NÚMERO DE PASSOS DIÁRIO E SUA ASSOCIAÇÃO COM FATORES DE RISCO CARDIOMETABÓLICOS EM PROFESSORES

DAILY STEPS AND THEIR ASSOCIATION WITH CARDIOMETABOLIC RISK FACTORS IN TEACHERS

RESUMO

As DCV são as principais causas de morbimortalidade mundial, sendo o sedentarismo um dos principais fatores de risco para seu desenvolvimento. Assim, esta investigação teve como objetivo avaliar o número de passos diários e sua associação com fatores de risco cardiometabólicos (FRCV) em professores. Foram avaliados o número de passos diários, parâmetros antropométricos, hemodinâmicos e bioquímicos de 150 professores, divididos em Dois grupos (G1 < 10000 passos e G2 ≥ 10000 passos). Para determinar a associação e magnitude desta entre FRCV e níveis insuficientes de atividade física foram utilizados o teste qui quadrado e razão de chances. Correlação de Pearson foi utilizada para verificar a relação entre o número de passos e as demais variáveis e curvas ROC para avaliar o ponto de corte de passos diários em relação a cada FRCV. Entre os docentes avaliados, 42% eram ativos fisicamente, apresentando melhor perfil antropométrico, hemodinâmico e bioquímico. Hipertensão arterial e dislipidemias foram os FRCV que apresentaram associação com a condição de baixo número de passos. O ponto de corte de número de passos indicou valores superiores a 12,500 passos/dia para proteção contra os FRCV. Assim, a maioria dos docentes era insuficientemente ativa, destacando que aqueles que atingiram 10000 passos por dia de média, apresentaram um melhor perfil cardiometabólico.

Palavras-chave:
Fatores de risco; Atividade motora; Hipertensão; Obesidade; Professores escolares

ABSTRACT

Cardiovascular diseases are the main causes of worldwide morbidity and mortality, with a sedentary lifestyle being one of the main risk factors for its development. Thus, this investigation aimed to evaluate the number of daily steps and their association with cardiometabolic risk factors (CRF) in teachers. The number of daily steps, anthropometric, hemodynamic and biochemical parameters of 150 teachers were evaluated, divided into two groups (G1 <10,000 steps and G2 ≥ 10,000 steps). To determine the association and magnitude of this between CRF and insufficient levels of physical activity, the chi square test and odds ratio were used. Pearson's correlation was used to verify the relationship between the number of steps and the other variables and ROC curves to assess the cutoff point of daily steps in relation to each CRF. Among the teachers evaluated, 42% were physically active, with a better anthropometric, hemodynamic and biochemical profile. Arterial hypertension and dyslipidemia were the CRF that were associated with the condition of low number of steps. The cut-off point for the number of steps indicated values greater than 12,500 steps/day for protection against CRF. Thus, most teachers were insufficiently active, highlighting that those who reached 10,000 steps per day on average, had a better cardiometabolic profile.

Keywords:
Risk factors; Motor activity; Hypertension; Obesity; School teachers

Introdução

A gênese e o desenvolvimento das doenças cardiovasculares estão intimamente relacionadas a hábitos de vida inadequados, principalmente relacionados à inatividade física, alimentação inadequada e tabagismo¹. A prática insuficiente de atividade física está entre os 10 principais fatores de risco para mortalidade de causas gerais, ocupando a quarta posição, causando aproximadamente 3,4 milhões de óbitos em todo mundo².

Em níveis mundiais, a taxa de indivíduos insuficientemente ativos, no ano de 2016, atingiu 26% da população com idade superior a 18 anos².

A prática regular de atividade física vem sendo amplamente recomendada como tratamento não farmacológico para a prevenção de doenças cardiovasculares, bem como no processo de reabilitação após episódios de eventos agudos². Além disso, indivíduos que realizam 150 min/semana de atividades aeróbicas apresentam uma redução de 20 a 30% no risco de mortalidade por todas as causas, uma diminuição no risco de mortalidade por acidente vascular cerebral e doença arterial coronariana; menores incidências de diabetes tipo 2 (DM2), hipertensão arterial sistêmica (HAS), dislipidemias, excesso de peso e alguns tipos de câncer².

