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Desempenho do modelo HAND no mapeamento de áreas suscetíveis à inundação usando dados de alta resolução espacial

Performance of the HAND model in mapping the areas susceptible to flooding using high-resolution spatial data

RESUMO

O mapeamento das áreas suscetíveis à inundação constitui uma etapa importante na minimização dos danos gerados por enchentes, sobretudo em áreas urbanas. Este mapeamento é usado no estabelecimento de diretrizes de uso e ocupação do solo e na formulação dos planos de defesa civil. No município de Blumenau e Brusque, mapeamentos das áreas atingidas por inundação foram realizados, a partir de levantamentos efetuados após a ocorrência de enchentes. A partir da topografia representada em modelos digitais de terrenos (MDT) o modelo HAND vinha sendo aplicado preliminarmente para a previsão de áreas potenciais de inundação. Recentemente introduziu-se um novo conceito nas curvas de nível acima da drenagem mais próxima (HAND contours), demonstrando para o rio Itajaí Açú em Blumenau a capacidade especifica deste modelo para utilização em mapeamentos de áreas de risco hidrológico. Este trabalho teve por objetivo avaliar mais amplamente o desempenho do método HAND contour no mapeamento de áreas suscetíveis à inundação, tendo por base os levantamentos topográficos e mapas de inundações disponíveis para os municípios de Blumenau e Brusque. Nesta avaliação, foram usadas as variáveis acerto, omissão e comissão e, os parâmetros F estatístico, acurácia geral, Fit (%), taxa de alarme falso (TAF) e a taxa de tendência (BIAS). Os resultados mostraram que para enchentes de pequena magnitude, o modelo HAND superestima significativamente a área suscetível à inundação. À medida que a cota de inundação aumenta, o desempenho do modelo HAND melhora. Para a maior enchente simulada de Blumenau e de Brusque, a omissão (área faltante) foi de 7,5 e 4,7%, respectivamente. A comissão (área excedente) foi de 35,3 e 42,2%, respectivamente. A comparação com outros estudos mostra que o desempenho do modelo HAND é similar aqueles obtidos por outros autores com modelos hidrodinâmicos, cujo requerimento de dados de entrada é elevado.

Palavras Chave:
Vulnerabilidade ambiental; Mapeamento de áreas de risco

ABSTRACT

Mapping areas susceptible to flooding is an important step to minimize the damage caused by floods, especially in urban areas. This mapping is used to establish guidelines for use and occupation of the soil and in the formulation of civil defense plans. In the municipalities of Blumenau and Brusque, flood stricken areas were mapped, from surveys carried out after the events. From the topography represented in digital terrain models (DTM), the HAND model had been preliminarily applied to predict potential flood areas. Recently a new concept was introduced in contours above the nearest drainage (HAND contours), demonstrating the specific ability of this method for use in hydrological risk area assessment. This study aimed to evaluate more widely the performance of the HAND contour method in mapping areas susceptible to flooding, based on topographic surveys available for the municipalities of Blumenau and Brusque. The evaluation used the variables accuracy, omission and commission, and the parameters F statistic, overall accuracy, Fit (%), false alarm rate (FAR) and the trend rate (BIAS). The results showed that for floods of small magnitude, the HAND model overestimates the area susceptible to flooding. As the flood level increases, the HAND model performance improves. For the largest simulated flood of Brusque and Blumenau, the omission (missing area) was of 7.5 and 4.7%, respectively. The commission (surplus area) was 35.3 and 42.2%, respectively. Comparison with other studies shows that the performance of the HAND model is similar to those obtained by other authors with hydrodynamic models, which have a high demand for data input.

Keywords:
Environmental vulnerability; Mapping of risk areas

INTRODUÇÃO

Inundações em áreas urbanas provocadas por enchentes causam danos sociais, econômicos e ambientais. As inundações ocorrem quando a capacidade de escoamento fluvial no canal principal é superada, induzindo o fluxo ao canal secundário (PINHEIRO, 2007Pinheiro, A. Enchentes e inundações. In: SANTOS, R. F. (Org.). Vulnerabilidade Ambiental. Brasília: Ministério do Meio Ambiente, 2007, p. 97-108.). O canal secundário tem sido considerado como área suscetível à inundação. As áreas suscetíveis à inundação podem ser adjacentes aos cursos de água ou afastadas, ligadas através de outros sistemas de drenagem natural e/ou artificial.

Medidas estruturais e não estruturais têm sido adotadas para minimização dos danos gerados por inundação. As primeiras envolvem ações que atuam no escoamento da onda de cheia enquanto as segundas abrangem ações preventivas e de convivência com este tipo de evento hidrológico extremo. O mapeamento das áreas suscetíveis à inundação constitui elemento fundamental para definição de medidas não estruturais, como planejamento do uso e ocupação do solo e, os planos de defesa civil (FRANK; PINHEIRO, 2003Frank, B.; Pinheiro, A. (Org.). Enchentes na bacia do Itajaí: 20 anos de experiências. 1. ed. Blumenau: Editora da FURB, 2003. 237 p.). Este mapeamento pode ser desenvolvido empregando-se diferentes metodologias e instrumentos de apoio. Uma metodologia frequentemente empregada consiste no levantamento da localização das superfícies atingidas pela inundação para a cota máxima da enchente. Nas últimas três décadas levantamentos deste tipo foram realizados no município de Blumenau, com mapeamento das superfícies de inundação em cartografia planialtimétrica na escala de 1:2000 (PINHEIRO et al., 1987Pinheiro, A.; Frank, B.; Cordero, A.; Lungershausen, J. Traçado das zonas de inundação de Blumenau. In: VII SIMPÓSIO BRASILEIRO DE HIDROLOGIA E DE RECURSOS HÍDRICOS; III SIMPÓSIO LUSO-BRASILEIRO DE HIDRÁULICA E DE RECURSOS HÍDRICOS, Salvador, de 8 a 13 de novembro de 1987.; CORDERO; BUTZKE, 2005; CORDERO et al., 2013Cordero, A.; Salvador, D.; Refosco, J.; Tachini, M. Cotas-Enchente do município de Blumenau. In: XX SIMPÓSIO BRASILEIRO DE RECURSOS HÍDRICOS, Bento Gonçalves, 2013. Anais... Bento Gonçalves, 2013.) e recentemente, o mesmo trabalho foi desenvolvido no município de Brusque, após a enchente de 2011. O traçado da superfície de inundação precisa considerar um plano inclinado representando a declividade da linha de água, sendo referenciada para uma seção fluviométrica, onde são estabelecidas as cotas de inundação, com diferentes frequências de excedências.

