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Perspectivas e práticas de apoio educativo aos alunos com transtornos da linguagem em Portugal

RESUMO

Objetivo

Contribuir para o conhecimento das perspectivas e práticas de apoio educativo aos alunos com transtornos da linguagem em contextos inclusivos em Portugal.

Método

Após revisão da bibliografia sobre o tema, foi elaborado um questionário, posteriormente aplicado a 123 professores do ensino regular. Para a análise dos dados recolhidos, foi realizada uma análise estatística descritiva e inferencial das variáveis dependentes, utilizando testes paramétricos.

Resultados

A análise descritiva revela que a maioria dos professores conhece o conceito de transtornos da linguagem e considera importante compreender o desenvolvimento da linguagem ao lidar com alunos com essa problemática. No entanto, mais da metade dos inquiridos acha que não possui formação nem informações suficientes acerca da aquisição e do desenvolvimento da linguagem e também não concorda que possua competências suficientes para contribuir para a identificação de alunos com transtornos da linguagem. Os resultados relativos à análise inferencial revelam diferenças estatisticamente significativas no que diz respeito ao gênero, ao tempo de serviço e ao distrito. Os resultados obtidos demonstram boas qualidades métricas no que se refere à consistência interna.

Conclusão

Os resultados evidenciam a necessidade de formação e informação dos professores acerca da aquisição e do desenvolvimento da linguagem e, mais especificamente, dos transtornos da linguagem. Demonstram também que os professores do ensino regular poder-se-ão deparar com dificuldades no apoio educativo aos alunos com transtornos da linguagem e, particularmente, em delinear estratégias adequadas às suas necessidades, nomeadamente na elaboração de programas educativos individualizados.

Descritores
Linguagem; Transtornos da Linguagem; Ensino; Apoio Educativo; Análise Quantitativa

ABSTRACT

Purpose

To analyze how students with Language Disorders receive remedial teaching in inclusive settings in Portugal.

Methods

We developed a questionnaire based on the literature review, and applied it to 123 elementary teachers in Portugal. We performed a descriptive and inferential statistical analysis of the dependent variables using parametric tests.

Results

Descriptive analysis revealed that most teachers know the concept of language disorders and consider it important to the development of language when supporting students with this problem. However, over half of the respondents answered that they have no training and enough information about the acquisition and development of language, and don´t consider having sufficient knowledge to contribute to the identification of students with language disorders. Results for inferential statistics showed statistically significant differences regarding gender; length of service and district, as well as a good internal consistency in relation to the questionnaire.

Conclusion

Results highlight the need for training and information about acquisition and development of language, and more specifically in relation to language disorders. It also showed that elementary teachers may find difficulties in intervention with students with language disorders, and particularly, to adequate strategies to their needs, particularly when developing Individualized Educational Programs for their students in a team.

Keywords
Language; Language Disorders; Teaching; Remedial Teaching; Quantitative Analysis

INTRODUÇÃO

Neste estudo, pretende-se abordar as perspectivas e práticas de apoio educativo aos alunos com transtornos da linguagem (TL) em contextos inclusivos das escolas regulares portuguesas. Para tal, salienta-se a necessidade de definir linguagem e suas componentes, as perspectivas de apoio educativo aos alunos com TL numa escola inclusiva, a importância da identificação e apoio precoce e eficaz relativamente a dificuldades na linguagem como forma de prevenir problemas na linguagem oral que surgem em idade escolar. Também serão descritas e analisadas as perspectivas dos professores portugueses relativamente ao conceito de TL e ao tipo de apoio prestado nas escolas portuguesas a esses alunos.

No âmbito da educação inclusiva, ao conhecer e estudar o desenvolvimento normal da linguagem oral, conseguir-se-á, mediante intervenções eficazes e apropriadas às caraterísticas e às necessidades individuais das crianças, reduzir as dificuldades delas e melhorar seus resultados acadêmicos, sendo esse processo tanto mais eficaz quanto mais precocemente for implementado. Assim, torna-se crucial que toda a comunidade educativa entenda e utilize, de igual forma, a terminologia dos TL, para tornar possível a identificação/o diagnóstico precoce dessas crianças(11 Bishop DV, Snowling MJ, Thompson PA, Greenhalgh T. Phase 2 of CATALISE: a multinational and multidisciplinary Delphi consensus study of problems with language development: terminology. J Child Psychol Psychiatry. 2017;58(10):1068-80. http://dx.doi.org/10.1111/jcpp.12721. PMid:28369935.
http://dx.doi.org/10.1111/jcpp.12721...
). É necessário que profissionais e pais entendam que a identificação poderá proporcionar intervenção apropriada e atempada a essas crianças.

