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O direito fundamental à água e sua intrincada satisfação no Direito colombiano* * O título do artigo publicado originalmente em espanhol na Revista Letras Jurídicas, Vol. 17 (1), 2012, p. 23-48, Medellín – Colombia, era “El derecho fundamental al agua y su intrincada satisfacción”. Nesta tradução, com a concordância do autor, optou-se por acrescentar a referência expressa ao direito colombiano, a fim de explicitar o foco da análise realizada. O mesmo autor, sem embargo, possui outro artigo sobre o direito fundamental à água em perspectiva internacional e comparada, publicado na mesma revista (Letras Jurídicas, Vol. 18, N. 2, 2013, p. 19-57) e que também será traduzido ao português para publicação no Brasil. O autor agradece a María José Viana, por seu valioso aporte na preparação dos materiais jurisprudenciais utilizados nesta investigação, e a ela e a Hubed Bedoya pelos agudos comentários formulados ao rascunho deste texto. Tradução de Graça Maria Borges de Freitas, Juíza do Trabalho em Minas Gerais-Brasil, Mestre em Direito Constitucional pela UFMG, Master em Argumentação Jurídica pela Universidad de Alicante-España, Doutoranda em Direito pela Universidad Externado de Colombia, em cotutela com a UFMG. E-mail: gmariabfreitas@ gmail.com; graca.borges@est.uexternado.edu.co

The constitutional right to water and its puzzling satisfaction in colombian law

Resumo

O objetivo deste artigo é determinar se a jurisprudência da Corte Constitucional colombiana acerca do caráter fundamental do direito à água e do dever de satisfazê-lo atribuído aos prestadores desse serviço é plausível. A estratégia para alcançar esse objetivo é uma análise da Sentença T-740 de 2011. Esta Sentença desafia a tendência presente no Direito Comparado que diminui a proteção dos direitos sociais, em razão do esforço dos juízes em levar a cabo uma harmonização entre os direitos sociais protegidos pela Constituição e os princípios reitores da globalização neoliberal. A jurisprudência constitucional colombiana não somente afirma o caráter fundamental do direito à água, como também atribui aos prestadores desse serviço, e não ao Estado, o dever de satisfazê-lo. Essa atribuição implica o fortalecimento dos direitos sociais frente às liberdades econômicas dos agentes do mercado que prestam o serviço de água.

Palavras-chave:
direito à água; direitos sociais; proporcionalidade; liberdades econômicas; direito fundamental

Abstract

The aim of this paper is to determine whether the case law of the Colombian Constitutional Court about the constitutional nature of the right to water and on the duty to satisfy it that it allocates to service providers is sound. The strategy for achieving this objective is an analysis of the Judgment T-740 of 2011. This judgment defies a trend in comparative law diminishing the protection of social rights, as a consequence of the attempt by the judges to harmonize the social rights protected by the Constitution and the guiding principles of neo-liberal globalization. The Colombian constitutional jurisprudence not only affirms the constitutional nature of the right to water, but it also allocates to public and private providers, and not the State, the duty to satisfy it. This allocation implies strengthening social rights against the economic freedoms of water companies.

Keywords:
right to water; socio-economic rights; proportionality; economic freedoms; constitucional right

1. INTRODUÇÃO

Em um artigo publicado recentemente em uma das revistas jurídicas mais influentes do mundo anglo-saxão, a Modern Law Review, editada pela reputada London School of Economics, Paul O’Connell preconiza a morte dos direitos sociais.1 1 O’CONNELL, Paul. The Death of Socio-Economic Right. Modern Law Review, vol. 74, núm. 4, 2011, p. 532-554. Este autor sustenta que, durante a última década, as cortes constitucionais e supremas dos países nos quais estes direitos mais se haviam desenvolvido (entre os quais se encontram Canadá, Índia, África do Sul e alguns países da América Latina) proferiram sentenças que conduzem a um declive na proteção dos direitos sociais. A juízo de O’Connell, este giro jurisprudencial deve ser entendido como o resultado de um esforço dos juízes para levar a cabo uma harmonização de fato, quer dizer, sem necessidade de reformas constitucionais, entre os direitos sociais protegidos pela Constituição e os princípios reitores da globalização neoliberal. Neste sentido, as altas Cortes haviam começado a interpretar os direitos fundamentais sociais de uma forma que não resulta oposta às garantias próprias do livre mercado. Se for observado com atenção, sem embargo, esta tendência, na realidade, leva consigo a claudicação a respeito do ideal de satisfazer estes direitos com plenitude. Os direitos sociais ficam para trás, em última análise, frente à garantia das liberdades econômicas dos atores do mercado.

A jurisprudência constitucional colombiana sobre o direito à água, e, em particular, a recente Sentença T-740 de 20112 2 Corte Constitucional. Sentença T-740 de 2011. Magistrado Relator Humberto Antonio Sierra Porto. , parece apartar-se da tendência assinalada por O’Connell. Nessa sentença, a Corte Constitucional não só afirma o caráter fundamental do direito à água - que, com toda nitidez, é, ademais, um direito social -, senão, ainda, em certa medida, atribui aos prestadores dos serviços públicos, e não ao Estado, o dever de satisfazê-lo. Esta atribuição implica tudo ao contrário do que a tese de O’Connell supõe: não a morte, senão o fortalecimento dos direitos sociais, e não a prevalência, senão a inferioridade das liberdades econômicas dos agentes do mercado que prestam o serviço público de água, frente a tais direitos.

O objetivo deste artigo é determinar se a posição da Corte Constitucional acerca do caráter fundamental do direito à água e, em particular, se a atribuição, em certa medida, do dever de satisfazê-lo aos prestadores de serviços públicos é plausível. A estratégia para lograr este objetivo é uma análise da citada Sentença T-740 de 2011. A primeira parte oferece uma reconstrução detalhada dessa providência judicial. A segunda parte contém uma avaliação da plausibilidade da doutrina sobre o direito fundamental à água e sua satisfação que a Corte Constitucional ali desenvolve.

2. UMA RECONSTRUÇÃO DA SENTENÇA T-740 DE 2011

2.1. A Lide

Mediante a Sentença T-740 de 2011, a Corte Constitucional colombiana resolveu uma ação de tutela3 3 NT. Ação de Tutela é uma ação específica do direito colombiano, própria para garantir a efetividade de um direito fundamental. , por meio da qual uma peticionária solicitava a proteção de seu direito ao acesso aos serviços públicos, em concreto, de seu direito ao acesso à água. A peticionária partia da premissa de que o direito à água é um direito fundamental, conexo ao direito à vida. Segundo aduzia, este direito lhe havia sido vulnerado por parte do Concelho de Administração da empresa prestadora do serviço de água. A suposta vulneração teria sido causada pela suspensão, por falta de pagamento, do serviço de água. A peticionária afirmava que suas precárias condições familiares e econômicas, derivadas de sua impossibilidade de trabalhar em razão de sua idade e de diversos problemas de saúde, lhe impediam de pagar para receber esse serviço público. De seus argumentos se segue que, nessas circunstâncias, a falta de pagamento não era uma razão que justificasse a decisão de suspender o serviço, adotada pelo Concelho de Administração da empresa que abastecia sua casa de água. Dita suspensão implicava a vulneração do direito fundamental ao acesso à água, um direito revestido de um nível superior ao contrato de prestação de serviços públicos e a qualquer normativa que autorizasse ao prestador suspender o serviço por falta de pagamento das contas.

A parte contrária no processo de tutela, quer dizer, a entidade prestadora do serviço público de água, sustentou que os argumentos da acionante desconheciam o estabelecido pelo contrato de serviços públicos que a peticionária havia subscrito com tal entidade. Tal contrato estabelecia a obrigação de pagamento da conta e previa a suspensão do serviço em caso de mora. Além disso, a entidade demandada assinalou que, em razão das condições econômicas e familiares da peticionária, a havia convidado a subscrever acordos alternativos de pagamento e, inclusive, lhe havia outorgado um subsídio de 70%. A entidade prestadora do serviço público estava disposta a assumir a carga financeira correspondente a esse subsídio. Afirmou que, apesar de tais benefícios, a peticionária não havia cumprido com suas obrigações contratuais e que esse descumprimento justificava a suspensão do serviço.

3. O CARÁTER FUNDAMENTAL DO DIREITO À ÁGUA

3.1. O Caráter Fundamental do Direito a Água e seu Efeito de Irradiação

De uma maneira muito plausível, a Corte Constitucional enfocou o começo de suas reflexões em direção ao problema de se o direito à água é um direito fundamental. É bem sabido que os direitos fundamentais estão revestidos de uma “força de irradiação” - como a denominou o Tribunal Constitucional Federal Alemão na sentença do conhecido caso Lüth4 4 A referência desta Sentença de 15 de janeiro de 1958 é: BVerfGE 7, 198, 205. Este conhecidíssimo caso versava sobre um pleito entre o diretor de cinema Veit Harlan e Lüth, o Presidente do escritório de imprensa de Hamburgo. Em diversas oportunidades, este havia atacado publicamente a Harlan, quem anteriormente havia dirigido “Judeu doce”, um filme de propaganda anti-semita, e que agora apresentava ao público “Amantes imortais”. Lüth também havia convidado o público e as empresas cinematográficas a boicotar o novo filme. Os tribunais de primeira e segunda instância consideraram que a conduta do jornalista vulnerava os bons costumes do § 826 do Código Civil. Pelo contrário, a Corte Constitucional Federal concedeu a tutela interposta por este último, ao considerar que sua conduta era um exercício legítimo da liberdade de expressão e que esta liberdade também se aplicava no âmbito do direito civil. A partir do caso Lüth começou a se consolidar a convicção de que nenhum âmbito jurídico escapa à força de irradiação que os direitos fundamentais projetam. - que se desdobra para todos os âmbitos do direito, incluídos os contratos. Em razão dessa força de irradiação, se uma obrigação contratual contradiz o conteúdo de um direito fundamental, perde toda validez; já não será devida pelo devedor, nem poderá ser exigida pelo credor. Como assinalara a Corte Constitucional, na Sentença T-632 de 2007,5 5 Cfr. Corte Constitucional, Sentença T-632 de 2007, Magistrado Relator Humberto Sierra Porto. em virtude de dita força de irradiação, “ao direito privado que até então determinava em solitário a configuração das relações jurídicas e a decisão dos conflitos jurídicos, se lhe sobrepõe outra ordem jurídica [a dos direitos fundamentais]; esta tem inclusive primazia sobre aquele”.

