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Aplicação de um instrumento de triagem do vocabulário para crianças entre 3 e 7 anos: estudo piloto

RESUMO

Objetivo

descrever o desempenho em vocabulário expressivo e receptivo de crianças entre três e sete anos de idade em um instrumento de triagem.

Método

a amostra foi composta por 133 crianças entre três e sete anos de idade, sem diagnósticos de deficiências ou transtornos do neurodesenvolvimento. Para a triagem, foi utilizado o instrumento TRILHAR, que inclui as habilidades de vocabulário receptivo e expressivo. Os dados foram analisados pelos testes Kruskal-Wallis, Mann-Whitney e Correlação de Spearman.

Resultado

houve diferença no desempenho dos grupos, além de correlação positiva entre a faixa etária e a pontuação na triagem. Ainda, verificou-se diferença nos desempenhos das provas de vocabulário receptivo e expressivo.

Conclusão

Foi verificada diferença no desempenho dos grupos nas tarefas de vocabulário receptivo, expressivo e no resultado final, com melhores resultados para o grupo de sete anos. Além disso, observou-se correlação positiva entre a idade e o desempenho na triagem, ou seja, quanto maior a idade, melhor o desempenho.

Descritores:
Vocabulário; Criança; Linguagem Infantil; Programas de Rastreamento; Estudo de Validação

ABSTRACT

Purpose

to describe the performance of children between three and seven years of age in using an expressive and receptive screening instrument.

Methods

the sample consisted of 133 children between 3 and 7 years of age, without diagnoses of neurodevelopmental disabilities or disorders. The screening was performed with the TRILHAR instrument, which includes receptive and expressive vocabulary skills. The data were analyzed by the Kruskal-Wallis, Mann-Whitney, and Spearman Correlation tests.

Results

we observed a statistical difference in the groups’ performance, in addition to a positive correlation between the age group and the final score in the screening. There was statistical difference in the performance on the receptive and expressive vocabulary subtests.

Conclusion

We observed difference in the performance of the groups in receptive and expressive tasks, and in the final score, with better performance for the children with 7 years. In addition, age and performance on the screening test were positively correlated, that is, the older the age, the better the performance.

Keywords:
Vocabulary; Child; Child Language; Mass Screening; Validation Study

INTRODUÇÃO

O vocabulário é formado por habilidades receptivas e expressivas, que correspondem a compreensão e produção das palavras, respectivamente(11 Ferracini F, Capovilla AGS, Dias NM, Capovilla FC. Expressive and receptive vocabulary assessment in preschool. Rev Psicopedag. 2006;23(71):124-33.). A forma e significado destas palavras são armazenadas no sistema léxico-semântico(22 Chow J, Davies AMA, Fuentes LJ, Plunkett K. The vocabulary spurt predicts the emergence of backward semantic inhibition in 18-months-old toddlers. Dev Sci. 2018:22(2):e12754. http://dx.doi.org/10.1111/desc.12754.
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). Durante o desenvolvimento, a aprendizagem de novo vocabulário permite a comunicação entre a criança e o ambiente no qual está inserida(33 Gândara JP, Befi-Lopes DM. Trends on lexical acquisition in children within normal development and children with developmental language disorder. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2010;15(2):297-304.).

