Treinamento para análise perceptivo-auditiva da voz: revisão de escopo

RESUMO

Objetivo

sintetizar o estado do conhecimento científico sobre treinamento para análise perceptivo-auditiva da voz.

Estratégias de pesquisa

a estratégia PCC (População, Conceito e Contexto) e combinações de descritores foram utilizadas para busca nas bases de dados PubMed/MEDLINE, LILACS e SciELO.

Critérios de seleção

foram incluídos estudos com população composta por ouvintes com ou sem experiência na análise perceptivo-auditiva, que incluíssem a análise perceptivo-auditiva da voz, no contexto da clínica vocal, utilizando vozes humanas e/ou sintetizadas, com treinamento individual ou em grupo. Foram observados método de treinamento, vozes utilizadas, tempo de treinamento e se houve treino de habilidades auditivas centrais.

Resultados

A literatura consultada mostrou ser comum o uso de âncoras auditivas, feedback, vozes naturais soprosas e rugosas e tempo de treinamento com duração máxima de duas horas. Nenhum estudo aplicou o treino de habilidades de processamento auditivo central no treinamento para avaliação perceptivo-auditiva da voz.

Conclusão

ainda não há consenso sobre qual é o melhor programa de treinamento para análise perceptivo-auditiva da voz.

Palavras-chave:
Voz; Distúrbios da voz; Percepção auditiva; Qualidade vocal; Disfonia

ABSTRACT

Purpose

To synthesize the state of scientific knowledge about training for auditory-perceptual voice analysis.

Research strategy

Question, Concept and Context and combinations of descriptors were formulated for searching in PubMed/Medline, LILACS and SciELO databases.

Selection criteria

Studies were included with a population composed of listeners with or without experience in auditory-perceptual analysis, which included auditory-perceptual voice analysis, in the context of vocal clinic, using human and/or synthesized voices, with individual or group training. Training method, voices used, training time and whether there was training in central auditory skills were observed.

Results

It is common to use auditory anchors, feedback, breathy and rough natural voices and training time with a maximum duration of two hours. No study applied the training of central auditory processing skills in training for auditory-perceptual voice assessment.

Conclusion

There is still no consensus on what is the best training program for auditory-perceptual voice analysis.

Keywords:
Voice; Voice disorders; Auditory perceptual; Voice quality; Dysphonia

INTRODUÇÃO

A qualidade vocal é, essencialmente, um fenômeno perceptivo em resposta a um estímulo acústico e, sendo assim, a produção vocal é também uma propriedade física que exige percepção auditiva para ser analisada. Dessa forma, é compreensível que a análise perceptivo-auditiva (APA) da voz seja o padrão de referência na Fonoaudiologia para a avaliação vocal, que é um pré-requisito indispensável na avaliação e monitoramento de pacientes disfônicos. Contudo, é um procedimento subjetivo, pois depende de fatores inerentes ao ouvinte, como experiências e habilidades individuais. Uma das formas de minimizar a alta variabilidade na concordância intra-avaliador e interavaliadores, na análise perceptivo-auditiva da voz, é o treinamento perceptivo-auditivo(¹).

Há diversas razões para a necessidade de maior consenso na APA da voz. Uma delas é a busca por avaliações profissionais mais precisas e outra é a dificuldade em se obter referências consistentes que sirvam de base para a aprendizagem de alunos de Fonoaudiologia, bem como para a validação de avaliações acústicas, ferramentas automáticas e implementação de novas técnicas(²).

Além do treinamento perceptivo-auditivo convencional, as habilidades auditivas centrais também podem ser aperfeiçoadas por meio de treinamento(³). Interessa considerar tais habilidades para a avaliação vocal, visto que a APA envolve mecanismos biológicos que correspondem a habilidades auditivas específicas: o cérebro decodifica as ondas sonoras do ouvido externo para o córtex, em um processo que permite a análise minuciosa dos sons, por meio das vias auditivas do sistema nervoso central e do córtex auditivo(⁴). Portanto, para que um sinal sonoro possa ser analisado adequadamente, se faz necessário um processamento auditivo preciso(⁵).

Considerando o que existe na literatura sobre treinamento auditivo para APA, importa observar algumas variáveis, como método de treinamento, vozes utilizadas, tempo de treinamento e se o treino de habilidades auditivas centrais tem sido considerado. Conhecendo tais variáveis, é possível analisar quais são as estratégias de treinamento mais utilizadas, bem como se há algo ainda não explorado, direcionando, assim, o desenvolvimento de novos programas de treinamento.