A isso se soma o fato de que no direito constitucional colombiano também se acolheu a conhecida doutrina do efeito horizontal ou efeito entre particulares dos direitos fundamentais, uma doutrina que também é de origem alemã (a chamada Drittwirkung der Grundrechte). Como bem explicara a Corte Constitucional na mesma Sentença T-632 de 2007, “é uma constante no constitucionalismo contemporâneo reconhecer a eficácia dos direitos fundamentais no tráfico jurídico privado”. Não cabe dúvida de que o Artigo 86 da Constituição Política acolheu expressamente esta constante, ao estabelecer que os particulares podem ser sujeitos passivos da ação de tutela. Como consequência dessa doutrina, se se prova que o direito à água é um direito fundamental e que uma entidade prestadora desse serviço público o vulnera, ainda quando o faça em exercício de um direito contratual, o juiz de tutela deve ordenar que cesse a vulneração e que prevaleça o direito fundamental frente a qualquer outra consideração jurídica.

3.2. A Justificação do Caráter Fundamental do Direito a Água

A pergunta relevante é, então, se o direito à água é um direito fundamental. Na Sentença T-740 de 2011, a Corte Constitucional desenvolveu quatro argumentos para justificar a tese de que o direito à água tem este caráter. Dos quatro argumentos, dois são de conexidade e dois são de autoridade. De acordo com os argumentos de conexidade, o direito à água é fundamental por sua conexão com o direito à vida e com a dignidade humana.6 6 A tese segundo a qual o direito à água tem um caráter fundamental por sua conexidade com outros direitos, havia sido proclamada previamente pela Corte Constitucional. A este respeito, é de particular importância a Sentença T-616 de 2010 (Magistrado Relator Luis Ernesto Vargas Silva). Em dita Sentença a Corte assinalou que o direito à água é um direito fundamental que pretende garantir “a posibilidade de obter a quantidade suficiente para o consumo, a higiene pessoal e doméstica e a preparação de alimentos. Toda vez que a carência de água para estes usos põe em grave perigo a realização da dignidade, a vida e a saúde dos acionantes, sua proteção é urgente e a via mais idônea para fazê-lo é a ação de tutela”. Outrossim, a Corte sustentou que a natureza fundamental do direito à água deriva da conexidade existente entre este direito e outros direitos de nível constitucional ou fundamental. O direito à água é um pressuposto essencial para o gozo de direitos como o da educação, dada sua inegável necessidade à hora de autorizar o funcionamento de um estabelecimento educativo; o direito ao ambiente saudável; dadas as propriedades sanitárias e de salubridade que a água traz consigo; e os direitos à proteção da diversidade étnica e cultural, se se tem em conta que algumas comunidades indígenas e afrocolombianas consideram a água como um elemento de especial significado cosmogônico. Como a Alta Corte sustentou em cada vez mais prolongada jurisprudência, a água, e, portanto, o acesso à mesma, é indispensável para a existência do ser humano7 7 Cfr. Corte Constitucional, Sentenças T-578 de 1992 (Magistrado Relator Alejandro Martínez Caballero), T- 140 de 1994 (Magistrado Relator Vladimiro Naranjo Mesa) e T- 207 de 1995 (Magistrado Relator Alejandro Martínez Caballero), e a própria T-740 de 2011 (Magistrado Relator Humberto Antonio Sierra Porto). e para que este tenha uma vida digna.8 8 Cfr. Corte Constitucional, Sentenças T-1104 de 2005 (Magistrado Relator Jaime Araújo Rentería), T-539 de 1993 (Magistrado Relator Carlos Gaviria Díaz), T-244 de 1994 (Magistrado Relator Hernando Herrera Vergara), T-523 de 1994 (Magistrado Relator Alejandro Martínez Caballero), T-092 de 1995 (Magistrado Relator Hernando Herrera Vergara), T-379 de 1995 (Magistrado Relator Antonio Barrera Carbonell), T-413 de 1995 (Magistrado Relator Alejandro Martínez Caballero), T-410 de 2003 (Magistrado Relator Jaime Córdoba Triviño), T-1104 de 2005 (Magistrado Relator Jaime Araújo Rentería), T-270 de 2007 (Magistrado Relator Jaime Araújo Rentería), T-022 de 2008 (Magistrado Relator Nilson Pinilla Pinilla), T-888 de 2008 (Magistrado Relator Marco Gerardo Monroy Cabra) e T- 381 de 2009 (Magistrado Relator Jorge Ignacio Pretelt Chaljub).

Por sua vez, os argumentos de autoridade sustentam que o direito à água é fundamental porque assim o reconhece o Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais da ONU e um consistente corpo normativo de direito internacional que, como estabelece a Constituição Política em seu Artigo 93, não só representa uma fonte de direitos fundamentais, senão também um conjunto de pautas para a interpretação de tais direitos. Dentro desse amplo corpo normativo, destacam, para os concretos propósitos deste estudo, o relatório da Organização Mundial da Saúde, que estabelece a quantidade mínima de água domiciliária que uma pessoa necessita para a satisfação das necessidades básicas, e as Sentenças da Corte Interamericana de Direitos Humanos, nos casos das comunidades indígenas Yakye Axa (de 2005) e Sawhoyamaxa (de 2006) contra Paraguai. Em ditas sentenças se ordenou o subministro imediato e periódico de água potável suficiente para os membros dessas comunidades.

Ademais, a Corte Constitucional assinalou que a proteção do direito à água, proteção que em muitos casos caminha de mãos dadas com a atribuição a esse direito de um caráter fundamental, é uma constante no direito constitucional comparado. Nesse sentido, à diferença de outros tribunais no mundo - assinaladamente, a Corte Suprema Federal dos Estados Unidos- a Corte Constitucional colombiana não oculta sua - quiçá louvável - abertura a envolver-se em processos transnacionais de desenvolvimento dos direitos fundamentais. Disposições e sentenças constitucionais da Bélgica, França, Itália, África do Sul, Costa Rica, Argentina, Bolívia, Equador e Peru teriam criado esse processo transnacional de reconhecimento do caráter fundamental do direito à água, ao que a Corte colombiana se soma. Capital para o caso concreto é a referência ao caso Mazibuko (Lindiwe Mazibuko contra Johannesburgo) de 2009, no qual a Corte Constitucional da África do Sul debateu acerca da existência do direito fundamental ao aesso a uma quantidade mínima de água por dia.9 9 CCT 39/09 Lindiwe Mazibuko e outros vs. Cidade de Johannesburgo e outros. Neste caso a Corte Constitucional da África do Sul se pronunciou sobre o conteúdo do direito à água consagrado na seção 27 da Constituição sul-africana, que estabelece o direito de todo cidadão a ter acesso a “água suficiente”. Em concreto, estudou a constitucionalidade da implementação de um projeto dirigido a melhorar o subministro de água e a reduzir as perdas de água mediante a instalação de medidores pré-pagos para a cobrança do serviço aos usuários. O propósito desses medidores era a cobrança do consumo de água que excedesse os 6 quilolitros por usuário, que é a quantidade básica que na África do Sul se subministra de maneira gratuita. A Corte Suprema de South Gauteng concedeu a petição da señora Mazibuko e de outros quatro residentes, consistente em proibir a instalação dos medidores, por considerar que era contrária o direito fundamental. A Corte decidiu que a Cidade devia prover 50 litros grátis de água para consumo básico diário aos demandantes e demais residentes de Phiri em Soweto. A decisão foi apelada perante a Corte Suprema de Apelações que sustentou que 42 litros de água por dia poderia ser considerado como a quantidade “suficiente de água” de acordo com a intenção do constituinte. Portanto, ordenou à Cidade reformular sua política de subministro de água, sobre a base de que a instalação de medidores pré-pagos para o subministro de água era uma medida contrária ao direito. A Corte de Apelações não teve em conta que a implementação deste novo sistema havia sido objeto de discussão e de posterior aprovação por parte das autoridades estatais correspondentes. A Corte Constitucional sustentou que da obrigação derivada da seção 27 da Constituição de subministro “suficiente de água” não se pode deduzir uma quantidade específica. Por esta razão, sustentou que não corresponde a nenhuma Corte determinar esta quantidade senão que é um assunto de política pública que deve ser deixado nas mãos do governo. O governo havia decidido que 25 litros de água diários por pessoa é um “subministro suficiente”, assim como a quantidade mensal de 6 quilolitros por família. Não considera a Corte que possa ser taxada dita política de irrazoável, quando mais de 100.000 lares em Johannesburgo ainda careciam do acesso ao serviço básico de água. A Corte concluiu que a instalação de medidores não é nem injusta nem discriminatória, pois esta política de subministro obedece a um plano progressivo de aumento da cobertura na prestação.

4. O CONTEÚDO DO DIREITO FUNDAMENTAL À ÁGUA

Mas, qual é o conteúdo do direito fundamental à água?

Como expliquei em outro lugar,10 10 BERNAL, Carlos. El principio de proporcionalidad y los derechos fundamentales. 3 ed. Madrid: Centro de Estudios Políticos y Constitucionales, 2007. os direitos fundamentais são relações jurídicas entre os indivíduos ou entre os indivíduos e o Estado. Em sua forma mais comum,11 11 ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. 2 ed. Madrid: Centro de Estudios Políticos y Constitucionales, 2008. p. 186 e ss. essas relações apresentam uma estrutura triádica, composta por um sujeito ativo, um sujeito passivo e um objeto. O objeto dos direitos fundamentais é sempre uma conduta de ação ou de omissão, prescrita por uma norma jurídica, que o sujeito passivo deve desenvolver a favor do sujeito ativo, e sobre cuja execução o sujeito ativo tem um poder jurídico, suscetível de ser exercido sobre o sujeito passivo. No caso dos direitos fundamentais sociais, em geral, o sujeito ativo é o indivíduo, o sujeito passivo é o Estado e o objeto é uma conduta positiva do Estado. 12 12 Cfr. Sobre esta estrutura dos direitos sociais: ALEXY, Robert. La institucionalización de los derechos humanos en el Estado Constitucional Democrático. Derechos y libertades, núm. 8, 2000. p. 12 - ss. Desse modo, o sujeito ativo tem um poder jurídico fundamental a que o Estado leve a cabo uma ação. Como o direito do indivíduo é correlativo ao dever do Estado, então, o conteúdo do direito pode ser definido, seja mediante a delimitação do direito específico do indivíduo, seja do dever específico do Estado.

