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Decidindo não decidir: a atuação penal do STF durante a pandemia de Covid-19

Deciding not to decide: the criminal rulings of the Brazilian Supreme Court during the Covid-19 pandemic

Resumo

Este artigo é baseado em uma amostra representativa e aleatória de 396 decisões monocráticas penais do Supremo Tribunal Federal, proferidas entre 01/01/2020 e 22/06/2021, que mencionam a pandemia de Covid-19. Foram mapeados os pedidos, o tipo de prisão, a data de julgamento, o tipo de ação e o resultado dos pedidos. Em seguida, foi feita uma análise qualitativa dos argumentos utilizados pela Corte para decidir. O objetivo principal do estudo é compreender como a Corte julgou pedidos de desencarceramento e o peso da pandemia de Covid-19 na argumentação judicial. Os dados indicam que a pandemia não teve impacto relevante na forma de decidir do STF em casos de prisão. Prevaleceram os indeferimentos de pedidos de soltura, com significativa mobilização argumentativa de óbices processuais, permitindo que a Corte não se posicionasse sobre questões de mérito. Por outro lado, quando o mérito foi analisado, a pandemia não foi tratada como argumento suficiente para desencarcerar. Ademais, a pandemia, a Recomendação 62 do CNJ e a ADPF 347 não tiveram grande destaque argumentativo nas poucas decisões que concederam pedidos de desencarceramento. A pesquisa reforça o diagnóstico de que a pandemia não mudou o modo como o Judiciário lida com a prisão. Esse achado de pesquisa contribui para a compreensão dos obstáculos para o enfrentamento do superencarceramento no Brasil.

Palavras-Chave
STF; Covid-19; pandemia; prisão; superencarceramento; pesquisa empírica

Abstract

This article is based on a representative and randomly selected sample of 396 individual criminal decisions from the Federal Supreme Court, issued between January 1, 2020, and June 22, 2021, related to the COVID-19 pandemic. We tracked the petitions, the type of imprisonment, the date of judgment, the type of legal action, and the outcomes of these requests. Subsequently, we conducted a qualitative analysis of the arguments employed by the Court in reaching its decisions. The main objective of the study is to understand how the Court ruled on requests for release from incarceration and the impact of the Covid-19 pandemic in the judicial reasoning. The findings indicate that the pandemic had no relevant impact on the Court’s decision-making process. Dismissals on procedural grounds prevailed, allowing the court to avoid ruling on the merits of a claim. On the other hand, when the merits were analyzed, the pandemic was not treated as a sufficient argument for releasing a prisoner. Additionally, during the pandemic, CNJ’s Recommendation No. 62 and ADPF No. 347 had no argumentative prominence in the few decisions that granted requests for release. This research reinforces the diagnosis that the pandemic has not changed how the Judiciary deals with imprisonment. This finding contributes to understand the challenges in tackling mass incarceration in Brazil.

Keywords
Brazilian Supreme Court; Covid-19; pandemic; prison; mass incarceration; empirical research

Sumário: Introdução; 1. Metodologia; 2. Apresentação e análise quantitativo-descritiva dos dados; 3. No meio do caminho tinha um obstáculo processual: supressão de instância e a impossibilidade de reexame de fatos em habeas corpus; 3.1. O argumento de “supressão de instância” e a Súmula 691; 3.2. Impossibilidade de reexame probatório em habeas corpus; 4. Reincidência, risco de reiteração delitiva e periculosidade do agente; 5. Recomendação 62 e as decisões que promoveram saída da prisão; Considerações finais.

Introdução

A pandemia de Covid-19 atingiu severamente o Brasil, colocando-o entre os países com os maiores números de mortes. Até abril de 2023, foram registrados mais de 700 mil óbitos em decorrência de infecção pelo vírus (Ministério da Saúde, 2023MINISTÉRIO DA SAÚDE. Coronavírus Brasil: Painel Geral. [S.l.], 2023. Disponível em: https://covid.saude.gov.br/. Acesso em: 08 mar. 2023.
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). O cenário de crise colocou em evidência gravíssimos problemas de ordem jurídica, entre os quais a precariedade e a superlotação do sistema carcerário brasileiro.

Mesmo antes da pandemia, as prisões brasileiras — que reúnem a terceira maior população prisional do mundo (Highest to Lowest, s.d.HIGHEST TO LOWEST: Prison Population Total. World Prison Brief, [S.l.], s.d.. Disponível em: https://www.prisonstudies.org/highest-to-lowest/prison-population-total?field_region_taxonomy_tid=All. Acesso em: 08 mar. 2023.
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)8 8 Relativamente ao período de janeiro a junho de 2022, 661.915 pessoas estavam encarceradas no Brasil; 29,12% delas em prisão provisória, isto é, não haviam sido condenadas em definitivo (Departamento Penitenciário Nacional, 2022). — já configuravam um “estado de coisas inconstitucional”, na dicção da decisão cautelar do Supremo Tribunal Federal (STF) tomada em 2015 na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 3479 9 Sobre o caso da ADPF 347, vide Machado (2020) e Magalhães (2019). . Nas palavras da Corte, o sistema carcerário compõe um “quadro de violação massiva e persistente de direitos fundamentais, decorrente de falhas estruturais e falência de políticas públicas e cuja modificação depende de medidas abrangentes de natureza normativa, administrativa e orçamentária”10 10 Supremo Tribunal Federal, Plenário, Medida Cautelar na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 347, Ministro Relator Marco Aurélio Mello, julgado em 09 set. 2015. Disponível em: http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=10300665. Acesso em: 09 mar. 2023. . Em outubro de 2023, a Corte finalmente apreciou o mérito da ação, julgando-a parcialmente procedente e reafirmando a existência do estado de coisas inconstitucional, caracterizado pela violação de direitos fundamentais no sistema carcerário brasileiro11 11 No momento da finalização deste artigo, o acórdão da ADPF 347 ainda não havia sido publicado. Vide STF Reconhece Violação Massiva (2023). .

A pandemia tornou ainda mais urgentes os problemas de um sistema combalido. Diante do risco acentuado de as prisões se tornarem centros de infecções do coronavírus, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em 17 de março de 2020, emitiu a Recomendação 62, com instruções aos órgãos do Judiciário para reduzir o superencarceramento durante a pandemia, entre as quais se incluíam a adoção de medidas cautelares em substituição à prisão provisória e a concessão de liberdade a grupos mais vulneráveis à Covid-19.

A Recomendação 62 não tinha caráter vinculante. O STF, porém, teve a oportunidade de vincular as instâncias inferiores: em março de 2020, foi feito um pedido no âmbito da ADPF 347 para que a Corte ordenasse medidas semelhantes às da Recomendação12 12 O pedido foi feito pelo Instituto de Defesa do Direito de Defesa, nos autos da ADPF 347, cujo Ministro Relator era Marco Aurélio, por meio da Petição 14.137/2020. . Em decisão liminar, o Ministro Marco Aurélio Mello conclamou os juízos de execução a considerarem medidas desencarceradoras em face da pandemia. No entanto, sua decisão foi revista logo em seguida pelo Pleno13 13 ADPF 347 TPI-Ref, Relator para Acórdão Min. Alexandre de Moraes, julgado em 18/03/2020, DJe 30/06/2020. .

Em maio de 2020, à luz do frequente descumprimento da Recomendação 62 pelos tribunais, foi ajuizada, pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), a ADPF 684. Postulava-se que o Poder Judiciário tomasse medidas na linha das propostas na Recomendação, como (i) substituir prisões cautelares por medidas alternativas, (ii) conceder prisão domiciliar a pessoas condenadas por crimes praticados sem violência ou grave ameaça, (iii) autorizar a progressão antecipada do regime semiaberto ao aberto para cumprimento em prisão domiciliar, e (iv) adotar medidas desencarceradoras para integrantes de grupos de risco para Covid-1914 14 Aqui, apresentamos resumidamente os pedidos formulados na ADPF 684. A petição inicial está disponível em: https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5910249. Acesso em: 26 jun. 2023. . A ação não foi julgada até a data de fechamento deste artigo.

Posição diferente foi adotada pelo Ministro Edson Fachin, em dezembro de 2020, quando concedeu medida cautelar no Habeas Corpus (HC) 188.820, impetrado pela Defensoria Pública da União (DPU) e pela Defensoria Pública do Rio de Janeiro (DPE/RJ) “em favor de todas as pessoas presas em locais acima da sua capacidade que sejam integrantes de grupos de risco para a Covid-19 e não tenham praticado crimes com violência ou grave ameaça”. O Ministro determinou monocraticamente que juízes e juízas, ao apreciarem pedidos de saída de unidades prisionais durante o estado de emergência, analisassem se as pessoas presas (i) pertenciam a grupo de risco para Covid-19; (ii) estavam em unidade superlotada; e (iii) não haviam cometido crimes violentos ou com grave ameaça. Preenchidos esses requisitos, e salvo exceções devidamente justificadas, haveria o direito à progressão de regime para quem cumprisse pena e medidas cautelares alternativas à prisão para quem estivesse preso provisoriamente. A liminar de Fachin foi referendada pela Segunda Turma, por unanimidade, em fevereiro de 2021.

Apesar da importância do entendimento firmado e do fato de se tratar de um habeas corpus coletivo, essa decisão não tinha caráter vinculante. No âmbito do próprio HC 188.820, diversos pedidos de extensão para que o STF concedesse liberdade a pessoas que alegavam cumprir esses requisitos foram indeferidos por Fachin, que entendeu caber ao juízo de origem a avaliação do caso concreto. Na prática, isso significava que o STF exerceria pouco controle sobre as decisões das instâncias inferiores em pedidos de desencarceramento. Isto é, mesmo no momento grave da pandemia, o STF optou por não confrontar de forma direta decisões judiciais que contrariavam o posicionamento da Corte - no âmbito do HC 188.820, ao menos - e do CNJ sobre encarceramento.

