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Potenciais evocados auditivos de curta e longa latência em indivíduos com disfunção vestibular

RESUMO

Objetivo

Avaliar a via auditiva em nível de tronco encefálico e cortical em indivíduos com disfunção vestibular periférica.

Método

Participaram do estudo 19 indivíduos, com idade entre 20 e 80 anos que possuíam exames vestibulares sugestivos de Disfunção Vestibular Periférica Deficitária (DVPD) ou Disfunção Vestibular (DV). Os participantes realizaram avaliação da via auditiva por meio dos Potenciais Evocados Auditivos de Tronco Encefálico (curta latência) e dos potenciais P1, N1, P2, N2 e P300 (longa latência).

Resultados

Nove indivíduos apresentaram diagnóstico de Disfunção Vestibular e 10 de Disfunção Vestibular Periférica Deficitária. A média geral dos potenciais de longa latência dos participantes ficou dentro da normalidade e no de curta latência houve uma média aumentada na latência das ondas III e V da orelha esquerda, bem como no intervalo interpico I-III de ambas as orelhas. Ao relacionar os potenciais auditivos com DV e DVPD, houve significância estatística apenas no intervalo interpico III-V no potencial de curta latência da orelha direita. Ao comparar longa e curta latência nos grupos, houve diferenças nas latências entre DV e DVPD, sem significância estatística.

Conclusão

Não houve relação significativa de DV e DVPD com os potenciais auditivos, porém, nos potenciais de longa latência, os indivíduos com Disfunção Vestibular apresentaram maior latência em P1, N1, P2, N2 e os indivíduos com Disfunção Vestibular Periférica Deficitária, maior latência no P300. No potencial de curta latência, houve um aumento nas latências absolutas no grupo Disfunção Vestibular e nos intervalos interpicos em Disfunção Vestibular Periférica Deficitária.

Descritores
Eletrofisiologia; Potenciais Evocados Auditivos; Testes de Função Vestibular; Tontura; Vertigem

ABSTRACT

Purpose

Evaluate the auditory pathway at the brainstem and cortical levels in individuals with peripheral vestibular dysfunction.

Methods

The study sample was composed 19 individuals aged 20-80 years that presented exam results suggestive of Peripheral Vestibular Disorder (PVD) or Vestibular Dysfunction (VD). Participants underwent evaluation of the auditory pathway through Brainstem Auditory Evoked Potentials (BAEP) (short latency) and P1, N1, P2, N2, and P300 cortical potentials (long latency).

Results

Nine individuals presented diagnosis of VD and 10 participants were diagnosed with PVD. The overall average of the long latency potentials of the participants was within the normal range, whereas an increased mean was observed in the short latency of waves III and V of the left ear, as well as in the I – III interpeak interval of both ears. Association of the auditory potentials with VD and PVD showed statistically significant correlation only in the III – V interpeak interval of the right ear for short latency. Comparison between the long and short latencies in the groups showed differences between VD and PVD, but without statistical significance.

Conclusion

No statistically significant correlation was observed between VD/PVD and the auditory evoked potentials; however, for the long latency potentials, individuals with VD presented higher latency in P1, N1, P2, and N2, where as participants with PVD showed higher latency in P300. In the short latency potentials, there was an increase in the absolute latencies in the VD group and in the interpeak intervals in the PVD group.

Keywords
Electrophysiology; Auditory Evoked Potential; Vestibular Function Tests; Dizziness; Vertigo

INTRODUÇÃO

O equilíbrio e a audição constituem duas das principais habilidades vitais ao ser humano, desempenhando papel fundamental no relacionamento do indivíduo com o meio ambiente. Distúrbios do equilíbrio tornam o indivíduo inseguro e produzem severos prejuízos na sua qualidade de vida, acometendo principalmente idosos (11 Rocha PR Jr, Kozan ES, Moraes JF, Pereira FG, Moreno AB. Reabilitação vestibular na qualidade de vida e sintomatologia de tontura de idosos. Cien Saude Colet. 2014;19(8):3365-74. http://dx.doi.org/10.1590/1413-81232014198.11082013. PMid:25119076.
http://dx.doi.org/10.1590/1413-81232014...
,22 Ferreira LMBM, Ribeiro KMOBF, Pestana ALS, Lima KC. Prevalência de tontura na terceira idade. Rev CEFAC. 2014;16(3):739-46. http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620142913.
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), mas também presente nas demais faixas etárias(33 Munaro G, Silveira AF, Rossi AG, Korbes D, Finkler AD. Contribuição do potencial evocado auditivo em pacientes com vertigem. Rev Bras Otorrinolaringol. 2010;76(3):384-91. ).

A avaliação otoneurológica revela dados importantes sobre a audição, o equilíbrio corporal e suas relações com o Sistema Nervoso Central. Especificamente, a vectoeletronistagmografia (VENG) é um dos métodos mais utilizados para diagnosticar alterações do equilíbrio e, deste modo, auxiliar no diagnóstico das alterações do labirinto(33 Munaro G, Silveira AF, Rossi AG, Korbes D, Finkler AD. Contribuição do potencial evocado auditivo em pacientes com vertigem. Rev Bras Otorrinolaringol. 2010;76(3):384-91. ). Esta avaliação pode revelar Disfunção Vestibular (DV), nos casos em que a prova calórica apresente resultado de hiper-reflexia ou preponderância direcional do nistagmo, ou Disfunção Vestibular Periférica Deficitária (DVPD), nos casos em que a prova calórica apresente resultado de hiporreflexia, arreflexia ou preponderância labiríntica(44 Mor R, Fragoso M. Vestibulometria na prática fonoaudiológica. São Paulo: Pulso; 2012. ).

