Acessibilidade / Reportar erro

Quando exercícios de fortalecimento da língua refletem na região cervical

RESUMO

Objetivo:

Comparar o impacto do exercício isocinético “sucção da língua contra o palato” na região cervical em participantes Classe I e Classe II/2.ª Divisão, considerando a média e a simetria do Root Means Square (RMS) dos músculos supra-hióideos e suboccipitais, e relatos sensoriais cervicais.

Método:

Onze participantes Classe I e 19 Classe II/2.ª Divisão, ambos os gêneros, média de idade 33,4 ±14,1 anos. Para análise da média do RMS e da simetria, realizou-se eletromiografia dos músculos suboccipitais e supra-hióideos, bilateralmente, no repouso e na sucção de água nas fases inicial, intermediária e final. A sensação cervical foi avaliada qualitativamente durante os exercícios.

Resultados:

A média do RMS não apresentou diferença entre Classes (p=0,7), mas revelou, na fase intermediária, elevação na musculatura suboccipital (p=0,0001) e diminuição na musculatura supra-hióidea. Na simetria, a musculatura supra-hióidea mostrou diferença significativa entre classes (p=0,0001) durante a fase intermediária. No participante Classe I, foi restabelecida a simetria na fase final, fato que não ocorreu na Classe II/2.ª Divisão. Em relação à sensação cervical, somente os Classe II/2.ª Divisão apresentaram queixas expressivas.

Conclusão:

O exercício isocinético de sucção da língua contra o palato repercutiu de forma expressiva com relatos de desconforto e dor cervical nos participantes Classe II/2.ª Divisão. Na média do RMS, não houve diferença entre as classes, mas, na fase intermediária, a musculatura suboccipital apresentou elevação de atividade significativa. A simetria na musculatura supra-hióidea teve diferença significativa entre as classes e assimetria na fase intermediária.

Descritores:
Má-oclusão; Língua; Cervical; Fonoaudiologia; Fisioterapia

ABSTRACT

Purpose:

To compare the impact of isokinetic exercise (tongue suction on the palate) in the cervical region of Class I and Class II / 2nd Division participants, considering the average and the symmetry of Root Means Square (RMS) of suprahyoid and suboccipital muscles and cervical sensory reports.

Method:

11 participants Class I and 19 Class II / 2nd Division, both genders, mean age 33.4 ± 14.1 years. For the analysis of RMS average and symmetry, electromyography was performed in the suboccipital and suprahyoid muscles, bilaterally, at rest and suction of water in the initial, intermediate and final phases. The cervical sensation was evaluated qualitatively during the exercises.

Results:

the mean RMS did not differ between Classes (p=0.7), but showed an increase in the intermediate phase in the suboccipital musculature (p=0.0001) and decrease in the suprahyoid musculature. In symmetry, the suprahyoid musculature showed a significant difference between classes (p=0.0001) during the intermediate phase. In the Class I participant the symmetry was reestablished in the final phase, a fact that did not occur in Class II / 2nd Division. Regarding the cervical sensation, only the Class II / 2nd Division had expressive complaints.

Conclusion:

The Isokinetic suctioning exercise of the tongue against the palate, had an expressive repercussion with reports of discomfort and neck pain in the Class II / 2nd Division participants. On average RMS, there was no difference between the classes, but in the intermediate phase, the suboccipital muscles showed a significant increase in the activity. Symmetry in the suprahyoid musculature had a significant difference between the classes and asymmetry in the intermediate phase.

Keywords:
Malocclusion; Tongue; Neck Pain; Speech-Language Pathologists; Physical Therapy Specialty

INTRODUÇÃO

O desconforto ou quadros álgicos são estados que restringem e podem até evoluir para condições incapacitantes. Com isso, critérios ou indicadores devem ser considerados. Nos casos de intervenções terapêuticas, que têm por objetivo o fortalecimento muscular(11 Ferreira TS, Mangili LD, Sassi FC, Fortunato-Tavares T, Limongi SCO, Andrade CRF. Speech and myofunctional exercise physiology: a critical review of the literature. J SocBrasFonoaudiol. 2011;23(3):288-96. https://doi.org/10.1590/s2179-64912011000300017. PMid:22012166
https://doi.org/10.1590/s2179-6491201100...
), queixas, como a dor irradiada(22 Shen FH, Samartzis D, Fessler RG.Textbook of the Cervical Spine. 1rt ed. Saunders: Elsevier Health Sciences; 2014), são relatadas com frequência. Mas nem sempre estas são investigadas, provavelmente por apresentarem uma etiologia complexa cuja biomecânica pode não só desencadear como potencializar tais sintomas(33 Norton NS. Netter's Head and Neck Anatomy for Dentistry. Netter Basic Sciences. 3rd ed. Elsevier: Health Science; 2016,44 Bondi M. Muscular "Modus Agendi" and craniomandibular dysfunction. J Orofacial Myology. 1995; 21:61-65. PMid:9055673).

Unidades funcionais como a língua têm uma maior predisposição a esses quadros por estar ancorada no osso hioide, o qual está interligado a sistemas sofisticados, como o crânio-cervical e o mandibular(33 Norton NS. Netter's Head and Neck Anatomy for Dentistry. Netter Basic Sciences. 3rd ed. Elsevier: Health Science; 2016), cuja complexa engrenagem(44 Bondi M. Muscular "Modus Agendi" and craniomandibular dysfunction. J Orofacial Myology. 1995; 21:61-65. PMid:9055673) exige que as estruturas estejam corretamente desenvolvidas e posicionadas para que os músculos suboccipitais auxiliem a curvatura fisiológica cervical (lordose) e garantam a estabilidade da cabeça(55 AI Kapandji. The physiology of the joints: The Spinal Column, Pelvic Girdle and Head v.3. 6th Revised edition. London UK: Publish Elsevier Health Sciences; 2008), para que assim os músculos supra-hióideos exerçam a alavanca crânio-mandibular(55 AI Kapandji. The physiology of the joints: The Spinal Column, Pelvic Girdle and Head v.3. 6th Revised edition. London UK: Publish Elsevier Health Sciences; 2008) e a língua possa então se movimentar.

