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Associação entre os aspectos da avaliação clínica da língua realizada em crianças

RESUMO

Objetivo

Pesquisar a existência de associação entre os aspectos da avaliação clínica da língua.

Métodos

Estudo transversal observacional, com 80 crianças brasileiras, saudáveis, faixa etária entre 8 e 12 anos, sendo 36 (45%) do gênero masculino e 44 (55%) do gênero feminino. Foram avaliados aspectos da língua relacionados à morfologia, frênulo, mobilidade, praxias e força. Foram obtidas as associações entre os aspectos da avaliação clínica, considerando nível de significância de 5%.

Resultados

Houve associação entre largura e altura; entre extensão do frênulo e as provas de sugar a língua no palato, vibrar, protrair/retrair e tocar comissuras direita e esquerda e lábios superior e inferior e entre a fixação do frênulo no assoalho da boca e as provas de sugar a língua no palato e vibrar. A prova de estalar ápice de língua apresentou associação com estalar o corpo. Estalar a língua (ápice ou corpo) apresentou associação com sugar a língua no palato, vibrar, protrair/retrair, tocar comissuras direita e esquerda e lábios superior e inferior e força. A prova de sugar a língua no palato apresentou associação com vibrar, protrair/retrair, tocar comissuras direita e esquerda e lábios superior e inferior e força de língua e a prova de vibrar a língua, com protrair e retrair e força de língua. Também houve associação entre protrair e retrair e tocar comissuras direita e esquerda e lábios superior e inferior.

Conclusão

Os aspectos da língua na avaliação clínica apresentaram associações entre si.

Palavras-chave:
Língua; Avaliação; Fonoaudiologia; Sistema estomatognático; Força muscular

ABSTRACT

Purpose

Investigate the possible association between myofunctional aspects of the tongue clinical evaluation.

Methods

Observational, cross-sectional study conducted with 80 healthy Brazilian schoolchildren aged 8-12 years: 36 (45%) males and 44 (55%) females. The following aspects of the tongue were assessed: morphology, frenulum, mobility, praxis, and force. Association between the aspects of clinical evaluation was obtained considering a statistical significance level of 5%.

Results

The following associations were observed: between tongue width and height; between frenulum length and the tasks of sucking the tongue on palate, tongue vibration, tongue protrusion/retraction, and touching right and left commissures and upper and lower lips; between frenulum attachment to the floor of the mouth and the tasks of sucking tongue on palate and tongue vibration. In the snap task, tongue apex snap was associated with tongue body snap. Tongue snap (apex or body) was associated with sucking the tongue on palate, tongue vibration, tongue protrusion/retraction, touching right and left commissures and upper and lower lips, and tongue force. Sucking tongue on palate was associated with tongue vibration, tongue protrusion/retraction, touching right and left commissures and upper and lower lips, and tongue force. Tongue vibration was associated with tongue protrusion/retraction and tongue force. Association was also observed between the tongue protrusion/retraction task and touching right and left commissures and upper and lower lips.

Conclusion

Association between tongue aspects was verified in the clinical evaluation.

Keywords:
Tongue; Evaluation; Speech, Language and hearing sciences; Stomatognathic system; Muscle strength

INTRODUÇÃO

A língua é um órgão muscular que participa de funções importantes para o sistema estomatognático, como mastigação, deglutição e fala(11 Sakamoto Y. Structural arrangement of the intrinsic muscles of the tongue and their relationships with the extrinsic muscles. Surg Radiol Anat. 2018;40(6):681-8. http://dx.doi.org/10.1007/s00276-018-1993-5. PMid:29470649.
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). No ato da mastigação, a língua auxilia na fase de trituração(22 Peyron MA, Woda A, Bourdiol P, Hennequin M. Age-related changes in mastication. J Oral Rehabil. 2017;44(4):299-312. http://dx.doi.org/10.1111/joor.12478. PMid:28029687.
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), mantendo o alimento sobre as superfícies oclusais e propicia a formação do bolo alimentar(22 Peyron MA, Woda A, Bourdiol P, Hennequin M. Age-related changes in mastication. J Oral Rehabil. 2017;44(4):299-312. http://dx.doi.org/10.1111/joor.12478. PMid:28029687.
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). Na deglutição, o alimento é direcionado pela língua para a faringe(33 Rocha SG, Silva RG, Berti LC. Qualitative and quantitative ultrasound analysis of oropharyngeal swallowing. CoDAS. 2015;27(5):437-45. http://dx.doi.org/10.1590/2317-1782/20152015015. PMid:26648214.
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) e, durante a fala, é uma das estruturas responsáveis pelos pontos articulatórios dos fonemas(44 Silva LM, Vassoler AMO, Marino VCC, Berti LC. Quantitative analysis of tongue movement in 14 phonemes of Brazilian Portuguese. CoDAS. 2017;29(4):1-8. PMid:28876369.). Além disso, realiza a limpeza da cavidade oral, após o consumo de alimentos(22 Peyron MA, Woda A, Bourdiol P, Hennequin M. Age-related changes in mastication. J Oral Rehabil. 2017;44(4):299-312. http://dx.doi.org/10.1111/joor.12478. PMid:28029687.
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).