Sem uma decisão vinculante do STF, a Recomendação 62 e a pandemia não parecem ter alterado significativamente as decisões sobre prisão (provisória ou definitiva) nos tribunais durante a pandemia. Quintão e Ribeiro (2022, p. 125)QUINTÃO, Beatriz Aranha; RIBEIRO, Ludmila. Judiciário em tempos de pandemia: um estudo das decisões em habeas corpus do Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Revista do Instituto de Ciências Penais, Belo Horizonte, v. 7, n. 1, p. 95–130, jan. 2022. https://doi.org/10.46274/1809-192XRICP2022v7n1p95-130
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constatam que, no Tribunal de Justiça de Minas Gerais, “embora a maioria das decisões tenha mencionado as diretrizes para prevenção ao coronavírus, pouquíssimas as usaram para conceder a liberdade aos indivíduos”. Segundo Neri e Carvalho (2020, p. 223)NERI, Bianca; CARVALHO, Jaqueline. Pandemia e prisão domiciliar: perpetuando o Estado de Coisas Inconstitucional. Atuação: Revista Jurídica do Ministério Público Catarinense, Florianópolis, v. 15, n. 33, p. 212-227, dez. 2020. https://doi.org/10.33946/2595-3966-v15n33-144
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, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro “busca todo tipo de fundamento, inclusive contraditórios entre si” para denegar medidas desencarceradoras. Vasconcelos, Machado e Wang (2020, p. 1477)VASCONCELOS, Natalia Pires de; MACHADO, Maíra Rocha; WANG, Daniel Wei Liang. COVID-19 nas prisões: um estudo das decisões em habeas corpus no Tribunal de Justiça de São Paulo. Revista de Administração Pública, Rio de Janeiro, v. 54, n. 5, p. 1472-1485, set. 2020. http://dx.doi.org/10.1590/0034-761220200536
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indicam não haver qualquer relação entre o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) mencionar a Recomendação e conceder ou denegar um habeas corpus. Dentre os writs julgados pelo TJSP, “54% citam a Recomendação 62 e em mais de 90% dos casos, o uso da recomendação é para indeferir o pedido” (Vasconcelos; Machado; Wang, 2020VASCONCELOS, Natalia Pires de; MACHADO, Maíra Rocha; YU JIUNN WANG, Henrique. Pandemia só das grades para fora: os habeas corpus julgados pelo Tribunal de Justiça de São Paulo. Revista Direito Público, Brasília, v. 17, n. 94, p. 541-569, jul./ago. 2020. Disponível em: https://www.portaldeperiodicos.idp.edu.br/direitopublico/article/view/4489. Acesso em: 28 nov. 2023.
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, p. 549). Hartmann et al (2020, p. 34-35)HARTMANN, Ivar Alberto; MAIA, Natália; SILVA, Lorena Abbas da; MARPIN, Ábia; ALMEIDA, Guilherme. Como STF e STJ decidem Habeas Corpus durante a Pandemia do COVID-19? Uma Análise Censitária e Amostral. 2 jul. 2020. Disponível em: https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=3659624 ou http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.3659624 . Acesso em: 08 mar. 2023.
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concluíram que a taxa de concessão de habeas corpus no STF e STJ antes e durante a pandemia são semelhantes15 15 Sobre a falta de impacto relevante da Recomendação n. 62 do CNJ, vide: Budó e Moser (2023), Valença e Freitas (2020), Ryu (2022), Trevisan et al (2020); Moraes e Vasconcellos (2022). .

Esse é um quadro que Machado e Vasconcelos (2021, p. 2038)MACHADO, Maíra Rocha; VASCONCELOS, Natália Pires. Uma conjuntura crítica perdida: a COVID-19 nas prisões brasileiras. Revista Direito e Práxis, Rio de Janeiro, v. 12, n. 3, p. 2015-2043, 2021. denominaram “conjuntura crítica perdida”: a oportunidade de o Judiciário, a partir de um evento de grande repercussão, reavaliar e mudar a “cultura institucional arraigada” de preferência pela imposição do encarceramento como resposta-paradigma em casos criminais.

Contudo, existe uma peça desse quadro que ainda falta conhecer com mais profundidade: os julgamentos do STF em pedidos individuais de liberdade, sobretudo habeas corpus. Embora haja indícios de que a pandemia não tenha alterado a taxa de sucesso de pedidos de habeas corpus (Hartmann et al., 2020HARTMANN, Ivar Alberto; MAIA, Natália; SILVA, Lorena Abbas da; MARPIN, Ábia; ALMEIDA, Guilherme. Como STF e STJ decidem Habeas Corpus durante a Pandemia do COVID-19? Uma Análise Censitária e Amostral. 2 jul. 2020. Disponível em: https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=3659624 ou http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.3659624 . Acesso em: 08 mar. 2023.
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) nos primeiros meses da pandemia, pouco se sabe sobre a forma como o contexto da Covid-19 afetou a argumentação jurídica das decisões do STF nesses pedidos individuais.

O presente estudo busca preencher essa lacuna na literatura por meio da análise de uma amostra das decisões penais monocráticas proferidas pelo STF desde o início da pandemia até junho de 2021. A proposta deste trabalho é, por meio de um estudo prevalentemente qualitativo informado por dados empíricos quantitativos, produzir um retrato sobre as decisões monocráticas em casos penais durante a pandemia, com especial interesse nos argumentos para decidir pedidos de desencarceramento.

Mais especificamente, os objetivos desta pesquisa são (i) analisar sistematicamente, com fundamentos metodológicos quantitativos e qualitativos, como o STF julgou pedidos de desencarceramento durante o período pandêmico e (ii) identificar o papel que a pandemia teve nas argumentações presentes nas decisões judiciais. Para isso, foram mapeados os pedidos, o tipo de prisão, a data de julgamento, o tipo de ação e o resultado dos pedidos. Em seguida, foi feita uma análise qualitativa dos argumentos utilizados pela Corte para decidir.

Na seção 1, apresentamos as estratégias metodológicas para a constituição do banco de decisões monocráticas do STF que servem de objeto para a análise. A seção 2 é dedicada a apresentar dados quantitativos referentes aos casos de decisões de Ministros analisadas pelos autores deste texto. A seção 3 discute os obstáculos processuais que impediram concessões de pedidos de pessoas presas durante a pandemia. A seção 4 aborda como argumentos baseados na periculosidade do agente, na reincidência e na possibilidade de reiteração delitiva foram utilizadas nas decisões monocráticas do STF para não conceder medidas alternativas ao cárcere. A seção 5 analisa os poucos casos de concessão de medidas que promoveram o desencarceramento pelo STF. Na conclusão, apontamos o descompasso entre a retórica e a prática do STF ao julgar casos penais.

1. Metodologia

As decisões disponíveis por meio do sistema de busca de julgados do site do STF16 16 Disponível em: https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search. Acesso em: 07 mar. 2023. foram coletadas por meio de rotinas automatizadas utilizando a linguagem de programação Python. Foram coletadas decisões proferidas entre 01/01/2020 e 22/06/2021 contendo as expressões “covid”, “pandemia” e “corona”. Esse período abarca as duas primeiras — e mais letais — ondas da Covid-19 no Brasil e inclui o momento posterior à introdução das vacinas, que permitiu o arrefecimento da crise sanitária. A escolha das palavras-chave se deu precisamente pelo interesse na pandemia como argumento jurídico.

Essa busca, após a exclusão de casos duplicados e de falsos positivos, formou um universo de 5.840 decisões. Por meio de um algoritmo, essas decisões foram agrupadas em clusters de acordo com a similaridade de seus textos. A equipe de pesquisa, então, classificou os clusters de acordo com temas e, por meio de aprendizado de máquina não supervisionado (machine learning), o computador expandiu as classificações para todo o universo de decisões. Após diversas rodadas de interação entre a equipe de pesquisa e o computador, chegou-se a uma classificação homogênea do material.

Ao fim, 4.247 decisões (78%) foram classificadas como matéria de direito penal17 17 A base completa, com indicação sobre a decisão pertencer ao conjunto de penal ou não está publicada em https://hdl.handle.net/10438.3/FK2/P3X8N0. . Considerado esse universo, foi constituída uma amostra representativa de 419 decisões monocráticas (IC 95%, margem de erro 4,5%)18 18 Este artigo é dedicado unicamente às decisões monocráticas, primeiramente, porque elas representam a maior parte da nossa amostra, composta por 396 monocráticas e 28 colegiadas. A análise das colegiadas exige uma estratégia metodológica própria para desagregar e analisar a argumentação e decisão de cada Ministro ou Ministra, o que será realizado em outro estudo. Ainda assim, uma análise preliminar das 28 decisões colegiadas (compostas por 26 em sede de habeas corpus e duas em sede de reclamação) indicou que, em nenhum acórdão em habeas corpus, o Paciente teve sua situação melhorada pelo julgamento colegiado do writ ou do agravo regimental interposto contra a decisão monocrática — em um único caso, a situação piorou: no julgamento colegiado do HC 185.991, a liminar anteriormente concedida revogando a prisão preventiva por ausência de fundamentação idônea foi cassada, por maioria de votos, pela Primeira Turma. Por isso se pode dizer que decisões monocráticas são representativas da tutela jurisdicional prestada pelo STF em sede de habeas corpus — na amostra, nenhum agravo regimental interposto contra decisão monocrática que negava seguimento à impetração foi provido. Já no caso do julgamento colegiado das duas reclamações, em uma delas, a Reclamação 40.761, o agravo regimental foi provido para dar procedência à reclamação e determinar a inclusão do reclamante no regime semiaberto ou a adoção de medidas alternativas pelo juízo de 1º grau. . Essas decisões foram lidas e codificadas pela equipe de pesquisa por meio de um questionário desenvolvido na plataforma “Google Forms”. A elaboração desse questionário passou por diversos testes para seu aperfeiçoamento e treinamento da equipe de pesquisa. Para reduzir o risco de erros humanos, cada decisão foi classificada por conjuntos aleatórios de três pesquisadores, prevalecendo a resposta unânime ou majoritária, isto é, quando pelo menos duas de três pessoas da equipe de pesquisa indicaram a mesma resposta. Nas raras ocasiões em que não foi possível chegar a uma maioria — as três respostas diferiam —, indicou-se na planilha “sem maioria” e o resultado foi descartado.

