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Aspectos texturais do magmatismo e tramas da tectônica impostas ao Granito Chaval na Zona de Cisalhamento Santa Rosa, extremo Noroeste da Província Borborema

Textural aspects of magmatism and tectonics imposed to Chaval Granite in Santa Rosa Shear Zone, North West of Borborema Province

Resumos

A região Noroeste da Província Borborema apresenta uma diversidade de corpos graníticos de natureza e evolução tectônica diversificadas, do Paleoproterozoico ao Paleozoico, com maior incidência relacionada ao Neoproterozoico e alojamento em diferentes fases da orogenia Brasiliana. Um desses exemplos é o Granito Chaval, que representa um batólito aflorante próximo à costa Atlântica do Ceará e Piauí, intrusivo em ortognaisses do Complexo Granja e supracrustais do Grupo Martinópole. Ele é, em parte, coberto por depósitos cenozoicos costeiros e rochas sedimentares paleozoicas da Bacia do Parnaíba. O Granito Chaval tem como característica marcante a textura porfirítica, destacando-se megacristais de microclina, em sienogranitos e monzogranitos, e outras feições texturais/estruturais de origem magmática, Essas permitiram interpretar sua evolução como de alojamento relativamente raso do plúton, conduzido por processos de cristalização fracionada, mistura de magmas com fluxo magmático e ação gravitacional em função da diferença de densidade do magma, levando à flutuação e ascensão de megacristais de microclina no magma residual, com alojamento de leucogranitos e pegmatitos nos estágios finais da evolução deste plutonismo. Por outro lado, em toda a metade Leste do plúton, encontra-se um rico acervo de estruturas tectógenas de cisalhamento, relacionada à implantação da Zona de Cisalhamento Transcorrente Santa Rosa, que levou a transformações tectonometamórficas superpostas às feições magmáticas, as quais atingiram condições metamórficas máximas na fácies anfibolito baixo. Cartograficamente, foram individualizados três domínios estruturais em que estão presentes uma gama de variações petroestruturais do Granito Chaval, sejam feições texturais/estruturais ígneas e tectônicas. As rochas plutônicas foram deformadas e modificadas progressivamente à medida que se dirige para Leste, no qual as rochas mudam-se para tonalidades mais escuras do cinza e os processos de cominuição e recristalização dinâmica reduzem, progressivamente, a granulação grossa desses granitos bem como o tamanho dos fenocristais para dimensões mais finas, mantendo-se suas características porfiroides. Desse modo, a trama milonítica se torna evidente, acentuando-se ao atingir a porção principal da Zona de Cisalhamento Transcorrente Santa Rosa. Como principais feições estruturais, destacam-se extinção ondulante forte; encurvamento e segmentação de cristais; geminação de deformação; rotação de cristais; microbudinagem; foliação anastomosada, inclusive S-C; lineação de estiramento; formas amendoadas de porfiroclastos, fitas e folhas de quartzo e recristalização. Os produtos desses processos de cisalhamento resultam na formação de protomilonitos, milonitos e ultramilonitos. Essas faixas miloníticas representam os locais de maior concentração da deformação, por isso é possível acompanhar progressivamente suas modificações texturais e mineralógicas, configurando uma sequência clássica de deformação progressiva heterogênea, por cisalhamento simples, em condições frágil-dúctil e dúctil. O alojamento do Granito Chaval aconteceu no final do Criogeniano (aproximadamente 630 Ma) e pode ser interpretado como magmatismo sin a tardi-tectônico em relação ao evento Brasiliano. O processo de cisalhamento que gerou a Zona de Cisalhamento Transcorrente Santa Rosa se formou nos incrementos finais da deformação de uma colisão continental em um sistema de cavalgamento oblíquo, em que se edificou o Cinturão de Cisalhamento Noroeste do Ceará, devido ao extravasamento lateral de massas crustais em fluxo dúctil acontecido no final da orogenia Brasiliana no Noroeste da Província Borborema.

Granito Chaval; Tramas magmáticas e tectônicas; Sistema Transcorrente; Zona de Cisalhamento Santa Rosa; Lineamento Transbrasiliano


The Northwestern region of Borborema Province features a wide variety of granitic bodies with diverse nature and tectonic evolution, since the Paleoproterozoic to Early Paleozoic, presenting higher incidence related to Neoproterozoic emplaced at different stages of Brasiliano (Panafrican) orogeny. One of these examples is the Chaval Granite representing a batholith body intruded in orthogneisses of Granja Complex and supracrustal rocks of Martinópole Group, outcropped near the Ceará and Piauí Atlantic coasts, Northeastern Brazil. The batholith is partly covered by Cenozoic coastal deposits and sedimentary rocks of the Paleozoic Parnaíba Basin. The Chaval Granite has a striking textural feature, which is represented by porphyritic highlighting microcline megacrysts in syenogranites and monzogranites, and many others textural/structural features of magmatic origin. They allowed interpreting the plutonic evolution at relatively shallow crustal level emplacement acting processes of fractional crystallization, magma mixing with intense magmatic flow, and gravitational force due to density difference of magma that lead to fluctuation of megacrysts of microcline and plagioclase in the residual magma, and accommodation of small bodies of leucogranite and pegmatites in the final stages of plutonic magmatic evolution of such plutonism. On the other hand, across the Eastern half of the pluton, there is a rich collection of shear structures related to the tectonic construction of the Santa Rosa Transcurrent Shear Zone, which led to tectono-metamorphic transformations superimposed on magmatic features that reached peak metamorphic conditions in the low amphibolite facies. Cartographically, three homogeneous structural domains were individualized, and each of them presents a variety of petrographic-structural features of the Chaval of igneous or tectonic nature. The plutonic rocks were deformed and progressively modified Eastward, in which the rocks change to darker gray, and comminution and dynamic recrystallization processes are reduced, as well as the coarse-grained granites are progressively, as well as the size of the phenocrysts to thinner dimensions, keeping their porphyroid characteristics, being accentuated the mylonitic features to achieve the main portion of Santa Rosa Transcurrent Shear Zone. As main structural features, there is the ondulatory extinction, cleavage and twining bending, twinning deformation, anastomosing foliation, badinage, S-C foliation, mineral stretching lineation, rotated and segmented crystals, lenticular, almondy or fish forms of porphyroclasts, pressure shadow, and ribbon quartz. The products of this shear deformation result in the formation of protomylonites, mylonites, and ultramylonites. These mylonite zones represent areas with the highest concentration of deformation that can gradually follow their textural and mineralogical changes, setting up a classic sequence of progressive heterogeneous deformation by simple shear in brittle-ductile and ductile conditions. The emplacement of Chaval Granite happened at the end of the Cryogenian (approximately 630 Ma) and can be interpreted as syn-tardi tectonic magmatism regarding the Brasiliano event. The process that generated the Santa Rosa Shear Zone resulted from lateral extravasation crustal masses in ductile flow took place in the final increments of deformation of a continental collision on an oblique thrust system, which built the Northwest Ceará Shear Belt, and happened at the end of Brasiliano (Panafrican) orogeny in Northwest Borborema Province.