No caso do direito fundamental à água, a Corte Constitucional invoca de novo o argumento de autoridade para assinalar que, de acordo com o estabelecido pelo Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais da ONU, o Estado tem o dever de “respeitar”, “proteger” e “cumprir” ou “fazer efetivo” o direito à água. Esta última função consiste em: “facilitar, proporcionar e promover”.13 13 Corte Constitucional. Sentença T-740 de 2011. Magistrado Relator Humberto Antonio Sierra Porto. O dever de respeitar o direito à água não implica, em sentido estrito, que o Estado leve a cabo ações positivas. Ao contrário, se concretiza no dever de abster-se de “interferir, prejudicar, ou impedir” o acesso ou o exercício do direito à água.14 14 Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais: Comentário Geral 12, Comentário Geral No. 14, entre outros. Em particular, esse dever se concretiza nos deveres específicos, a cargo do Estado, de abster-se de (i) levar a cabo práticas que “denegue[m] ou restrinja[m] o acesso à água potável em condições de igualdade”; “(ii) imiscuir-se arbitrariamente nos sistemas consuetudinários ou tradicionais de distribuição da água”; “(iii) reduzir ou contaminar ilicitamente a água como, por exemplo, com resíduos procedentes de instalações pertencentes ao Estado ou lixões municipais que contaminem fontes hídricas ou mediante o emprego e os ensaios de armas de qualquer tipo”, e “(iv) limitar o acesso aos serviços e infraestruturas de subministro de água ou destruí-los como medida punitiva”.15 15 Corte Constitucional. Sentença T-740 de 2011. Magistrado Relator Humberto Antonio Sierra Porto.

Os deveres do Estado que implicam ações positivas são os de proteger e cumprir ou fazer efetivo o direito à água. O dever de proteger implica “adotar as medidas que sejam necessárias e que, de acordo a (sic) as circunstâncias, resultem razoáveis para assegurar o exercício […do direito à água] e impedir a interferência de terceiros”.16 16 Corte Constitucional. Sentença T-740 de 2011. Magistrado Relator Humberto Antonio Sierra Porto. A Corte Constitucional interpreta este dever como um dever normativo, quer dizer, como o “dever do Estado de regular o comportamento de terceiros, sejam indivíduos, grupos, empresas e outras entidades, com o objetivo de impedir que estes interfiram ou comprometam de qualquer modo o desfrute do direito”. Como é óbvio, esse dever normativo só pode ser cumprido mediante a expedição de medidas legislativas e administrativas que: (i) “impeçam que terceiros deneguem o acesso à água potável em condições de igualdade e contaminem ou explorem de forma não equitativa os recursos de água”; (ii) “impeçam que terceiros prejudiquem o acesso físico em condições de igualdade e a um custo razoável a recursos de água suficientes, salubres e aceitáveis, quando estes controlem os serviços de subministro de água”; e (iii) façam funcionar de forma eficaz o sistema judicial “com o fim de resguardar o gozo do direito à água potável frente a afetações provenientes de terceiros”.17 17 Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais: Comentário Geral 15.

Finalmente, o dever de cumprir ou fazer efetivo o direito à água implica a adoção de políticas e medidas tendentes à satisfação desse direito. Em concreto, esse dever implica os deveres específicos de facilitar, promover e proporcionar. Facilitar supõe “iniciar atividades com o fim de fortalecer o acesso ao direito [à água] ou seu desfrute”.18 18 Corte Constitucional. Sentença T-740 de 2011. M.P. Humberto Antonio Sierra Porto. Promover consiste em levar a cabo “ações tendentes a difundir, educar, ou capacitar a população” no que concerne ao exercício do direito à água. Por último, proporcionar quer dizer assegurar que o titular do direito à água tenha acesso a esse bem, em especial, quando, em princípio, por circunstâncias alheias a seu controle, não pode desfrutar do mesmo.

Esses deveres do Estado são correspondentes a certos direitos específicos do indivíduo. No Comentário Geral número 15, o Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais estabelece que o indivíduo tem direito a dispor e ter acesso, cada dia, a determinada quantidade de água que cumpra com certas especificações mínimas de qualidade. O direito à água, então, se concretiza em poderes jurídicos específicos atinentes à disponibilidade, acessibilidade e qualidade da água. A disponibilidade denota a quantidade mínima de água para os usos pessoais e domésticos (bebida, cozimento de alimentos, limpeza e saneamento) que uma pessoa necessita.19 19 Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, Comentário Geral No. 15. De acordo com a Organização Mundial da Saúde, a quantidade necessária para esse fim é de “50 litros por pessoa ao dia”.20 20 Organização Mundial da Saúde (OMS). Relatório sobre la cantidad de agua domiciliaria, el nivel del servicio y la salud y ONU/WWAP (Nações Unidas/Programa Mundial de Avaliação dos Recursos Hídricos), 2003. 1er Informe de las Naciones Unidas sobre el Desarrollo de los Recursos Hídricos en el Mundo: Agua para todos, agua para la vida. París, Nueva York e Oxford. UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) e Berghahn Books. A disponibilidade também tem que ver com que “a periodicidade do subministro de água seja suficiente para os usos pessoais e domésticos”.21 21 Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, Comentário Geral No. 15. Essa propriedade do direito à água leva consigo cinco deveres correlativos a cargo do Estado, um de abstenção (abster-se de interromper ou desconectar de maneira arbitrária ou injustificada os serviços ou instalações de água) e quatro de prestação: regular e controlar eficazmente os serviços de subministro de água; garantir que os estabelecimentos penitenciários e os serviços de saúde contem com água limpa e potável e com condições sanitárias adequadas; assegurar a prestação eficiente do serviço público de água a todos os habitantes do território do Estado; e garantir a sustentabilidade dos recursos hídricos.

Em relação à acessibilidade, a Corte Constitucional interpreta o ordenamento internacional no sentido de que o Estado tem três deveres, um de abstenção e dois de prestação. O Estado deve abster-se de privar uma pessoa do mínimo indispensável de água. Ao mesmo tempo, deve facilitar água e garantir o subministro necessário de água a quem não disponha de meios suficientes; e garantir que todos os beneficiários do direito a uma casa adequada tenham acesso permanente a água potável, a instalações sanitárias e de asseio, de eliminação de resíduos e de drenagem. Nesse sentido, “a água e as instalações e serviços de água devem ser acessíveis para todos, sem discriminação alguma, dentro da jurisdição do Estado.”22 22 Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, Comentário Geral No. 15. A acessibilidade tem quatro dimensões: acessibilidade física (a água e as instalações de água devem estar ao alcance físico de todos os setores da população); acessibilidade econômica (a água e os serviços e instalações devem estar ao alcance econômico de todos os indivíduos); a não discriminação (consiste em que a água e os serviços e instalações de água devem ser acessíveis a todos os indivíduos, inclusive aos setores mais vulneráveis e marginalizados da população sem discriminação alguma por qualquer dos motivos proibidos internacionalmente); e o acesso à informação (que compreende o direito de solicitar, receber e difundir informação sobre assuntos relacionados com a água).

Particularmente relevante para o objeto da Sentença T-740 de 2011 resulta a acessibilidade econômica. Com base nas observações do Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, a Corte Constitucional atribui ao Estado os deveres concretos de: abster-se de efetuar aumentos desproporcionados ou discriminatórios do preço da água; abster-se de toda prática ou atividade que denegue ou restrinja o acesso à água potável em condições de igualdade; impedir que terceiros prejudiquem o acesso físico, em condições de igualdade e a um custo razoável, a recursos de água suficientes, salubres e aceitáveis; estabelecer um sistema normativo para garantir o acesso físico à água em condições de igualdade e a um custo razoável, que preveja uma supervisão independente, uma autêntica participação pública e a imposição de multas por descumprimento; velar para que a água seja acessível para todos; adotar as medidas necessárias para que a água seja acessível (o que inclui a utilização de um conjunto de técnicas e tecnologias econômicas apropriadas, a expedição de políticas adequadas em matéria de preços, como o subministro de água a título gratuito ou a baixo custo, ou o uso de suplementos de ingressos); e garantir que todos os pagamentos por subministro de água se baseiem no princípio de equidade, a fim de assegurar que esses serviços, sejam públicos ou privados, estejam ao alcance de todos, incluídos os grupos socialmente desfavorecidos.

Finalmente, o atributo da qualidade implica que a água necessária para cada uso pessoal ou doméstico deve ser salubre. Isto quer dizer, que não pode conter micro-organismos ou substâncias químicas ou radiativas que possam constituir uma ameaça para a saúde das pessoas. Outrossim, a água deve ter uma cor, um odor e um sabor aceitáveis para cada uso pessoal ou doméstico. Este atributo também faz com que o direito fundamental à água seja correspondente a vários deveres concretos a cargo do Estado. Os mais importantes consistem em que o Estado: se abstenha de reduzir ou contaminar ilicitamente a água; adote medidas para impedir que terceiros contaminem ou explorem em forma indevida os recursos hídricos; proteja os sistemas de distribuição de água da ingerência indevida, o dano e a destruição; adote medidas para prevenir, tratar e controlar as enfermidades associadas à água; e vele pelo subministro adequado de água limpa potável e pela criação de condições sanitárias básicas como componente da higiene ambiental e industrial.

5. A DECISÃO DA CORTE CONSTITUCIONAL NO CASO CONCRETO

Mas, como deve ser concretizado em medidas específicas este conteúdo constitucional abstrato do direito fundamental à água e do correspondente dever de satisfazê-lo que se atribui ao Estado em casos específicos? E, em especial, como deve ser feita esta concreção no marco de um regime de serviços públicos como o colombiano, no qual não é o próprio Estado o que presta o serviço público de aqueduto senão que concedeu sua prestação a empresas de naturezas diversas, às que, em todo caso, se lhes reconhece um legítimo direito de lucrar pelo desenvolvimento de dita atividade econômica?

