of planning. In: FREESTONE, R. (org.). Urban planning in a changing world: the twentieth century experience. London: E&FN Spon, 2000.), ao reexaminar os estudos sobre as difusões internacionais do urbanismo, retoma os trabalhos seminais de Anthony Sutcliffe (1981SUTCLIFFE, A. Towards the planned city, Germany, Britain, the United States and France, 1780-1914. Oxford: Basil Blackwell, 1981.) e Peter Hall (1988HALL, P. Cities of tomorrow: An intellectual history of urban planning and design in the twentieth century. Cambridge, MA: Basil Blackwell 1988. ) e soma a eles uma amplitude de trabalhos que ao longo dos anos desenvolveram a problemática em foco, identificando até mesmo modos comuns de interpretação, o que possibilitou a criação de uma tipologia de difusão em graus variados entre “empréstimos” e “imposições”. Nota-se, contudo, que essa tipologia, ainda que bastante esclarecedora, é construída fortemente - mas não exclusivamente - ancorando-se nas experiências inglesas e suas antigas colônias, em que o centro político e econômico é o difusor de ideais e práticas e por vezes reforça análises unidirecionais.

A despeito de variados estudos de planos urbanos de cidades latino-americanas terem sido realizados ao longo do debate sobre a circulação das ideias, com ênfase nos atores e suas práticas, desde os anos 2000 alguns estudos vêm apontando a lacuna historiográfica a respeito de uma perspectiva de conjunto da América Latina e assinalaram problemáticas a serem tratadas por novos estudos. Arturo Almandoz (2007ALMANDOZ, A. Modernización urbanística em América Latina. Luminarias extranjeras y câmbios disciplinares, 1900-1960. Revista Iberoamericana, VII, 27, p. 59-78, 2007.; 2011ALMANDOZ, A. Capitais latino-americanas e urbanistas estrangeiros (1920-1950). In: LANNA, A. et al. (org.). São Paulo, os estrangeiros e a construção das cidades. São Paulo: Alameda, 2011.) propõe uma discussão sobre a modernização urbanística na América Latina baseada em uma perspectiva “panorâmica e comparativa”, em que busca relacionar as transformações na cidade e suas disciplinas com os imaginários e outras formas de representação por intermédio das “formações discursivas” elaboradas nos planos urbanos formulados para as cidades latino-americanas pela atuação de diversos urbanistas estrangeiros.

Pesquisas reunidas no livro Urbanismo na América do Sul, organizado por Marco Aurélio Gomes (2009GOMES, M. A. A. F. Experiências sul-americanas: uma lacuna na historiografia brasileira sobre cidade e o urbanismo. In: GOMES, M. A. A. F. (org.). Urbanismo na América do Sul: circulação de ideias e constituição do campo, 1920-1960. Salvador: EDUFBA, 2009.) e publicado pela EDUFBA, sugerem como método a comparação em estreito diálogo com a história comparada, lançam uma advertência sobre o risco etnocêntrico presente na bibliografia e ainda vislumbram abordagens não restritas aos limites nacionais. Gomes (2009GOMES, M. A. A. F. Experiências sul-americanas: uma lacuna na historiografia brasileira sobre cidade e o urbanismo. In: GOMES, M. A. A. F. (org.). Urbanismo na América do Sul: circulação de ideias e constituição do campo, 1920-1960. Salvador: EDUFBA, 2009.) dirige o olhar para a América do Sul com o intuito de, através das redes profissionais, aproximar, pela comparação, experiências nacionais distintas e explorar suas singularidades. Ricardo Medrano (2009MEDRANO, R. H. Notas sobre a América do Sul na historiografia urbana brasileira. In: GOMES, M. A. A. F. (org.). Urbanismo na América do Sul: circulação de ideias e constituição do campo, 1920-1960 . Salvador: EDUFBA , 2009.) visa ao urbanismo e à história da cidade na América Latina com a proposta de promover uma aproximação da história comparada, atento, simultaneamente, ao tratamento das questões supranacionais com o aporte das construções nacionais e de uma visão do continente em que sobressai um estranhamento entre o Brasil e os países de ocupação espanhola.

Há ainda inúmeros trabalhos que pretendem ampliar as possibilidades de discussão sobre a história da arquitetura e do urbanismo por meio das trocas culturais e da circulação de ideias, com destaque para novos focos de análise, como as redes profissionais e a figura do estrangeiro.3 3 Cf. LANNA, A. et al. (org.). São Paulo, os estrangeiros e a construção das cidades. São Paulo: Alameda, 2011. Esse livro reúne artigos que compõem projeto de pesquisa mais amplo sobre a atuação dos estrangeiros na cidade de São Paulo. Este, segundo Lira (2011LIRA, J. T. C. Arquitetos estrangeiros, a arquitetura no estrangeiro e a história. In: LANNA, A. et al. São Paulo, os estrangeiros e a construção das cidades . São Paulo: Alameda , 2011.), tornou-se decisivo para analisar as trocas internacionais, uma vez que, com seu deslocamento e com as “redes intricadas de mobilidade, disputas, inserções, resistências ou contaminações” (LIRA, 2011LIRA, J. T. C. Arquitetos estrangeiros, a arquitetura no estrangeiro e a história. In: LANNA, A. et al. São Paulo, os estrangeiros e a construção das cidades . São Paulo: Alameda , 2011., p. 355), pode-se lançar luz a novas interpretações, sobretudo da arquitetura e do urbanismo modernos, rejeitando as “narrativas habituais da difusão dos padrões modernos nas ditas periferias do modernismo” (id., p. 365). Poderíamos dizer aqui que o estrangeiro, pensado como o viajante, o passeur ou o expert, assumiria o papel de mediador cultural.