Chaval Granite; Magmatic and tectonic fabric; Transcurrent system; Santa Rosa Shear Zone; Transbrasiliano Lineament


INTRODUÇÃO

O Granito Chaval compreende um batólito localizado no extremo Noroeste da Província Borborema na fronteira dos estados do Piauí e Ceará, próximo à Costa Atlântica. Levantamentos geológicos realizados nesta região, em uma seção de aproximadamente 70 km de Oeste para Leste, desde os arredores da localidade de Jandira passando por Bom Princípio, São Miguel, Santa Rosa, Brejinho, Camurupim e São Domingos e pelas cidades de Chaval, Barroquinha até Granja, permitiram a identificação de dois domínios estruturais distintos e outros subdomínios no Granito Chaval: um que apresenta feições tipicamente magmáticas e outro marcado por tramas tectônicas relacionadas à deformação e às transformações minerais ao longo da Zona de Cisalhamento Santa Rosa (ZCSR), ao Noroeste da Província Borborema.

Neste trabalho, esses domínios e subdomínios estruturais são caracterizados e suas relações são discutidas dentro do quadro da colocação e deformação do Granito Chaval, ao Noroeste da Província Borborema.

O presente trabalho apresenta dados de análise estrutural, principalmente de ordem mesoscópica, complementada por estudos petrográficos, ao longo dos principais locais de ocorrência do Granito Chaval e de suas encaixantes. Além disso, discute suas relações temporais do processo de colocação e dos efeitos das transformações tectonometamórficas do cisalhamento. A Fig. 1 situa a área de estudo no contexto geológico-geotectônico do Noroeste da Província Borborema e apresenta um panorama das relações espaciais das várias unidades litotectônicas do domínio Médio Coreaú e da porção Oeste do domínio Ceará Central.

Figura 1.
A) Mapa geológico simplificado do NW da Província Borborema com as principais unidades geológico-geotectônicas, adaptado daquele do Estado do Ceará (Cavalcante et al. 2003); (B) Seção geológica esquemática Chaval - Sobral - Aracatiaçú mostrando as relações estruturais entre as principais unidades litoestratigráficas e tectônicas do Noroeste do Ceará.

CONTEXTO GEOLÓGICO DO NOROESTE DA PROVÍNCIA BORBOREMA

O Granito Chaval está situado no extremo Noroeste da Província Borborema, domínio Médio Coreaú, na unidade definida como Cinturão de Cisalhamento Noroeste do Ceará (Abreu et al. 1988Abreu F.A.M., Gorayeb P.S.S., Gama Jr. T., Hasui Y. 1988. O Cinturão de Cisalhamento Noroeste do Ceará. In: Congresso Latino-Americano de Geologia, 7, Belém, Anais, p. 20-33.), a qual compreende um conjunto de ortognaisses do Paleoproterozoico (Complexo Granja) tectonicamente imbricados com rochas supracrustais do Neoproterozoico (Grupo Martinópole), como visto na Fig. 1.

Os conjuntos litoestruturais têm direção geral NE-SW, e seu elemento planar de maior expressão é a foliação milonítica com mergulhos médios a altos, predominantemente para SE. A lineação de estiramento apresenta baixo valor de mergulho, em torno de 4 a 20º, até horizontais, para os quadrantes NE (predominantemente) ou SW. A deformação cisalhante, heterogênea e progressiva, em caráter dúctil e em condições metamórficas da fácies anfibolito alto, e em casos mais restritos da fácies granulito (região de Granja e Cariré), foi responsável pela formação de foliações e lineação de estiramento, por intensa transposição dos conjuntos rochosos em diferentes graus, rotação dos elementos da trama e imbricação. Assim, a região esteve envolvida em um sistema de cisalhamento oblíquo com cavalgamentos e transcorrências associadas, definido como Cinturão de Cisalhamento Noroeste do Ceará (Abreu et al. 1988Abreu F.A.M., Gorayeb P.S.S., Gama Jr. T., Hasui Y. 1988. O Cinturão de Cisalhamento Noroeste do Ceará. In: Congresso Latino-Americano de Geologia, 7, Belém, Anais, p. 20-33.; Abreu & Gorayeb 1992Abreu F.A.M., Gorayeb P.S.S. 1992. Feições litoestruturais e critérios cinemáticos no Cinturão Noroeste do Ceará. In: SBG, Congresso Brasileiro de Geologia, 37, São Paulo, Boletim de Resumos Expandidos, v. 1, p. 300-301.).

A unidade mais antiga está representada pelo Complexo Granja do Paleoproterozoico, com idades definidas entre 2,35 e 2,3 Ga - Sideriano (Fetter et al. 2000Fetter A.H., Van Schmus W.R., Santos T.J.S., Nogueira Neto J.A., Arthaud M.H. 2000. U-Pb and Sm-Nd geochronological constraints on the crustal evolution and basement architecture of Ceará state, NW Borborema province, NE Brazil: implications for the existence of the paleoproterozoic supercontinente "Atlantica". Revista Brasileira de Geociências, 30:102-106.). É constituído dominantemente por extensas áreas de ortognaisses tonalíticos e granodioríticos mais ou menos migmatizados e restritamente lentes de paragnaisses com granada, biotita e sillimanita, granulitos máficos, enderbitos e raros charnockitos, além de quartzitos diversos, formações ferríferas bandadas e anfibolitos.

O Grupo Martinópole compreende uma sequência supracrustal do Neoproterozoico constituída de micaxistos diversos com muscovita, biotita, granada, estaurolita, cianita e/ou sillimanita, quartzitos com muscovita e/ou sillimanita, paragnaisses aluminosos, rochas calciosilicáticas, mármores, anfibolitos, xistos ferruginosos, manganesíferos ou grafitosos e metavulcânicas (Abreu et al. 1989Abreu F.A.M., Gorayeb P.S.S., Gama Jr. T. 1989. Aspectos tectônicos da região de Martinópole - Massapê - CE. In: SBG-NE, Simpósio Nacional de Estudos Tectônicos, 2, Fortaleza, Actas, p. 265-267.; Santos & Hackspacher 1992Santos T.J.S, Hackspacher P.C. 1992. Geologia do Grupo Martinópole, noroeste do Ceará. In: Congresso Brasileiro de Geologia, 37, São Paulo, Anais, Boletim de Resumos Expandidos, v. 1, p. 298-299.; Santos et al. 2008Santos T.J.S., Fetter A.H., Nogueira Neto J.A. 2008. Comparisons between the northwestern Borborema Province, NE Brazil, and the southwestern Pharusian Dahomey Belt, SW Central Africa). Geological Society Special Publication, 294:101-119.). Datações U-Pb em zircão de metariolitos apontaram idade de 777 ± 11 Ma (Fetter et al. 2003Fetter A.H., Santos T.T.S., Van Schmus W.R., Hackspacher P.C., Neves B.B.B., Arthaud M.H., Nogueira Neto J.A., Wernick E. 2003. Evidence for Neoproterozoic continental Arc Magmatism in the Santa Quitéria batholith of Ceará state, NW Borborema Province, NE Brazil: implication for the assembly of West Gondwana. Gondwana Research, 6:265-273.; Araujo et al. 2012Araujo C.E.G., Cordani U.G., Basei M.A.S., Castro N.A., Sato K., Sproesser W.M. 2012. U-Pb detrital zircon provenance of metasedimentary rocks from the Ceará Central and Médio Coreaú Domains, Borborema Province, NE-Brazil: Tectonic implications for a long-lived Neoproterozoic active continental margin. Precambrian Research, 206:36-51.).

