INTRODUÇÃO
Um pronto-socorro (PS) é uma das áreas do hospital de grande complexidade assistencial, fluxo de profissionais e usuários. Possui especificidades que o distinguem dos outros serviços de saúde, pois exige assistência imediata, eficiente e integrada, bem como amplo conhecimento técnico, habilidade profissional e emprego de recursos tecnológicos(1).
A exposição a ruídos no local de trabalho tem sido apontada como fator de diminuição da concentração, irritabilidade e estresse para profissionais que atuam em unidades hospitalares(2). O aumento nos níveis de ruído nesses locais tem sido associado à circulação de pessoas, tonalidade de voz entre equipes de trabalho, presença de múltiplos equipamentos médicos hospitalares com alarmes estridentes, comportamento laboral não cuidadoso, como fechamentos de portas, gavetas, armários, entre outros(3-6).
Trabalhadores que desempenham funções iguais têm concepções diferentes sobre os riscos a que estão expostos e, no que tange à exposição ao ruído, as divergências são ainda maiores na forma como ele os afeta (7). Pesquisa que avaliou os níveis de pressão sonora também analisou a percepção que esses trabalhadores possuem sobre os efeitos causados pela elevada intensidade do ruído e os sintomas decorrentes da exposição. Os resultados demonstraram que estavam acima dos recomendados pelas normas de conforto acústico, além de evidenciarem importantes associações estatísticas entre o ambiente barulhento e queixas de saúde dos profissionais. Os sintomas mais relatados foram cefaleia e incômodo a sons fortes. O ruído poderia prejudicar a execução das atividades dos profissionais e afetar, inclusive, a comunicação oral entre os trabalhadores(8).
Por ser subjetivo, às pessoas reagem diferentemente ao mesmo ruído: uma pessoa pode não perceber o ruído, enquanto outra pode sentir-se incomodada. Mesmo em situações em que o nível do ruído é pouco intenso, porém audível, um indivíduo pode fazer, ou não, objeção a ele(9).
A exposição a ruídos no ambiente, por um longo período, além de determinar comprometimentos físicos, mentais e sociais no indivíduo, pode contribuir para a existência de erros humanos decorrentes da compreensão equivocada de palavras ou frases, acidentes de trabalho, erros de procedimentos, doenças ocupacionais e outros agravos à saúde do profissional de enfermagem, ou seja, a condição de trabalho pode oferecer riscos à segurança das pessoas, tanto dos profissionais quanto dos próprios pacientes(10,11).
Conforme a United States Environmental Protection Agency(12), os níveis de ruído em ambiente hospitalar não devem exceder 45 dB(A), durante o dia, e 35 dB(A), durante a noite. A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda de 30 a 40 dB(A) para ambientes internos hospitalares. A norma regulamentadora brasileira 10152, da Associação Brasileira de Normas técnicas (ABNT), diz respeito aos níveis de ruídos compatíveis com o conforto acústico, visando ao bem-estar da comunidade(13). Os níveis de pressão sonora mensurados acima dos recomendados pelos órgãos responsáveis podem afetar a concentração exigida na prática do profissional de enfermagem, na execução de suas tarefas, devido a sua complexidade(14).
A relevância do estudo se justifica pelas várias pesquisas em diferentes áreas hospitalares, apresentando o ruído como problema principal e atual(3-6). Nesse contexto, o PS(1) é um ambiente que merece atenção, porque engloba vários equipamentos médicos hospitalares, uma grande equipe de profissionais, vítimas de acidentes, familiares e veículos de resgate, aumentando a intensidade sonora do ambiente e risco para saúde e no desempenho profissional das equipes. Estes dados tornam-se importantes na implantação de medidas ou ações para a redução do ruído no local(15,16).
Este estudo, portanto, teve por objetivo comparar a percepção dos profissionais das áreas de enfermagem e administrativa frente ao ruído no pronto-socorro.