A efeitos de responder esta pergunta, resulta pertinente analisar a forma em que a Corte Constitucional resolveu o caso sub examine mediante a Sentencia T-740 de 2011 e a maneira em que fundamentou sua decisão.

Apesar de que o demandado em dito processo não era o Estado, senão o Concelho administrador de um aqueduto, a Corte Constitucional adotou as seguintes decisões: conceder a ação de tutela e ordenar ao dito Concelho restabelecer o fluxo de água potável na casa da acionante; e revisar os acordos de pagamento subscritos entre o Concelho e a acionante a fim de implementar uma fórmula mediante a qual esta, de acordo com sua capacidade econômica, pudesse ficar em dia com suas obrigações. Em todo caso, a Corte ordena que, se a acionante prova que não conta com os recursos econômicos para sufragar a dívida, o Concelho deve prover-lhe pelo menos 50 litros de água ao dia, por pessoa que habite em sua casa. Isto pode fazê-lo por dois meios alternativos: seja mediante a utilização do aqueduto em uso e a instalação no mesmo de um redutor de fluxo que garanta pelo menos dita quantidade de água, ou por meio da provisão à acionante de uma fonte pública do recurso hídrico que lhe assegure o subministro da quantidade mínima de água.

Junto ao anterior, a Corte Constitucional concedeu uma ordem a uma autoridade estatal. Ordenou ao município no qual habitava a acionante “assignar da partida de água e saneamento básico transferida a este pelo Governo Nacional, os valores necessários para garantir a cobertura de 50% do custo da água” que for proporcionada à acionante e a seu grupo familiar como garantia mínima do subministro deste recurso hídrico.

6. O FUNDAMENTO DA DECISÃO DA CORTE CONSTITUCIONAL

Como chegou a Corte Constitucional a esta decisão? Como a fundamentou, a partir da doutrina, antes exposta, concernente ao caráter fundamental e ao conteúdo do direito à água?

A Corte Constitucional reconhece, de forma plausível, que o acesso à água, ademais de fazer parte do conteúdo de um direito fundamental, é o resultado da prestação de um serviço público domiciliário. Por esta razão, em princípio, deve reger-se pela regulação legal deste serviço. Como é bem sabido, esta regulação estabelece que as empresas de serviços públicos têm competência para prestar este serviço “em troca de um preço” (Art. 128 da Lei 142 de 1994) e, portanto, para cobrar uma tarifa. A Corte Constitucional admite que esta característica do subministro de água não é caprichosa, senão que cumpre várias funções:

(i) permite assegurar o equilíbrio econômico e financeiro das empresas prestadoras de serviços públicos domiciliários; (ii) contribui ao fortalecimento de tais empresas; (iii) incentiva a participação dos particulares no mercado dos serviços públicos, o qual contribui à ampliação da cobertura na sua prestação, e (iv) permite que o Estado possa estabelecer políticas de ordem social que permitam assegurar a prestação dos serviços domiciliários às pessoas de escassos recursos [em virtude do princípio constitucional de solidariedade].

Estas razões levam a deduzir que, junto ao direito fundamental à água, existem outros direitos e bens jurídicos que são relevantes em situações como a do caso que se comenta, e que jogariam a favor de exigir o pagamento pela prestação desse serviço. Entre eles se destacam os direitos das empresas prestadoras do serviço público à livre empresa, ao patrimônio, assim como às expectativas legítimas e à segurança jurídica, que são princípios constitucionais implícitos e explícitos, respectivamente. A estes direitos se somam os bens coletivos que têm que ver com a estabilidade financeira do sistema de serviços públicos domiciliários e com a possibilidade de que exista solidariedade entre os usuários.

Tais direitos e bens fundamentam não já unicamente a competência, senão a obrigação a cargo das empresas de serviços públicos de cobrar a fatura de água e de suspender o serviço quando um usuário haja deixado de pagar três faturas. O Artigo 18 da Lei 689 de 2001, que modificou o Artigo 130 da Lei 142 de 1994, estabelece dita obrigação. Na Sentença C- 150 de 2003,23 23 Corte Constitucional, Sentença C-150 de 2003. Magistrado Relator Manuel José Cepeda Espinosa. a Corte Constitucional estabeleceu que dita obrigação se ajusta à Constituição. Não obstante, nessa mesma sentença sustentou que a suspensão da água tem duas limitações: uma processual e uma substancial. A limitação processual consiste em que a empresa de serviços públicos deve levar a cabo um devido processo com o usuário para tentar arrecadar o pagamento. Este processo deve incluir a possibilidade de subscrição de acordos de pagamento que tenham em conta a capacidade econômica de cada usuário. Por sua parte, a limitação substancial se traduz na proibição de suspender a água a estabelecimentos e sujeitos de especial proteção constitucional.24 24 Corte Constitucional, Sentença C-150 de 2003. Magistrado Relator Manuel José Cepeda Espinosa. Entre os primeiros se contam os centros penitenciários,25 25 Corte Constitucional, Sentenças T-235 de 1994 (Magistrado Relator Antonio Barrera Carbonell) e T-881 de 2001 (Magistrado Relator Marco Gerardo Monroy Cabra). as instituições educativas,26 26 Corte Constitucional, Sentenças T-380 de 1994 (Magistrado Relator Hernando Herrera Vergara) e T-018 de 1998 (Magistrado Relator Carlos Gaviria Díaz). e os hospitais27 27 Corte Constitucional, Sentença T-1205 de 2004. Magistrado Relator Marco Gerardo Monroy Cabra. .

Na sentença sub examine, a limitação relevante é a substancial no que concerne aos sujeitos de especial proteção constitucional. Segundo a Corte, esta limitação substancial deriva da proteção do direito fundamental à água e de outros direitos fundamentais destes sujeitos. A Corte também sugere que estes direitos devem prevalecer sobre os direitos das empresas de serviços públicos domiciliários. O alto tribunal anuncia que na sentença que se comenta fará uma ponderação entre estes dois tipos de direitos e que dita ponderação mostra que a suspensão do serviço aos sujeitos de especial proteção constitucional resulta “especialmente desproporcionada”:

ainda que esta persiga um fim constitucionalmente legítimo [acrescenta], que é a garantia da prestação eficiente, contínua e ininterrupta dos serviços públicos a todos os usuários e é idônea para alcançar o objetivo perseguido, os benefícios obtidos com sua aplicação são menores que os sacrifícios a que são expostos os titulares do direito fundamental à água.

O certo é que a Corte não leva a cabo a ponderação anunciada. Não fundamenta explicitamente porque os benefícios da suspensão do serviço público de água são menores que os sacrifícios que dela derivam para os sujeitos de especial proteção constitucional. Contudo, a Corte assume a prevalência do direito à água destes sujeitos e determina que se um destes sujeitos não pode cumprir os acordos de pagamento que a empresa de serviços públicos lhe ofereceu, e manifesta e prova que não conta com a capacidade econômica para pagar pelo serviço, “a empresa prestadora deverá instalar, a conta desta, um redutor no fluxo de água que garanta pelo menos 50 litros de água por pessoa ao dia ou prover uma fonte pública do recurso hídrico que assegure o subministro de igual quantidade de água.”

A partir desse momento, se a empresa de serviços públicos levou a cabo o devido processo, ofereceu acordos de pagamento ao usuário e instalou o redutor, pode utilizar as ações judiciais correspondentes contra o usuário para arrecadar a dívida não paga e pode aspirar a que o Estado pague um subsídio de até 50% do preço da água de consumo mínimo que subministre ao usuário. Da sentença parece desprender-se que este subsídio é um caso especial daquele que as entidades territoriais podem conceder aos usuários de serviços públicos, de acordo com o Artigo 99 da Lei 142 de 1994. Como dito artigo estabelece, em nenhum caso este subsídio poderá ser superior a 15% do custo médio do subministro do serviço público para o estrato 328 28 NT. A estratificação é a classificação socio-econômica dos imóveis residenciais que devem receber serviços públicos na Colômbia. É realizada com a finalidade principal de cobrar de maneira diferenciada (precisamente, por estratos) tais serviços, permitindo conceder subsídios aos grupos mais carentes. Há seis estratos sócio-econômicos. O estrato 1 é o mais baixo e o 6 o mais alto. A ideia geral é a de que os estratos mais altos (5 y 6) paguem mais do que lhe corresponde pelos serviços recebidos para subsidiar e fazer possível às pessoas dos estratos mais baixos (1, 2 y 3), especialmente do 1, desfrutar dos serviços públicos. A estratificação é prevista na Ley 142 de 1994, que regulamenta os princípios de solidariedade e redistribuição de renda que devem reger os serviços públicos domiciliares, conforme previsto no art. 367 da constituição colombiana. , a 40% do custo médio do subministro para o estrato 2, nem superior a 50% deste para o estrato 1. No entanto, se, pelo contrário, a empresa omitiu este devido processo, deverá assumir por inteiro o custo do serviço até que se modifique a situação econômica do beneficiário do serviço. Não poderia, em consequência, aspirar ao pagamento do subsídio estatal.

A Corte Constitucional utiliza todas estas premissas jurídicas para solucionar o caso concreto. No último passo de seu raciocínio só constata que a empresa fornecedora dos serviços de água que serve à peticionária não recebeu os subsídios estatais. Também considera reconhecido que a peticionária é um sujeito de especial proteção por ser mãe cabeça de família de dois filhos menores e por estar enferma. A conclusão é que a suspensão do serviço de água vulnera seus direitos fundamentais e que, apesar de não haver pago as faturas, ela e seus filhos têm direito a receber até 50 litros de água diários cada um.

A Colisão entre o Direito a Água e os Direitos das Empresas de Serviços Públicos Domiciliários

Após esta reconstrução da Sentença T-740 de 2011, resulta pertinente avaliar a plausibilidade das teses sustentadas pela Corte Constitucional. A sentença acerta ao reconhecer que no caso sub examine existe uma colisão entre vários direitos fundamentais e princípios constitucionais. O direito fundamental à água da peticionária joga a favor de que o serviço de água não lhe seja suspendido e a que se subministre a ela e a sua família a quantidade mínima de água, quer dizer, 50 litros ao dia por pessoa. Contra tanto de um como do outro jogam as liberdades econômicas das empresas de serviços públicos e o princípio de legalidade que estabelece que as normas legais e contratuais que prescrevem o pagamento da tarifa devem ser cumpridas, sob pena de desconexão do serviço. Uma vez que tanto tais direitos como este princípio têm natureza constitucional, uma fundamentação adequada de qualquer solução para o caso concreto passa por levar a cabo uma ponderação entre eles.29 29 Cfr. Sobre a ponderação como o método apropriado para resolver este tipo de colisões: BERNAL, Carlos. El derecho de los derechos. Bogotá: Universidad Externado de Colombia, 2005.