Sabendo da proximidade anatômica e funcional dos sistemas auditivo e vestibular, que estão localizados no mesmo receptor periférico, mas que percorrem caminhos distintos abrangendo uma vasta região cerebral, acredita-se que há a necessidade de uma avaliação de ambas as porções, que deva incluir além dos testes vestibulares, a avaliação eletrofisiológica da audição, principalmente em indivíduos com queixa de tontura, vertigem ou manifestações associadas(33 Munaro G, Silveira AF, Rossi AG, Korbes D, Finkler AD. Contribuição do potencial evocado auditivo em pacientes com vertigem. Rev Bras Otorrinolaringol. 2010;76(3):384-91. ,55 Matas CG, Silva SM, Wen DDM, Nunes CS, Sanches SGG. Potenciais evocados auditivos em indivíduos com syndrome vestibular periférica. Arq Int Otorrinolaringol. 2011;15(3):308-13. http://dx.doi.org/10.1590/S1809-48722011000300007.
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), a fim de estabelecer um diagnóstico preciso das possíveis etiologias.

Assim, entende-se que, além da porção periférica, deve-se avaliar a porção central da audição, tendo em vista que essas alterações, juntamente com as disfunções vestibulares, podem ser as únicas manifestações de doenças que acometem outros sistemas, por exemplo, no caso da hidropsia endolinfática, ototoxicoses, schwannoma vestibular, casos de traumatismo cranioencefálico, dentre outros(66 Munhoz MSL, Silva MLG, Ganança MM, Caovilla HH. Evidências de distúrbio otoneurológico na história clínica. In: Ganança MM, Munhoz MSL, Caovilla HH, Silva MLG, editores. Otoneurologia ilustrada. São Paulo: Ateneu; 2005. p. 3-4. ). Ainda, alterações do sistema vestibular podem ser indicativas de uma gama de patologias do Sistema Nervoso Central(77 Ganança FF, Fukujima MM, Duarte JA, Bezerra KC, Alves NS, Jomori R, et al. Sinais e sintomas vestibulares e doenças do sistema nervoso central. Rev Equilíbrio Corporal Saúde. 2016;8(1):33-40. ).

Os Potenciais Evocados Auditivos (PEA) podem auxiliar no diagnóstico de indivíduos com alterações vestibulares, investigando a integridade da via auditiva desde a sua porção periférica até o córtex auditivo, uma vez que vestibulopatias podem comprometer ambos os sistemas(33 Munaro G, Silveira AF, Rossi AG, Korbes D, Finkler AD. Contribuição do potencial evocado auditivo em pacientes com vertigem. Rev Bras Otorrinolaringol. 2010;76(3):384-91. ,88 Welsh LW, Welsh JJ, Rosen LG. Evaluation of vertigo byauditory brainstem response. Ann Otol Rhinol Laryngol. 2002;111(8):730-5. http://dx.doi.org/10.1177/000348940211100813. PMid:12184596.
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). Os PEA integrados à avaliação vestibular poderão fornecer informações sobre o local da lesão(55 Matas CG, Silva SM, Wen DDM, Nunes CS, Sanches SGG. Potenciais evocados auditivos em indivíduos com syndrome vestibular periférica. Arq Int Otorrinolaringol. 2011;15(3):308-13. http://dx.doi.org/10.1590/S1809-48722011000300007.
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). Dentre os PEA, podem ser utilizados nesta avaliação os PEA de curta (Potencial Evocado Auditivo de Tronco Encefálico - PEATE), média (Potencial Evocado Auditivo de Média Latência - PEAML) ou longa latência (P1, N1, P2, N2), também conhecidos como potenciais corticais e cognitivo (P300).

Estudos datados da década de 80 e 90(99 Ahmed I. Brainstem auditory evoked potentials indizziness. Clin Electroencephalogr. 1984;15(2):110-5. http://dx.doi.org/10.1177/155005948401500208. PMid:6610504.
http://dx.doi.org/10.1177/1550059484015...

10 Eggermont JJ, Don M, Brackmann DE. Electrocochleography and auditory brainstem electric responses in patients with pontine angle tumors. Ann Otol Rhinol Laryngol Suppl. 1980;89(6):1-19. http://dx.doi.org/10.1177/00034894800890S601. PMid:6779693.
http://dx.doi.org/10.1177/0003489480089...

11 Ojala M, Vaheri E, Larsen TA, Matikainen E, Juntunen J. Diagnostic value of electroencephalography and brainstem auditory evoked potentials in dizziness. Acta Neurol Scand. 1988;78(6):518-23. http://dx.doi.org/10.1111/j.1600-0404.1988.tb03695.x. PMid:3271004.
http://dx.doi.org/10.1111/j.1600-0404.1...
-1212 Cassvan A, Ralescu S, Moshkovski FG, Shapiro E. Brainstem auditory evoked potential studies in patients with tinnitus and/or vertigo. Arch Phys Med Rehabil. 1990;71(8):583-6. PMid:2369295. ) já traziam o indicativo de anormalidades no PEATE em indivíduos com vertigem ou tontura, sendo que a origem do comprometimento eram as alterações centrais. Nas últimas pesquisas brasileiras sobre o tema, estudiosos, ao comparar o PEATE de indivíduos com e sem disfunção vestibular, identificaram que, no grupo estudo, 96% dos indivíduos possuíam valores de latências normais, porém aumentadas em relação ao grupo controle(33 Munaro G, Silveira AF, Rossi AG, Korbes D, Finkler AD. Contribuição do potencial evocado auditivo em pacientes com vertigem. Rev Bras Otorrinolaringol. 2010;76(3):384-91. ). Já em outro estudo(55 Matas CG, Silva SM, Wen DDM, Nunes CS, Sanches SGG. Potenciais evocados auditivos em indivíduos com syndrome vestibular periférica. Arq Int Otorrinolaringol. 2011;15(3):308-13. http://dx.doi.org/10.1590/S1809-48722011000300007.
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), ao avaliar a via auditiva com o PEATE, PEAML e P300 em indivíduos com DVPD e DV de origem periférica, encontraram-se alterações em todos os potenciais.