MÉTODOS
Trata-se de um estudo descritivo com análise quantitativa, realizado na unidade de urgência e emergência do PS de um hospital público no estado do Paraná. O projeto foi aprovado pelo comitê de ética do próprio hospital, sob o nº 167/2010. Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), respeitando a Resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde. Foram excluídos apenas os profissionais que estavam em férias ou licença e quem não aceitou participar.
A estrutura física do PS conta com áreas para acolhida dos pacientes, que podem chegar pela recepção ou pela entrada das urgências e emergências, trazidos por carros de resgates, ambulâncias ou helicóptero. A planta física dispõe de recepção com sala de espera; sala de Suporte Avançado de Vida (SAV), planejado para atendimento de três pacientes em situação emergencial; uma antessala em frente ao SAV, com lavabos e área de circulação de macas com pacientes que chegam pelo Serviço Integrado de Atendimento ao Trauma (SIATE) e Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU); um posto de enfermagem, local onde as medicações são preparadas e onde ocorre, também, a transferência de plantão da equipe de enfermagem e a permanência de médicos que executam prescrições médicas e discussões de conduta.
Existe um amplo espaço de circulação em frente ao posto de enfermagem, que serve para estacionamento de macas com pacientes que aguardam a realização de exames ou internamento, quando outras áreas estão lotadas. Também há um corredor central, com cadeiras para clientes e acompanhantes que aguardam atendimento médico, radiografias (RX) e outros exames.
Conta, ainda, com sala de observação, sala de gesso, box de atendimento, sala de sutura, sala de guias e laudos de RX e tomografia, farmácia satélite, áreas de descanso da equipe de trabalho, entre outras. O setor de RX e tomografia consiste de áreas com salas anexas à estrutura física do PS. O heliponto está localizado em área central do hospital e o acesso ao PS é feito por elevador, sendo que, desde o início do seu funcionamento, existem dias em que chega mais de um paciente e, outras vezes, passam-se dias sem a chegada de nenhum.
Os níveis de ruído do PS, avaliados segundo a norma NHO - 01 da Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medicina do Trabalho - FUNDACENTRO(17), variaram de 56,6 dB (A) a 119 dB (A). O menor nível de ruído avaliado foi na sala de sutura (56,6 dBA), no período da manhã, e o maior nível avaliado foi o do helicóptero, no momento da sua chegada e permanência (119 dBA). Dentre os equipamentos, o maior nível de ruído foi encontrado na utilização da serra de gesso (90,0 dBA) e o menor nível foi o do oxímetro ligado (61,0 dBA) (16,18). As medições foram realizadas em dez pontos internos do pronto-socorro em sequência de avaliação de dois minutos e trinta segundos em cada local, repetindo por mais três vezes, de modo que quatro medições foram feitas em cada ponto, com máxima, mínima e ruído contínuo equivalente (Leq), nos períodos da manhã, tarde e noite(16,18).
Na área de enfermagem, os enfermeiros realizam o planejamento da assistência e também executam atividades assistenciais juntamente com os técnicos e auxiliares de enfermagem, que estão sob sua orientação e supervisão. Esses profissionais circulam por toda área interna do pronto-socorro e alguns profissionais estão habilitados a receber o paciente no heliponto.
A equipe de enfermagem desse setor compõe-se de 46 profissionais, entre enfermeiros, técnicos e auxiliares de enfermagem, e a equipe administrativa, de 30 profissionais. Essas equipes estão distribuídas em escala de 12 por 36 horas, ou 40 horas semanais. Portanto, alguns profissionais atuam seis,oito ou 12 horas diurnas ou noturnas, em turnos fixos, assim estabelecidos: manhã, das 7 h às 13 h; tarde, das 13 h às 19 h e noite, das 19 h às 7 h.
A equipe administrativa é composta por técnicos e auxiliares que trabalham na recepção e na sala de guias. Suas atividades se desenvolvem no atendimento e na abertura da ficha clínica do paciente, com digitação dos dados de documentos e do motivo que o trouxe ao PS.