Os músculos que constituem a língua são responsáveis pela movimentação e modificação em sua forma, sendo extrínsecos (palatoglosso, genioglosso, hioglosso e estiloglosso) e intrínsecos (longitudinal superior, longitudinal inferior, transverso e vertical)(11 Sakamoto Y. Structural arrangement of the intrinsic muscles of the tongue and their relationships with the extrinsic muscles. Surg Radiol Anat. 2018;40(6):681-8. http://dx.doi.org/10.1007/s00276-018-1993-5. PMid:29470649.
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). Os músculos intrínsecos estão contidos na própria língua, enquanto os extrínsecos originam-se em estruturas adjacentes e inserem-se na língua(11 Sakamoto Y. Structural arrangement of the intrinsic muscles of the tongue and their relationships with the extrinsic muscles. Surg Radiol Anat. 2018;40(6):681-8. http://dx.doi.org/10.1007/s00276-018-1993-5. PMid:29470649.
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). Os músculos intrínsecos e extrínsecos da língua são interdependentes, visto que suas fibras encontram-se entrelaçadas tridimensionalmente(11 Sakamoto Y. Structural arrangement of the intrinsic muscles of the tongue and their relationships with the extrinsic muscles. Surg Radiol Anat. 2018;40(6):681-8. http://dx.doi.org/10.1007/s00276-018-1993-5. PMid:29470649.
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,55 Sakamoto Y. Configuration of the extrinsic muscles of the tongue and their spatial interrelationships. Surg Radiol Anat. 2017;39(5):497-506. http://dx.doi.org/10.1007/s00276-016-1777-8. PMid:27830322.
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). Por isso, a maioria dos movimentos realizados pela língua requer a contração de vários músculos simultaneamente, havendo constante interação entre os músculos extrínsecos e intrínsecos da língua, nas diversas funções que ela desempenha(11 Sakamoto Y. Structural arrangement of the intrinsic muscles of the tongue and their relationships with the extrinsic muscles. Surg Radiol Anat. 2018;40(6):681-8. http://dx.doi.org/10.1007/s00276-018-1993-5. PMid:29470649.
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,55 Sakamoto Y. Configuration of the extrinsic muscles of the tongue and their spatial interrelationships. Surg Radiol Anat. 2017;39(5):497-506. http://dx.doi.org/10.1007/s00276-016-1777-8. PMid:27830322.
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). Devido à disposição de suas fibras musculares, organizadas tanto paralelamente, quanto perpendicularmente ao eixo, a língua é considerada um hidrostato muscular, sendo capaz de mudar sua forma, sem alterar o volume. Logo, qualquer diminuição do comprimento deste órgão em uma direção ocasiona o aumento compensatório em, pelo menos, outra direção(66 Sanders I, Mu L. A three-dimensional atlas of human tongue muscles. Anat Rec. 2013;296(7):1102-14. http://dx.doi.org/10.1002/ar.22711. PMid:23650264.
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). O afilamento, por exemplo, é provocado pela contração do músculo transverso, o que diminui a seção transversal; a retrusão é provocada pela contração dos músculos longitudinais e a lateralização é resultado da contração concomitante dos músculos longitudinais, unilateralmente, e do músculo transverso(66 Sanders I, Mu L. A three-dimensional atlas of human tongue muscles. Anat Rec. 2013;296(7):1102-14. http://dx.doi.org/10.1002/ar.22711. PMid:23650264.
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).

A língua contém, em sua região anterior, alta concentração de fibras musculares resistentes à fadiga (tipo I) e de contração rápida (tipo IIa). Essa composição fornece o suporte estrutural para a realização dos movimentos da fala, que são rápidos, repetitivos e não requerem muita força. Fibras tipo IIb encontram-se na base da língua. Tais fibras possuem maior capacidade de geração de força, o que é necessário durante a deglutição. A alta capacidade de produção de adenosina trifosfato (ATP) das fibras tipo I e IIa, predominantes na língua, a tornam resistente à fadiga muscular(77 Burkhead LM, Sapienza CM, Rosenbek JC. Strength-training exercise in dysphagia rehabilitation: principles, procedures, and directions for future research. Dysphagia. 2007;22(3):251-65. http://dx.doi.org/10.1007/s00455-006-9074-z. PMid:17457549.
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).

Não apenas o tipo da fibra muscular difere entre as regiões da língua, como também as concentrações dos tecidos. A região anterior da língua tem maior concentração de tecido conjuntivo do que as regiões média e posterior. O tecido conjuntivo proporciona resistência e flexibilidade, necessárias à rápida sequência de movimentos e mudanças de forma realizados pela região anterior da língua, durante a fala(88 Miller JL, Watkin KL, Chen MF. Muscle, adipose, and connective tissue variations in intrinsic musculature of the adult human tongue. J Speech Lang Hear Res. 2002;45(1):51-65. http://dx.doi.org/10.1044/1092-4388(2002/004). PMid:14748638.
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). Outro fator responsável pela realização de movimentos finos e precisos pelo terço anterior da língua é a maior concentração de unidades motoras nessa região. Já a região posterior, tem maior concentração de tecido muscular e maior diâmetro das fibras musculares, favorecendo a realização de força(88 Miller JL, Watkin KL, Chen MF. Muscle, adipose, and connective tissue variations in intrinsic musculature of the adult human tongue. J Speech Lang Hear Res. 2002;45(1):51-65. http://dx.doi.org/10.1044/1092-4388(2002/004). PMid:14748638.
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). Devido à complexa organização de suas fibras musculares e à grande quantidade de motoneurônios que compõem o XII nervo craniano, responsável por sua inervação motora, a língua executa diversos movimentos em curtos períodos de tempo(99 Stone M, Epstein MA, Iskarous K. Functional segments in tongue movement. Clin Linguist Phon. 2004;18(6-8):507-21. http://dx.doi.org/10.1080/02699200410003583. PMid:15573487.
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).