Diante deste contexto, verifica-se a importância de ampliar as investigações sobre as respostas eletrofisiológicas em indivíduos com DV ou DVPD, visto que os estudos são escassos na literatura e ainda não há um consenso de que os potenciais eletrofisiológicos sejam capazes de identificar alterações otoneurológicas. Sendo assim, o presente estudo poderá contribuir no entendimento do funcionamento da via auditiva nessa população, proporcionando maior clareza no diagnóstico das vestibulopatias, auxiliando no monitoramento da evolução e no tratamento especializado. As alterações nos PEA poderão ser indicativas da necessidade de solicitação de avaliações otoneurológicas integradas e vice-versa. Assim, este estudo vislumbra ampliar a visão dos profissionais no encaminhamento, e a inserção de testes complementares na avaliação clínica com o intuito de enriquecer o diagnóstico e a orientação terapêutica.

Deste modo, o objetivo deste estudo é avaliar a via auditiva em nível de tronco encefálico e cortical em indivíduos com disfunção vestibular periférica.

MÉTODO

Trata-se de um estudo de caráter descritivo, quantitativo e transversal. A pesquisa foi realizada no Ambulatório de Otoneurologia – Setor de Equilíbrio e no ambulatório de Eletrofisiologia da Audição do Hospital Universitário Santa Maria, da Universidade Federal de Santa Maria-RS (UFSM), após a aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade sob o protocolo de número 306.039. O estudo seguiu os preceitos da resolução 466/12.

A amostra deste estudo foi composta por conveniência, com indivíduos que compareceram ao Ambulatório de Otoneurologia para avaliação do equilíbrio, num período de oito meses. Todos os indivíduos convidados a participar da pesquisa, consentiram sua participação por meio da leitura e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Para a casuística do estudo, adotaram-se os seguintes critérios de elegibilidade: idade a partir de 18 anos; apresentar limiares auditivos até 25 dB NA na média das frequências de 250 a 2000 Hz(baixas frequências) e até 50 dB NA na média das frequências de 3000 a 8000 Hz (altas frequências), para evitar que a perda auditiva periférica pudesse influenciar os resultados dos PEA; ausência de comprometimento condutivo; possuir exames vestibulares sugestivos de DVPD ou DV; e ausência de comprometimentos neurológicos e/ou cognitivos, conforme informações do prontuário ou que pudessem ser visíveis.

Os indivíduos que foram agendados pelo serviço do Ambulatório de Otoneurologia, já possuíam resultado de sua audiometria. Deste modo, após a realização dos testes vestibulares, aqueles que apresentavam resultados de DV ou de DVPD e possuíam sua audiometria de acordo com os critérios estabelecidos, foram convidados a participar da pesquisa e, no caso de aceite, foram agendados em outro momento para a realização dos testes eletrofisiológicos. Assim, participaram do estudo 19 indivíduos, com média de idade de 50,1 anos, faixa etária variando de 20 a 80 anos de idade, sendo três do gênero masculino e 16 do gênero feminino.

Para a avaliação do sistema vestibular, foi utilizado o sistema computadorizado de vectoeletronistagmografia (VENG), da marca Contronic, modelo SCV, versão 5.0, o qual realizou a avaliação vestíbulo-oculomotora por meio de uma disposição triangular de eletrodos colocados perto dos olhos, para registro da variação do potencial corneorretinal durante a movimentação dos olhos(44 Mor R, Fragoso M. Vestibulometria na prática fonoaudiológica. São Paulo: Pulso; 2012. ). As avaliações destinaram-se, basicamente, ao registro do nistagmo.

Para a realização do exame vestibular e com o intuito de se obter resultados fidedignos, ressalta-se que todos os indivíduos atenderam às recomendações do preparo prévio para o exame conforme sugere a literatura(44 Mor R, Fragoso M. Vestibulometria na prática fonoaudiológica. São Paulo: Pulso; 2012. ).

Inicialmente foi realizada à limpeza da pele com álcool e os quatro eletrodos foram fixados à pele do indivíduo por meio de pasta eletrolítica e fita adesiva (micropore) na região periorbitária, um em cada canto externo dos olhos, outro na região frontal (terra) e o último, dois dedos acima da glabela (44 Mor R, Fragoso M. Vestibulometria na prática fonoaudiológica. São Paulo: Pulso; 2012. ). Posteriormente, os indivíduos foram posicionados, sentados a 1 m da barra de luzes, com a luminosidade na sala reduzida durante o exame e a VENG foi realizada para observação e registro da calibração dos movimentos oculares; pesquisa do nistagmo espontâneo com os olhos abertos (NEOA) e com olhos fechados (NEOF); pesquisa do nistagmo semiespontâneo (NSE); pesquisa do rastreio pendular; pesquisa do nistagmo optocinético (NOP); prova rotatória pendular decrescente (PRPD) e a pesquisa do nistagmo pós- calórico por meio da prova calórica (44 Mor R, Fragoso M. Vestibulometria na prática fonoaudiológica. São Paulo: Pulso; 2012. ).

Para o presente estudo, consideraram-se, apenas, os resultados obtidos na prova calórica, devido ao fato de ser uma avaliação específica da função vestibular e permitir avaliar cada labirinto separadamente. Utilizou-se a estimulação com água (240 mL) por 40 segundos nas temperaturas de 44 °C e 30 °C, na seguinte sequência: 44 °C-OD, 44 °C-OE, 30 °C-OE e 30 °C-OD; com intervalo de três minutos entre as provas(44 Mor R, Fragoso M. Vestibulometria na prática fonoaudiológica. São Paulo: Pulso; 2012. ), respeitando um intervalo de cinco minutos entre as estimulações. O indivíduo foi posicionado de modo a manter-se em decúbito dorsal com inclinação de 30º em relação ao plano horizontal(44 Mor R, Fragoso M. Vestibulometria na prática fonoaudiológica. São Paulo: Pulso; 2012. ).