Uma abordagem nova, desenvolvida por pesquisadores do INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) e do INPA (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia) é o modelo de terreno denominado HAND - Height Above Nearest Drainage (NOBRE et al., 2011Nobre, A. D.; Cuartas, L. A.; Hodnett, M.; Rennó, C. D.; Rodrigues, G.; Silveira, A.; Waterloo, M.; Saleska, S. Height above the Nearest Drainage, a hydrologically relevant new terrain model. Journal Hydrology. v. 404, n. 1-2, p.13–29, 2011. doi:10.1016/j.jhydrol.2011.03.051
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). Esse modelo tem sido usado no mapeamento da condição hidrológica estacionária do terreno e também no mapeamento de áreas suscetíveis à inundação. Trata-se de uma normalização topográfica da paisagem que usa como entrada o Modelo Digital do Terreno (MDT) e fornece como saída um novo MDT normalizado, que pode ser classificado de acordo com distâncias verticais relativas aos cursos d’água mais próximos. NOBRE et al. (2011)Nobre, A. D.; Cuartas, L. A.; Hodnett, M.; Rennó, C. D.; Rodrigues, G.; Silveira, A.; Waterloo, M.; Saleska, S. Height above the Nearest Drainage, a hydrologically relevant new terrain model. Journal Hydrology. v. 404, n. 1-2, p.13–29, 2011. doi:10.1016/j.jhydrol.2011.03.051
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definiram como referência de base a altura da rede de drenagem mais próxima para classificar as áreas de acordo com a saturação de agua no solo pela indicação da altura local relativa de determinado local, ao invés da altura em relação nível do mar.

Cuartas et al. (2012)Cuartas, L. A.; Tomasella, J.; Nobre, A. D.; Nobre, C. A.; Hodnett, M. G.; WATERLOO, OLIVEIRA S. M de; RANDOW, R. de C.; TRANCOSO, R.; FERREIRA, M. Distributed hydrological modeling of a micro-scale rainforest watershed in Amazonia: Model evaluation and advances in calibration using the new HAND terrain model. Journal of Hydrology, v. 462-463, p.15–27, 2012. doi:10.1016/j.jhydrol.2011.12.047.
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testaram o modelo HAND, acoplado ao modelo DHSVM - Distributed Hydrology Soil Vegetation Model’s (WIGMOSTA et al., 1994Wigmosta, M. S.; Vail, L.; Lettenmaier, D. P. A distributed hydrology-vegetation model for complex terrain. Water Resources Research, v.30, p.1665-1679, 1994.) para simular respostas hidrológicas e representar a distribuição espacial dos fenômenos hidrológicos na Amazônia Central. Nobre et al. (2010)Nobre, C. A.; Young, A. F.; Orsini, J. A. M.; Saldiva, P. H. N.; Nobre, A. N.; Ogura, A. T.; Thomaz, O.; Valverde, M.; Párraga, G. O. O.; Silva, G. C. M.; Silveira, A. C.; Rodrigues, G. de O. Vulnerabilidades das megas cidades brasileiras às mudanças climáticas: região metropolitana de São Paulo. In: MOTTA, R. S.; HARGRAVE, J.; LUEDEMANN, G.; GUTIERREZ, M. B. S. (Eds.). Mudança do clima no Brasil: aspectos econômicos, sociais e regulatórios.Brasília: Ipea, 2010. Cap. 13. definiram locais onde o crescimento urbano do município de São Paulo poderia se expandir, projetando cenários futuros de risco hidrológico. No Brasil, o modelo HAND tem sido aplicado para áreas com MDT, obtidos na missão SRTM - Shuttle Radar Topography Mission (FARR et al., 2007Farr, T. G.; Rosen, P. A.; Caro, E.; Crippen, R.; Duren, R.; HENSLEY, KOBRICK, M.; PALLER, M.; RODRIGUES, E.; ROTH, L.; SEAL, D.; SHIMADA, S. J.; UMLAND, J.; WERNER, M.; OSKIN, M.; BURBANK, D.; ALSDORF, D. The shuttle radar topography mission. 2007, Revista Geophys. 45, RG2004.1–33. doi:10.1029/2005RG000183.1.
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). Este MDT apresenta resolução espacial de 90 m.

Com base no modelo HAND, Nobre et al. (2015)Nobre, A. D.; Cuartas, L. A.; Momo, M. R.; Pinheiro, A.; Severo, D. L,; Nobre, C. A. HAND contour: calibration-independent new predictor of inundation extent. Hydrological Processes. 2015. doi: 10.1002/hyp.10581.
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desenvolveram um novo conceito de curva de nível normalizada de acordo com a distância vertical para a drenagem mais próxima, abordagem que chamaram de HAND contour, a qual testaram na mesma região deste estudo. O método HAND contour permite traçar a superfície potencial de inundação apenas com a topografia digital, sem a necessidade de calibração com parâmetros fluviograficos representativos do sistema.