Na aplicação do questionário, 23 casos foram excluídos por (i) não abordarem pandemia, (ii) não serem casos penais ou (iii) não tratarem de prisão (cautelar ou pena). Com isso, a amostra analisada neste artigo é composta por 396 casos19 19 Apesar de o artigo seguir o sistema de citação de fontes no formato autor-data, as decisões judiciais serão citadas em notas de rodapé, com indicações que permitam a fácil identificação dos documentos consultados. Dado o número muito grande de decisões citadas, a referência a elas no estilo autor-data tornaria a identificação dos casos mais trabalhosa e a leitura menos fluida. .

2. Apresentação e análise quantitativo-descritiva dos dados

Os pedidos feitos pela defesa nas decisões analisadas (incluindo habeas corpus, reclamações e recursos) foram: revogação da prisão preventiva (249), conversão da prisão preventiva em prisão domiciliar (180), conversão da prisão preventiva em medida cautelar diversa da prisão (136) e progressão de regime (41)20 20 Observou-se tanto a presença de pedidos isolados, quando apenas um pedido foi formulado, como pedidos cumulados, quando havia mais de um pedido. Por essa razão, a soma dos pedidos ultrapassa o número de 396 decisões analisadas .

Em 278 dos casos, o(a) Paciente estava em prisão preventiva (70%) e em 106 (26,7%), em fase de cumprimento de pena prisão. Identificou-se um caso de prisão temporária, além de sete casos em que a leitura da decisão monocrática não permitiu a identificação da modalidade de prisão.

O gráfico 1 apresenta a distribuição das 396 decisões ao longo dos meses que compõem a amostra, bem como a proporção de concessão da liberdade21 21 Por concessão da liberdade entendemos as decisões que visavam ao desencarceramento, isto é, à retirada, ainda que provisória, do sistema carcerário. em cada um desses meses. No total, foram 47 casos de concessão do pedido da defesa (11,9%) e 349 não concessões (88,8%). Neste trabalho, entende-se como “concessão” a decisão que atende a algum pedido da pessoa presa, ainda que não promova efetiva saída da prisão. Desses 47 casos, 24 referem-se a decisões que promoveram saída da prisão, ainda que para o regime de prisão domiciliar.

Gráfico 1
Distribuição do resultado dos julgamentos ao longo dos meses

Na amostra analisada, os meses com maior incidência de decisões proferidas foram abril, maio, junho, agosto e setembro de 2020. Em relação à taxa de sucesso dessas decisões, destacam-se os meses de outubro e novembro de 2020, bem como fevereiro e junho de 2021, que tiveram percentuais de concessão acima de 30%.

A maioria das decisões analisadas refere-se a habeas corpus (330 casos, 83,3%), com uma predominância de habeas corpus individual (327 casos) em comparação a habeas corpus coletivo (três casos). Em seguida, 46 casos (11,61%) envolviam reclamação e 18 casos (4,54%), algum recurso penal, incluindo o recurso em habeas corpus. Com exceção de dois casos que se referem a outros tipos de procedimento22 22 Trata-se do agravo regimental no recurso ordinário em habeas corpus e embargos de declaração na extensão nos embargos de declaração na reclamação. , o gráfico a seguir reúne os três principais tipos de ações/recursos da amostra:

Gráfico 2
Tipos de procedimento

Considerando que as reclamações buscavam, em geral, a aplicação da Súmula Vinculante 5623 23 “A falta de estabelecimento penal adequado não autoriza a manutenção do condenado em regime prisional mais gravoso, devendo-se observar, nessa hipótese, os parâmetros fixados no RE 641.320/RS” STF, Súmula Vinculante 56, DJE de 8-8-2016. (não relacionada à pandemia) e muitos dos recursos referem-se a recursos em habeas corpus e agravos contra decisões monocráticas em habeas corpus, é possível dizer que o habeas corpus foi o principal instrumento disponível para se chegar ao STF.

A maioria dos habeas corpus resultou em não concessões e, para tanto, argumentos processuais foram largamente empregados, em detrimento de argumentos atinentes ao mérito dos pedidos formulados perante o STF, como indicado no gráfico 324 24 Este trabalho abordará o protagonismo dos argumentos processuais nas decisões analisadas. .

Gráfico 3
Resultado dos habeas corpus

A tabela 1 apresenta a distribuição, por Ministro(a), da totalidade das decisões monocráticas analisadas neste trabalho, bem como os resultados dos julgamentos adotados por cada um(a). Embora a probabilidade de concessão seja baixa,25 25 As concessões contemplam as decisões em que algum dos pedidos feitos pela defesa foram bem-sucedidos. Dentre elas, há decisões que levaram diretamente a algum tipo de desencarceramento (retirada, ainda que provisória, do sistema carcerário) e decisões que contemplam pedidos diversos, como a realização de audiência de custódia ou reavaliação da prisão pela instância inferior, considerando a pandemia da Covid-19. e a de uma decisão que promova a saída da prisão mais baixa ainda, há bastante heterogeneidade na taxa de concessão entre os membros da corte. O Ministro Fachin destaca-se por ter concedido pelo menos um dos pedidos em um terço dos HCs que lhe chegaram, embora a maioria das concessões não tenha levado diretamente à saída da prisão. O Ministro Gilmar Mendes, por outro lado, foi quem mais concedeu, em números absolutos, pedidos que levaram à saída da prisão, representando quase 46% do total de decisões do STF com esse efeito. Cinco Ministros não concederam nenhum pedido que levasse diretamente ao desencarceramento e três concederam apenas uma vez.

Tabela 1
Atuação individual de Ministros e Ministras do STF no resultado dos julgamentos

A pesquisa também buscou compreender o impacto da Recomendação 62 e da ADPF 347 nessas decisões. Das 396 decisões monocráticas analisadas, 158 têm alguma menção à Recomendação 62, entre as quais há somente 18 concessões (11,39%). Já entre os 236 casos em que a Recomendação 62 não foi citada, houve 29 concessões (12,29%). Assim, os dados mostram que a menção à Recomendação 62 não teve grande peso para o resultado dos julgamentos, pois a diferença entre os casos em que a Recomendação 62 é citada e aqueles em que ela não é citada é pequena28 28 Considerando-se os 47 casos de concessões que compõem a nossa amostra de monocráticas, nota-se que em 38,29% das decisões há referência à Recomendação 62, enquanto em 61,7% não há menção à Recomendação. .

A ADPF 347 também parece não influenciar muito as decisões concessivas, pois o STF concedeu apenas 15 pedidos das 89 decisões em que a ADPF 347 foi mencionada. Ou seja, em 84,14% dos casos, a menção à ADPF não levou à concessão de pedidos em casos que envolvem prisão.

Outros dados que merecem ser destacados são os argumentos mobilizados pela defesa relacionados ao risco específico (idoso e/ou comorbidade) do paciente e os resultados dos julgamentos. Em 120 casos, a defesa mencionou algum risco específico para a Covid-19 – principalmente, doenças respiratórias, hipertensão e a condição de ser idoso – e, ainda assim, apenas sete desses casos foram concedidos (5,8%).

Considerado o grupo de 113 casos em que a idade e/ou comorbidade foi alegada pela defesa, mas que resultaram em não concessões: em 19 decisões foi alegado que o estabelecimento prisional adota medidas adequadas e/ou suficientes para prevenção e/ou controle da doença; em 23 decisões foi argumentado que a pessoa presa não demonstrou situação de risco na unidade prisional; e em 23 decisões foi alegado que a pessoa presa não demonstrou e/ou não fazia parte do grupo de risco. Diante desse cenário marcado por poucas concessões e baixo impacto dos argumentos relacionados aos riscos específicos relacionados à Covid-19, as próximas seções analisam com mais detalhes os principais argumentos mobilizados na fundamentação das decisões monocráticas do STF para conceder ou não medidas de desencarceramento.

3. No meio do caminho tinha um obstáculo processual: supressão de instância e a impossibilidade de reexame de fatos em habeas corpus

3.1. O argumento de “supressão de instância” e a Súmula 691

O STF entende por “supressão de instância” a análise de uma matéria não examinada ou decidida pela instância inferior29 29 Cf., por exemplo, acórdão do RHC 176.629, julgado em 4/11/2020: “O acórdão impugnado não examinou a matéria suscitada neste recurso. Desse modo, torna-se inviável a esta Suprema Corte conhecer do tema originariamente, sob pena de indevida supressão de instância e violação das regras constitucionais de repartição de competências”. . O argumento pode aparecer em casos nos quais se busca da Corte a revisão de decisão de instância inferior - via recurso ou ação de impugnação - mas o STF entende que o fato ou o argumento não foi analisado pelo tribunal que proferiu a decisão impugnada. Trata-se de exigência de “uma espécie de prequestionamento das teses defensivas submetidas à apreciação do Supremo Tribunal Federal” (Nunes, 2023NUNES, Mariana Madera. O cabimento de habeas corpus e a jurisprudência defensiva do Supremo. In: PEDRINA, Gustavo Mascarenhas Lacerda; NUNES, Mariana Madera; SOUZA, Rafael Ferreira de; VASCONCELLOS, Vinicius Gomes de (orgs.). Habeas corpus no Supremo Tribunal Federal. 3 ed. São Paulo: RT, 2023., p. 87).

Mas o argumento de “supressão de instância” também é utilizado pelo STF para evitar a análise de habeas corpus impetrado contra decisão monocrática de relator de Tribunal Superior que (i) indefere medida liminar; (ii) indefere liminarmente a impetração ou (iii) nega seguimento ao processo, sem que o caso tenha sido posteriormente submetido a julgamento colegiado - mesmo que a matéria tenha sido analisada pelo Ministro. Esse argumento – de ausência de esgotamento das instâncias inferiores – apareceu com frequência nas decisões do STF analisadas nesse artigo.

