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ESTRATÉGIAS DE TRANSIÇÃO OFENSIVA E DEFENSIVA NO HANDEBOL NA PERSPECTIVA DE TREINADORES EXPERIENTES

OFFENSIVE AND DEFENSIVE STRATEGIES IN HANDBALL DURING THE TRANSITION PHASE FROM THE PERSPECTIVE OF EXPERIENCED COACHES

RESUMO

O objetivo desta pesquisa foi mapear as estratégias de contra-ataque e retorno defensivo elucidadas por quatro treinadores experientes de handebol, cujos depoimentos foram tabulados, analisados e interpretados baseando-se na técnica do Discurso do Sujeito Coletivo (DSC). O DSC apontou que os treinadores exploram o contra-ataque como estratégia sempre que possível e consideram relevantes aspectos como a saída antecipada e sistematizada dos jogadores (no contra-ataque) e a pressão na saída de bola e o retorno antecipado dos jogadores (no retorno defensivo). Foram propostos quatro princípios operacionais de contra-ataque (controle da bola, busca por zonas livres, busca por vantagens numéricas e espaciais, arremesso de zonas favoráveis) e quatro de retorno defensivo (pressão no possuidor da bola, retorno antecipado, proteção de setores mais efetivos, organização do sistema defensivo). A elaboração de tais princípios operacionais para as transições podem auxiliar no planejamento de treinamentos específicos.

Palavras-chave:
Pedagogia do esporte; Handebol; Jogo de transição; Estratégia.

ABSTRACT

The aim of this work was to map counterattack and defensive return strategies adopted by four experienced handball coaches, whose speeches were tabulated, analyzed and interpreted based on the Collective Subject Discourse (CSD) technique. The DSC showed that coaches exploit the counter-attack strategy when possible and consider some relevant aspects such as early and systematic departure of the players (to the counterattack) and press when the opponent recovers the ball and the anticipated return of the players (the defensive return). Have been suggested four operational principles of counterattack (ball control, search for free zones, search for numerical and spatial advantages, throwing from favorable zones) and four defensive return (pressure on the ball possessor, early returns, protection of more effective zones, organization of the defensive system). The identification of those operational principles of the transition phase can guide the specific training process.

Keywords:
Sport pedagogy; Handball; Transition phase; Strategy.

Introdução

Os jogos esportivos coletivos (JEC) apresentam a alternância dinâmica entre as fases ofensiva e defensiva, demandando dos jogadores a necessidade de pensar o jogo em continuidade. A alternância de fases é caracterizada pela mudança da posse de bola entre as equipes (na qual a equipe que a possui está em processo ofensivo, ao passo que o adversário encontra-se em processo defensivo) e, para cada uma dessas, são identificadas regras de ação específicas, baseadas no regulamento do esporte e nos princípios operacionais11. Bayer C. O ensino dos desportos colectivos. Lisboa: Dinalivros; 1994..

Os princípios operacionais11. Bayer C. O ensino dos desportos colectivos. Lisboa: Dinalivros; 1994. caracterizam-se como mecanismos para atender aos objetivos de cada fase: a) ofensiva: manter a posse da bola, progredir em direção ao alvo e anotar o ponto; b) defensiva: recuperar a posse da bola, dificultar a progressão adversária e proteger o alvo. Oliver Coronado e Sosa González22. Oliver Coronado JF, Sosa González PI. La actividad física y deportiva extraescolar en los centros educativos: Balonmano. Barcelona: Ministerio de Educación y Cultura/Consejo Superior de Deportes; 1996. apontam ainda para condicionante na fase defensiva, na qual a finalização adversária deva ocorrer em condições adversas.

Na alternância entre essas fases emerge a fase de transição, caracterizada como um momento de grandes instabilidades para as equipes, devido aos possíveis desequilíbrios numéricos e espaço-temporais. A transição se refere à passagem de um lugar para outro33. Santana WC, Garcia OdB. A incidência do contra-ataque em jogos de futsal de alto rendimento. Pensar Prát 2007;10(1):153-62. ou quando a equipe vai da sua defesa para o ataque (transição ofensiva) e do ataque para a defesa (transição defensiva). Serão abordados nesta pesquisa as estratégias de retorno defensivo (na transição defensiva) e de contra-ataque (na transição ofensiva).

Nos últimos 30 anos o jogo de handebol se tornou mais veloz em virtude dos contra-ataques, seja de forma qualitativa (variedade de opções e formas de execução) e/ou quantitativa (número de ocorrências, aumento do número de gols anotados e melhoria da eficácia)44. Antón García JL. Balonmano: perfeccionamiento e investigación. Barcelona: INDE Publicaciones; 2000.

5. Moutinho S. Caracterização do contra-ataque no andebol: estudo em equipas seniores femininas. Porto: Universidade do Porto; 2006.
-66. Reyes A. Progresión del contraataque. Associación de Entrenadores de Balonmano 2008;46(280):23-27.. Nos Jogos Olímpicos de Munique (1972) o jogo apresentava em média 38 ataques (com 8,6% dos gols marcados em contra-ataque), enquanto no Campeonato Mundial do Japão (1997), o número de ataques foi de 55 (com 20,3% dos gols anotados em contra-ataque) (44. Antón García JL. Balonmano: perfeccionamiento e investigación. Barcelona: INDE Publicaciones; 2000..