Participaram do estudo 59 profissionais, sendo 38 da área de enfermagem (AE) e 21 da área administrativa (AD). Foram excluídos do estudo os profissionais que estavam de férias (n=7), de licença (n=6) e três enfermeiros que conheciam o tema da pesquisa, além de um auxiliar de enfermagem que não aceitou participar.
A coleta de dados realizou-se em janeiro e fevereiro de 2011. Foi utilizado um questionário, com o objetivo de avaliar a percepção, o conhecimento e as atitudes da equipe de profissionais frente ao ruído no ambiente de trabalho (Anexo 1). O questionário foi baseado em estudo que avaliou a percepção sobre ruído ambiental (19) e adaptado para o presente estudo com questões abertas e fechadas, relacionadas ao ruído e às condições de trabalho(16). Cuidou-se para não apresentar, no início das entrevistas, o termo percepção do ruído, para que não houvesse interferência na coleta dos dados, porque a intenção era verificar se a menção ao ruído surgia espontaneamente, ao longo dos relatos. Durante as entrevistas, foram coletadas muitas informações, porém, apenas as relacionadas ao ruído foram apresentadas. Posteriormente, as questões foram agrupadas e digitadas em planilhas eletrônicas e tratadas estatisticamente.
A análise estatística foi realizada por meio de métodos descritivos (distribuição de frequências relativas) e métodos inferenciais (teste Qui-quadrado, coeficiente de correlação de Spearman). Os testes foram aplicados ao nível de significância de 0,05 (5%), correlacionados os problemas de saúde com tempo de trabalho no PS, problemas de saúde com a percepção do ambiente sonoro e percepção de incômodos entre as equipes de trabalho.
RESULTADOS
A população estudada foi composta por 59 profissionais, sendo 38 da área de enfermagem (AE) e 21 da área administrativa (AD). Houve predominância do gênero feminino, sendo, respectivamente, 68,42% (AE) e 76,19% (AD). Quanto à faixa etária, no total de 50% (19) dos profissionais da AE e 42,86% (9) da AD, a prevalência foi de 30 a 39 anos, com média de 34,1 (desvio padrão 7,0) para AE e média de 32,6 (desvio padrão de 9,7) para AD. No que se refere à jornada de trabalho, em 68,42% (26) da AE predominou a jornada de 36 horas e em 57,14% (12) da AD, de 40 horas. Observou-se que quase a metade dos profissionais da AE (47,36%) e da AD (71,43%) tinha menos de dois anos de trabalho no PS. Quanto ao tempo de permanência em horas no PS, os profissionais da AE (60,53%) permanecem 6 horas diárias no trabalho e os da AD (90,48%) permanecem 12 horas, dia sim, dia não. Quanto à percepção do ruído no pronto socorro, a maioria considerou muito intenso (AE/52,63%), seguido de normal ou médio (28,57%). As informações dos participantes, quanto ao gênero, faixa etária, jornada de trabalho semanal e tempo de trabalho em horas encontram-se descritas na Tabela 1 .