Para o registro do nistagmo pós-calórico, os indivíduos se mantiveram de olhos fechados e sob tarefa mental, a fim de maximizar as respostas do reflexo vestíbulo-ocular, sendo instruídos a abrir os olhos e fixá-los em um ponto à sua frente, para que se observasse a presença ou ausência do Efeito da Inibição da Fixação Ocular (EIFO)(44 Mor R, Fragoso M. Vestibulometria na prática fonoaudiológica. São Paulo: Pulso; 2012. ).

Assim, foram considerados indivíduos com DV aqueles em que a prova calórica apresentou resultado de hiper-reflexia ou preponderância direcional do nistagmo. Para a classificação em DVPD, foram considerados aqueles em que a prova calórica apresentou resultado de hiporreflexia, arreflexia ou preponderância labiríntica, de acordo com os critérios de Mor e Fragoso(44 Mor R, Fragoso M. Vestibulometria na prática fonoaudiológica. São Paulo: Pulso; 2012. ).

Num segundo momento então, a avaliação eletrofisiológica foi realizada somente nos indivíduos que aceitaram participar da pesquisa e que se enquadravam nos critérios de inclusão. Foi utilizado o equipamento modelo “ SmartEP”da marca Intelligent Hearing Systems (IHS) , de dois canais, em que a avaliação consistiu na realização do PEALL e do PEATE. Vale ressaltar que o PEALL foi realizado primeiro em virtude de os indivíduos precisarem estar atentos aos estímulos.

Para a realização do PEALL, a pele foi limpa com auxílio de gel esfoliante e os eletrodos foram fixados com pasta condutiva eletrolítica e fita microporosa, ficando o eletrodo ativo no vértex (Cz), os de referência nas mastoides direita e esquerda e o eletrodo terra na fronte (Fpz).

Devido à indisponibilidade de um número maior de eletrodos no equipamento utilizado, não foi possível monitorar a movimentação ocular durante o exame, porém verificou-se que não houve interferência na qualidade, pois foram controlados os números de artefatos. Ainda, a impedância dos eletrodos foi mantida igual ou inferior a 3 Kohm. Os indivíduos mantiveram-se sentados em poltrona confortável, sendo orientados a prestar atenção e contar mentalmente os estímulos diferentes (estímulo raro) que apareceriam, aleatoriamente, dentro de uma série de estímulos iguais (estímulo frequente) e, somente ao final do exame, deveriam falar quantos estímulos raros ouviram. A porcentagem de apresentação dos estímulos raros foi de 20%, enquanto que para estímulos frequentes foi de 80% (paradigma oddball).

Uma série de 300 estímulos (240 frequentes e 60 raros) verbais (sílabas /ba/ - estímulo frequente e /di/ - estímulo raro) foram apresentados de modo binaural, a uma intensidade de 80 dBnHL, utilizando-se fones de inserção, com velocidade de 0.8 estímulos/segundo, polaridade alternada e filtros passa-banda de 1-30Hz. A duração do estímulo /ba/ foi de 114,8 ms e do estímulo /di/, de 209,5 ms. Os valores de latência foram obtidos pela identificação das ondas P1, N1, P2 e N2 no traçado do estímulo frequente e do P300 no traçado do estímulo raro, utilizando como referência de normalidade para esses potenciais os valores propostos em um estudo que também utilizou o mesmo conjunto de estímulos no equipamento “SmartEP”, conforme descrito na Tabela 1(1313 Didoné DD, Oppitz SJ, Folgearini J, Biaggio EPV, Garcia MV. Auditory evoked potentials with different speech stimuli: a comparison and standardization of values. Int Arch Otorhinolaryngol. 2016;20(2):99-104. http://dx.doi.org/10.1055/s-0035-1566133. PMid:27096012.
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).

Tabela 1
Valores de Latência utilizados no PEALL

Não foi realizada a reprodutibilidade do traçado para a marcação das ondas. Elas foram marcadas de acordo com a morfologia dos picos positivos e negativos, e com as latências esperadas. A marcação das ondas foi realizada por uma das pesquisadoras e teve uma Fonoaudióloga como juíza, sendo que houve concordância na marcação em 100% dos traçados.

Ainda, para a classificação dos indivíduos em normal e alterado no P300, foi considerada a idade daqueles que possuíam 60 anos ou mais, tendo em vista o aumento da latência relatada na literatura a partir de 60 anos de idade, de 2,85 ms a cada ano a partir desta faixa etária(1414 Cóser MJS, Cóser PL, Pedroso FS, Rigon R, Cioqueta E. P300 auditory evoked potential latency in elderly. Braz J Otorhinolaryngol. 2010;76(3):287-93. PMid:20658005. ). Inicialmente pensou-se em considerar o aumento da latência nos indivíduos com idade acima de 45 anos, devido aos relatos existentes na literatura, para a ocorrência desse aumento nessa faixa etária(1515 Brown WS, Marsh J, La Rue A. Exponential electrophysiological aging: P300 latency. Electroencephalogr Clin Neurophysiol. 1983;55(3):277-85. http://dx.doi.org/10.1016/0013-4694(83)90205-5. PMid:6186459.
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,1616 Reis ACMB, Frizzo ACF, Isaac ML, Garcia CFD, Funayama CAR, Iório MCM. P300 em indivíduos com perda auditiva sensorioneural. Rev Bras Otorrinolaringol. 2015;81(2):126-32. http://dx.doi.org/10.1016/j.bjorl.2014.10.001.
http://dx.doi.org/10.1016/j.bjorl.2014....
). No entanto, ao visualizar os valores de latência adquiridos, verificou-se que, no grupo de indivíduos com idade entre 45 e 60 anos, houve ausência do potencial P300 na maioria dos indivíduos, sendo estes classificados como alterados, juntamente com quem já apresentava um aumento de latência independentemente da idade adulta ou idosa, que ocorreu em apenas um indivíduo. Foram classificados como normais neste mesmo grupo, aqueles que estavam dentro dos padrões tanto para adultos com menos de 45 anos, como para adultos de maior idade, pois o valor se encaixava em qualquer critério, como pode ser observado na Tabela 2 .