O contra-ataque se caracteriza por uma passagem rápida da meia-quadra defensiva para a ofensiva, iniciando com a saída rápida para o ataque, a partir da recuperação da posse da bola33. Santana WC, Garcia OdB. A incidência do contra-ataque em jogos de futsal de alto rendimento. Pensar Prát 2007;10(1):153-62.,77. Rose Junior D, Lamas L. Análise de jogo no basquetebol: perfil ofensivo da Seleção Brasileira Masculina. Rev Bras Ed Fís Esp 2006;20(3):165-173.,88. Feu Molina S. Organización didáctica del proceso de enseñanza-Aprendizaje para la construcción del juego ofensivo en balonmano. E-Balonmano 2006;2(4):53-66. e terminando quando a equipe finaliza ou quando o adversário organiza seu sistema defensivo55. Moutinho S. Caracterização do contra-ataque no andebol: estudo em equipas seniores femininas. Porto: Universidade do Porto; 2006.,99. García JC. Balonmano. Madrid: Comitê Olímpico Espanhol; 1991.

10. Müller M, Gertstein H, Konzag I, Konzag G. Balonmano entrenarse jugando: el sistema de ejercicios completo Barcelona: Editorial Paidotribo; 1996.
-1111. Fernández JJR, Martínez LC, Suárez HV, Carral JMC. Balonmán: manual básico. Santiago: Edicións Lea; 1999..

No contra-ataque os atacantes buscam as melhores posições da quadra para o arremesso, preferencialmente em superioridade numérica55. Moutinho S. Caracterização do contra-ataque no andebol: estudo em equipas seniores femininas. Porto: Universidade do Porto; 2006.,1212. García JLA. Balonmano: táctica grupal ofensiva. Concepto, estrutura y metodología. Madrid: Gymnos Editorial; 1998.,1313. Menezes RP. Modelo de análise técnico-tática do jogo de handebol: necessidades perspectivas e implicações de um modelo de interpretação das situações de jogo em tempo real. [Tese de Doutorado em Educação Física]. Campinas: Universidade Estadual de Campinas. Programa de Pós-Graduação em Educação Física; 2011. ou vantagem espacial, originárias de uma rápida circulação da bola e/ou jogadores1414. Teodorescu L. Problemas de teoria e metodologia nos jogos desportivos. Lisboa: Horizonte; 1984.. Essa estratégia tem sido utilizada por equipes de diferentes níveis de rendimento, e se constitui em marcar rapidamente o gol a partir do êxito defensivo (recuperação da posse da bola) sem que o adversário organize seu sistema defensivo33. Santana WC, Garcia OdB. A incidência do contra-ataque em jogos de futsal de alto rendimento. Pensar Prát 2007;10(1):153-62.,1515. Delgado MG. El contragol. Real Federación Española de Balonmano 2004;2(226):14-20..

Diametralmente oposto ao contra-ataque, o retorno defensivo é visto como uma transição rápida do ataque para a defesa, marcado pela perda da posse da bola por uma equipe44. Antón García JL. Balonmano: perfeccionamiento e investigación. Barcelona: INDE Publicaciones; 2000., implicando no rápido retorno para o setor defensivo. Busca-se evitar ou atrasar o contra-ataque adversário e recuperar a bola22. Oliver Coronado JF, Sosa González PI. La actividad física y deportiva extraescolar en los centros educativos: Balonmano. Barcelona: Ministerio de Educación y Cultura/Consejo Superior de Deportes; 1996.,44. Antón García JL. Balonmano: perfeccionamiento e investigación. Barcelona: INDE Publicaciones; 2000., assim como tentar constituir o sistema defensivo com o maior número de jogadores possível e dificultar o arremesso adversário1111. Fernández JJR, Martínez LC, Suárez HV, Carral JMC. Balonmán: manual básico. Santiago: Edicións Lea; 1999..

Determinante nesse cenário complexo de jogo, o treinador é responsável por organizar e avaliar o processo de treinamento, a partir dos parâmetros do jogo e dos fatores de rendimento das equipes1616. Melendez-Falkowski MM, Enriquez-Fernández E. Los sistemas de juego ofensivos. Madrid: Editorial Esteban Sanz Martinez; 1988. para buscar maior eficácia durante a transição. Sistematizar o processo de ensino-aprendizagem-treinamento (EAT) referente a essa fase do jogo é uma questão emergente no handebol, o que torna relevante a descrição de seus princípios.

Esta pesquisa toma como problema central a investigação dos princípios relevantes do jogo de transição no handebol. Assim sendo, o objetivo foi mapear os comportamentos táticos relevantes indicados por treinadores de handebol experientes para as fases de transição ofensiva (especificamente da estratégia de contra-ataque) e defensiva (referente ao retorno defensivo).

Métodos

Fizeram parte da amostra desta pesquisa quatro treinadores de handebol experientes (com 23,5 ± 7 anos de atuação profissional), com resultados expressivos em âmbito nacional e reconhecimento na comunidade esportiva1717. Santana WC. A visão estratégico-tática de técnicos campeões da Liga Nacional de Futsal. [Tese de Doutorado em Educação Física]. Campinas: Universidade Estadual de Campinas. Programa de Pós-Graduação em Educação Física; 2008.. Os treinadores assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido aprovado por um Comitê de Ética em Pesquisa institucional (parecer CEP 094/2011).

Os critérios para inclusão na amostra foram: a participação na comissão técnica da Seleção Brasileira feminina em um dos três últimos ciclos Olímpicos (entre 2004 e 2012) e/ou ter sido finalista em uma das duas competições nacionais femininas promovidas pela Confederação Brasileira de Handebol (Liga Nacional ou Campeonato Brasileiro).