Analisaram-se aqui as possibilidades da perspectiva da história conectada, sem necessariamente excluir procedimentos de comparação, com o propósito de evidenciar focos, como a circulação e deslocamentos, capazes de produzir novos quadros geográficos e cronológicos. A própria América Latina pode ser um reenquadramento, se voltarmos o olhar para as redes profissionais que se estabelecem entre os diversos países, para as viagens de atores-chave, migrações, congressos e eventos que articulem profissionais, para revistas que circulam e difundem discursos e perspectivas, ou seja, para deslocamentos - de conceitos e atores - que revelem conexões mais amplas entre as experiências latino-americanas.

2. Conexões entre “o polo” de modernidade e “o outro”

Na perspectiva de Arturo Almandoz (2007ALMANDOZ, A. Modernización urbanística em América Latina. Luminarias extranjeras y câmbios disciplinares, 1900-1960. Revista Iberoamericana, VII, 27, p. 59-78, 2007.), o segundo pós-guerra teria sido um momento de inflexão na história do urbanismo na América Latina e na própria constituição do campo disciplinar. Sua análise é de que se trata de um momento de “modernização urbanística” na América Latina, em que o urbanismo de cunho “europeizante academicista”, predominante até os anos 1930, ligado às Escolas de Belas Artes, perde relevância ante a vertente de “planificação tecnicista de corte norte-americano” (Almandoz, 2007ALMANDOZ, A. Modernización urbanística em América Latina. Luminarias extranjeras y câmbios disciplinares, 1900-1960. Revista Iberoamericana, VII, 27, p. 59-78, 2007., p. 59). Para o autor, a essa inflexão corresponde um deslocamento do “polo de modernidade” da Europa aos Estados Unidos, país que emerge como potência na nova configuração geopolítica. No campo do urbanismo, novos objetos - a região e o território -, novos instrumentos - planos diretores e o zonning - e uma nova agenda - em estreita relação com as ciências sociais - emergem em diversos planos e projetos urbanos nos países latino-americanos.

A presença norte-americana no campo do urbanismo na América Latina é sentida desde os anos 1920 e 1930, tendo como momento decisivo a crise de 1929, como visto nos estudos coordenados por Marco Aurélio Gomes (2009GOMES, M. A. A. F. Experiências sul-americanas: uma lacuna na historiografia brasileira sobre cidade e o urbanismo. In: GOMES, M. A. A. F. (org.). Urbanismo na América do Sul: circulação de ideias e constituição do campo, 1920-1960. Salvador: EDUFBA, 2009.) e Maria Cristina Leme (1999LEME, M. C. S. (org.). Urbanismo no Brasil: 1895-1965. São Paulo: Studio Nobel: FAU-USP: Fupam, 1999.; 2011LEME, M. C. S. A presença norte-americana e a transformação de São Paulo no pós-guerra. In: LANNA, A. et al. (org.). São Paulo, os estrangeiros e a construção das cidades . São Paulo: Alameda , 2011.) que têm esse período como recorte. Entretanto, é efetivamente no pós-guerra que se intensifica o aporte do urbanismo norte-americano com a regularização dos contatos, a contratação dos experts (a partir desse momento, cada vez mais americanos que franceses) e a criação de instituições internacionais ou interamericanas já dentro de um rearranjo geopolítico do pós-guerra em que a Europa perde sua hegemonia.

Vista de outro ângulo, a análise das experiências de “modernização urbanística” na América Latina nos faz questionar sua relação com o “polo de modernidade”, considerado, a priori, algo externo ou, muitas vezes, um modelo a ser perseguido. Revela-se, assim, uma diferença entre o polo e aquilo que está fora dele - mais ainda, uma assimetria valorativa entre as partes, interpretada por alguns autores como produção do polo.

Edward SaidSAID, E. Orientalismo: o Oriente como invenção do Ocidente. São Paulo: Cia. das Letras, [1978], 1990., em Orientalismo ([1978] 1990), trabalha com o binômio Ocidente/Oriente, com a proposição de uma análise de como, a partir da Europa - especificamente dos impérios britânico e francês - e, posteriormente, norte-americano -, criaram-se uma representação e um discurso sobre o Oriente que ele denominou orientalismo. Said ([1978] 1990SAID, E. Orientalismo: o Oriente como invenção do Ocidente. São Paulo: Cia. das Letras, [1978], 1990., p. 15) afirma:

Orientalismo pode ser discutido e analisado como a instituição organiza para negociar com o Oriente - negociar com ele fazendo declarações a seu respeito, autorizando opiniões sobre ele, descrevendo-o, colonizando-o, governando-o: em resumo, o orientalismo como um estilo ocidental para dominar, reestruturar e ter autoridade sobre o Oriente.