OBJETIVO

Sintetizar o estado do conhecimento científico sobre treinamento para análise perceptivo-auditiva da qualidade vocal.

ESTRATÉGIA DE PESQUISA

A presente revisão foi desenvolvida com base nas recomendações do guia internacional Preferred Items for Systematic reviews and Meta-Analyses extension for Scoping Reviews (PRISMA-ScR)(⁶). Para respaldar a elaboração da pergunta de pesquisa e dos critérios de elegibilidade, foi utilizada a estratégia PCC (População, Conceito e Contexto)(⁷). Foram adotados os seguintes tópicos-chave:

• . População: ouvintes com ou sem experiência em APA

• . Conceito: treinamento para análise perceptivo-auditiva da voz

• . Contexto: clínica vocal

Conciliando os tópicos-chave da PCC com os objetivos do estudo, foi elaborada a seguinte pergunta de pesquisa: “Como é feito o treinamento para a análise perceptivo-auditiva da voz?”.

A busca eletrônica foi realizada em maio de 2022, nas bases de dados PubMed/MEDLINE, LILACS e SciELO. Além disso, foi realizada busca nas citações dos artigos selecionados. As estratégias de busca foram elaboradas a partir de termos indexados e livres, relacionados à PCC. Utilizaram-se combinações entre os seguintes descritores: PubMed - (((“speech-language pathology”) OR (“speech therapy”)) AND ((“auditory perception”) OR (“auditory perceptual assessment”) OR (“auditory perception judgment”) OR (“auditory-perceptual evaluation”) OR (“auditory-perceptual analysis”) OR (“auditory-perceptual measures”)) AND ((“dysphonia”) OR (“perceptual evaluation of dysphonia”) OR (“voice quality”) OR (“vocal quality”))); SciELO - (((“speech therapy”)) OR ((“speech-language pathology”)) AND ((“auditory perception”)) OR ((“auditory perceptual assessment”)) OR ((“auditory perception judgment”)) OR ((“auditory-perceptual evaluation”)) OR ((“auditory-perceptual measures”))) e LILACS - (((“vocal quality”)) OR ((“voice quality”)) AND ((“speech therapy”)) OR ((“auditory perceptual assessment”)) OR ((“auditory perception judgment”)) OR ((“auditory-perceptual evaluation”)) OR ((“auditory-perceptual measures”))). A língua inglesa foi utilizada na busca em todas as bases de dados. Não foi utilizado filtro de idioma ou data de publicação.

CRITÉRIOS DE SELEÇÃO

Para realizar a seleção dos artigos, foram estabelecidos critérios de elegibilidade. Foram incluídos estudos cuja população fosse composta por ouvintes com ou sem experiência na APA, no contexto da clínica vocal, que incluíssem o treinamento da análise perceptivo-auditiva da voz, individual ou em grupo, utilizando vozes humanas e/ou sintetizadas. Os critérios de exclusão foram: estudos secundários, treinamento exclusivamente com a utilização de voz artística e ausência de descrição do treinamento do julgamento perceptivo-auditivo.

Para a seleção dos estudos, foi realizada, primeiramente, a identificação dos estudos nas bases de dados PubMed/MEDLINE, SciELO e LILACS. Em seguida, foram aplicados os critérios de inclusão, por meio da leitura do título e resumo. Logo após, realizou-se a exclusão dos estudos repetidos e a aplicação dos critérios de exclusão, mediante leitura completa dos estudos. A seleção foi realizada por dois revisores, de forma independente. Nos casos de divergência entre os revisores, dois outros revisores ficaram disponíveis para tomada de decisão consensual.

ANÁLISE DOS DADOS

Os artigos elegíveis foram submetidos à extração dos seguintes dados para composição da matriz de análise: autores, método de treinamento, vozes utilizadas, tempo de treinamento e se houve treino de habilidades auditivas centrais.

RESULTADOS

A busca rastreou, inicialmente, 124 artigos. Desses, 14 foram selecionados para análise, após passarem pelos critérios de elegibilidade. Não houve divergência entre os revisores que realizaram a busca e triagem dos artigos, portanto, não foi necessária a participação do terceiro revisor. A partir desses artigos, novos foram inseridos, por meio da busca adicional nas referências bibliográficas dos artigos selecionados, totalizando a inclusão de 23 estudos nesta revisão (Figura 1).