Como antes foi assinalado, a Corte Constitucional não faz explícita uma ponderação entre estes direitos e princípios. Sem embargo, disso não se segue que uma ponderação semelhante não seja possível, nem que esta deixe de lançar exatamente os resultados que a Corte Constitucional proclama. À continuação deverá ser explorado se isso é assim.

As Tensões Existentes ao Interior do Regime Constitucional dos Serviços Públicos Domiciliários

Para começar, deve ser compreendido porque entram em colisão e qual é o marco constitucional no qual dita colisão deve ser resolvida.

A Constituição Política fundamenta pelo menos duas concepções dos serviços públicos domiciliários: uma concepção fundada no Estado Social e outra baseada na liberalização dos serviços públicos. Tais concepções se baseiam em dois pilares que, considerados de maneira conjunta e absoluta, quer dizer, com a aspiração de pleno cumprimento, seriam irreconciliáveis. A primeira se funda na teoria do Estado Social de Direito. Esta teoria reconhece que a satisfação das necessidades básicas da população é um dos fins do Estado. Outrossim, costuma estar associada com uma confiança na gestão pública para o alcance deste fim e, em geral, para a proteção dos interesses gerais. Esta teoria encontra respaldo nos artigos 1º e 2º da Constituição, entre outros. A segunda concepção descansa sobre a teoria do Estado Liberal. Esta teoria costuma ser associada com a liberalização da economia, a exclusão da intervenção estatal, a desconfiança na gestão levada a cabo por parte do aparato do Estado, o correspondente patrocínio à prestação dos serviços públicos por parte de agentes particulares e a proteção dos direitos econômicos de tais agentes. Esta teoria se reflete nos artigos 58, 60, 64, 332, 333 e 334 da Constituição.

Estas duas tendências dão lugar a uma tensão que se projeta ao interior do regime dos serviços públicos domiciliários. A concepção liberal privilegia a proteção dos direitos subjetivos das empresas de serviços públicos, a garantia de seu livre exercício e o respaldo jurídico à obtenção de lucro pelas atividades econômicas desenvolvidas neste campo da economia. A concepção do Estado Social atribui caráter prioritário à prestação ótima destes serviços e à plena satisfação do interesse geral e das necessidades básicas dos indivíduos. A tensão entre estas duas concepções se apresenta pela dificuldade de conciliar, desde o ponto de vista econômico, o lucro e o robustecimento financeiro das empresas de serviços públicos, por uma parte, e a plena satisfação do interesse geral e as necessidades básicas dos indivíduos, por outra. Quanto maior seja tal lucro e robustecimento financeiro de tais empresas, tanto menor será o grau de satisfação das necessidades básicas que os serviços públicos satisfazem e, vice-versa, quanto maior seja o grau desta satisfação, tanto menores serão as possibilidades de lucro e de robustecimento financeiro das mencionadas empresas.

A tensão entre estas duas concepções se apresentam também em outros países cujas constituições, como a da Alemanha e Espanha, contêm uma cláusula atinente ao Estado Social. Para alguns autores de ditas latitudes, a prevalência de uma das posturas sobre a outra é patente. Gaspar Ariño, por exemplo, considera que a existência na Constituição de um direito geral de liberdade implica a prevalência do direito à liberdade de empresa sobre o princípio social de intervenção estatal.30 30 ORTIZ, G. Ariño. Principios de Derecho Público Económico. Granada: Comares, 1999. Sem embargo, para outros, como Hurtado Orts,31 31 ORTS, F. Hurtado. La iniciativa pública local en la actividad económica. Madrid: Civitas, 1994. p. 144 - ss. é possível aceitar a coexistência a um mesmo nível das duas concepções, sem que deva ser construída uma hierarquia entre elas.

Talvez seja esta última a postura assumida pela primeira jurisprudência constitucional, em expressões tais como: “A liberdade econômica reconhecida aos particulares, lhes permite perseguir seu benefício particular e a utilização dos recursos do país, dentro dos limites do bem comum”32 32 Corte Constitucional, Sentença T-251 de 1993. Magistrado Relator Eduardo Cifuentes Muñoz. , ou como: “…a Constituição consagra uma economia social de mercado dirigida, posto que reconhece genericamente que a iniciativa privada e a atividade econômica são livres (C.P. art. 332) porém estabelece, também de maneira global, que “a direção geral da economia estará a cargo do Estado (C.P. art. 333)”33 33 Corte Constitucional, Sentença C-265 de 1994. Magistrado Relator Alejandro Martínez Caballero. . Sem embargo, em uma segunda fase, a Corte Constitucional pareceu haver-se distanciado desta postura, para reconhecer a prevalência do princípio do Estado Social sobre o princípio de liberalização dos serviços públicos. Durante os primeiros anos deste século, a Corte pareceu defender a existência de uma prevalência do interesse geral, a satisfação plena dos direitos sociais e o bem comum sobre os direitos de conteúdo econômico das empresas de serviços públicos.

Como o apontei em outro lugar,34 34 BERNAL, Carlos. El concepto de servicio público en el orden jurídico colombiano. Letras Jurídicas, vol. 10, n. 1, 2005. p. 105 - 141. dita postura está sujeita a algumas objeções. Não parece plausível atribuir a nenhuma destas concepções dos serviços públicos uma prevalência absoluta. As duas concepções estão fundadas em disposições constitucionais que ostentam uma mesma hierarquia e entre as quais não existem relações de prioridade. Tampouco é possível que tais concepções coexistam pacificamente. Ditas concepções darão sempre lugar a conflitos que deverão ser resolvidos com fundamento no princípio de proporcionalidade, à luz das particularidades de cada caso concreto.

Felizmente, na Sentença T-740 de 2011 a Corte Constitucional reconhece inequivocamente a tese da igualdade hierárquica dos princípios que fundam estas duas concepções e da necessidade de resolver suas colisões mediante uma ponderação. Não obstante, a decisão que adota a Corte parece ser o resultado de uma ponderação que, não só é implícita, senão também inadequada, tal como à continuação se mostrará.

7. DEVEM AS EMPRESAS DE SERVIÇOS PÚBLICOS DOMICILIÁRIOS SUBSIDIAR A ÁGUA MÍNIMA QUE OS SUJEITOS DE ESPECIAL PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL TÊM DIREITO A RECEBER?

O aspecto mais discutível da Sentença T-740 de 2011 é o seguinte. A Sentença impõe às empresas de serviços públicos domiciliários uma proibição de suspender o serviço de água a pessoas que são sujeitos de especial proteção constitucional. Outrossim, ordena a ditas empresas oferecer a estes sujeitos acordos de pagamento e, em todo caso, em definitiva, subministrar uma quantidade mínima de água diária de 50 litros por pessoa, para o que as empresas deverão, por sua conta, instalar um redutor. Sem que a Lei de Serviços Públicos se refira explicitamente ao direito à água dos sujeitos de especial proteção constitucional, a Sentença aplica neste âmbito o Artigo 99 da Lei 142 de 1994, que regula os subsídios que as entidades territoriais podem conceder aos usuários de serviços públicos. A aplicação desta disposição, e, em concreto, da norma, segundo a qual, as pessoas de estrato 1 podem receber um subsídio equivalente até 50% do preço da água que consomem, conduzem a Corte Constitucional a estabelecer que a empresa de serviços públicos domiciliários, que é sujeito passivo da ação de tutela, só pode cobrar até 50% da água mínima que subministre aos sujeitos de especial proteção constitucional. Adiante farei referência a esta regra com a expressão: a regra do 50%.

Aqui defenderei a tese, segundo a qual, a regra do 50% é produto de uma ponderação inapropriada dos direitos e deveres que entram em colisão em situações como aquela que dá lugar a esta sentença. Isto pode ser mostrado se se intenta levar a cabo tal ponderação.

No caso concreto há vários direitos e deveres em jogo. Em primeiro lugar, resulta pertinente estudar os alcances da sentença em relação ao direito fundamental à água dos sujeitos de especial proteção constitucional. Deve ser aclarado que, a diferença do que a sentença da Corte parece pressupor, esta categoria de indivíduos não é idêntica à categoria de indivíduos de extrato 1. Como a jurisprudência constitucional indica, os sujeitos de especial proteção constitucional são aqueles que estão em circunstâncias de especial “vulnerabilidade”, “debilidade” ou “marginalidade”.35 35 Corte Constitucional, Sentença T- 525 de 2009. M. P. Nilson Pinilla. Exemplos deste tipo de sujeitos são: as crianças, as mulheres chefes de família, os descapacitados, os anciãos, os membros de grupos minoritários ou as pessoas em situação de pobreza extrema.36 36 Corte Constitucional, Sentença T-789 de 2003. Magistrado Relator Manuel José Cepeda Espinosa. A esta categoria também se somaram os desalojados37 37 Cfr. Por todas a T-025 de 2004 (Magistrado Relator Manuel José Cepeda Espinosa), T- 192 de 2010 (Magistrado Relator Jorge Ivan Palacio Palacio) e T-287 de 2010 (Magistrado Relator Gabriel Eduardo Mendoza Martelo). e os recicladores informais.38 38 Corte Constitucional. Sentença C-793 de 2009 (Magistrado Relator Gabriel Eduardo Mendoza Martelo). Deste conceito e desta enumeração (que, com segurança, não é taxativa) pode ser deduzido que não todos os indivíduos de estrato 1 são sujeitos de especial proteção constitucional e que não todos os sujeitos de especial proteção constitucional o são em relação ao direito fundamental à água. Por exemplo, um cidadão da terceira idade que tenha suficientes recursos para sufragar o pagamento da fatura da água não poderia aduzir que é um sujeito de especial proteção constitucional para efeitos de impedir a suspensão do serviço. O grupo que no concernente ao direito à água resulta mais relevante é o das pessoas em condições de extrema pobreza.