Em nossa amostra, 330 dos 396 casos eram habeas corpus. Desses, 75,6% foram negados sob o argumento de que a jurisdição dos tribunais inferiores ainda não havia sido esgotada e que, portanto, a análise pelo STF envolveria “supressão de instância”. Diante da relevância desse argumento nas decisões do STF em casos penais durante a pandemia, vale explicar, de forma breve, como a Corte construiu esse entendimento – que deu origem a uma súmula – e o argumento de que há casos excepcionais nos quais o STF pode analisar o habeas corpus mesmo havendo “supressão de instância”.

É comum habeas corpus serem impetrados com pedido de liminar, isto é, com um pedido para que o relator ou a relatora, ao receber a petição, tome alguma decisão provisória que resguarde a liberdade do paciente antes de a ação ser julgada. O pedido liminar se justifica em casos urgentes e nos quais a espera pelo julgamento do habeas corpus — que pode levar meses — pode acarretar dano irreparável ou de difícil reparação.

Em muitos casos, para atacar o indeferimento da medida liminar pelo relator do habeas corpus, o impetrante maneja novo habeas corpus para o órgão jurisdicional superior (em geral, o STJ, contra decisões proferidas por Tribunais estaduais ou regionais federais). Indeferida a liminar pelo STJ, muitos impetrantes impetram novo habeas corpus perante o STF. Para restringir essa prática, em 2003, o STF editou a Súmula 691, segundo a qual: “não compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer de habeas corpus impetrado contra decisão do relator que, em habeas corpus requerido a tribunal superior, indefere a liminar”. Das 300 decisões que denegaram habeas corpus na amostra, 28% mencionaram a Súmula 691 como argumento para deixar de analisar o mérito do pedido.

Esse entendimento fundamenta-se em interpretação restritiva do artigo 102, I, i, da Constituição Federal, que estabelece competir ao STF processar e julgar habeas corpus quando “o coator for Tribunal Superior ou o coator ou o paciente for autoridade ou funcionário cujos atos estejam sujeitos diretamente à jurisdição do Supremo Tribunal Federal”. Segundo esse entendimento, haveria “supressão de instância” se o STF julgasse habeas corpus contra decisão monocrática de um Tribunal Superior. A título de exemplo, na decisão abaixo, o Ministro Luiz Fux não analisa nenhuma das questões de mérito levadas ao STF pelo impetrante com base unicamente neste entendimento, que resume da seguinte forma:

Com efeito, esta Suprema Corte não pode, em razão da sua competência constitucionalmente delineada e da organicidade do direito, conhecer, nesta via mandamental, questões não examinadas definitivamente no Tribunal a quo, sob pena de estimular a impetração de habeas corpus per saltum, em detrimento da atuação do Superior Tribunal de Justiça, órgão jurisdicional que igualmente ostenta competências de envergadura constitucional.30 30 Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, HC 184.712, Rel. Min. Luiz Fux, DJe 30/04/2020, p. 6

Essa, porém, não é uma regra absoluta. O STF tem admitido a possibilidade de conceder habeas corpus nessas circunstâncias se houver flagrante ilegalidade na privação de liberdade31 31 Supremo Tribunal Federal, Segunda Turma, HC 93.767, Rel. Min. Celso de Mello, DJe 31/03/2014. Ver, também, Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, HC 221.477, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJe 20/10/2022; Supremo Tribunal Federal, Plenário, Medida Cautelar no HC 86.864, Rel. Min. Carlos Velloso, DJe 16/12/2005. . Um exemplo notório ocorreu no âmbito da Operação Lava Jato quando o Ministro Teori Zavascki superou a Súmula 691 e concedeu liminar para revogar a prisão preventiva de um dos investigados32 32 Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, HC 125.555, Rel. Min. Teori Zavascki, DJe 04/04/2015. . Nesse caso, o STF reafirmou explicitamente a possibilidade de concessão de habeas corpus contra decisão liminar quando a decisão de prisão é “teratológica, manifestamente ilegal ou abusiva”33 33 Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, HC 125.555, Rel. Min. Teori Zavascki, DJe 04/04/2015. .

A Súmula 691 tem sido objeto de duas críticas principais. Primeiro, questiona-se sua base no texto constitucional. Foi com esse fundamento que o Ministro Cezar Peluso propôs seu cancelamento em uma decisão em habeas corpus em 200534 34 Supremo Tribunal Federal, Plenário, HC 85.185, Rel. Min. Cezar Peluso, DJe 01/09/2006. Ver, também, Toron (2017, p. 86). . Esse entendimento não foi endossado pela maioria da Corte, que manteve a súmula, mas concedeu ordem de habeas corpus “de ofício” por constatar flagrante ilegalidade no caso concreto35 35 O art. 654, §2º, do Código de Processo Penal autoriza juízes e Tribunais a concederem habeas corpus de ofício sempre que “sofre ou está na iminência de sofrer constrangimento ilegal”. . O resultado desse caso aponta para a segunda crítica: a falta de clareza quanto ao conceito de “flagrante ilegalidade” gera incerteza, casuísmo e inconsistência na aplicação dessa súmula36 36 De acordo com Toron (2017, p. 89), “[s]ão tantas as interpretações construídas para sua mitigação que ela [a Súmula 691] mais se presta ao desserviço de gerar insegurança do que ao papel de estabilizar jurisprudência”. .

A exceção para os casos de “flagrante ilegalidade” oferecia uma oportunidade para que considerações sobre os riscos à saúde relacionados à Covid-19 e sobre a Recomendação 62 fossem apreciadas via habeas corpus pelo STF. No entanto, isso ocorreu em poucos casos e sem elementos suficientes na fundamentação para se apontar coerência na aplicação da exceção. Em 33,48% dos 227 habeas corpus negados sob o argumento da supressão de instância, havia a alegação específica de que a pessoa presa era idosa ou tinha alguma comorbidade, mas essa alegação não foi analisada porque, de acordo com o STF, era necessário aguardar o julgamento da instância inferior.

Um caso ilustra como o risco da pandemia pode desaparecer em meio a argumentos processuais. Sob o argumento de supressão de instância, o Ministro Luiz Fux negou seguimento a um habeas corpus impetrado em favor de uma mulher que cumpria pena por tráfico de drogas — crime cometido sem violência — e que alegava pertencer ao grupo de risco para Covid-19 pelo fato de portar HIV37 37 Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, HC 188.867, Rel. Min. Luiz Fux, DJe 07/08/2020, p. 6. . A leitura da decisão do STJ nesse caso mostra que a liminar fora negada porque o habeas corpus lá impetrado impugnava “decisão singular” de desembargador do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte. O desembargador, por sua vez, havia denegado liminarmente o habeas corpus sob o fundamento de que o instrumento utilizado era inidôneo e que a decisão do juiz de execução deveria ter sido impugnada via agravo em execução. O caso, portanto, passou por três instâncias sem que a alegação da paciente sobre os critérios na Recomendação 62 fosse avaliada.

Em regra, as decisões do STF concentraram-se na fundamentação da aplicação da Súmula 691 e na reprodução do fundamento da decisão da autoridade coatora no habeas corpus. Do conjunto das decisões, não foi possível extrair de suas fundamentações um entendimento claro do STF quanto ao que seria “ilegalidade flagrante” ou ao modo em que esse conceito deveria ser aplicado em casos concretos no contexto da pandemia.

3.2. Impossibilidade de reexame probatório em habeas corpus

Dos 300 habeas corpus não concedidos, 21% foram negados expressamente sob o argumento de que se tratava de instrumento incompatível com “reexame de provas”, “incursão na moldura fática” ou “valoração e exame minucioso do acervo fático probatório”. O argumento apareceu, na maior parte das vezes, em pedidos de prisão domiciliar em razão da pandemia da Covid-19.

Uma das chaves relevantes para analisar as decisões do STF sobre a pandemia em matéria penal – em geral, habeas corpus que pedem o cumprimento da prisão (preventiva ou execução da pena) em regime domiciliar – passa pela compreensão do que se entende por “vedação ao reexame de prova em habeas corpus” e como esse argumento serve como obstáculo para a concessão de liberdade.

O habeas corpus visa a reverter ou prevenir a ilegal “lesão ou ameaça à liberdade de locomoção” (Badaró, 2022BADARÓ, Gustavo. Processo Penal. 10 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2022., p. 1115)38 38 Segundo o artigo 5º, LXVIII, da Constituição Federal: “conceder-se-á “habeas-corpus” sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder”. . Trata-se de ação autônoma de impugnação que opera como “meio de ataque colateral porque propicia a apreciação e eventual alteração de decisão por autoridade judicial que não é aquela responsável pela análise da questão em um primeiro momento” (Vasconcellos, 2023VASCONCELLOS, Vinicius Gomes de. Limites cognitivos do exame judicial em habeas corpus nos Tribunais Superiores. In: PEDRINA, Gustavo Mascarenhas Lacerda; NUNES, Mariana Madera; SOUZA, Rafael Ferreira de; VASCONCELLOS, Vinicius Gomes de (orgs.). Habeas corpus no Supremo Tribunal Federal. 3ª ed. São Paulo: RT, 2023. p. 155-167., p. 159).

Como forma de ataque colateral, “não há fase instrutória, mas há instrução” e, por essa razão, “o pedido de habeas corpus deverá ser instruído com documentos” (Badaró, 2022, p. 1132). Em outras palavras, “a análise do habeas corpus depende de evidente demonstração da coação ou da ameaça, não sendo permitida uma análise exauriente do conteúdo” (Moraes; Vasconcellos, 2022MORAES, Helena Brandão Nogueira de Oliveira; VASCONCELLOS, Vinicius Gomes de. Aspectos jurídicos da pandemia do Covid-19 e a atuação do Supremo Tribunal Federal em habeas corpus. Revista Direito Público, Brasília, v. 19, n. 102, p. 367-392, abr./jun. 2022. https://doi.org/10.11117/rdp.v19i102.5006
https://doi.org/10.11117/rdp.v19i102.500...
, p. 376).