Com base na teoria literária e tendo como objeto a literatura e textos político-filosóficos, Said ([1978] 1990SAID, E. Orientalismo: o Oriente como invenção do Ocidente. São Paulo: Cia. das Letras, [1978], 1990., p. 17) propõe desvelar uma dimensão política subjacente à cultura:

[...] as ideias, cultura e histórias não podem ser estudadas sem que a sua força, ou mais precisamente a sua configuração de poder, seja também estudada. [...] A relação entre Ocidente e Oriente é uma relação de poder, de dominação, de graus variados de uma complexa hegemonia.

Rechaçando uma análise mecânica entre cultura e política, em que as obras artísticas seriam determinadas por “grandes fatos” históricos, ou a superestrutura subordinada à estrutura, Said dialoga com as noções de “hegemonia” de Antonio Gramsci, de “discurso” de Michel Foucault e de “estrutura de sentimentos” de Raymond Williams.

O autor constrói, então, como “dispositivos metodológicos”, as noções de “localização estratégica” e “formação estratégica” (SAID, [1978] 1990SAID, E. Orientalismo: o Oriente como invenção do Ocidente. São Paulo: Cia. das Letras, [1978], 1990., p. 31) para analisar os textos de modo a identificar uma “superioridade posicional flexível” em que se afirma, de maneiras variadas, uma “superioridade” europeia sobre o “atraso” oriental. Assim, Said (id., p. 19) revela que “[...] o principal componente da cultura europeia é precisamente o que torna essa cultura hegemônica tanto na Europa quanto fora dela: a ideia da identidade europeia como sendo superior em comparação com todos os povos e culturas não europeus”.

Ao trabalhar a questão do eurocentrismo ou do etnocentrismo, Said aborda a relação entre cultura e imperialismo político. No livro Orientalismo ([1978] 1990), a ênfase recai na empresa cultural britânica e francesa; a partir da Segunda Guerra Mundial, com a emergência da hegemonia dos Estados Unidos; segundo o autor, o Oriente seria abordado da mesma forma que fizeram Inglaterra e França.

Um dos rendimentos teóricos desse livro clássico é justamente o desvelamento do etnocentrismo presente nas representações e no discurso fundamentado no “polo” ou no “centro” sobre o “outro”. Contudo, a circulação não se concretiza livre de processos de negociação, de tensões, de exclusões que ocorrem dentro de uma configuração de poder nos contatos culturais.

Em Cultura e Imperialismo ([1993] 1995), Said amplia sua análise, ao tratar das relações do “Ocidente metropolitano e seus territórios ultramarinos” (id., ibid., p.11). Nele, o autor retoma a perspectiva de análise de Orientalismo ([1978] 1990) sobre os discursos construídos pelo “Ocidente metropolitano” a respeito dos territórios de domínio imperial, somando uma análise direcionada ao outro polo em questão, e de suas experiências de resistência. Said ([1993] 1995SAID, E. Cultura e imperialismo. São Paulo: Cia. das Letras , [1993] 1995., p. 13) afirma:

A cultura, neste sentido, é uma fonte de identidade, e aliás bastante combativa, como veremos em recentes “retornos” à cultura e à tradição. Esses “retornos” apresentam códigos rigorosos de conduta intelectual e moral, que se opõem à permissividade associada a filosofias relativamente liberais como o multiculturalismo e o hibridismo. No antigo mundo colonial, esses “retornos” geraram vários fundamentalismos religiosos e nacionalistas.

Ao analisar os processos de resistência cultural do “antigo mundo colonial” em um momento de movimentos de descolonização, sobretudo de países norte-africanos e asiáticos, Said salienta a afirmação de identidades nacionais no intuito de autodeterminação. Mas assinala igualmente o fortalecimento de fundamentalismos religiosos e nacionalistas. Nessa perspectiva, o processo de globalização desencadeado pelo imperialismo moderno gerava “experiências sobrepostas” e “interdependências culturais” (SAID, [1993] 1995SAID, E. Cultura e imperialismo. São Paulo: Cia. das Letras , [1993] 1995., p. 22), de maneira que as culturas se imbricavam mutuamente. É por esse motivo que ele propõe outro ângulo para se pensar a questão (id., p. 23):

[...] O fato de agora serem de tal interesse, a ponto de levar a elaboração, por exemplo, deste e de outros livros, é consequência menos de uma espécie de espírito vingativo retrospectivo do que uma maior necessidade de elos e conexões. Uma das realizações do imperialismo foi aproximar o mundo, e embora nesse processo a separação entre europeus e nativos tenha sido insidiosa e fundamentalmente injusta, a maioria de nós deveria agora considerar a experiência histórica do império como algo partilhado em comum. A tarefa, portanto, é descrevê-la enquanto relacionada com os indianos e britânicos, os argelinos e franceses, os ocidentais e africanos, asiáticos, latino-americanos e australianos.