Um dos primeiros marcos do desenvolvimento do vocabulário é a produção da primeira palavra aproximadamente aos 12 meses de idade. Nesta faixa etária, cerca de 86% dos responsáveis notam mudanças significativas na expressão de seus filhos(44 Kraljević JK, Cepanec M, Simlesa S. Gestural development and it’s relation to a child’s early vocabulary. Infant Behav Dev. 2014;37(2):192-202. http://dx.doi.org/10.1016/j.infbeh.2014.01.004. PMid:24583922.
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). Comumente, as primeiras nomeações fazem relação a objetos, alimentos, animais, partes do corpo e atividades de rotina(55 Marjanovič-Umek L, Fekonja-Peklaj U, Podlesek A. Characteristics of early vocabulary and grammar development in slovenian-speaking infants and toddlers: a CDI-adaptation study. J Child Lang. 2013;40(4):779-98. http://dx.doi.org/10.1017/S0305000912000244. PMid:22863332.
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). Após os 18 meses, geralmente quando o léxico é formado por 50 palavras, a aquisição de vocabulário passa a ocorrer de forma rápida(66 Samuelson LL, McMurray B. What does it take to learn a word. Wiley Interdiscip Rev Cogn Sci. 2017;8(1-2):e1421. http://dx.doi.org/10.1002/wcs.1421. PMid:27911490.
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), caracterizando a explosão de vocabulário(77 Ganger J, Brent MR. Reexamining the vocabulary spurt. Dev Psychol. 2004;40(4):621-32. http://dx.doi.org/10.1037/0012-1649.40.4.621. PMid:15238048.
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). Neste período, as palavras passam a ser utilizadas em sentenças e coordenadas com o uso de gestos(88 Parladé MV, Iverson JM. The interplay between language, gesture, and affect during communicative transition: a dynamic systems approach. Dev Psychol. 2011;47(3):820-33. http://dx.doi.org/10.1037/a0021811. PMid:21219063.
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). Outro crescimento semântico importante será notado após a inserção escolar(99 Song S, Su M, Kang C, Liu H, Zhang Y, McBride-Chang C, et al. Tracing children’s vocabulary development from preschool through the school-age years: an 8-year longitudinal study. Dev Sci. 2015;18(1):119-31. http://dx.doi.org/10.1111/desc.12190. PMid:24962559.
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). Por meio da leitura, haverá contato com palavras de baixa frequência na língua oral, o que permite o aprendizado incidental, sobretudo tratando-se de textos narrativos(1010 Duff D, Tomblin J, Catts H. The influence of reading on vocabulary growth: a case of a Matthew Effect. J Speech Lang Hear Res. 2015;58(3):853-64. http://dx.doi.org/10.1044/2015_JSLHR-L-13-0310. PMid:25812175.
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).

O vocabulário restrito é considerado um sinal de risco para os transtornos de linguagem(1111 ASHA: American Speech-Language-Hearing Association. Spoken language disorders [Internet]. Rockville: American Speech-Language-Hearing Association; c1997-2019 [cited 2019 Jan 30]; [about 5 screens]. Available from: https://www.asha.org/PRPSpecificTopic.aspx?folderid=8589935327§ion=Signs_and_Symptoms
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), por isso a importância deste aspecto da linguagem. Indivíduos com esta característica podem apresentar atrasos no nível morfossintático(1212 Rescorla L, Turner HL. Morphology and sintax in late talkers at age 5. J Speech Lang Hear Res. 2015;58(2):434-44. http://dx.doi.org/10.1044/2015_JSLHR-L-14-0042. PMid:25631704.
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), dificuldades em socialização(1313 Capone Singleton N. Late talkers: why the wait-and-see approach is outdated. Pediatr Clin North Am. 2018;65(1):13-29. http://dx.doi.org/10.1016/j.pcl.2017.08.018. PMid:29173713.
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), em decodificação(1414 Marcotte A, Parker C, Furey W, Hands J. An examination of the validity of the dynamic indicators of vocabulary skills (DIVS). J Psychoed Assess. 2014;32(2):133-45. http://dx.doi.org/10.1177/0734282913498849.
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) e compreensão leitora(1515 Psyridou M, Eklund K, Poikkeus AM, Torppa M. Reading outcomes of children with delayed early vocabulary: a follow-up from age 2-16. Res Dev Disabil. 2018;78:114-24. http://dx.doi.org/10.1016/j.ridd.2018.05.004. PMid:29805034.
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), comportamentos agressivos, depressão e ansiedade(1616 van Daal J, Verhoeven L, van Balkom H. Behaviour problems in children with language impairment. J Child Psychol Psychiatry. 2007;48(11):1139-47. http://dx.doi.org/10.1111/j.1469-7610.2007.01790.x. PMid:17995490.
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). Longitudinalmente, muitas dessas crianças persistem com dificuldades, em especial aquelas identificadas tardiamente(1313 Capone Singleton N. Late talkers: why the wait-and-see approach is outdated. Pediatr Clin North Am. 2018;65(1):13-29. http://dx.doi.org/10.1016/j.pcl.2017.08.018. PMid:29173713.
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).

Na literatura nacional, estão disponíveis instrumentos validados para avaliação do vocabulário, os quais foram plenamente pesquisados, são eles: Teste de Vocabulário Auditivo por Figuras USP (TVfUSP), Teste de Linguagem Infantil ABFW, Teste Token, Teste de Vocabulário Auditivo, dentre outros(1717 Guimarães C, Oda A. Instrumentos de avaliação de linguagem infantil: aplicabilidade em deficientes. Rev CEFAC. 2013;15(6):1690-702. http://dx.doi.org/10.1590/S1516-18462013000600033.
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). O objetivo destes testes é avaliar clinicamente o desempenho em vocabulário e obter um diagnóstico.