Figura 1
Fluxograma da coleta de dados e seleção dos estudos que compuseram a amostra

A literatura consultada mostrou ser comum o uso de âncoras auditivas (69,56%), que são emissões vocais definidas como representantes de um determinado tipo e/ou grau de desvio e podem ser naturais ou sintetizadas, servindo de referência externa durante a APA; feedback (ser informado do acerto ou erro durante o treinamento) (78,26%) e soprosidade e/ou rugosidade como parâmetros vocais mais avaliados (82,60%). Com relação ao tempo de treino, não houve um parâmetro firmado na literatura, sendo que alguns estudos (34,78%) sequer especificaram a duração do treinamento. Dentre os que mencionaram essa informação, a maioria (86,6%) realizou treinamento com duração máxima de duas horas.

Outro aspecto observado foi a lacuna na literatura quanto ao treino de habilidades auditivas centrais no treinamento para APA da qualidade vocal. Nenhum dos estudos analisados incluiu o treino de habilidades de processamento auditivo central como estratégia de aprendizado (Quadro 1).

Quadro 1
Matriz de análise dos estudos que abordaram o treinamento para análise perceptivo-auditiva da voz

ARTIGO	MÉTODO DE TREINAMENTO	VOZES UTILIZADAS	TEMPO DE TREINAMENTO	TREINO DE HABILIDADES AUDITIVAS CENTRAIS
(1)	Âncoras e feedback	56 vozes naturais Parâmetros: rugosidade, soprosidade, astenia, tensão e instabilidade	58,33 minutos (média)	Não realizado
(2)	Âncoras e feedback	12 vozes sintetizadas e 12 vozes naturais Parâmetros: pitch, timbre, loudness, rugosidade, soprosidade, astenia, tremor e instabilidade	Não informado	Não realizado
(3)	Feedback	Dez vozes naturais desviadas. Parâmetro: grau geral	Não informado	Não realizado
(8)	Âncoras e feedback	20 vozes duplicadas, naturais e sintetizadas, normais e desviadas Parâmetros: rugosidade e soprosidade	30 minutos	Não realizado
(9)	Âncoras e feedback	57 vozes sintetizadas Parâmetros: Soprosidade	Quatro horas	Não realizado
(10)	Âncoras e feedback	30 vozes naturais: 15 amostras de vozes âncoras e 15 como estímulos de treinamento Parâmetros: grau geral, rugosidade e soprosidade	Duas horas	Não realizado
(11)	Âncoras auditivas, pistas auditivas e textuais	36 vozes naturais Parâmetros: grau de desvio, rugosidade e soprosidade	15-20 minutos	Não realizado
(12)	Palestra, âncoras e feedback.	23 vozes naturais, em 82 apresentações Parâmetro: ressonância	Duas horas	Não realizado
(13)	Âncoras e feedback	6 vozes sintetizadas em 36 apresentações Parâmetro: soprosidade	15 minutos	Não realizado
(14)	Âncoras visuais (espectrograma)	107 vozes naturais desviadas Parâmetros: grau geral, rugosidade, soprosidade, astenia e tensão	Quatro sessões de 20 minutos	Não realizado
(15)	Aulas, âncoras, propriocepção, discussão em grupo, feedback	14 vozes naturais desviadas + duas repetições Parâmetros: grau de desvio, diplofonia, pitch, tensão, instabilidade, soprosidade	50 minutos	Não realizado
(16)	Âncoras e feedback	84 vozes naturais, normais e desviadas. Parâmetro: Grau geral	Não informado	Não realizado
(17)	Âncoras textuais e auditivas e feedback	30 vozes naturais Parâmetros: Grau geral, rugosidade e soprosidade	Não informado	Não realizado
(18)	Âncoras e feedback	40 vozes naturais Parâmetros: grau geral, rugosidade, soprosidade, tensão, astenia, pitch e loudness	Não informado	Não realizado
(19)	Âncoras e feedback	Vozes naturais (número não especificado) Parâmetros: rugosidade e soprosidade	Duas horas divididas em quatro sessões de 20 minutos	Não realizado
(20)	APA com e sem repetições de estímulos âncoras	220 vozes naturais Parâmetros: rugosidade, soprosidade e tensão	2 sessões: 1ª: 1h, 10 minutos 2ª: 42 minutos	Não realizado
(21)	Feedback; Informações sobre o caso (entrevista, exame de imagem e história clínica)	20 vozes naturais, em ordem gradativa de desvio Parâmetros: grau de desvio, pitch, loudness, soprosidade, rugosidade, frequência, tensão, instabilidade	Não informado	Não realizado
(22)	Feedback	20 vozes naturais: duas normais e 18 desviadas Parâmetros: rugosidade e soprosidade	50 minutos	Não realizado
(23)	Feedback	32 vozes naturais + vozes extras escolhidas pelos alunos (número não determinado) Parâmetros: Grau geral, rugosidade, soprosidade, astenia e tensão	Nove encontros de 15 minutos cada	Não realizado
(24)	Feedback perceptivo-auditivo e/ou visual (espectograma)	24 vozes naturais Parâmetros: grau geral, rugosidade e soprosidade	Duas horas divididas em quatro sessões de 20 minutos	Não realizado
(25)	Feedback	20 vozes naturais Parâmetros: grau de desvio, rugosidade, soprosidade, astenia e tensão	Cinco horas	Não realizado
(26)	Revisão com amostras de vozes com diferentes qualidades	25 vozes naturais Parâmetros: grau de desvio, rugosidade, soprosidade, tensão, pitch e loudness	10-15 minutos	Não realizado
(27)	APA por consenso	Vozes naturais (número de vozes, no treinamento, não descrito) Parâmetro: ressonância	Não informado	Não realizado