A opção pelo caráter qualitativo desta pesquisa se justifica: a) pela ênfase aos elementos da experiência humana; b) pela natureza descritiva dos dados; c) pelo contexto no qual se manifesta o conhecimento dos indivíduos; d) pela atenção do pesquisador com os significados atribuídos aos processos (e não produtos); e e) pela análise indutiva dos dados1818. Triviños A. Introdução à pesquisa em ciências sociais: a pesquisa qualitativa em educação. São Paulo: Atlas; 1987..

A entrevista é um importante meio de obtenção de dados na pesquisa qualitativa1919. Marconi MA, Lakatos EM. Metodologia científica. 6.ed. São Paulo: Atlas ; 2011., pela obtenção de informações que dificilmente seriam acessadas em uma pesquisa bibliográfica ou de observação. O instrumento de entrevista semiestruturada é parte de um estudo mais amplo, cujo recorte foi composto por três questões para o mapeamento das variáveis na fase de transição: a) “Você é a favor ou contra induzir sua equipe ao contra-ataque? Por quê?”; b) “O que você faz ou treina para que o contra-ataque seja induzido?”; c) “O que você faz ou treina para que o contra-ataque do adversário seja ineficaz?”.

As entrevistas foram gravadas na íntegra e a transcrição iniciada no mesmo dia, para manter o teor e o significado dos discursos latentes para o pesquisador2020. Oliver D, Serovich J, Mason T. Constraints and opportunities with interview transcription: Towards reflection in qualitative research. Social Forces 2005;84(2):1273-89.. Os discursos foram analisados com base no método do Discurso do Sujeito Coletivo (DSC), que permite organizar, tabular e interpretar dados qualitativos obtidos a partir das entrevistas, para a construção do pensamento da coletividade, partindo dos fragmentos dos discursos individuais2121. Lefèvre F, Lefèvre AMC. Pesquisa de representação social: um enfoque qualiquantitativo. 2.ed. Brasília: Liber Livro Editora; 2012.. Três figuras metodológicas constituem o DSC: as ideias centrais (IC: que representam a descrição objetiva de um determinado discurso sobre a temática); as expressões-chave (ECH: transcrições literais de determinados trechos do discurso); e o DSC (composto pelas ECH que possuem a mesma IC)2121. Lefèvre F, Lefèvre AMC. Pesquisa de representação social: um enfoque qualiquantitativo. 2.ed. Brasília: Liber Livro Editora; 2012..

O DSC foi redigido na primeira pessoa do singular, a partir de trechos contínuos ou descontínuos (ECH), representando o discurso de todos como se fosse o de apenas um e reduzindo possível polissemia proveniente das ECH e das IC. Este método tem sido utilizado na área de Ciências do Esporte para identificar aspectos referentes ao processo de EAT1313. Menezes RP. Modelo de análise técnico-tática do jogo de handebol: necessidades perspectivas e implicações de um modelo de interpretação das situações de jogo em tempo real. [Tese de Doutorado em Educação Física]. Campinas: Universidade Estadual de Campinas. Programa de Pós-Graduação em Educação Física; 2011.,2222. Menezes RP, Marques RFR, Nunomura M. O ensino do handebol na categoria infantil a partir dos discursos de treinadores experientes. Movimento. 2015;21(2):463-77..

Os resultados serão apresentados em três subseções, a partir das temáticas envolvidas nos questionamentos centrais desta pesquisa: a) indução ao contra-ataque; b) modelação e treinamento do contra-ataque; e c) defendendo o contra-ataque adversário. Assim sendo, os DSC elaborados constituem a base para a identificação dos parâmetros considerados relevantes pelos treinadores e para as reflexões apresentadas por esta pesquisa. No final da seção "Resultados e Discussão" serão discutidos os princípios operacionais elaborados a partir da análise das três subseções supracitadas.

Na apresentação de cada DSC será identificada a procedência da fala (S1, S2, S3, S4) de forma sobrescrita e, para cada questionamento, será apresentada uma breve discussão e contextualização com a literatura específica do handebol.

Resultados e Discussão

Indução ao contra-ataque:

Os aspectos apontados pelos treinadores sobre a indução aos contra-ataques estão apresentados no Quadro 1, com as IC identificadas (IC-A, IC-B, IC-C, IC-D) e os DSC construídos (DSC1, DSC2, DSC3, DSC4).

Quadro 1
Motivos para a indução aos contra-ataques

Quando os treinadores são indagados sobre os motivos para indução ao contra-ataque o primeiro ponto destacado é a vantagem espacial (IC-A), por ocupar regiões favoráveis ao arremesso antes dos adversários. Esse fator aponta para a disputa por espaços mais eficazes durante o contra-ataque (preferencialmente na região central da quadra)1616. Melendez-Falkowski MM, Enriquez-Fernández E. Los sistemas de juego ofensivos. Madrid: Editorial Esteban Sanz Martinez; 1988. e a tentativa de uma finalização rápida99. García JC. Balonmano. Madrid: Comitê Olímpico Espanhol; 1991..

A busca por melhores regiões ocorre de modo que os atacantes possuam menor pressão espaço-temporal no contra-ataque, aproveitando os amplos espaços da quadra (em profundidade e largura) para a continuidade do jogo ofensivo. Trata-se, segundo os treinadores, de aproveitar a própria evolução da dinâmica do jogo de handebol para se pautar em uma estratégia de jogo que permita chegar mais rapidamente ao gol adversário, com menores interferências adversárias.