Apesar da quantidade de instrumentos de avaliação, são escassos os estudos nacionais dedicados a triagem do vocabulário e sua aplicação em crianças falantes do português brasileiro. Como evidenciado em revisão de literatura anteriormente realizada(1818 Barbosa ALA, Soares HB, Azoni CAS. Construção de um instrumento de triagem do vocabulário para crianças entre 3 e 7 anos. Audiol Commun Res. 2019;24:e2131. http://dx.doi.org/10.1590/2317-6431-2019-2131.
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), há instrumentos de triagem do vocabulário para falantes do inglês, devidamente validados para esta população, como o Dynamic Indicators of Vocabulary Skills(1919 Marcotte A, Clemens N, Parker C, Whitcomb S. Examining the classification accuracy of a vocabulary screening measure with preschool children. Assess Eff Interv. 2016;41(4):230-42. http://dx.doi.org/10.1177/1534508416632236.
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), Language Development Survey(2020 Rescorla L. The language development survey: a screening tool for delayed language in toddlers. J Speech Hear Disord. 1989;54(4):587-99. http://dx.doi.org/10.1044/jshd.5404.587. PMid:2811339.
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) e o Receptive Vocabulary Screener Application(2121 Schaefer B, Bowyer-Crane C, Herrmann F, Fricke S. Development of a tablet application for the screening of receptive vocabulary skills in multilingual children: a pilot study. Child Lang Teach Ther. 2015;32(2):179-91. http://dx.doi.org/10.1177/0265659015591634.
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). Estes instrumentos são capazes de detectar precocemente crianças com sinais de risco em relação ao nível semântico da linguagem, o que possibilita a promoção de práticas de intervenção precoce.

Diante do exposto, nota-se a necessidade de pesquisas dedicadas a criação, validação e aplicação de triagens na área da linguagem infantil. O objetivo deste estudo foi aplicar um instrumento de triagem do vocabulário receptivo e expressivo em crianças entre 3 e 7 anos de idade. A hipótese do estudo é de que haverá diferença no desempenho entre as faixas etárias, com aumento no número de acertos na triagem de acordo com o avanço da idade.

MÉTODO

Tipo de estudo e aspectos éticos

Trata-se de um estudo descritivo, transversal e quantitativo, aprovado pelo Comitê de Ética, parecer número 2.548.341. Todos os responsáveis pelos participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e os participantes o Termo de Assentimento Livre e Esclarecido (TALE).

Participantes

Inicialmente, foram selecionadas 136 crianças, porém uma possuía diagnóstico de Síndrome de Down e duas de Transtorno do Espectro do Autismo (TEA). A amostra final contou com 133 crianças do ensino infantil ao primeiro ano do ensino fundamental de escolas públicas da cidade de aplicação do estudo, dos quais 45,9% (n=61) eram do sexo masculino e 54,1% (n=72) do sexo feminino, com média de idade de 4,99 anos (dp=1,384), subdivididas nos seguintes grupos, de acordo com a faixa etária: G1 – 38 crianças com três anos de idade; G2 – 21 crianças com quatro anos de idade; G3 – 30 crianças com cinco anos de idade; G4 – 32 crianças com seis anos de idade; G5 – 22 crianças com sete anos de idade. A amostra foi selecionada por conveniência, de acordo com a disponibilidade das crianças. Por se tratar de um estudo piloto para verificar os aspectos iniciais de aplicação do instrumento, não foi realizado cálculo amostral.

Para a seleção da amostra, foram levados em consideração os seguintes critérios de inclusão: crianças entre três e sete anos de idade regularmente matriculadas no ensino público, sem diagnóstico de síndromes, deficiências ou transtornos do neurodesenvolvimento, de acordo com relato da professora ou diagnóstico prévio. Caso os pesquisadores detectassem alguma alteração no desenvolvimento da linguagem, a criança não seria incluída no estudo e deveria ser encaminhada para avaliação específica. É importante citar que, para indivíduos na faixa etária mais precoce, foi considerado o desenvolvimento fonológico durante a aplicação do instrumento, nos quais processos fonológicos comuns para cada faixa etária não foram considerados sinais de alterações.