Nota-se, assim, um caminho sugestivo para pesquisas pautadas nas conexões ou nos contatos entre povos que problematizam os processos de dominação e etnocentrismo, tendo como objeto a cultura ou práticas culturais. Assim, as interpretações de Said - apesar de não ser o único a fazê-lo - instigaram os chamados estudos pós-coloniais, que ganharam maior difusão nos anos 1980 nos Estados Unidos e na Inglaterra com nomes como Homi Bhabha, Stuart Hall e Paul Gilroy, assim como os estudos subalternos, notadamente na Índia, com Dipesh Chakrabarty, Gayatri Spivak e Ranajit Guha (este nascido em Bangladesh), entre outros. Com relação à América Latina, houve, nos anos 1990, a conformação do Grupo Latino-americano de Estudos Subalternos, constituído por nomes como o do peruano Aníbal Quijano, do colombiano Santiago Castro-Gómez e do argentino Walter Mignolo. Após a dissolução do grupo por certas rupturas interpretativas e buscando novas bases epistemológicas, eles iriam contribuir para a construção do Grupo Modernidade/Colonialidade durante os anos 2000 (BALLESTRIN, 2013BALLESTRIN, L. América Latina e o giro decolonial. Revista Brasileira de Ciência Política, Brasília, DF, n. 11, p. 89-117, 2013.).

O antropólogo colombiano Arturo Escobar, no artigo “Mundos y conocimientos de otro modo” (2003ESCOBAR, A. Mundos y conocimientos de otro modo. El programa de investigación de modernidad/colonialidad latino-americano. Tabula Rasa, Bogotá, n. 1, p. 51-86, 2003., p. 60), anuncia brevemente o programa de pesquisa, os pressupostos e os conceitos-chave do Grupo Modernidade/Colonialidade latino-americano:

1) ênfase em localizar as origens da modernidade na Conquista da América e do controle do Atlântico depois de 1542, antes que os mais comumente aceitos marcos, como a Ilustração ou o final do século XVIII; 2) atenção persistente ao colonialismo e ao desenvolvimento do sistema mundial capitalista como constitutivos da modernidade; isso inclui uma determinação de não passar por alto a economia e suas formas concomitantes de exploração; 3) em consequência, adoção de uma perspectiva planetária na explicação da modernidade, no lugar de uma visão da modernidade como fenômeno intraeuropeu; 4) identificação da dominação de outros fora do centro europeu como dimensão necessária da modernidade, com a concomitante subalternização do conhecimento e das culturas desses outros grupos; 5) concepção do eurocentrismo como forma de conhecimento da modernidade/colonialidade.

Desse complexo programa de pesquisa, procura-se salientar a “diferença colonial”, entendida como “um espaço epistemológico e político privilegiado” (ESCOBAR, 2003ESCOBAR, A. Mundos y conocimientos de otro modo. El programa de investigación de modernidad/colonialidad latino-americano. Tabula Rasa, Bogotá, n. 1, p. 51-86, 2003., p. 61). Dentre os autores de diversas áreas do conhecimento envolvidos no grupo, Escobar destaca o argentino Walter Mignolo, que se dedica aos estudos da cultura, especificamente da literatura, e propõe um “pensamento de fronteira” que tensione certas metodologias e categorias.

No livro de autoria de Mignolo, Histórias locais/projetos globais: colonialidade, saberes subalternos e pensamento liminar ([2000] 2003], é possível analisar o lugar da América Latina, não exatamente no projeto pós-colonial, mas dentro do que ele chama de “modernidade/colonialidade”. Ancorado nos trabalhos de Aníbal Quijano e de Immanuel Wallerstein, Mignolo posiciona as Américas no imaginário do “sistema mundial colonial moderno”, cuja origem remonta às expansões europeias do século XVI, que culminaram em um processo de trocas e de contatos globais do mundo moderno. No argumento desse autor, a América Latina foi constitutiva da modernidade através de um lugar específico, a sua “diferença colonial”. Para Mignolo, ([2000] 2003 MIGNOLO, W. Compreensão humana e interesses locais. O ocidentalismo e o argumento (latino-) americano. In: MIGNOLO, W. Histórias locais/projetos globais: colonialidade, saberes subalternos e pensamento liminar. Belo Horizonte: Ed. da UFMG, [2000] 2003., p.180-181):

Em primeiro lugar, no século 16, a “descoberta” da América contribuiu para a formação do mundo colonial/moderno. Em segundo lugar, no início do século 19, as Américas contribuíram para constituir o segundo estágio da modernidade/colonialidade. Embora a “história” tenha enfatizado a Revolução Francesa, o Iluminismo e a formação dos modernos Estados-nações, a descolonização nas Américas caminha de mãos dadas com a história mais curta da modernidade (do século 18 até hoje). Isto é, durante o período em que a Índia começava a ser colonizada pela Inglaterra e a África do Norte sucumbia ao colonialismo francês, as Américas testemunharam um longo período de libertação: do colonialismo da Inglaterra (os Estados Unidos), da França (Haiti), e Espanha (Argentina, México, Colômbia, Chile, Peru, Equador). Aqui se tem, num brevíssimo resumo, um espectro variegado das mudanças da diferença colonial no mundo colonial/moderno.

Observa-se, aqui, outra particularidade da América Latina: o processo de descolonização ocorrido no século XIX conformou-se em uma “ordem mundial” diferente da descolonização da Índia e da África do Norte, ocorridas em meados do século XX. Mignolo ([2000] 2003 MIGNOLO, W. Compreensão humana e interesses locais. O ocidentalismo e o argumento (latino-) americano. In: MIGNOLO, W. Histórias locais/projetos globais: colonialidade, saberes subalternos e pensamento liminar. Belo Horizonte: Ed. da UFMG, [2000] 2003., p. 181) declara:

Portanto, teorias de descolonização de intelectuais indianos ou do Norte da África, nascidos pouco antes ou depois da descolonização, foram impulsionadas por uma experiência histórica e emocional significativamente diferente dos intelectuais da América Latina que teorizam a descolonização entre um século e século e meio após a descolonização.