O certo é que, em todo caso, de acordo com a análise do conteúdo do direito à água, os sujeitos de proteção constitucional têm um direito fundamental ao acesso a uma quantidade de água mínima de 50 litros por pessoa. Sem embargo, o destinatário deste direito não é a empresa de serviços públicos domiciliários, senão o Estado. No marco do regime constitucional de um Estado Social de Direito, a comunidade política, representada pelo Estado, é aquela que, em estrito sentido, têm a função de satisfazer as necessidades básicas do indivíduo quando este ou sua família não tenham capacidade para fazê-lo. Esta não é uma função própria das empresas de serviços públicos. Se isto é assim, então não se entende porque a empresa de serviços públicos domiciliários só pode recuperar 50% do valor da água mínima que deve prover aos sujeitos de especial proteção constitucional, ademais de instalar a seu cargo os redutores correspondentes. Estas empresas não são destinatárias do direito fundamental à água. O destinatário deste direito é o Estado que, por conseguinte, deveria restituir a estas empresas 100% da água mínima que elas subministrem aos sujeitos de especial proteção constitucional. Permitam-me referir-me a esta regra com a expressão: a regra do 100%.

Contra a regra do 100% caberiam dois argumentos. O primeiro assinala que, em todo caso, a empresa de serviços públicos pode utilizar as ações judiciais correspondentes para tentar recuperar do usuário o 50% do preço da água gratuita que o Estado não cobre. Este argumento, sem embargo, dá lugar a um dilema irresolúvel. Por uma parte, não pode esperar-se demasiado do uso destas ações judiciais. Se se trata de indivíduos em circunstâncias de pobreza absoluta, será muito pouco provável que as empresas de serviços públicos domiciliários logrem recuperar o 50% que o Estado não cobre. Neste sentido, este 50% se converte em um subsídio que estas empresas terminam outorgando de maneira forçada aos usuários. Este subsídio não encontra nenhum acordo jurídico. Não é função destas empresas, senão do Estado, subsidiar aos usuários que o necessitem. Contudo, por outra parte, se, para fins de discussão, se admitisse que as empresas logram recuperar do usuário, mediante ações judiciais, o 50% que o Estado não cobre, a situação definitiva resultaria calamitosa e desproporcionada para o sujeito de especial proteção constitucional. Pode supor-se que, por exemplo, em situações como a da acionante da tutela sub examine, o sujeito de especial proteção constitucional é o proprietário do imóvel no qual se subministra a água. Pense-se que, após um devido processo judicial, a empresa de serviços públicos consegue arrematar o imóvel para recuperar o 50% do importe da água mínima não coberto pelo Estado. A consequência seria inaceitável: o sujeito de especial proteção constitucional terminaria perdendo sua casa. Portanto, a regra do 50% conduz a um dilema sem saída: ou a empresa de serviços públicos termina outorgando um subsídio que não está chamada a outorgar, ou o sujeito de especial proteção constitucional resulta desproporcionalmente exposto a um risco de ruína e de expropriação.

O segundo argumento contrário à regra do 100% sustentaria que ela se aparta da lei porque o Artigo 99 da Lei 142 de 1994 estabeleceu no máximo de 50% o subsídio que as entidades territoriais podem outorgar aos usuários de serviços públicos domiciliários. Não obstante, a debilidade deste argumento também é manifesta. Não pode ser desconhecido que existem razões de peso para que dito artigo da Lei 142 de 1994 haja limitado o montante dos subsídios que o Estado possa outorgar, inclusive às pessoas de mais baixos recursos. O Estado Social de Direito se baseia em uma concepção da autonomia individual segundo a qual, o sujeito é quem, em princípio, tem a competência de velar por si mesmo. Estado Social de Direito não é sinônimo de paternalismo irrestrito e injustificado, senão de autonomia com solidariedade. Inclusive os indivíduos de estrato 1 estão chamados a cobrir, em princípio, suas necessidades básicas por meio de seu esforço, seu trabalho e o desenvolvimento de alguma atividade econômica dentro do mercado. Apesar disso, isto não pode ser esperado dos sujeitos de especial proteção constitucional, se esta categoria se toma em sério. A vulnerabilidade, debilidade e marginalidade das pessoas que a ela se adscrevem faz que não possa ser esperado delas, pelo menos de forma temporal, nem sequer que possam velar por si mesmos para cobrir uma porcentagem do preço da água mínima a que têm direito. Isto justifica que a comunidade política, representada pelo Estado, lhes deva garantir este mínimo com plenitude, quer dizer, em um 100%.

A isto deve somar-se que não existe nenhuma razão conceitual para identificar, como o faz a Corte Constitucional, o subsídio legal de até 50% que as entidades territoriais podem outorgar aos indivíduos de estrato 1, com o montante que o Estado deve empregar para satisfazer o direito fundamental ao acesso a uma quantidade mínima de água, de que são titulares os sujeitos de especial proteção constitucional. Esta satisfação deve ser de 100%. Isto é o que se segue das fontes (sobretudo internacionais) dos direitos fundamentais que a própria Corte Constitucional expõe na Sentença T-740 de 2011. O Artigo 99 da Lei 142 de 1994 não regula este suposto; e, como, se mostrou, sua aplicação resulta inconveniente e contrária à plena satisfação do direito fundamental à água que a Constituição garante.

Ora, a regra do 50% também desconhece as exigências que derivam da liberdade de empresa e os demais direitos constitucionais e legais das empresas de serviços públicos domiciliários. Estes direitos fazem legítimo que não sejam estas empresas aquelas que devam suportar financeiramente a satisfação do direito fundamental à água. A imposição a estas empresas da obrigação de prestar o serviço público de água sem que possam recuperar o 100% da tarifa, implica um desconhecimento dos reconhecimentos ou assignações a estas empresas previstas na lei. Por conseguinte, resulta contrário à segurança jurídica e dificulta que tais empresas possam cumprir com as obrigações que têm com os demais usuários. Toda imposição financeira não prevista nas condições iniciais do negócio desajusta o sistema de prestação do serviço público. A empresa assume suas obrigações sob o entendimento de que receberá uma remuneração pela prestação do mesmo (o custo razoável), e que esta remuneração lhe permitirá dispor dos meios necessários para prestar o serviço em condições apropriadas, ampliar a cobertura e melhorar a qualidade.

Como é bem sabido, estas condições financeiras estão reguladas pelo Artigo 128 da Lei 142 de 1994, segundo o qual o contrato de serviços públicos é aquele “em virtude do qual uma empresa de serviços públicos os presta a um usuário em troca de um preço em dinheiro, de acordo a (sic) estipulações que foram definidas por ela para oferecê-las a muitos usuários não determinados”. Ao exigir à empresa que continue a prestação em condições de não pagamento do serviço, a sentença desconhece o princípio de onerosidade do contrato de serviços públicos. Como reconheceu a Corte, o caráter oneroso do contrato de condições uniformes consiste no pagamento que deve fazer todo usuário ou subscritor como contraprestação aos serviços recebidos.39 39 Corte Constitucional. Sentença T-740 de 2011. Magistrado Relator Humberto Antonio Sierra Porto. Corte Constitucional, Sentença C-150 de 2003. Magistrado Relator Manuel José Cepeda Espinosa. .

Deve ser agregado que a imposição às empresas de serviços públicos de cargas que correspondem ao Estado leva consigo uma vulneração do princípio da boa fé que está tipificado pelo Artigo 83 da Constituição e que deve regular, não só a atuação dos particulares, senão também a do Estado em sua relação com estes e com outras entidades, tanto de natureza pública como privada. As empresas prestadoras de serviços públicos entram no mercado confiantes de que a boa fé do Estado (legislador, administração pública e ramo judicial) o levará a respeitar as condições pactuadas nos contratos de concessão e a manter ditas condições durante o termo de execução de dita atividade comercial. Um câmbio súbito de ditas condições também lesiona o princípio de segurança jurídica que o artigo 2 da Constituição estabelece e que faz parte do princípio do Estado de Direito. Segundo este princípio, as empresas prestadoras de serviços públicos devem poder ter a certeza de que as condições financeiras nas que previram sua operação no mercado não serão modificadas arbitrariamente nem em prejuízo de seus interesses. As empresas partem do suposto de que poderão exercer sua atividade comercial em condições de estabilidade jurídica e financeira.

Outrossim, como a própria Corte Constitucional estabelece na Sentença T-740 de 2011, existe “uma obrigação do Estado de adotar políticas e medidas […] destinadas a satisfazer a prestação do serviço de água”. Desta maneira, ao resolver os casos particulares de pedidos de reinstalação do serviço de água, deve corresponder ao juiz determinar que tipo de políticas públicas estabeleceu o Estado para levar a cabo tal garantia. Se o juiz encontra que no caso particular não existe nenhum tipo de política pública, deverá exortar ou, inclusive, cominar ao legislador ou à administração pública, segundo seja seu âmbito de competência, que exerçam esta função mediante a criação de normas, a expedição de atos administrativos e disposições orçamentárias, ou mediante as ações positivas que sejam pertinentes. A imposição desta carga às empresas prestadoras do serviço público carece de fundamento jurídico, não só pela falta de competência destas para levar a cabo tais tarefas, senão também pela inexistência do dever jurídico de fazê-lo.

Não parece apropriado que a jurisprudência constitucional traslade, sem justificação alguma, às empresas de serviços públicos, cargas e deveres que são próprias do Estado. Como estabelece o Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, é dever do Estado “garantir que todos os pagamentos por subministro de água se baseiem no princípio de equidade, a fim de assegurar que esses serviços, sejam públicos ou privados, estejam ao alcance de todos”40 40 Corte Constitucional. Sentença T-740 de 2011. Magistrado Relator Humberto Antonio Sierra Porto. Corte Constitucional, Sentença C-150 de 2003. Magistrado Relator Manuel José Cepeda Espinosa. . Deve ser reconhecido que a Sentença T-740 de 2011 não representa a primeira oportunidade na qual a jurisprudência traslada deveres deste tipo às empresas de serviços públicos domiciliários. Na Sentença T-1104 de 2005, por exemplo, em virtude do princípio de disponibilidade que deve caracterizar o serviço de água, a Corte Constitucional impôs às Empresas Públicas de Medelim a obrigação de conectar à casa de um usuário o serviço de água potável, ainda que em ausência das redes de aqueduto necessárias. A sentença ordenou a estas Empresas a realização das obras e de todos os estudos técnicos pertinentes sem ter em conta as implicações orçamentárias de dita decisão. Em dito caso, a Corte se apartou do bem fundamentado precedente, contido na Sentença T-244 de 1994, no qual havia ordenado à Administração Pública, e não a uma empresa de serviços públicos, levar a cabo os estudos, a elaboração e a execução de um projeto que era necessário para a construção de um aqueduto em uma zona rural.