O segundo ponto abordado pelos treinadores é a vantagem numérica no contra-ataque quando comparado ao ataque posicional (IC-B). A superioridade ou igualdade numérica são apontadas como diretrizes do contra-ataque, pelo aproveitamento do balanço espacial favorável e desorganização defensiva1010. Müller M, Gertstein H, Konzag I, Konzag G. Balonmano entrenarse jugando: el sistema de ejercicios completo Barcelona: Editorial Paidotribo; 1996.,1111. Fernández JJR, Martínez LC, Suárez HV, Carral JMC. Balonmán: manual básico. Santiago: Edicións Lea; 1999.,1616. Melendez-Falkowski MM, Enriquez-Fernández E. Los sistemas de juego ofensivos. Madrid: Editorial Esteban Sanz Martinez; 1988.. Para os treinadores a saída antecipada de alguns jogadores visa alcançar a vantagem numérica na quadra adversária para o desenvolvimento do contra-ataque direto (ou simples) ou ampliado (ou sustentado)1111. Fernández JJR, Martínez LC, Suárez HV, Carral JMC. Balonmán: manual básico. Santiago: Edicións Lea; 1999.,1313. Menezes RP. Modelo de análise técnico-tática do jogo de handebol: necessidades perspectivas e implicações de um modelo de interpretação das situações de jogo em tempo real. [Tese de Doutorado em Educação Física]. Campinas: Universidade Estadual de Campinas. Programa de Pós-Graduação em Educação Física; 2011.,1616. Melendez-Falkowski MM, Enriquez-Fernández E. Los sistemas de juego ofensivos. Madrid: Editorial Esteban Sanz Martinez; 1988..

Os contra-ataques são desenvolvidos em até três etapas44. Antón García JL. Balonmano: perfeccionamiento e investigación. Barcelona: INDE Publicaciones; 2000.,55. Moutinho S. Caracterização do contra-ataque no andebol: estudo em equipas seniores femininas. Porto: Universidade do Porto; 2006.,1313. Menezes RP. Modelo de análise técnico-tática do jogo de handebol: necessidades perspectivas e implicações de um modelo de interpretação das situações de jogo em tempo real. [Tese de Doutorado em Educação Física]. Campinas: Universidade Estadual de Campinas. Programa de Pós-Graduação em Educação Física; 2011.: a) primeira onda: saída rápida de até três jogadores que ocupam a quadra adversária para receber um passe longo (contra-ataque simples); b) segunda onda: saída rápida dos jogadores mais recuados do sistema defensivo (quando a primeira onda não foi possível) para alcançar superioridade numérica na quadra adversária (contra-ataque ampliado ou sustentado); c) terceira onda: continuidade do contra-ataque apoiado, explorando a superioridade numérica diante da desorganização defensiva adversária (contra-ataque continuado). A terceira onda deve proporcionar um encadeamento com a quarta fase do ataque (jogo posicional)44. Antón García JL. Balonmano: perfeccionamiento e investigación. Barcelona: INDE Publicaciones; 2000.,1313. Menezes RP. Modelo de análise técnico-tática do jogo de handebol: necessidades perspectivas e implicações de um modelo de interpretação das situações de jogo em tempo real. [Tese de Doutorado em Educação Física]. Campinas: Universidade Estadual de Campinas. Programa de Pós-Graduação em Educação Física; 2011..

O terceiro aspecto elucidado pelos treinadores se refere à tendência facilitada pelas regras (IC-C) e, embora as razões não sejam explicitadas, algumas possibilidades são apontadas: a) a vantagem do ataque após sofrer uma falta (dando continuidade ao jogo ofensivo); b) dar o tiro de saída rapidamente após sofrer o gol sem aguardar o retorno adversário. Esta possibilidade é denominada contragol, definida como uma ação individual ou coletiva, a partir do tiro de saída, que objetiva marcar um gol imediatamente após ter sofrido um55. Moutinho S. Caracterização do contra-ataque no andebol: estudo em equipas seniores femininas. Porto: Universidade do Porto; 2006.,1515. Delgado MG. El contragol. Real Federación Española de Balonmano 2004;2(226):14-20..

O quarto aspecto apontado pelos treinadores se refere à preparação física dos jogadores (IC-D), e citam que a cada dia os jogadores estão mais rápidos, transformando o desenvolvimento do jogo em contra-ataque em uma opção para toda a partida. Este aspecto é evidenciado na ocupação, pelos jogadores mais velozes, de postos específicos defensivos que propiciam o desenvolvimento de um jogo antecipado de transição. O handebol no século XXI é jogado com maiores velocidades, cujos tempos mais curtos em posse da bola e o número maior de posses de bola se deve à maior incidência de contra-ataques55. Moutinho S. Caracterização do contra-ataque no andebol: estudo em equipas seniores femininas. Porto: Universidade do Porto; 2006..

Salienta-se que o treinamento específico para o contra-ataque deve preparar os jogadores para resistir aos estímulos de alta intensidade durante toda a partida, associado à condição tática de iniciar os deslocamentos durante o arremesso adversário. O aumento de velocidade do jogo pauta-se, portanto, na assunção de um modelo de jogo que prepara os jogadores para suportar tal demanda energética, sugerindo que não foram os jogadores mais rápidos que modificaram o jogo, mas a mudança de concepção do jogo que modificou as características dos jogadores.

Modelação e treinamento do contra-ataque:

Os aspectos apontados pelos treinadores envolvendo as condutas para a indução ao contra-ataque estão apresentados no Quadro 2, com as IC identificadas (IC-E, IC-F) e os DSC construídos (DSC5, DSC6).