Tabela 1 Distribuição dos participantes segundo gênero, idade, jornada de trabalho semanal, tempo de trabalho em anos, tempo de permanência em horas e percepção do nível de ruído no pronto-socorro
CARACTERIZAÇÃO DOS PARTICIPANTES |
ENFERMAGEM (n=38) |
ADMINISTRATIVO (n=21) |
||
---|---|---|---|---|
n | % | n | % | |
Gênero | ||||
Feminino | 26 | 68,42 | 16 | 76,19 |
Masculino | 12 | 31,58 | 5 | 23,81 |
Idade | ||||
Menos de 30 anos | 11 | 28,95 | 8 | 38,10 |
30 a 39 anos | 19 | 50,00 | 9 | 42,86 |
40 ou mais anos | 8 | 21,05 | 4 | 19,04 |
Jornada de trabalho semanal no PS | ||||
36 horas | 26 | 68,42 | 9 | 42,86 |
40 horas | 12 | 31,57 | 12 | 57,14 |
Tempo de trabalho no PS em anos | ||||
Menos de 2 anos | 18 | 47,36 | 15 | 71,43 |
2 a 4 anos 5 anos ou mais Tempo de permanência em horas no PS 6 horas 8 horas 12 horas |
10 10 23 02 13 |
26,32 26,32 60,53 5,26 34,21 |
4 2 2 19 |
19,05 9,52 9,52 90,48 |
Percepção do nível de ruído no PS | ||||
Muito intenso | 20 | 52,63 | 6 | 28,57 |
Normal/ médio | 11 | 28,95 | 6 | 28,57 |
Pouco Intenso | 5 | 13,16 | 6 | 28,57 |
Não é barulhento | 1 | 2,63 | 3 | 14,29 |
Indiferente | 1 | 2,63 |
Legenda: PS = pronto-socorro; n = número de sujeitos
Os períodos de maior ruído no PS, segundo as equipes foram descritos da seguinte forma: manhã: o horário das 7h01 às 13 h; tarde: das 13h01 às 19 h; noite das 19h01 à 1 h e madrugada, de 1h01 às 7 h. Esses horários, durante o dia, correspondem aos turnos de troca de plantão da população do estudo. O período da noite ficou dividido em duas partes, início do plantão noturno e madrugada, que termina com a troca de plantão dos trabalhadores ( Tabela 2 ).
Tabela 2 Período do dia de maior ruído no pronto-socorro, segundo as equipes
PERÍODO | ENFERMAGEM (n=38) | ADMINISTRATIVO (n=21) | ||
---|---|---|---|---|
n | % | n | % | |
Variável | 18 | 47,37 | 7 | 33,33 |
Manhã | 8 | 21,05 | 1 | 4,76 |
Tarde | 9 | 23,68 | 14 | 66,67 |
Noite | 8 | 21,05 | 3 | 14,29 |
Legenda: n = número de sujeitos
Obs: Alguns profissionais relataram mais de um turno com maior ruído e nenhum participante relatou incômodo durante a madrugada.
As respostas foram classificadas como variável do estudo quando os respondentes afirmaram não existir um horário certo para o ruído. Também foi classificada como mais de uma resposta quando os respondentes citaram horários que correspondiam a mais de um turno.
A distribuição dos participantes, de acordo com as fontes de ruídos classificadas como incômodas, foi a seguinte: na AE, 60,53% dos profissionais identificaram os equipamentos como fontes de ruído e 85,71% dos profissionais da AD referiram ruído de pessoas. O ruído citado como o mais incômodo, tanto para AE (31,58%), como para AD (38,10%), foi aquele originado por pessoas. Na AE, foram citados os ruídos gerados pela própria equipe de trabalho (18,42%) e, na AD, os causados pelos pacientes (33,33%) ( Tabela 3 ).