Material

O instrumento de triagem TRILHAR tem como objetivo realizar a triagem do vocabulário receptivo e expressivo de crianças entre três e sete anos de idade, visando a identificação de sinais de risco para alterações no desenvolvimento do nível semântico da linguagem oral, considerando-se que nesta faixa etária o desenvolvimento do vocabulário é essencial para aquisição de outras habilidades linguísticas e para o desenvolvimento da leitura. Foi construído por pesquisadores brasileiros, a partir da observação da necessidade de instrumentos de triagem do vocabulário por meio de revisão integrativa da literatura. A seleção das palavras e construção das figuras ocorreu criteriosamente, levando em consideração instrumentos de avaliação do vocabulário. O processo detalhado da revisão de literatura e construção do instrumento, incluindo a seleção das palavras e elaboração das figuras, encontra-se referenciado(1818 Barbosa ALA, Soares HB, Azoni CAS. Construção de um instrumento de triagem do vocabulário para crianças entre 3 e 7 anos. Audiol Commun Res. 2019;24:e2131. http://dx.doi.org/10.1590/2317-6431-2019-2131.
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).

O TRILHAR conta com dez atividades semânticas para a recepção e dez para a expressão. No vocabulário receptivo, a criança deve apontar imagens correspondentes às palavras faladas pelo avaliador. No vocabulário expressivo, deve nomear dez imagens apresentadas. É composto por vocábulos dos seguintes campos semânticos: roupas, animais, alimentos, móveis, utensílios, meios de transporte, brinquedos, instrumentos, profissões, lugares, partes do corpo, adjetivos e verbos (Tabela 1). Durante sua construção, evitou-se o uso de vocábulos que sofressem variação cultural e na análise, é considerado acerto a produção de sinônimos.

Tabela 1
Itens de vocabulário receptivo e expressivo do instrumento de triagem

Para a aplicação, há um fantoche que facilita a interação entre a criança e o avaliador, bem como estimula a motivação para a conclusão das atividades. O material também conta com um manual de uso para o aplicador do teste e folhas para registro das respostas. É indicada a observação de aspectos qualitativos, sendo importante o registro da presença de sinais comportamentais importantes, alterações fonológicas ou fonéticas na oralidade, desatenção, lentificação e não compreensão do teste. O instrumento deve ser utilizado por fonoaudiólogo.

O resultado é calculado de acordo com o número de acertos nas provas de vocabulário expressivo e receptivo, nas quais a pontuação máxima é de dez pontos. O resultado final, de no máximo vinte, é obtido a partir da soma dos pontos das provas citadas anteriormente.

Procedimento

Primeiramente, foram contatadas duas escolas públicas do ensino infantil e fundamental para a obtenção da anuência. Após isso, foram enviadas cartas de apresentação da pesquisa aos pais e realizadas reuniões para a descrição do instrumento, sua forma de aplicação e assinatura do TCLE e TALE, a partir dos sete anos de idade.

Todas as triagens foram realizadas individualmente, em sala com condições acústicas e de iluminação adequadas, no horário combinado com as professoras de cada turma. Foi utilizado o material impresso do instrumento, com apoio do fantoche para motivação da criança na atividade. A aplicação foi iniciada pelo vocabulário receptivo, seguido pelo vocabulário expressivo, com média de tempo total de aplicação de 04 minutos e 03 segundos (dp=01m39s).

Análise dos dados

Os dados foram analisados de forma descritiva e inferencial, por meio dos testes Kruskal-Wallis para verificar a diferença entre as idades; Mann-Whitney para a diferença entre os sexos e Correlação de Spearman para verificar a correlação entre as variáveis de idade, sexo e desempenho na prova. Considerou-se o intervalo de confiança de 95% e nível de significância de 0,05. Foi utilizado o IBM SPSS Statistics, versão 23.

RESULTADOS

Os valores descritivos do desempenho em pontuação dos grupos na triagem encontram-se apresentados na Tabela 2, seguidos pelos valores descritivos de acordo com o sexo na Tabela 3. Além disso, é possível verificar a porcentagem de acertos de cada item da triagem (Tabela 4).

Tabela 2
Desempenho na triagem de acordo com a faixa etária
Tabela 3
Desempenho na triagem de acordo com o sexo
Tabela 4
Porcentagem de acertos por item para cada faixa etária para verificar o nível de dificuldade

Por fim, foi observada e correlação positiva entre o desempenho em vocabulário receptivo e vocabulário expressivo (p=0,01, r=0,22).