Outra importante métrica relacionada à atividade física habitual e sua relação com desfechos de saúde cardiometabólica é a contagem do número de passos diário³. Atingir a marca de 10000 passos por dia tem sido relacionado à redução do risco de desfechos cardiometabólicos adversos⁴. Em uma investigação, Oliveira e colaboradores⁵ observou que docentes que atingiam a meta diária de 10000 passos por dia apresentavam um melhor perfil antropométrico e menores níveis de triglicerídeos plasmáticos, ao passo que aqueles que não atingiram esta média diária apresentaram risco maior para desenvolvimento de excesso de peso (RR= 2,25, p=0,019) e dislipidemias (RR= 2,98, p= 0,002).

Neste contexto, para a avaliação da atividade física habitual, diversos instrumentos podem ser utilizados, dentre eles os questionários, recordatórios, sensores de movimento, equipamentos eletrônicos, elementos químicos, calorimetria, entre outros, se propondo à avaliação do comportamento humano em diferentes contextos, tais como: a) no lazer; b) nos deslocamentos; c) no trabalho; e d) nas atividades domésticas_³),(⁶) .

Levando em consideração tais contextos, diversas profissões apresentam características laborais com um grande predomínio de atividades de cunho sedentário, como os motorista de caminhão⁷, bancários⁸, taxistas⁹, policiais¹⁰, entre outros. Entre os docentes da educação básica de ensino, as características laborais também parecem estar influenciando negativamente os níveis de atividade física, como foi possível perceber nos estudos de Oliveira e colaboradores^5),(11 e Silva & Silva¹² em professores da rede pública.

A avaliação do nível de atividade física em populações específicas são essenciais, uma vez que possibilitam identificar aspectos comportamentais de risco e fornecem informações preciosas que norteiam estratégias de políticas públicas, como projetos, eventos, palestras e campanhas educativas, visando incentivar a prática de atividade física, bem como ampliar o conhecimento dos efeitos benéficos do exercício físico nas mais diferentes instâncias corporais^{3),(5),(13),(14),(15}.

Nesta perspectiva, a presente investigação objetivou avaliar o número de passos diários e sua associação com fatores de risco cardiometabólicos em professores da rede privada de Viçosa-MG. Além disso, buscou-se analisar se o ponto de corte de 10000 passos diário é um bom preditor para os principais fatores de risco cardiovasculares nesta população especificamente.

Métodos

Participantes

Esta investigação foi conduzida por meio de um estudo observacional com delineamento transversal, em professores da rede privada da cidade de Viçosa-MG. Para determinar o tamanho mínimo da amostra, foi realizado o cálculo amostral, levado em consideração a população de professores na rede privada do referido município no ano de 2015, (310 docentes); a prevalência média dos fatores de risco para doenças cardiovasculares da população de Belo Horizonte (25%)⁶; um erro padrão de 5% e um intervalo de confiança de 95%. Com estas informações chegou-se ao número de 150 indivíduos, correspondendo a 48% do universo de professores.

Inicialmente esta investigação obteve parecer positivo frente ao comitê de ética para pesquisas com seres humanos da Universidade Federal de Viçosa (CAAE 48845415.0.0000.5153), seguindo a Resolução nº466/12 do Conselho Nacional de Saúde e de acordo com a Declaração de Helsinki. Posteriormente foi estabelecido um contato com as escolas a fim de explicar os procedimentos e esclarecer possíveis dúvidas inerente à coleta de dados. Todos os docentes atuantes na escola poderiam participar dos procedimentos, desde que atendessem aos critérios de inclusão, que consistia em pelo menos 3 anos de atuação contínua, não estar de licença médica ou maternidade e não estar grávida.

