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Construção e aplicabilidade de um teste de percepção de fala com figuras

RESUMO

Objetivo

construir e aplicar um material de apoio para respostas ao teste do índice percentual de reconhecimento de fala em crianças.

Método

estudo descritivo exploratório. A primeira etapa, elaboração de um material, foi realizada pela avaliação de 31 fonoaudiólogos (juízes), com palavras monossílabas e dissílabas, regulares e frequentes, que pertencem ao vocabulário das crianças e figuras que pudessem representar essas palavras. A segunda etapa constituiu-se da aplicabilidade do material em 30 crianças na faixa etária de 2 a 4 anos e 11 meses, com audição normal.

Resultados

o material foi constituído por 25 palavras e seis pranchas com seis figuras. As palavras selecionadas pelos fonoaudiólogos tiveram como critério o fonema inicial e figuras reais, coloridas e próximas do cotidiano das crianças. A média de acertos apresentada pelas crianças no índice percentual de reconhecimento de fala com apoio das figuras foi de 93% (± 8% desvio padrão) e sem, de 64% (± 25% desvio padrão). Ao comparar os resultados obtidos com e sem o apoio das figuras, observou-se diferença significativa para 15 das 25 palavras do teste, sendo maior o número de acertos quando se utilizou com apoio de figuras. Na comparação entre os acertos e erros obtidos no teste, utilizando as figuras como apoio, houve diferença significativa apenas para a palavra “cão” (p=0,0079).

Conclusão

houve concordância entre os juízes em relação às palavras e figuras; a aplicação foi rápida e fácil, possibilitando a avaliação e o monitoramento sistematizado da habilidade de percepção de fala independentemente da capacidade de verbalização da criança.

Descritores:
Percepção Auditiva; Criança; Audição; Audiologia; Fonoaudiologia

ABSTRACT

Purpose

To prepare and apply support material for responses to the Speech Recognition Percentage Index (SRPI) test in children.

Methods

This is a descriptive, exploratory study conducted in two phases: in the first phase, 31 speech-language pathologists (referees) prepared material composed of regular, frequently used monosyllabic and disyllabic words belonging to the vocabulary of children and figures that could represent these words; the second phase consisted in the application of this material to 30 normal-hearing children aged 2 to 4 years and 11 months.

Results

The material consisted of 25 words and six boards with six figures each. The word selection criterion adopted by the referees included the initial phoneme and real, colorful figures familiar to the children. The mean scores of the children in the SRPI test were 93% (SD ± 8%) with the support of figures and 64% (SD ± 25%) without figure support. Comparison between the results obtained with and without the support of figures showed significant difference for 15 of the 25 test words, with higher scores with the use of supporting figures. Comparison between correct and incorrect responses using the support of figures showed significant difference only for the word “dog” (“cão”) (p=0.0079).

Conclusion

There was agreement among the referees with respect to the words and figures. The SRPI test can be rapidly and easily applied, allowing evaluation and systematic monitoring of speech perception ability regardless of child verbalization capacity.

Keywords:
Auditory Perception; Child; Hearing; Audiology; Speech, Language and Hearing Sciences

INTRODUÇÃO

A avaliação audiológica básica é composta pela audiometria tonal limiar e testes de percepção de fala, que avaliam desde a capacidade de o indivíduo perceber o som com o mínimo de intensidade (Limiar de Detecção de Voz - LDV), Limiar de Recepção de Fala (LRF) à capacidade de o indivíduo reconhecer palavras (Índice Percentual de Reconhecimento de Fala - IPRF), expressos em porcentagem de acertos das palavras. Os testes de reconhecimento de palavras são de grande importância no diagnóstico audiológico. Para garantir a eficiência da avaliação da capacidade auditiva de um indivíduo, não se deve restringir apenas à habilidade de perceber tons puros, como na audiometria tonal. O reconhecimento de fala não pode ser presumido pelos limiares tonais, o que torna a logoaudiometria um instrumento clínico indispensável(11 Wilson RH, Strouse AL. Audiometria com estímulos de fala. In: Musiek FE, Rintelmann WF. Perspectivas atuais em avaliação auditiva. São Paulo: Manole; 2001. p. 21-62.).

Os testes de reconhecimento de fala comumente utilizam a resposta verbal apresentada pelos indivíduos para inferir sobre o input auditivo. No entanto, quando utilizado com crianças pequenas ou com indivíduos que não dominam o código oral, esse procedimento imprime dificuldade na interpretação das respostas, uma vez que essas crianças utilizam processos fonológicos para simplificar a sua fala ou não conseguem verbalizar.

Processos fonológicos são simplificações das regras fonológicas que envolvem sequências de sons na pronúncia das palavras para se aproximar da pronúncia correta(11 Wilson RH, Strouse AL. Audiometria com estímulos de fala. In: Musiek FE, Rintelmann WF. Perspectivas atuais em avaliação auditiva. São Paulo: Manole; 2001. p. 21-62.,22 Gray S, Reiser M, Brinkley S. Effect of onset and rhyme primes in preschoolers with typical development and specific language impairment. Speech Lang Hear Res. 2012;55(1):32-44. PMid:22199187. http://dx.doi.org/10.1044/1092-4388(2011/10-0203).
http://dx.doi.org/10.1044/1092-4388(2011...
). Quando presentes, dificultam a interpretação dos resultados dos testes de percepção de fala, visto que exigem produção correta dos sons para pontuação, impossibilitando a distinção, pelo examinador, se a criança reconhece auditivamente ou não a palavra e/ou fonema em avaliação.