Ainda assim, é possível – na verdade, necessário – o exame “da prova pré-constituída que acompanha a petição inicial, da resposta ao pedido de informação e de qualquer outra prova documental juntada aos autos” (Badaró, 2022, p. 1132)BADARÓ, Gustavo. Processo Penal. 10 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2022.. Aury Lopes Jr. (2022, p. 1231)LOPES JR., Aury. Direito Processual Penal. 19 ed. São Paulo: Saraiva, 2022. também entende ser possível a “análise” de prova pré-constituída, mas não pode ser feita “ampla discussão probatória”:

[...] não se pode confundir dilação probatória com análise da prova (pré-constituída). A sumarização da cognição impede que se pretenda produzir prova em sede de habeas corpus ou mesmo obter uma decisão que exija a mesma profundidade da cognição do processo de conhecimento (ou seja, aquela necessária para se alcançar a sentença de mérito).

A análise qualitativa dos habeas corpus negados com base no argumento de que dependeriam de “reexame de prova”, contudo, revelou um déficit de fundamentação dessas decisões. A leitura das decisões não permite observar o que o tribunal entende que poderia ser feito em habeas corpus. Uma coisa é rever a “conclusão das instâncias inferiores” sobre a comprovação do fator de risco (i.e., aferir se há ou não determinada doença); outra coisa, muito diferente, é rever a conclusão das instâncias inferiores sobre a aplicação da regra ao caso, isto é, se determinada doença significa “extremamente debilitado por doença grave” (art. 318, do CPP) ou “acometido de doença grave” (art. 117, da LEP), considerando que a Recomendação 62 recomendou aos magistrados a “reavaliação das prisões provisórias” e a “concessão de saída antecipada do regime fechado” de presos idosos ou em grupo de risco.

Muito frequentemente, os habeas corpus insurgem-se contra decisões que negavam a prisão domiciliar por exigirem que as pessoas presas provassem a impossibilidade de tratamento das enfermidades no estabelecimento prisional. Portanto, à pessoa presa cabia o ônus de produzir prova negativa – também chamada de “prova diabólica” por sua dificuldade de produção – que requeria informações de difícil acesso sobre o serviço de saúde no estabelecimento prisional. Na prática, quando o STF se recusa a examinar questões de prova, endossa esse entendimento sobre ônus de prova, limitando significativamente a aplicabilidade da Recomendação 62.

Um caso ilustra bem essa questão: um homem de 66 anos, com câncer de próstata, “hipertenso, obeso e com diagnóstico de enfisema pulmonar bilateral + pequenos nódulos pulmonares”39 39 Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, HC 200.754, Rel. Min. Alexandre de Moraes, DJe 23/04/2021, p. 6. , pediu o cumprimento da prisão preventiva em seu domicílio com fundamento na Recomendação 62. Ele era processado pelo crime de homicídio qualificado e estava foragido quando o habeas corpus foi impetrado. De acordo com a decisão de primeira instância que havia denegado o pedido de prisão domiciliar:

não há indicação expressa e irrefutável de que esteja extremamente debilitado, tampouco há prova de que ainda esteja com enfisema pulmonar nos dias atuais ou mesmo que ainda tenha células cancerígenas em seu corpo, não tendo se submetido a cirurgia para retirada do tumor e/ou a tratamento rádio ou quimioterápico e, ainda, de que o tratamento necessário ao controle dessas doenças não possa ser realizado junto ao estabelecimento prisional [...]40 40 Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, HC 200.754, Rel. Min. Alexandre de Moraes, DJe 23/04/2021, p.3. .

O Ministro Relator Alexandre de Moraes negou seguimento ao pedido sob o argumento de que “a análise das questões fáticas suscitadas pela defesa, de forma a infirmar o entendimento das instâncias ordinárias, demandaria o reexame do conjunto probatório, providência incompatível com esta via processual”41 41 Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, HC 200.754, Rel. Min. Alexandre de Moraes, DJe 23/04/2021, p.10. .

O argumento da impossibilidade de “reexame de provas” em habeas corpus também foi aplicado de forma inconsistente. Na amostra, houve casos nos quais a ordem de habeas corpus foi concedida pelo STF apesar da avaliação dos tribunais inferiores de que inexistia prova de que a pessoa presa não poderia ser tratada dentro da unidade prisional. Em um deles, um homem de 70 anos, com diabetes, estava cumprindo pena pelo crime de estelionato e teve negado seu pedido de cumprimento da prisão em regime domiciliar em razão da pandemia. A liminar foi indeferida pelo STJ sob o argumento de que “as instâncias de origem consignaram a falta de comprovação da necessidade de tratamento médico e que não há casos confirmados no estabelecimento prisional da comarca de origem”42 42 Superior Tribunal de Justiça, Decisão Monocrática, HC 619.088, Rel. Min. Saldanha Palheiro, DJe 21/10/2020, p. 2. . O Ministro Gilmar Mendes, porém, concedeu a ordem de habeas corpus para converter a prisão em regime fechado para prisão domiciliar, pois “caracterizada situação ensejadora do afastamento da incidência da Súmula 691/STF”, considerando que o paciente, então com 70 anos e diabético, cumpria pena por crime sem violência ou grave ameaça (estelionato)43 43 Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, HC 193.361, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe 05/11/2020. .

Nos casos em que o STF reverteu as decisões das instâncias inferiores que haviam constatado falta de prova de necessidade de tratamento médico, não há grandes explicações quanto ao que levou o tribunal a superar o obstáculo do “reexame de prova”, que impediu a análise detida de muitos casos durante a pandemia. Portanto, o uso desse argumento, assim como o da “supressão de instância”, parece seletivo. Não há critérios claros sobre sua superação para autorizar a avaliação do mérito e a concessão do pedido. Isso gera inconsistência, desigualdade e insegurança em decisões versando sobre liberdade individual.

A inconsistência na aplicação do argumento e a confusão conceitual sobre o que quer dizer “reexame de prova” já é bem documentada na doutrina. De acordo com Vasconcellos (2023, p. 164)VASCONCELLOS, Vinicius Gomes de. Limites cognitivos do exame judicial em habeas corpus nos Tribunais Superiores. In: PEDRINA, Gustavo Mascarenhas Lacerda; NUNES, Mariana Madera; SOUZA, Rafael Ferreira de; VASCONCELLOS, Vinicius Gomes de (orgs.). Habeas corpus no Supremo Tribunal Federal. 3ª ed. São Paulo: RT, 2023. p. 155-167.,

o posicionamento que simplesmente veda o reexame probatório em âmbito de habeas corpus é insuficiente e inoperante, pois (1) a ação de HC é instruída por provas documentais, além das informações prestadas pelo juízo de origem e há análise de tais elementos; e (2) a distinção entre “reexame de prova” e “nova valoração jurídica da prova” mostra-se confusa em diversos casos concretos.

Mas a pesquisa mostra que nem mesmo o contexto crítico e urgente da pandemia de Covid-19 nos anos de 2020 e 2021 – que levou o CNJ a recomendar aos juízos a reavaliação das prisões provisórias e concessão de saída antecipada dos regimes fechado e semiaberto em razão de “dificuldades para garantia da observância dos procedimentos mínimos de higiene e isolamento rápido dos indivíduos sintomáticos, insuficiência de equipes de saúde, entre outros” em presídios brasileiros – foi capaz de promover uma mudança nesse estado de coisas. O STF continuou a usar, de forma inconsistente, o argumento de “reexame de provas” para evitar a análise dos riscos de saúde dos indivíduos que acionaram a Corte durante a pandemia.

4. Reincidência, risco de reiteração delitiva e periculosidade do agente

A periculosidade do agente, a reincidência e o risco de reiteração delitiva são elementos frequentemente utilizados em fundamentações sobre a imposição de prisão, especialmente no tocante à prisão provisória. Trata-se de argumentos em geral relacionados à noção de “ordem pública”, prevista no art. 312 do CPP.

O fundamento da “ordem pública” tem sido questionado pela literatura em razão de sua vagueza e imprecisão44 44 Nesse sentido, confira-se: Mirza (2016); Badaró (2022, p. 1212); Prado e Santos (2018, p. 226); Saad (2013). . O próprio CNJ já afirmou: “ao ser discutida a ordem pública, a análise da possibilidade de reiteração delitiva e das condições pessoais da pessoa presa conduzem a uma argumentação pautada em discursos que se voltam à construção do perfil de pessoas que seriam mais ou menos ‘perigosas’ e ‘propensas a voltar-se a atividades criminais’” (CNJ, 2020CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ. Manual sobre tomada de decisão na audiência de custódia: parâmetros gerais. LANFREDI, Luís Geraldo Sant’Anna et al. (coords.). Brasília: Conselho Nacional de Justiça, 2020., p. 141). Tal argumentação, segundo o CNJ (2020, p. 143), não deve ser adotada pelo Judiciário, pois promove a construção de “uma lógica decisória baseada em um direito penal do autor, e não do fato”, constituindo, assim, uma “prática que viola a presunção de inocência e vai contra as possibilidades constitucionais para prisão provisória”.