As estratégias de intervenção atualmente delineadas visam seguir uma perspectiva de escola inclusiva, em que esta pretende trazer os serviços às crianças, nomeadamente à escola onde se encontram inseridas de seus pares. Deste modo, uma educação inclusiva vai, consequentemente, originar que os intervencionistas da linguagem, os terapeutas da fala, os professores e educadores trabalhem com os colegas e familiares das crianças, em equipas de colaboração nos contextos escolares. Como resultado, tais profissionais desempenham, cada vez mais, um papel fundamental no apoio às crianças com TL em contextos escolares. Ao assumirem um papel crucial na educação das crianças com TL, os profissionais têm que ter formação adequada, tanto na área da linguagem e comunicação como em matéria das necessidades educativas especiais (NEE)(22 Santos LM, Friche AA, Lemos SM. Conhecimento e instrumentalização de professores sobre desenvolvimento de fala: ações de promoção de saúde. Rev CEFAC. 2011;13(4):645-56. http://dx.doi.org/10.1590/S1516-18462011005000011.
http://dx.doi.org/10.1590/S1516-18462011...
,33 Wilson L, McNeill B, Gillon GT. Inter-professional education of prospective speech-language therapists and primary school teachers through shared professional practice placements. Int J Lang Commun Disord. 2017;52(4):426-39. http://dx.doi.org/10.1111/1460-6984.12281. PMid:27624388.
http://dx.doi.org/10.1111/1460-6984.1228...
). A identificação das crianças que possam apresentar atraso ou problemas na linguagem tornou-se uma questão fundamental na avaliação, de forma a identificar aquelas em risco de desenvolverem problemas acadêmicos, sociais e comportamentais(44 Fricke S, Millard G. A setting-based oral Language Intervention for nursery-aged children with english as an additional language. In: Murphy VA, Evangelou M, editores. Early childhood education in english for speakers of other languages. London: British Council; 2016. p. 171-86.). Torna-se, assim, evidente que crianças com transtornos da fala e transtornos de linguagem revelam geralmente indicações precoces da necessidade de serviços de educação especial. Deste modo, é importante que as escolas invistam tempo e recursos nesses aspectos para construir alicerces ao desenvolvimento da literacia e do sucesso acadêmico(44 Fricke S, Millard G. A setting-based oral Language Intervention for nursery-aged children with english as an additional language. In: Murphy VA, Evangelou M, editores. Early childhood education in english for speakers of other languages. London: British Council; 2016. p. 171-86.,55 Oliveira RB, Bidarra MG, Vaz-Rebelo M. Práticas de colaboração para inclusão de alinos com necessidades educativas especiais nas escolas portuguesas: perceções de professores e equipa técnico-pedagógica. Saber & Educar. 2017;(23):70-9. http://dx.doi.org/10.17346/se.vol23.288.
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).

A filosofia da inclusão contribuiu para que ocorressem mudanças na organização dos serviços de apoio a crianças com transtornos de comunicação (transtornos da linguagem e/ou da fala). A implementação de modelos de atendimento, ditos tradicionais, traduz-se na intervenção isolada dos professores com um grupo de crianças, na intervenção isolada dos intervencionistas da linguagem ou terapeutas da fala com outro grupo de crianças e no apoio dado pelos pais à criança em casa. A existência de serviços de apoio adequados aos contextos escolares possibilita que os profissionais e pais colaborem, que partilhem as experiências e conhecimentos e que os profissionais assumam a responsabilidade de maximizar o apoio das competências linguísticas e comunicativas na sala de aula.

Tais serviços de apoio consideram as necessidades, as capacidades e a forma de viver de todas as crianças, tendo em conta a diversidade existente na sala, com a implementação de programas educativos e a articulação entre os programas e os projetos educativos(55 Oliveira RB, Bidarra MG, Vaz-Rebelo M. Práticas de colaboração para inclusão de alinos com necessidades educativas especiais nas escolas portuguesas: perceções de professores e equipa técnico-pedagógica. Saber & Educar. 2017;(23):70-9. http://dx.doi.org/10.17346/se.vol23.288.
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,66 Vieira-Rodrigues MMM, Sanches-Ferreira MMP. A inclusão de crianças com necessidades educativas especiais no ensino regular em Portugal: a opinião de educadores de infância e de professores do 1º ciclo do ensino público e privado. Rev Bras Educ Espec. 2017;23(1):37-55. http://dx.doi.org/10.1590/s1413-65382317000100004.
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).

Atualmente, os procedimentos de intervenção para essas crianças baseiam-se em estratégias e métodos implementados nos ambientes onde a criança está inserida junto de seus pares(55 Oliveira RB, Bidarra MG, Vaz-Rebelo M. Práticas de colaboração para inclusão de alinos com necessidades educativas especiais nas escolas portuguesas: perceções de professores e equipa técnico-pedagógica. Saber & Educar. 2017;(23):70-9. http://dx.doi.org/10.17346/se.vol23.288.
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,66 Vieira-Rodrigues MMM, Sanches-Ferreira MMP. A inclusão de crianças com necessidades educativas especiais no ensino regular em Portugal: a opinião de educadores de infância e de professores do 1º ciclo do ensino público e privado. Rev Bras Educ Espec. 2017;23(1):37-55. http://dx.doi.org/10.1590/s1413-65382317000100004.
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).

A eficácia da inclusão de crianças com transtornos de comunicação (transtornos de linguagem e/ou fala) não tem tanto a ver com a gravidade do problema, mas sim com apoio apropriado. O modo como os profissionais (intervencionistas da linguagem, terapeutas da fala, professores, educadores etc.) implementam as atividades nos ambientes de ensino-aprendizagem, de forma a reconhecer, apoiar e desenvolver todas as capacidades da criança, é fundamental, verificando-se que práticas de colaboração adequadas resultam em aquisições para a criança(33 Wilson L, McNeill B, Gillon GT. Inter-professional education of prospective speech-language therapists and primary school teachers through shared professional practice placements. Int J Lang Commun Disord. 2017;52(4):426-39. http://dx.doi.org/10.1111/1460-6984.12281. PMid:27624388.
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,77 Martins R, Freitas P, Carvalho O, Pascoinho J. Intervenção precoce: práticas e representações. Revista Educação Especial. 2018;31(62):495-512. http://dx.doi.org/10.5902/1984686X28819.
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). Desenvolver linhas de orientação práticas, para organizar a intervenção, de forma colaborativa, com o objetivo de responder às necessidades de todas as crianças incluídas nas classes regulares, deverá ser uma exigência dos procedimentos, de forma a garantir que elas recebam os serviços adequados na escola(66 Vieira-Rodrigues MMM, Sanches-Ferreira MMP. A inclusão de crianças com necessidades educativas especiais no ensino regular em Portugal: a opinião de educadores de infância e de professores do 1º ciclo do ensino público e privado. Rev Bras Educ Espec. 2017;23(1):37-55. http://dx.doi.org/10.1590/s1413-65382317000100004.
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,77 Martins R, Freitas P, Carvalho O, Pascoinho J. Intervenção precoce: práticas e representações. Revista Educação Especial. 2018;31(62):495-512. http://dx.doi.org/10.5902/1984686X28819.
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).