A associação da língua com os músculos mandibulares e cervicais(66 Shiino Y, Sakai, S, Takeishi, R, et al. Effect of body posture on involuntary swallow in healthy volunteers. PhysiolBehav 2016; 155: 250-259), entretanto, nem sempre é relevada. Provavelmente, isso é devido ao fato de os especialistas que atuam nessa área tradicionalmente se limitarem ao estudo de regiões específicas: Fonoaudiólogos na cavidade oral e Fisioterapeutas na cintura escapular e músculos posturais da cabeça. Todavia, na alteração do desenvolvimento mandibular, a conexão da língua com a região cervical nem sempre poderá ser desconsiderada, devido à interligação da mandíbula com o osso hióideo e a coluna cervical(77 Ishii T, Narita N, Endo H. Evaluation of jaw and neck muscle activities while chewing using EMG-EMG transfer function and EMG-EMG coherence function analyses in healthy subjects. Physiology&Behavior. 2016; 160:35-42. https://doi.org/10.1016/j.physbeh.2016.03.023. PMid:27059322
https://doi.org/10.1016/j.physbeh.2016.0...
). Participantes Classe II/2.ª Divisão de Angle apresentam a oclusão com trespasse vertical incisal acentuado, retrognatismo e face ligeiramente inclinada para baixo(88 Lopatiene K, Smailiené D, Sidlauskiene M. An Interdisciplinary Study of Orthodontic, Orthopedic, and Otorhinolaryngological Findings in 12-14-Year-Old Preorthodontic Children. Medicina (Kaunas). 2013;49(11). PMid:24823929). A mudança na postura da cabeça pode levar a musculatura da cadeia de interligação língua, osso hióideo(99 Li Q, Minagi, Y, Hor K, Kondoh J, Fujiwara S, Tamine K, et al. Coordination in oro-pharyngeal biomechanics during human swallowing. PhysiolBehav. 2015; 1: 300- 305. https://doi.org/10.1016/j.physbeh.2015.05.004. PMid:25957912
https://doi.org/10.1016/j.physbeh.2015.0...
) e coluna cervical se reorganizar(44 Bondi M. Muscular "Modus Agendi" and craniomandibular dysfunction. J Orofacial Myology. 1995; 21:61-65. PMid:9055673) para garantir o equilíbrio do sistema estomatognático(1010 Graber TM. The "three M's": Muscles, malformation, and malocclusion. Am J Orthod. 1963; 49(6): 418-450. https://doi.org/10.1016/0002-9416(63)90167-2
https://doi.org/10.1016/0002-9416(63)901...
). Em particular durante a movimentação da língua, devido ao seu deslocamento posterior(99 Li Q, Minagi, Y, Hor K, Kondoh J, Fujiwara S, Tamine K, et al. Coordination in oro-pharyngeal biomechanics during human swallowing. PhysiolBehav. 2015; 1: 300- 305. https://doi.org/10.1016/j.physbeh.2015.05.004. PMid:25957912
https://doi.org/10.1016/j.physbeh.2015.0...
) em função do retrognatismo mandibular, não apenas os músculos mandibulares, supra-hióideos(33 Norton NS. Netter's Head and Neck Anatomy for Dentistry. Netter Basic Sciences. 3rd ed. Elsevier: Health Science; 2016), como também os músculos posturais da cabeça, suboccipitais(55 AI Kapandji. The physiology of the joints: The Spinal Column, Pelvic Girdle and Head v.3. 6th Revised edition. London UK: Publish Elsevier Health Sciences; 2008) podem ser sobrecarregados.

Nessas alterações dentoesqueléticas, desordens miofuncionais orofaciais (OMDs) decorrentes da flacidez na musculatura lingual também são observadas(1111 Proffit WR, Mason RM. Myofunctional therapy for tongue thrusting: background and recommendations. J AmDent Assoc.1975; 90:403-11. https://doi.org/10.14219/jada.archive.1975.0075. PMid:1053783
https://doi.org/10.14219/jada.archive.19...
,1212 Giuca MR, Pasini M, Pagano A, Mummolo S, Vanni A. Longitudinal study on a rehabilitative model for correction of atypical swallowing. Eur J PaediatrDent. 2008;9(4):170-174. PMid:19072004,1313 J. Smithpeter, D. Covell. Relapse of anterior open bites treated with orthodontic appliances with and without orofacial myofunctional therapy. Am J OrthodDentofacialOrthop, 137 (2010), pp. 605-614. https://doi.org/10.1016/j.ajodo.2008.07.016. PMid:20451779
https://doi.org/10.1016/j.ajodo.2008.07....
), como o alojamento da língua no assoalho bucal e a interposição da mesma entre as arcadas durante a deglutição e a fala, nas quais Terapias Miofuncionais Orofaciais (OMTs), com o objetivo de favorecer os tratamentos ortopédicos dento-esqueléticos e ortognáticos, são preconizadas(1111 Proffit WR, Mason RM. Myofunctional therapy for tongue thrusting: background and recommendations. J AmDent Assoc.1975; 90:403-11. https://doi.org/10.14219/jada.archive.1975.0075. PMid:1053783
https://doi.org/10.14219/jada.archive.19...
,1212 Giuca MR, Pasini M, Pagano A, Mummolo S, Vanni A. Longitudinal study on a rehabilitative model for correction of atypical swallowing. Eur J PaediatrDent. 2008;9(4):170-174. PMid:19072004,1313 J. Smithpeter, D. Covell. Relapse of anterior open bites treated with orthodontic appliances with and without orofacial myofunctional therapy. Am J OrthodDentofacialOrthop, 137 (2010), pp. 605-614. https://doi.org/10.1016/j.ajodo.2008.07.016. PMid:20451779
https://doi.org/10.1016/j.ajodo.2008.07....
). Nesses casos, o fortalecimento da língua é uma das principais metas a ser alcançada. Durante as movimentações da língua, entretanto, os músculos mandibulares e cervicais também podem ser sobrecarregados(44 Bondi M. Muscular "Modus Agendi" and craniomandibular dysfunction. J Orofacial Myology. 1995; 21:61-65. PMid:9055673). Entretanto, pouco se sabe ainda qual a repercussão dessas movimentações na região cervical.

A prática da OMT com o objetivo de fortalecer a musculatura da língua já é referida em muitos estudos(1111 Proffit WR, Mason RM. Myofunctional therapy for tongue thrusting: background and recommendations. J AmDent Assoc.1975; 90:403-11. https://doi.org/10.14219/jada.archive.1975.0075. PMid:1053783
https://doi.org/10.14219/jada.archive.19...
,1212 Giuca MR, Pasini M, Pagano A, Mummolo S, Vanni A. Longitudinal study on a rehabilitative model for correction of atypical swallowing. Eur J PaediatrDent. 2008;9(4):170-174. PMid:19072004,1313 J. Smithpeter, D. Covell. Relapse of anterior open bites treated with orthodontic appliances with and without orofacial myofunctional therapy. Am J OrthodDentofacialOrthop, 137 (2010), pp. 605-614. https://doi.org/10.1016/j.ajodo.2008.07.016. PMid:20451779
https://doi.org/10.1016/j.ajodo.2008.07....
), mas os casos com relatos de incômodo ou dor na região cervical, durante ou após esses exercícios, são encaminhados para tratamento fisioterapêutico(1414 Van Grootel RJ, Buchner R, Wismeijer D, Van der Glas HW. Towards an optimal therapy strategy for myogenous TMD, physiotherapy compared with occlusal splint therapy in an RCT with therapy-and-patient-specific treatment durations. BMC MusculoskeletalDisorders. 2017; 18:76. https://doi.org/10.1186/s12891-017-1404-9. PMCID:PMC5301345. PMid:28183288
https://doi.org/10.1186/s12891-017-1404-...
). O esclarecimento sobre a associação de incômodo ou dor na região cervical com os movimentos da língua nem sempre ocorre. Intervenções mioterápicas que envolvam a movimentação da língua em pacientes com desvio na postura da cabeça devem, com isso, considerar a avaliação interdisciplinar. Tal compreensão permitirá aos especialistas uma visão mais integral dos casos, para que indicadores, como a presença de incômodo ou dor muscular, possam ser esclarecidos e assim se evitem prejuízos, como limitação do tratamento e até possíveis iatrogenias em outras regiões do corpo, como a cervicalgia(1515 Teixeira JM, Barros Filho T, Lin TY, Hamani C, Teixeira WGJ. Cervicalgias. Rev Med. 2001;80(2):307-16.).