Na presente pesquisa, reincidência, risco de reiteração delitiva ou periculosidade do agente foram utilizados pelo STF em 26,3% das denegações de pedidos no contexto da pandemia45 45 Na maior parte das vezes, os argumentos sobre periculosidade e reincidência vinham acompanhados de argumentos processuais. Por exemplo, em 65% das vezes que a periculosidade foi citada como argumento para denegação, tratou-se de argumento complementar à supressão de instância. Da mesma forma, em 71% das vezes em que a decisão citou risco de reiteração ou reincidência da pessoa presa para não soltar, esse argumento veio acompanhado de argumento referente à supressão de instância. . A ideia de periculosidade surge nas decisões em uma formulação recorrente e genérica: “a periculosidade do agente é motivo idôneo para a custódia cautelar e é evidenciada pelo modus operandi/gravidade concreta do delito e pelo risco de reiteração delitiva”46 46 A título de exemplo, tal construção textual aparece nas seguintes decisões da amostra: Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, HC 184.532/SP, Ministra Carmen Lúcia, 27 abr. 2020; Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, HC 186.848/MG, Ministra Carmen Lúcia, 16 jun. 2020; e Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, HC 199.960/MG, Ministro Gilmar Mendes, 13 abr. 2021. . Tal formulação, inclusive, apareceu em um dos casos da amostra, no corpo de um precedente de 2012 citado na decisão:

Se as circunstâncias concretas da prática do ilícito indicam, pelo modus operandi, a periculosidade do agente ou o risco de reiteração delitiva, está justificada a decretação ou a manutenção da prisão cautelar para resguardar a ordem pública, desde que igualmente presentes boas provas da materialidade e da autoria, à luz do art. 312 do CPP (v.g. HC 105.585/SP, HC 112.763/MG e HC 112.364 AgR/DF, precedentes da minha lavra). Dentre eles, destaco o seguinte: “Este Supremo Tribunal assentou que a periculosidade do agente evidenciada pelo modus operandi e o risco concreto de reiteração criminosa são motivos idôneos para a manutenção da custódia cautelar.

(HC 110.313/MS, Rel. Min. Cármen Lúcia, 1ª Turma, DJe 13.02.2012)47 47 Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, HC 186.045/MG, Ministra Rosa Weber, 27 mai. 2020. .

Na amostra analisada, exemplos de circunstâncias ligadas ao modus operandi e à gravidade concreta do delito que configuram a periculosidade do agente são: grande quantidade de drogas apreendidas48 48 Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, HC 189.680/SC, Ministra Carmen Lúcia, 20 ago. 2002. , liderança em associação criminosa e mentoria do crime praticado49 49 Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, HC 199.960/MG, Ministro Gilmar Mendes, 13 abr. 2021. , gravidade incrementada do delito de homicídio em razão de premeditação, violência extrema e divisão de tarefas entre os agentes50 50 Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, HC 181.708/SP, Ministra Carmen Lúcia, 12 mai. 2020. .

O parâmetro “reiteração delitiva”, por sua vez, pretende avaliar o risco de que a pessoa, caso não seja presa, venha a cometer novos delitos. Em alguns casos, a presença de reincidência ou maus antecedentes foi suficiente para embasar esse prognóstico51 51 Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, HC 184.137/CE, Ministro Edson Fachin, 06 mai. 2020. Os exemplos citados a seguir demonstram a forma pela qual os registros criminais prévios foram mobilizados pelo STF para justificar a necessidade de custódia cautelar:

É de concluir-se, portanto, que a decisão do Juízo de primeira instância, mantida pelo STJ, alinha-se perfeitamente à jurisprudência deste Supremo Tribunal, firmada no sentido de que a prisão preventiva pode ter fundamento na reiteração criminosa como violadora da ordem pública, quando demonstrada a presença de registro de prática de crimes na folha de antecedentes criminais do réu, ainda mais, como no caso, em que ele é reincidente específico.52 52 Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, HC199.944/SP, Ministro Ricardo Lewandowski, 05 abr. 2021.

Na hipótese dos autos, não verifico a ocorrência de manifesta e incontestável ilegalidade a reclamar a superação da referida súmula. Isso porque a prisão justifica-se, sobretudo, diante da possibilidade da reiteração delitiva, haja vista a notícia nos autos de que o acusado responde a ações penais pela prática de diversos delitos.53 53 Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, HC201.517/SP, Ministro Gilmar Mendes, 13 mai. 2021.

Em outros casos analisados, a Corte baseou a análise do risco da reiteração delitiva em ação concreta do próprio paciente que “já beneficiado por medida cautelar diversa da prisão voltou a delinquir”54 54 Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, HC201.988/RS, Ministro Dias Toffoli, 31 mai. 2021. . Em outros, o STF fez essa avaliação a partir das circunstâncias fáticas da acusação, como, por exemplo: “trata-se de organização criminosa estruturada que, em tese, chega a auferir R$ 160.000,00 por mês, com atividade regular e reiterada, dirigida à aplicação de golpes”55 55 Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, HC191.304/MT, Ministro Gilmar Mendes, 16 set. 2020. .

Embora os antecedentes negativos sejam aceitos como indicativos do risco de reiteração delitiva, o contrário não é verdadeiro: ou seja, a primariedade da pessoa e/ou a ausência de maus antecedentes não obstaram a manutenção da prisão em diversos dos casos que compuseram a amostra:

A jurisprudência deste Supremo Tribunal consolidou-se no sentido de que a “existência de condições subjetivas favoráveis ao agravante, tais como primariedade e residência fixa, não obsta a segregação cautelar, desde que presentes, nos autos, elementos concretos a recomendar sua manutenção, como se verifica na espécie” (HC n. 154.394, Relator o Ministro Dias Toffoli, DJe 24.8.2018).56 56 Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, HC 198.232/MT, Ministra Carmen Lúcia, 1º mar. 2021.

Em conclusão, o uso dos argumentos relacionados à periculosidade, à reiteração delitiva e à reincidência na amostra analisada reforça o diagnóstico já feito em outras seções deste trabalho quanto ao padrão decisório da Suprema Corte: privilegia-se a manutenção da prisão, mesmo durante a pandemia.

5. Recomendação 62 e as decisões que promoveram saída da prisão

A amostra contém 24 casos em que a medida de desencarceramento foi concedida, determinando a revogação da prisão preventiva ou a substituição da prisão (cautelar ou definitiva) por prisão domiciliar57 57 A maioria dessas 24 decisões de concessão foi proferida pelo Ministro Gilmar Mendes (10) e as demais pelo Ministro Ricardo Lewandowski (4), Ministro Edson Fachin (3), Ministro Marco Aurélio (3), Ministro Luís Roberto Barroso (1), Ministro Dias Toffoli (1), Ministra Rosa Weber (1) e Ministro Nunes Marques (1). As demais decisões não envolveram ordens diretas de desencarceramento e determinaram a realização da audiência de custódia, progressão para o regime semiaberto (em cumprimento à Súmula Vinculante 56) ou a inclusão de julgamento em pauta para evitar excesso de prazo na prisão preventiva. . Nessas 24 decisões, em 10 houve menção à Recomendação 62 ou ao contexto pandêmico em seus fundamentos. Isso significa que a maioria das concessões não foi fundamentada textualmente na pandemia, ou seja, a pandemia teve impacto ainda menor nos modos de decidir do STF do que a taxa de concessão – já pequena – poderia indicar58 58 Como, neste trabalho, foram analisados os textos das decisões monocráticas e os argumentos utilizados pelo Supremo Tribunal Federal, a ausência da referência à pandemia ou à Recomendação foi considerada, para fins desta pesquisa, como ausência de peso argumentativo desse fator nas decisões. .

Contudo, há três casos em que a argumentação se baseou exclusiva e extensivamente na Recomendação 62 e no contexto da pandemia. Essas decisões, todas proferidas pelo Ministro Gilmar Mendes, contêm diversos parágrafos (idênticos) sobre a Recomendação 62 para a redução de danos diante da gravidade da pandemia e o risco que representa para a população carcerária dado o estado de coisas inconstitucional.

Nesse sentido, a Recomendação 62 do Conselho Nacional de Justiça busca estabelecer medidas para impedir a propagação do Covid-19 dentro dos estabelecimentos penais e de internação de menores, de modo a evitar a ocorrência de danos irreparáveis à saúde e à vida de milhares de pessoas que se encontram sob a guarda específica do Estado, o que certamente ocorrerá, caso haja a propagação em massa desse novo vírus nas condições atualmente existentes.Com efeito, ao recomendar a excepcionalidade e a reavaliação das medidas de internação de jovens infratores e de prisões definitivas e provisórias por conta da propagação do Covid-19, inclusive em casos como os das mães, gestantes, lactantes, deficientes, idosos e outros grupos vulneráveis, o CNJ reforçou as normas que já constam da legislação federal e da Constituição Federal, relativas aos direitos e garantias fundamentais à liberdade, ao devido processo legal, à proteção à maternidade, à presunção de inocência e à saúde [...] Em tal sentido, a Recomendação 62, de 17 de março de 2020 do Conselho Nacional de Justiça deve ser adotada como parâmetro.”59 59 Cf. Supremo Tribunal Federal, Habeas Corpus 193.361/MG, Ministro Gilmar Mendes, 29 out. 2020; Supremo Tribunal Federal, Habeas Corpus 183.693/MG, Ministro Gilmar Mendes, 06 mai. 2020; Supremo Tribunal Federal, Habeas Corpus 186.020 MC/SP, Ministro Gilmar Mendes, 19 jun. 2020.

Dois desses casos envolvem cumprimento de penas elevadas (mais de 40 e mais de 17 anos de reclusão em regime fechado). A concessão da prisão domiciliar levou em consideração o fato de que ambos os pacientes integrariam grupo de risco da Covid-19. Um deles tinha 70 anos, era diabético, e o crime não teria envolvido violência ou grave ameaça à pessoa60 60 Supremo Tribunal Federal, Habeas Corpus 193.361/MG, Ministro Gilmar Mendes, 29 out. 2020. ; o outro era cardiopata, hipertenso e diabético61 61 Supremo Tribunal Federal, Habeas Corpus 183.693/MG, Ministro Gilmar Mendes, 06 mai. 2020. . O terceiro caso refere-se a dois pacientes envolvidos em crime cometido sem violência ou grave ameaça, cujas penas não ultrapassavam sete anos em regime inicial de cumprimento no semiaberto62 62 Supremo Tribunal Federal, Habeas Corpus 186.020 MC/SP, Ministro Gilmar Mendes, 19 jun. 2020. .