Os aspectos musculares e anatômicos da língua, tais como força, mobilidade, praxias, postura, morfologia e frênulo, devem estar em harmonia, para o adequado desempenho das funções estomatognáticas. Quando há suspeita de alterações, cada aspecto deve ser avaliado minuciosamente e separadamente(1010 Farias SR, Ávila CRB, Vieira MM. Relationship between speech, tonus and non-verbal praxis of the stomatognathic system in preschoolers. Pro Fono. 2006;18(3):267-76. http://dx.doi.org/10.1590/S0104-56872006000300006. PMid:17180795.
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). A avaliação clínica da língua é a mais comumente utilizada, mas se limita, pelo fato de ser perceptiva, podendo o diagnóstico variar entre os profissionais(1111 Rezende BA, Furlan RM, Casas EB, Motta AR. Relationship between clinical and instrumental assessment of the tongue in healthy young adults. CoDAS. 2015;27(3):260-6. http://dx.doi.org/10.1590/2317-1782/20152014155. PMid:26222943.
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). Mesmo com a criação e o uso de instrumentos de avaliação objetiva, que têm crescido nessa área(1212 Azevedo ND, Lima JC, Furlan RMMM, Motta AR. Tongue pressure measurement in children with mouth-breathing behavior. J Oral Rehabil. 2018;45(8):612-7. http://dx.doi.org/10.1111/joor.12653. PMid:29782038.
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13 Motta AR, Las Casas EB, César CC, Bommarito S, Chiari BM. Caracterização da força da língua por meio de medidas objetivas. Rev CEFAC. 2017;19(1):82-9. http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620171919116.
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-1414 Oliveira GD, Valentim AF, Vicente LCC, Motta AR. Factors associated with tongue pressure in post-stroke patients. Audiol Commun Res. 2017;22:e1870.), a avaliação clínica qualitativa continua sendo o método mais utilizado na prática. No entanto, as relações entre os aspectos da língua, obtidos na avaliação clínica qualitativa, ainda são pouco estudadas. Uma pesquisa(1515 Rezende BA, Furlan RMMM, Las Casas EB, Motta AR. Clinical assessment of the tongue in healthy young adults. Rev CEFAC. 2016;18(3):559-67. http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620161832516.
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) verificou a associação entre os aspectos da avaliação clínica da língua de adultos saudáveis e encontrou que o grau de tensão influencia no desempenho das praxias linguais. Os autores verificaram, ainda, que as alterações na prova de vibração vieram acompanhadas de outras dificuldades, como no estalo e na elevação da língua. Outra pesquisa, que avaliou a língua de 120 crianças, constatou que naquelas com tônus de língua normal, as praxias de língua se encontravam regulares e, nas crianças que apresentaram o tônus de língua alterado, as praxias também se mostraram alteradas(1010 Farias SR, Ávila CRB, Vieira MM. Relationship between speech, tonus and non-verbal praxis of the stomatognathic system in preschoolers. Pro Fono. 2006;18(3):267-76. http://dx.doi.org/10.1590/S0104-56872006000300006. PMid:17180795.
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).

Sendo a população infantil parte considerável do público que procura atendimento fonoaudiológico, é importante observar e entender as relações entre os aspectos clínicos da língua, nessa população. A literatura apontou que os aspectos orofaciais miofuncionais são pouco pesquisados em crianças(1616 Rabelo AVT, Campos FR, Friche CP, Silva BSV, Friche AAL, Alves CRL, et al. Speech and language disorders in children from public schools in Belo Horizonte. Rev Paul Pediatr. 2015;33(4):453-9. http://dx.doi.org/10.1016/j.rpped.2015.02.004. PMid:26300524.
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). Dessa forma, um estudo abordando esses aspectos poderá ajudar os fonoaudiólogos a realizar diagnósticos mais precisos na área de motricidade orofacial e propor planejamentos terapêuticos adequados. Diante disso, o objetivo deste estudo foi pesquisar a existência de associação entre os aspectos da avaliação clínica da língua de crianças. Acredita-se que haja relação entre os vários aspectos da avaliação da língua.

MÉTODOS

Esta pesquisa caracterizou-se por um estudo transversal observacional, realizado nas Clínicas Integradas de Saúde do Centro Universitário Metodista Izabela Hendrix, na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e em uma escola da rede pública de Belo Horizonte (MG). A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Instituto Metodista Izabela Hendrix, sob o número 2.141.922, e pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UFMG, sob os números 692.875 e CAAE – 67187417.5.0000.5149.

Participantes

Foram incluídas na amostra 80 crianças brasileiras, saudáveis, faixa etária entre 8 e 12 anos, (média = 10,52 anos, desvio padrão = 1,4 anos), sendo 36 (45%) do gênero masculino e 44 (55%) do gênero feminino.