Tabela 3 Distribuição dos participantes segundo as fontes de ruídos e os considerados incômodos no pronto-socorro
FONTES DE RUÍDOS E OS CONSIDERADOS INCOMODOS |
ENFERMAGEM (n=38) | ADMINISTRATIVO (n=21) | ||||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Fonte n % |
Incômodo n % |
Fonte n % |
Incômodo n % |
|||||
1-Equipamentos | 23 | 60,53 | 10 | 26,32 | 6 | 28,57 | - | 0,00 |
Respiradores | 12 | 31,58 | 2 | 5,26 | - | 0,00 | - | 0,00 |
Monitores/oxímetro | 9 | 23,63 | 3 | 7,89 | - | 0,00 | - | 0,00 |
Campainha interna | 9 | 23,68 | 1 | 2,63 | 4 | 19,05 | - | 0,00 |
Bomba infusora | 8 | 21,05 | 2 | 5,26 | - | 0,00 | - | 0,00 |
Mesa de transporte | 4 | 10,53 | 2 | 5,26 | - | 0,00 | - | 0,00 |
Macas | 4 | 10,53 | 1 | 2,63 | - | 0,00 | - | 0,00 |
Telefone | 3 | 7,89 | - | 0,00 | 2 | 9,52 | - | 0,00 |
Ar condicionado | 1 | 2,63 | - | 0,00 | - | - | - | 0,00 |
Computadores | - | - | 1 | 2,63 | - | - | - | 0,00 |
2-Pessoas | 21 | 55,26 | 12 | 31,58 | 18 | 85,71 | 8 | 38,10 |
Equipe de trabalho | 11 | 28,95 | 7 | 18,42 | - | 0,00 | 4 | 19,05 |
Paciente | 9 | 23,68 | 4 | 10,53 | 7 | 33,33 | 7 | 33,33 |
Aglomeração | 5 | 13,16 | 1 | 2,63 | 11 | 52,38 | - | 0,00 |
3-Ruído externo | 16 | 42,11 | 11 | 28.94 | 10 | 47,62 | 4 | 19,05 |
Ambulância | 8 | 21,05 | 2 | 5,26 | 3 | 14,29 | - | 0,00 |
Helicóptero | 7 | 18,42 | 6 | 15,79 | 3 | 14,29 | 1 | 4.76 |
Obras | 5 | 13,16 | 3 | 7.89 | 4 | 19,05 | 1 | 4,76 |
Portas | - | 0,00 | 1 | 4,76 | - | 0,00 | ||
4- Não incomoda | - | - | 2 | 5,26 | - | - | 9 | 42,86 |
5- Não soube informar | - | - | 7 | 18,42 | - | - | - | 0,00 |
Legenda: n = número de sujeitos
Obs: Alguns profissionais relataram mais de uma fonte de ruído e a AE é a mais incomodada. Essa situação pode ser compreendida pelas próprias atividades desempenhadas pela enfermagem no pronto-socorro, as quais se desenvolvem em setor com características imprevisíveis, com uma demanda que exige agilidade e resoluções de emergência. No entanto, a AD referiu sentir incômodo pelo ruído produzido pelas pessoas
Quanto à percepção de incômodos referentes ao ruído no PS, avaliada por meio do teste Qui-quadrado, verificou-se que houve diferença (p=0,0432) na proporção de incômodo entre os profissionais da AE e AD, sendo significativamente maior para os profissionais da AE.
Sobre as dificuldades causadas pelo ruído no desempenho de alguma tarefa no trabalho e o tipo de dificuldade, os profissionais da AE (7,89%) referiram sentir dificuldade, mas não relataram o tipo. Na AD, quase a metade (42,86%) relatou dificuldades, sendo 33,33% de concentração, 11,11% de comunicação e 55,55% não souberam informar o tipo de dificuldade ( Tabela 4 ).
Tabela 4 Distribuição dos participantes de acordo com a dificuldade em desempenhar alguma tarefa na presença do ruído e o tipo de dificuldade
Variável | ENFERMAGEM (n-38) | ADMINISTRATIVO (n-21) | ||
---|---|---|---|---|
n | % | n | % | |
Dificulta tarefa | ||||
Não | 35 | 92,11 | 12 | 57,12 |
Sim | 3 | 7,89 | 9 | 42,86 |
Tipo de dificuldade | ||||
Concentração | - | 0,00 | 3 | 33,33 |
Comunicação | - | 0,00 | 1 | 11,11 |
Não soube informar | 3 | 100,0 | 5 | 55,55 |
Legenda: n = número de sujeitos
Os problemas extra-auditivos foram relatados com maior ocorrência, sendo o cansaço o mais citado, tanto na AE (71,05%), quanto na AD (57,14%), surgindo, ainda, o estresse AE (60,53%), AD (47,62%), ansiedade AE (47,37%), ansiedade e nervosismo AD (42,86%) e irritabilidade AE (44,74%) e AD (52,38%) ( Tabela 5 ).