Na prática clínica, durante a bateria de testes audiológicos, a maioria dos profissionais realiza o IPRF em crianças menores de 5 anos de idade e, muitas vezes, com dificuldades relacionadas à aplicação do teste, uma vez que nessa faixa etária ocorre o processo de aquisição dos fonemas. Nessa situação, os resultados obtidos sem apoio gráfico muitas vezes não correspondem à real capacidade de reconhecimento auditivo de fala dessa população. A falta de figuras padronizadas também dificulta a sistematização dos resultados e, consequentemente, o monitoramento do desenvolvimento da percepção auditiva dessa criança, principalmente nos casos com alteração/distúrbio de fala e/ou auditivo.

Na literatura nacional, encontram-se testes de percepção de fala com utilização de palavras e sentenças(33 Silva RCL, Bevilacqua MC, Mitre EI, Moret ALM. Teste de percepção de fala para palavras dissílabas. Revista CEFAC. 2004;6(2):209-14.

4 Delgado EMC, Bevilacqua MC. Lista de palavras como procedimento de avaliação da percepção dos sons da fala para crianças deficientes auditivas. Pró-Fono R Atual Cient. 1999;11(1):59-64.
-55 Lacerda AP. Audiologia clínica. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 1976. 199 p.). Porém, não se encontra material gráfico com figuras para a realização do IPRF em crianças. Na literatura internacional, encontram-se trabalhos com testes de percepção de fala, com considerações sobre a dificuldade na escolha do vocabulário e forma de apresentação do teste(66 Cienkowski KM, Ross M, Lerman J. The Word Intelligibility by Picture Identification (WIPI) test revisited. J Educ Audiol. 2009;15:39-43.,77 Geers AE. Techniques for assessing auditory speech perception and lip reading enhancement in young deaf children. Volta Review. 1994;96(5):85-96.).

Ao elaborar um instrumento de avaliação de percepção de fala, deve-se considerar se as palavras e/ou figuras são de conhecimento da criança, a fim de garantir que ela compreenda e reconheça a figura que está sendo utilizada, impedindo, assim, que ela aponte qualquer figura por desconhecê-la, interferindo nos resultados da avaliação e produzindo distorções na interpretação da avaliação.

O objetivo deste estudo foi construir e verificar a aplicabilidade de um material de apoio com figuras para respostas ao teste IPRF em crianças, de acordo com o sexo e a idade.

MÉTODO

A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da instituição de realização do estudo, um hospital de alta complexidade de cuidado do interior do Estado de São Paulo, Processo nº 600/2014.

Todos os responsáveis pelos participantes, quando menores, e os participantes profissionais da área foram informados sobre os objetivos do estudo e, uma vez concordando com sua participação, assinaram Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e o Termo de Assentimento (TA), quando necessário.

O estudo consistiu de duas etapas, a primeira referente à elaboração do instrumento, com a análise criteriosa das palavras e das figuras do teste IPRF. O material foi avaliado por um painel de juízes, 31 fonoaudiólogos, com titulação mínima de especialização e experiência clínica na área do tema. A segunda etapa, a aplicabilidade do instrumento, foi realizada com 30 crianças com audição normal e sem queixa de alterações de aquisição e/ou desenvolvimento de linguagem.

Elaboração do instrumento

Nessa primeira etapa da pesquisa, realizou-se o levantamento de palavras monossílabas e dissílabas, em artigos publicados(33 Silva RCL, Bevilacqua MC, Mitre EI, Moret ALM. Teste de percepção de fala para palavras dissílabas. Revista CEFAC. 2004;6(2):209-14.,44 Delgado EMC, Bevilacqua MC. Lista de palavras como procedimento de avaliação da percepção dos sons da fala para crianças deficientes auditivas. Pró-Fono R Atual Cient. 1999;11(1):59-64.). Essas palavras foram selecionadas a partir dos seguintes critérios: 1) serem passíveis de representação gráfica; 2) pertencerem ao vocabulário da criança, evitando palavras desconhecidas e figuras incoerentes; 3) ocorrência dos fonemas consonantais e vocálicos do Português Brasileiro em onset silábico, independentemente do padrão silábico e acentual, uma vez que a proposta do estudo foi avaliar como a criança percebe os sons da língua portuguesa auditivamente e não avaliar o desempenho de fala desses indivíduos, limitando o número de palavras a 25, correspondendo à quantidade dos testes de reconhecimento de fala conhecidos.

Noventa palavras foram selecionadas, porém apenas 65 foram inseridas no trabalho por estarem de acordo com os três critérios estabelecidos.

Em um segundo momento, iniciou-se o levantamento de figuras, no site de busca Google, sites de domínio público Pixabay(88 Pixabay. Banco de imagens e fotos livres de direitos. 2014 [citado em 2014 Maio 15]. Disponível em: http://pixabay.com/
http://pixabay.com/...
) e Shutterstock(99 Shutterstock. Banco de imagens, fotos e vetores livres de direitos. 2014 [citado em 2014 Maio 15]. Disponível em: http://www.shutterstock.com/.
http://www.shutterstock.com/...
) que pudessem representar essas palavras.

Dessa forma, após a seleção das palavras e das figuras para compor o material, foi criada a primeira versão do instrumento, com, no mínimo, uma palavra de uso regular (correspondência fonema – grafema) e mais comuns, de acordo com a percepção dos juízes, e suas respectivas figuras, sendo quatro para cada palavra, duas opções de figuras com representação real da palavra (Figura 1A, B) e duas desenhadas (Figura 1C, D).