Os critérios de inclusão foram: estar na faixa etária estabelecida, ausência de glossectomias, pelvectomias ou paralisia de língua, ausência de diagnóstico de transtorno invasivo do desenvolvimento, ausência de diagnóstico de doenças neurológicas ou sindrômicas e não ter diagnóstico de perda auditiva. Como critério de exclusão, foram considerados: crianças que não compreendessem as tarefas solicitadas na avaliação, que não conseguissem concluir todas as etapas da avaliação clínica, e que apresentassem ausência de concordância entre os avaliadores na avaliação clínica da língua.

Avaliação clínica

Os participantes foram recrutados na sala de espera das Clínicas Integradas de Saúde do Centro Universitário Metodista Izabela Hendrix, no Ambulatório de Fonoaudiologia da UFMG e em uma escola da rede pública de Belo Horizonte. Cada um dos participantes foi informado sobre os objetivos e métodos da pesquisa e recebeu o Termo de Assentimento para ser assinado. O responsável recebeu o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido para autorizar a realização da pesquisa com a criança. Aqueles que concordaram em participar e assinaram os termos foram submetidos à avaliação clínica da língua, realizada por dois fonoaudiólogos, sendo, pelo menos um deles, especialista em motricidade orofacial, ou por um fonoaudiólogo especialista em motricidade orofacial e um aluno do oitavo período do curso de Fonoaudiologia do Centro Universitário Metodista Izabela Hendrix, previamente treinados para a realização da avaliação clínica da língua. No total, cinco avaliadores participaram da coleta de dados: três fonoaudiólogos e dois alunos do oitavo período do curso de Fonoaudiologia. Dentre os três fonoaudiólogos, dois eram especialistas em motricidade orofacial, com experiência de dez e de 23 anos na área, e um fonoaudiólogo tinha experiência de um ano na área. O diagnóstico foi estipulado por consenso e, quando não houve concordância entre as avaliações dos dois avaliadores, o indivíduo foi excluído da amostra.

A avaliação clínica da língua foi realizada por meio da antroposcopia e teve a duração aproximada de 20 minutos, sendo avaliados cinco aspectos: morfologia, frênulo, mobilidade, praxias e força(1717 Marchesan IQ, Berretin-Felix G, Genaro KF. MBGR protocol of orofacial myofunctional evaluation with scores. Int J Orofacial Myology. 2012;38:38-77. PMid:23362752.).

Na avaliação dos aspectos morfológicos, foram observadas largura e altura da língua, classificadas em normal ou alterada.

Para avaliar o frênulo lingual, foi solicitado ao participante que elevasse a língua dentro da cavidade oral, sem tocar o palato, e foram observadas as fixações do frênulo no assoalho da boca e na língua. Também foi observada a extensão, se adequada, curta ou longa(1717 Marchesan IQ, Berretin-Felix G, Genaro KF. MBGR protocol of orofacial myofunctional evaluation with scores. Int J Orofacial Myology. 2012;38:38-77. PMid:23362752.). Os casos com histórico de frenotomia ou frenectomia prévia foram registrados.

Na avaliação da mobilidade, foi solicitado que o participante realizasse movimentos de estalar o ápice e o corpo da língua, sugar a língua no palato duro e mantê-la por cinco segundos e vibrá-la(1515 Rezende BA, Furlan RMMM, Las Casas EB, Motta AR. Clinical assessment of the tongue in healthy young adults. Rev CEFAC. 2016;18(3):559-67. http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620161832516.
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), sendo o modelo fornecido pelo avaliador. Cada uma destas tarefas foi classificada como adequada, alterada ou ausente.

Na avaliação das praxias (coordenação), foi solicitado, mediante modelo fornecido pelo avaliador, que o participante alternasse protrusão e retração lingual e tocasse o ápice da língua, sequencialmente, nas comissuras direita e esquerda e nos lábios superior e inferior(1515 Rezende BA, Furlan RMMM, Las Casas EB, Motta AR. Clinical assessment of the tongue in healthy young adults. Rev CEFAC. 2016;18(3):559-67. http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620161832516.
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). Quando o participante não conseguia realizar os movimentos solicitados, considerou-se como alterado. Todas as tarefas de mobilidade e de praxias em que houve presença de movimentos associados de mandíbula e musculatura perioral foram anotadas, sendo considerados como movimentos associados, as contrações não esperadas de lábios e os movimentos de mandíbula durante a realização das tarefas de língua.

Para avaliar a força da língua, foi solicitado que o participante protraísse a língua empurrando-a contra uma espátula de madeira, posicionada verticalmente, a poucos centímetros da boca, realizando a tarefa de contrarresistência, mantendo a força por alguns segundos(1515 Rezende BA, Furlan RMMM, Las Casas EB, Motta AR. Clinical assessment of the tongue in healthy young adults. Rev CEFAC. 2016;18(3):559-67. http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620161832516.
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). A força foi considerada adequada quando a protrusão com contrarresistência foi mantida sem tremores e sem deformação da língua; reduzida, quando a musculatura conseguia resistir apenas levemente contra a resistência feita pela espátula, havendo tremores e deformação e reduzida no ápice, quando apenas o ápice lingual apresentava deformação e/ou tremores.