Tabela 5 Distribuição dos participantes segundo os problemas de saúde relatados
PROBLEMAS DE SAÚDE | ENFERMAGEM (n=38) | ADMINISTRATIVO (n=21) | ||
---|---|---|---|---|
n | % | n | % | |
Cansaço | 27 | 71,05 | 12 | 57,14 |
Estresse | 23 | 60,53 | 10 | 47,62 |
Ansiedade | 18 | 47,37 | 9 | 42,86 |
Irritabilidade | 17 | 44,74 | 11 | 52,38 |
Problemas gastrointestinais | 13 | 34,21 | 3 | 14,29 |
Nervosismo | 11 | 18,95 | 9 | 42,86 |
Perturbações sono | 10 | 26,32 | 8 | 38,10 |
Alterações de visão | 6 | 15,79 | 4 | 19,05 |
Problemas circulatórios | 6 | 15,79 | 1 | 4,76 |
Dor de cabeça | 5 | 13,16 | 6 | 28,57 |
Incômodo | 4 | 10,53 | 5 | 23,81 |
Perda auditiva | 4 | 10,53 | 1 | 4,76 |
Sem resposta | 4 | 10,53 | 2 | 9,52 |
Zumbido | 3 | 7,89 | 1 | 4,76 |
Dif. Comp. Fala | 2 | 5,26 | 1 | 4,76 |
Problemas cardíacos | 2 | 5,26 | 1 | 4,76 |
Legenda: n = número de sujeitos
Obs: Alguns profissionais relataram mais de uma queixa
Ao correlacionar os problemas de saúde com o tempo de trabalho dos profissionais no PS, aplicou-se o teste correlação de Spearman R, verificando-se diferença entre os resultados das duas equipes: menos de 2 anos (R=0,654 e p=0,0041); 2 anos a menos de 5 anos (R=0,7948 e p=0,0022); 5 anos ou mais (R=0,2055 e p=0,44452), prevalecendo o número maior de queixas para AE.
Ao correlacionar os problemas de saúde com a percepção do ruído, o teste de correlação de Spearman demonstrou correlação significativa entre os resultados dos dois grupos, para aqueles que consideravam o ruído no PS pouco intenso (R=0,7053 e p=0,00023), ou não barulhento (R=0,6606 e p=0,0053). Isso significa que os dois grupos apresentaram comportamento semelhante quanto aos problemas de saúde. No caso dos participantes que consideraram o ruído como muito intenso (R=0 e p=0,0640) e normal/médio (R=0 e p=0,2548), a correlação não foi significativa, demonstrando que os dois grupos mostraram-se diferentes, prevalecendo um número de problemas de saúde maior para o AE.
DISCUSSÃO
Este estudo visou avaliar a percepção das equipes de enfermagem e administrativa frente ao ruído no PS. Na busca de referenciais, foram encontrados poucos estudos que abordassem a intensidade sonora em PS, sendo que a maior parte dos estudos é de investigação em unidades de terapia intensiva (UTI)(20). Portanto, nesta discussão são citados os estudos desenvolvidos que abordaram a temática com preponderância em UTI, por se tratar de um ambiente muito semelhante ao que hoje encontramos no pronto-socorro, como pacientes críticos, diversos equipamentos e um grande número de profissionais atuando.
O estudo apresentou predomínio da força de trabalho do gênero feminino, tanto na área de enfermagem (68,42%), como na administrativa (76,19%) ( Tabela 1 ). Historicamente, a enfermagem é uma profissão feminina. Autores(21), quando analisaram a capacidade para o trabalho entre profissionais de enfermagem do PS de um hospital universitário, também obtiveram dados semelhantes da população, ou seja, 74,1% de trabalhadores do gênero feminino, fato constatado em outros estudos (22-24).
Em relação à faixa etária, eram equipes jovens profissionais na AE (78,95%) e na AD (80,96%), com menos de 40 anos, concordando com outros estudos(23,25) ( Tabela 1 ).