Uma das feições estruturais mais marcantes da região Noroeste do Ceará são as zonas de cisalhamento transcorrentes, sendo a mais expressiva a de Sobral - Cariré-Campo Lindo. Outras de variadas larguras e comprimentos delineiam lineamentos de direção NE-SW, preferencialmente, o que pode ser constatado no mapa geológico do estado do Ceará (Cavalcante et al. 2003Cavalcante J.C., Vasconcelos A.M., Medeiros M.F., Paiva I.P., Gomes F.E.M., Cavalcante S.N., Cavalcante J.E., Melo A.C.R., Duarte Neto V.C., Bevenides H.C. 2003. Mapa Geológico do Estado do Ceará. Escala 1:500.000. Fortaleza, CPRM - Serviço Geológico do Brasil.), tais como as zonas Estreito, Adrianópolis, Granja, Araçás, Martinópole, Uruoca, Água Branca, Campanário, Tangente, Senador Sá, Cariré e Forquilha. Esse quadro caracteriza um sistema transcorrente de expressão regional, sendo representado, na escala continental, pelo Lineamento Transbrasiliano. Sua continuidade ocorre para o continente africano (Cordani et al. 2013Cordani U.G., Pimentel M.M., Araújo C.E.G., Fuck, R.A. 2013. The significance of the Transbrasiliano - Kandi tectonic corridor for the amalgamation of West Gondwana. Brazilian Journal of Geology, 43:583-597.), interpretado como relacionado a uma colisão continental cujas diversas zonas de cisalhamento se formaram nos incrementos finais da deformação de um sistema de cavalgamento oblíquo, no qual se edificou o Cinturão de Cisalhamento Noroeste do Ceará, levando ao extravasamento lateral de massas crustais em fluxo dúctil acontecido no final da orogenia Brasiliana (750 a 550 Ma), ao Noroeste da Província Borborema (Gorayeb & Abreu 1989Gorayeb P.S.S., Abreu F.A.M. 1989. A Faixa de Alto Grau de Cariré. In: SBG-NE, Simpósio de Geologia do Nordeste, 13, Fortaleza, Atas, p. 182-184.; Arthaud & Torquato 1989Arthaud M.H., Torquato J.R. 1989. A tectônica transcorrente no estado do Ceará. In: SBG-NE, Simpósio Nacional de Estudos Tectônicos, 2, Fortaleza, Atas, p. 277-278.).

O Nefelina Sienito Brejinho (NSB), conforme descrito por Gorayeb et al. (2011)Gorayeb P.S.S, Barbosa R.C.O., Moura C.A.V., Lemos R.L. 2011. Petrografia, geocronologia e significado tectônico do Nefelina Sienito Brejinho: extremo noroeste da Província Borborema. Revista Brasileira de Geologia, 41:390-407., constitui um pequeno plúton alcalino de idade 554 ± 11 Ma localizado ao Sudoeste de Chaval, intrusivo em ortognaisses do Complexo Granja, em que secciona a ZCSR. Este plúton alcalino é um dos registros de episódio magmático pós-tectônico relacionado à tectônica extensional do final do Neoproterozoico - início do Paleozoico, que tem como um representante a Suíte Intrusiva Meruoca (Gorayeb 2010Gorayeb P.S.S. 2010. Estudo comparativo entre as províncias extensionais do NE da Província Tocantins e NW da Província Borborema. In: SBG, Congresso Brasileiro de Geologia, 45, Belém, Anais, CD-ROM.), com idades 523 ± 9 Ma e 523 ± 20 Ma (Archanjo et al. 2009Archanjo C.J., Launeau P., Hollanda M.H.B.M. 2009. Scattering of magnetic fabrics in the Cambrian alkaline granite of Meruoca (Ceará state, northeastern Brazil). International Journal of Earth Sciences, 98:1793-1807.; Teixeira et al. 2010Teixeira M.F.B., Nascimento R.S., Gorayeb P.S.S., Moura C.A.V., Abreu F.A.M. 2010. Novos dados geocronológicos do Feixe de Diques de Aroeiras e sua relação com o Granito Meruoca - noroeste do Ceará. In: Congresso Brasileiro de Geologia, 45, Belém, Anais, CD-ROM., respectivamente), mas com representação em grande parte da Província Borborema.

De um modo geral, o NSB é um corpo plutônico isento de deformação, de natureza alcalina subsaturada, constituído principalmente por rochas leucocráticas às mesocráticas, com granulação grossa e variações mais finas em alguns setores de suas margens resfriadas e nos limites entre algumas fácies petrográficas. Os principais tipos petrográficos são egirina-nefelina sienitos, biotita-nefelina sienitos, nefelina microssienitos, melassienitos, pegmatitos sieníticos e piroxenitos alcalinos (Gorayeb et al. 2011Gorayeb P.S.S, Barbosa R.C.O., Moura C.A.V., Lemos R.L. 2011. Petrografia, geocronologia e significado tectônico do Nefelina Sienito Brejinho: extremo noroeste da Província Borborema. Revista Brasileira de Geologia, 41:390-407.).

Na parte SW da área, as expressivas camadas sub-horizontais de arenitos do Grupo Serra Grande (Bacia do Parnaíba) estão depositadas em franca não conformidade sobre os ortognaisses, as supracrustais, os granitoides e as alcalinas já descritas, sustentando a terminação Norte da Serra da Ibiapaba, com altitudes máximas de quase 1.000 m.

Fechando o quadro estratigráfico, nas porções N e NW, as unidades mais antigas são cobertas por depósitos sedimentares cenozoicos da Costa Atlântica, tais como coluviões, depósitos em enseadas, restingas, lagos, aluviões, praias, dunas e mangues.

GRANITO CHAVAL

O Granito Chaval foi inicialmente identificado nos levantamentos cartográficos do Projeto Jaibaras com denominação estratigráfica informal (Costa et al. 1979Costa M.J., França J.B., Lins C.A.C., Bacchiegga I.F., Habekost C.R., Cruz W.B. 1979. Geologia da Bacia de Jaibaras, Ceará, Piauí e Maranhão - Projeto Jaibaras. Brasília, MME/DNPM, 106 p, Série Geologia Básica, 11.), e comporta um corpo batolítico com cerca de 2.000 km2 localizado próximo à zona costeira Atlântica, tendo como localidades referenciais as cidades de Chaval (Ceará) e Bom Princípio (Piauí), como observado nas Figs. 1 e 2. Grande parte do corpo acha-se encoberto por depósitos sedimentares cenozoicos costeiros ao Norte; no entanto, excelentes exposições estão presentes ao longo das principais drenagens ou em morros de, relativamente, baixa expressão topográfica, a exemplo da cidade de Chaval e arredores (Fig. 3A). Nas áreas mais afastadas da costa, o corpo se destaca na morfologia sustentando morros e serras com topos abaulados e formas tipo "pão de açúcar", apresentando altitudes de até 350 m, a exemplo da Serra do Chumbo, e se projeta para SW até desaparecer sob as camadas de arenitos do Grupo Serra Grande na borda da Serra da Ibiapaba (Figs. 2 e 3).

Figura 2.
Mapa geológico da região de Chaval - Bom Princípio, modificado de Gorayeb et al. (2011).

Figura 3.
Mapa dos domínios estruturais da área de ocorrência do Granito Chaval com representação das estruturas planares (em polo) e lineares em estereograma de igual área de Schmith.