Análise dos dados

Com a finalidade de descrever a amostra, realizaram-se medidas de tendência central (média) e variabilidade (desvio padrão) para as variáveis contínuas e análise de frequência para as variáveis categóricas.

Aplicou-se o teste Qui-quadrado e teste exato de Fisher, com a finalidade de avaliar a associação entre as variáveis força, mobilidade, praxia, morfologia e frênulo. Considerou-se nível de significância de 5%. Os dados foram analisados utilizando o programa estatístico IBM SPSS.

RESULTADOS

Foram avaliadas 80 crianças, sendo 36 (45%) do gênero masculino e 44 (55%) do gênero feminino. A idade dos participantes apresentou a seguinte distribuição: 12 (15%) com 8 anos, 7 (8,8%) com 9 anos, 13 (16,3%) com 10 anos, 23 (28,7%) com 11 anos e 25 (31,3%) com 12 anos.

Com relação aos aspectos morfológicos da língua, 77 (96,3%) apresentaram altura adequada e 71 (88,8%) apresentaram largura adequada. Quanto ao frênulo lingual, 69 (86,3%) apresentaram extensão de frênulo adequada e 10 (12,5%) apresentaram frênulo curto; 71 (89,9%) apresentaram fixação na parte média da língua, 3 (3,8%) apresentaram fixação no ápice e 5 (6,3%), entre a parte média e o ápice. Já com relação à fixação no assoalho da boca, 64 crianças (81%) apresentaram fixação entre as carúnculas e 15 (6,3%), na crista alveolar. Uma criança já havia sido submetida à frenectomia e, por isso, não participou da avaliação deste aspecto.

Com relação à mobilidade, 68 (85%) estalaram o ápice da língua adequadamente, 69 (86,3%) estalaram o corpo da língua; 68 (85%) sugaram a língua no palato de maneira adequada e 62 (77,5%) vibraram a língua corretamente. Com relação às praxias, 72 crianças (90%) realizaram adequadamente a tarefa de protrair e retrair a língua e 71 (88,8%) tocaram o ápice sequencialmente nas comissuras direita e esquerda e nos lábios superior e inferior, acertadamente. Movimentos associados de lábios e/ou língua apenas foram notados nas tarefas de praxias, sendo que, na tarefa de protrair e retrair a língua, um participante apresentou compensação de lábios e, na tarefa de tocar comissuras direita, esquerda, superior e inferior, um participante apresentou compensação de lábios e 2, de mandíbula.

Com relação à força de língua, 35 (43,8%) apresentaram força adequada, 21 (12,5%) apresentaram redução de força no ápice lingual e 24 (30%) apresentaram redução na força em toda a língua.

Em relação à associação entre largura e altura da língua e as demais variáveis de interesse, foi encontrada associação somente entre as variáveis altura e largura, entre si, indicando que indivíduos com largura alterada tenderam a apresentar, também, alteração na altura da língua (Tabela 1).

Tabela 1
Associação entre largura e altura da língua e as demais variáveis de interesse

Quanto à associação entre extensão e fixação do frênulo da língua e as demais variáveis de interesse, foram encontradas associações entre extensão do frênulo e as tarefas de tocar as comissuras direita e esquerda, lábio superior e inferior, protrair e retrair a língua, vibrar a língua, sugar a língua no palato e também entre fixação do frênulo no assoalho da boca e as tarefas de sugar a língua no palato e vibrar a língua, indicando que os indivíduos que tiveram frênulo alterado apresentaram dificuldades de mobilidade e praxias linguais (Tabela 2).

Tabela 2
Associação entre extensão e fixação do frênulo da língua e as demais variáveis de interesse

No que diz respeito à associação entre estalar o ápice e o corpo da língua e as demais variáveis, foram encontradas associações significativas entre estalar o ápice da língua e estalar o corpo da língua, bem como das provas de estalo de língua (corpo ou ápice) com sugar a língua no palato, vibrar a língua, protrair e retrair a língua, tocar as comissuras e força de língua (Tabela 3).

Tabela 3
Associação entre estalar o ápice e o corpo da língua e as demais variáveis

No que se refere à associação entre sugar a língua no palato e vibrar a língua e as demais variáveis de interesse, foram encontradas associações significativas entre sugar a língua no palato e as tarefas de vibrar a língua, protrair e retrair, tocar comissuras direita e esquerda, lábios superior e inferior e força de língua, bem como entre vibrar a língua e as provas de protrair e retrair e força de língua (Tabela 4).

Tabela 4
Associação entre sugar a língua no palato e vibrar a língua e as demais variáveis de interesse

Quanto à associação entre provas de praxias da língua e as demais variáveis de interesse, foram encontradas associações apenas entre protrair e retrair e tocar nas comissuras direita e esquerda, no lábio superior e inferior (Tabela 5).