Tabela 2
Valores de latência encontrados nos potenciais P1, N1, P2, N2 e P300 e de latências absolutas e intervalos interpicos do PEARE em todos os indivíduos da pesquisa

Assim, entendeu-se que dividir os indivíduos numa faixa etária acima de 45 anos não seria necessário, pois essa divisão não influenciaria os resultados, decidindo-se, assim, considerar apenas o aumento da latência para os indivíduos com idade acima de 60 anos. Em seguida, foi realizado o registro do PEATE, no qual, o eletrodo ativo foi posicionado em Fz (fronte), permanecendo os outros nos mesmos locais, e a impedância dos eletrodos ainda mantida igual ou inferior a 3 Kohm . Os indivíduos permaneceram sentados em poltrona e foram instruídos a ficar com os olhos fechados e relaxados, a fim de diminuir interferências no exame.

O PEATE foi realizado somente para pesquisa qualitativa da via auditiva. Utilizou-se o clique como estímulo acústico, em polaridade rarefeita, apresentado de forma monoaural na intensidade de 80 dBnHL, em ambas as orelhas, com o uso de fones de inserção, em uma velocidade de apresentação de 27,7 cliques/segundo, duração de 0,1 milissegundos, sendo empregado um total de 2048 estímulos em cada orelha. Foram registradas duas ondas em cada orelha, para a reprodução dos traçados e confirmação da existência de respostas. Foram analisadas as latências absolutas das ondas I, III e V e os intervalos interpicos I-III, III-V e I-V. Os resultados foram classificados como normal ou alterado com base nos valores fornecidos pelo próprio fabricante, em tabela que acompanha o equipamento, conforme valores expostos na Tabela 3 .

Tabela 3
Valores de latência absoluta e intervalos interpicos utilizados no PEATE

Na Figura 1 , tem-se uma amostra de como foi realizado o registro e marcação dos potenciais P1, N1, P2, N2, P300 e do PEATE em um indivíduo participante da pesquisa.

Figura 1
Demonstrativo de registro e marcação do PEALL e do PEATE

Foram considerados resultados significantes quando p≤0,05 com intervalo de confiança de 95%. Os testes estatísticos utilizados foram o teste de Qui-quadrado, para medir o grau de relação entre DV e DVPD com PEALL e PEATE, e o teste de Mann-Whitney para comparar DV e DVPD para os valores quantitativos de PEALL e PEATE.

RESULTADOS

Dos 19 participantes do estudo, três foram homens e 16 mulheres com idade mínima de 20 e máxima de 80 anos, com média de 50,1 anos. Dentre os indivíduos, seis apresentaram idade acima dos 60 anos e os outros 13, entre 20 e 59 anos. Apesar da grande faixa etária avaliada, a amostra demonstrou-se homogênea, pois o coeficiente de variação apresentou-se em 37%, ou seja, abaixo de 50%. Ainda o intervalo de confiança foi baixo (8,3), o que permite dizer que a média da idade foi de 50,1 ± 8,3 anos.

Quanto aos limiares auditivos, nove indivíduos apresentaram limiares normais em todas as frequências, quatro participantes apresentaram limiares normais na média das baixas frequências e perda auditiva neurossensorial até 40 dB NA nas altas frequências e seis indivíduos, limiares normais nas baixas frequências e perda neurossensorial até 50 dB NA nas altas frequências.

Dos participantes, nove apresentaram diagnóstico de DV e 10 de DVPD. Daqueles que apresentaram DV, sete apresentaram resultado de hiper-reflexia e dois de preponderância direcional do nistagmo (PDN). Dos que apresentaram diagnóstico de DVPD, um apresentou resultado de arreflexia, sete de preponderância labiríntica e dois de hiporreflexia.

Na Tabela 4 , evidencia-se a descritiva completa de todos os indivíduos avaliados, demonstrando dentre outros, e média para os valores de latência do PEALL, PEATE e intervalo interpico das ondas do PEATE por orelha.

Tabela 4
Descritiva Completa da latência do PEALL, do PEATE e Intervalo Interpico do PEATE por orelha

Nas Tabelas 5 e 6 , tem-se, respectivamente, a medida do grau de relação de DV e DVPD para o PEALL e para latência absoluta e intervalo interpico do PEATE por orelha. Nota-se significância estatística apenas no intervalo interpico III-V da orelha direita no PEATE.

Tabela 5
Relação entre os resultados obtidos na vectoeletronistagmografia (DV e DVPD) e o PEALL (N1, N2, P1, P2 e P300) normal e alterado, em ambas as orelhas
Tabela 6
Relação entre os resultados obtidos na vectoeletronistagmografia (DV e DVPD) e Latência absoluta (I, III e V) e Intervalo Interpico (I-III, I-V e III-V) do PEATE normal e alterado, em ambas as orelhas

Nas Tabelas 7 e 8 , tem-se respectivamente o resultado da comparação dos PEALL e do PEATE, com os resultados da avaliação vestibular (DV ou DVPD).