Quadro 2
Condutas dos treinadores na indução do contra-ataque

Quando a questão central envolve a dinâmica para indução do contra-ataque os treinadores citam a vantagem de atacar rapidamente contra uma defesa desorganizada, favorecendo a orientação e o desenvolvimento das ações dos atacantes, corroborando os preceitos apontados por Melendez-Falkowski e Enriquez-Fernández1616. Melendez-Falkowski MM, Enriquez-Fernández E. Los sistemas de juego ofensivos. Madrid: Editorial Esteban Sanz Martinez; 1988.. Um dos fatores apontados é a saída sistematizada em contra-ataque (IC-E) após a recuperação da posse da bola que, na visão dos treinadores, necessita de diretrizes que orientem os jogadores à ocupação de regiões específicas, mais favoráveis à progressão em direção ao gol.

Diferentes possibilidades de saída antecipada são apontadas pelos treinadores, como a dos jogadores do mesmo setor ou do setor oposto ao da finalização ou, caso o arremesso seja executado da região central, os defensores desse setor se deslocam até uma zona pré-estabelecida, enquanto os demais defensores tentam recuperar a posse da bola. Os jogadores que possuem boas condições para o contra-ataque devem ocupar postos específicos no setor defensivo que permitam a saída eficaz, sendo os pontas os primeiros a saírem1616. Melendez-Falkowski MM, Enriquez-Fernández E. Los sistemas de juego ofensivos. Madrid: Editorial Esteban Sanz Martinez; 1988.. Reyes66. Reyes A. Progresión del contraataque. Associación de Entrenadores de Balonmano 2008;46(280):23-27. aponta que os jogadores mais criativos devem receber o primeiro passe, para que os jogadores mais velozes se preocupem em alcançar rapidamente a zona ofensiva. Diante das saídas antecipadas dos jogadores aumenta-se o risco da equipe adversária recuperar a posse da bola, o que implica na necessidade de incorporar estratégias no treinamento para coberturas nas regiões aclaradas com a saída antecipada dos jogadores.

O segundo fator apontado pelos treinadores é a indução dos jogadores adversários a erros (IC-F), pela finalização em condições desfavoráveis como: a) desequilibrando os atacantes; b) permitindo arremessos de setores menos eficazes e/ou pelos jogadores menos habilidosos. Outro aspecto manifestado é a participação defensiva, pressionando os atacantes e restringindo seus espaços para execução dos elementos técnico-táticos ou apoiar os companheiros. Os defensores devem tentar recuperar a posse da bola o mais precocemente possível, induzindo o adversário ao erro (como a violação das regras), interceptando um passe ou dificultando o arremesso1616. Melendez-Falkowski MM, Enriquez-Fernández E. Los sistemas de juego ofensivos. Madrid: Editorial Esteban Sanz Martinez; 1988..

O contra-ataque, portanto, não deriva somente de acasos da dinâmica do jogo, mas de ações defensivas efetivas que constituem uma atitude permanente e contínua desde a fase defensiva, atreladas a regras de ação que orientam a conduta dos jogadores na transição defesa-ataque99. García JC. Balonmano. Madrid: Comitê Olímpico Espanhol; 1991.,1111. Fernández JJR, Martínez LC, Suárez HV, Carral JMC. Balonmán: manual básico. Santiago: Edicións Lea; 1999.. Assim, os treinadores abordam aspectos como dificultar ou evitar os arremessos adversários pelos jogadores mais efetivos, cujas estratégias defensivas induzam a arremessos sob maior pressão nas dimensões espacial e temporal.

A continuidade do contra-ataque é preconizada pelos treinadores devido às vantagens do jogo em grandes espaços com o sistema defensivo em desequilíbrio e, não havendo finalização, o jogo continua sendo desenvolvido como um ataque organizado, ainda em altas velocidades55. Moutinho S. Caracterização do contra-ataque no andebol: estudo em equipas seniores femininas. Porto: Universidade do Porto; 2006.. O ataque organizado pauta-se na continuidade do contra-ataque, garantindo a manutenção da velocidade de execução das ações ofensivas e a utilização de diferentes elementos técnico-táticos1313. Menezes RP. Modelo de análise técnico-tática do jogo de handebol: necessidades perspectivas e implicações de um modelo de interpretação das situações de jogo em tempo real. [Tese de Doutorado em Educação Física]. Campinas: Universidade Estadual de Campinas. Programa de Pós-Graduação em Educação Física; 2011..

Constituem-se como princípios do contra-ataque e como fatores relacionados ao êxito desta estratégia: a) o jogador que recebe a bola deve evitar a falta; b) a busca pela região central da quadra1111. Fernández JJR, Martínez LC, Suárez HV, Carral JMC. Balonmán: manual básico. Santiago: Edicións Lea; 1999.,1616. Melendez-Falkowski MM, Enriquez-Fernández E. Los sistemas de juego ofensivos. Madrid: Editorial Esteban Sanz Martinez; 1988.; c) o desenvolvimento do jogo em profundidade e largura1111. Fernández JJR, Martínez LC, Suárez HV, Carral JMC. Balonmán: manual básico. Santiago: Edicións Lea; 1999.,1212. García JLA. Balonmano: táctica grupal ofensiva. Concepto, estrutura y metodología. Madrid: Gymnos Editorial; 1998.,1616. Melendez-Falkowski MM, Enriquez-Fernández E. Los sistemas de juego ofensivos. Madrid: Editorial Esteban Sanz Martinez; 1988.; d) a continuidade do jogo ofensivo; e) evitar o drible excessivo (exceto na situação de 1x0) e os passes em suspensão; f) a manutenção do desenvolvimento das ações em várias linhas de passe1111. Fernández JJR, Martínez LC, Suárez HV, Carral JMC. Balonmán: manual básico. Santiago: Edicións Lea; 1999.; g) a seleção do melhor passe sem perda de velocidade66. Reyes A. Progresión del contraataque. Associación de Entrenadores de Balonmano 2008;46(280):23-27.,99. García JC. Balonmano. Madrid: Comitê Olímpico Espanhol; 1991.; e h) identificar a posição e os deslocamentos dos companheiros e dos adversários99. García JC. Balonmano. Madrid: Comitê Olímpico Espanhol; 1991.,1212. García JLA. Balonmano: táctica grupal ofensiva. Concepto, estrutura y metodología. Madrid: Gymnos Editorial; 1998., apresentando trajetórias bem definidas66. Reyes A. Progresión del contraataque. Associación de Entrenadores de Balonmano 2008;46(280):23-27..