Assim, o resultado da simulação do modelo HAND é estreitamente relacionado com a qualidade (resolução espacial) do dado topográfico. Neste contexto, em 2012, foi realizado levantamento aerofotogramétrico do estado de Santa Catarina, com resolução espacial de 0,39 m. Este levantamento pode ser empregado no mapeamento das áreas suscetíveis a inundação dos municípios catarinenses. No entanto, constata-se a ausência de avaliação do modelo HAND para MDT com alta resolução espacial.

Assim, este trabalho visa avaliar o desempenho do modelo HAND no mapeamento de áreas suscetíveis à inundação, utilizando MDT de alta resolução espacial. O rendimento do modelo HAND foi avaliado com base nos mapas de inundação dos municípios de Blumenau e Brusque, obtidos com medições realizadas após a ocorrência dos eventos de cheias. As enchentes apresentaram diferentes cotas máximas de inundação.

METODOLOGIA

Áreas de estudo

As áreas de estudo foram os municípios de Blumenau e Brusque (Figura 1), localizados o estado de Santa Catarina, que possuem registro de ocorrência de inundação desde o inicio de suas colonizações, na década de 1850. Eles estão inseridos na bacia do rio Itajaí-Açú. Em Blumenau existe uma estação fluviométrica da rede hidrológica nacional, pertencente à Agência Nacional de Águas, registrada sob código 83800002, localizada na latitude -26°55’7’ e longitude -49°3’56”, com área de drenagem de 11803 km2. Ao longo da história do município de Blumenau, foram registradas 73 enchentes que provocaram inundações (CEOPS, 2015CENTRO DE OPERAÇÕES DO SISTEMA DE ALERTA – CEOPS. Picos de enchentes. Disponível em http://ceops.furb.br/index.php/sistema-de-alerta/picos-de-enchentes. Acesso em: 02/09/2015.
http://ceops.furb.br/index.php/sistema-d...
). Residências são atingidas pela inundação quando a cota medida na estação fluviométrica de referência é igual ou superior a 8,00 m. Em 1880, a cota máxima registrada foi de 17,10 metros. Em relação ao município de Brusque, a estação fluviométrica da Agência Nacional de Águas, está registrada sob o código 83900000, localizada na latitude -27°06’02” e longitude -48°55’00”, apresentando área de drenagem de 1700 km2. A história de ocorrência de inundações neste município é similar àquela registrada no município de Blumenau.

Figura 1
- Localização das áreas de estudo

Após a enchente em agosto de 1984, foi realizado levantamento das marcas da inundação e traçada a superfície inundável do município de Blumenau. Foram traçadas as superfícies para as cotas de inundação de 10,0, 12,0, 15,46 (cota máxima da enchente de agosto de 1984) e 17,10 m (PINHEIRO et al., 1987Pinheiro, A.; Frank, B.; Cordero, A.; Lungershausen, J. Traçado das zonas de inundação de Blumenau. In: VII SIMPÓSIO BRASILEIRO DE HIDROLOGIA E DE RECURSOS HÍDRICOS; III SIMPÓSIO LUSO-BRASILEIRO DE HIDRÁULICA E DE RECURSOS HÍDRICOS, Salvador, de 8 a 13 de novembro de 1987.). Elas foram realizadas em mapas planialtimétricos em escala de 1:2000, com curvas de nível de 1,0 em 1,0 m. Também foram levantadas as linhas de água das enchentes para as diferentes cotas máximas registradas. As linhas de agua representam a evolução espacial, ao longo do rio, das cotas topográficas atingidas pela onda de cheia. Após a enchente de 05/1992 (cota máxima de 12,80 m), uma atualização do mapeamento das áreas inundáveis foi realizada (CORDERO; BUTZKE, 1995Cordero, A.; Butzke, I. C. Cota-enchente para a cidade de Blumenau. Revista Técnico Científica Dynamis, Blumenau, v.1, n.12, p.5-9, 1995.). Em 2012, foi efetuado um novo levantamento da superfície de inundação produzida pela enchente ocorrida em 09/2011, cuja cota máxima de inundação foi de 13,00 m (CORDERO et al., 2012). As superfícies de inundação medidas nestes levantamentos foram utilizadas neste trabalho para avaliar o desempenho do modelo HAND. No município de Brusque foi levantada apenas a superfície inundada pela enchente ocorrida em setembro de 2011, que alcançou a cota máxima de 10,03 m (REFOSCO; NICOLETTI, 2014Refosco, J. C.; Nicoletti, A. L. Carta enchente para Brusque. FURB. Relatório Interno. 2014.).

Modelo HAND

Modelo HAND é denominação equivalente a de modelo digital de terreno, pois é uma versão de um MDT normalizado pela rede de drenagem. Consiste em modelo com componentes estáticas, representando a realidade geométrica da superfície. Fisicamente, ele descreve uma superfície virtual de potenciais gravitacionais relativos. A partir do modelo HAND, curvas de nível são geradas e estas indicam potencial relativo normalizado para inundação.

O modelo HAND, escrito em C++, contém procedimentos estabelecidos para o processamento do MDT (estrutura raster), extraindo dele automaticamente a rede de drenagem. A partir da rede de drenagem e do MDT, é então gerada a topologia HAND (NOBRE et al., 2011Nobre, A. D.; Cuartas, L. A.; Hodnett, M.; Rennó, C. D.; Rodrigues, G.; Silveira, A.; Waterloo, M.; Saleska, S. Height above the Nearest Drainage, a hydrologically relevant new terrain model. Journal Hydrology. v. 404, n. 1-2, p.13–29, 2011. doi:10.1016/j.jhydrol.2011.03.051
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).