Tal Granito apresenta uma relação intrusiva com os ortognaisses tonalíticos e granodioríticos do Complexo Granja e com granada-biotita xistos e quartzitos do Grupo Martinópole, ao longo do seu flanco Leste (Figs. 4B e 4C). Porém, os efeitos deformacionais da ZCSR, instalada na região de contato entre o granito e os ortognaisses, descaracterizam e dificultam a observação dessas relações em seu flanco Leste.

Figura 4.
Feições características do Granito Chaval e suas encaixantes: (A) Destaque do relevo em formas de maciços e grandes lajedos na cidade de Chaval; (B) Ortognaisses tonalíticos migmatizados do Complexo Granja; (C) Biotita-muscovita xisto do Grupo Martinópole, na porção Leste do plúton; (D) Arenitos estratificados, sub-horizontais, do Grupo Serra Grande no Planalto da Ibiapaba.

Na parte Oeste, os últimos registros de exposições do Granito Chaval são encontrados nos arredores da cidade de Bom Princípio, não se conhecendo sua real extensão, pois há amplas coberturas sedimentares (Fig. 3D). Entretanto, logo após a divisa do Piauí com o Maranhão, nas proximidades da localidade de Jandira (Maranhão), há uma pequena ocorrência de um microgranito exposto em uma pedreira, que pode corresponder à borda do Granito Chaval. Para Noroeste, o único registro que se conhece de rochas do embasamento é um pequeno maciço exposto na praia, ao Norte de Parnaíba, Piauí, na localidade da Pedra do Sal (Granito Pedra do Sal) (Gama Jr. et al. 1988Gama Jr. T., Gorayeb P.S.S., Abreu F.A.M. 1988. O Granito Pedra do Sal e suas feições de cisalhamento. Revista Brasileira de Geociências, 18:424-432.).

Geologia e petrografia

Em um quadro geral são registrados dois grupos petrográficos principais, bem distintos e delimitados nos mapas: um com característica tipicamente plutônica, que ocorre da porção central a Oeste do corpo; e outro que se distribui da porção central ao Leste, em que os registros da deformação cisalhante são gradativamente mais acentuados em direção à ZCSR (Figs. 2 e 3).

No primeiro grupo, a rocha predominante é um granito megaporfirítico de cor cinza, leucocrático com matriz fanerítica grossa. Predominam fenocristais euédricos de K-feldspato (1 a 10 cm) que podem alcançar entre 5 e 85 % modal. Fenocristais de plagioclásio são raros. Tais fenocristais definem uma foliação de fluxo magmático, provavelmente associada à ação da gravidade e dinâmica da câmara magmática (Fig. 5), os quais são representados por microclina pertítica de cor branca ou cinza claro, zonada e com geminação do tipo Carslbad (Fig. 5). Em suas seções hexagonais, perpendiculares à face 010, as trilhas das inclusões de lamelas de biotita demarcam zonas de crescimento magmático (Figs. 5B e 5C). Estas feições texturais são similares ao que foi descrito nos plútons graníticos Godani Valley, da Nigéria (Vaniman 1978Vaniman D. 1978. Crystallization history of sector-zoned microcline megacrysts from the Godani Valley pluton, Nigeria. Mineralogical Magazine, 42:443-451.), e Wuluuman, da Austrália (Vernon 2008Vernon R.H. 2008. A practical guide to rock microstructure. Cambridge, Cambridge University Press, 594 p.), em que também são interpretadas como de origem magmática.

Figura 5.
Estruturas primárias de origem ígnea plutônica representativa do Domínio A: (A) estrutura de fluxo magmático com orientação subparalela de fenocristais tabulares, euedrais de microclina com alto ângulo de mergulho denotando fluxo do magma durante o resfriamento; (B) Estrutura de fluxo magmático (porção inferior da foto) e alta concentração de megacristais de microclina (textura cumulada) em mais de 90% em volume da rocha (porção superior), formada por ação gravitacional e mobilidade do magma; (C a F) Detalhes dos megacristais tabulares de álcali feldspato com concentração de fenocristais de aproximadamente 40%, 50 a 75%, 85 e 100% do volume da rocha, respectivamente, indicando processo de fracionamento por ação gravitacional.

Os principais tipos de rochas são de natureza granítica, plutônica, classificadas como hornblenda-biotita monzogranitos porfiríticos, biotita-microclina granitos porfiríticos, quartzo-microclina sienitos cumulados e biotita sienogranitos. Além disso, foram identificados pegmatitos graníticos e aplitos.

Os fenocristais apresentam também textura poiquilítica, definida por concentrações de inclusões de biotita, K-feldspato, plagioclásio, quartzo, anfibólio e apatita.

A matriz apresenta textura granular hipidiomórfica contendo microclina e oligoclásio em quantidades variadas, seguidas por quartzo e, inferiormente, biotita e hornblenda, além de allanita, titanita, zircão, apatita e minerais opacos como acessórios.

Em termos estruturais, são frequentes as estruturas de fluxo magmático, destacando-se fortemente o alinhamento preferencial de megacristais euédricos de K-feldspato em matriz grossa de quartzo, feldspatos e biotita (Fig. 5). O acamadamento e bandamento magmático mostram variações composicionais e granulométricas e são realçados pela orientação de schlieren, definido por biotita e outros enclaves, além do alinhamento de feldspatos (Fig. 7). Outras feições importantes são as texturas da acumulação de cristais, causadas por migração e concentração dos cristais de K-feldspato no magma residual, que foram conduzidos por movimentos convectivos do magma, inclusive em condutos resultantes do processo de filtragem por pressão no magma granítico (Figs. 5B, 5D a 5F).

Figura 6.
Feições primárias de origem plutônica do Granito Chaval, representativas do Domínio A: (A) Bandamento de fluxo magmático com alternâncias quartzo-feldspáticas e faixas mais concentradas em biotita, deve-se notar veios pegmatíticos seccionando-o; (B) Pequenos corpos de leucogranitos na forma de lacólito e funil invertido com pequenos condutos nas porções superiores, encaixados em granito porfirítico. Representam emanações magmáticas tardias bem evoluídas do magma granítico, migrados para a cúpula do plúton; (C) Grandes veios de pegmatitos leucograníticos; (D) Enclaves ovalados com fenocristais alinhados denotando fluxo e concentrações de minerais máficos nos bordos. Notar veio tardio com deslocamento do cristal; (E) Enclave ígneo de granulação fina de composição intermediária, com forma irregular contendo fenocristais euedrais de K-feldspato. Notar fenocristal na borda do enclave, transpassando-o. Borda concentrada em máficos envolvidos em granito porfirítico, originados por mistura de magmas; (F) Enclaves definindo concentrações de biotita em formas irregulares (schlieren), representando, provavelmente, restitos de rochas encaixantes.

Figura 7.
Feições de zoneamento oscilatório e deformação em fenocristais de K-feldspato no Granito Chaval: (A e B) Fenocristais euedrais com zoneamento oscilatório em matriz com discreta foliação espaçada contornando os cristais. Deve-se notar que as zonas de crescimento são realçadas por inclusões de biotita e há deformação nos cristais com comportamento frágil-dúctil (Domínio B1); (C) Detalhe de fenocristais euédricos levemente deformados (comportamento frágil-dúctil), com formas retangulares ou hexagonais incluindo zoneamento realçado por trilhas de inclusões de biotita. Notar a foliação na matriz com embricamento de feldspatos, orientação preferencial de biotita e quartzo estirado, que contorna os fenocristais com discretas sombras de pressão; (D) Feição semelhante com foliação mais destacada realçada por fitas de quartzo e cristais rotacionados.