Para os treinadores uma das formas de induzir a saída em contra-ataque se dá a partir de erros dos adversários, determinados por ações defensivas coletivas (incluindo o goleiro) para recuperar o rebote defensivo e controlar a posse da bola. O contra-ataque apresenta-se como uma tendência irrevogável, por fatores como as vantagens espaciais e numéricas e as características dos jogadores relacionadas às capacidades físicas (como a velocidade). Desta forma, a sistematização do treinamento dos contra-ataques visa preparar os jogadores (individualmente e coletivamente) para desenvolver os elementos técnico-táticos desde a recuperação da posse da bola até a finalização (ou continuidade como ataque posicional).

Defendendo o contra-ataque adversário:

Os aspectos abordados pelos treinadores para dificultar os contra-ataques da equipe adversária estão apresentados no Quadro 3, com as IC identificadas (IC-G, IC-H, IC-I, IC-J, IC-K) e os DSC construídos (DSC7, DSC8, DSC9, DSC10, DSC11).

Quadro 3
Comportamentos individuais e coletivos que objetivam dificultar os contra-ataques da equipe adversária

Com relação aos comportamentos individuais e coletivos que visam dificultar o contra-ataque adversário e/ou um rápido retorno defensivo, os treinadores apontam como fator preponderante a pressão na saída de bola adversária para dificultar as ações ofensivas no início da transição. São abordadas estratégias como: a) pressionar o goleiro adversário (com o pivô e com o jogador que arremessou) para atrasar a sua tomada de decisão e permitir que os defensores ocupem regiões favoráveis antes dos atacantes; b) pressionar os jogadores que recebem o primeiro passe, dificultando a organização do contra-ataque.

Os apontamentos dos treinadores são abordados por Antón García44. Antón García JL. Balonmano: perfeccionamiento e investigación. Barcelona: INDE Publicaciones; 2000., para o qual a bola dificilmente é recuperada quando o adversário a intercepta, a não ser em regiões próximas à área, quando não há controle pleno da bola. Assim, emerge a necessidade de pressionar o jogador que recuperou a bola e os seus possíveis apoios, pelos jogadores que estão mais próximos dela, considerando a disputa pela sua posse como uma atitude permanente e imediata quando se passa para a fase defensiva2323. García JLA. Balonmano: táctica grupal defensiva. Concepto, estructura y metodología. Granada: Grupo Editorial Universitario; 2002..

O segundo comportamento aludido pelos treinadores trata do retorno antecipado de alguns jogadores (do mesmo setor ou do setor oposto ao arremesso), para marcar os adversários que iniciam antecipadamente os contra-ataques. Tal como apresentado pelos treinadores, verifica-se a importância de retornar rapidamente e antecipadamente à situação defensiva, principalmente em direção ao setor central da quadra22. Oliver Coronado JF, Sosa González PI. La actividad física y deportiva extraescolar en los centros educativos: Balonmano. Barcelona: Ministerio de Educación y Cultura/Consejo Superior de Deportes; 1996.,44. Antón García JL. Balonmano: perfeccionamiento e investigación. Barcelona: INDE Publicaciones; 2000.. Este retorno rápido é garantido inicialmente pelos jogadores da primeira linha ofensiva que não participaram da situação de finalização e organizam rapidamente o sistema defensivo44. Antón García JL. Balonmano: perfeccionamiento e investigación. Barcelona: INDE Publicaciones; 2000.,1111. Fernández JJR, Martínez LC, Suárez HV, Carral JMC. Balonmán: manual básico. Santiago: Edicións Lea; 1999..

O terceiro aspecto se refere à rápida organização do sistema defensivo, para a qual os treinadores apontam: a) o retorno rápido dos jogadores até a linha de 9 metros da quadra defensiva; b) o retorno em duas linhas de três jogadores (em direção à linha de 6 metros da sua quadra); e c) o retorno provisório no sistema defensivo 3:3, para então recompor o sistema original. Os treinadores sugerem a necessidade de uma diretriz, na qual cada jogador saiba o momento certo para retornar, o setor que irá ocupar e a forma que será seu deslocamento.

Essa rápida organização defensiva consiste na premissa básica de dificultar o aproveitamento dos espaços produzidos pelo desequilíbrio defensivo durante a organização do sistema e evitar o gol adversário22. Oliver Coronado JF, Sosa González PI. La actividad física y deportiva extraescolar en los centros educativos: Balonmano. Barcelona: Ministerio de Educación y Cultura/Consejo Superior de Deportes; 1996.,1111. Fernández JJR, Martínez LC, Suárez HV, Carral JMC. Balonmán: manual básico. Santiago: Edicións Lea; 1999., cuja efetividade depende de uma distribuição equilibrada dos jogadores que retornam, referenciada à zona na qual a bola é perdida44. Antón García JL. Balonmano: perfeccionamiento e investigación. Barcelona: INDE Publicaciones; 2000..