Tabela 5
Associação entre provas de praxias da língua e as demais variáveis de interesse

DISCUSSÃO

A presente pesquisa avaliou aspectos de morfologia, frênulo, mobilidade, praxias e força de língua em crianças de 8 a 12 anos de idade. A faixa etária escolhida deveu-se ao fato de que o desempenho motor da língua sofre pouca variação nesta fase. O diâmetro e a mielinização dos axônios do trato corticobulbar, que controla a movimentação da língua, sofrem aumento rápido e não linear até aproximadamente os 8 anos. Após esta idade, continuam a aumentar, porém, de maneira mais gradual, ao final da infância e na adolescência(1818 Potter NL, Kent RD, Lazarus JAC. Oral and manual force control in preschool-aged children: is there evidence for common control. J Mot Behav. 2009;41(1):66-82. http://dx.doi.org/10.1080/00222895.2009.10125919. PMid:19073472.
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). Uma pesquisa que mediu a força da língua de crianças e adolescentes apontou para um rápido aumento de força dos 3 aos 8 anos. Após os 8 anos, a força continuou aumentando, mas de maneira mais gradativa, até atingir o pico, por volta dos 16 anos(1818 Potter NL, Kent RD, Lazarus JAC. Oral and manual force control in preschool-aged children: is there evidence for common control. J Mot Behav. 2009;41(1):66-82. http://dx.doi.org/10.1080/00222895.2009.10125919. PMid:19073472.
http://dx.doi.org/10.1080/00222895.2009....
).

O aspecto que teve o menor número de indivíduos considerados alterados foi a altura da língua, enquanto a força foi o aspecto com maior número de alterações. No estudo que avaliou os aspectos da língua em adultos(1515 Rezende BA, Furlan RMMM, Las Casas EB, Motta AR. Clinical assessment of the tongue in healthy young adults. Rev CEFAC. 2016;18(3):559-67. http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620161832516.
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), a força também foi um fator com grande quantidade de indivíduos alterados (62,5% da amostra) e, em uma pesquisa que investigou a prevalência de alterações fonoaudiológicas em crianças, os autores observaram que 67,4% das alterações orofaciais miofuncionais estavam relacionadas com a tensão das estruturas avaliadas(1616 Rabelo AVT, Campos FR, Friche CP, Silva BSV, Friche AAL, Alves CRL, et al. Speech and language disorders in children from public schools in Belo Horizonte. Rev Paul Pediatr. 2015;33(4):453-9. http://dx.doi.org/10.1016/j.rpped.2015.02.004. PMid:26300524.
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). Um estudo(1010 Farias SR, Ávila CRB, Vieira MM. Relationship between speech, tonus and non-verbal praxis of the stomatognathic system in preschoolers. Pro Fono. 2006;18(3):267-76. http://dx.doi.org/10.1590/S0104-56872006000300006. PMid:17180795.
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) sugeriu que a força muscular interfere na capacidade da língua de realizar movimentos em sequência. Tal associação concorda com o presente estudo, ao mostrar que os indivíduos que apresentaram diminuição da força da língua, também demonstraram dificuldade na realização das praxias linguais. Uma explicação para tal achado é que a quantidade de força que a língua é capaz de exercer não depende apenas da concentração de tecido muscular, diâmetro e tipo das fibras musculares, mas também da ativação neural, ou seja, do número de unidades motoras recrutadas na contração muscular, da velocidade e da coordenação do recrutamento das unidades motoras(77 Burkhead LM, Sapienza CM, Rosenbek JC. Strength-training exercise in dysphagia rehabilitation: principles, procedures, and directions for future research. Dysphagia. 2007;22(3):251-65. http://dx.doi.org/10.1007/s00455-006-9074-z. PMid:17457549.
http://dx.doi.org/10.1007/s00455-006-907...
). Por isso, a inadequada ativação neural pode ser vinculada à diminuição de força, coordenação e precisão dos movimentos.

Na presente pesquisa, com relação aos aspectos morfológicos, foi encontrada associação entre largura e altura da língua. Estudos apontaram que a largura da língua geralmente encontra-se alterada em respiradores orais(1919 Rodrigues HOSN, Faria SR, Paula FSG, Motta AR. Occurrence of mouth breathing and orofacial myology disorders in patients on orthodontic treatment. Rev CEFAC. 2005;7(3):356-62.), devido à postura rebaixada que assume para passagem de ar pela cavidade oral e pode ser resultado da fraqueza do músculo transverso. Já a altura da língua, está relacionada ao músculo vertical. Juntos, transverso e vertical realizam o afilamento lingual(66 Sanders I, Mu L. A three-dimensional atlas of human tongue muscles. Anat Rec. 2013;296(7):1102-14. http://dx.doi.org/10.1002/ar.22711. PMid:23650264.
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), que foi avaliado na tarefa de força, nesta pesquisa. No entanto, não foi encontrada relação destas variáveis com a força da língua, sugerindo que as alterações entre largura e altura da língua dos indivíduos desta pesquisa são, provavelmente, variações anatômicas individuais e não resultado de alterações na força. O volume aumentado da língua, tanto na largura quanto na altura, tem sido relacionado ao acúmulo de gordura na língua, condição encontrada em indivíduos com apneia obstrutiva do sono(2020 Kim AM, Keenan BT, Jackson N, Chan EL, Staley B, Poptani H, Torigian DA, Pack AI, Schwab RJ. Tongue fat and its relationship to obstructive sleep apnea. Sleep. 2014;37(10):1639-48. http://dx.doi.org/10.5665/sleep.4072. PMid:25197815.
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). Tal condição, porém, não foi investigada na presente pesquisa.