As dificuldades experienciadas pelas crianças com TL aos níveis da compreensão da linguagem oral, da perceção auditiva, da memória e word finding and retrieval parecem traduzir-se em dificuldades nas competências da leitura, escrita e soletração, sendo tal fato considerado uma forte evidência na relação entre as dificuldades da linguagem oral e a literacia(44 Fricke S, Millard G. A setting-based oral Language Intervention for nursery-aged children with english as an additional language. In: Murphy VA, Evangelou M, editores. Early childhood education in english for speakers of other languages. London: British Council; 2016. p. 171-86.,88 Messer D, Dockrell J. Children’s naming and word-finding difficulties: descriptions and explanations. J Speech Lang Hear Res. 2006;49(2):309-24. http://dx.doi.org/10.1044/1092-4388(2006/025). PMid:16671846.
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,99 Molina FP, Robertson XA. Didactics strategies to develop the narrative discourse in preschool childreen with specific language impairment. Rev Signos. 2018;51:410-29.).

Os modelos de apoio passaram por bastantes modificações, transformando-se em modelos colaborativos, uma vez que há um objetivo cada vez mais determinado em proporcionar intervenção na linguagem, na sala regular ou em outros contextos habituais da criança e implementar estratégias de intervenção mais adequadas às crianças com TL.

Com as diretrizes mais recentes, pretende-se que os profissionais especializados em linguagem, além de prestarem apoio direto e ensinar em equipe, também participem das decisões de planificação, coordenação e monitorização do desenvolvimento linguístico da criança. Tais profissionais partilham a responsabilidade de ensinar para toda a turma, em colaboração com o professor do ensino regular(33 Wilson L, McNeill B, Gillon GT. Inter-professional education of prospective speech-language therapists and primary school teachers through shared professional practice placements. Int J Lang Commun Disord. 2017;52(4):426-39. http://dx.doi.org/10.1111/1460-6984.12281. PMid:27624388.
http://dx.doi.org/10.1111/1460-6984.1228...
,77 Martins R, Freitas P, Carvalho O, Pascoinho J. Intervenção precoce: práticas e representações. Revista Educação Especial. 2018;31(62):495-512. http://dx.doi.org/10.5902/1984686X28819.
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). Além de partilharem as responsabilidades de ensinar, essa equipe multidisciplinar partilha igualmente as resoluções de problema e as tomadas de decisão para todas as crianças (com e sem TL).

Entender o desenvolvimento da linguagem na criança, desde o nascimento e durante os primeiros anos de vida, é crucial para a melhor compreensão do processo de comunicação entre a criança e os indivíduos que lhe são próximos, considerando que o desenvolvimento da linguagem obedece a um processo sequencial e universal(1010 Owens R. Language development: an introduction. 9th ed. Boston: Pearson Education; 2016.).

A linguagem é um código partilhado socialmente que representa ideias mediante o uso de símbolos arbitrários e regras que orientam as combinações deles(1111 Pullen PC, Justice LM. Enhancing phonological awareness, print awareness and oral language skills in preschool children. Intervention Sch Clin. 2003;39(2):87-98. http://dx.doi.org/10.1177/10534512030390020401.
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). Permite ao utilizador representar um objeto, um acontecimento ou uma relação por meio de um símbolo ou um conjunto de símbolos. Assim sendo, a linguagem compreende regras complexas que orientam os sons, as palavras, as frases, o significado e a sua produção. Tais regras subentendem a capacidade de entendimento, compreensão, capacidade de formulação e produção da linguagem.

O desenvolvimento da linguagem implica a apreensão de regras específicas do sistema relacionadas com a forma (estrutura da linguagem), o conteúdo (significado da linguagem) e o uso (aplicação da linguagem em contexto). Relativamente à forma, esta engloba três componentes: a fonologia, a morfologia e a sintaxe. Ao conteúdo refere-se a semântica e, ao uso, a pragmática. Cada uma dessas cinco componentes é uma parte do sistema linguístico e rege-se por um conjunto de regras específicas da linguagem de forma a existir comunicação eficaz(1010 Owens R. Language development: an introduction. 9th ed. Boston: Pearson Education; 2016.).

A forma da linguagem pode ser comprometida no nível da fonologia, quando o aluno apresenta problemas na consciência fonológica. Isto se verifica quando o aluno não consegue dividir as palavras nas suas unidades mínimas, os fonemas, ou efetuar o processo inverso, em que lhe são dados os fonemas separados e tem de os unir para formar uma palavra. Outro problema que pode apresentar é na vertente expressiva da fonologia, quando produz uma palavra com omissão ou substituição de fonemas(1212 Hage SRV, Nicolielo AP, Guerreiro MM. Deficit in phonological working memory: a psycholinguistic marker in portuguese speaking children with specific language impairment. Psychology. 2014;5(5):380-8. http://dx.doi.org/10.4236/psych.2014.55049.
http://dx.doi.org/10.4236/psych.2014.550...
). Também podem existir problemas na recessão dos fonemas – discriminação auditiva (capacidade de distinguir diferenças entre os sons)(1313 Nicolielo AP, Hage SRV. Phonological processing in subjects with specific language impairment. Rev CEFAC. 2014;16(6):1820-6. http://dx.doi.org/10.1590/1982-0216201416813.
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).