O quarto fator abordado pelos treinadores está relacionado com a realização de uma falta leal (que é possível e faz parte do jogo) no jogador em posse da bola, ainda em sua quadra defensiva ou próxima ao meio da quadra, permitindo que os defensores estruturem seu sistema de jogo para evitar a rápida construção do jogo ofensivo e dificultar a estruturação do contra-ataque. Fernández Romero et al.1111. Fernández JJR, Martínez LC, Suárez HV, Carral JMC. Balonmán: manual básico. Santiago: Edicións Lea; 1999. apontam que uma falta tática (com intenção ou motivação estratégica) pode diminuir as possibilidades de contra-ataque e facilitar o retorno defensivo.

A quinta consideração feita pelos treinadores quanto ao retorno defensivo envolve a efetividade na fase ofensiva, com arremessos em condições adequadas. A diminuição dos erros ofensivos é relevante e necessita de uma análise adequada, independentemente dos resultados ou das consequências do erro2323. García JLA. Balonmano: táctica grupal defensiva. Concepto, estructura y metodología. Granada: Grupo Editorial Universitario; 2002., uma vez que o ataque efetivo limita o contra-ataque adversário, cujos erros na fase ofensiva são pré-requisitos para a saída rápida dos adversários.

Dentre as preocupações do retorno defensivo estão as ideias de pressionar a saída adversária (remontando a ideia de evitar o contra-ataque)1111. Fernández JJR, Martínez LC, Suárez HV, Carral JMC. Balonmán: manual básico. Santiago: Edicións Lea; 1999. e de organizar o retorno ao sistema defensivo (incluindo o retorno antecipado de alguns jogadores) para desenvolver procedimentos táticos que diminuam as vantagens dos atacantes e o acesso às regiões de maior efetividade (como o centro da quadra)44. Antón García JL. Balonmano: perfeccionamiento e investigación. Barcelona: INDE Publicaciones; 2000.,1010. Müller M, Gertstein H, Konzag I, Konzag G. Balonmano entrenarse jugando: el sistema de ejercicios completo Barcelona: Editorial Paidotribo; 1996..

Impedir os contra-ataques adversários é um desafio constante, conforme exposto pelos treinadores, que apontam como uma das principais formas a execução de uma pressão sobre os possíveis receptores da bola, para diminuir a velocidade do contra-ataque e tentar recuperar a posse da bola no início da transição. Essa pressão pode ser executada por jogadores pré-determinados ou mesmo pelo goleiro da própria equipe.

Simultaneamente à pressão nos atacantes, há a preocupação com o rápido retorno defensivo e com o reposicionamento dos defensores em seu sistema, assim evidenciado pelos treinadores. O retorno estruturado pode ser associado, segundo esses, ao retorno antecipado de alguns jogadores, preferencialmente nas zonas que possuem os atacantes mais velozes e que se antecipam para a saída em contra-ataque, ou mesmo à falta em uma zona específica.

Princípios norteadores da transição no handebol

As informações provenientes dos discursos dos treinadores (que constituíram cada DSC), em relação à fase de transição, foram importantes para identificar as principais premissas do retorno defensivo e do contra-ataque. Os discursos abordam temáticas variadas acerca da transição, como o mapeamento dos parâmetros individuais e coletivos, as ocupações espaciais e as possibilidades de sincronismo entre os jogadores, que culmina na elaboração e organização dos elementos organizacionais do jogo1414. Teodorescu L. Problemas de teoria e metodologia nos jogos desportivos. Lisboa: Horizonte; 1984..

O contra-ataque se apresenta como uma estratégia imprescindível para o sucesso das equipes, pois proporciona vantagens numéricas e espaciais a partir de elementos relacionados: à tática (organização das estratégias), à técnica (finalização sem oposição) e às capacidades motoras (como a velocidade de deslocamento).

Dada essa importância, entendemos que durante o processo de EAT o contra-ataque deva ser abordado de forma sistemática, englobando diferentes situações. Essas situações devem: a) considerar os princípios de cooperação, oposição e finalização2424. Garganta J. Para uma teoria dos jogos desportivos colectivos. In: Graça A, Oliveira J, editors. O ensino dos jogos desportivos. 3.ed. Porto: Universidade do Porto /Centro de Estudos dos Jogos Desportivos; 1998. p. 11-26.; b) enfatizar suas possibilidades (simples ou apoiado); c) utilizar diferentes relações numéricas; d) partir de diferentes sistemas e elementos técnico-táticos defensivos (como flutuações e dissuasões); e) com ou sem participação do goleiro33. Santana WC, Garcia OdB. A incidência do contra-ataque em jogos de futsal de alto rendimento. Pensar Prát 2007;10(1):153-62.,1616. Melendez-Falkowski MM, Enriquez-Fernández E. Los sistemas de juego ofensivos. Madrid: Editorial Esteban Sanz Martinez; 1988..

A abordagem a partir de diferentes métodos de ensino subsidia diferentes possibilidades de resolução de situações-problema pelos jogadores, seja pelos elementos técnicos ou elementos técnico-táticos. Adotar abordagens variadas pode minimizar possíveis erros em contra-ataques, como não se desmarcar quando um defensor está próximo, deslocar-se em baixas velocidades ou para regiões pouco eficazes e a não observância de superioridade ou igualdade numérica1616. Melendez-Falkowski MM, Enriquez-Fernández E. Los sistemas de juego ofensivos. Madrid: Editorial Esteban Sanz Martinez; 1988..