Para classificar as áreas suscetíveis à inundação e indicar a altura de uma determinada localização geográfica, em vez do nível do mar, o algoritmo HAND define como referência a altura relativa da rede de drenagem mais próxima (NOBRE et al., 2011Nobre, A. D.; Cuartas, L. A.; Hodnett, M.; Rennó, C. D.; Rodrigues, G.; Silveira, A.; Waterloo, M.; Saleska, S. Height above the Nearest Drainage, a hydrologically relevant new terrain model. Journal Hydrology. v. 404, n. 1-2, p.13–29, 2011. doi:10.1016/j.jhydrol.2011.03.051
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). O modelo HAND tem como entrada o MDT (Modelo Digital do Terreno). O processo é desenvolvido em três etapas, as duas primeiras utilizando método bem estabelecido (ex. O’CALLAGHAN; MARK, 1984O’Callaghan, J. F.; Mark, D. M. The extraction of drainage networks from digital elevation data. Computer Vision, Graphics and Image Processing, v. 28, n. 3, p. 323−344, 1984.; JENSON; DOMINGUE, 1988Jenson, S. K.; Domingue, J. O. Extracting topographic structure from digital elevation data for geographic information system analysis. Photogrammetric Engineering and Remote Sensing, v.54, n. 11, p.1593−1600, 1988.), e a terceira etapa com o novo método desenvolvido para o HAND (NOBRE et al. 2011Nobre, A. D.; Cuartas, L. A.; Hodnett, M.; Rennó, C. D.; Rodrigues, G.; Silveira, A.; Waterloo, M.; Saleska, S. Height above the Nearest Drainage, a hydrologically relevant new terrain model. Journal Hydrology. v. 404, n. 1-2, p.13–29, 2011. doi:10.1016/j.jhydrol.2011.03.051
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).

  • -

    Etapa 1: direção do fluxo de drenagem e correção do MDT. Define-se para cada ponto de grade, a direção do fluxo da água. A conexão hidrológica entre os pontos de grade leva em conta a direção do escoamento superficial, que é determinada pelo método Deterministic Eight-Neighbors. Este método utiliza a regra da maior declividade para atribuir a direção do fluxo. O resultado desta etapa é uma grade de pontos chamada DFD (Direção do Fluxo de Drenagem, em inglês LDD -Local Drain Direction). Desta forma, a direção do escoamento superficial e a conexão entre os pontos hidrológicos na formação da rede de drenagem na grade, tem por principio a força gravitacional, a qual determina que a agua sempre segue para o ponto mais baixo. Entretanto, se uma célula processada tem altitude menor ou igual ao menor dos seus oito vizinhos ela é identificada como sumidouro no MDT. Sumidouros são áreas que podem ser naturais (como no relevo cárstico) ou mais comumente são ruídos dos dados ou artefatos criados durante o processamento topográfico na geração do MDT. Os últimos ocorrem quando há incoerência do valor altimétrico no dado topográfico, em alguns pontos da grade, causando interrupção da rede de drenagem. Para regularizar estas imperfeições do MDT utiliza-se rotina de regularização da drenagem, que pode ser Fill (preencher), Breach (cavar) ou outro método, que corrige as imperfeições do dado topográfico, tais como presença de sumidouros.

A iniciação do canal é estabelecida por um limiar de área acumulada. O segundo conjunto de procedimentos utiliza a rede de trajetórias de escoamento superficial, gerando um mapa de drenagem-mais-próxima (cada célula nos canais de drenagem está espacialmente associada com todas as células do MDT que nela drenam). Este mapa de associação da drenagem mais próxima vai orientar espacialmente o operador na produção da topologia normalizada HAND.

  • -

    Etapa 2: obtenção da rede de drenagem. A partir do MDT hidrologicamente coerente e da rede de trajetórias superficiais de escoamento (DFD), são calculados, para cada célula da grade, os valores acumulados de fluxo recebidos, no qual células com valores altos indicam uma maior concentração de fluxo acumulado. Com o método da área de contribuição é definido um limiar mínimo para identificar as células da grade nos quais se iniciam os cursos d’água (headwater). Assim, a rede de drenagem é definida pelo ponto da grade que tem uma área de contribuição maior que o limiar mínimo definido. Quanto maior o limiar, menos pontos na grade serão encontrados. Desta forma, menor será a densidade de drenagem. Neste caso, são detalhados apenas os cursos de água principais (maior ordem). Limiares menores incluirão as drenagens menores, aumentando o detalhamento da rede de drenagem da área considerada. A área de contribuição é calculada através da contagem do número de células, cujas trajetórias de fluxo convergem para a célula considerada.

  • -

    Etapa 3: geração da topologia HAND: nesta etapa o modelo classifica todos os pontos da grade de entrada com base nas distâncias verticais relativas, ao longo das trajetórias superficiais de fluxo, para o curso d’água mais próximo. Como resultado desta etapa é produzido um MDT normalizado, onde a cada ponto de grade é ajustado um novo valor altimétrico referenciado topograficamente com a rede de drenagem.

Neste trabalho foi utilizado o MDT obtido do levantamento aerofotogramétrico realizado pela Secretaria de Desenvolvimento Econômico e Sustentável de Santa Catarina (SDS-SC) em 2013. Para o levantamento acoplaram-se aos aviões computadores, aparelhos GPS de alta precisão, sistema inercial e acelerômetros, tornando possível o conhecimento preciso da posição e altitude da aeronave na hora da tomada das aerofotos. Foi utilizado o Sistema Aerotransportado de Aquisição e Pós-processamento de Imagens Digitais (SAAPI), com pixels de 1,0 m e resolução vertical de 0,39 m do solo.