Procedimentos

A obtenção dos dados ocorreu em duas etapas distintas, sendo a primeira no próprio ambiente escolar, em uma sala reservada e em um horário previamente agendado com o professor. Nesta etapa foram preenchidos o termo de consentimento livre e esclarecido e o questionário de dados pessoais, além da realização de todas as medidas antropométricas e pressóricas, e da entrega do pedômetro para sua utilização pelos 8 dias subsequentes. A segunda etapa foi realizada no Laboratório de Análises Clínicas da Divisão de Saúde da Universidade Federal de Viçosa, para a obtenção da amostra sanguínea.

Aparelhos que contabilizam o número de passos, como o pedômetro, são amplamente utilizados em estudos epidemiológicos^3),(5),(16, por apresentar validade e precisão na mensuração destes dados^4),(17. Na presente investigação, cada voluntário recebeu um pedômetro Digi-Walker® (modelo CW-701, Yamax Corporation, Tokyo, Japão), utilizando o mesmo por 8 dias consecutivos, evitando alterações na rotina habitual. Os voluntários foram orientados a utilizar o pedômetro o maior tempo possível, retirando apenas quando fosse inviável sua utilização (ao dormir, tomar banho e atividades aquáticas) ou em situações que interferissem na contagem dos passos (andar de moto, bicicleta ou ônibus). Este equipamento mantem em sua memória o registro do número de passos dos últimos sete dias. Além disso, foi entregue a cada voluntário uma folha de registro onde o mesmo deveria anotar a contagem de passos ao final do dia, para posterior conferência com o equipamento, bem como anotar o tempo em que permaneceu sem o equipamento em cada turno do dia. Desta forma, o primeiro dia de utilização foi descartado, buscando evitar o efeito Hawthorne¹⁸. A média do número de passos foi estabelecida a partir da contagem dos últimos sete dias de utilização. Sua utilização foi padronizada, sendo o aparelho afixado ao cós da calça, posicionado na linha média da coxa direita próxima a crista ilíaca, de acordo com as recomendações do fabricante. Para a classificação do nível de atividade física foi estabelecido o valor de 10000 passos por dia⁴.

A mensuração da massa corporal foi realizada com a utilização de uma balança portátil da marca Plenna® (modelo Acqua SIM09190, Plenna, Brasil), com precisão de 100 gramas, estando o avaliado descalço e com vestes leves. A mensuração da estatura foi realizada com a utilização de um estadiômetro portátil da marca WCS® (Cardiomed, Brasil), com precisão de 1 mm, estando o avaliado de costas para o instrumento, em posição anatômica.

As circunferências corporais foram mensuradas com a utilização de uma fita antropométrica inelástica da marca Sanny Medical® (modelo SN4010, Sanny, Brasil), graduada em milímetros. Para a mensuração das circunferências de cintura (CC), abdome (CA) e quadril (CQ) a fita métrica foi posicionada na região de menor curvatura entre o último arco costal e a crista ilíaca, na região de maior protuberância do quadril e na altura da cicatriz umbilical, respectivamente¹⁹.

A partir dos dados de peso, estatura, CC, CA e CQ foram calculados os indicadores antropométricos índice de adiposidade corporal (IAC), índice de conicidade (IC), índice de massa corporal (IMC), relação cintura estatura (RCE) e relação cintura quadril (RCQ)^{20),(21),(22),(23}.

O percentual de gordura corporal (%GC) foi determinado através da técnica de dobras cutâneas, sendo realizadas três medidas alternadas em três pontos distintos, abdominal peitoral e coxa para os homens²⁴, tríceps supra ilíaca e coxa para as mulheres²⁵. Para a obtenção das medidas foi utilizado um compasso de dobras cutâneas científico Cescorf® (modelo Top Tec, Cescorf, Brasil). A conversão da densidade corporal em %GC foi realizada pela fórmula de Siri²⁶: (%G= [(4,95 / DC) - 4,50] x 100).