O estudo tem por objetivo comparar o impacto de exercícios isocinéticos, sucção da língua contra a palato com posterior deglutição, na região cervical, em participantes Classe I e Classe II/2.ª Divisão, considerando a média do RMS, a simetria dos músculos supra-hióideos e suboccipital, e relatos sensoriais na região cervical.

MÉTODO

Estudo experimental, quantitativo e prospectivo, realizado no Laboratório de Eletromiografia do Centro de Estudos e Pesquisa em Reabilitação Prof. Dr. Gabriel Porto da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas-CEPRE/FCM/UNICAMP. Aprovado no Comitê de Ética em Pesquisa-CEP/FCM/UNICAMP sob n.º 39597414.2.0000.5404. Todos os participantes envolvidos assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

Amostra

Constituída por 30 participantes, sendo 11 do grupo de controle Classe I de Angle e 19 do grupo experimental Classe II/2.ª Divisão de Angle, gêneros masculino e feminino, faixa etária entre 18 e 59 anos.

Critérios de inclusão: participantes saudáveis, com presença de todos os elementos dentários, relação molar de Classe I (sem comprometimento esquelético) ou relação molar de Classe II/2.ª Divisão de Angle (retrognatas), portadores ou não de má oclusão.

Critérios de exclusão: participantes com síndrome, doença crônica sistêmica, trauma ou má formação esquelética, dor muscular, agenesia dentária, portadores de prótese dentária, desvios posturais, dor muscular, prescrição de medicamentos neurológicos e/ou miorrelaxantes e com disfunção temporomandibular, segundo o Protocolo RDC / DTM(1616 Ahmad M, Hollender L, Anderson Q, Kartha K, Ohrbach R, Truelove E, Mike JT, Schiffman E. Research Diagnostic Criteria for Temporomandibular Disorders (RDC/TMD): Development of Image Analysis Criteria and Examiner Reliability for Image Analysis. Oral Surg Oral Med Oral Pathol Oral RadiolEndod. 2009; 107(6): 844-860. https://doi.org/10.1016/j.tripleo.2009.02.023. PMCID: PMC3139469. PMid:19464658
https://doi.org/10.1016/j.tripleo.2009.0...
), caracterizados com DTM segundo o Eixo 1 do protocolo − desordens musculares, deslocamentos do disco, artralgia, artrite, artrose.

Procedimentos

Análise Oclusal

Realizada por um cirurgião-dentista do Serviço de Odontologia do Hospital das Clínicas/FCM/UNICAMP. Segundo a classificação de Angle: Classe I com relação mesiodistal da mandíbula, dentes incisivos superiores sobrepondo um terço da altura da coroa dos dentes incisivos inferiores, primeiros molares superiores e inferiores com a cúspide mesiobucal do molar superior em oclusão no sulco bucal do molar inferior. Classe II/2.ª Divisão com presença de retrognatismo mandibular e/ou prognatismo maxilar, oclusão distal do dente primeiro molar inferior em relação ao primeiro molar superior e trespasse vertical entre os dentes incisivos superiores e inferiores(1717 Todd M, Walkow DMD, SheldonPeck DDS. Dental arch width in Class II Division 2 deep-bite malocclusion. American Journal of Orthodontics and Dentofacial Orthopedics. 2002;122(6):608-13. https://doi.org/10.1067/mod.2002.129189. PMid:12490871
https://doi.org/10.1067/mod.2002.129189...
).

Eletromiografia de Superfície(1818 Ries LG, Alves MC, Bérzin F. Asymmetric activation of temporalis, masseter, and sternocleidomastoid muscles in temporomandibular disorder patients. Cranio. 2008; 26:59-64. https://doi.org/10.1179/crn.2008.008. PMid:18290526
https://doi.org/10.1179/crn.2008.008...
)

Exame foi realizado no Laboratório de Eletromiografia do Curso de Fonoaudiologia/CEPRE/FCM/UNICAMP. O equipamento utilizado foi o eletromiógrafo Myosystem I acoplado a um computador Pentium® 4 (Intel) de 650 MHz e software Myosystem BR, versão 2.52 (Data Hominis Tecnologia Ltda.). Condicionador de sinal com 12 bits de resolução e CMRR (Modo de Rejeição Comum) de 112 db @ 60 Hz. O sinal eletromiográfico foi obtido com um conversor Analógico Digital (A/D) da Myosystem Prosecon Ltda., modelo PCI-DAS 1200 com 12 bits de resolução com frequência de amostragem para coleta de 2.000 Hz, sendo filtrado por passa banda de 20 e 500 Hz. Foram utilizados eletrodos bipolares descartáveis de Ag/AgCl modelo Chicopee MA 011 (Meditrace®, Kendall-LTP) com 1 cm de diâmetro, que foram acoplados a um pré-amplificador modelo PA1010-VA da Lynx Tecnologia Ltda., para criar um circuito ativo diferencial.

Fixação dos eletrodos

Diante da presença de pelo ou cabelo, foi realizada a tricotomia e, posteriormente, a adstringência da pele com álcool etílico 70 %. Os participantes então permaneceram confortavelmente sentados em uma cadeira com os braços apoiados sobre o colo e a cabeça posicionada paralela ao plano de Frankfurt (linha que liga um ponto da parte mais baixa da margem orbitária ao tragus). Foram orientados a manter o olhar fixo no horizonte para manter a posição natural da cabeça. Os joelhos e quadris foram mantidos a 90° de flexão e os pés apoiados no chão. O eletrodo de referência foi posicionado junto ao osso frontal do participante e os demais eletrodos fixados bilateralmente, com distância intereletrodo de 1 cm, na musculatura supra-hióidea(1919 Ormeño G, Miralles R, Loyola R, Valenzuela S, Santander H, Palazzi C, Villanueva P: Body position effects on EMG activity of the temporal and suprahyoid muscles in healthy subjects and in patients with myogenic cranio-cervical-mandibular dysfunction. J CraniomandibPract. 1999; 17:132-142. https://doi.org/10.1080/08869634.1999.11746087. PMid:10425940
https://doi.org/10.1080/08869634.1999.11...
) e musculatura suboccipital(2020 Sommerich CM, Joines SMB, Hermans V, Moon SD. Use of surface electromyography to estimate neck muscle activity. J ElectromyogrKinesiol, 10 (2000) 377-398). (Figura 1))

Figura 1
Fixação dos eletrodos na musculatura supra-hióidea (a) e na musculatura suboccipital; note-se que foi necessário realizar tricotomia para o adequado posicionamento dos eletrodos (b)

Exercícios de fortalecimento da língua

As manobras consistiram de movimentos isocinéticos da língua contra o palato(1111 Proffit WR, Mason RM. Myofunctional therapy for tongue thrusting: background and recommendations. J AmDent Assoc.1975; 90:403-11. https://doi.org/10.14219/jada.archive.1975.0075. PMid:1053783
https://doi.org/10.14219/jada.archive.19...
,1212 Giuca MR, Pasini M, Pagano A, Mummolo S, Vanni A. Longitudinal study on a rehabilitative model for correction of atypical swallowing. Eur J PaediatrDent. 2008;9(4):170-174. PMid:19072004). Para tanto, uma sonda nasogástrica com diâmetro de quatro mililitros (4 mL) foi conectada a uma seringa de 10 mL contendo água e posicionada entre a ponta da língua e a papila atrás dos dentes incisivos superiores. O volume de 70 mL de água foi sugado de forma intermitente em um total de sete seringas.