Desempenho do modelo HAND

Para avaliar o desempenho do modelo HAND na previsão da extensão de áreas inundadas, foram escolhidas variáveis que determinam o acerto, a omissão e a comissão. Foram calculados os seguintes parâmetros: F estatístico, acurácia geral, Fit (%), taxa de alarme falso (TAF) e a taxa de tendência (BIAS). Estes parâmetros são explicados a seguir.

São consideradas áreas de acerto as áreas coincidentes no mapa observado e no mapa simulado. Ou seja, são as áreas em que o modelo prevê corretamente as áreas de inundação. Quanto maior é o percentual da variável acerto, melhor o desempenho do modelo. Considerando que o representa a área observada e s a área simulada, o acerto é obtido por (o∩s).

As áreas de omissão são aquelas observadas como inundáveis, mas que na simulação do modelo, o resultado não classifica como sendo área inundável. A omissão é obtida por (o - o∩s).

As áreas de comissão são aquelas que não são observadas como áreas de inundação, mas que na simulação do modelo, são classificadas como sendo áreas inundáveis. A comissão é obtida por (s-o∩s).

São as seguintes as definições para os parâmetros calculados:

  • -

    F estatístico: Os mapas observados e simulados são comparados usando as três áreas: observada, simulada e acerto. A média entre elas é o F estatístico (COOK; MERWADE, 2009Cook, A.; Merwade, V. Effect of topographic data, geometric configuration and modeling approach on flood inundation mapping. Journal of Hydrology, v.377, n.1, p.131-142, 2009. doi:10.1016/j.jhydrol.2009.08.015.
    https://doi.org/10.1016/j.jhydrol.2009.0...
    ), expresso por:

(1)

Este parâmetro é zero quando não há sobreposição e 100 quando as áreas observada e simulada coincidem perfeitamente (YU; LANE, 2006Yu, D.; Lane, S. N. Urban fluvial flood modelling using a two-dimensional diffusion-wave treatment, part 1: mesh resolution effects. s, Hydrological Processes. v. 20, n.7, p.1541–1565, 2006. doi:10.1002/hyp.5935.
https://doi.org/10.1002/hyp.5935...
; BATES, 2000Bates, P.; De Roo, A. P. A simple raster-based model for flood inundation simulation. Journal of Hydrology, v. 236, n.1-2, p.54–77, 2000. doi:10.1016/S0022-1694(00)00278-X.
https://doi.org/10.1016/S0022-1694(00)00...
; HORRITT et al., 2002Horritt, M. S.; Bates, P. D. Evaluation of 1D and 2D numerical models for predicting river flood inundation. Journal of Hydrology, v.268, n.1, p.87-99, 2002. doi:10.1016/S0022-1694(02)00121-X.
https://doi.org/10.1016/S0022-1694(02)00...
).

  • -

    Acurácia Geral: este parâmetro representa a relação entre a área de acerto simulada e a área total observada. Este parâmetro tem valor zero quando não há sobreposição e 100 quando as áreas coincidem perfeitamente (YU; LANE, 2006Yu, D.; Lane, S. N. Urban fluvial flood modelling using a two-dimensional diffusion-wave treatment, part 1: mesh resolution effects. s, Hydrological Processes. v. 20, n.7, p.1541–1565, 2006. doi:10.1002/hyp.5935.
    https://doi.org/10.1002/hyp.5935...
    ). A acurácia geral é expressa por:

(2)
  • -

    Fit(%), ou método de ajuste, é a razão entre o número de pixels coincidentes nas áreas de inundação observadas e simuladas e a soma das duas áreas (simuladas e observadas). Este parâmetro é expresso por (BATES, 2000Bates, P.; De Roo, A. P. A simple raster-based model for flood inundation simulation. Journal of Hydrology, v. 236, n.1-2, p.54–77, 2000. doi:10.1016/S0022-1694(00)00278-X.
    https://doi.org/10.1016/S0022-1694(00)00...
    ):

(3)

Esta medida assume valor zero quando não há sobreposição e 50 quando as áreas coincidem perfeitamente.

  • -

    Taxa de alarme falso (TAF): avalia o rendimento do modelo em relação aos erros de comissão, ou seja, o percentual de área simulada pelo modelo, como sendo inundada, mas que na realidade, não é área de inundação (STEPHENSON, 2000Stephenson, D. B. Use of the “odds ratio” for diagnosing forecast skill. Weather and Forecasting, v.15, n.2, p.221-232, 2000. http://dx.doi.org/10.1175/1520-0434(2000)015<0221:UOTORF>2.0.CO;2.
    http://dx.doi.org/10.1175/1520-0434(2000...
    ). Neste parâmetro quanto mais próximo de zero for o valor obtido, melhor será o rendimento do modelo. A equação de TAF é dada por:

(4)
  • -

    Taxa de tendência (BIAS): este parâmetro avalia apenas o erro. Apresenta qual é a tendência de erro por omissão ou por comissão na simulação do modelo (STEPHENSON, 2000Stephenson, D. B. Use of the “odds ratio” for diagnosing forecast skill. Weather and Forecasting, v.15, n.2, p.221-232, 2000. http://dx.doi.org/10.1175/1520-0434(2000)015<0221:UOTORF>2.0.CO;2.
    http://dx.doi.org/10.1175/1520-0434(2000...
    ). O parâmetro é obtido pela relação entre a área simulada e a área observada. Quanto mais próximo de 1 for o valor deste parâmetro, melhor será o rendimento do modelo. Se o valor obtido for maior que 1 indica uma tendência de erro por comissão e, se o valor for menor que 1, indicará tendência de erros por omissão de áreas.