Os alunos que apresentam perturbações na área da morfologia demonstram muitas dificuldades em usar as regras morfológicas, tais como seus pares as usam(1414 Leonard LB. Reciprocal relations between syntax and tense/agreement morphology in children’s interpretation of input: A look at children with specific language impairment. First Lang. 2019;39(1):96-110. http://dx.doi.org/10.1177/0142723717729094.
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). As maiores dificuldades que podem apresentar são na construção do plural irregular, em que a terminação não segue a regra; quando têm de aplicar a terceira pessoa do singular; quando têm de formar um adjetivo a partir de uma palavra(1414 Leonard LB. Reciprocal relations between syntax and tense/agreement morphology in children’s interpretation of input: A look at children with specific language impairment. First Lang. 2019;39(1):96-110. http://dx.doi.org/10.1177/0142723717729094.
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,1515 Verhoeven L, Steenge J, van Balkom H. Verb morphology as clinical marker of specific language impairment: evidence from first and second language learners. Res Dev Disabil. 2011;32(3):1186-93. http://dx.doi.org/10.1016/j.ridd.2011.01.001. PMid:21333487.
http://dx.doi.org/10.1016/j.ridd.2011.01...
).

Alunos com dificuldades na área da sintaxe podem revelar problemas em repetir frases na forma declarativa ou em outras formas. Também podem demonstrar dificuldades em escolher uma imagem para adequá-la a uma frase e descrever uma imagem por meio de uma frase. Apesar de a complexidade das frases crescer, ao longo da escolaridade, tais alunos continuam a usar frases muito simples(1616 Befi-Lopes DM, Gândara JP, Felisbino FS. Categorização semântica e aquisição lexical: desempenho de crianças com alterações do desenvolvimento da linguagem. Rev CEFAC. 2006;8(2):155-61.,1717 Befi-Lopes DM, Nuñes CO, Cáceres AM. Correlação entre vocabulário expressivo e extensão média do enunciado em crianças com alteração específica de linguagem. Rev CEFAC. 2013;15(1):51-7. http://dx.doi.org/10.1590/S1516-18462012005000017.
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). Essas dificuldades morfossintáticas podem levar a limitações na sua expressão oral(1818 Hernandez GD, Rodriguez VMA. The grammatical production in the narrative discourse of pupils with Specific Language Impairment (SLI). Rev Signos. 2018;51:264-84.).

Na área da semântica, os alunos com TL revelam vocabulário reduzido, dificuldades de nomeação, de evocação, principalmente quando as palavras utilizadas aparecem raramente, bem como na compreensão de palavras com significados ambíguos. Em geral, também cometem mais erros que seus colegas quando lhes é pedido o antônimo ou a definição de palavras simples(1616 Befi-Lopes DM, Gândara JP, Felisbino FS. Categorização semântica e aquisição lexical: desempenho de crianças com alterações do desenvolvimento da linguagem. Rev CEFAC. 2006;8(2):155-61.).

As dificuldades na área da pragmática verificam-se quando utilizam padrões de comunicação mais complicados para explicar algo a outra criança mais nova, como um jogo, do que para explicar o mesmo jogo a uma criança da sua idade. Também são menos eficazes em descrever objetos de que seus pares sem problemática. Apesar de as dificuldades no nível da sintaxe e da semântica terem mais impacto negativo, como o uso da pragmática se refere ao uso da linguagem em contexto social, os erros que cometem no seu uso podem conduzir a problemas sociais para esses alunos(1919 Davies C, Andrés-Roqueta C, Norbury CF. Referring expressions and structural language abilities in children with specific language impairment: a pragmatic tolerance account. J Exp Child Psychol. 2016;144:98-113. http://dx.doi.org/10.1016/j.jecp.2015.11.011. PMid:26716575.
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).

Evidências científicas mostram ainda que algumas crianças com dificuldades na linguagem e na aprendizagem podem ter limitações no nível da memória e atenção ou produzir erros de nomeação devidos a representações incompletas do esquema de semântica ou fonológico das palavras-alvo(2020 Cleave PL, Girolametto L, Chen X, Johnson C. Narrative abilities in monolingual and dual language learning children with specific language impairment. J Commun Disord. 2010;43(6):511-22. http://dx.doi.org/10.1016/j.jcomdis.2010.05.005. PMid:20579660.
http://dx.doi.org/10.1016/j.jcomdis.2010...