Figura 1
Distribuição das figuras mais assinaladas pelos fonoaudiólogos segundo as opções apresentadas, figuras reais (A, B) e figuras desenhadas (C, D)

Depois da elaboração do material e com o objetivo de selecionar as palavras e figuras, foram convidados 31 fonoaudiólogos para realizar a avaliação da primeira versão. Depois do aceite, os profissionais assinaram o TCLE. Todos atuavam em serviços públicos de saúde de média e alta complexidade, com experiência clínica. O tempo de experiência clínica variou de 3 a 32 anos, sendo a média de 13,6 e mediana de 17,5 anos, com maior concentração na faixa etária de ≥20 anos (39%), seguida de dez a 20 anos de experiência (11,35%) e, por fim, entre três e nove anos (8,26%).

Os indivíduos caracterizaram-se por formação acadêmica mínima de pós-graduação, sendo assim, todos já tinham realizado, no mínimo, algum curso de especialização, aprimoramento e/ou aperfeiçoamento e 71% possuíam titulação stricto sensu (mestrado e/ou doutorado). A maioria atuava nas áreas de Audiologia (15%) e Linguagem (10%), seguidas das de Disfagia (4%), Motricidade Oral (5%), Saúde Coletiva (3%), Voz (3%) e Gagueira (2%). Em relação à faixa etária atendida por esses fonoaudiólogos, a maioria atendia preferencialmente crianças (26%).

Por meio de um questionário, dividido em três situações: identificação, avaliação lista de palavras e avaliação lista de figuras, aos fonoaudiólogos solicitou-se assinalar as palavras da “lista de palavras monossílabas e dissílabas” que considerassem adequadas para o material e a figura que melhor representasse a palavra escolhida, a partir de cartelas contendo as quatro figuras. As pesquisadoras não explicitaram critério para a escolha e não exigiram número exato de palavras, com o objetivo de que fosse identificada, por escolha espontânea, o que fosse julgado de mais comum, tanto para as palavras quanto para as figuras.

Para quantificar o grau de concordância entre os fonoaudiólogos, durante o processo de reavaliação do material elaborado, utilizou-se a porcentagem de concordância, adotando como concordância valores superiores a 85%(1010 Grant JS, Davis LL. Selection and use of contente experts for instrument development. Res Nurs Health. 1997;20(3):269-74. PMid:9179180. http://dx.doi.org/10.1002/(SICI)1098-240X(199706)20:3<269::AID-NUR9>3.0.CO;2-G.
http://dx.doi.org/10.1002/(SICI)1098-240...
).

A partir da avaliação realizada pelos fonoaudiólogos (juízes), as pesquisadoras confeccionaram a segunda versão do material, sendo, portanto, constituído de 25 palavras com suas figuras correspondentes.

Todas as imagens com índice de concordância acima de 85% foram mantidas e as imagens com índice de concordância inferiores a 85% foram substituídas, seguindo as sugestões propostas pelas fonoaudiólogas participantes. Finalmente, foram definidas as cartelas, sendo uma prancha treino e cinco para o teste, todas contendo seis figuras para a realização do teste, perfazendo o total de 30 figuras, sendo 25 ditas e cinco (uma de cada cartela) não foram ditas, a fim de garantir que a identificação não seria por exclusão.

Realizadas as modificações sugeridas pelos juízes e considerando-se cada item (figura/palavra), obteve-se a segunda versão do teste (25 itens), que foi submetida à aplicação em uma amostra de 30 crianças menores de 5 anos de idade (Figura 2).

Figura 2
Prancha com figuras para o IPRF

Aplicabilidade do instrumento

Na segunda etapa da pesquisa, a fim de aprimorar o material elaborado para o teste, este foi aplicado em um grupo de crianças, na faixa etária de 2 anos a 4 anos e 11 meses, que não tinham queixas de alterações quanto à aquisição e/ou desenvolvimento de linguagem e com audição normal. Foram abordadas no meio familiar, contato das pesquisadoras e da demanda espontânea da clínica de audiologia da instituição do estudo.

Considerando que nesse intervalo de idade pode-se observar variáveis em relação à aquisição dos fonemas(1111 Wertzner HF. Fonologia. In: Andrade CRF, Befi-Lopes DM, Fernandes FDM, Wertzner HF. ABFW: teste de linguagem infantil nas áreas de fonologia, vocabulário, fluência e pragmática. São Paulo: Pró-Fono; 2000. p. 5-40.), para análise, os participantes foram divididos em três grupos de faixa etária: crianças com idade entre 2 anos e 2 anos e 11 meses, 3 anos e 3 anos e 11 meses e 4 e 4 e 11 meses.

Essa etapa foi composta pelos seguintes procedimentos: audiometria lúdica em campo livre de todos os indivíduos, nas frequências de 500, 1K, 2K e 4K Hz. Posteriormente, foi realizado o Índice Percentual de Reconhecimento de Fala (IPRF) com o material elaborado, em uma sala acusticamente tratada, de viva voz, a 60 dBNA, em sistema de campo livre. Com o objetivo de controlar o sinal acústico em um ponto específico do espaço, procurou-se estabelecer uma distância de trabalho, definida, neste estudo, distância de 60 cm da cadeira à caixa de som. Também foram controlados o ângulo azimutal, a 0º azimute uma vez que a estimulação foi binaural e de elevação do som incidente para cada participante como procedimento para realização de medidas em campo livre, uma vez que os participantes eram normo-ouvintes.

O audiômetro utilizado foi o AC40, Interacoustic. Nessa etapa, as crianças foram orientadas que ouviriam várias palavras e deveriam apontar a figura correspondente. Para a realização do reconhecimento auditivo da palavra, por meio de identificação da figura correspondente, foram disponibilizadas cartelas contendo seis figuras cada uma, nas quais as crianças deveriam apontar a figura dita pelo examinador. Para esse procedimento, o segundo examinador, dentro da cabina, realizava a troca das pranchas de acordo com a apresentação das palavras.