Ressalta-se que índices altos no parâmetro de acurácia geral, não necessariamente significam um rendimento aceitável do modelo. Se o modelo sempre simular uma área de inundação bastante grande, sempre serão obtidos valores altos no parâmetro de acurácia. Neste parâmetro não é considerado os erro por comissão. Os parâmetros de TAF e BIAS permitem fazer esta constatação. O parâmetro de TAF considera os erros do modelo em comissão, enquanto que o parâmetro BIAS mostra uma tendência dos erros (omissão ou comissão), tanto em termos de sub ou de superestimação. No entanto, a comparação dos valores das áreas simulada e observada não representa a sobreposição das mesmas. Ou seja, é possível que haja áreas inundáveis subestimadas em determinadas regiões e superestimadas em outras e, ainda assim, o parâmetro esteja próximo de 1.

Da mesma forma, bons resultados alcançados com o índice de TAF, não necessariamente indicam um bom desempenho global do modelo, pois o TAF não considera os erros do modelo por omissão de área.

Os valores dos parâmetros F e FIT refletem a capacidade do HAND em simular a área efetivamente inundada, mas não incluem a área não inundável que foi simulada corretamente. Isto constitui uma das limitações do cálculo destes parâmetros que em ambos utiliza-se apenas a área de inundação simulada corretamente.

Processo operacional

Na fase de pré-processamento do modelo, o mosaico da superfície de inundação foi obtido a partir das imagens do MDT. Em seguida, foram criados os arquivos shapefile e realizá-los três recortes da área total. Uma vez realizados os recortes, os mesmos foram exportados para arquivo do tipo TIFF. Os recortes foram necessários apenas para reduzir o tempo de processamento A partir das ferramentas de sistema de informações geográficas foram executadas as operações de correção do MDT e gerações do DFD. Uma vez realizada estas operações, os recortes foram importados para o HAND, onde foram executadas as funções para obtenção da área acumulada e a rede de drenagem a partir da atribuição do limiar. Neste trabalho utilizou-se limiar de 4,05 km2 de modo a reduzir contribuição das drenagens de pequena ordem. Definida a rede de drenagem, foi processado o algoritmo HAND e as classificações HAND de 1 à 20 m. Na sequência estes arquivos (recortes) foram exportados para o SIG onde foi realizada a remontagem da área total de inundação simulada e feitos os cruzamentos das saídas do HAND com as cartas-enchente de Blumenau nas cotas de inundação de 10,0; 12,0; 13,0; 15,46 e 17,0 m e, para Brusque, com a cota de inundação de 10,03 m. Como resultado deste processamento, obteve-se o valor quantitativo da área de acerto, do erro por omissão e do erro de comissão de áreas para cada simulação HAND. Obtidos os valores destas variáveis foram calculados os parâmetros de acurácia geral, FIT, F estatístico, TAF e BIAS.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Na Figura 2 são apresentados os resultados dos cruzamentos entre as manchas de inundação observadas e as manchas de inundação simuladas pelo modelo HAND, para as diversas cotas de inundação no município de Blumenau (Figuras 1A, 1B, 1C, 1D e 1E) e no município de Brusque (Figura 1F). Os resultados estão representados pelas áreas coincidentes entre a mancha observada e simulada, assim como, pelas áreas de omissão e comissão.

Figura 2
- Áreas de inundação de Blumenau para as cotas de 10 m (A), 12 m (B), 13,0 m (C), 15,46 m (D) 17 m (F). A área de inundação de Brusque na cota 10,03 m (F). Vermelho representa as áreas de acerto; azul representa as áreas de comissão; verde representa as áreas de omissão simuladas pelo modelo

Em relação à área observada, percebe-se que para as superfícies com cotas de inundação menores (10 e 12 m), o modelo simula uma área com contornos mais largos, representando uma elevada área de comissão (área em azul). Entretanto, na medida em que a cota de inundação vai aumentando, a área de acerto do modelo (área em vermelho) vai crescendo e a área de omissão vai diminuindo. Além disso, em todas as cotas de inundação, as áreas de omissão (área em verde) mantêm-se sempre pequenas, praticamente imperceptíveis.

A partir da mancha na cota de inundação 13 m, percebe-se uma diminuição importante das áreas de comissão. Na medida em que a superfície de inundação aumenta, melhora o rendimento do modelo.

A análise da capacidade do modelo de simulação de áreas inundadas não é tarefa fácil, pois elas devem ser realizadas sob os diversos aspectos de rendimento. Neste trabalho foram selecionados os parâmetros estatísticos mais utilizados na literatura para compor a análise dos índices de acerto, índices de erros por omissão e os índices de erros por comissão de áreas inundáveis. Neste caso, os índices expressam as áreas em termos de valores percentuais, obtidos com relação as áreas observadas.

Foram definidos critérios para a seleção do melhor resultado entre as simulações HAND para cada mancha na cota de inundação. O primeiro critério de corte definido foi: índice de omissão menor que 15%. Desta forma, as simulações que apresentaram índice de omissão maior que 15% foram descartados. Este critério foi definido porque no contexto de um sistema de prevenção, o erro por omissão é o mais grave, podendo causar maior impacto na gestão de uso e ocupação do solo. O segundo critério de corte, foi de índice de comissão. Neste caso, analisou-se o contexto de maneira que mesmo estimando corretamente todas as áreas suscetíveis a inundação, ainda assim, pode não ser eficiente, caso o modelo apresente exorbitantes áreas com suscetibilidade, gerando assim, altos índices de erros por comissão. O terceiro e último critério, foi o de percentual de acerto entre as áreas observada e simulada. Os valores obtidos para os parâmetros calculados na análise de rendimento do modelo são apresentados na Tabela 1. Nota-se que com o aumento da cota de inundação observada, foram obtidos melhores índices de acerto, representado pela omissão. Ao mesmo tempo, diminuiu o erro por comissão. Os parâmetros F estatístico e Fit também apresentaram melhores resultados para as maiores cotas de inundação.