Há, ainda, um caso em que o argumento da pandemia foi mencionado, mas não foi determinante para a concessão do pedido de revogação de prisão preventiva. Nesse caso, o Ministro Marco Aurélio sustentou que “a crise sanitária decorrente da pandemia Covid-19 é insuficiente a levar ao acolhimento da providência pretendida”. Contudo, a prisão foi revogada pelo Ministro por basear-se na gravidade abstrata do delito63 63 Supremo Tribunal Federal, HC 197.648 MC/PR, Ministro Marco Aurélio, 25 fev. 2021. .

Em conclusão, a pandemia serve como fundamento da decisão em poucos casos, sendo menor ainda o número de casos nos quais é determinante para concessão de medida de desencarceramento. No entanto, assim como na aplicação de argumentos processuais, há poucos elementos que explicam os motivos pelos quais a pandemia tem algum peso, enquanto há casos nos quais a crise sanitária e os riscos para os pacientes sequer chegam a ser discutidos. Essa falta de critérios claros na argumentação judicial reforça o problema de insegurança, casuísmo e inconsistência nas decisões do STF em matéria de encarceramento durante a pandemia de Covid-19.

Considerações finais

A pesquisa mostrou que, mesmo durante a crise gerada pela pandemia, o STF pouco promoveu medidas desencarceradoras de pessoas inseridas em um sistema prisional caracterizado, pela própria Corte, como um “estado de coisas inconstitucional”. Das 396 decisões penais do STF durante a pandemia de Covid-19 analisadas na pesquisa, apenas 6% representaram concessão de pedido de revogação da prisão, recolhimento em prisão domiciliar ou progressão de regime.

A maioria dos casos que chegaram ao STF sequer teve o mérito analisado, pois a Corte, aplicando argumentos processuais, decidiu não decidir durante a crise sanitária. Entre esses argumentos, destacam-se aqueles relativos à supressão de instância e à impossibilidade de reexame de matéria fático-probatória em sede de habeas corpus – o principal instrumento processual disponível para se chegar ao STF em matéria penal. Das 300 decisões denegatórias de habeas corpus, 75,6% utilizaram o argumento de que a jurisdição dos tribunais inferiores ainda não havia sido esgotada (“supressão de instância”) e 21% apontaram a incompatibilidade do habeas corpus com o “reexame de provas”.

A análise qualitativa das decisões mostrou que os argumentos sobre supressão de instância e vedação de análise de prova podem servir para barrar qualquer habeas corpus com pouco ônus argumentativo. O uso de argumentos processuais para não se analisar o mérito de um habeas corpus precede a pandemia (Zambom, 2022ZAMBOM, Mariana Morais. Os sentidos da ressocialização em decisões sobre a gestão da sanção no Superior Tribunal de Justiça. Dissertação (Mestrado em Direito) – Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getulio Vargas, FGV, São Paulo, 2022. Disponível em: https://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/handle/10438/32392. Acesso em: 18 abr. 2023.
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, p.172-173), mas não se pode deixar de notar a manutenção da prática mesmo durante a pandemia - e por um tribunal que reconheceu o “estado de coisas inconstitucional” no sistema carcerário e abertamente criticou a inação do Executivo federal na tomada de medidas para proteger a população contra a Covid-19 (Wang et al., 2023WANG, Daniel Wei Liang; ARRUDA, Ana Luiza Gajardoni de Mattos; OLIVEIRA, Bruno da Cunha de; SANTOS, Ezequiel Fajreldines dos; MORIBE, Gabriela Tiemi; HECK, Leonardo Nochang; ESTEVES, Luiz Fernando Gomes; PEDRO, Marcela Pereira. O STF e as medidas de prevenção e tratamento da Covid-19. Revista Direito GV, São Paulo, v. 19, p. e2336, 2023. https://doi.org/10.1590/2317-6172202336.
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).

Casos possivelmente urgentes — e que dificilmente chegariam ao STF em tempo hábil caso se aguardassem todos os julgamentos de mérito das instâncias inferiores — foram rejeitados sem uma resposta efetiva. No contexto de uma pandemia causada por um vírus que se espalhava de forma veloz, o tempo era questão central. Manter os entendimentos sobre supressão de instância e vedação de reexame de provas consistiu em uma opção: a Corte escolheu não agir e, quando o fez, interferiu não de forma sistemática, mas seletiva e inconsistente, nas práticas judiciais que contribuem para o superencarceramento. Nos casos em que o STF analisou o caso concreto – ainda que de forma superficial para aferir eventual “flagrante ilegalidade” que autorizasse a superação do obstáculo processual criado pela própria Corte –, pouco se falou de risco de vida ou condições de saúde nas instituições prisionais.

O presente estudo evidencia que o STF optou por não interferir direta e decisivamente na forma como instâncias inferiores decidiam questões relacionadas a encarceramento durante a pandemia. Primeiro, porque não concedeu pedidos em controle concentrado de constitucionalidade para obrigar que o Judiciário considerasse a aplicação de medidas alternativas à prisão diante do quadro de pandemia e dos riscos aumentados para certos grupos. Se resolveu não atuar no atacado, no varejo decidiu não decidir a maioria dos pedidos individuais de medidas de desencarceramento durante a pandemia.

O protagonismo de argumentos processuais para barrar análises de mérito de pedidos de desencarceramento foi viabilizado, no plano discursivo, pela utilização de expressões que surgem nas decisões monocráticas como se fossem autoevidentes (“manifesta ilegalidade”, “teratologia”). Trata-se, contudo, de expressões que carecem de carga semântica capaz de orientar a justificação judicial da decisão sobre a prisão: não há um entendimento claro sobre o que configura a abusividade ou a manifesta ilegalidade de uma decisão de instância inferior.

Além de confirmar o diagnóstico de que a crise causada pela Covid-19 não implicou mudanças relevantes no modo como o Judiciário lida com o encarceramento, a pesquisa mostra que nem mesmo instrumentos potencialmente transformadores das práticas institucionais relativas à prisão, como a cautelar concedida na ADPF 347 e a Recomendação 62, trouxeram mudanças significativas64 64 VideVasconcelos, Machado e Wang (2020); Machado e Vasconcelos (2021); Vasconcelos, Machado e Yu Jiunn Wang (2020); Hartmann et al (2020); Quintão e Ribeiro (2022); Neri e Carvalho (2020). .

Esse achado abre portas para a reflexão sobre o real significado da declaração do “estado de coisas inconstitucional” no sistema carcerário brasileiro. Se, em 2015, o STF adotou a expressão que criou uma série de expectativas na comunidade jurídica, em 2020 e 2021, a Corte evitou atribuir efeitos concretos para o termo, mesmo em meio à pandemia — como se a expressão não fosse dotada de carga normativa suficiente para constituir um conceito hábil para se conceder medidas alternativas ao cárcere. O “estado de coisas inconstitucional” não foi usado de modo destacado nos juízos sobre soltar ou não soltar uma pessoa durante a pandemia65 65 Salienta-se que, em 2023, a Corte julgou o mérito da ADPF 347 e reafirmou o estado de coisas inconstitucional no sistema carcerário brasileiro. Futuras pesquisas poderão mostrar se esse caso servirá como precedente para que o STF promova a saída de pessoas das prisões. .

Algo similar pode ser dito com relação à Recomendação 62 do CNJ que, embora não fosse uma norma cogente, buscou orientar a aplicação de regras processuais penais e constitucionais no contexto da pandemia66 66 Nesse sentido, por exemplo, há regras legais sobre medidas cautelares que oferecem alternativas à prisão provisória (artigo 318, caput e incisos; artigo 319, caput e incisos, ambos do CPP). . Como visto, a Recomendação raramente importou no julgamento de demandas concretas, apesar de o Pleno do STF ter destacado a importância das medidas propostas pelo CNJ nas decisões tomadas no âmbito da ADPF 347 em março de 2020 e do HC Coletivo 188.820.

Esta pesquisa mostra o descompasso entre o reconhecimento do STF da crise carcerária — como na ADPF 347 e na Recomendação 62 — e sua atuação cotidiana e individual. Mesmo durante uma crise sanitária que gravemente atingiu o Brasil, prevaleceram decisões amparadas em argumentos processuais e recheadas de expressões marcadas por um vácuo semântico. Este artigo contribuiu para a formação de um retrato da atuação do Judiciário, cujo órgão de cúpula consiste em uma poderosa Corte Suprema que, embora dotada de ampla competência e independência, não ousou promover mudanças estruturais na situação da população carcerária durante a pandemia.