Tabela 7
Comparação entre os resultados obtidos na vectoeletronistagmografia (DV e DVPD) para a latência de cada PEALL (P1, N1, P2, N2 e P300) em ambas as orelhas
Tabela 8
Comparação entre os resultados obtidos na vectoeletronistagmografia (DV e DVPD) para as latências absolutas (I, III e V) e intervalos interpicos (I-III, I-V e III- V) do PEATE, em ambas as orelhas

DISCUSSÃO

Ao analisar as características dos participantes do presente estudo, pôde-se observar uma vasta faixa etária, semelhante a outros estudos já realizados em indivíduos com disfunção vestibular(33 Munaro G, Silveira AF, Rossi AG, Korbes D, Finkler AD. Contribuição do potencial evocado auditivo em pacientes com vertigem. Rev Bras Otorrinolaringol. 2010;76(3):384-91. ,55 Matas CG, Silva SM, Wen DDM, Nunes CS, Sanches SGG. Potenciais evocados auditivos em indivíduos com syndrome vestibular periférica. Arq Int Otorrinolaringol. 2011;15(3):308-13. http://dx.doi.org/10.1590/S1809-48722011000300007.
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,1717 Almeida LD, Mitre ED, Lemos L, Simões ECC. Vestibulometria em indivíduos com zumbido e exames audiológicos normais. Rev CEFAC. 2005;7(3):382-7. ), tendo em vista que as alterações do labirinto podem ocorrer nas diferentes faixas etárias, desde indivíduos muito jovens até idosos, o que justifica uma ampla faixa etária avaliada(44 Mor R, Fragoso M. Vestibulometria na prática fonoaudiológica. São Paulo: Pulso; 2012. ). No entanto, a idade dos indivíduos foi considerada homogênea nesta amostra, visto que o coeficiente de variação ficou abaixo de 50%.

Em relação à descrição do PEALL, nota-se que a média de todos os participantes ficou dentro dos padrões esperados de latência em todos os potenciais, em ambas as orelhas ( Tabela 4 ). Vale ressaltar novamente que foi considerado o aumento da idade nos seis indivíduos maiores de 60 anos para a classificação em normal e alterado na latência do P300, pois se sabe que o envelhecimento por si só é capaz de provocar aumento na latência dos potenciais(1313 Didoné DD, Oppitz SJ, Folgearini J, Biaggio EPV, Garcia MV. Auditory evoked potentials with different speech stimuli: a comparison and standardization of values. Int Arch Otorhinolaryngol. 2016;20(2):99-104. http://dx.doi.org/10.1055/s-0035-1566133. PMid:27096012.
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). Assim, considerou-se um acréscimo de 2,85 ms de latência a cada ano de vida acima dos 60 anos(1414 Cóser MJS, Cóser PL, Pedroso FS, Rigon R, Cioqueta E. P300 auditory evoked potential latency in elderly. Braz J Otorhinolaryngol. 2010;76(3):287-93. PMid:20658005. ), sobre o valor utilizado como referência para adultos(1313 Didoné DD, Oppitz SJ, Folgearini J, Biaggio EPV, Garcia MV. Auditory evoked potentials with different speech stimuli: a comparison and standardization of values. Int Arch Otorhinolaryngol. 2016;20(2):99-104. http://dx.doi.org/10.1055/s-0035-1566133. PMid:27096012.
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). Deste modo, só permaneceram alterados aqueles que apresentaram latência superior a essa soma, ou aqueles que demonstraram ausência do potencial, a fim de descartar interferências do processo de envelhecimento.

Já em relação à descritiva geral do PEATE, este demonstrou-se normal na média das latências absolutas das ondas I, III e V apenas na orelha direita (OD), pois, na orelha esquerda (OE), apresentou uma média aumentada na latência das ondas III e V, bem como no intervalo interpico I-III de ambas as orelhas. Porém, esse aumento de latência absoluta foi discreto, estando a onda III da OE 0,06 ms aumentada na média em relação ao padrão de normalidade utilizado, a onda V 0,09 ms aumentada, o intervalo interpico I-III da OD com um aumento médio de 0,08 ms e no mesmo intervalo da OE, um aumento de 0,28 ms ( Tabela 4 ).

Ao analisar os resultados normais e alterados de todos os PEA para os grupos DV e DVPD ( Tabela 5 e 6 ), no geral, não se identificou relação com as disfunções vestibulares, tanto no PEALL quanto no PEATE, visto pela ausência de significância estatística. Houve exceção em apenas um item que evidenciou significância estatística, demonstrando um predomínio de indivíduos com alteração na latência do intervalo interpico III-V da OD, corroborando os resultados de um estudo (55 Matas CG, Silva SM, Wen DDM, Nunes CS, Sanches SGG. Potenciais evocados auditivos em indivíduos com syndrome vestibular periférica. Arq Int Otorrinolaringol. 2011;15(3):308-13. http://dx.doi.org/10.1590/S1809-48722011000300007.
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), que também encontrou diferença neste mesmo intervalo, porém ao comparar os grupos controle e DVPD, sendo a causa desse resultado não estabelecida pelos autores. Em contrapartida, outros estudiosos(33 Munaro G, Silveira AF, Rossi AG, Korbes D, Finkler AD. Contribuição do potencial evocado auditivo em pacientes com vertigem. Rev Bras Otorrinolaringol. 2010;76(3):384-91. ) não evidenciaram alterações nos intervalos interpicos de indivíduos com disfunção vestibular, comparados a indivíduos normais.