21 Boerma T, Leseman P, Wijnen F, Blom E. Language proficiency and sustained attention in monolingual and bilingual children with and without language impairment. Front Psychol. 2017;8:1241-52. http://dx.doi.org/10.3389/fpsyg.2017.01241. PMid:28785235.
http://dx.doi.org/10.3389/fpsyg.2017.012...
-2222 Desmottes L, Maillart C, Meulemans T. Memory consolidation in children with specific language impairment: delayed gains and susceptibility to interference in implicit sequence learning. J Clin Exp Neuropsychol. 2017;39(3):265-85. http://dx.doi.org/10.1080/13803395.2016.1223279. PMid:27615432.
http://dx.doi.org/10.1080/13803395.2016....
). Outras crianças podem exibir semelhantes erros de nomeação, mas têm subjacentes dificuldades nos processos de recuperação das especificações semânticas e fonológicas armazenadas(88 Messer D, Dockrell J. Children’s naming and word-finding difficulties: descriptions and explanations. J Speech Lang Hear Res. 2006;49(2):309-24. http://dx.doi.org/10.1044/1092-4388(2006/025). PMid:16671846.
http://dx.doi.org/10.1044/1092-4388(2006...
,2323 Bishop DVM. What causes specific language impairment in children? Curr Dir Psychol Sci. 2006;15(5):217-21. http://dx.doi.org/10.1111/j.1467-8721.2006.00439.x. PMid:19009045.
http://dx.doi.org/10.1111/j.1467-8721.20...
). Tais tipos de dificuldades são significativos e podem ser caraterizados por dificuldades em nomear, produzir conceitos adequados no momento certo, descrever e narrar histórias(99 Molina FP, Robertson XA. Didactics strategies to develop the narrative discourse in preschool childreen with specific language impairment. Rev Signos. 2018;51:410-29.).

A prevalência de crianças com essas dificuldades é elevada entre os alunos com transtornos de comunicação e em comorbilidade com dificuldades de aprendizagem específicas(2424 Correia LM. Inclusão e necessidades educativas especiais: um guia para educadores e professores. 2. ed. Porto: Porto Editora; 2013.). Os profissionais concordam que as dificuldades em nomear podem resultar em sérios problemas de linguagem expressiva, os quais podem afetar profundamente a vida delas, impedindo a aprendizagem e interferindo na comunicação interpessoal.

Alunos com disnomia podem evidenciar problemas tanto no armazenamento como no acesso a representações lexicais(88 Messer D, Dockrell J. Children’s naming and word-finding difficulties: descriptions and explanations. J Speech Lang Hear Res. 2006;49(2):309-24. http://dx.doi.org/10.1044/1092-4388(2006/025). PMid:16671846.
http://dx.doi.org/10.1044/1092-4388(2006...
). Existem diferentes tipos de dificuldades de nomeação, como repetições, reformulações, substituições, inserções, palavras vazias, preenchimento de tempo e atrasos, bem como avaliações correspondentes, intervenções e acomodações para cada uma dessas dificuldades.

Estudos internacionais revelam que há incidência elevada de disnomia nos alunos com NEE, podendo ser uma fonte permanente de dificuldades na leitura, na aprendizagem e na expressão. O caráter universal da disnomia é um aspecto importante da aprendizagem da linguagem(88 Messer D, Dockrell J. Children’s naming and word-finding difficulties: descriptions and explanations. J Speech Lang Hear Res. 2006;49(2):309-24. http://dx.doi.org/10.1044/1092-4388(2006/025). PMid:16671846.
http://dx.doi.org/10.1044/1092-4388(2006...
,2020 Cleave PL, Girolametto L, Chen X, Johnson C. Narrative abilities in monolingual and dual language learning children with specific language impairment. J Commun Disord. 2010;43(6):511-22. http://dx.doi.org/10.1016/j.jcomdis.2010.05.005. PMid:20579660.
http://dx.doi.org/10.1016/j.jcomdis.2010...
,2525 German D. Child word finding: student voices enlighten us. ASHA Lead. 2009;14(2):10-3. http://dx.doi.org/10.1044/leader.FTR2.14022009.10.
http://dx.doi.org/10.1044/leader.FTR2.14...
). Deste modo, como ferramenta de monitorização das possíveis dificuldades linguísticas, pode-se utilizar a análise da linguagem oral em contexto escolar. Essa identificação é importante na medida em que as dificuldades de linguagem podem ter impacto emocional nos alunos e repercussões nas suas aprendizagens acadêmicas(2626 Conti-Ramsden G, Botting N. Emotional health in adolescents with and without a history of specific language impairment (SLI). J Child Psychol Psychiatry. 2008;49(5):516-25. http://dx.doi.org/10.1111/j.1469-7610.2007.01858.x. PMid:18221347.
http://dx.doi.org/10.1111/j.1469-7610.20...
,2727 Gray S, Kvalsvig A, O’Connor M, O’Connor E, Incledon E, Tarasuik J, et al. Can a teacher-reported indicator be used for population monitoring of oral language skills at school entry? Int J Speech Lang Pathol. 2018;20(4):447-57. http://dx.doi.org/10.1080/17549507.2017.1294200. PMid:28290724.
http://dx.doi.org/10.1080/17549507.2017....
).

Levando em conta os diversos tipos de diagnósticos nas dificuldades de linguagem existentes em idade escolar e que a referenciação dos professores é um preditor de elegibilidade para os serviços de educação especial(2828 Gregory KD, Oetting JB. Classification accuracy of teacher ratings when screening nonmainstream english-speaking kindergartners for language impairment in the rural south. Lang Speech Hear Serv Sch. 2018;49(2):218-31. http://dx.doi.org/10.1044/2017_LSHSS-17-0045. PMid:29621802.
http://dx.doi.org/10.1044/2017_LSHSS-17-...
), este estudo tem o objetivo de contribuir para o conhecimento das perspectivas de apoio aos alunos com TL em escolas inclusivas em Portugal. Deste modo, será analisado se é assegurada resposta escolar efetiva às necessidades dos alunos com TL, conhecendo as perspectivas dos professores portugueses relativamente ao conceito de TL e ao tipo de apoio prestado nas escolas a esses alunos. Sua importância relaciona-se à consciencialização de todos os intervenientes no processo educativo de alunos com TL quanto à necessidade de formação e especialização nessa área, para responder eficazmente às carências desses alunos e minimizar, assim, o impacto no percurso escolar deles.