Com relação ao frênulo lingual, houve alterações nas provas de mobilidade e praxias em indivíduos com alterações no frênulo, sendo a associação significativa entre extensão do frênulo e provas de mobilidade e praxia e entre fixação do frênulo no assoalho e mobilidade da língua. Um estudo apontou que indivíduos com alteração de frênulo possuem maiores chances de apresentar alterações na mobilidade da língua(2121 Silva MC, Costa MLVCM, Nemr K, Marchesan IQ. Lingual frenulum alteration and chewing interference. Rev CEFAC. 2009;11:363-9. http://dx.doi.org/10.1590/S1516-18462009000700012.
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). O mesmo estudo também indicou que 35% das pessoas com frênulo alterado apresentaram mobilidade alterada, enquanto apenas 15% de indivíduos com frênulo normal tiveram alteração na mobilidade. Outra pesquisa encontrou que, quando há uma alteração no frênulo de língua, a mobilidade lingual pode ficar prejudicada(2222 Suzart DD, Carvalho ARR. Speech disorders related to alterations of the lingual frenulum. Rev CEFAC. 2016;18(6):1332-9. http://dx.doi.org/10.1590/1982-0216201618621715.
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). Em outro artigo, também foi observado que o frênulo curto e anteriorizado apresentou maior alteração nas praxias para cima e vibração(2323 Braga LAS, Silva J, Pantuzzo CL, Motta AR. Prevalence of change in frenulum lingual and its implications in speech of school children. Rev CEFAC. 2009;11:378-90. http://dx.doi.org/10.1590/S1516-18462009000700014.
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) e que a tarefa de sucção encontrava-se alterada nos frênulos curto e anteriorizado. A presente pesquisa confirmou que alterações da extensão e fixação do frênulo no assoalho podem gerar alterações na mobilidade de língua. Isso ocorre pelo fato de o frênulo lingual apresentar alta quantidade de fibras de colágeno tipo I, resistente à tração, o que pode justificar a restrição do movimento da língua(2424 Martinelli RLC, Marchesan IQ, Gusmão RJ, Rodrigues AC, Berretin-Felix G. Histological characteristics of altered human lingual frenulum. Int J Pediatr Child Health. 2014;2(1):5-9. http://dx.doi.org/10.12974/2311-8687.2014.02.01.2.
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). Uma criança que havia sido submetida previamente a frenectomia não foi excluída do estudo, apenas foi excluída da avaliação do frênulo, participando, assim, da avaliação dos demais aspectos, uma vez que se considerou importante investigar a língua de crianças, independente de alterações ou queixas, anteriores ou atuais, relacionadas à língua ou às funções orais. A exclusão de crianças com alterações limitaria a faixa de desempenho obtida, conforme notado em pesquisa prévia, realizada com indivíduos adultos(1515 Rezende BA, Furlan RMMM, Las Casas EB, Motta AR. Clinical assessment of the tongue in healthy young adults. Rev CEFAC. 2016;18(3):559-67. http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620161832516.
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).

As associações encontradas nas tarefas de mobilidade e praxias concordaram com a literatura. Em um estudo, foi relatado que indivíduos que possuem comprometimento nas praxias têm dificuldade de vibrar a língua e sugá-la(2525 Gonçalves CS, Ferreiro MC. Study of the relationship among presence of short and/or projected lingual frenulum and [R] backward production. Rev CEFAC. 2006;8(1):56-60.). Em estudo realizado com adultos(1515 Rezende BA, Furlan RMMM, Las Casas EB, Motta AR. Clinical assessment of the tongue in healthy young adults. Rev CEFAC. 2016;18(3):559-67. http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620161832516.
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), o estalo de língua apresentou associação com vibração de língua e ambas as provas apresentaram associação com a classificação da tensão, mostrando a relação dessas provas com a força da língua, o que corresponde com os achados da presente pesquisa.

Com relação às praxias, houve associação entre protrair e retrair e tocar a língua nas comissuras, mas não houve associação com a força da língua. Tal achado discorda de uma pesquisa realizada com crianças pré-escolares, na qual foi constatada diminuição da força de língua em crianças com dificuldade de realização das provas de praxias linguais não verbais(1010 Farias SR, Ávila CRB, Vieira MM. Relationship between speech, tonus and non-verbal praxis of the stomatognathic system in preschoolers. Pro Fono. 2006;18(3):267-76. http://dx.doi.org/10.1590/S0104-56872006000300006. PMid:17180795.
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). Poucos foram os indivíduos que realizaram movimentos associados de lábios ou mandíbula, durante as praxias. Autores também verificaram pouca ocorrência de movimentos associados de lábios e maior ocorrência de movimentos associados de mandíbula, porém, em proporção maior (18,8%)(1515 Rezende BA, Furlan RMMM, Las Casas EB, Motta AR. Clinical assessment of the tongue in healthy young adults. Rev CEFAC. 2016;18(3):559-67. http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620161832516.
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), em comparação com esta pesquisa (2,5%). Os participantes com movimentos associados de lábios apresentaram dificuldade em estalar o ápice e o corpo da língua e de vibrar a língua, enquanto os participantes com movimentos associados de mandíbula tiveram dificuldade para sugar a língua no palato. Além disso, participantes com movimentos associados de lábios ou de mandíbula apresentaram redução de força da língua. Portanto, tais contrações não esperadas parecem ser compensações para auxiliar a realização do movimento pelo participante, frente à dificuldade de força ou mobilidade na língua.