Para o autor argentino, as “nações pós-coloniais” de meados do século XX conformaram-se nos horizontes da descolonização e do marxismo em um contexto de Guerra Fria, enquanto as “nações pós-independência” do século XIX se articulavam dentro da ideologia liberal. Segundo Mignolo ([2000] 2003 MIGNOLO, W. Compreensão humana e interesses locais. O ocidentalismo e o argumento (latino-) americano. In: MIGNOLO, W. Histórias locais/projetos globais: colonialidade, saberes subalternos e pensamento liminar. Belo Horizonte: Ed. da UFMG, [2000] 2003., p. 189): “A descolonização como horizonte final ainda não existia no século XIX. O horizonte era a nação. Ou, ainda melhor, a ‘res-pública’”. Assim, aborda-se um tema canônico nos estudos sobre a América Latina, seja tratando de um país de forma independente, seja envolvendo um conjunto de países, por vezes pelo método comparativo: a construção da nação, da identidade nacional ou da cultura nacional. Já discutimos os limites apontados pela historiografia ao enquadramento da nação como delimitação dos objetos de pesquisa e os riscos desse procedimento. Todavia, Mignolo (id., p. 190) articula o imaginário mobilizado pelos movimentos de independência - o imaginário realizado dentro do liberalismo - em tensão com um projeto global colonial: “A pós-independência deveria então ser entendida como reconfigurações (econômicas, políticas, epistemológicas) da colonialidade do poder, e a emergência de novos projetos em tensão conflituosa com o projeto global” (id., ibid.).

Cabe ressaltar que do processo de independência emerge uma nova territorialização, entendida como a constituição de um lugar que forma fronteiras geográficas e memórias comuns, e, portanto, a própria noção de América e posteriormente de América Latina - esta última em contraposição à América anglo-saxã. Sua identificação, pela Coroa espanhola, como “Índias Ocidentais” expressava a ideia de administração das possessões coloniais; o nome América teria sido construído pela população e pelos intelectuais crioulos, os quais tinham ascendência espanhola e eram vinculados aos processos de independência do século XIX. Mignolo ([2000] 2003 MIGNOLO, W. Compreensão humana e interesses locais. O ocidentalismo e o argumento (latino-) americano. In: MIGNOLO, W. Histórias locais/projetos globais: colonialidade, saberes subalternos e pensamento liminar. Belo Horizonte: Ed. da UFMG, [2000] 2003., p. 186) explica que “a emergência da população ‘crioula’ e de seus intelectuais preencheu o espaço vazio, construindo uma nova territorialidade que, com os anos, veio a chamar-se ‘América Latina’”. O mesmo autor revela (id., p. 185, 186):

Suas memórias comuns baseiam-se na colonização espanhola das Índias Ocidentais, o que levou à inclusão de Porto Rico, São Domingos e Cuba, países com a mesma língua, como a América Espanhola continental. Por outro lado, e numa relação invertida, o Brasil fica incluído na América Latina não por causa da língua (como no caso das ilhas), mas por pertencer ao continente!

O resultado final é que a imagem atual da América (Latina) foi mapeada sobre os legados coloniais da primeira modernidade (isto é, o período moderno inicial dos historiadores dos Anais que é sobretudo o século 16, quando se estabeleceu o circuito comercial atlântico.

O projeto intelectual de Mignolo analisa, na articulação e na rearticulação das histórias locais com os projetos globais, as reconfigurações de poder, do mesmo modo que os conhecimentos “subalternos” tensionaram modos de pensar, ou construíram modos alternativos a partir das margens, num entendimento dos saberes “subalternos” - ou subalternizados - como críticos às categorias universais, compreendidas como a projeção de histórias locais como universais.

Voltando às indagações sobre a história do urbanismo na América Latina e à formulação de Almandoz sobre a mudança do “polo de modernidade” e os processos de “modernização urbanística”, poderíamos, então, questionar as assimetrias de poder envolvendo os contatos culturais. Quais saberes seriam subalternizados? E, simultaneamente, perscrutar como as histórias locais construiriam mecanismo de tensionamento com o projeto global. Haveria resistências ou outras formas de pensar? Tratar-se-ia de um modernismo sem modernização ou de uma diferença intrínseca à modernidade? Neste sentido, pensar os processos de circulação de ideias possibilitaria análises mais complexas, com ênfase nas vias de mão dupla operadas nos contatos culturais, de maneira a salientar as práticas e os mecanismos inventivos dos agentes ativos.