Já nos registros de EMG, foram consideradas quatro fases: repouso, início, intermediário e final, sendo que os registros foram coletados assim que o participante iniciava a sucção da seringa. A fase inicial consistiu da média do RMS referente à sucção da primeira e da segunda seringa. Para a fase intermediária, foi considerada a sucção das terceira, quarta e quinta seringas, e a fase final, a sucção das sexta e sétima seringas. As variáveis atividade elétrica média e simetria do RMS foram considerados em relação a Classe oclusal, Fase e efeito Classe Fase.

Coleta do Sinal de EMG:

A duração da coleta dos sinais foi medida durante o repouso e durante a sucção de água.

Recrutamento da Musculatura Lingual

Foi obtido com participante sugando água, em que foi utilizada uma sonda nasogástrica descartável, marca Mark Med, curta n.º 04, acoplada a uma seringa descartável sem agulha, marca BD Plastipak, 10 mL(2121 Kim Y, McCullough GH. Maximum hyoid displacement in normal swallowing. Dysphagia. 2008; 23:274-9. PMid:11102841. https://doi.org/10.1016/s1050-6411(00)00033-x
https://doi.org/10.1016/s1050-6411(00)00...
). A seringa foi preenchida com água mineral e a sonda foi posicionada entre a língua e a região da papila incisiva, possibilitando a captação da atividade muscular da língua desde a sucção até a deglutição da água. A avaliação foi dividida em quatro fases: Repouso, Sucção Inicial, Sucção Intermediária e Sucção Final, com descanso de cinco minutos entre elas. No repouso e demais fases, os sinais obtidos foram no início de cada situação e finalizados após 10 segundos. Com exceção do Repouso, as fases de sucção inicial e final corresponderam à média de duas seringas de 10 mL, enquanto que a intermediária correspondeu à média de três seringas. No total, o participante realizou várias sucções em um total de 70 mL, correspondente a sete seringas.

Como se tratava de participantes saudáveis, inicialmente sem referência de dor, não foi aplicado nenhum instrumento específico para investigação da sensibilidade. As sensações foram determinadas a partir de um estudo piloto cujas queixas predominantes foram: desconforto, cansaço e dor. Nessas condições, foi solicitado que o participante definisse o local da queixa, sendo anotado o momento em que ocorreu.

Análise Estatística

As análises foram conduzidas independentemente em cada um dos compartimentos (Estudo da Amostra, Eletromiografia e Relatos das Sensações), e separadas conforme a natureza das variáveis (paramétrica e não paramétrica). Os resultados foram apresentados na sequência definida pelo tipo de análise, a seguir:

a) Análise Exploratória

A comparação estatística dos grupos por gênero e idade foi realizada pelo método de Mann-Whitney, com correção de Yates. Foi escolhido este método em virtude de o grupo amostral não possuir distribuição normal, o que determinou comparação pelas médias e adotado nível de significância de 5 % (p=0,05).

A análise paramétrica da amostra confirmou similaridade na variância do n, o que justificou a quantidade distinta de participantes encontrada neste estudo. Os resultados mostraram, ainda, que houve homogeneidade na caracterização dos grupos, equivalência em relação à Idade (p=0,3003) e ao Gênero (p=0,9405), não influenciando no processamento dos dados de eletromiografia e relatos de sensações.

b) Eletromiografia

Os dados foram tabulados na linguagem “txt’ para análise quantitativa. Porém, não foram submetidos à normalização(1818 Ries LG, Alves MC, Bérzin F. Asymmetric activation of temporalis, masseter, and sternocleidomastoid muscles in temporomandibular disorder patients. Cranio. 2008; 26:59-64. https://doi.org/10.1179/crn.2008.008. PMid:18290526
https://doi.org/10.1179/crn.2008.008...
), uma vez que a literatura(2222 Duarte Kroll C, Bérzin F, Alves MC. Avaliação clínica da atividade dos músculos mastigatórios durante a mastigação habitual - um estudo sobre a normalização de dados eletromiográficos. Revista de Odontologia da UNESP. 2010;39(3):157-62) refere que, ao atenuar sinais de artefatos e diferenças interindividuais dos participantes, no caso de estudos clínicos, o perfil que diferencia os grupos pode ser descaracterizado. Uma vez tabulados os valores de Root Means Square (RMS)(1818 Ries LG, Alves MC, Bérzin F. Asymmetric activation of temporalis, masseter, and sternocleidomastoid muscles in temporomandibular disorder patients. Cranio. 2008; 26:59-64. https://doi.org/10.1179/crn.2008.008. PMid:18290526
https://doi.org/10.1179/crn.2008.008...
) na fase de pré-processamento, foi feita a transformação das variáveis originais em indicadores apropriados para a análise e interpretação dos resultados. No pré-processamento dos dados oriundos da eletromiografia, foi efetuado o cálculo do índice de simetria. Esse indicador variou de zero, indicando ausência de simetria, até um, que indica simetria perfeita nas quantidades de ativações dos músculos, ou seja, valores exatamente iguais observados no lado direito e no lado esquerdo(1818 Ries LG, Alves MC, Bérzin F. Asymmetric activation of temporalis, masseter, and sternocleidomastoid muscles in temporomandibular disorder patients. Cranio. 2008; 26:59-64. https://doi.org/10.1179/crn.2008.008. PMid:18290526
https://doi.org/10.1179/crn.2008.008...
).

Também foram calculados os valores médios de RMS para cada músculo, conforme descrito, e a simetria, calculando-se a média dos valores correlatos observados no mesmo músculo do lado direito e do lado esquerdo.

Os indicadores obtidos na fase de pré-processamento foram submetidos à análise de variância baseada em postos, e ajustados num modelo linear generalizado misto para teste dos efeitos da Classe Oclusal e da Fase na forma de medidas repetidas, uma vez que houve também avaliação nas diferentes fases.