Os valores de pressão arterial sistólica (PAS) e diastólica (PAD) foram obtidos por um esfigmomanômetro aneroide da marca Premium® (modelo ESFHS501, Wenzhou, China), com precisão de 3 mmHg, devidamente calibrado e com braçadeira padrão para adultos, após 5 minutos de repouso na posição sentada. Todos os procedimentos para a obtenção da pressão arterial seguiram as recomendações da Sociedade Brasileira de Cardiologia²⁷.

A coleta da amostra sanguínea para análise dos parâmetros bioquímicos foi realizada entre 7 e 9 horas da manhã, após um período mínimo de 12 horas de jejum, por um profissional especializado na extração, no laboratório de análises clínicas da Universidade Federal de Viçosa. Foram analisados os parâmetros glicemia de jejum (GL), colesterol total (CT), lipoproteína de alta densidade (HDL-C) e triglicerídeos (TG). A lipoproteína de baixa densidade (LDL-C) foi obtida por meio da equação de Friedewald²⁸. A glicemia de jejum foi classificada de acordo com a Sociedade Brasileira de Diabetes²⁹ e o perfil lipídico conforme a Sociedade Brasileira de Cardiologia³⁰.

Análise estatística

Para a análise estatística os avaliados foram divididos em insuficientemente ativos (<10000 passos por dia) e ativos fisicamente (>10000 passos por dia)⁴. Para verificar a pressuposição de normalidade das variáveis do estudo foi utilizado o teste de Komolgorov-Smirnov, sendo que CC, RCQ, IC, %GC e CT apresentaram distribuição normal. A apresentação dos dados constituiu na exploração descritiva das variáveis estudadas (média e desvio-padrão para os dados paramétricos; mediana, valores máximo e mínimo para os dados não paramétricos). O teste t Student foi utilizado para comparar os dados paramétricos, e Mann-Whitney para comparar os dados não-paramétricos entre os grupos.

A relação entre o número de passos e as demais variáveis foi avaliada pelo coeficiente de correlação linear de Pearson para os dados paramétricos, e pelo coeficiente de correlação de Spearman para os dados não paramétricos. O teste qui-quadrado foi utilizado para verificar a associação entre variáveis categóricas. Para a determinar a magnitude de associação entre os fatores de risco cardiovascular e os níveis insuficientes de atividade física foi utilizado a razão de chances (Odds ratio), com um intervalo de confiança de 95%. Foram realizadas curvas ROC (Receiver Operating Characteristic) para avaliar o ponto de corte de passos diários. Para todos os tratamentos adotou-se um nível de significância menor ou igual a 5%. Todas as análises estatísticas foram realizadas através do programa SPSS para Windows, versão 20.0 (Chicago, EUA) e MedCalc Statistical Software, versão 9.3 (Ostend, Belgium).

Resultados

Compuseram a amostra deste estudo 150 professores, representado 48% do total de docentes desta rede de ensino. Dentre os avaliados, 72% eram do sexo feminino.

O nível de atividade física dos professores, de acordo com a classificação proposta por Tudor Locke e colaboradores⁴, demonstra que 42% dos docentes foram classificados como ativos fisicamente, atingindo assim, a recomendação mínima de 10000 passos por dia de média.

As variáveis antropométricas, pressóricas e bioquímicas, estratificada segundo o número de passos, são apresentadas na Tabela 1.