DISCUSSÃO

A partir dos resultados deste estudo, observou-se a diferença da média entre os grupos e a correlação entre a idade e o desempenho no vocabulário receptivo, expressivo e no resultado final. Isto confirma a hipótese de aumento gradual do vocabulário de acordo com a faixa etária(2222 Cáceres-Assenço AM, Ferreira SCA, Santos AC, Befi-Lopes DM. Application of a Brazilian test of expressive vocabulary in European Portuguese children. CoDAS. 2018;30(2):e20170113. http://dx.doi.org/10.1590/2317-1782/20182017113. PMid:29791612.
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). Conforme a progressão da idade, ocorre a ampliação de habilidades cognitivas que proporcionam a aprendizagem de novas palavras durante as experiências cotidianas e situações de comunicação(2323 Moretti TCF, Kuroishi RCS, Mandrá PP. Vocabulary of preschool children with typical language development and socioeducational variables. CoDAS. 2017;29(1):e20160098. PMid:28300961.).

Embora neste estudo não tenha havido diferença de desempenho nas tarefas quanto ao sexo, em geral, observa-se que meninas obtém melhores resultados em tarefas que envolvem a linguagem, pois podem utilizar mais estratégias de aprendizagem(2424 Pahom O, Farley A, Ramonda K. Are the best language learners from Mars or from Venus? Gender and vocabulary acquisition in the L2 spanish classroom. Reading Matrix: An International Online Journal. 2015;15(1):158-72.). Entretanto, no aspecto vocabulário, os achados corroboram outros estudos na população brasileira(2222 Cáceres-Assenço AM, Ferreira SCA, Santos AC, Befi-Lopes DM. Application of a Brazilian test of expressive vocabulary in European Portuguese children. CoDAS. 2018;30(2):e20170113. http://dx.doi.org/10.1590/2317-1782/20182017113. PMid:29791612.
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,2525 Medeiros VP, Valença RKL, Guimarães JATL, Costa RCC. Expressive vocabulary and analyze the variables in a regional sample of students in Maceió. ACR. 2013;18(2):71-7.).

No que diz respeito ao tipo de tarefa, as crianças obtiveram melhores resultados no vocabulário receptivo, visto que o desenvolvimento das habilidades compreensivas ocorre anteriormente e mais rapidamente do que produção(2626 Benedict H. Early lexical development: comprehension and production. J Child Lang. 1979;6(2):183-200. http://dx.doi.org/10.1017/S0305000900002245. PMid:468932.
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). Além disso, o vocabulário receptivo é base para o desenvolvimento da produção e quanto melhor as habilidades compreensivas, também o será na expressão em linguagem(2727 Armonia AC, Mazzega LC, Pinto FCA, Souza ACRF, Perissinoto J, Tamanaha AC. Relação entre vocabulário receptivo e expressivo em crianças com transtorno específico do desenvolvimento da fala e da linguagem. Rev CEFAC. 2015;17(3):759-65. http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620156214.
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). Este padrão é considerado uma das tendências de aquisição lexical(33 Gândara JP, Befi-Lopes DM. Trends on lexical acquisition in children within normal development and children with developmental language disorder. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2010;15(2):297-304.), havendo um intervalo de cerca de cinco meses entre a compreensão e a produção de 50 palavras.

Nove palavras obtiveram baixo percentual de acerto, foram elas: gangorra, escola, rir, torneira, quarto, quebrar, pastel, roda-gigante e fazendeiro. Um dos motivos que pode ter influenciado este resultado foi a construção gráfica das figuras. Para que o reconhecimento ocorra plenamente, deve haver relação entre a figura e o objeto conhecido pela criança(2828 Snodgrass JG, Vanderwart M. A standerdized set of 260 pictures: norms for name agreement, image agreement, familiarity and visual complexity. J Exp Psychol Hum Learn. 1980;6(2):174-215. http://dx.doi.org/10.1037/0278-7393.6.2.174. PMid:7373248.
http://dx.doi.org/10.1037/0278-7393.6.2....
). É possível que os itens indicados acima não tenham representado as palavras de forma adequada, visto que não houve uma faixa etária específica, o que sugere a necessidade de revisões.