Notou-se que 68,42% e 42,86% dos profissionais da AE e AD, respectivamente, trabalhavam, em média, 36 horas semanais e 31,57% da AE e 57,14% da AD, 40 horas semanais. Estudo (25) constatou que 57,1% dos enfermeiros pesquisados trabalhavam, em média, 36 horas semanais, com média diária de 6 horas.
No que se refere ao tempo de trabalho em anos, constatou-se renovação das equipes de trabalho, sendo que, tanto AE (47,36%), como AD (71,43%) estavam a menos de dois anos no PS. Os resultados de um estudo(14) mostraram uma grande proporção de enfermeiros trabalhando nas unidades há menos de três anos, mas, se considerada toda a amostra estudada, a média do tempo de trabalho, neste setor, é de cinco anos e oito meses.
Quanto à percepção do ruído presente no PS, a AE, com 52,63%, referiu ser muito intenso. Porém, na AD, constatou-se a percentagem de 28,57%, considerando ser muito intenso, médio e pouco intenso. Chama a atenção o fato de somente 2,63% da AE e 14,29% da AD terem considerado o ambiente como não ruidoso ( Tabela 1 ). Essas respostas são compatíveis com os níveis de ruído avaliados no PS, que variaram de 56,6 a 119 dB(A)(16,18). Ressalta-se, aqui, que os níveis de conforto recomendados para hospitais, conforme NBR 10152(13), são de 35 dB (A) a 45 dB (A).
Estudo(26) realizado em UTI relatou que somente 2,7% dos profissionais perceberam o ambiente como pouco ruidoso, com um nível de ruído que variou de 61,35 a 62,31 dB(A). Ainda em outro estudo(27), que analisou a percepção das características acústicas de uma UTI, também se encontraram dados em que somente 10,2% consideraram o ambiente como pouco ruidoso.
Na análise da intensidade do ruído nos diferentes turnos, pôde-se constatar que, na AE, 41,9% consideraram o ruído variável, porém, na AD, 56,0% referiram maior intensidade de ruído no período da tarde, confirmando os achados de autores(28). Quando comparados os resultados da mensuração da percepção dos profissionais da saúde, verificou-se maior concordância entre os profissionais do turno da tarde, visto que 80% deles consideravam intenso o ruído existente na unidade de terapia intensiva neonatal (UTIN), enquanto a percepção dos que trabalhavam nos demais turnos se dividia entre moderado e intenso ( Tabela 2 ).
Quanto às fontes geradoras de ruído ( Tabela 3 ), profissionais da enfermagem identificaram mais os ruídos dos equipamentos (60,53%) e os profissionais da área administrativa, os de pessoas (85,71%). A AE desenvolve atividades com maior número de equipamentos e atendimento a pessoas; já as atividades da AD, estão mais voltadas ao atendimento ao público e funções burocráticas. Portanto, é de se esperar que as equipes identifiquem mais as fontes de ruído que estejam mais próximas delas. Em outros estudos, os autores obtiveram dados semelhantes(2-6,29,30), que também identificaram, como fontes geradoras de ruídos, os alarmes de equipamentos, as conversas, as risadas e a movimentação entre as pessoas.
Quanto à dificuldade no desempenho de tarefas diante do ruído ( Tabela 4 ), o grupo AD referiu dificuldade (42,86%), sendo 33,33% dificuldade de concentração e 11,11% de comunicação. Conforme estudo(2), os profissionais também apontaram alguns efeitos que os ruídos provocavam na sua rotina de trabalho, tais como diminuição da concentração, irritabilidade e estresse, distração, agitação e alterações auditivas, em ordem de frequência de surgimento nas respostas. É importante salientar que a equipe AD atua em estrutura física com bancada sem divisórias, onde várias pessoas estão sendo atendidas. Concomitantemente, esses profissionais falam ao telefone, preenchem dados cadastrais, com impressoras em funcionamento, o que facilita a propagação do ruído e dificulta a concentração e comunicação.