Tabela 1
Características da amostra de professores segundo a média do número de passos diários, Viçosa-MG, Brasil (N=150)

Variáveis	< 10000 passos (n= 87)	> 10000 passos (n= 63)	P-valor*
Número de Passos	7347 (2451-9859)	12105 (10042- 18225)	-
Idade (anos)	41 (23-65)	34 (21-60)	0,007*
IMC (Kg/m²)	25,7 (18,8-40,3)	24,3 (17,2-36)	0,047*
CC (cm)	92,3 ± 11,79	87,6 ± 10,59	0,015ǂ
RCQ	0,81 ± 0,09	0,78 ± 0,08	0,047ǂ
RCE	0,49 (0,39-0,69)	0,47 (0,38-0,63)	0,009*
IAC	29,7 (18,8-52,2)	29,7 (16,1-44,3)	0,306*
IC	1,27 ± 0,07	1,25 ± 0,06	0,045ǂ
Gordura Corporal (%)	28,3 ± 6,2	25,5 ± 6,7	0,008ǂ
PAS (mmHg)	115 (90-160)	110 (85-150)	0,116*
PAD (mmHg)	80 (60-100)	70 (50-90)	0,081*
Glicose (mg/dL)	90 (70-208)	85 (73-195)	0,009*
Colesterol total (mg/dL)	192 ± 34,1	180 ± 31,9	0,022ǂ
HDL-C (mg/dL)	50 (26-105)	53 (27-86)	0,482*
LDL-C (mg/dL)	109 (57-196)	99 (61-167)	0,021*
Triglicerídeos (mg/dL)	115 (40-350)	103 (38-360)	0,116*

• Nota: ^*Dados são apresentados como mediana, e valores mínimo e máximo. Teste Mann-Whitney. ǂ Dados são apresentados como média e desvio-padrão. Teste t Student. IMC: índice de massa corporal; CC: circunferência de cintura; RCQ: relação cintura-quadril; RCE: relação cintura-estatura; IAC: índice de adiposidade central; IC: índice de conicidade; PAS: pressão arterial sistólica; PAD: pressão arterial diastólica; HDL-C: lipoproteína de alta densidade; LDL-C: lipoproteína de baixa densidade; RCV: risco cardiovascular. Fonte: Autores

A Tabela 2 apresenta o ponto de corte estabelecido para cada um dos parâmetros bioquímicos analisados, bem como, a prevalência de cada um desses parâmetros alterados entre os grupos de indivíduos ativos e insuficientemente ativos.

Tabela 2
Prevalência de parâmetros bioquímicos alterados segundo a média de passos diários em professores da rede privada, Viçosa-MG, Brasil (N=150)

Parâmetros bioquímicos	Insuficientemente ativos (< 10000 passos/dia)	Ativos (>10000 passos/dia)	P-valor
	87 (100%) N (%)	63 (100%) N (%)
Glicose	1 (1,1%)	2 (3,2%)	0,57
Colesterol total	32 (36,8%)	14 (22,2%)	0,056
HDL-C Homens	11 (45,8%)	8 (44,4%)	0,929
HDL-C Mulheres	23 (36,5%)	6 (13,3%)	0,007
LDL-C	26 (29,9%)	8 (12,7%)	0,013
Triglicerídeos	24 (27,6%)	13 (20,6%)	0,330

• Nota: Glicose de jejum > 126 mg/dl; Colesterol total > 200 mg/dl; HDL-C em homens < 40 mg/dl; HDL-C em mulheres < 50 mg/dl; LDL-C > 130 mg/dl; Triglicerídeos > 150 mg/dl. Fonte: Autores

Ao analisar a relação do número de passos com os demais indicadores antropométricos foi possível observar que apenas a CC, RCE e %GC se correlacionaram estatisticamente, sendo fraca e negativa esta correlação (Figura 1).

Figura 1
Correlação entre número de passos e indicadores antropométricos em professores da rede privada, Viçosa-MG, Brasil (N=150)

Na Tabela 3 são apresentados os fatores de risco associados ao reduzido número de passos (<10000 passos). É possível observar que HAS e dislipidemias foram significativamente associadas à esta condição.