Diante destes achados, verificou-se que os aspectos miofuncionais da língua na avaliação clínica realizada em crianças apresentaram diversas associações entre si. O fonoaudiólogo deve, portanto, estar atendo durante o processo avaliativo. A interdependência entre as alterações pode influenciar o prognóstico, sendo que, quando existem vários aspectos alterados, pode ser necessária a abordagem concomitante de dois ou mais aspectos na terapia.

A avaliação qualitativa da língua, apesar de prática rotineira na clínica fonoaudiológica, especialmente na área de motricidade orofacial, ainda é pouco estudada, principalmente quanto ao desempenho de crianças(1616 Rabelo AVT, Campos FR, Friche CP, Silva BSV, Friche AAL, Alves CRL, et al. Speech and language disorders in children from public schools in Belo Horizonte. Rev Paul Pediatr. 2015;33(4):453-9. http://dx.doi.org/10.1016/j.rpped.2015.02.004. PMid:26300524.
http://dx.doi.org/10.1016/j.rpped.2015.0...
). Diferentes estudos foram desenvolvidos para investigar provas específicas de língua, como força(2626 Araújo TG, Rodrigues TM, Furlan RMMM, Las Casas EB, Motta AR. Reproducibility assessment of an instrument for measuring the axial force of the tongue. CoDAS. 2018;30(3):e20170191. PMid:29972446.), mobilidade(2727 Gubiani MB, Ceron MI, Freitas GP, Soares MK. Relação entre os fonemas linguodentais e habilidade de mobilidade de língua. Rev Disturb Comum. 2013;25(2):161-7.), praxias(1414 Oliveira GD, Valentim AF, Vicente LCC, Motta AR. Factors associated with tongue pressure in post-stroke patients. Audiol Commun Res. 2017;22:e1870.,2828 Mattos FMGF. Orofacial myofunctional characteristics of oral and oronasal breathers. Rev CEFAC. 2018;20(4):459-67. http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620182042818.
http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620182...
,2929 Gubiani MB, Carli CM, Keske-Soares M. Phonological disorder and alterations of orofacial praxis and the stomatognathic system. Rev CEFAC. 2015;17(1):134-42. http://dx.doi.org/10.1590/1982-0216201517513.
http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620151...
) e/ou frênulo(2222 Suzart DD, Carvalho ARR. Speech disorders related to alterations of the lingual frenulum. Rev CEFAC. 2016;18(6):1332-9. http://dx.doi.org/10.1590/1982-0216201618621715.
http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620161...
), em indivíduos com condições clínicas variadas. No entanto, este estudo inova, ao investigar a relação existente entre as diferentes provas da avaliação da língua. Tal conhecimento é importante para auxiliar o profissional no processo de avaliação, possibilitando um olhar diferenciado, a partir do desempenho do paciente em cada prova da avaliação. Uma avaliação clínica bem feita é importante para o sucesso terapêutico.

Uma limitação encontrada nesta pesquisa foi que alguns aspectos importantes da língua não foram avaliados, tais como tremor de língua, posição habitual, simetria e mucosa. As avaliações foram realizadas por duplas de avaliadores, de forma concomitante, e nem sempre pelos mesmos avaliadores, visto que cinco avaliadores participaram da coleta. Além disso, dois desses avaliadores eram estudantes da graduação, o que constitui outra limitação deste estudo, embora todos tenham sido treinados previamente quanto aos critérios de classificação de cada prova. Também não foram avaliadas as funções do sistema estomatognático. É importante ressaltar que existem as dificuldades inerentes à subjetividade da avaliação clínica, sendo que, para minimizá-las, a avaliação foi sempre realizada por dois avaliadores. Sugere-se a realização de novas pesquisas que investiguem as funções orofaciais, associando-as com as provas da avaliação clínica, uma vez que é ainda desconhecido o quanto o desempenho da língua em tarefas isoladas está relacionado ao seu desempenho nas funções.

CONCLUSÃO

Foi encontrada associação entre largura e altura da língua; extensão de frênulo e sugar a língua no palato, vibrar, protrair/retrair, tocar a língua nas comissuras direita/esquerda, lábio superior/inferior; fixação do frênulo no assoalho e sugar a língua no palato e vibrar; estalar o ápice da língua e estalar o corpo; estalar a língua (ápice ou corpo) e sugar a língua no palato, vibrar, protrair/retrair, tocar nas comissuras direita/esquerda, lábio superior/inferior e força de língua; sugar a língua no palato e vibrar, protrair/retrair, tocar nas comissuras direita/esquerda e lábio superior/inferior e força de língua; vibrar a língua e protrair/retrair e força de língua; protrair/retrair e tocar a língua nas comissuras direita/esquerda, lábio superior/inferior.

  • Trabalho realizado no Centro Universitário Metodista Izabela Hendrix – Belo Horizonte (MG), Brasil.
  • Financiamento: Nada a declarar.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Jun 2019
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    20 Set 2018
  • Aceito
    12 Fev 2019
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