3. Práticas culturais e transculturação

O estudo das práticas culturais foi um recurso para analisar os desvios às “grandes interpretações” ou às determinações do mundo social, dando visibilidade à ação dos atores, ou sujeitos, e aos usos e reelaborações tanto de ideias como de técnicas ou objetos. A “história das apropriações” foi discutida pelo historiador Roger Chartier ([1989] 1991)CHARTIER, R. O mundo como representação. Revista do Instituto de Estudos Avançados, São Paulo, 11, 5, p. 173-191, [1989] 1991. no artigo “O mundo como representação”, publicado originalmente na revista Annales. Histoire, Sciences Sociales. Respondendo ao editorial da revista de 1988, que indagava sobre um momento de inflexão da disciplina apoiada na leitura da “crise geral das ciências sociais” e do abandono dos sistemas globais de interpretação, Chartier ([1989] 1991CHARTIER, R. O mundo como representação. Revista do Instituto de Estudos Avançados, São Paulo, 11, 5, p. 173-191, [1989] 1991., p. 176, 177) apresenta sua leitura relativa às mudanças das práticas de pesquisa entre os historiadores e outras estratégias para a disciplina.

[...] invocando contra as determinações imediatas das estruturas as capacidades inventivas dos agentes, e contra a submissão mecânica à regra as estratégias próprias da prática.

[...] as novas perspectivas abertas para pensar outros modos de articulação entre as obras ou as práticas e o mundo social, sensíveis ao mesmo tempo à pluralidade das clivagens que atravessam uma sociedade e à diversidade dos empregos de materiais ou de códigos partilhados.

Amparado na leitura de que não haveria propriamente uma crise das ciências sociais, mas um refluxo do marxismo e do estruturalismo em face do retorno da filosofia do sujeito, o autor apresenta uma reflexão metodológica baseada em sua pesquisa sobre a história do livro, organizada em três movimentos: (i) o estudo crítico do texto, (ii) a história do livro - como objeto - e (iii) a análise das práticas de leitura que produziriam “usos e significações diferençadas”. Nesse procedimento, articulam-se o que o Chartier chama de “mundo do texto” e “mundo do leitor” e a construção social do sentido. O deslocamento para a ação dos sujeitos, ou, ainda, para “a liberdade criadora dos agentes” ([1989] 1991, p. 180) diante das leituras e das obras, enfatizaria a apropriação, assim entendida pelo autor (CHARTIER, [1989] 1991CHARTIER, R. O mundo como representação. Revista do Instituto de Estudos Avançados, São Paulo, 11, 5, p. 173-191, [1989] 1991., p. 180):

A apropriação, a nosso ver, visa uma história social dos usos e das interpretações, referidas a suas determinações fundamentais e inscrita nas práticas específicas que as produzem.

Assim, voltar a atenção para as condições e os processos que, muito concretamente, sustentam as operações de produção de sentido é reconhecer, contra a antiga história intelectual, que nem as inteligências nem as ideias são desencarnadas, e, contra os pensamentos do universal, que as categorias dadas como invariantes, sejam elas filosóficas ou fenomenológicas, devem ser construídas na descontinuidade das trajetórias históricas.

Assim, Chartier anuncia uma história cultural do social em que procura acessar o mundo social por intermédio das obras e das práticas culturais, ou “desvios culturais”. Volta-se o olhar para as ações dos sujeitos, da pluralidade dos empregos, ou do reemprego - na acepção de Michel de Certeau (1980)DE CERTEAU, M. L’Invention du quotidien, I, Arts de faire. Paris: Union Génerale d’Editions, 1980. citada pelo autor -, e das compreensões variadas.

As formulações de Chartier são de particular interesse para analisar como referências ou modelos urbanísticos foram construídos e formulados, seus modos de circulação e sua apropriação por agentes, arquitetos e urbanistas, que tiveram papel ativo em sua reelaboração ou reemprego inventivo. Trata-se, portanto, de uma prática cultural.

As práticas culturais na América Latina oriundas das experiências sobrepostas produzidas pelo deslocamento ou como resultado de encontros culturais foram lidas em termos variados, como mestiçagem, sincretismo, crioulização, hibridização ou transculturação. Estudos culturais, como é o caso de Culturas híbridas, do argentino Néstor García Canclini ([1989] 2013)CANCLINI, N. G. Culturas híbridas: estratégias para entrar e sair da modernidade. São Paulo: Edusp, [1989] 2013., procuram romper com análises em que a cultura é vista de maneira monolítica ou como identidades “puras” ou “autênticas”. Esse antropólogo trabalha com essa gama de conceitos em busca de novas abordagens para “repensar a tese de que na América Latina as divergências entre o modernismo cultural e a modernização social nos transformariam em uma versão deficiente da modernidade canonizada pelas metrópoles” (CANCLINI, [1989] 2013CANCLINI, N. G. Culturas híbridas: estratégias para entrar e sair da modernidade. São Paulo: Edusp, [1989] 2013., p. 22). Segundo ele, na mesma obra (p. XXVI): “Neste tempo, quando ‘as decepções das promessas do universalismo abstrato conduziram às crispações particularistas’ o pensamento e as práticas mestiças são recursos para reconhecer o diferente e elaborar as tensões das diferenças”.