Tabela 3
Análise dos fatores de risco cardiovascular associados ao reduzido número de passos (< 10000 passos), Viçosa-MG, Brasil (n= 150)

	Razão de Chance (IC95%)	P-valor*
Excesso de Peso1	1,641 (0,853-3,156)	0,186
Hipertensão Arterial2	2,700 (1,167-6,249)	0,029
Diabetes mellitus 3	1,089 (0,177-6,718)	1,00ǂ
Dislipidemias4	2,634 (1,347-5,149)	0,007

• Nota: * Teste do qui-quadrado de Pearson com correção de continuidade; ǂ Teste exato de Fisher. 1 Excesso de Peso: IMC > 25 Kg/m²; 2 Hipertensão Arterial: PAS > 140 mmHg e/ou PAD > 90 mmHg ou diagnóstico médico de HAS; 3 Diabetes mellitus: Glicemia de Jejum > 126 mg/dL ou diagnóstico médico de DM; 4 Dislipidemia: CT> 200mg/dL e/ou LDL-C > 130 mg/dL e/ou Triglicerídeos > 150 mg/dl e/ou HDL-C < 40 mg/dL homens e < 50 mg/dL mulheres. Fonte: Autores

A média de passos diária pode ser considerada preditora de quase todos os principais fatores de risco cardiovascular (Figura 2), pois apresentou limite inferior acima de 0,50 exceto para o diabetes. O melhor ponto de corte para os desfechos apresentados variou, sendo o menor valor 8146 passos para obesidade e o maior 11913 passos para diabetes

Figura 2
Curva ROC do número de passos como preditor de fatores de risco cardiovascular em professores da rede privada, Viçosa-MG, Brasil (N=150)

Discussão

Os achados da presente investigação demonstram que a maioria dos decentes da educação básica da rede privada de Viçosa-MG não atingiram a recomendação mínima de 10000 passos por dia de média, para serem classificados como ativos fisicamente. Contudo, é importante destacar que o percentual de indivíduos que alcançaram esta recomendação foi de 42%, podendo assim ser considerado um dado relevante, uma vez que na grande maioria de estudos em que o nível de atividade física foi avaliado por meio do número de passos, mais de 70% dos indivíduos são classificados como insuficientemente ativos por não atingirem esta recomendação³¹.

Foram observados maiores valores de IMC, CC, RCQ, RCE, IC, %GC, GL, CT e LDL-C no grupo de indivíduos insuficientemente ativos (<10000 passos/dia), frente ao grupo de indivíduos ativos (>10000 passos/dia). Estes resultados reforçam de forma geral, como uma atividade física, representada aqui pelo número de passos, pode ser importante na melhora de indicadores de risco cardiometabólico, contribuindo assim para reduzir o surgimento e agravamento de eventos cardiovasculares precoces⁵.

Essa disparidade encontrada entre os grupos foi corroborada pelos estudos de Cocate e colaboradores³² , avaliando homens brasileiros e Pillay e colaboradores³³, avaliando funcionário Sul Africanos. Além disso, a presença de correlação inversa e negativa entre passos e alguns parâmetros antropométricos obtidas nesta investigação, foi semelhante à obtida em brasileiros³², exaltando o papel da atividade física no controle e diminuição de alguns indicadores antropométricos relacionados à obesidade.

Nesta perspectiva, a relevante contribuição do comportamento sedentário frente ao ganho de peso corporal deve ser enfatizada, ainda mais pelo grande componente sedentário a que está submetido o trabalho docente^5),(12),(34. Assim sendo, a prática regular de atividade física, um importante componente do gasto energético diário³⁵, pode contribuir imensamente para a redução e controle da massa corporal devendo assim ser estimulada em seus diferentes seguimentos, seja nos momentos de lazer, deslocamento ao trabalho ou até mesmo no próprio ambiente de trabalho⁵.