Acredita-se que discretas alterações na via auditiva central podem ter trazido algumas alterações no PEATE associadas a possíveis vestibulopatias, uma vez que os indivíduos avaliados possuíam limiares tonais capazes de eliciar todas as ondas com latências dentro do esperado(33 Munaro G, Silveira AF, Rossi AG, Korbes D, Finkler AD. Contribuição do potencial evocado auditivo em pacientes com vertigem. Rev Bras Otorrinolaringol. 2010;76(3):384-91. ).

Na comparação entre DV e DVPD, para a latência de cada PEALL ( Tabela 7 ), apesar da inexistência de significância estatística, constatou-se um aumento na média da latência dos potenciais corticais (P1, N1, P2, N2) no grupo DV e do potencial cognitivo (P300) no grupo DVPD. Do mesmo modo, observou-se o aumento nas latências absolutas do PEATE no grupo DV e dos intervalos interpicos no grupo DVPD, mesmo que em ambos os grupos as latências estivessem dentro do esperado e sem significância estatística ( Tabela 8 ). Diante disso, foi feita uma análise da média de idade dos indivíduos com DV e com DVPD, para entender se a idade destes poderia estar contribuindo para tais resultados, e constatou-se média de 45 anos para DV e de 54 anos para DVPD.

Assim, se pensarmos no potencial cognitivo P300 que pode ser influenciado pelo aumento da idade, poderíamos dizer que seria uma causa do seu aumento de latência no grupo DVPD, porém já foi relatado anteriormente que a idade dos indivíduos até 60 anos não modificaria o resultado da pesquisa. Ainda, o que explicaria no grupo DV os indivíduos mais jovens possuírem maior latência para os potenciais corticais?

Deste modo, entendeu-se que a idade dos indivíduos pode não ter sido o principal motivo a causar tais resultados, e sim a própria classificação do indivíduo em DV ou DVPD, demonstrando com isso que o tipo de disfunção vestibular pode ser a causa para modificações nos potenciais, mesmo que pequenas entre si.

De qualquer modo, esses dados corroboram outro estudo(33 Munaro G, Silveira AF, Rossi AG, Korbes D, Finkler AD. Contribuição do potencial evocado auditivo em pacientes com vertigem. Rev Bras Otorrinolaringol. 2010;76(3):384-91. ) no que se refere aos resultados do PEATE por estarem dentro dos padrões de normalidade tanto em indivíduos normo-ouvintes quanto com perda auditiva, apesar de referirem que houve um aumento das latências absolutas em relação a indivíduos sem disfunção vestibular. Esse estudo utilizou como referência de normalidade um grupo controle com indivíduos com limiares auditivos normais e sem queixa ou alterações vestibulares.

Outro estudo(55 Matas CG, Silva SM, Wen DDM, Nunes CS, Sanches SGG. Potenciais evocados auditivos em indivíduos com syndrome vestibular periférica. Arq Int Otorrinolaringol. 2011;15(3):308-13. http://dx.doi.org/10.1590/S1809-48722011000300007.
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) também não verificou diferença do PEATE entre um grupo controle composto por indivíduos com queixa de vertigem e exame vestibular normal e outros dois grupos de indivíduos, sendo um com DV e outro com DVPD. Porém, os autores encontraram alteração no PEATE em todos os grupos e sugeriram que os indivíduos com queixa de vertigem podem apresentar alterações no PEATE. No entanto, o estudo foi realizado com indivíduos que apresentavam perda auditiva de até 55 dB NA nas frequências de 250 a 2000 Hz e até 60 dB NA de 3000 a 6000 Hz, o que pode ter interferido nos resultados do PEATE, pois, mesmo que ele possa ser realizado com perdas periféricas de grau até moderado, a perda auditiva pode alterar a morfologia do registro(1818 Watson DR. A study of the effects of coclear loss on the auditory brainstem response (ABR) specificity and false positive rate in retrococlear assessment. Audiology. 1999;38(3):155-64. http://dx.doi.org/10.3109/00206099909073017. PMid:10437686.
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,1919 Matas CG, Leite RA, Gonçalves IC, Neves IF. Brainstem auditory evoked potential in individuals with conductive and sensorineural hearing losses. int Arch Otorhinolaryngol. 2005;9(4):280-6. ), diferente do atual estudo que utilizou médias auditivas de até 25 dB NA nas baixas frequências e até 50 dB NA nas altas frequências.

Os mesmos autores(55 Matas CG, Silva SM, Wen DDM, Nunes CS, Sanches SGG. Potenciais evocados auditivos em indivíduos com syndrome vestibular periférica. Arq Int Otorrinolaringol. 2011;15(3):308-13. http://dx.doi.org/10.1590/S1809-48722011000300007.
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) também realizaram o P300 e encontraram relação deste com o grupo DVPD. O atual estudo corrobora com esses resultados, mesmo que não tenha verificado significância estatística, pois observou aumento de latência nesse grupo. De qualquer modo, nota-se no estudo citado que houve um número maior de indivíduos com normalidade nas latências, tanto do PEATE quanto do P300, o que não foi observado no atual estudo, em que houve um número maior de indivíduos alterados, mesmo sem significância estatística.

É esperado que o PEATE apresente-se normal nos indivíduos com limiares auditivos normais ou com perdas auditivas até moderadas, que não possuam comprometimentos condutivos periféricos ou de ordem central. Sendo assim, os resultados do presente estudo, mesmo não apresentando significância estatística, sugerem que as disfunções vestibulares periféricas possuem certas influências sobre os resultados do PEATE e do P300, ao fazer uma análise em conjunto com os outros estudos já citados. Porém, não se sabe se somente a tontura e o diagnóstico de DV ou DVPD são capazes de demonstrar essas alterações ou se há outros fatores que contribuíram para tal resultado.