Inicialmente, foi realizado um treino com uma lista de seis palavras (Figura 2 - Prancha Treino), para que a criança compreendesse a estratégia do teste e não tivesse dificuldade quanto ao estímulo ou ao tipo de resposta solicitada durante o procedimento.

A mesma lista de palavras foi aplicada, nas mesmas condições apresentadas anteriormente, porém sem o apoio das figuras. Dessa forma, as crianças foram orientadas verbalmente que ouviriam várias palavras e deveriam repeti-las uma a uma. Durante esse procedimento, a segunda examinadora anotava em uma ficha de registro as respostas das crianças, e utilizava, como auxílio, um gravador de voz, para posterior análise e comparação da produção oral das palavras. Uma vez que os dados foram coletados e registrados, foram realizadas a transcrição fonética e a análise dos processos fonológicos encontrados, possibilitando às pesquisadoras identificarem a particularidade de cada criança quanto aos erros cometidos no IPRF, sem o apoio das figuras.

Nos dois procedimentos, o examinador aplicou toda a lista de palavras, sem o uso de repetições e pausas entre os fonemas. Foram utilizadas frases introdutórias durante os dois procedimentos. Para a apresentação da lista de figuras, utilizou-se a frase veículo: Mostre a(o) _____, e para a lista de palavras: Repita a palavra____. Para os dois procedimentos, foram utilizados anteparos, para impedir o apoio de leitura orofacial, como no teste de IPRF convencional.

Para atender aos objetivos propostos, foram utilizados os testes: t de Student para amostras independentes, o coeficiente de correlação de Pearson, que quantifica a associação entre duas variáveis quantitativas, e o teste exato de Fisher, para verificar a associação entre o sexo e a resposta (figuras ou lista, para cada palavra). Todos os procedimentos foram realizados por meio do software SAS® 9.2 e com nível de significância de 5%.

A fim de comparar o tempo de aplicação do teste de reconhecimento de fala com e sem figuras, nas diferentes faixas etárias, foi utilizado o teste ANOVA, two way.

RESULTADOS

Os resultados estão apresentados em duas etapas: elaboração do instrumento e aplicabilidade do instrumento.

Elaboração do instrumento

As 25 palavras mais assinaladas e o número de fonoaudiólogos que as escolheram estão apresentados na Tabela 1. Dessa forma, foi elaborada a lista de palavras para o IPRF.

Tabela 1
Distribuição das palavras, por fonemas, mais assinaladas e número de fonoaudiólogos que as escolheram (n=31)

Os fonoaudiólogos tiveram preferência por figuras reais, coloridas e mais próximas do cotidiano dos participantes, na faixa etária estudada, conforme se verifica na Figura 1.

Observou-se preferência por figuras dos grupos “A” e “B”, portanto, das figuras selecionadas pelos fonoaudiólogos, 68% eram “reais”, enquanto que apenas 32% das escolhidas eram “desenho” (C e D). Sendo assim, tentou-se padronizar as imagens e selecionar as mais votadas entre as reais, de maneira que todas estivessem no mesmo padrão, “reais” ou “desenhos”, as figuras que representavam bola, casa, gelo, rato, trem, sol e rei, escolhidas preferencialmente no formato desenho, foram substituídas pelas imagens mais votadas dentre as reais.

Das 25 figuras finais e substituídas por imagens de domínio público, quatro (16%) foram substituídas novamente, pois as figuras com índice de concordância inferior a 85% foram consideradas inadequadas para compor o material final (Figura 3).

Figura 3
Demonstrativo do Índice de concordância das escolhas dos fonoaudiólogos por figuras/palavras

Além dessas quatro figuras consideradas inadequadas (índice de concordância menor 85%), foram selecionadas mais seis figuras, todas de sites de domínio público, e reavaliadas pelos fonoaudiólogos participantes para compor a prancha treino. O critério para a escolha dessas seis últimas figuras foi o número de escolhas pelos juízes, ou seja, as mais assinaladas.

Assim, foram confeccionadas seis pranchas, sendo nomeadas: Prancha Treino, Prancha 1, 2, 3, 4 e 5 (Figura 2). Para cada prancha com seis figuras, uma delas, posicionada aleatoriamente, não era dita pela pesquisadora, a fim de impedir que a criança identificasse uma das figuras por exclusão, comprometendo, assim, a fidedignidade do teste. Essas mesmas figuras/palavras que não eram ditas durante o teste foram utilizadas para a realização da “prancha treino”, previamente ao início da avaliação, garantindo que a criança compreendesse a estratégia do teste.

Aplicação do teste

Todos os participantes realizaram Audiometria Tonal Limiar Lúdica, em campo livre. Com a confirmação dos limiares auditivos dentro dos padrões de normalidade, realizou-se o IPRF com e sem apoio de figuras, de acordo com os critérios descritos anteriormente.

A idade das crianças variou de 2 anos e 1 mês a 4 anos e 11 meses, 8 (26,66%) crianças com idade entre 2 anos e 2 anos e 11 meses, 12 (40%) entre 3 anos e 3 anos e 11 meses e 10 (33,33%) entre 4 e 4 e 11 meses.

Quanto ao sexo, a maioria dos voluntários foi composta por meninos (60%; n=18), enquanto que as meninas representaram 40% (n=12) da amostra.