Dos parâmetros antropométricos analisados IMC, RCQ e IC não se correlacionaram com o número de passos, enquanto CC, RCE e %GC apresentaram uma correlação inversa e fraca. Diferente dos achados desta investigação, alguns estudos encontraram correlação entre o número de passos e IMC e RCQ³⁶. No entanto, esta ausência de correlação aqui obtida se justifica pelos múltiplos fatores que influenciam o desenvolvimento da obesidade, como a alimentação inadequada, fatores genético, a intensidade das atividades realizadas³⁷, e a própria característica do ambiente escolar.

As variáveis bioquímicas analisadas no presente estudo apresentaram valores médios (CT) e medianos (GL, HDL-C, LDL-C e TG) classificados como normal para ambos os grupos de classificação^29),(30, contudo, GL, CT e LDL-C foram significativamente superior no grupo de indivíduos insuficientemente ativos. Os resultados obtidos em uma investigação com adultos residentes dos EUA³⁸ corroboram com os resultados desta investigação para os parâmetros CT e GL. Julius e colaboradores³⁹ avaliando adultos fumantes do Wisconsin Smokers' Health Study (WSHS) encontrou menores níveis de LDL-C e CT em mulheres com maior nível de atividade física (>7500 passos) se comparado às de menor nível (<7500) corroborando com os resultados da presente investigação. Em Finlandeses com risco aumentado de desenvolver diabetes, Herzig e colaboradores⁴⁰ encontrou menores níveis de CT, LDL-C e GL no grupo de indivíduos com maior média de número de passos (5870 vs 4434), resultados estes semelhantes aos obtidos na presente investigação. Apesar da diferença entre as classificações adotadas nos estudos supracitados, é possível perceber uma tendência de melhores níveis de CT, LDL-C e GL em indivíduos com um maior número de passos, sendo esta tendência também observada nos professores avaliados.

Já os parâmetros bioquímicos HDL-C e Triglicerídeos não apresentaram diferenças significativas entre os grupos. Este resultado é intrigante, uma vez que o exercício físico atua de forma mais expressiva nestes Dois parâmetros se comparados ao LDL-C e CT. Entretanto, é possível perceber que o percentual de docentes com alterações nestes parâmetros foi superior no grupo de indivíduos insuficientemente ativos.

A atividade física é uma ferramenta amplamente recomendada e utilizada no tratamento das dislipidemias, bem como do diabetes, sendo um dos principais tratamentos não-farmacológicos recomendados para ambas as alterações^29),(30. Nas dislipidemias o exercício físico atua aumentando a atividade de enzimas e transportadores de proteínas, promovendo uma maior oxidação lipídica no músculo esquelético, reduzindo assim suas concentrações a níveis plasmáticos³⁰.

Na glicemia, o exercício físico atua na redução das concentrações de insulina circulante, melhorando sua ação nos receptores e pós-receptores de membrana, provocando uma melhor resposta dos transportadores celulares de glicose. Além disso a maior capilarização das células musculares esqueléticas observada em indivíduos ativos aumentam o aporte de glicose a estas células. A soma dessas ações promovem uma maior captação de glicose pelos tecidos, reduzindo assim sua concentração a níveis plasmáticos²⁹.

Pressão arterial sistólica e diastólica não apresentaram diferenças estatísticas entre os 2 grupos analisados. Uma possível justificativa para este comportamento são os baixos valores de mediana desses parâmetros, bem como a grande taxa de controle da pressão arterial, entre os indivíduos hipertensos. É consenso na literatura o efeito benéfico do exercício físico nos níveis pressóricos⁴¹. Contudo, os resultados obtidos na presente investigação estão de acordo com os obtidos nos estudos de Pillay e colaboradores³³ em trabalhadores sul africanos e Herzig e colaoradores⁴⁰ em indivíduos com risco aumentado para desenvolver diabetes, onde maiores níveis de atividade física não impactaram os níveis de PAS e PAD.

Ao verificar a associação dos fatores de risco metabólicos com o reduzido número de passos foi possível perceber que o não cumprimento dos 10000 passos por dia elevam os riscos para desenvolvimento de HAS e Dislipidemias.