A necessidade da adoção da técnica de análise de variância baseada em postos apenas foi percebida após o início da condução das análises dos dados originais, já que se frustraram as tentativas de ajuste de um modelo com resíduos aderentes à distribuição gaussiana, o que obrigou a aplicação de método híbrido paramétrico/não paramétrico. Foi definida, na fase de planejamento da análise, a aplicação do teste de Tukey para as comparações múltiplas de médias. Em todos os testes estatísticos, foi adotado o nível de significância de 5 % (p=0,05).

Na investigação dos participantes Classe I e Classe II/2.ª Divisão em relação à repercussão dos exercícios de fortalecimento da língua (fases: repouso, inicial, intermediária e final) na região cervical, foram consideradas variáveis quantitativas (média e simetria) dos músculos supra-hióideos e suboccipitais, e descritivas (relatos sensoriais) da região cervical. Com os registros eletromiográficos digitalizados, foi possível calcular a atividade elétrica média muscular por meio do RMS, segundo a equação a seguir:

RMS M ú sculo = RMS Direito + RMS Esquerdo / 2

E, para análise da simetria, foi adotada a seguinte equação:

IS M ú sculo = 1 RMS Direito RMS Esquerdo / RMS Direito + RMS Esquerdo

ISMúsculo é o índice de simetria de cada músculo estudado, tendo sido calculados indicadores para os músculos supra-hióideo e suboccipital;RMSDireito é o valor da raiz do quadrado médio (Root Mean Square) do músculo posicionado do lado direito e o RMSEsquerdo corresponde ao valor obtido no músculo homólogo. Esse indicador varia de zero (indicando ausência de simetria) até um, que indica simetria perfeita nas quantidades de ativações dos músculos, ou seja, valores exatamente iguais observados nos lados direito e esquerdo.

c) Estudos das sensações relatadas pelos participantes

Diante da natureza nominal das medidas, a análise das sensações teve como fundamento a construção de tabelas de contingência unidimensionais, com objetivo meramente descritivo, e em tabelas de contingência bidimensionais associadas ao teste de Cochran, Mantel e Haenszel, para comparação da igualdade de escores nos grupos. Foi adotado o nível de significância de 5 % para interpretação dos resultados.

RESULTADOS

Gênero

A análise do gênero comprovou a equivalência entre os grupos (p=0,9405) (Tabela 1) de sujeitos Classe I e Classe II/2.ª Divisão (retrognatas).

Tabela 1
Comparativo das variáveis numéricas em relação ao gênero entre a Classe I e a Classe II/2.ª Divisão (mordida aberta dentária e retrognatismo mandibular)

Idade

A análise da idade também comprovou a equivalência entre os dois grupos (p=0,3003) (Tabela 2).

Tabela 2
Comparativo das variáveis numéricas em relação à idade entre os grupos

Média

Foram observados, na média, fortes indícios (p<0,01) de diferenças entre as médias de RMS dos músculos supra-hióideos e suboccipitais em, pelo menos, duas das quatro fases estudadas. Entretanto, não foram observados indícios de efeitos significativos da classe ou da interação. Resultado similar foi observado nas médias de simetria dos músculos suboccipitais com fortes indícios (p<0,01) de diferenças entre as médias de simetrias apenas nas fases. Já na musculatura supra-hióidea, os dados revelaram fortes indícios (p<0,01) da existência de interação significativa, o que nos leva a concluir que as fases e as classes interagem e geram efeitos decorrentes da combinação.

Como não houve diferença significativa entre as classes (Tabela 3), as mesmas foram então somadas para a análise de comparação das médias de RMS dos músculos supra-hióideos e suboccipitais, conforme Figuras 1A e 1B.

Tabela 3
Análise de variância baseada em postos dos dados de RMS (Média e Simetria) dos músculos supra-hióideos e suboccipitais

O teste de Tukey nos músculos supra-hióideos revelou diferença significativa somente na fase de repouso (Figura 1A). Note, entretanto, que apesar de não significativa, houve uma diminuição expressiva de atividade durante a fase intermediária, que coincidiu com a única fase em que a musculatura suboccipital também apresentou elevação significativa em relação às demais fases (Figuras 2A e 1B).

Figura 2
Médias (desvio padrão), limites de confiança da média e teste de Tukey para comparação das médias de RMS dos músculos supra-hióideos e do grupo muscular suboccipital. Barras com letras iguais indicam médias que diferem entre si no nível de significância de 5%

Simetria

Na análise da simetria baseada no RMS dos músculos suboccipitais, as classes foram novamente somadas, pois, segundo a Tabela 3, também não houve diferença significativa entre as classes (Figura 3).

Figura 3
Médias (desvio padrão) limites de confiança da média e teste de Tukey para comparação da simetria dos músculos suboccipitais. Barra com letras iguais indicam médias que não diferem entre si no nível de significância de 5%

O teste dá indícios de que, tanto na Classe I quanto na Classe II, a assimetria ocorreu somente na fase de sucção intermediária. Foi interessante observar que, nesse momento de assimetria, houve uma elevação de atividade na musculatura suboccipital (Figura 3B).

Por fim, distintamente do que ocorreu anteriormente na musculatura supra-hióidea, os participantes Classe I apresentaram um comportamento distinto dos participantes Classe II/2.ª Divisão, assim como ao longo das fases (Tabela 3).

Comparando-se os efeitos dentro de cada fase (letras maiúsculas), observa-se que somente na fase de repouso os participantes Classe I e Classe II foram simétricos. À medida, entretanto, que começam a sugar, a Classe I foi mais equilibrada que a Classe II/2.ª Divisão (Figura 4A), sendo que a assimetria ocorreu somente na fase intermediária e é restabelecida na fase final. Já na Classe II, a assimetria é evidente na fase inicial, intermediária sem restabelecimento do equilíbrio até na fase final (Figura 4B).

Figura 4
Médias (desvio padrão) limites de confiança da média e teste de Tukey para comparação da simetria dos músculos supra-hióideos. Barra com letras iguais indicam médias que não diferem entre si no nível de significância de 5 %. S: Sucção, Interm: intermediária. Note-se que a musculatura supra-hióidea apresentou diferença significativa entre as classes oclusais em todas as fases, com exceção do repouso (A) e assimetria na Classe I somente na fase intermediária, distintamente do que ocorreu na Classe II/2.ª Divisão, que a partir do momento em que começou a executar os exercícios manteve assimetria de forma sistemática (B)

Descrição da sensação cervical

No relato da sensação, fica evidente, nas fases intermediária e final, a elevada porcentagem de participantes Classe I (75 %) sem queixa, distintamente do que ocorre na Classe II/2.ª Divisão (14,5 %) (Quadro 1).

Quadro 1
Relato nas distintas classes oclusais da sensação cervical ao longo das fases no fortalecimento da língua

DISCUSSÃO

Os exercícios de fortalecimento da língua repercutiram de forma expressiva na região cervical, com relatos de desconforto e dor apenas no participante Classe II/2.ª Divisão, retrognatas. Tais relatos se justificam pelo comportamento muscular nos exercícios de fortalecimento da língua nas distintas classes oclusais, evidenciados pelas variáveis média do RMS e simetria dos músculos supra-hióideos e suboccipitais.