Outros tipos de rochas de ocorrência mais restrita no plúton são veios e diques pegmatíticos e aplitos. Pequenos corpos intrusivos de composição leucogranítica ricos em K-feldspato e quartzo apresentam-se em formas de lacólitos e funil invertido (Figs. 7A a 7C), cujas ramificações inferiores contêm rastros em condutos estreitos e são registros da migração das fases tardias do magma residual em direção ao topo do plúton, às regiões de menor pressão do sistema magmático. Essas rochas representam as fases mais evoluídas do processo de cristalização, fracionada na evolução de tal processo plutônico.

Frequentemente, são encontrados enclaves de microgranitoides de tamanho centimétrico a métrico, de composição quartzo diorítica, de coloração cinza e granulação fina ou média, que ocorrem em formas ovaladas ou irregulares (Figs. 6D e 6E). Eles possuem xenocristais de K-feldspato euédrico de dimensões e formas semelhantes aos fenocristais do granito hospedeiro adjacente, às vezes alinhado, refletindo fluxo magmático. Em alguns casos, os xenocristais estão projetados da borda do enclave ao granito hospedeiro (Fig. 6E). Contornando a margem dos enclaves, há concentração de biotita e anfibólio, a qual, provavelmente, é um resultado da reação entre dois magmas de composições extremas (basáltica e granítica), como visto nas Figs. 6D e 6E. Há casos em que a mistura entre eles é extensiva e os contatos são difusos, com variações granulométricas aleatórias. Tais feições indicam que esses enclaves foram originalmente glóbulos de magmas basálticos que fluíram e se misturaram quase que completamente com o magma granítico, englobando parcialmente os cristais precoces do granito (fenocristais de feldspatos). Esses glóbulos resfriaram mais rapidamente e se solidificaram em granulação mais fina, provavelmente devido ao gradiente de temperatura e viscosidade em relação ao magma granítico hospedeiro. Tudo isto evidencia a ação dos processos da mistura de magmas (hibridismo) na evolução do Granito Chaval, o que é semelhante ao descrito por Vernon (2008)Vernon R.H. 2008. A practical guide to rock microstructure. Cambridge, Cambridge University Press, 594 p. e Gill (2010)Gill R. 2010. Igneous rocks and processes, a practical guide. Wiley-Blackwell, London, 428 p..

Outro tipo de enclave são os tipos schlieren, centi a decimétricos, ricos em biotita e/ou anfibólio, em formas de folhas, lentes ou discoides. Geralmente, são encontrados esporadicamente, com orientação preferencial concordante às estruturas de fluxo magmático. Eles podem representar agregados residuais de minerais refratários que seriam carreados de material das áreas fontes do magma granítico ou encaixantes (restitos), vide Fig. 6E.

Nas regiões em que os granitos encontram-se moderadamente deformados ou não deformados, tendo como boa referência a pedreira nos arredores do povoado São Domingues, pode-se reconhecer ainda a presença de veios pegmatíticos com larguras centimétricas a métricas, de cor branca e granulação muito grossa, contendo a associação mineral de microclina, albita, quartzo, turmalina, muscovita, berilo, granada e sulfetos (Fig. 6C).

O outro grupo é representado por granitos deformados por cisalhamento, com exposição em grande parte da metade Leste do plúton, que se apresentam com feições estruturais diversas, em função da intensidade da deformação e, em geral, apresentam tramas miloníticas características formadas por processo de cisalhamento ao longo da zona transcorrente dextral (Figs. 2 e 3). À medida que se dirige ao Leste, acentuam-se as tonalidades mais escuras do cinza, e os processos de cominuição e recristalização dinâmica reduzem, progressivamente, a granulação grossa desses granitos, bem como o tamanho dos fenocristais para dimensões mais finas, mantendo-se suas características porfiroides. Com isso, uma trama milonítica se torna evidente, acentuando-se ao atingir a porção principal da ZCSR. Neste caso, destacam-se a foliação anastomosada, lineação de estiramento e porfiroclastos amendoados, principalmente de K-feldspato e biotita, com fitas de quartzo, contornados pela foliação milonítica, registrando-se variações petrográficas desde protomilonitos, milonitos até ultramilonitos, seguindo a classificação de Bell e Etheridge (1973)Bell T.H., Etheridge M.A. 1973. Microstructures of mylonites and their descriptive terminology. Lithos, 6:337-348..

Apesar da caracterização e compartimentação na macroescala dos domínios estruturais homogêneos e aumento progressivo da deformação na direção Leste, até na escala de afloramento constata-se a presença de áreas mais ou menos deformadas ou variação na intensidade da deformação, e pode-se entender isto pelos conceitos de deformação progressiva e heterogênea (Ramsay & Hubber 1983Ramsay J.G., Hubber M.I. 1983. The techniques of modern structural geology 1: stain analysis. London, Academic Press.; Fossen 2010Fossen H. 2010. Geologia estrutural. Trad. Andrade F.R.D. Oficina de Textos, São Paulo, 584 p.).

A partir de observações em microscopia ótica, destacam-se porfiroclastos ocelares de feldspatos envolvidos por matriz quartzo-feldspática cominuída e recristalizada que se dispõe em faixas anastomosadas, as quais podem conter, em menor ou maior quantidade, biotita, titanita, quartzo fitado e micas tipo peixe, todos orientados, preferencialmente, definindo a foliação milonítica.

As transformações metamórficas sobre os minerais primários acompanham sequencialmente a deformação no processo de cisalhamento, com aumento progressivo das reações na direção Leste, de modo que são mais importantes no domínio estrutural B2. Assim, é evidente o caráter dúctil da deformação acompanhada de recristalização dinâmica, com a formação de foliações, inclusive em pares S-C e forte estiramento dos minerais. Sob observação microscópica, as principais reações se devem à cominuição e recristalização generalizada de quartzo e feldspatos com a formação da textura granoblástica poligonal na matriz (contatos em pontos tríplices), reduzindo-se a granulação das rochas. Nos cristais de biotita primária deformada e que ainda restam como porfiroclastos em formas tipo peixe, encontram-se transformadas em suas bordas para finas lamelas de biotita com pleocroísmo fraco (marrom pálido), as quais contrastam com as cores mais intensas dos minerais primários (marrom avermelhado). Em muitos outros casos, a biotita primária apresenta-se desfeita em agregados finamente laminados de biotita neoformada definindo a foliação milonítica juntamente com as fitas de quartzo e feldspatos microgranulares recristalizados, e raramente clorita. Transformações para biotita verde pálida são registradas também em cristais microbudinados de hornblenda, nas zonas de estricção e bordas dos cristais. Os porfiroclastos de microclina e plagioclásio, estirados e budinados mostram-se recristalizados em suas bordas ou zonas de segmentação, definindo textura mortar. No caso do plagioclásio, substituições por sericita/muscovita são registradas principalmente nas margens e nos microcisalhamentos do cristal, associadas com carbonato e biotita. O epídoto só foi identificado em rochas do domínio pouco deformado em duas situações, formando coroas na allanita ou substituindo o plagioclásio em associação com muscovita.

Com esses dados, conclui-se que há uma gradação do metamorfismo dinâmico de Oeste para Leste, desde áreas isentas ou incipientes de qualquer efeito termal (região de Bom Princípio), passando para zonas com a paragênese Qtz - Ms - Ep - Cl, chegando às condições máximas para o metamorfismo dinâmico na fácies anfibolito baixo com a estabilização da associação Kf - Pl - Bt - Qtz.