O autor refuta interpretações em que o modernismo teria sido a adoção de modelos estrangeiros ou de soluções meramente formais. Ele busca nas próprias contradições elementos internos e ativos das culturais nacionais, “um modo de experiência intelectual destinado a assumir conjuntamente a estrutura conflitiva da própria sociedade, sua dependência de modelos estrangeiros e os projetos de transformá-la” (CANCLINI, [1989] 2013CANCLINI, N. G. Culturas híbridas: estratégias para entrar e sair da modernidade. São Paulo: Edusp, [1989] 2013., p. 77). A análise do processo de hibridização não trata simplesmente da descrição de uma mistura ou da justaposição de culturas, mas, ao se combinarem, outras relações de sentido seriam construídas apoiadas na ideia de reconversão de saberes como uma utilização produtiva de recursos anteriores em novos contextos. A esse respeito, Canclini esclarece ([1989] 2013CANCLINI, N. G. Culturas híbridas: estratégias para entrar e sair da modernidade. São Paulo: Edusp, [1989] 2013., p. XIX): “Parto de uma primeira definição: entendo por hibridação processos socioculturais nos quais estruturas e práticas discretas, que existiam de forma separada, se combinam para gerar novas estruturas, objetos e práticas”.

Desse modo, ele propõe um olhar que observa simultaneamente os processos sociais que atuam sobre as obras e os procedimentos com que os artistas retrabalham ou reelaboram conceitos, com base em um movimento triplo, em que o autor chama atenção para os conflitos internos, para a dependência exterior e para as utopias transformadoras nas obras de artes.

Apesar das críticas feitas à hibridização e a seus usos nas dinâmicas do processo de globalização, essa noção encontrou entusiastas, sobretudo na literatura e nas artes, que viam nesse procedimento uma faceta estética e política, ao manejar de maneira consciente e intencionalmente contestadora as normas da cultura hegemônica. Nas palavras do antropólogo argentino: “como ser radical sem ser fundamentalista” (CANCLINI, [1989] 2013CANCLINI, N. G. Culturas híbridas: estratégias para entrar e sair da modernidade. São Paulo: Edusp, [1989] 2013., p. 372).

A noção de transculturação foi enunciada pelo antropólogo cubano Fernando Ortiz na obra Contrapunteo cubano del tabaco y el azúcar, publicada em 1940, especificamente no capítulo adicional “Del fenómeno social de la ‘transculturación’ y de su importancia en Cuba”. Nele, Ortiz interpreta a história de seu país como “uma história de suas intricadíssimas transculturações” (ORTIZ, [1940] 1983ORTIZ, F. Contrapunteo cubano del tabaco y el azúcar. Habana: Editorial de Ciencias Sociales, [1940] 1983., p. 86), em uma compreensão histórica de processos culturais das populações indígenas e dos imigrantes brancos e negros. É seu entendimento (id., p. 90) que:

[...] o vocábulo transculturação expressa melhor os processos de transição de uma cultura para outra, porque esse processo não consiste somente em adquirir uma cultura diferente, o que, a rigor, é o significado do vocábulo anglo-saxão acculturation, porém o processo implica também, necessariamente, a perda, o desenraizamento de uma cultura anterior, o que se poderia chamar de uma desculturação parcial, e, além do mais, significa a criação consequente de novos fenômenos culturais, que se poderiam denominar neoculturação.

A transculturação, assim, seria a síntese do processo de um duplo movimento de “desculturação” e de “aculturação”, o que pressupõe exclusões e apropriações seletivas dentro de uma nova totalidade. Essa noção contrapõe-se a um entendimento de assimilação passiva e pacífica do elemento externo. Na interpretação de Castro (2016CASTRO, F. V. Um intelectual multifacetado em caleidoscópio de ideias: raça no pensamento de Fernando Ortiz. Estudos Ibero-Americanos, Porto Alegre, v. 42, n. 2, p. 606-632, 2016., p. 615), “[...] ocorre um processo que tanto a cultura considerada dominante quanto a dita ‘subalterna’ passam por transformações. Tal premissa rompe com a perspectiva de existirem culturas superiores e inferiores”. Contudo, tampouco, apaziguam-se as diferenças sociais entre culturas e grupos étnicos dentro do processo de transculturação.

Tanto a noção de hibridismo como a de transculturação têm em comum uma perspectiva de que os encontros culturais não ocorrem em uma única direção entre um agente ativo e outro passivo, e de que, ao se combinarem, elas produzem novos sentidos. No entanto, é possível observar sensíveis diferenças no procedimento de análise. No processo de transculturação, como anunciado por Ortiz, o agente cultural não é consciente, e a síntese do processo de contato entre culturas, tratada como fenômeno social, é maturada ao operar mediante a exclusão de certos aspectos culturais e a afirmação de outros de maneira seletiva, sem que nenhuma das culturas envolvidas se mantenha integralmente. No caso do processo de hibridação, como anunciado por Canclini, o agente é consciente e reelabora o conceito ou a ideia reconvertendo-o, ao colocá-lo em outra posição e em outro contexto.