Para a prática fonoaudiológica, tais resultados são de extrema relevância, uma vez que exercícios de fortalecimento da língua são vastamente utilizados ao longo das intervenções mioterápicas em diversas situações(33 Norton NS. Netter's Head and Neck Anatomy for Dentistry. Netter Basic Sciences. 3rd ed. Elsevier: Health Science; 2016). E o desencadeamento de quadros de desconforto ou queixas álgicas pode não só dificultar como até mesmo impossibilitar a continuidade dos exercícios. Outro fator a se considerar é a relevância de avaliações interdisciplinares, fonoaudiologia e fisioterapia, para a compreensão das queixas na região da cintura escapular, como podemos observar na discussão a seguir.

Para análise do sinal, foi considerado o RMS, uma vez que os sinais apresentaram uma distribuição equilibrada ao longo das captações. Na média do RMS em relação à classe oclusal, os resultados não revelaram diferença significativa. Porém, os dados indicaram que algo ocorreu na fase intermediária, uma vez que a musculatura supra-hióidea apresentou uma expressiva diminuição de atividade e a musculatura suboccipital, uma significativa elevação (p=0,0004). Ou seja, os dados indicam que, no momento de declínio de atividade da musculatura supra-hióidea, a região cervical realizou uma compensação cujos resultados podem ser justificados por três fatores.

Em primeiro lugar, pelo comando neural em comum entre os sistemas motor da mandíbula e do pescoço, responsáveis pela manutenção do equilíbrio da cabeça para que funções importantes, como a deglutição − a qual fez parte do exercício de sucção proposto pelo estudo, uma vez que a água foi deglutida e ambos os momentos foram considerados na captação −, possam ocorrer sem intercorrências(2121 Kim Y, McCullough GH. Maximum hyoid displacement in normal swallowing. Dysphagia. 2008; 23:274-9. PMid:11102841. https://doi.org/10.1016/s1050-6411(00)00033-x
https://doi.org/10.1016/s1050-6411(00)00...
,2323 H Zafar. Integrated jaw and neck function in man. Studies of mandibular and head-neck movements during jaw opening-closing tasks.SwedDent J. 2000; 143:1-41). O segundo fator a ser considerado é a musculatura supra-hióidea e os movimentos exercidos pela língua que podem ser correlacionados, devido ao elo que possuem com o complexo hiolaríngeo(2424 Pearson WG, Langmore SE, Yu LB, Zumwait AC. Structural Analysis of muscles elevathing the hyolaryngeal Complex. Dysphagia.2012; 27, 445-451. https://doi.org/10.1007/s00455-011-9392-7. PMCID:PMC3350616. PMid:22278076
https://doi.org/10.1007/s00455-011-9392-...
). Observe-se que o exercício proposto no estudo, ao levar a língua a se apoiar no palato e tracionar o osso hióideo para cima, provocou uma alteração na cadeia funcional, especialmente do Trígono de Beclard(2525 Machado A.Neuroanatomia Funcional. 3ªed. São Paulo: Atheneu, 2013. p.360), em que se localizam o osso hioide, o nervo hipoglosso e a parte posterior do músculo digástrico(33 Norton NS. Netter's Head and Neck Anatomy for Dentistry. Netter Basic Sciences. 3rd ed. Elsevier: Health Science; 2016). Este último, com inserção na eminência mastoidea do osso temporal, intimamente relacionado à inserção da musculatura suboccipital na região da nuca(33 Norton NS. Netter's Head and Neck Anatomy for Dentistry. Netter Basic Sciences. 3rd ed. Elsevier: Health Science; 2016,55 AI Kapandji. The physiology of the joints: The Spinal Column, Pelvic Girdle and Head v.3. 6th Revised edition. London UK: Publish Elsevier Health Sciences; 2008). E, por fim, a ação conjunta da língua com os músculos suboccipitais também pode ter sido favorecida pelos ramos do nervo hipoglosso presentes na alça cervical(33 Norton NS. Netter's Head and Neck Anatomy for Dentistry. Netter Basic Sciences. 3rd ed. Elsevier: Health Science; 2016,55 AI Kapandji. The physiology of the joints: The Spinal Column, Pelvic Girdle and Head v.3. 6th Revised edition. London UK: Publish Elsevier Health Sciences; 2008).

Em uma análise mais detalhada por meio da simetria(1818 Ries LG, Alves MC, Bérzin F. Asymmetric activation of temporalis, masseter, and sternocleidomastoid muscles in temporomandibular disorder patients. Cranio. 2008; 26:59-64. https://doi.org/10.1179/crn.2008.008. PMid:18290526
https://doi.org/10.1179/crn.2008.008...
) − isto é, lado direito e lado esquerdo, que identifica situações de ajustes e compensações −, na musculatura suboccipital, também não houve diferença entre as classes, mas sim novamente em relação à fase intermediária. Ou seja, nessa fase, algo desencadeou um desarranjo na postura da cabeça que, posteriormente, na fase final, foi reequilibrada. Na simetria da musculatura supra-hióidea, houve diferença significativa entre as classes. Na Classe I, o único momento de assimetria tanto da musculatura supra-hióidea como da suboccipital foi novamente na Sucção Intermediária(2626 Ide NI, Muramatsu LV, Ramari C, Macedo DV, Palomari ET. Artigo de revisão. Adaptações neurais ao treinamento de força. Rev. Acta Brasileira do Movimento Humano. 2014;4(5):1-16), restabelecido na fase final. O desarranjo ou inconsistência muscular nesse caso concorda com estudos(2626 Ide NI, Muramatsu LV, Ramari C, Macedo DV, Palomari ET. Artigo de revisão. Adaptações neurais ao treinamento de força. Rev. Acta Brasileira do Movimento Humano. 2014;4(5):1-16,2727 Phablo Abreu P, LealCardoso JH, Ceccatto VM. Adaptation of skeletal muscle to physical exercise: molecular and energy considerations. RevBrasMed Esporte. 2017;23(1). https://doi.org/10.1590/1517-869220172301167371
https://doi.org/10.1590/1517-86922017230...
) que indicam uma ação reflexa para manutenção do movimento e busca de equilíbrio do sistema funcional. E, na Classe II/2.ª Divisão, dados consistentes constataram assimetria na musculatura supra-hióidea ao longo de quase todas as fases, distintamente do que ocorreu na Classe I.