ANÁLISE DA DEFORMAÇÃO E DOMÍNIOS ESTRUTURAIS

A análise estrutural foi abordada de duas formas, uma envolvendo a porção não deformada ou pouco deformada do Granito Chaval, na qual foram enfocadas principalmente as feições texturais/estruturais relacionadas ao magmatismo, e outra registrando as estruturas tectônicas relacionadas à deformação cisalhante. Para tais abordagens, foram seguidos os critérios de diversos autores (Bell & Etheridge 1973Bell T.H., Etheridge M.A. 1973. Microstructures of mylonites and their descriptive terminology. Lithos, 6:337-348.; White et al. 1980White S.H., Burrows S.E., Carreras J., Shaw N.D., Humphreys F. 1980. On mylonites in ductile shear zones. Journal of Structural Geology, 2:175-187.; Ramsay & Hubber 1983Ramsay J.G., Hubber M.I. 1983. The techniques of modern structural geology 1: stain analysis. London, Academic Press.; Lister & Snoke 1984Lister G.S., Snoke A.W. 1984. S-C mylonites. Journal of Structural Geology, 6:617-638.; Passchier & Simpson 1986Passchier C.W., Simpson C. 1986. Porphyroclast sistems as kinematic indicators. Journal of Structural Geology, 8:831-843.; Simpson 1985Simpson C. 1985. Deformation of granitic rocks across the brittle-ductile transition. Journal of Structural Geology, 7:503-511.; Simpson 1986Simpson C. 1986. Determination of movement sense in mylonites. Journal of Geological Education, 34:246-261.; Passchier & Trouw 2006Passchier C.W., Trouw R.A.J. 2006. Microtectonics. Berlin, Springer-Verlag, 289 p.; Trouw et al. 2010Trouw R.A.J., Siersma D., Passchier C.W. 2010. Atlas of mylonites - and related microstructures. Springer-Verlag Berlin Heidelberg, 322 p.). Foi dada especial atenção aos critérios de discriminação entre as estruturas de naturezas magmática e tectônica e suas inter-relações para interpretação do posicionamento tectônico do Granito Chaval, seguindo os critérios descritos por Paterson et al. (1989)Paterson S.R., Vernon R.H., Tobisch O.T. 1989. A review of criteria for the identification of magmatic and tectonic foliations in granitoids. Journal of Structural Geology, 11:349-363.. Cartograficamente e descritivamente, foram individualizados domínios estruturais, nos quais, de um ao outro, é caracterizada uma gama de variações petroestruturais do Granito Chaval, desde rochas com feições texturais/estruturais ígneas, e suas gradações progressivamente deformadas que levaram à formação de protomilonitos, milonitos e ultramilonitos.

Dois domínios estruturais foram individualizados. O Domínio A ocupa a porção Noroeste do corpo e é caracterizado pela trama tipicamente ígnea, sem registros de deformação dúctil, enquanto que o Domínio B, situado na porção Sudeste, é marcado por feições deformacionais relacionadas à instalação da ZCSR que afeta o flanco Leste do corpo granítico e suas encaixantes próximas. O curso médio do Rio Camurupim segue aproximadamente o limite entre esses dois domínios na direção NE-SW. A partir daí, para Leste, registram-se os efeitos ainda incipientes da deformação que se intensifica progressivamente para Sudeste até a ZCSR, em que as rochas transformaram-se em milonitos (Fig. 2).

O Domínio B foi compartimentado em dois subdomínios: um transicional (B1), cuja deformação imposta é fraca à média, em que ainda identificam-se nas rochas os aspectos reliquiares da trama magmática com uma foliação superimposta; e o outro milonítico (B2) fortemente deformado, classificando-se as rochas como granitos milonitizados e milonitos, além de pequenas zonas de ultramilonitos (Fig. 2).

Domínio A

Neste domínio as estruturas e texturas plutônicas acham-se integralmente preservadas e as feições deformacionais restringem-se a discretas bandas de cisalhamento, microfalhas e fraturas. A feição estrutural mais marcante diz respeito à estrutura de fluxo magmático, que, no presente caso, é definida pela orientação preferencial de fenocristais tabulares euédricos de K-feldspato envolvidos em matriz de granulação grossa. Essa feição porfirítica é extensiva por todo o domínio do corpo. As percentagens de fenocristais, em geral, situam-se em aproximadamente 70% do volume total das rochas. No entanto, em determinadas situações, foram identificados setores com concentrações de até 90%, nos quais os cristais euedrais e subedrais de K-feldspato estão cumulados com seus interstícios preenchidos por quartzo, feldspatos e biotita (Fig. 5). Essas feições texturais estão relacionadas ao processo de diferenciação magmática e convecção do magma, associada à ação da gravidade. Os megacristais de microclina num determinado estágio da evolução magmática do Granito Chaval apresentaram tendência a flutuar no magma residual na câmara magmática, em função da diferença de densidade pelo processo denominado flutuabilidade (buoyancy). Estruturas de fluxo magmático são registradas com frequência e são definidas pela orientação preferencial dos cristais euédricos de álcali feldspato, bandamento com variações granulométricas e por rastros de enclaves em folhas orientadas (Figs. 6A e 6C). Apesar de marcantes, as direções dessas estruturas não seguem um padrão preferencial, a não ser na escala local, e variam muito na escala mesoscópica, conforme indicado no estereograma na Fig. 4. Para um melhor controle dessas feições e sua contextualização no plúton, é necessária a realização de mapeamento sistemático de semidetalhe ou detalhe no plúton.

Sobre os megacristais, inclusive os zonados, a mais simples explicação é que eles se desenvolveram em condições de baixa taxa de nucleação em rápido crescimento, provavelmente em baixo grau de subresfriamento em magmas félsicos, com significativa hidratação no sistema (Vernon 2008Vernon R.H. 2008. A practical guide to rock microstructure. Cambridge, Cambridge University Press, 594 p.).

Outra feição magmática identificada é representada por enclaves subcirculares ou irregulares com dimensões de 15 cm a alguns metros, de composição intermediária ou máfica, granulação fina ou média, e que contêm no seu interior xenocristais de álcali feldspato idênticos ao do granito envolvente (Figs. 6D e 6E). Isto é interpretado como relacionado ao processo de mistura do magma granítico com um máfico, o qual não apresenta registros na região.

Domínio B

Este domínio ocupa a porção SE do Granito Chaval e é caracterizado por uma gama de estruturas tectônicas que foram impressas sobre a trama magmática, reconhecido por mais de 8 km de largura, e que são relacionados à ZCSR. O comportamento espacial das estruturas pode ser visualizado nos estereogramas da Fig. 3.