Não pode ser negado que, uma vez que a prestação do serviço de água está, faticamente, em mãos das empresas de serviços públicos, é razoável que, em princípio, elas devam atuar de forma temporal para garantir a satisfação deste direito por parte dos usuários, sobretudo quando se trata de sujeitos de especial proteção constitucional. Contudo, esta intervenção deve ser sempre temporal, isto é, enquanto o Estado desenvolve a atuação que os direitos fundamentais lhe exigem. A assignação de deveres do Estado a tais empresas não deverá ser estendida mais além do tempo que necessite o legislador ou a administração pública para resolver o problema de fundo, por exemplo, para apropriar as partidas orçamentárias pertinentes, outorgar o auxílio econômico ou levar a cabo as ações positivas necessárias para satisfazer as necessidades básicas dos usuários. Em todo caso, em definitivo, estas atividades tendentes à satisfação do direito à água devem ser sufragadas por completo pelo Estado. A regra do 100% tem validez constitucional como concreção do direito fundamental à água.

Finalmente, deve ser reconhecido que, de não ser assim, com o tempo, e a causa do princípio de igualdade e da força de precedente que têm as decisões da Corte Constitucional, a regra do 50% poderia ter repercursões de considerável magnitude na estabilidade financeira das empresas de serviços públicos domiciliários e, em geral, do sistema de prestação destes serviços. Sentenças de tutela como a do caso sub examine têm efeitos inter pares. Isto implica que sua ratio decidendi e a decisão que se segue dela (e que inclui a regra do 50%) deverá ser aplicada em todos os casos idênticos e análogos. Este efeito faz ainda mais conveniente que o Estado assuma em todos estes casos a responsabilidade que lhe corresponde e proteja com plenitude os direitos fundamentais dos sujeitos de especial proteção constitucional.

Estas considerações fundamentam as seguintes conclusões: (1) Que resulta proporcional que os sujeitos de especial proteção constitucional recebam uma quantidade mínima de água diária.41 41 Problema diferente, que aqui não abordarei, é se a quantidade mínima de água diária é necessariamente 50 litros por pessoa ou se, como o estabeleceu a Corte Constitucional da África do Sul, no caso Mazibuko, antes citado, esta quantidade pode ser menor e deve ser estabelecida pelo Legislador. O Estado é o destinatário deste direito fundamental e, portanto, o competente para sufragar o custo desta quantidade de água. A proporcionalidade desta medida deriva da constatação de que, enquanto a carência de água mínima representa uma afetação severa dos direitos fundamentais dos sujeitos de especial proteção constitucional, o subministro deste subsídio por parte do Estado só pode supor uma intervenção media ou leve nas finanças públicas. De fato, em razão das circunstâncias de extrema pobreza dos sujeitos de especial proteção constitucional, o outorgamento deste subsídio reveste uma prioridade constitucional frente ao pagamento dos subsídios gerais que o Estado pode outorgar a pessoas de estratos 1 a 3, de acordo com a Lei de Serviços Públicos Domiciliários. Os sujeitos de especial proteção constitucional necessitam uma proteção com mais premência que as pessoas de estratos 1 a 3 que não se encontram em comparáveis condições de precariedade. (2) Que, por razões técnicas e logísticas, é proporcional que as empresas de serviços públicos domiciliários não suspendam o serviço de água, ante a falta de pagamento da fatura por parte de um sujeito de especial proteção constitucional e que continuem o subministro da quantidade mínima de água diária. (3) Sem embargo, a regra do 50% resulta desproporcional e, por conseguinte, deve ser substituída pela regra do 100%. A regra do 50% aliena do Estado social sua responsabilidade e a traslada às empresas de serviços públicos. Desta forma, esta regra afeta desproporcionalmente os direitos constitucionais destas empresas, em especial, a liberdade de empresa, as demais liberdades econômicas fundamentais e o direito à estabilidade e ao respeito dos direitos adquiridos, que está ligado com os princípios de legalidade, boa fé e confiança legítima. Além disso, esta regra incorre em desproporção com o usuário que é sujeito de especial proteção constitucional porque o põe em risco de expropriação total, ao ter que responder com seus bens frente às empresas de serviços públicos pelo 50% do valor da água mínima que o Estado não cobre.

Para terminar, deve ser reconhecido que, desde logo, o mais apropriado desde os pontos de vista jurídico, técnico e financeiro é que seja o Legislador quem regule a forma em que o Estado deve satisfazer e garantir o direito fundamental ao acesso à água dos sujeitos de especial proteção constitucional, e que seja a administração pública a encarregada de distribuir com diligência os subsídios necessários para assegurar dita satisfação, no marco de um sistema de serviços públicos de livre mercado, sob supervisão do Estado. Neste sentido, os avanços da jurisprudência só podem ser consolidados com a expedição de boas políticas públicas que outorguem aos direitos sociais o alcance pleno que lhes corresponde no entorno constitucional colombiano.