Na Classe II/2.ª Divisão, o comportamento muscular provavelmente foi afetado pelo retrognatismo, o qual ocasiona flacidez na musculatura da língua em função da mordida aberta dentária e esquelética desses casos. A flacidez, com isso, justifica o estado instável nas fases de Repouso, Sucção Inicial e Sucção Intermediária, fato não ocorrido na Sucção Final, em que as duas classes restabeleceram a simetria na musculatura suboccipital, ou seja, equilíbrio postural da cabeça. Isso ocorre, provavelmente, pelo fato de os participantes terem consciência de que seria o último exercício. Tal continuidade, entretanto, não foi sem custo para os participantes da Classe II/2.ª Divisão, cujos relatos de cansaço, incômodo e dor ocorreram desde a Sucção Inicial. Note-se que se culminou em queixas expressivas de dor e incômodo na região cervical (63 %) e base da língua (37 %) em todos os participantes na sucção final. Já, no participante Classe I, as queixas de incômodo e dor foram pontuais e irrelevantes na região dorsal inferior média da língua em apenas cinco participantes. A presença de incômodo e dor chama a atenção, pois se trata de adultos jovens(2828 Mansilla-Ferragut, P, Fernández-de-las-Peñas, C, Alburquerque-Sendín, F, Cleland, JA, Boscá-Gandía, JJ. The immediate effects of atlanto-occipital joint manipulation on active mouth opening and pressure pain sensitivity in women with mechanical neck pain. J Man PhysiolTher. 2009; 32: 101- 106. https://doi.org/10.1016/j.jmpt.2008.12.003. PMid:19243721
https://doi.org/10.1016/j.jmpt.2008.12.0...
) (média de idade 32,63±14,02), com homogeneidade em relação ao gênero e saudáveis, não havendo, assim, a necessidade, inclusive, da aplicação de um protocolo específico para determinação da dor, por não apresentarem ainda indicativos, como o processo de envelhecimento, que possam desencadear tais sintomas(2929 Hatch JP, Shinkai RSA, Sakai S, Rugh JD, Paunovich ED. Determinants of masticatory performance in dentate adults. Arch. Oral. Biol. 2001;46(7):641-48. https://doi.org/10.1016/s0003-9969(01)00023-1. PMid:113693
https://doi.org/10.1016/s0003-9969(01)00...
). Entretanto, confirmou-se o quanto fatores dento/esqueléticos podem interferir nesses casos.

Nos participantes, Classe II/2.ª Divisão, a retificação cervical decorrente do retrognatismo, ao tensionar os músculos suboccipitais, tornou a deglutição árdua, uma vez que provavelmente os músculos hióideos contraíram ao longo dos exercícios e não conseguiram relaxar totalmente após o movimento, principalmente a parte posterior do músculo digástrico. Nos exercícios de fortalecimento da língua, a contração isométrica exigida na língua desencadeou um aumento de tensão por todo seu ventre muscular, levando à ativação em demasia dos órgãos tendinosos de Golgi(2727 Phablo Abreu P, LealCardoso JH, Ceccatto VM. Adaptation of skeletal muscle to physical exercise: molecular and energy considerations. RevBrasMed Esporte. 2017;23(1). https://doi.org/10.1590/1517-869220172301167371
https://doi.org/10.1590/1517-86922017230...
,3030 Guyton AC, Hall JE. Guyton and Hall Textbook of Medical Physiology, International Edition. The 13th edition. Elsevier: Health Sciences; 2015). Um estudo relata que estímulos sucessivos despertam terminações nervosas livres responsáveis pela aferência do sistema, os quais, diante de sobrecarga, lentificam a ação muscular(2626 Ide NI, Muramatsu LV, Ramari C, Macedo DV, Palomari ET. Artigo de revisão. Adaptações neurais ao treinamento de força. Rev. Acta Brasileira do Movimento Humano. 2014;4(5):1-16). E, com isso, em vez de fortalecer a musculatura, promovem um reflexo monossináptico30 cuja resposta pode ocasionar cansaço, desconforto ou dor. Esse é um quadro coerente com os relatos sensoriais obtidos neste estudo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS: o presente estudo apresentou uma série de limitações, como o uso da avaliação postural apenas para efeito de exclusão e a ausência de dispositivos quantitativos para mensurar a dor, que poderiam trazer maiores evidências com a elevação da amostra. Tais dispositivos também poderiam ter contribuído para a normalização dos dados, atenuando, com isso, as possíveis diferenças interindividuais. Assim, pesquisas futuras devem ser conduzidas observando esse importante aspecto.

CONCLUSÃO

Os exercícios isocinéticos, sucção da língua contra o palato com posterior deglutição, repercutiram de forma expressiva com relatos de desconforto e dor na região cervical apenas nos participantes Classe II/2.ª Divisão. Na média do RMS, não houve diferença entre as classes, mas, na fase intermediária, a musculatura suboccipital apresentou elevação de atividade significativa. Já com relação à simetria na musculatura supra-hióidea, dados revelaram diferença significativa entre as classes e assimetria na fase intermediária.

  • Trabalho realizado no CEPRE, Faculdade de Medicina - Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP ‐ Campinas (SP), Brasil
  • Fonte de financiamento: Não houve fonte de auxílio à pesquisa.

AGRADECIMENTOS

Agradecemos a todos os voluntários que participaram da pesquisa; ao Setor de Radiologia do Hospital das Clínicas da Unicamp; aos Professores, Servidores e Alunos do CEPRE-UNICAMP.