Subdomínio B1 - Transicional

A característica desta zona é destacada pelo início da cominuição dos grãos da matriz grossa dos granitos, modificando-a para granulação média, que é acompanhada pelo desenvolvimento de uma foliação incipiente do tipo espaçada (milimétrica à centimétrica). Esta é definida pela orientação das lamelas de biotita e leve estiramento dos cristais de quartzo, caracterizando deformação de caráter frágil-dúctil que transformou os granitos em protomilonitos, sem descaracterizar as feições texturais primárias (Fig. 8). O local tipo deste subdomínio é a Pedreira de São Domingos, localizada a aproximadamente 2 km do povoado homônimo, na margem esquerda da rodovia Chaval-Parnaíba. As texturas ígneas estão parcialmente preservadas, tendo os fenocristais de microclina mantido suas formas euédricas, mas alguns se acham rotacionados e levemente imbricados. Os fenocristais de K-feldspato permanecem aparentemente intactos quando observados na mesoescala, porém, sob observação microscópica, registram-se leve contorção, microfraturamentos e fraca extinção ondulante. Por outro lado, os cristais de quartzo apresentam forte extinção ondulante, formação de subgrãos, com leve estiramento e recristalização parcial.

Figura 8.
Aspectos estruturais representativos do Domínio B1 na zona pouco deformada do Granito Chaval: (A) Foliação espaçada definida por orientação preferencial de biotita com leve embricamento de quartzo e feldspatos; (B) Feição semelhante, com efeitos em veio pegmatítico. Notar a refração na direção da foliação; (C) Foliação incipiente em granito porfirítico com leve rotação e tendência ao alinhamento dos fenoclastos; (D) Feição semelhante com embricamento, alinhamento, fraturamento e encurvamento de fenocristais; (E) Porção relativamente mais deformada (comportamento dúctil) com destaque à foliação melhor definida e um leve estiramento de fenocristais e cominuição da matriz; (F) Detalhe de um porfiroclasto segmentado (centro da foto), com fratura antitética de cisalhamento e outros fenoclastos de álcali feldspato com deformação frágil em matriz foliada com comportamento frágil-dúctil.

Seguindo-se de Noroeste para Sudeste, a variação da intensidade de deformação pode ser acompanhada progressivamente, e as modificações na morfologia dos porfiroclastos são evidentes levando ao estiramento dos mesmos, com o desenvolvimento das sombras de pressão e foliação mais bem definida. Em certas situações, os porfiroclastos se acham segmentados em várias partes, denotando ainda seu comportamento frágil, enquanto que a matriz foliada indica o comportamento frágil-dúctil (Fig. 8F).

Subdomínio B2 - Zona Milonítica

O Subdomínio B2 ocupa a porção mais ao Leste do corpo granítico e parte das encaixantes, e a área de referência pode ser observada a alguns quilômetros na rodovia BR-402 no trecho Barroquinha - Chaval e ao longo do curso do Riacho Santa Rosa, no qual a ZCSR está instalada (Fig. 4). Neste caso, as texturas primárias do Granito Chaval já se acham descaracterizadas dando lugar às feições miloníticas, com forte transposição, formação de bandamento tectônico, forte estiramento dos minerais, recristalização e neoformação de minerais e marcante foliação milonítica. Os fenocristais, originalmente de maior tamanho, ainda restam como porfiroclastos envolvidos na matriz milonítica que é desenhada pelos cristais de quartzo em folhas e fitas (ribbon quartz), vide Figs. 9B a 9D, por lamelas orientadas de biotita e outros cristais estirados, e são comuns foliações tipo S-C (Fig. 9E). Intensa cominuição e recristalização dinâmica foram responsáveis pela descaracterização textural das rochas plutônicas originais, cuja recristalização de quarto, feldspatos e biotita gerou uma matriz de granulação fina/média (Fig. 9F).

Figura 9.
Aspectos estruturais representativos do Domínio B2, zona mais deformada do Granito Chaval: (A) Grande maciço granítico com marcante foliação milonítica em alto ângulo de mergulho; (B) Granito milonitizado com destaque aos porfiroclastos amendoados de álcali feldspato em matriz com foliação milonítica anastomosada; (C) Detalhe da foliação milonítica mais linearizada, realçada por quarto fitado e porfiroclastos estirados de feldspatos; (D) Pares S-C bem definidos com realce das fitas de quartzo; (E) Detalhe da foliação S-C bem definida, com porfiroclastos tipo delta (d), sendo que todos indicam sentido de movimento dextral; (F) Milonito em estágio avançado de deformação dúctil, fortemente linearizado, com redução à granulação fina da matriz e quase desaparecimento dos porfiroclastos por cominuição e recristalização dinâmica. Notar veio pegmatítico paralelizado à foliação e geração de bandamento tectônico.

A foliação neste domínio apresenta predominantemente direção N10-20E, com altos valores de mergulho para NE ou E (Fig. 9A), e as lineações de estiramento demonstram baixos valores de mergulho preferencialmente para NNE (Fig. 4). Indicadores cinemáticos, como pares S-C, assimetria de porfiroclastos, geometria das sombras de pressão, feições sigmoidais, rotação e desmembramento de porfiroclastos, permitem interpretar a tectônica como relacionada à cinemática dextral para o movimento em caráter transcorrente que gerou a ZCSR.

ANÁLISE DOS DADOS GEOCRONOLÓGICOS

Os dados geocronológicos existentes na literatura sobre o Granito Chaval ainda mantêm certa indefinição quanto a sua idade de colocação, embora não haja questionamento sobre sua formação no Neoproterozoico. Estudos geocronológicos apontaram idades de 512 ± 15 Ma (K-Ar em biotita, Almeida et al. 1968Almeida F.F.M, Melcher G.C., Cordani U.G., Kawashita K., Vandoros P. 1968. Radiometric age determination from northern Brazil. Boletim da Sociedade Brasileira de Geologia, 17:3-14.); 507 ± 29 Ma (Rb-Sr em rocha total, Nogueira Neto et al. 1990Nogueira Neto J.A., Torquato J.R., Macambira M.J.B., Arthaud M.H. 1990. Avaliação dos dados geocronológicos do Complexo Granja (CE). Revista de Geologia, 3:5-18.) e 591 ± 10 Ma (U-Pb em monazita, Fetter 1999Fetter A.H. 1999. U-Pb and Sm-Nd geochronological constraints on the crustal framework and geologic history of Ceará, NW Borborema Province. Tese de Doutorado, University of Kansas, USA, 164 p.). Por outro lado, Lima (1997)Lima A.M.M. 1997. Caracterização petrográfica e geocronológica do Granito Chaval e das rochas encaixantes, na região de Buriti dos Lopes (PI). Trabalho de Conclusão de Curso de Geologia, Universidade Federal do Pará, 40 p., usando o método de evaporação de Pb, obteve a idade de 630 ± 19 Ma em cristais de zircão da porção não deformada do corpo (região de Bom Princípio). Tal fato foi confirmado por Nogueira et al. (2013)Nogueira B.K.C, Gorayeb P.S.S., Toro M.A.G., Moura C.A.V. 2013. Novos dados geocronológicos do Granito Chaval, extremo noroeste da Província Borborema: correlação com o Arco Magmático Santa Quitéria. In: SBG-NE, Simpósio de Geologia do Nordeste, 25º, Gravatá, Anais, CD-ROM., que utilizaram esta mesma sistemática em amostra da porção deformada (região de Chaval), com 633 ± 3,3 Ma. Considerando tratar-se de um granito com deformações e transformações metamórficas cisalhantes, isto poderia afetar os sistemas isotópicos mais suscetíveis e os valores de idade mais nova devem representar resfriamento do granito ou reequilíbrio metamórfico. As duas idades em zircão são semelhantes, coincidem dentro dos erros analíticos e mostram pequena diferença em relação àquela em monazita. No entanto, pode-se interpretá-las como relacionada ao processo de cristalização ígnea, permitindo definir a cronologia do Granito Chaval no Neoproterozoico, final do período Criogeniano. Valores de idade semelhante foram obtidos em granitoides relacionados ao Complexo Tamboril - Santa Quitéria (637 a 614 Ma, Fetter et al. 2003Fetter A.H., Santos T.T.S., Van Schmus W.R., Hackspacher P.C., Neves B.B.B., Arthaud M.H., Nogueira Neto J.A., Wernick E. 2003. Evidence for Neoproterozoic continental Arc Magmatism in the Santa Quitéria batholith of Ceará state, NW Borborema Province, NE Brazil: implication for the assembly of West Gondwana. Gondwana Research, 6:265-273.), sugerindo tratar-se de granitos sin/tardi-tectônicos em relação ao evento Brasiliano durante a evolução do NW da Província Borborema.