• Fonte: Elaborado pelos autores, 2022
• Legenda: APA = análise perceptivo-auditiva

DISCUSSÃO

O presente estudo buscou sintetizar o estado do conhecimento científico sobre treinamento para análise perceptivo-auditiva da voz. Com base na literatura consultada, foi possível identificar os métodos de treinamento mais usuais, as vozes mais utilizadas para o treinamento (sintetizadas, naturais ou ambas), bem como os parâmetros de qualidade vocal mais estudados dentro do treinamento para APA, o tempo de treinamento e se o treino de habilidades auditivas centrais tem sido considerado.

Diversos autores têm investido no treinamento de avaliadores para a análise perceptivo-auditiva, empregando o uso de vozes âncoras(¹,²,⁸-²⁰), que são modelos de vozes que se enquadram no parâmetro estudado, e servem de referência para a avaliação de outras vozes. Esse uso tem se mostrado útil em elevar a confiabilidade da APA, ao reduzir sua variabilidade e subjetividade(¹). Apesar de ser comum que profissionais precisem de muitos anos de experiência para atingir padrões confiáveis na APA, hoje se sabe que o uso de âncoras ajuda a estabilizar os padrões internos até de ouvintes inexperientes, fazendo-os alcançar um nível considerável de precisão na APA em um breve intervalo de tempo, desde que sejam devidamente treinados(⁸,¹¹,¹⁹).

Alguns estudos fazem uso de vozes sintetizadas(²,⁸,⁹,¹³). As vozes sintetizadas são combinações de diferentes parâmetros biomecânicos para geração de sinais com diferentes graus, tipos e combinações de desvios vocais. Devido à multidimensionalidade das características da voz humana, é difícil obter objetividade na avaliação, fator que impede uma justa padronização. Quanto às vozes sintetizadas, é possível se ter o conhecimento exato de suas propriedades acústicas e até mesmo manipular os parâmetros acústicos, conforme desejo ou necessidade(²). A utilização de vozes sintetizadas favorece a confiabilidade da avaliação perceptivo-auditiva, sendo, dessa forma, um grande auxílio nas pesquisas científicas e no treinamento perceptivo-auditivo de jovens clínicos(²).

O emprego de feedback no treinamento é uma ferramenta muito comum(¹,²,⁵,⁸-¹⁰,¹²,¹³,¹⁵-¹⁹,²¹-²⁵), pois é considerada útil para desenvolver a formação de padrões internos que norteiam a análise perceptivo-auditiva da voz. Essa estratégia consiste em o avaliador ouvir um estímulo e receber a resposta imediata sobre o seu erro ou acerto. A tarefa favorece o desenvolvimento de protótipos calibrados entre os avaliadores, contribuindo para a maior confiabilidade na APA(¹²,¹³,¹⁹).

Com relação aos parâmetros da qualidade vocal, a soprosidade e a rugosidade são os que apresentam maior índice de concordância entre os avaliadores, além de serem os de maior predominância na prática clínica(¹⁶). O treinamento de tais parâmetros, portanto, favorece o desenvolvimento de protótipos mentais representativos, que contribuem para a melhor avaliação perceptivo-auditiva(⁸).

A concordância entre os avaliadores tende a ser maior quanto ao grau geral de desvio, porém, menor com relação aos parâmetros da qualidade vocal (soprosidade, rugosidade e ressonância, por exemplo)(³). Isso mostra a necessidade de treinamento auditivo que propicie a prática dos parâmetros vocais isolados(²⁷). Esse treinamento deve ser quesito obrigatório para fonoaudiólogos em formação(⁵). Sugere-se que o treinamento auditivo para APA seja realizado de forma progressiva, apresentando tarefas mais fáceis, seguidas de desafios maiores, gradativamente. Por exemplo, as vozes mais desviadas devem ser praticadas antes das vozes com menor grau de desvio(³).