  • 1
    O’CONNELL, Paul. The Death of Socio-Economic Right. Modern Law Review, vol. 74, núm. 4, 2011, p. 532-554.
  • 2
    Corte Constitucional. Sentença T-740 de 2011. Magistrado Relator Humberto Antonio Sierra Porto.
  • 3
    NT. Ação de Tutela é uma ação específica do direito colombiano, própria para garantir a efetividade de um direito fundamental.
  • 4
    A referência desta Sentença de 15 de janeiro de 1958 é: BVerfGE 7, 198, 205. Este conhecidíssimo caso versava sobre um pleito entre o diretor de cinema Veit Harlan e Lüth, o Presidente do escritório de imprensa de Hamburgo. Em diversas oportunidades, este havia atacado publicamente a Harlan, quem anteriormente havia dirigido “Judeu doce”, um filme de propaganda anti-semita, e que agora apresentava ao público “Amantes imortais”. Lüth também havia convidado o público e as empresas cinematográficas a boicotar o novo filme. Os tribunais de primeira e segunda instância consideraram que a conduta do jornalista vulnerava os bons costumes do § 826 do Código Civil. Pelo contrário, a Corte Constitucional Federal concedeu a tutela interposta por este último, ao considerar que sua conduta era um exercício legítimo da liberdade de expressão e que esta liberdade também se aplicava no âmbito do direito civil. A partir do caso Lüth começou a se consolidar a convicção de que nenhum âmbito jurídico escapa à força de irradiação que os direitos fundamentais projetam.
  • 5
    Cfr. Corte Constitucional, Sentença T-632 de 2007, Magistrado Relator Humberto Sierra Porto.
  • 6
    A tese segundo a qual o direito à água tem um caráter fundamental por sua conexidade com outros direitos, havia sido proclamada previamente pela Corte Constitucional. A este respeito, é de particular importância a Sentença T-616 de 2010 (Magistrado Relator Luis Ernesto Vargas Silva). Em dita Sentença a Corte assinalou que o direito à água é um direito fundamental que pretende garantir “a posibilidade de obter a quantidade suficiente para o consumo, a higiene pessoal e doméstica e a preparação de alimentos. Toda vez que a carência de água para estes usos põe em grave perigo a realização da dignidade, a vida e a saúde dos acionantes, sua proteção é urgente e a via mais idônea para fazê-lo é a ação de tutela”. Outrossim, a Corte sustentou que a natureza fundamental do direito à água deriva da conexidade existente entre este direito e outros direitos de nível constitucional ou fundamental. O direito à água é um pressuposto essencial para o gozo de direitos como o da educação, dada sua inegável necessidade à hora de autorizar o funcionamento de um estabelecimento educativo; o direito ao ambiente saudável; dadas as propriedades sanitárias e de salubridade que a água traz consigo; e os direitos à proteção da diversidade étnica e cultural, se se tem em conta que algumas comunidades indígenas e afrocolombianas consideram a água como um elemento de especial significado cosmogônico.
  • 7
    Cfr. Corte Constitucional, Sentenças T-578 de 1992 (Magistrado Relator Alejandro Martínez Caballero), T- 140 de 1994 (Magistrado Relator Vladimiro Naranjo Mesa) e T- 207 de 1995 (Magistrado Relator Alejandro Martínez Caballero), e a própria T-740 de 2011 (Magistrado Relator Humberto Antonio Sierra Porto).
  • 8
    Cfr. Corte Constitucional, Sentenças T-1104 de 2005 (Magistrado Relator Jaime Araújo Rentería), T-539 de 1993 (Magistrado Relator Carlos Gaviria Díaz), T-244 de 1994 (Magistrado Relator Hernando Herrera Vergara), T-523 de 1994 (Magistrado Relator Alejandro Martínez Caballero), T-092 de 1995 (Magistrado Relator Hernando Herrera Vergara), T-379 de 1995 (Magistrado Relator Antonio Barrera Carbonell), T-413 de 1995 (Magistrado Relator Alejandro Martínez Caballero), T-410 de 2003 (Magistrado Relator Jaime Córdoba Triviño), T-1104 de 2005 (Magistrado Relator Jaime Araújo Rentería), T-270 de 2007 (Magistrado Relator Jaime Araújo Rentería), T-022 de 2008 (Magistrado Relator Nilson Pinilla Pinilla), T-888 de 2008 (Magistrado Relator Marco Gerardo Monroy Cabra) e T- 381 de 2009 (Magistrado Relator Jorge Ignacio Pretelt Chaljub).
  • 9
    CCT 39/09 Lindiwe Mazibuko e outros vs. Cidade de Johannesburgo e outros. Neste caso a Corte Constitucional da África do Sul se pronunciou sobre o conteúdo do direito à água consagrado na seção 27 da Constituição sul-africana, que estabelece o direito de todo cidadão a ter acesso a “água suficiente”. Em concreto, estudou a constitucionalidade da implementação de um projeto dirigido a melhorar o subministro de água e a reduzir as perdas de água mediante a instalação de medidores pré-pagos para a cobrança do serviço aos usuários. O propósito desses medidores era a cobrança do consumo de água que excedesse os 6 quilolitros por usuário, que é a quantidade básica que na África do Sul se subministra de maneira gratuita. A Corte Suprema de South Gauteng concedeu a petição da señora Mazibuko e de outros quatro residentes, consistente em proibir a instalação dos medidores, por considerar que era contrária o direito fundamental. A Corte decidiu que a Cidade devia prover 50 litros grátis de água para consumo básico diário aos demandantes e demais residentes de Phiri em Soweto. A decisão foi apelada perante a Corte Suprema de Apelações que sustentou que 42 litros de água por dia poderia ser considerado como a quantidade “suficiente de água” de acordo com a intenção do constituinte. Portanto, ordenou à Cidade reformular sua política de subministro de água, sobre a base de que a instalação de medidores pré-pagos para o subministro de água era uma medida contrária ao direito. A Corte de Apelações não teve em conta que a implementação deste novo sistema havia sido objeto de discussão e de posterior aprovação por parte das autoridades estatais correspondentes. A Corte Constitucional sustentou que da obrigação derivada da seção 27 da Constituição de subministro “suficiente de água” não se pode deduzir uma quantidade específica. Por esta razão, sustentou que não corresponde a nenhuma Corte determinar esta quantidade senão que é um assunto de política pública que deve ser deixado nas mãos do governo. O governo havia decidido que 25 litros de água diários por pessoa é um “subministro suficiente”, assim como a quantidade mensal de 6 quilolitros por família. Não considera a Corte que possa ser taxada dita política de irrazoável, quando mais de 100.000 lares em Johannesburgo ainda careciam do acesso ao serviço básico de água. A Corte concluiu que a instalação de medidores não é nem injusta nem discriminatória, pois esta política de subministro obedece a um plano progressivo de aumento da cobertura na prestação.
  • 10
    BERNAL, Carlos. El principio de proporcionalidad y los derechos fundamentales. 3 ed. Madrid: Centro de Estudios Políticos y Constitucionales, 2007.
  • 11
    ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. 2 ed. Madrid: Centro de Estudios Políticos y Constitucionales, 2008. p. 186 e ss.
  • 12
    Cfr. Sobre esta estrutura dos direitos sociais: ALEXY, Robert. La institucionalización de los derechos humanos en el Estado Constitucional Democrático. Derechos y libertades, núm. 8, 2000. p. 12 - ss.
  • 13
    Corte Constitucional. Sentença T-740 de 2011. Magistrado Relator Humberto Antonio Sierra Porto.
  • 14
    Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais: Comentário Geral 12, Comentário Geral No. 14, entre outros.
  • 15
    Corte Constitucional. Sentença T-740 de 2011. Magistrado Relator Humberto Antonio Sierra Porto.
  • 16
    Corte Constitucional. Sentença T-740 de 2011. Magistrado Relator Humberto Antonio Sierra Porto.
  • 17
    Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais: Comentário Geral 15.
  • 18
    Corte Constitucional. Sentença T-740 de 2011. M.P. Humberto Antonio Sierra Porto.
  • 19
    Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, Comentário Geral No. 15.
  • 20
    Organização Mundial da Saúde (OMS). Relatório sobre la cantidad de agua domiciliaria, el nivel del servicio y la salud y ONU/WWAP (Nações Unidas/Programa Mundial de Avaliação dos Recursos Hídricos), 2003. 1er Informe de las Naciones Unidas sobre el Desarrollo de los Recursos Hídricos en el Mundo: Agua para todos, agua para la vida. París, Nueva York e Oxford. UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) e Berghahn Books.
  • 21
    Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, Comentário Geral No. 15.
  • 22
    Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, Comentário Geral No. 15.
  • 23
    Corte Constitucional, Sentença C-150 de 2003. Magistrado Relator Manuel José Cepeda Espinosa.
  • 24
    Corte Constitucional, Sentença C-150 de 2003. Magistrado Relator Manuel José Cepeda Espinosa.
  • 25
    Corte Constitucional, Sentenças T-235 de 1994 (Magistrado Relator Antonio Barrera Carbonell) e T-881 de 2001 (Magistrado Relator Marco Gerardo Monroy Cabra).
  • 26
    Corte Constitucional, Sentenças T-380 de 1994 (Magistrado Relator Hernando Herrera Vergara) e T-018 de 1998 (Magistrado Relator Carlos Gaviria Díaz).
  • 27
    Corte Constitucional, Sentença T-1205 de 2004. Magistrado Relator Marco Gerardo Monroy Cabra.
  • 28
    NT. A estratificação é a classificação socio-econômica dos imóveis residenciais que devem receber serviços públicos na Colômbia. É realizada com a finalidade principal de cobrar de maneira diferenciada (precisamente, por estratos) tais serviços, permitindo conceder subsídios aos grupos mais carentes. Há seis estratos sócio-econômicos. O estrato 1 é o mais baixo e o 6 o mais alto. A ideia geral é a de que os estratos mais altos (5 y 6) paguem mais do que lhe corresponde pelos serviços recebidos para subsidiar e fazer possível às pessoas dos estratos mais baixos (1, 2 y 3), especialmente do 1, desfrutar dos serviços públicos. A estratificação é prevista na Ley 142 de 1994, que regulamenta os princípios de solidariedade e redistribuição de renda que devem reger os serviços públicos domiciliares, conforme previsto no art. 367 da constituição colombiana.
  • 29
    Cfr. Sobre a ponderação como o método apropriado para resolver este tipo de colisões: BERNAL, Carlos. El derecho de los derechos. Bogotá: Universidad Externado de Colombia, 2005.
  • 30
    ORTIZ, G. Ariño. Principios de Derecho Público Económico. Granada: Comares, 1999.
  • 31
    ORTS, F. Hurtado. La iniciativa pública local en la actividad económica. Madrid: Civitas, 1994. p. 144 - ss.
  • 32
    Corte Constitucional, Sentença T-251 de 1993. Magistrado Relator Eduardo Cifuentes Muñoz.
  • 33
    Corte Constitucional, Sentença C-265 de 1994. Magistrado Relator Alejandro Martínez Caballero.
  • 34
    BERNAL, Carlos. El concepto de servicio público en el orden jurídico colombiano. Letras Jurídicas, vol. 10, n. 1, 2005. p. 105 - 141.
  • 35
    Corte Constitucional, Sentença T- 525 de 2009. M. P. Nilson Pinilla.
  • 36
    Corte Constitucional, Sentença T-789 de 2003. Magistrado Relator Manuel José Cepeda Espinosa.
  • 37
    Cfr. Por todas a T-025 de 2004 (Magistrado Relator Manuel José Cepeda Espinosa), T- 192 de 2010 (Magistrado Relator Jorge Ivan Palacio Palacio) e T-287 de 2010 (Magistrado Relator Gabriel Eduardo Mendoza Martelo).
  • 38
    Corte Constitucional. Sentença C-793 de 2009 (Magistrado Relator Gabriel Eduardo Mendoza Martelo).
  • 39
    Corte Constitucional. Sentença T-740 de 2011. Magistrado Relator Humberto Antonio Sierra Porto. Corte Constitucional, Sentença C-150 de 2003. Magistrado Relator Manuel José Cepeda Espinosa.
  • 40
    Corte Constitucional. Sentença T-740 de 2011. Magistrado Relator Humberto Antonio Sierra Porto. Corte Constitucional, Sentença C-150 de 2003. Magistrado Relator Manuel José Cepeda Espinosa.
  • 41
    Problema diferente, que aqui não abordarei, é se a quantidade mínima de água diária é necessariamente 50 litros por pessoa ou se, como o estabeleceu a Corte Constitucional da África do Sul, no caso Mazibuko, antes citado, esta quantidade pode ser menor e deve ser estabelecida pelo Legislador.
  • *
    O título do artigo publicado originalmente em espanhol na Revista Letras Jurídicas, Vol. 17 (1), 2012, p. 23-48, Medellín – Colombia, era “El derecho fundamental al agua y su intrincada satisfacción”. Nesta tradução, com a concordância do autor, optou-se por acrescentar a referência expressa ao direito colombiano, a fim de explicitar o foco da análise realizada. O mesmo autor, sem embargo, possui outro artigo sobre o direito fundamental à água em perspectiva internacional e comparada, publicado na mesma revista (Letras Jurídicas, Vol. 18, N. 2, 2013, p. 19-57) e que também será traduzido ao português para publicação no Brasil. O autor agradece a María José Viana, por seu valioso aporte na preparação dos materiais jurisprudenciais utilizados nesta investigação, e a ela e a Hubed Bedoya pelos agudos comentários formulados ao rascunho deste texto. Tradução de Graça Maria Borges de Freitas, Juíza do Trabalho em Minas Gerais-Brasil, Mestre em Direito Constitucional pela UFMG, Master em Argumentação Jurídica pela Universidad de Alicante-España, Doutoranda em Direito pela Universidad Externado de Colombia, em cotutela com a UFMG. E-mail: gmariabfreitas@ gmail.com; graca.borges@est.uexternado.edu.co

8. REFERÊNCIAS

  • ALEXY, Robert. La institucionalización de los derechos humanos en el Estado Constitucional Democrático. Derechos y libertades, núm. 8, 2000.
  • ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales 2 ed. Madrid: Centro de Estudios Políticos y Constitucionales, 2008.
  • BERNAL, Carlos. El concepto de servicio público en el orden jurídico colombiano. Letras Jurídicas, vol. 10, n. 1, 2005.
  • BERNAL, Carlos. El derecho de los derechos Bogotá: Universidad Externado de Colombia, 2005.
  • BERNAL, Carlos. El principio de proporcionalidad y los derechos fundamentales 3 ed. Madrid: Centro de Estudios Políticos y Constitucionales, 2007.
  • ORTIZ, G. Ariño. Principios de Derecho Público Económico Granada: Comares, 1999.
  • ORTS, F. Hurtado. La iniciativa pública local en la actividad económica Madrid: Civitas, 1994.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Abr 2019
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2015

Histórico

  • Recebido
    13 Out 2014
  • Aceito
    29 Dez 2014
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