REFERÊNCIAS

  • 1
    Ferreira TS, Mangili LD, Sassi FC, Fortunato-Tavares T, Limongi SCO, Andrade CRF. Speech and myofunctional exercise physiology: a critical review of the literature. J SocBrasFonoaudiol. 2011;23(3):288-96. https://doi.org/10.1590/s2179-64912011000300017 PMid:22012166
    » https://doi.org/10.1590/s2179-64912011000300017
  • 2
    Shen FH, Samartzis D, Fessler RG.Textbook of the Cervical Spine. 1rt ed. Saunders: Elsevier Health Sciences; 2014
  • 3
    Norton NS. Netter's Head and Neck Anatomy for Dentistry. Netter Basic Sciences. 3rd ed. Elsevier: Health Science; 2016
  • 4
    Bondi M. Muscular "Modus Agendi" and craniomandibular dysfunction. J Orofacial Myology. 1995; 21:61-65. PMid:9055673
  • 5
    AI Kapandji. The physiology of the joints: The Spinal Column, Pelvic Girdle and Head v.3. 6th Revised edition. London UK: Publish Elsevier Health Sciences; 2008
  • 6
    Shiino Y, Sakai, S, Takeishi, R, et al. Effect of body posture on involuntary swallow in healthy volunteers. PhysiolBehav 2016; 155: 250-259
  • 7
    Ishii T, Narita N, Endo H. Evaluation of jaw and neck muscle activities while chewing using EMG-EMG transfer function and EMG-EMG coherence function analyses in healthy subjects. Physiology&Behavior. 2016; 160:35-42. https://doi.org/10.1016/j.physbeh.2016.03.023 PMid:27059322
    » https://doi.org/10.1016/j.physbeh.2016.03.023
  • 8
    Lopatiene K, Smailiené D, Sidlauskiene M. An Interdisciplinary Study of Orthodontic, Orthopedic, and Otorhinolaryngological Findings in 12-14-Year-Old Preorthodontic Children. Medicina (Kaunas). 2013;49(11). PMid:24823929
  • 9
    Li Q, Minagi, Y, Hor K, Kondoh J, Fujiwara S, Tamine K, et al. Coordination in oro-pharyngeal biomechanics during human swallowing. PhysiolBehav. 2015; 1: 300- 305. https://doi.org/10.1016/j.physbeh.2015.05.004 PMid:25957912
    » https://doi.org/10.1016/j.physbeh.2015.05.004
  • 10
    Graber TM. The "three M's": Muscles, malformation, and malocclusion. Am J Orthod. 1963; 49(6): 418-450. https://doi.org/10.1016/0002-9416(63)90167-2
    » https://doi.org/10.1016/0002-9416(63)90167-2
  • 11
    Proffit WR, Mason RM. Myofunctional therapy for tongue thrusting: background and recommendations. J AmDent Assoc.1975; 90:403-11. https://doi.org/10.14219/jada.archive.1975.0075 PMid:1053783
    » https://doi.org/10.14219/jada.archive.1975.0075
  • 12
    Giuca MR, Pasini M, Pagano A, Mummolo S, Vanni A. Longitudinal study on a rehabilitative model for correction of atypical swallowing. Eur J PaediatrDent. 2008;9(4):170-174. PMid:19072004
  • 13
    J. Smithpeter, D. Covell. Relapse of anterior open bites treated with orthodontic appliances with and without orofacial myofunctional therapy. Am J OrthodDentofacialOrthop, 137 (2010), pp. 605-614. https://doi.org/10.1016/j.ajodo.2008.07.016 PMid:20451779
    » https://doi.org/10.1016/j.ajodo.2008.07.016
  • 14
    Van Grootel RJ, Buchner R, Wismeijer D, Van der Glas HW. Towards an optimal therapy strategy for myogenous TMD, physiotherapy compared with occlusal splint therapy in an RCT with therapy-and-patient-specific treatment durations. BMC MusculoskeletalDisorders. 2017; 18:76. https://doi.org/10.1186/s12891-017-1404-9 PMCID:PMC5301345. PMid:28183288
    » https://doi.org/10.1186/s12891-017-1404-9
  • 15
    Teixeira JM, Barros Filho T, Lin TY, Hamani C, Teixeira WGJ. Cervicalgias. Rev Med. 2001;80(2):307-16.
  • 16
    Ahmad M, Hollender L, Anderson Q, Kartha K, Ohrbach R, Truelove E, Mike JT, Schiffman E. Research Diagnostic Criteria for Temporomandibular Disorders (RDC/TMD): Development of Image Analysis Criteria and Examiner Reliability for Image Analysis. Oral Surg Oral Med Oral Pathol Oral RadiolEndod. 2009; 107(6): 844-860. https://doi.org/10.1016/j.tripleo.2009.02.023 PMCID: PMC3139469. PMid:19464658
    » https://doi.org/10.1016/j.tripleo.2009.02.023
  • 17
    Todd M, Walkow DMD, SheldonPeck DDS. Dental arch width in Class II Division 2 deep-bite malocclusion. American Journal of Orthodontics and Dentofacial Orthopedics. 2002;122(6):608-13. https://doi.org/10.1067/mod.2002.129189 PMid:12490871
    » https://doi.org/10.1067/mod.2002.129189
  • 18
    Ries LG, Alves MC, Bérzin F. Asymmetric activation of temporalis, masseter, and sternocleidomastoid muscles in temporomandibular disorder patients. Cranio. 2008; 26:59-64. https://doi.org/10.1179/crn.2008.008 PMid:18290526
    » https://doi.org/10.1179/crn.2008.008
  • 19
    Ormeño G, Miralles R, Loyola R, Valenzuela S, Santander H, Palazzi C, Villanueva P: Body position effects on EMG activity of the temporal and suprahyoid muscles in healthy subjects and in patients with myogenic cranio-cervical-mandibular dysfunction. J CraniomandibPract. 1999; 17:132-142. https://doi.org/10.1080/08869634.1999.11746087 PMid:10425940
    » https://doi.org/10.1080/08869634.1999.11746087
  • 20
    Sommerich CM, Joines SMB, Hermans V, Moon SD. Use of surface electromyography to estimate neck muscle activity. J ElectromyogrKinesiol, 10 (2000) 377-398
  • 21
    Kim Y, McCullough GH. Maximum hyoid displacement in normal swallowing. Dysphagia. 2008; 23:274-9. PMid:11102841. https://doi.org/10.1016/s1050-6411(00)00033-x
    » https://doi.org/10.1016/s1050-6411(00)00033-x
  • 22
    Duarte Kroll C, Bérzin F, Alves MC. Avaliação clínica da atividade dos músculos mastigatórios durante a mastigação habitual - um estudo sobre a normalização de dados eletromiográficos. Revista de Odontologia da UNESP. 2010;39(3):157-62
  • 23
    H Zafar. Integrated jaw and neck function in man. Studies of mandibular and head-neck movements during jaw opening-closing tasks.SwedDent J. 2000; 143:1-41
  • 24
    Pearson WG, Langmore SE, Yu LB, Zumwait AC. Structural Analysis of muscles elevathing the hyolaryngeal Complex. Dysphagia.2012; 27, 445-451. https://doi.org/10.1007/s00455-011-9392-7 PMCID:PMC3350616. PMid:22278076
    » https://doi.org/10.1007/s00455-011-9392-7
  • 25
    Machado A.Neuroanatomia Funcional. 3ªed. São Paulo: Atheneu, 2013. p.360
  • 26
    Ide NI, Muramatsu LV, Ramari C, Macedo DV, Palomari ET. Artigo de revisão. Adaptações neurais ao treinamento de força. Rev. Acta Brasileira do Movimento Humano. 2014;4(5):1-16
  • 27
    Phablo Abreu P, LealCardoso JH, Ceccatto VM. Adaptation of skeletal muscle to physical exercise: molecular and energy considerations. RevBrasMed Esporte. 2017;23(1). https://doi.org/10.1590/1517-869220172301167371
    » https://doi.org/10.1590/1517-869220172301167371
  • 28
    Mansilla-Ferragut, P, Fernández-de-las-Peñas, C, Alburquerque-Sendín, F, Cleland, JA, Boscá-Gandía, JJ. The immediate effects of atlanto-occipital joint manipulation on active mouth opening and pressure pain sensitivity in women with mechanical neck pain. J Man PhysiolTher. 2009; 32: 101- 106. https://doi.org/10.1016/j.jmpt.2008.12.003 PMid:19243721
    » https://doi.org/10.1016/j.jmpt.2008.12.003
  • 29
    Hatch JP, Shinkai RSA, Sakai S, Rugh JD, Paunovich ED. Determinants of masticatory performance in dentate adults. Arch. Oral. Biol. 2001;46(7):641-48. https://doi.org/10.1016/s0003-9969(01)00023-1 PMid:113693
    » https://doi.org/10.1016/s0003-9969(01)00023-1
  • 30
    Guyton AC, Hall JE. Guyton and Hall Textbook of Medical Physiology, International Edition. The 13th edition. Elsevier: Health Sciences; 2015

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    31 Jul 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    27 Set 2018
  • Aceito
    02 Set 2019
Sociedade Brasileira de Fonoaudiologia Al. Jaú, 684, 7º andar, 01420-002 São Paulo - SP Brasil, Tel./Fax 55 11 - 3873-4211 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revista@codas.org.br