Levando em consideração o tempo de aplicação, todo o procedimento, com e sem apoio das figuras, foi realizado com duração média de 5,23 minutos (min) pelo grupo de crianças de 2 anos; 3,81 min pelo grupo de crianças de 3 anos; e 3,59 min pelo grupo de crianças de 4 anos.

O IPRF com apoio das figuras foi realizado em uma média de tempo de 3,42 minutos (min) pelo grupo de crianças de 2 anos; tempo de 2,50 min pelo grupo de crianças de 3 anos; e 2,25 min pelo grupo de crianças de 4 anos. O IPRF sem o apoio das figuras foi realizado em uma média de tempo de 1,81 min pelas crianças de 2 anos; 1,31min pelas crianças de 3 anos; e 1,34 min pelas crianças de 4 anos (Tabela 2).

Tabela 2
Comparação entre o tempo de aplicação do IPRF com e sem apoio de figuras, nas três faixas etárias estudadas

Quando comparados os tempos de aplicação do teste com apoio de figuras das três faixas etárias estudadas, verificou-se que houve diferença significativa entre o dos participantes de faixa etária de 2 anos de idade em relação ao dos demais (entre 2 e 3 anos p=0,0360 e entre 2 e 4 anos de idade p=0,0138). Na aplicação do IPRF sem apoio de figuras, não houve diferença estatística em relação ao tempo de aplicação entre as três faixas etárias estudadas. Ao se comparar os tempos de aplicação com e sem o apoio de figuras das três faixas etárias, identificou-se diferença estatística (2 anos p=0,0015; 3 anos p=0,005 e 4 anos p=0,0085), conforme demonstrado na Tabela 2.

Ao associar o número de erros, quando realizado o IPRF com e sem o apoio de figuras, observou-se diferença significativa para 15 das 25 palavras, sendo maior o número de acertos quando realizado o IPRF com apoio de figuras, conforme pode ser visualizado na Tabela 3.

Tabela 3
Associação entre acertos e erros do IPRF com e sem o apoio das figuras

No IPRF, utilizando as figuras como apoio, os erros variaram de acordo com a idade, sendo que as crianças entre 2 anos e 2 anos e 11 meses apresentaram 23 erros. As crianças entre 3 anos e 3 anos e 11 meses apresentaram 26 erros, enquanto que as crianças entre 4 anos e 4 e 11 meses apresentaram apenas cinco erros, sendo esses erros no reconhecimento das figuras: gelo, faca, zebra, cão e rei (Tabela 4).

Tabela 4
Número de erros por palavra do IPRF, com e sem o apoio das figuras, por faixa etária

Na comparação entre os acertos e erros obtidos no IPRF, utilizando as figuras como apoio, é possível verificar diferença significativa apenas para a palavra “cão” (p=0,0079).

No IPRF sem o apoio das figuras, os erros também variaram de acordo com a idade, as crianças entre 2 anos e 2 anos e 11 meses apresentaram 131 erros. As crianças entre 3 anos e 3 anos e 11 meses apresentaram 92 erros, enquanto que as crianças entre 4 anos e 4 e 11 meses apresentaram apenas 43 erros. Ao comparar os erros e acertos obtidos no IPRF, sem o apoio das figuras, 19 das 25 palavras apresentaram diferença significativa quando comparadas às idades (Tabela 4).

Por meio do estudo estatístico coeficiente de correlação de Pearson, pode-se observar associação da variável idade com os resultados encontrados durante a aplicação do IPRF com o apoio das figuras (p=0,0050), bem como para o teste sem o uso delas (p<0,0001).

Ao associar os indivíduos do sexo feminino e masculino com os erros obtidos nos dois procedimentos (IPRF com e sem figuras), não houve diferença significativa (Tabela 5).

Tabela 5
Número de erros por palavra do IPRF segundo sexo

No IPRF sem o apoio das figuras, além de identificar as respostas de acerto ou erro da criança, ele permite ao examinador transcrever os processos fonológicos que foram utilizados pelas crianças. Embora não tenha sido objetivo deste estudo, considerou-se elucidativo apresentar os processos fonológicos registrados nesta faixa etária estudada (Figura 4).

Figura 4
Processos fonológicos utilizados pelas crianças no IPRF sem o apoio das figuras, por faixa etária

DISCUSSÃO

Uma das formas de aferir a confiabilidade de um instrumento diz respeito à medida do grau de concordância entre as respostas de dois “momentos de aplicação” do instrumento para os mesmos indivíduos, esperando, em tal situação, que esse grau seja elevado, o que foi constatado pelos resultados encontrados na análise deste estudo, que apresentaram nível de concordância superior a 85% entre as duas aplicações para os mesmos indivíduos(1212 Pasquali L. Testes referentes a construto: teoria e modelo de construção. In: Pasquali L, organizador. Instrumentos psicológicos: manual prático de elaboração. Brasília: LabPAM/IBAP; 2001. p. 37-71.).

Com base nas evidências das respostas analisadas estatisticamente, observou-se que a concordância foi elevada entre os indivíduos participantes.

Desse modo, pode-se constatar que o instrumento proposto neste estudo apresentou bases fidedignas para sua utilização, para avaliação do índice percentual de reconhecimento de fala, em acordo com as argumentações de estudos anteriores de que um teste com medidas reconhecidamente confiáveis e válidas fornece ao pesquisador e ao clínico possibilidades de avaliar as crianças dessa faixa etária. A maioria das palavras selecionadas pelos fonoaudiólogos foi dissílabas e, durante a aplicação do teste, as palavras utilizadas tornaram possível a rápida determinação do índice percentual de reconhecimento auditivo de fala das crianças avaliadas, o que condiz com outros estudos(33 Silva RCL, Bevilacqua MC, Mitre EI, Moret ALM. Teste de percepção de fala para palavras dissílabas. Revista CEFAC. 2004;6(2):209-14.,44 Delgado EMC, Bevilacqua MC. Lista de palavras como procedimento de avaliação da percepção dos sons da fala para crianças deficientes auditivas. Pró-Fono R Atual Cient. 1999;11(1):59-64.), sendo possível observar que as palavras dissílabas, principalmente com estrutura silábica (cvcv) são palavras satisfatórias para teste de percepção de fala para crianças.