Pretende também alertar para a necessidade de criação de políticas educativas direcionadas ao desenvolvimento pleno das capacidades/competências desses alunos, por meio, por exemplo, da estruturação de instrumentos legais que permitam identificar, avaliar e elaborar programas adequados aos alunos com TL. O investimento científico em torno dessa área é igualmente um dos focos essenciais para reconhecer a importância dessa problemática e, consequentemente, ultrapassar as lacunas de conhecimento e formação dos profissionais de educação.

MÉTODOS

Participantes

Neste estudo, participaram 123 professores do ensino regular, de ambos os gêneros, com idades compreendidas entre 20 e 65 anos. Todos os indivíduos envolvidos assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido. A amostra deste estudo foi maioritariamente constituída por professores do gênero feminino (86,2%). A faixa etária mais prevalente foi dos 31 aos 40 anos (51,2%), 22,8% para as idades compreendidas entre 41 e 50 anos, 13,8% para a faixa etária mais jovem (20 a 30 anos) e os restantes 12,2% para o escalão etário dos 51 aos 65 anos.

Todos os 18 distritos de Portugal continental e regiões autônomas da Madeira e dos Açores, exceto Beja e Castelo Branco, encontram-se representados na amostra, sendo os mais representados Braga (44,7%) e Porto (21,1%). Para os restantes distritos, 8,9% para Viana do Castelo, 6,5%, Lisboa, 2,4%, tanto para Leiria como para Viseu, e com a mesma percentagem de 1,6% encontram-se os distritos de Aveiro, Coimbra, Faro, Setúbal e a Região Autônoma da Madeira. Com percentagem mais reduzida (0,8%), encontram-se os distritos de Bragança, Évora, Guarda, Portalegre, Santarém, Vila Real e a Região Autônoma dos Açores.

É importante referir que 0,8% dos professores era bacharel, enquanto a maioria (43,9%) era licenciada: 27,6% são pós-graduados, 25,2%, mestres, e 2,4%, doutorados.

A maioria dos docentes tinha entre 5 e 15 anos de tempo de serviço (51,2%). A restante porcentagem distribui-se por 23,6% dos professores com mais de 20 anos de serviço, 15,4% dos docentes, menos de cinco anos de serviço e 9,8% exerciam a profissão entre 15 e 20 anos.

Quanto à função docente atual, a maioria era professor/a do 1o ciclo (51,2%), 17,9%, professores/as de educação especial, 3,3%, professores/as de apoio educativo e a mesma percentagem exercia a função de professor/a assessor/a. Dos inquiridos, havia, ainda, psicólogos/as (2,4%) e terapeutas da fala (4,1%). Os restantes 17,8% dos inquiridos desempenhavam outras funções educativas.

Em relação à formação em educação especial, 24,4% dos professores não tinham nenhuma formação em educação especial, 30,9%, pós-graduação ou especialização na área, 18,7% participaram de ações de formação, 17,9% frequentaram unidades curriculares em educação especial na sua formação inicial, 7,3% tinham mestrado e 0,8%, doutorado.

Relativamente à realização de alguma ação de formação na área dos TL, 67,5% afirmaram que nunca haviam frequentado qualquer ação de formação nessa área, contrastando com os 32,5% que afirmaram já ter frequentado formação nessa área.

Instrumento de recolha de dados

Este estudo seguiu as normas do Código da Comissão de Ética da Universidade do Minho e autorização do Conselho Científico da Universidade do Minho, depois de terem sido assegurados todos os aspetos de confidencialidade e anonimato dos dados.

Para a recolha dos dados, foi utilizado o questionário “Perspectivas e práticas de apoio educativo aos alunos com transtornos da linguagem no 1º ciclo do ensino básico” –, composto de duas partes. A primeira parte diz respeito à caracterização dos dados sociodemográficos dos professores inquiridos e inclui oito questões de escolha múltipla: gênero, idade, distrito, habilitações acadêmicas, tempo de serviço, função atual, formação em educação especial e frequência em alguma ação de formação na área dos TL. A segunda parte do questionário refere-se a questões específicas construídas com base na literatura consultada ao longo de anos de docência e experiência profissional na área pela terceira autora deste estudo, tendo por base o modelo de apoio educativo aos TL e outro tipo de transtornos de desenvolvimento amplamente utilizado e publicado por autores norte-americanos. Tais questões foram, então, inseridas no questionário sob a forma de itens, sempre com uma visão positiva, visando analisar as perspectivas dos inquiridos acerca dos alunos com TL no 1º ciclo.

Assim, a segunda parte do questionário é composta de 32 itens distribuídos por três dimensões: a primeira diz respeito à operacionalização dos conceitos (questões 1 a 10), a segunda, a estratégias, método e organização do apoio educativo (questões 11 a 20) e a terceira, a avaliação e planificação (questões 21 a 32). Esses 32 itens são classificados segundo a escala de likert em quatro níveis: 1 - Discordo totalmente; 2 - Discordo; 3 - Concordo; 4 - Concordo totalmente.

Esse questionário foi elaborado no Google Drive para preenchimento on-line, tendo sido divulgado a professores do 1o ciclo do ensino básico em âmbito nacional.

Procedimentos de recolha de dados

Após inserção on-line e consequente divulgação às redes sociais, por e-mail, por meio da rede de contatos dos autores deste estudo e da divulgação a diversas associações de professores, as respostas foram obtidas no tempo inicialmente estipulado para essa fase (um mês).

RESULTADOS

A análise de dados foi realizada mediante a utilização do software SPSS versão 21.