A preferência pelo contra-ataque ao longo dos anos o coloca como uma tendência crescente do handebol moderno44. Antón García JL. Balonmano: perfeccionamiento e investigación. Barcelona: INDE Publicaciones; 2000.,55. Moutinho S. Caracterização do contra-ataque no andebol: estudo em equipas seniores femininas. Porto: Universidade do Porto; 2006.,1111. Fernández JJR, Martínez LC, Suárez HV, Carral JMC. Balonmán: manual básico. Santiago: Edicións Lea; 1999.. Baseando-se nas melhorias qualitativas e quantitativas dessa estratégia, o treinamento no handebol busca aprimorar o jogo de transição, seja com ênfase na demanda metabólica para sustentar o jogo em alta velocidade, seja por soluções táticas que permitam aos jogadores atuarem diante das situações-problema.

Menezes1313. Menezes RP. Modelo de análise técnico-tática do jogo de handebol: necessidades perspectivas e implicações de um modelo de interpretação das situações de jogo em tempo real. [Tese de Doutorado em Educação Física]. Campinas: Universidade Estadual de Campinas. Programa de Pós-Graduação em Educação Física; 2011. aponta como princípios operacionais para a transição ofensiva: saída rápida em contra-ataque, manutenção da posse da bola, buscar arremessar de zonas favoráveis e finalizar com o sistema adversário em desequilíbrio. Para a transição defensiva o autor propõe os seguintes princípios: retardar ou impedir o contra-ataque adversário, conduzir os atacantes para zonas de difícil finalização e retornar rapidamente ao setor defensivo, de forma organizada. Assim, o contra-ataque e o retorno defensivo podem ser considerados como estratégias específicas às duas fases distintas do jogo (as transições), porém inter-relacionadas com as fases ofensivas e defensivas.

Diante do exposto entendemos que os princípios operacionais são importantes balizadores para o treinamento do contra-ataque e do retorno defensivo, orientando os encadeamentos nos planos espacial e temporal, cujas ações dos jogadores devem aumentar a complexidade do jogo para o adversário. Considerando o exposto na literatura e o teor das entrevistas com os treinadores, assim como as demandas espaço-temporais e a necessidade de anotar o gol (em contra-ataque) ou de retornar rapidamente, apontamos os princípios operacionais apresentados na Figura 1.

Figura 1. Princípios
operacionais específicos ao contra-ataque e ao retorno defensivo

A dualidade de forças demonstrada entre as estratégias de contra-ataque e de retorno defensivo sugerem procedimentos específicos, na medida em que trazem comportamentos opostos e com diferentes finalidades2525. Suárez TA, Argilaga MA. Evaluación prospectiva en programas de entrenamiento de fútbol a 7 mediante indicadores de éxito en diseños diacrónicos intensivos retrospectivos. Psicothema 2000;12(2):52-5.. Essa dimensão tática externada pelas relações de oposição e cooperação2424. Garganta J. Para uma teoria dos jogos desportivos colectivos. In: Graça A, Oliveira J, editors. O ensino dos jogos desportivos. 3.ed. Porto: Universidade do Porto /Centro de Estudos dos Jogos Desportivos; 1998. p. 11-26. aponta para a constituição central do jogo, pois ocorrem em um contexto influenciado e determinado por diferentes configurações que o jogo apresenta em seu decorrer2626. Peñas CL, Anguera Argilaga M. Utilización del análisis secuencial en el estudio de las interacciones entre jugadores en el fútbol de rendimiento. Rev Psic Deporte 2003;12(1):27-37..

Conclusões

A importância dada atualmente ao contra-ataque e ao retorno defensivo no handebol serviu como prerrogativa para balizar os elementos estudados nesta pesquisa, por se apresentar como uma tendência de jogo moderno, como verificado no discurso dos treinadores experientes e dos apontamentos realizados pelos diferentes autores consultados.

Nota-se, a partir dos relatos dos treinadores e das informações provenientes da revisão de literatura, que o contra-ataque recebe uma atenção maior do que o retorno defensivo. Neste sentido, esta pesquisa procurou contribuir com uma maior oferta de subsídios teóricos sobre esta temática, dentre os quais foram elucidadas soluções de retorno defensivo e de contra-ataques, apontando erros prováveis e possibilidades de treinamento.

Um fator relevante apontado pelo DSC e pelos autores consultados é a compreensão da transição como um “sistema de jogo”, digna de enfoque estratégico em termos de trajetórias e de diretrizes norteadoras da ocupação espacial, assim como qualquer outro sistema (ofensivo e defensivo) e que demanda adaptações em decorrência das alterações no cenário técnico-tático do jogo.

Os princípios operacionais propostos para o contra-ataque e para o retorno defensivo apresentam substanciais implicações práticas, ao passo que possibilitam identificar aspectos pontuais da dinâmica da transição e, desta forma, podem ser utilizadas pelos treinadores para sistematizar os treinamentos de suas equipes de maneira específica. Assim, passa a servir como um referencial para a elaboração de exercícios/jogos específicos e como um balizador de possíveis procedimentos pedagógicos a serem utilizados.

Entendemos que há um grau de dificuldade significativo nas ações de contra-ataque e de retorno defensivo devido à velocidade das ações, como os passes em movimentos rápidos ou a busca rápida pelo posto específico defensivo sem deixar de cobrir o setor da quadra no qual a bola se encontra.

Observamos a tendência de que as equipes passem grande parte do jogo em situações de contra-ataque, por serem mais favoráveis à finalização quando comparadas ao ataque posicional, o que demanda maior participação na fase de transição defensiva. Assim, há uma demanda metabólica diferenciada, visto que o jogo de transição e o jogo posicional assumem características diferentes, o que aponta diretamente para a necessidade de contextualização e especificidade das sessões de treinamento.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2016

Histórico

  • Recebido
    28 Jan 2016
  • Revisado
    23 Maio 2016
  • Aceito
    28 Out 2016
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