Para a avaliação das figuras, na elaboração do material, houve maior tendência de escolha, pelos fonoaudiólogos, por imagens reais, algumas inseridas em um contexto e outras não.

O treino realizado com seis palavras e figuras (prancha treino), antes da aplicação efetiva do IPRF com figuras, demonstrou ser eficaz por garantir a compreensão da atividade e da tarefa a ser realizada pela criança. Verificou-se que as crianças não tiveram dificuldades em compreender a estratégia. Pesquisadores(33 Silva RCL, Bevilacqua MC, Mitre EI, Moret ALM. Teste de percepção de fala para palavras dissílabas. Revista CEFAC. 2004;6(2):209-14.,44 Delgado EMC, Bevilacqua MC. Lista de palavras como procedimento de avaliação da percepção dos sons da fala para crianças deficientes auditivas. Pró-Fono R Atual Cient. 1999;11(1):59-64.,1313 Barzaghi L, Madureira S. Percepção de fala e deficiência de audição: elaboração de um procedimento de avaliação da percepção auditiva das plosivas. Distúrbios da Comunicação. 2005;17(1):87-99.) enfatizaram a importância do treinamento antes do teste propriamente dito, demonstrando ser importante, tanto para a rápida aplicação quanto para a compreensão da atividade proposta e resposta a ela. Embora não tenha sido realizado um treino para o IPRF sem o apoio das figuras, as crianças não apresentaram dificuldades na repetição das palavras ouvidas, provavelmente por ser aplicado após o IPRF com figuras.

O tempo de aplicação para o IPRF com apoio das figuras foi significativamente maior do que o realizado sem figuras, possivelmente pelo fato de ter sido aplicado antes do procedimento sem o apoio de figuras, fazendo com que a parte do treino fosse dispensada na segunda aplicação (Tabela 2).

Outro fator a se considerar foi o fato de o tempo de aplicação ser significativamente maior para o grupo de crianças na faixa etária de 2 anos do que o dos demais grupos para o procedimento com apoio das figuras (p=0,0360 e p=0,138 quando comparados aos grupos de faixa etária de 3 e 4 anos, respectivamente) e mantiveram tempos semelhantes para realização dos testes tanto com como sem figuras quando comparados os tempos nas faixas etárias de 3 e 4 anos.

A média de tempo destinada à aplicação de um teste de percepção de fala em crianças, desta faixa etária, é satisfatória e viável em serviços em que protocolos tendem a cumprir com princípios de resolutividade e têm demandas regionais a serem atendidas.

Neste estudo, a média de acertos apresentada pelas crianças no IPRF, com apoio das figuras, foi de 93%, desvio padrão de 8%, e no teste sem o apoio das figuras foi de 64%, com desvio padrão de 25%. A baixa porcentagem de acertos para o reconhecimento de palavras sem o apoio de figuras foi observada em um estudo(1414 Magalhães LA, Cimonari PM, Novaes BCAC. Avaliação de percepção de fala em crianças com deficiência auditiva usuárias de aparelho de amplificação sonora: a questão do instrumento e seus critérios. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2007;12(3):221-32. http://dx.doi.org/10.1590/S1516-80342007000300010.
http://dx.doi.org/10.1590/S1516-80342007...
), com porcentagem de reconhecimento de palavras abaixo de 88%.

A porcentagem de erros para o reconhecimento das palavras nos dois procedimentos foi maior para as crianças mais novas e diminuiu consideravelmente com o aumento da faixa etária. Isso condiz com outros estudos(33 Silva RCL, Bevilacqua MC, Mitre EI, Moret ALM. Teste de percepção de fala para palavras dissílabas. Revista CEFAC. 2004;6(2):209-14.,1515 Berti LC, Falavigna AE, Santos JB, Oliveira RA. Desempenho perceptivo-auditivo de crianças na identificação de contrastes fonológicos entre as oclusivas. J Soc Bras Fonoaudiol. 2012;24(4):348-54. PMid:23306685. http://dx.doi.org/10.1590/S2179-64912012000400010.
http://dx.doi.org/10.1590/S2179-64912012...
), nos quais a dificuldade de reconhecimento de palavras também foi menor de acordo com o aumento da idade das crianças.

Ao associar os resultados obtidos no IPRF, com e sem o apoio das figuras, observou-se diferença significativa para as palavras: Bola, Tênis, Dedo, Casa, Gato, Vaca, Sapo, Zebra, Chave, Leão, Rato, Olho, Trem, Flor e Sol, sendo maior o número de acertos quando utilizamos o IPRF com apoio de figuras (Tabela 3).

Durante a aplicação do IPRF, com apoio de figuras, pode-se considerar que os erros variaram de acordo com a idade, uma vez que o grupo de crianças com faixa etária entre 2 e 2 anos e 11 meses (n=8) apresentaram 23 erros, o grupo de crianças com idade entre 3 e 3 anos e 11 meses (n=12) apresentaram 26 erros e as com idade entre 4 e 4 anos e 11 meses (n=10), apenas cinco erros. O grupo de crianças com faixa etária entre 3 e 3 anos e 11 meses apresentou maior número de erros, entretanto, vale ressaltar que também é o grupo com maior número de individuals (40% da amostra). Pode-se observar que a alta porcentagem de acerto para o IPRF com figuras está relacionada com a idade, com o tipo de resposta solicitada (apontar a figura) e com a familiaridade das palavras e figuras.