Em relação à utilização do número de passos diários como preditor dos fatores de risco cardiovasculares podemos observar que para obesidade e HAS o melhor ponto de corte se situou entre 8100 e 9400 passos, respectivamente. Já para os fatores de risco diabetes e dislipidemias o melhor ponto de corte se situou entre 11200 e 12000 passos. É importante mencionar que o número de passos apresentou um maior poder de predição para a HAS (área sob a curva ROC 0,656), e um menor para o diabetes (área sob a curva ROC 0,552), não sendo assim, um bom indicador a ser utilizado na identificação do risco de diabetes nos professores.

A análise de ponto de corte por meio da curva ROC é utilizada em estudos epidemiológicos como forma de definir o melhor resultado para determinada população⁵. Sendo assim, na presente investigação o valor de média de passos diário que apresentou melhor sensibilidade e especificidade foi inferior aos 10000 passos por dia preconizado por Tudor-Locke e colaboradores⁴ para obesidade e HAS, e superior a este valor, para as variáveis diabetes e dislipidemias.

A recomendação preconizada por Tudor-Locke e colaboradores⁴, estabelece o valor de 10000 passos por dia como mínimo necessário para obtenção de benefícios à saúde. Apesar de ter sido observado valores inferiores ao preconizado, para as variáveis HAS e obesidade, é recomendado o incentivo de atividade que promovam o aumento no número de passos nesta população, uma vez diversos estudos tem demonstrado a associação deste com os fatores de risco cardiovascular^{31),(32),(36),(37),(38}.

É importante destacar que a presente investigação apresenta algumas limitações metodológicas. Inicialmente, o tipo de delineamento utilizado possibilita a ocorrência de causalidade reversa, podendo interferir na interpretação dos resultados. Entretanto, foi realizado o cálculo amostral e randomização dos sujeitos, buscando assim aumentar a validade do estudo. Outra importante limitação é a utilização do pedômetro como estimador do nível habitual de atividade física. Este instrumento só registra o número de passos, sem detectar aceleração, intensidade, mudanças de inclinação do terreno, caminhadas com sobrecarga, bem como atividade realizadas no meio aquático e atividade de ciclismo. Entretanto, é um método válido, amplamente utilizado em estudos para diagnóstico do nível habitual de atividade física^{11),(32),(33),(36),(37}. Para minimizar possíveis erros de análise, no momento da entrega do aparelho o avaliador realizava uma análise detalhada junto com o avaliado, visando identificar se os valores estavam condizentes com o número de passos do mesmo.

Conclusões

Com os achados da presente investigação é possível concluir que a maioria dos docentes avaliados foi classificada como insuficientemente ativa (<10000 passos/dia). Aqueles que atingiram a recomendação mínima de 10000 passos por dia apresentaram menor idade, um melhor perfil antropométrico (IMC, CC, RCQ, RCE, IC, %GC) e bioquímico (GL, CT e LDL-C). A prática insuficiente de atividade física entre os professores elevou os riscos para o desenvolvimento de HAS e Dislipidemias. Além disso, o número de passos apresentou uma correlação fraca e inversa com os indicadores antropométricos.

Mediante os resultados obtidos na presente investigação, estratégias devem ser implementadas junto ao contexto escolar, sendo estas voltadas ao incentivo e fomento de atividades físicas no próprio contexto escolar, por meio de ações institucionais, ou fora dele, através de parcerias com a iniciativa privada. Além disso, políticas educacionais devem ser discutidas priorizando hábitos saudáveis, garantindo assim uma melhor saúde a esta população e consequentemente uma melhor qualidade educacional, haja visto a relevância da docência no contexto nacional.

Referências

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  31 Jan 2022
• Data do Fascículo
  2021

Histórico

• Recebido
  07 Dez 2020
• Revisado
  14 Mar 2021
• Aceito
  17 Jun 2021