DISCUSSÃO E CONCLUSÕES

O Granito Chaval, apesar de sua extensa área de ocorrência, é um corpo relativamente homogêneo em termos composicionais. Suas rochas principais são sienogranitos e monzogranitos, incluindo destacada textura porfirítica com megacristais de microclina. No entanto, apresenta um rico acervo de estruturas e texturas/microestruturas relacionadas tanto aos processos magmáticos quanto tectônicos, além dos registros de transformações metamórficas a partir de uma trama magmática, em que são encontradas em inúmeros e excelentes afloramentos, com feições extremamente didáticas para estudos nas escalas macro, meso e microscópica. As feições de domínio não deformado (Domínio A) do Granito Chaval demonstram a evolução plutônica, com alojamento em ortognaisses do Paleoproterozoico do Complexo Granja no final do Criogeniano (aproximadamente 630 Ma), possivelmente em nível crustal relativamente raso. Elas têm uma fase precoce de formação de cristais de plagioclásio, hornblenda, biotita e zircão e, em seguida, os megacristais de K-feldspato em sucessivos estágios de crescimento (zoneamento), levando, posteriormente, à cristalização da fase residual do magma granítico, cristalizando oligoclásio juntamente com microclina e, na sequência, os cristais de quartzo.

A mistura de magmas foi discreta no plúton, pelo menos no nível erosional atual em que se encontra o plúton, mas o fracionamento gravitacional foi significativo, levando à ascensão e acumulação de grande quantidade de fenocristais de microclina cristalizados precocemente, migrados em direção à cúpula do plúton. Isto, provavelmente, acelerou o processo de fracionamento do magma residual, resultando em uma modificação da composição do magma granítico se considerarmos as variações faciológicas identificadas nas regiões da cúpula do plúton (quartzo sienitos, sienitos), inclusive as fases leucocráticas tardias (leucogranitos).

A mistura de magmas, embora mais localizada, também teve seu papel nesta diferenciação, afetando determinadas áreas do plúton e gerando rochas híbridas de composição intermediária. Fases magmáticas tardias com maior ação de fluidos geraram pequenos corpos em formas de lopólitos, diques e veios pegmatíticos, além de aplitos, sem grande expressão territorial ou volumétrica, mas que demonstram as fases mais evoluídas do Granito Chaval.

Por outro lado, ao longo da borda Sudeste do plúton, instalou-se a ZCSR, a qual modificou seletivamente grande parte da porção Leste do plúton, deformando-o progressivamente e heterogeneamente atingindo maior intensidade na porção Leste, próximo ao contato com as encaixantes, o que resultou na formação de protomilonitos, milonitos e ultramilonitos devido ao cisalhamento de caráter transcorrente dextral, acompanhado de recristalização dinâmica em condições metamórficas da fácies anfibolito baixo. O processo de cisalhamento está relacionado aos estágios finais de uma colisão continental cujas diversas zonas de cisalhamento se formaram nos incrementos finais da deformação de um sistema de colisão oblíqua, que edificou o Cinturão de Cisalhamento Noroeste do Ceará, levando ao extravasamento lateral de massas crustais em fluxo dúctil acontecido no final da orogenia Brasiliana no Noroeste da Província Borborema (Gorayeb & Abreu 1989Gorayeb P.S.S., Abreu F.A.M. 1989. A Faixa de Alto Grau de Cariré. In: SBG-NE, Simpósio de Geologia do Nordeste, 13, Fortaleza, Atas, p. 182-184.; Arthaud & Torquato 1989Arthaud M.H., Torquato J.R. 1989. A tectônica transcorrente no estado do Ceará. In: SBG-NE, Simpósio Nacional de Estudos Tectônicos, 2, Fortaleza, Atas, p. 277-278.). Outros representantes de tais processos estão registrados em diversas zonas de cisalhamento nesse domínio crustal, como a de Sobral - Cariré - Campo Lindo de grande expressão, e de forma mais discreta no Granito Pedra do Sal, na Costa do Piauí (Gama Junior et al. 1988Gama Jr. T., Gorayeb P.S.S., Abreu F.A.M. 1988. O Granito Pedra do Sal e suas feições de cisalhamento. Revista Brasileira de Geociências, 18:424-432.) e na Suíte Rosário no Maranhão (Gorayeb et al. 1999Gorayeb P.S.S., Gaudette H.E., Moura C.A.V., Abreu F.A.M. 1999. Geologia e geocronologia da Suite Rosário, nordeste do Brsil, e sua contextualização geotectônica. Revista Brasileira de Geociências, 29:571-578.).

Ao longo dessa zona milonítica, pode-se acompanhar progressivamente suas modificações texturais e mineralógicas importantes, que permitiram a separação de domínios homogêneos, configurando uma sequência clássica de deformação progressiva heterogênea, por cisalhamento simples, em condições frágil-dúctil e dúctil. As modificações da trama ígnea original foram causadas pela paulatina redução do tamanho dos grãos constituintes, variando a granulometria de grossa até fina, pela segmentação e individualização de novos grãos a partir dos cristais primários, microfraturamento, microbudinagem, encurvamentos, lenticularização e estiramento dos cristais, formação de foliação S-C, acompanhados por cominuição e recristalização dinâmica. As feições são indicativas de uma deformação não coaxial, com movimento dextral, resultando na implantação da Zona de Cisalhamento Transcorrente Santa Rosa, preferencialmente na região de interface do Granito Chaval com os gnaisses encaixantes. Durante a deformação, a maioria das fases minerais se reequilibrou aos novos parâmetros P-T, em condições metamórficas máximas da fácies anfibolito baixo.

A idade dessa tectônica e implantação da ZCSR pode ser estabelecida pelas datações dos dois corpos magmáticos da região, entre 0,60 e 0,55 Ga, que corresponde às idades de colocação do Granito Chaval e do NSB, respectivamente. Neste caso, considerando que o referido granito está afetado por esta tectônica e que poderia ter um alojamento sin-tardi cinemático em relação à orogenia Brasiliana, isto definiria sua idade máxima. Por outro lado, o plúton alcalino Brejinho é intrusivo nos gnaisses adjacentes, não apresenta qualquer efeito de deformação e está truncando a ZCSR. Claramente, este plúton se alojou pós-cisalhamento, o que determinaria a idade mínima para o processo transcorrente. Além disso, outras referências são as formações basais da Bacia Paleozoica do Parnaíba, que estão assentadas sobre todo o domínio crustal, em franca discordância erosiva.

REFERÊNCIAS

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2014

Histórico

  • Recebido
    23 Abr 2014
  • Aceito
    06 Out 2014
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