Quanto aos potencias corticais, não foram encontrados estudos na literatura que tivessem avaliado esses potenciais em indivíduos com disfunção vestibular, o que dificultou a discussão desses achados, assim como também são poucos os estudos com os demais PEA. É possível entender esse fato, pois se olharmos para a prática clínica, a avaliação otoneurológica é composta basicamente por VENG, posturografia, vídeo-hit e Potencial Miogênico Evocado Vestibular (VEMP). Mas por que poucos falam dos PEA? Por que os PEA não são utilizados na prática clínica? É por que não existe comprovação científica para essa relação?

É mais provável que a resposta seja pela falta de comprovação científica e por saber que envolve estruturas anatômicas diferentes na avaliação pela VENG ou por PEA, por exemplo. No entanto, podemos nos questionar o que essas respostas alteradas podem nos dizer, pois, se alguns estudos encontraram relação(55 Matas CG, Silva SM, Wen DDM, Nunes CS, Sanches SGG. Potenciais evocados auditivos em indivíduos com syndrome vestibular periférica. Arq Int Otorrinolaringol. 2011;15(3):308-13. http://dx.doi.org/10.1590/S1809-48722011000300007.
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) e outros não encontraram significância estatística, mas observaram diferenças(33 Munaro G, Silveira AF, Rossi AG, Korbes D, Finkler AD. Contribuição do potencial evocado auditivo em pacientes com vertigem. Rev Bras Otorrinolaringol. 2010;76(3):384-91. ) (assim como no atual estudo), isso pode nos dizer algo, que talvez não tenha relação com o diagnóstico de DV e DVPD, mas, sim, com outros sintomas ou patologias associadas aos indivíduos que possuem disfunções vestibulares, como o zumbido que muitos relatam e que não entrou no mérito deste estudo.

Deste modo, vale pensar que uma análise de outras variáveis, como zumbido, cognição, atenção etc., pode fornecer informações que respondam essas dúvidas. Se pensarmos, por exemplo, sobre a importância de o indivíduo possuir boa atenção e cognição no momento que está realizando a prova calórica para se manter sob tarefa mental, a fim de maximizar as respostas do reflexo vestíbulo-ocular, e também para a realização do P300, poderíamos inferir que aquele que possui dificuldade nesses quesitos poderá apresentar alteração no P300, bem como influenciar o resultado da prova calórica, inibindo a resposta. Esse fato pode sugerir que uma avaliação da atenção e cognição possa servir como complemento, no sentido de descartar essas alterações nos testes e ter uma resposta fidedigna quanto à relação dos potenciais, ocorrendo a mesma coisa com o PEATE, se o indivíduo possuir zumbido, pois existem estudos que demonstram que o zumbido pode causar alterações neste potencial(2020 Kehrle HM, Granjeiro RC, Sampaio AL, Bezerra R, Almeida VF, Oliveira CA. Comparison of auditory brainstem response results in normal-hearing patients with and without tinnitus. Arch Otolaryngol Head Neck Surg. 2008;134(6):647-51. http://dx.doi.org/10.1001/archotol.134.6.647. PMid:18559734.
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,2121 Schaette R, McAlpine D. Tinnitus com um audiograma normal: evidência fisiológica para perda auditiva oculta e modelo computacional. J Neurosci. 2011;31(38):13452-7. http://dx.doi.org/10.1523/JNEUROSCI.2156-11.2011. PMid:21940438.
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). Além disso, um estudo evidenciou alterações vestibulares em 21 de 30 indivíduos com zumbido e sem queixa de tontura(1717 Almeida LD, Mitre ED, Lemos L, Simões ECC. Vestibulometria em indivíduos com zumbido e exames audiológicos normais. Rev CEFAC. 2005;7(3):382-7. ).

Outra limitação verificada nessa pesquisa foi a dificuldade na adesão da amostra para realizar a bateria de procedimentos, principalmente quando se tratou de comparecer em dois dias distintos com longos tempos de avaliação, o que limitou o tamanho da amostra e pode ter influenciado os resultados, que, apesar de verificar um número maior de alterações, não demonstrou ser estatisticamente significante. Assim, acredita-se que estudos com amostras maiores possam revelar outras informações a respeito da contribuição ou não dos PEA na avaliação otoneurológica, bem como o uso de avaliações complementares, que descartem outras alterações associadas, como no caso da doença de Ménière em que os indivíduos podem possuir tontura e zumbido(33 Munaro G, Silveira AF, Rossi AG, Korbes D, Finkler AD. Contribuição do potencial evocado auditivo em pacientes com vertigem. Rev Bras Otorrinolaringol. 2010;76(3):384-91. ).

Por mais que não tenha sido demonstrada significância estatística nos resultados, não se pode negar o fato de que houve algumas alterações que puderam nos dar informações complementares, por exemplo, de que outros sistemas podem ser acometidos em indivíduos com tontura, não sendo necessariamente causados pelo diagnóstico de DV e DVPD, mas, sim, por outros sintomas ou patologias associadas e que poderão auxiliar em outras condutas ou tratamentos e, aí, sim, poderem contribuir para avaliação clínica dos indivíduos com vestibulopatias.

CONCLUSÃO

Não houve relação significativa de DV e DVPD com os potenciais auditivos, porém, no PEALL, os indivíduos com DV apresentaram maior latência nos potenciais corticais (P1, N1, P2, N2) e os indivíduos com DVPD, maior latência do potencial cognitivo (P300). No PEATE, houve um aumento nas latências absolutas no grupo DV e nos intervalos interpicos em DVPD. Assim, acredita-se que outros fatores associados à tontura podem ter contribuído para esse resultado.

  • Trabalho realizado no Departamento de Fonoaudiologia, Universidade Federal de Santa Maria – UFSM - Santa Maria (RS), Brasil.
  • Fonte de financiamento: nada a declarar.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2018

Histórico

  • Recebido
    26 Jan 2017
  • Aceito
    15 Set 2017
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