O trabalho de Fernando Ortiz e seu conceito de transculturação tem especial interesse para Mignolo por tensionar as categorias disciplinares existentes, produzindo uma nova. O conceito de Ortiz foi formulado como alternativa à noção de aculturação do antropólogo polonês radicado na Inglaterra Bronislaw Malinowski: “[...] enquanto aculturação apontava para mudanças culturais numa única direção, o corretivo transculturação visava chamar a atenção para os processos complexos e multidirecionais da transformação cultural” (MIGNOLO, [2000] 2003 MIGNOLO, W. Compreensão humana e interesses locais. O ocidentalismo e o argumento (latino-) americano. In: MIGNOLO, W. Histórias locais/projetos globais: colonialidade, saberes subalternos e pensamento liminar. Belo Horizonte: Ed. da UFMG, [2000] 2003., p. 233). Mais ainda, para o antropólogo argentino, o pensamento de Ortiz reflete sobre as “margens”, inicialmente “sobre as margens da nação em termos de ‘mestizaje’ e sobre a margem de culturas em termos de transculturação de objetos e mercadorias no sistema mundial colonial/moderno” (id., p. 183). Nesse processo, Ortiz inclui a participação afro-americana na construção da história nacional de Cuba e, para além dela, no que Mignolo chama de “homogêneo imaginário crioulo da América Latina” (id., ibid.). Sua interpretação é de que o sentido de diferença colonial seria atuante na conceituação da transculturação, embora o próprio Ortiz não tenha teorizado sobre ela.

Considerações finais

Procurou-se traçar aqui um caminho de diálogo entre campos disciplinares distintos: a proposta da história conectada, a problematização apresentada pelos estudos pós-coloniais e, por fim, o estudo das práticas culturas, no intuito de refletir a respeito da escrita da história do urbanismo e da cidade tendo como enquadramento a América Latina - entendida não somente como recorte geográfico.

No debate com os historiadores, buscou-se refletir sobre as implicações do estabelecimento de outros recortes de pesquisa, com base na lacuna historiográfica, apontada por Marco Aurélio Gomes (2009GOMES, M. A. A. F. Experiências sul-americanas: uma lacuna na historiografia brasileira sobre cidade e o urbanismo. In: GOMES, M. A. A. F. (org.). Urbanismo na América do Sul: circulação de ideias e constituição do campo, 1920-1960. Salvador: EDUFBA, 2009.), dos estudos de conjunto acerca da América Latina no campo do urbanismo e dos estudos urbanos. Os recortes que têm a nação como enquadramento geográfico e temporal, assim como a perspectiva da história comparada, foram vistos como fortalecimento de um campo de disputas entre as nações e o retorno do etnocentrismo. A resposta dada pelos historiadores a esses questionamentos foi uma saída metodológica sustentada na história conectada ou transnacional, que, nesse procedimento, enfatizou novos temas, como os encontros culturais, o choque entre civilizações, circuitos, trânsitos, a circulação das ideias, dos saberes, das técnicas. Como proposto por Bender (2000), trata-se de pensar “solidariedades e conexões alternativas” entre grupos sociais e situações presentes na América Latina, considerando a constituição de redes profissionais.

Voltar os olhos à problemática evidenciada pelos estudos pós-coloniais, de assimetrias e hierarquizações valorativas também produzidas pelos encontros culturais, na projeção de categorias analíticas que desconsiderem os contextos locais e seus saberes, torna nítida a valorização dos conflitos, disputas e resistências que envolvem tais relações. Desse modo, somos convocados a analisar as “configurações e reconfigurações dos poderes”, incluindo os modos de tensionamento e as negociações. Também se deve levar em conta que os contatos não se estabelecem de modo unilateral, com um polo ativo e outro passivo. Ao contrário, analisar a via de mão dupla operada nos contatados culturais possibilita reconhecer os saberes subalternizados e colocá-los em perspectiva.

Examinar, portanto, as práticas culturais atentando para a ação dos agentes permite analisar os mecanismos de apropriações, dando ênfase à construção de novos significados. Os estudos das práticas culturais na América Latina analisaram as formas como objetos, ideias e culturas se combinaram, criando novos sentidos ou reconfigurando saberes e significações, com particular interesse na construção de uma nova categoria de análise, como é o caso da transculturação, em que um novo modo interpretativo foi construído baseando-se nos quadros sociais próprios da América Latina.

Tratar da história do urbanismo (e mesmo da arquitetura) para além de suas relações e seus procedimentos internos, buscando, antes, inseri-la em contextos culturais, políticos e sociais mais amplos, nos leva ao diálogo com outras disciplinas e a uma reflexão de seus métodos e problemáticas. Este artigo tem o intento de contribuir com os estudos das circulações de ideias na constituição do campo do urbanismo, iluminando, por intermédio do diálogo disciplinar, focos e escalas de análises capazes de dar visibilidade à América Latina para além dos procedimentos de comparação. Também se pretendeu chamar atenção para as assimetrias e hierarquizações valorativas presentes na projeção de categorias analíticas construídas em decorrência de outras realidades sociais, a fim de, ao contrário, salientar, por meio das práticas culturais, as ações inventivas dos agentes sociais nas apropriações e na reconfiguração dos saberes e, inclusive, na capacidade de construção de outras categorias analíticas através de quadros sociais próprios da América Latina.

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  • 3
    Cf. LANNA, A. et alLANNA, A. et al. (org.). São Paulo, os estrangeiros e a construção das cidades . São Paulo: Alameda , 2011.. (org.). São Paulo, os estrangeiros e a construção das cidades. São Paulo: Alameda, 2011. Esse livro reúne artigos que compõem projeto de pesquisa mais amplo sobre a atuação dos estrangeiros na cidade de São Paulo.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    20 Fev 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    07 Fev 2022
  • Aceito
    11 Nov 2022
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