Tabela 1
- Índices e parâmetros estatísticos obtidos na aplicação do modelo HAND para estimar manchas de inundação nos municípios de Blumenau e Brusque

Da mesma forma, o índice TAF premia a área de acerto, penalizando os erros por comissão de áreas. Assim, obtém-se os melhores resultados deste parâmetro nas cotas inundações mais elevadas (13,0; 15,46 e 17,0 m).

Para o parâmetro de acurácia geral, analisa-se uma média simples da divisão entre a área de acerto do modelo pela área total observada de inundação. Neste caso, quanto maior for à área de inundação simulada pelo modelo, maior serão as chances de melhorar o rendimento do parâmetro de acurácia modelo. O cálculo de acurácia considera apenas os erros por omissão de áreas. Isso explica os valores altos de acurácia geral, obtidos nas simulações de todas as cotas de inundação.

Os erros de comissão foram maiores que os erros de omissão. Esta constatação pôde ser verificada nos resultados do parâmetro BIAS, que apresenta a tendência do erro.

Os resultados obtidos neste trabalho podem ser comparados com estudos realizados em outros locais. Cook e Merwade (2009)Cook, A.; Merwade, V. Effect of topographic data, geometric configuration and modeling approach on flood inundation mapping. Journal of Hydrology, v.377, n.1, p.131-142, 2009. doi:10.1016/j.jhydrol.2009.08.015.
https://doi.org/10.1016/j.jhydrol.2009.0...
utilizaram dois modelos de simulação: o modelo HEC-HAS 1D e modelo FESWMS 2D, para gerar mapas de extensão de inundação para duas bacias nos Estados Unidos, em Stroud’s Creek na Carolina do Norte e Brazos River no Texas,. Utilizaram como dados de entrada MDTs com resoluções de 11 e 30 m e dados LIDAR (Light Detection and Ranging). Os mapas simulados pelos modelos foram comparados como os mapas base disponibilizados pelo FEMA (Federal Emergency Management Agency). Na análise comparativa eles utilizaram três variáveis com índices quantitativos: área de inundação, largura média de inundação e F estatístico. A média dos F estatístico, para as diferentes condições topográficas (escalas e fonte dos dados) e geométricas (espaçamento longitudinal e perfil transversal). Os valores de F estatístico foram diferentes para estas características assim como para os rios simulados e para os modelos utilizados. O F estatístico variou entre 55,5 e 100,0% para as condições topográficas e entre 82,5 e 100,0% para as condições geométricas consideradas.

Horritt et al. (2002)Horritt, M. S.; Bates, P. D. Evaluation of 1D and 2D numerical models for predicting river flood inundation. Journal of Hydrology, v.268, n.1, p.87-99, 2002. doi:10.1016/S0022-1694(02)00121-X.
https://doi.org/10.1016/S0022-1694(02)00...
apresentam os resultados dos testes com os modelos de inundação HEC-RAS 1D, LISFLOOD-FP 1D e TELEMAC 2D, abrangendo uma área de 60 km no rio Severn, no Reino Unido. Os mapas de extensão de inundação obtidos pelos três modelos foram comparados com os dois eventos de cheias registradas com imagem de satélite. O coeficiente Fit foi utilizado na análise de eficiência dos modelos. Os rendimentos dos modelos ficaram muito próximos. Em um evento de cheia, os coeficientes Fit foram da ordem de 65% e no outro na ordem de 40%.

Tayefi et al. (2007)Tayefi, V.; Lane, S. N.; Hardy, R. J.; Yu, D. A comparison of one-and two-dimensional approaches to modelling flood inundation over complex upland floodplains. Hydrological Processes, v.21, n.23, p.3190-3202, 2007. doi: 10.1002/hyp.6523.
https://doi.org/10.1002/hyp.6523...
utilizaram os coeficientes de acurácia geral e F estatístico para avaliar o modelo HEC-RAS combinando 1D e 2D com três configurações distintas, no rio Wharfe no Reino Unido. Os mapas obtidos pelas simulações com o HEC-RAS foram comparados com as observações em campo, logo após a ocorrência da inundação dos pontos em que a água ultrapassou o canal principal. Os melhores resultados alcançados foram de 75% pelo coeficiente de acurácia geral e 62% pelo coeficiente de F estatístico.

Os resultados obtidos com o modelo HAND devem ser analisados em duas perspectivas. Primeiro, a inundação na cidade de Blumenau é gerada pela enchente produzida na bacia do rio Itajaí-Açú. As áreas ribeirinhas adjacentes são diretamente inundadas pelo escoamento fluvial no rio principal. No entanto, nas bacias de drenagem dos afluentes, a inundação é provocada pelo escoamento de refluxo, quando o nível de água do rio principal é mais elevado do que no escoamento no canal de drenagem. Deste modo, a velocidade de enchimento nas áreas suscetíveis a inundação dos afluentes depende da diferença de nível entre o rio principal e o ponto considerado. Isto significa que a hidrodinâmica do escoamento de refluxo controla a abrangência da área efetivamente inundada. Para enchentes de curta duração, parte da área suscetível a inundação pode não ser atingida se a velocidade de enchimento for reduzida. Em geral, esta situação é observada para enchente de pequena magnitude, como aquelas com cota de inundação de 10,0 e 12,0 m. Para as enchentes com cota de inundação mais elevadas, o tempo de passagem da onda de cheia é maior, possibilitando o completo enchimento das áreas suscetíveis à inundação.