Observou-se que tão importante quanto o estímulo de fala utilizado (monossílaba ou dissílaba) é a familiaridade e o significado que a palavra tem para a criança. Das palavras escolhidas pelos fonoaudiólogos, todas foram reconhecidas pela maioria das crianças, exceto a palavra “cão” que apresentou maior índice de erro durante o teste com apoio das figuras para todas as idades (43,33%). Talvez esteja relacionado ao fato de essa palavra não fazer parte do repertório das crianças na faixa etária estudada, sendo mais comum a utilização da palavra “cachorro” ou a onomatopeia “au-au” para as mais novas.

Na comparação entre os erros e acertos obtidos no teste, utilizando as figuras como apoio, houve diferença significativa apenas para esta palavra (cão) (p=0,0079). Na literatura, encontram-se vários estudos relacionados à familiaridade das palavras para as crianças. Em alguns estudos(33 Silva RCL, Bevilacqua MC, Mitre EI, Moret ALM. Teste de percepção de fala para palavras dissílabas. Revista CEFAC. 2004;6(2):209-14.,44 Delgado EMC, Bevilacqua MC. Lista de palavras como procedimento de avaliação da percepção dos sons da fala para crianças deficientes auditivas. Pró-Fono R Atual Cient. 1999;11(1):59-64.,1414 Magalhães LA, Cimonari PM, Novaes BCAC. Avaliação de percepção de fala em crianças com deficiência auditiva usuárias de aparelho de amplificação sonora: a questão do instrumento e seus critérios. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2007;12(3):221-32. http://dx.doi.org/10.1590/S1516-80342007000300010.
http://dx.doi.org/10.1590/S1516-80342007...
,1616 Angelo TCS, Bevilacqua MC, Moret ALM. Percepção da fala em deficientes auditivos pré-linguais usuários de implante coclear. Pró-Fono R Atual Cient. 2010;22(3):275-80. PMid:21103718. http://dx.doi.org/10.1590/S0104-56872010000300020.
http://dx.doi.org/10.1590/S0104-56872010...

17 Bevilacqua MC, Tech EA. Elaboração de um procedimento de avaliação de percepção de fala em crianças deficientes auditivas profundas a partir de cinco anos de idade. In: Marchesan IQ, Zorzi JL, Gomes ICD, editores. Tópicos em Fonoaudiologia. São Paulo: Lovise; 1996. p. 411-33.
-1818 Orlandi ACL, Bevilacqua MC. Deficiência auditiva profunda nos primeiros anos de vida: procedimento para avaliação da percepção da fala. Pró-Fono R Atual Cient. 1999;10(2):87-91.), as crianças obtiveram maior índice de acertos para as palavras familiares.

Durante a aplicação do IPRF com figuras, observou-se que as crianças menores apresentavam tendência a apontar para o próprio corpo, quando eram solicitadas a apontar, nas pranchas, as figuras das partes do corpo, tais como “mão”, “pé”, “boca” e “olho”, e também apresentavam latência maior para desencadear uma resposta. Já as crianças maiores, além de apresentarem respostas mais rápidas, em algumas situações, percebiam que as imagens extras (para impedir resposta por exclusão) não eram ditas.

Ao se comparar indivíduos do sexo feminino e masculino com os erros obtidos para o teste com o apoio das figuras, não houve diferença significativa. Bem como quando se comparou com o teste sem o apoio das figuras. Resultados semelhantes foram encontrados em um estudo(1919 Ferrante C, Borsel JV, Pereira MMB. Análise dos processos fonológicos em crianças com desenvolvimento fonológico normal. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2009;14(1):36-40. http://dx.doi.org/10.1590/S1516-80342009000100008.
http://dx.doi.org/10.1590/S1516-80342009...
), no qual não foi observada diferença estatisticamente significativa quando comparados os processos fonológicos com os indivíduos de ambos os sexos.

Para o IPRF sem o apoio das figuras, as crianças apresentaram muitos erros, sendo esses relacionados aos processos fonológicos utilizados por elas e próprios para a faixa etária(11 Wilson RH, Strouse AL. Audiometria com estímulos de fala. In: Musiek FE, Rintelmann WF. Perspectivas atuais em avaliação auditiva. São Paulo: Manole; 2001. p. 21-62.,2020 Caumo DTM, Ferreira MIDC. Relação entre desvio fonológicos e processamento auditivo. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2009;14(2):234-40. http://dx.doi.org/10.1590/S1516-80342009000200015.
http://dx.doi.org/10.1590/S1516-80342009...
). As crianças de 2 anos apresentaram 131 erros, as de 3 anos apresentaram 92 erros e as crianças de 4 anos apresentaram 43 erros.

Quando comparados os erros e acertos obtidos no teste sem o apoio das figuras, para a maioria das palavras houve diferença significativa, como pode ser observado na Tabela 3. O que pode ser justificado pelo fato do número e a variabilidade dos processos fonológicos utilizados pelas crianças nessa faixa etária estudada. Neste estudo, mesmo com o aumento da idade, as crianças entre 4 e 4 anos 11 meses ainda mantiveram alguns processos fonológicos, o que talvez justificaria algumas dessas crianças ainda apresentarem porcentagem de erro importante no teste sem o apoio das figuras.