Foi realizada uma análise descritiva e inferencial das variáveis dependentes, utilizando dois testes paramétricos (Student T-Test e One Way ANOVA), para estudar a influência das variáveis independentes sobre os resultados e verificar a existência de diferenças estatisticamente significativas entre o gênero, o tempo de serviço e o distrito dos professores (Tabelas 1 e 2). Foi considerado para nível de significância α = 0,05 (95%).

Tabela 1
Análise inferencial quanto à variável gênero
Tabela 2
Análise inferencial às variáveis tempo de serviço e distrito

A fidelidade de um teste permite determinar o grau de confiança que se poder ter na informação recolhida. Para verificar se os itens desse questionário compõem uma prova consistente, procedeu-se à utilização do alfa de Cronbach, cujo valor obtido para a totalidade do questionário foi de 0,802, tendo sido considerado muito bom, verificando-se, assim, a consistência interna (homogeneidade) dos itens.

A análise descritiva dos resultados (Tabela 3) revela a porcentagem de respostas para cada um dos níveis em cada item, indicando valores médios entre 2,28 e 3,46.

Tabela 3
Análise descritiva dos itens do questionário

A análise descritiva permitiu verificar que, para a maioria dos docentes, é importante conhecer o desenvolvimento da linguagem no apoio a alunos com PL, sendo esta uma categoria considerada no âmbito de apoio às NEE. No entanto, mais da metade dos inquiridos considera que não possui formação nem informações suficientes acerca da aquisição e do desenvolvimento da linguagem e não concorda que possua competências suficientes para identificar um aluno com TL. Os valores obtidos mostram que a maioria dos inquiridos considera que conhece o conceito de TL.

Em sua maioria, os inquiridos consideram que alunos com TL devem ser apoiados na escola regular, onde estão incluídos em tempo integral segundo a legislação portuguesa, mas também julgam que deveriam ser apoiados por centros/institutos externos à escola. Mais de 90% dos inquiridos consideram que os alunos com TL necessitam de algum tipo de ensino adicional para além do professor da turma.

Estes são os resultados mais relevantes do estudo, que permitem inferir que existe uma resposta pouco eficaz do sistema educativo em uma formação adequada dos docentes nessa área, refletindo-se no apoio e no desempenho do aluno. O potencial do aluno com TL poderá ser maximizado à medida que se aumenta a eficácia das respostas às suas necessidades.

DISCUSSÃO

De acordo com a filosofia da inclusão, a escola deve procurar incluir todos os alunos, preferencialmente na classe regular. Para corresponder a essa necessidade, é preciso conhecer as características dos alunos, identificar suas necessidades e utilizar estratégias e recursos precisos para conduzi-los ao sucesso educativo. Esse sucesso não tem de ser igual para todos(66 Vieira-Rodrigues MMM, Sanches-Ferreira MMP. A inclusão de crianças com necessidades educativas especiais no ensino regular em Portugal: a opinião de educadores de infância e de professores do 1º ciclo do ensino público e privado. Rev Bras Educ Espec. 2017;23(1):37-55. http://dx.doi.org/10.1590/s1413-65382317000100004.
http://dx.doi.org/10.1590/s1413-65382317...
,77 Martins R, Freitas P, Carvalho O, Pascoinho J. Intervenção precoce: práticas e representações. Revista Educação Especial. 2018;31(62):495-512. http://dx.doi.org/10.5902/1984686X28819.
http://dx.doi.org/10.5902/1984686X28819...
).

Decorrente do compromisso assumido pelas escolas de promoção da inclusão, com base na aceitação das diferenças existentes entre os alunos, no apoio à aprendizagem e na resposta às necessidades individuais, encontra-se a expectativa de que os professores sejam capazes de mobilizar um conjunto de recursos, em termos de metodologias e de estratégias de ensino, que possibilite capacidade de resposta de qualidade às necessidades específicas de todos os alunos, no contexto de sala de aula(55 Oliveira RB, Bidarra MG, Vaz-Rebelo M. Práticas de colaboração para inclusão de alinos com necessidades educativas especiais nas escolas portuguesas: perceções de professores e equipa técnico-pedagógica. Saber & Educar. 2017;(23):70-9. http://dx.doi.org/10.17346/se.vol23.288.
http://dx.doi.org/10.17346/se.vol23.288...
).

Tendo por base dados adiantados por alguns autores nacionais e estrangeiros e vários estudos efetuados por instituições educacionais ligadas às NEE, é possível apresentar uma estimativa de prevalência das várias problemáticas(2424 Correia LM. Inclusão e necessidades educativas especiais: um guia para educadores e professores. 2. ed. Porto: Porto Editora; 2013.). Dentre estas, Correia(2424 Correia LM. Inclusão e necessidades educativas especiais: um guia para educadores e professores. 2. ed. Porto: Porto Editora; 2013.) refere como os de segunda maior prevalência os transtornos de comunicação (22%). Deste modo, no contexto de uma escola inclusiva, espera-se que exista investimento na mobilização de práticas colaborativas com os serviços de educação especial, para desenvolver um conjunto diversificado de opções, metodologias, estratégias e serviços que assegurem respostas flexíveis e sensíveis às necessidades dos alunos com tais transtornos.