Dentre as palavras com baixo percentual de acerto, houve predominância das tarefas do vocabulário expressivo. Isto pode ser explicado pelo fato de que, no vocabulário expressivo, a criança precisa fazer uma relação direta entre a imagem e a palavra. Já no vocabulário receptivo, existe a possibilidade de acerto por exclusão, o que facilita a identificação da imagem para a palavra ouvida.

Um aspecto importante a ser pontuado é que o português do Brasil sofre variações culturais referentes ao léxico e crianças brasileiras apresentam alto nível de variabilidade em tarefas de nomeação(2929 Miranda MC, Pompéia S, Bueno OFA. Um estudo comparativo das normas de um conjunto de 400 figuras entre crianças brasileiras e americanas. Rev Bras Psiquiatr. 2004;26(4):226-33. http://dx.doi.org/10.1590/S1516-44462004000400005. PMid:15729455.
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). Por este motivo, o TRILHAR foi construído visando minimizar este viés e considera correta a produção de sinônimos, visto que quando esta variável é ignorada, a criança pode apresentar desempenho compatível com uma alteração de linguagem devido a incompatibilidade entre seu dialeto e o dialeto do instrumento, levando a uma situação de um falso diagnóstico para alteração da linguagem(3030 Laing SP, Kamhi A. Alternative assessment of language and literacy in culturally and linguistically diverse populations. Lang Speech Hear Serv Sch. 2003;34(1):44-55. http://dx.doi.org/10.1044/0161-1461(2003/005). PMid:27764486.
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).

Os dados iniciais desse estudo piloto visaram observar o desempenho preliminar de crianças com desenvolvimento típico na triagem do vocabulário e o funcionamento prático do TRILHAR. Estes dados auxiliarão na composição da versão final do instrumento. Futuramente, é importante que seja aplicado em diferentes grupos diagnósticos, com foco na investigação dos sinais de risco referentes ao nível semântico da linguagem. Além disso, outras etapas do processo de validação são necessárias para definir a pontuação de corte a ser considerada na análise do instrumento.

É importante esclarecer que o TRILHAR trata-se de uma triagem, portanto seu objetivo é identificar crianças com sinais de riscos para as diferentes alterações no desenvolvimento da linguagem, as quais possuem sintomas relacionados ao vocabulário. O desempenho semântico e demais níveis da linguagem devem ser, posteriormente, avaliados clinicamente visando o diagnóstico e início da intervenção, caso seja confirmada a alteração.

Uma possível limitação a ser pontuada foi a ausência de análise do tipo de troca semântica realizada pela criança, visto que inicialmente os autores consideraram este tipo de observação mais adequada para situações de avaliação. Além disso, a aplicação apenas em escolas públicas faz um recorte da população infantil, sendo necessários mais estudos com indivíduos de escolas privadas e diferentes situações socioeconômicas.

Esta pesquisa pode contribuir para os aspectos educacionais e científicos na área de linguagem infantil e Fonoaudiologia Educacional, visto a existência de um instrumento de triagem do vocabulário que permite a identificação de crianças com sinais de risco para as alterações de linguagem, possibilitando a intervenção precoce e prevenção das dificuldades de aprendizagem da leitura posteriormente.

CONCLUSÃO

Foi verificada diferença no desempenho dos grupos nas tarefas de vocabulário receptivo, seguido do expressivo e no resultado final, com melhores resultados para o grupo de sete anos. Além disso, observou-se correlação positiva entre a idade e o desempenho na triagem, ou seja, quanto maior a idade, melhor o desempenho.

AGRADECIMENTOS

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), pelo auxílio para a realização desta pesquisa, sob processo número 1728008.

  • Trabalho realizado no Departamento de Fonoaudiologia, Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN - Natal (RN), Brasil.
  • Fontes de financiamento: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), processo número 1728008.

REFERÊNCIAS

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    Ferracini F, Capovilla AGS, Dias NM, Capovilla FC. Expressive and receptive vocabulary assessment in preschool. Rev Psicopedag. 2006;23(71):124-33.
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    Chow J, Davies AMA, Fuentes LJ, Plunkett K. The vocabulary spurt predicts the emergence of backward semantic inhibition in 18-months-old toddlers. Dev Sci. 2018:22(2):e12754. http://dx.doi.org/10.1111/desc.12754
    » http://dx.doi.org/10.1111/desc.12754
  • 3
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    05 Maio 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    15 Jun 2019
  • Aceito
    22 Maio 2020
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