O número de processos fonológicos diminuiu com o aumento da idade. Esse achado está de acordo com o trabalho de Ferrante et al.(1919 Ferrante C, Borsel JV, Pereira MMB. Análise dos processos fonológicos em crianças com desenvolvimento fonológico normal. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2009;14(1):36-40. http://dx.doi.org/10.1590/S1516-80342009000100008.
http://dx.doi.org/10.1590/S1516-80342009...
) e Silva et al.(2121 Silva MK, Ferrante C, Borsel JV, Pereira MMB. Aquisição fonológica do português brasileiro em crianças do Rio de Janeiro. J Soc Bras Fonoaudiol. 2012;24(3):248-54. PMid:23128173. http://dx.doi.org/10.1590/S2179-64912012000300010.
http://dx.doi.org/10.1590/S2179-64912012...
), cujo número de processos fonológicos utilizados pelas crianças diminuiu gradativamente com o aumento da faixa etária, bem como a variabilidade dos processos fonológicos. Observa-se que as crianças entre 2 e 2 anos e 11 meses utilizaram dez processos fonológicos durante o teste, as crianças entre 3 e 3 anos e 11 meses utilizaram nove e aquelas entre 4 e 4 anos e 11 meses, apenas seis, achados que corroboram o estudo de Silva et al.(2121 Silva MK, Ferrante C, Borsel JV, Pereira MMB. Aquisição fonológica do português brasileiro em crianças do Rio de Janeiro. J Soc Bras Fonoaudiol. 2012;24(3):248-54. PMid:23128173. http://dx.doi.org/10.1590/S2179-64912012000300010.
http://dx.doi.org/10.1590/S2179-64912012...
). Esses autores observaram que, à medida que as crianças alcançam a completude do inventário fonológico, ocorre diminuição da variabilidade dos processos fonológicos.

Os processos mais utilizados pelas crianças, segundo a classificação de Wertzner(1111 Wertzner HF. Fonologia. In: Andrade CRF, Befi-Lopes DM, Fernandes FDM, Wertzner HF. ABFW: teste de linguagem infantil nas áreas de fonologia, vocabulário, fluência e pragmática. São Paulo: Pró-Fono; 2000. p. 5-40.) foram: simplificação de encontro consonantal, redução de sílaba, frontalização de velar, frontalização de palatal, simplificação de líquida, plosivação de fricativa, posteriorização para velar, posteriorização para palatal, ensurdecimento de plosiva, ensurdecimento de fricativa e outros. De todos os processos utilizados, observou-se maior índice de erros nas palavras com encontro consonantal para todas as idades. Segundo alguns autores(1111 Wertzner HF. Fonologia. In: Andrade CRF, Befi-Lopes DM, Fernandes FDM, Wertzner HF. ABFW: teste de linguagem infantil nas áreas de fonologia, vocabulário, fluência e pragmática. São Paulo: Pró-Fono; 2000. p. 5-40.,1919 Ferrante C, Borsel JV, Pereira MMB. Análise dos processos fonológicos em crianças com desenvolvimento fonológico normal. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2009;14(1):36-40. http://dx.doi.org/10.1590/S1516-80342009000100008.
http://dx.doi.org/10.1590/S1516-80342009...
,2121 Silva MK, Ferrante C, Borsel JV, Pereira MMB. Aquisição fonológica do português brasileiro em crianças do Rio de Janeiro. J Soc Bras Fonoaudiol. 2012;24(3):248-54. PMid:23128173. http://dx.doi.org/10.1590/S2179-64912012000300010.
http://dx.doi.org/10.1590/S2179-64912012...

22 Lamprecht RR. A aquisição da fonologia do português na faixa dos 2:9- 5:5. Let Hoje. 1993;28(2):99-106.
-2323 Pagan-Neves LO, Wertzner HF. Parâmetros acústicos das líquidas do Português Brasileiro no transtorno fonológico. Pró-Fono R Atual Cient. 2010;22(4):491-6. http://dx.doi.org/10.1590/S0104-56872010000400022.
http://dx.doi.org/10.1590/S0104-56872010...
), o encontro consonantal é o último processo a alcançar estabilidade dentro do sistema fonológico da criança.

Dessa forma, os resultados sugerem que o material elaborado é viável para o teste de percepção de fala, a tarefa solicitada foi compreendida pelas crianças e tanto as palavras como as figuras estão adequadas para o IPRF, com crianças na faixa etária entre 2 anos e 4 anos e 11 meses. Sendo assim, foi possível observar o quanto o IPRF com as figuras como apoio pode ser importante para a realização do teste em crianças menores de 5 anos.

CONCLUSÃO

Conclui-se que a utilização do material elaborado, com figuras e palavras monossílabas e dissílabas, regulares e frequentes, foi de aplicação rápida e fácil, demonstrando atender aos objetivos do IPRF em crianças na faixa etária estudada, possibilitando o monitoramento sistematizado da habilidade de percepção de fala independentemente da capacidade de verbalização da criança.

AGRADECIMENTOS

Agradecemos a Diego Henrique dos Santos Pereira por seu apoio na formatação das ilustrações do manuscrito.

  • Trabalho realizado no Curso de Fonoaudiologia, Centro Integrado de Reabilitação do Hospital Estadual de Ribeirão Preto, Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto – FMRP, Universidade de São Paulo – USP - Ribeirão Preto (SP), Brasil.
  • Fonte de financiamento: Programa de Iniciação Cientifíca Institucional/RUSP.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Dez 2016
  • Data do Fascículo
    Nov-Dec 2016

Histórico

  • Recebido
    27 Mar 2015
  • Aceito
    02 Nov 2015
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