A classificação dos TL deve ser encarada não apenas com o intuito de chegar a um diagnóstico, mas de conduzir a seleção e a elaboração de um programa adequado às capacidades e às necessidades de cada criança(11 Bishop DV, Snowling MJ, Thompson PA, Greenhalgh T. Phase 2 of CATALISE: a multinational and multidisciplinary Delphi consensus study of problems with language development: terminology. J Child Psychol Psychiatry. 2017;58(10):1068-80. http://dx.doi.org/10.1111/jcpp.12721. PMid:28369935.
http://dx.doi.org/10.1111/jcpp.12721...
). Para tal, é importante considerar termos ou conceitos que permitam aos diversos profissionais e familiares, ou seja, a todos os intervenientes no processo, comunicarem-se de forma clara e objetiva entre si, selecionando eficazmente a informação pertinente para a tomada de decisões educativas(22 Santos LM, Friche AA, Lemos SM. Conhecimento e instrumentalização de professores sobre desenvolvimento de fala: ações de promoção de saúde. Rev CEFAC. 2011;13(4):645-56. http://dx.doi.org/10.1590/S1516-18462011005000011.
http://dx.doi.org/10.1590/S1516-18462011...
).

Essa disparidade de conceitos tem limitado a prevenção e a identificação precoce de crianças que não têm acesso imediato aos serviços de que necessitam(11 Bishop DV, Snowling MJ, Thompson PA, Greenhalgh T. Phase 2 of CATALISE: a multinational and multidisciplinary Delphi consensus study of problems with language development: terminology. J Child Psychol Psychiatry. 2017;58(10):1068-80. http://dx.doi.org/10.1111/jcpp.12721. PMid:28369935.
http://dx.doi.org/10.1111/jcpp.12721...
). Perante a elevada prevalência de crianças com TL no contexto educacional, torna-se pertinente identificar o mais precocemente possível aquelas com dificuldades e em risco de evidenciarem problemas da linguagem no seu percurso acadêmico, no âmbito do desempenho linguístico(77 Martins R, Freitas P, Carvalho O, Pascoinho J. Intervenção precoce: práticas e representações. Revista Educação Especial. 2018;31(62):495-512. http://dx.doi.org/10.5902/1984686X28819.
http://dx.doi.org/10.5902/1984686X28819...
,2424 Correia LM. Inclusão e necessidades educativas especiais: um guia para educadores e professores. 2. ed. Porto: Porto Editora; 2013.).

A disnomia é um dos TL que desde o início dos anos 70 se tornou interesse para os investigadores no campo da afasia nos adultos, transtornos de aprendizagem, transtornos de fala e da linguagem. Contudo, foi na década de 1980, que Diane German(2525 German D. Child word finding: student voices enlighten us. ASHA Lead. 2009;14(2):10-3. http://dx.doi.org/10.1044/leader.FTR2.14022009.10.
http://dx.doi.org/10.1044/leader.FTR2.14...
) iniciou seus estudos sobre disnomia, sendo até hoje a investigadora que mais estudos tem realizado no âmbito dessa problemática, nomeadamente na avaliação da disnomia, com a finalidade de programar tais alunos para obter sucesso. German e seus colaboradores identificaram três subgrupos no nível das dificuldades em nomear: subgrupo 1 - dificuldades na recuperação; subgrupo 2 - dificuldades na compreensão; subgrupo 3 - dificuldades na recuperação e na compreensão, pesquisando, especificamente, questões da precisão e rapidez em nomear.

CONCLUSÃO

Para que o professor possa identificar e, consequentemente, intervir em alunos com TL, é fundamental que compreenda as reais competências e necessidades deles, para, assim, atuar em conformidade, promovendo a progressão e o sucesso educativo. Com este estudo, verificamos as perspectivas e práticas de apoio educativo a alunos com TL no 1o ciclo do ensino básico, tentando, assim, perceber a forma como os professores intervêm nesse nível de ensino.

Após a análise dos dados obtidos, verificamos que grande parte dos professores afirma que não possui competências para identificar alunos com TL nem formação e informações suficientes acerca da aquisição e do desenvolvimento da linguagem, condições verificadas em outros países(2929 Eloi ME, Santos JN, Martins-Reis VO. Disorders in oral and written language in elementary teachers’ perception. Rev CEFAC. 2015;17(5):1420-31. http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620151754115.
http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620151...
,3030 Silva LK, Labanca L, Melo EMC, Costa-Guarisco LP. Identification of language disorders in the school setting. Rev CEFAC. 2014;16(6):1972-9. http://dx.doi.org/10.1590/1982-0216201415813.
http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620141...
). Desta forma, consequentemente, os profissionais poderão encontrar dificuldades em intervir nesses alunos e, mais especificamente, em delinear estratégias adequadas às reais necessidades deles. As características, capacidades e necessidades de aprendizagem de cada criança poderão requerer modalidades de apoio bastante diversificadas, que apenas serão eficazes se se tiver em conta uma avaliação compreensiva completa e realizada por profissionais especializados(2424 Correia LM. Inclusão e necessidades educativas especiais: um guia para educadores e professores. 2. ed. Porto: Porto Editora; 2013.). Ao conhecer e estudar o desenvolvimento típico da linguagem, o professor conseguirá avaliar as competências linguísticas para intervir adequadamente no processo educativo dos alunos, em equipe com outros profissionais (intervencionistas da linguagem, terapeutas da fala etc.) e, assim, colmatar e remediar, de forma eficaz, suas necessidades individuais.

  • Trabalho realizado no Instituto de Educação, Universidade do Minho – UMinho - Braga, Portugal.
  • Fonte de financiamento: Este trabalho é financiado pelo CIEd - Centro de Investigação em Educação, projeto UID/CED/01661/2019, Instituto de Educação, Universidade do Minho, através de fundos nacionais da FCT/MCTES-PT.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    31 Out 2019
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    28 Abr 2018
  • Aceito
    07 Fev 2019
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