Com relação ao tempo de treinamento, sabe-se que sessões curtas são mais eficazes para o aprendizado do que sessões de longo período, especialmente para avaliadores inexperientes(³). Isso se deve, especialmente, ao uso de âncoras, pois seu efeito estabiliza os padrões internos, fazendo com que os avaliadores alcancem um nível considerável de precisão na APA(⁹,¹¹). São suficientes apenas duas horas de treinamento para se observar diferença significativa na precisão da APA por ouvintes inexperientes(¹⁰).

O cérebro só é capaz de manter a atenção e processar, conscientemente, o estímulo que for mais relevante no momento e isso só é possível quando não se excede o tempo de atenção sustentada, pois a ativação dos circuitos neurais tende a desviar o foco atencional para outros estímulos, sejam eles internos ou ambientais(²⁸). O treinamento dividido em várias sessões favorece o aprendizado por evitar a ocorrência de fadiga e desatenção, também contribuindo para o aprendizado pela repetição da exposição à emissão. Por isso, alguns estudos realizaram o treinamento com tempo contínuo de, no máximo, 20 minutos, com intervalos de maior tempo ou dividindo o treinamento em mais sessões(¹,¹⁵,²³,²⁶).

Em suma, há diversas semelhanças entre os treinamentos oferecidos nos estudos analisados. No entanto, não há um programa de treinamento específico que seja seguido sistematicamente, de modo que se faz necessário pesquisar diferentes abordagens de treinamento com o fim de se estabelecer um padrão de referência que guie a metodologia de ensino para APA nas disciplinas de voz dos cursos de Fonoaudiologia e que, além disso, sirva de aperfeiçoamento para profissionais que se dedicam à prática clínica e/ou pesquisa científica.

Há escassez na literatura quanto à aplicação do treino de habilidades de processamento auditivo central (PAC) no treinamento para julgamento perceptivo-auditivo da voz, porém, a APA da qualidade vocal envolve habilidades de reconhecimento e discriminação de padrões temporais e de frequência(⁴). Sendo assim, a compreensão da relação entre PAC e APA da voz pode contribuir para o desenvolvimento de programas de treinamento auditivo para APA mais eficazes.

O APA exige a capacidade de identificar e discriminar o grau e o tipo de desvio da qualidade vocal, além de analisar aspectos como pitch, loudness e ressonância. Os desvios na qualidade vocal envolvem modificações do sinal acústico, que tocam os domínios da frequência e/ou tempo, de forma que o avaliador necessita ser hábil na percepção auditiva para conseguir processar, decompor, integrar e interpretar uma informação acústica(³).

Visto que a análise vocal é realizada pela via auditiva, a avaliação do processamento auditivo é importante, tanto para os pacientes de voz - pois precisam monitorá-la -, quanto para os fonoaudiólogos que realizam a avaliação perceptivo-auditiva da voz. Quanto aos pacientes disfônicos, há evidências de que alterações vocais podem ter relação com dificuldades no processamento auditivo, principalmente nas habilidades de ordenação e resolução temporal. Dessa forma, os resultados na avaliação do processamento auditivo são proporcionais ao desempenho na percepção auditiva da voz(²⁹). Sendo assim, há indícios de que tanto a avaliação do processamento auditivo central, como o treino de habilidades auditivas centrais poderiam fazer parte dos programas de treinamento para a APA. No entanto, ainda faltam estudos que incluam o PAC no treinamento, com o fim de evidenciar a sua efetividade.

CONCLUSÃO

Há diversas semelhanças entre os treinamentos oferecidos nos estudos analisados, porém, não existe consenso sobre um programa específico de treinamento para APA que seja considerado como padrão de referência. As estratégias mais usuais incluem o uso de âncoras auditivas, feedback, vozes naturais com diferentes graus de desvios, sendo os parâmetros soprosidade e/ou rugosidade os mais usuais e breve tempo de treinamento. Há escassez na literatura quanto à aplicação do treino de habilidades de processamento auditivo central no treinamento para APA da voz.

• Trabalho realizado no Programa de Pós-Graduação em Modelos de Decisão e Saúde, Universidade Federal da Paraíba - UFPB - João Pessoa (PB), Brasil.
• Financiamento: Nada a declarar.

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  17 Jul 2023
• Data do Fascículo
  2023

Histórico

• Recebido
  29 Dez 2022
• Aceito
  12 Maio 2023