Foram relatados, em ambos os grupos (AE e AD), problemas de saúde extra-auditivos ( Tabela 5 ), sendo o cansaço o mais citado, seguido de outros, como estresse, ansiedade, nervosismo e irritabilidade. Estudo(5) demonstrou que os funcionários sentem desconforto a sons fortes (74,4%), seguido de mal-estar e cansaço (35,5%), devido ao estresse provocado pelo ruído que é produzido por vários dispositivos, combinados com os sons de alarmes, obras, horários de visitas e conversação entre os funcionários do hospital. De acordo com autor(14), dentre os fatores extra-auditivos prejudiciais mais relevantes, encontrados entre os profissionais de enfermagem de um hospital público de ensino, a irritação (45,63%) foi a mais ocorrente.
Houve correlação entre os problemas de saúde das equipes de trabalho com tempo de trabalho e com a percepção de ruído no PS. Segundo autor (7), trabalhadores que executam as mesmas funções têm concepções diferentes sobre os riscos a que estão expostos e, no que se refere à exposição ao ruído, as divergências são ainda maiores quanto à forma como ele os afeta.
Estudo(28) realizado em um hospital universitário na cidade de Santa Maria - RS objetivou conhecer a percepção de profissionais que atuavam na UTIN e também de pais, sobre os ruídos presentes na unidade, além de mensurar esses níveis para posterior comparação das duas vertentes da pesquisa. O referido estudo apontou que 97,7% dos profissionais entrevistados afirmaram que os ruídos podem provocar alterações nos indivíduos e destacaram a irritabilidade e o estresse como os maiores efeitos prejudiciais para os profissionais, confirmando que eles têm consciência sobre os prejuízos causados no ambiente de trabalho e também fora dele.
O estudo das percepções de riscos dos trabalhadores(15) reside em tentar compreender como estas percepções podem influenciar os seus comportamentos, as suas atitudes e as formas de realizar o seu trabalho, visto que esses fatores podem influenciar a possibilidade de os trabalhadores sofrerem acidentes de trabalho ou contraírem doenças profissionais. Tais fatores podem ser minimizados, por exemplo, mediante políticas e estratégias preventivas.
Um estudo(27) demonstrou a importância da aplicação de uma medida de baixo custo, como a educação continuada da equipe de trabalho, sobre a prevenção de ruído ambiental, para que se obtenha mudança comportamental.
Por fim, e com base nos resultados do presente estudo, sugere-se a implantação de medidas como diminuir o tom de voz em conversa com maior proximidade entre os profissionais, evitar conversas ao lado do paciente e criação de ambientes para discussão clínica longe das unidades de pacientes. Também são estratégias eficazes atender rapidamente aos disparos dos alarmes, abrir/fechar gavetas e portas com cuidado, manutenção dos equipamentos citados como geradores de ruído ou ações para redução do ruído no PS, levando em consideração as percepções das equipes de saúde, visando influenciar positivamente as mudanças de comportamentos, de atitudes e das formas de realizar o trabalho, para minimizar o risco de danos à saúde, acidentes de trabalho ou dificuldades relacionadas ao desempenho profissional das equipes.
CONCLUSÃO
Houve diferença na percepção dos profissionais da área de enfermagem e administrativa, em relação ao ruído no PS, mas, para ambas as áreas, o ruído que causa maior incômodo é o produzido pelas pessoas.
Diante dos problemas de saúde identificados, que podem ser utilizados para reflexões e para intervenções futuras, sugere-se desenvolver um programa de redução do ruído no ambiente de PS, com a participação efetiva dos trabalhadores, para favorecer o direcionamento de ações ao nível individual e coletivo. Desse modo, deve-se manter a avaliação do ruído de forma rotineira, com retorno aos colaboradores. Recomenda-se a realização de mais estudos na área de pronto-socorro.