Segundo, a inclinação da linha de água da onda de cheia é variável em função da magnitude do evento. Pinheiro et al. (1987)Pinheiro, A.; Frank, B.; Cordero, A.; Lungershausen, J. Traçado das zonas de inundação de Blumenau. In: VII SIMPÓSIO BRASILEIRO DE HIDROLOGIA E DE RECURSOS HÍDRICOS; III SIMPÓSIO LUSO-BRASILEIRO DE HIDRÁULICA E DE RECURSOS HÍDRICOS, Salvador, de 8 a 13 de novembro de 1987. apresentaram as linhas de água levantadas ao longo do rio Itajaí-Açú para diferentes enchentes registradas no município de Blumenau. Cordero et al. (2012) apresentaram as linhas de águas levantadas para as enchentes recentes. As alterações das linhas de água das ondas de cheias podem ser provocadas por modificações na hidrodinâmica fluvial, tais como obras efetuadas no canal, alteração da rugosidade das margens (crescimento da vegetação, remoção de cobertura vegetal, aterramentos, proteção das margens com gabiões, entre outras ações), assoreamento e extração de areia no fundo do canal, aprofundamento do calado em regiões navegáveis, erosão e escorregamentos das margens, entre outras intervenções humanas e processos naturais ou induzidos por atividades antrópicas. Essas alterações se desenvolvem ao longo do tempo e dos cursos de água (rios principais e afluentes) e fazem parte da dinâmica de ocupação da paisagem, sobretudo em áreas urbanas, com ocupação desordenada.

O modelo HAND descreve a elevação relativa das cotas do terreno. Em princípio ele representa a cota de inundação em uma condição hidrostática, onde a variação da linha de água da cheia é produzida pela alteração altimétrica da superfície do terreno. Neste sentido, as condições hidrodinâmicas descritas acima não são consideradas no traçado das superfícies inundáveis. Similar aos modelos hidrodinâmicos unidimensionais, que consideram a superfície da água distribuída de forma uniforme na seção transversal, o modelo HAND considera a superfície da agua distribuída de forma uniforme lateralmente, mas em contraste com os anteriores, considera apenas as seções ajustadas para as trajetórias de fluxo superficial. O plano da linha de inundação se distribui ao longo da rede de drenagem em função da elevação da altimetria do terreno.

Assim, o desempenho do modelo HAND pode ser influenciado pelas intensidades das variações hidrodinâmicas que ocorrem no curso de água principal e de seus afluentes. A aplicação do modelo HAND na cidade de Blumenau mostra que o desempenho foi menor para as cotas de inundação mais baixas, onde as variações hidrodinâmicas são mais expressivas, melhorando para as cotas de inundação mais elevadas. Isto permite considerar que em regiões com reduzidas variações hidrodinâmicas, como em trechos inferiores de cursos de águas, o desempenho do modelo HAND poderá ser mais elevado.

Por outro lado, nota-se pelos resultados obtidos por outros pesquisadores, que o empego de modelos hidráulicos uni ou bidimensionais também apresentam desempenho da mesma ordem de grandeza daqueles alcançados com a aplicação do modelo HAND em Blumenau. Os modelos hidrodinâmicos unidimensionais representam a evolução da linha de água ao longo do canal principal e, a evolução transversal é obtida considerando a ocorrência de um plano de inundação horizontal. Transversalmente, a superfície apresenta inclinação que pode representar a ação das forças de atrito e de pressão. No caso de um modelo bidimensional, estas forças poderiam ser consideradas. No entanto, a quantidade de dados de entrada destes modelos (para parametrização e calibração) é elevada, dificultando a medição ou a estimação de seus valores efetivos. Assim, simplificações precisam ser adotadas, de modo que a precisão na estimativa da superfície de inundação pode ser reduzida. Estas dificuldades provocam incertezas que refletem no desempenho dos modelos hidrodinâmicos na representação das linhas de água de inundação em área com elevada heterogeneidade espacial e temporal.

Neste contexto, o esforço para o uso de modelos hidrodinâmicos que descrevem as equações completas de Saint Vennant ou equações simplificadas é grande, tanto em termos computacionais quanto em termos de dados de entrada. Em contrapartida a aplicação do modelo HAND requer levantamento planialtimétrico, que pode ser obtido por técnicas modernas de sensoriamento remoto, não requerendo muito esforço computacional e de dados de entrada. Em ambos os casos, o traçado das superfícies de inundação apresenta desempenhos equivalentes, indicando que o modelo HAND constitui em ferramenta adequada para traçado de áreas suscetíveis a inundação.

CONCLUSÕES

Foi possível avaliar o desempenho do modelo HAND no mapeamento das áreas suscetíveis à inundação nos municípios de Blumenau e de Brusque. As superfícies simuladas, para as diferentes cotas de inundação, foram comparadas com os levantamentos realizados após a ocorrência das últimas grandes enchentes na bacia do rio Itajaí. Os parâmetros estatísticos empregados demonstraram que os resultados obtidos foram similares àqueles simulados por outros autores que utilizaram modelos hidrodinâmicos. A acurácia geral foi superior a 85%, mas as comissões (excesso de área simulada) foram elevadas para aquelas cotas de inundações mais baixas, representativas de pequenas enchentes, reduzindo para as enchentes com maiores cotas de inundação.

O rendimento do modelo HAND pode ser considerado adequado no traçado das áreas suscetíveis à inundação, para modelos digitais de terreno de alta resolução espacial. Assim, considera-se que ele constitui uma ferramenta que pode ser empregada no traçado das áreas suscetíveis a inundação no estado de Santa Catarina, onde os municípios têm levantamentos planialtimétricos obtidos com imagens aerofotogramétricas de alta resolução.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem ao CNPq (processos 404158/2013-7 GEOCLIMA e 303472/2014-6) pelo fomento a pesquisa e pela concessão de bolsa de produtividade de pesquisa.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Mar 2016

Histórico

  • Recebido
    17 Jul 2015
  • Revisado
    19 Set 2015
  • Aceito
    23 Set 2015
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