  • 8
    Relativamente ao período de janeiro a junho de 2022, 661.915 pessoas estavam encarceradas no Brasil; 29,12% delas em prisão provisória, isto é, não haviam sido condenadas em definitivo (Departamento Penitenciário Nacional, 2022DEPARTAMENTO PENITENCIÁRIO NACIONAL. Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias. Brasília: Ministério da Justiça e Segurança Pública, 2022. Disponível em: https://app.powerbi.com/view?r=eyJrIjoiNWQ0ODM1OTQtMmQ2Ny00M2IyLTk4YmUtMTdhYzI4N2ExMWM3IiwidCI6ImViMDkwNDIwLTQ0NGMtNDNmNy05MWYyLTRiOGRhNmJmZThlMSJ9. Acesso em: 08 mar. 2022.
    https://app.powerbi.com/view?r=eyJrIjoiN...
    ).
  • 9
    Sobre o caso da ADPF 347, vide Machado (2020)MACHADO, Maíra Rocha. Quando o estado de coisas é inconstitucional: sobre o lugar do Poder Judiciário no problema carcerário. Revista de Investigações Constitucionais, Curitiba, vol. 7, n. 2, p. 631-664, maio/ago. 2020. http://dx.doi.org/10.5380/rinc.v7i2.60692
    https://doi.org/10.5380/rinc.v7i2.60692...
    e Magalhães (2019)MAGALHÃES, Breno Baía. O Estado de Coisas Inconstitucional na ADPF 347 e a sedução do Direito: o impacto da medida cautelar e a resposta dos poderes políticos. Revista Direito GV, São Paulo, v. 15, n. 2, e1916, 2019. https://doi.org/10.1590/2317-6172201916
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    .
  • 10
    Supremo Tribunal Federal, Plenário, Medida Cautelar na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 347, Ministro Relator Marco Aurélio Mello, julgado em 09 set. 2015. Disponível em: http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=10300665. Acesso em: 09 mar. 2023.
  • 11
    No momento da finalização deste artigo, o acórdão da ADPF 347 ainda não havia sido publicado. Vide STF Reconhece Violação Massiva (2023)STF RECONHECE VIOLAÇÃO MASSIVA de direitos no sistema carcerário brasileiro. STF Notícias, Brasília, 04 out. 2023. Disponível em: https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=515220&ori=1. Acesso em: 09 out. 2023.
    https://portal.stf.jus.br/noticias/verNo...
    .
  • 12
    O pedido foi feito pelo Instituto de Defesa do Direito de Defesa, nos autos da ADPF 347, cujo Ministro Relator era Marco Aurélio, por meio da Petição 14.137/2020.
  • 13
    ADPF 347 TPI-Ref, Relator para Acórdão Min. Alexandre de Moraes, julgado em 18/03/2020, DJe 30/06/2020.
  • 14
    Aqui, apresentamos resumidamente os pedidos formulados na ADPF 684. A petição inicial está disponível em: https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5910249. Acesso em: 26 jun. 2023.
  • 15
    Sobre a falta de impacto relevante da Recomendação n. 62 do CNJ, vide: Budó e Moser (2023)BUDÓ, Marília de Nardin; MOSER, Manuela. A pandemia da Covid-19 e as decisões do STJ sobre maternidade e prisão preventiva. Revista Direito e Práxis, Rio de Janeiro, v. 14, n. 1, p. 270-300, mar. 2023. https://doi.org/10.1590/2179-8966/2021/56871
    https://doi.org/10.1590/2179-8966/2021/5...
    , Valença e Freitas (2020)VALENÇA, Manuela Abath; FREITAS, Felipe da Silva. O direito à vida e o ideal de defesa social em decisões do STJ no contexto da pandemia da COVID-19. Revista Direito Público, Brasília, v. 17, n. 94, p. 570-594, jul./ago. 2020. Disponível em: https://www.portaldeperiodicos.idp.edu.br/direitopublico/article/view/4593. Acesso em: 28 nov. 2023.
    https://www.portaldeperiodicos.idp.edu.b...
    , Ryu (2022)RYU, Daiana Santos. Encarceramento provisório na pandemia do coronavírus (SarsCoV-2) na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: prisão preventiva como ultima ratio? Revista Brasileira de Direito Processual Penal, Porto Alegre, v. 8, n. 1, jan./abr. 2022. https://doi.org/10.22197/rbdpp.v8i1.628
    https://doi.org/10.22197/rbdpp.v8i1.628...
    , Trevisan et al (2020)TREVISAN, Beatriz Massetto et al. Prisão e pandemia: uma análise crítica das decisões do Supremo Tribunal Federal durante a crise da covid-19. Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal, Porto Alegre, v. 16, n. 96, p. 5-18, jun./jul. 2020.; Moraes e Vasconcellos (2022)MORAES, Helena Brandão Nogueira de Oliveira; VASCONCELLOS, Vinicius Gomes de. Aspectos jurídicos da pandemia do Covid-19 e a atuação do Supremo Tribunal Federal em habeas corpus. Revista Direito Público, Brasília, v. 19, n. 102, p. 367-392, abr./jun. 2022. https://doi.org/10.11117/rdp.v19i102.5006
    https://doi.org/10.11117/rdp.v19i102.500...
    .
  • 16
    Disponível em: https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search. Acesso em: 07 mar. 2023.
  • 17
    A base completa, com indicação sobre a decisão pertencer ao conjunto de penal ou não está publicada em https://hdl.handle.net/10438.3/FK2/P3X8N0.
  • 18
    Este artigo é dedicado unicamente às decisões monocráticas, primeiramente, porque elas representam a maior parte da nossa amostra, composta por 396 monocráticas e 28 colegiadas. A análise das colegiadas exige uma estratégia metodológica própria para desagregar e analisar a argumentação e decisão de cada Ministro ou Ministra, o que será realizado em outro estudo. Ainda assim, uma análise preliminar das 28 decisões colegiadas (compostas por 26 em sede de habeas corpus e duas em sede de reclamação) indicou que, em nenhum acórdão em habeas corpus, o Paciente teve sua situação melhorada pelo julgamento colegiado do writ ou do agravo regimental interposto contra a decisão monocrática — em um único caso, a situação piorou: no julgamento colegiado do HC 185.991, a liminar anteriormente concedida revogando a prisão preventiva por ausência de fundamentação idônea foi cassada, por maioria de votos, pela Primeira Turma. Por isso se pode dizer que decisões monocráticas são representativas da tutela jurisdicional prestada pelo STF em sede de habeas corpus — na amostra, nenhum agravo regimental interposto contra decisão monocrática que negava seguimento à impetração foi provido. Já no caso do julgamento colegiado das duas reclamações, em uma delas, a Reclamação 40.761, o agravo regimental foi provido para dar procedência à reclamação e determinar a inclusão do reclamante no regime semiaberto ou a adoção de medidas alternativas pelo juízo de 1º grau.
  • 19
    Apesar de o artigo seguir o sistema de citação de fontes no formato autor-data, as decisões judiciais serão citadas em notas de rodapé, com indicações que permitam a fácil identificação dos documentos consultados. Dado o número muito grande de decisões citadas, a referência a elas no estilo autor-data tornaria a identificação dos casos mais trabalhosa e a leitura menos fluida.
  • 20
    Observou-se tanto a presença de pedidos isolados, quando apenas um pedido foi formulado, como pedidos cumulados, quando havia mais de um pedido. Por essa razão, a soma dos pedidos ultrapassa o número de 396 decisões analisadas
  • 21
    Por concessão da liberdade entendemos as decisões que visavam ao desencarceramento, isto é, à retirada, ainda que provisória, do sistema carcerário.
  • 22
    Trata-se do agravo regimental no recurso ordinário em habeas corpus e embargos de declaração na extensão nos embargos de declaração na reclamação.
  • 23
    “A falta de estabelecimento penal adequado não autoriza a manutenção do condenado em regime prisional mais gravoso, devendo-se observar, nessa hipótese, os parâmetros fixados no RE 641.320/RS” STF, Súmula Vinculante 56, DJE de 8-8-2016.
  • 24
    Este trabalho abordará o protagonismo dos argumentos processuais nas decisões analisadas.
  • 25
    As concessões contemplam as decisões em que algum dos pedidos feitos pela defesa foram bem-sucedidos. Dentre elas, há decisões que levaram diretamente a algum tipo de desencarceramento (retirada, ainda que provisória, do sistema carcerário) e decisões que contemplam pedidos diversos, como a realização de audiência de custódia ou reavaliação da prisão pela instância inferior, considerando a pandemia da Covid-19.
  • 26
    Esta coluna abarca concessões aos pedidos presentes nos habeas corpus, reclamações e recursos, inclusive as medidas liminares ou cautelares, bem como aquelas feitas de ofício.
  • 27
    Esta coluna abarca denegações, indeferimentos de liminares e não conhecimentos.
  • 28
    Considerando-se os 47 casos de concessões que compõem a nossa amostra de monocráticas, nota-se que em 38,29% das decisões há referência à Recomendação 62, enquanto em 61,7% não há menção à Recomendação.
  • 29
    Cf., por exemplo, acórdão do RHC 176.629, julgado em 4/11/2020: “O acórdão impugnado não examinou a matéria suscitada neste recurso. Desse modo, torna-se inviável a esta Suprema Corte conhecer do tema originariamente, sob pena de indevida supressão de instância e violação das regras constitucionais de repartição de competências”.
  • 30
    Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, HC 184.712, Rel. Min. Luiz Fux, DJe 30/04/2020, p. 6
  • 31
    Supremo Tribunal Federal, Segunda Turma, HC 93.767, Rel. Min. Celso de Mello, DJe 31/03/2014. Ver, também, Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, HC 221.477, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJe 20/10/2022; Supremo Tribunal Federal, Plenário, Medida Cautelar no HC 86.864, Rel. Min. Carlos Velloso, DJe 16/12/2005.
  • 32
    Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, HC 125.555, Rel. Min. Teori Zavascki, DJe 04/04/2015.
  • 33
    Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, HC 125.555, Rel. Min. Teori Zavascki, DJe 04/04/2015.
  • 34
    Supremo Tribunal Federal, Plenário, HC 85.185, Rel. Min. Cezar Peluso, DJe 01/09/2006. Ver, também, Toron (2017, p. 86)TORON, Alberto Zacharias. Habeas Corpus: controle do devido processo legal: questões controvertidas e de processamento do writ. 1 ed. ver., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017..
  • 35
    O art. 654, §2º, do Código de Processo Penal autoriza juízes e Tribunais a concederem habeas corpus de ofício sempre que “sofre ou está na iminência de sofrer constrangimento ilegal”.
  • 36
    De acordo com Toron (2017, p. 89)TORON, Alberto Zacharias. Habeas Corpus: controle do devido processo legal: questões controvertidas e de processamento do writ. 1 ed. ver., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017., “[s]ão tantas as interpretações construídas para sua mitigação que ela [a Súmula 691] mais se presta ao desserviço de gerar insegurança do que ao papel de estabilizar jurisprudência”.
  • 37
    Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, HC 188.867, Rel. Min. Luiz Fux, DJe 07/08/2020, p. 6.
  • 38
    Segundo o artigo 5º, LXVIII, da Constituição Federal: “conceder-se-á “habeas-corpus” sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder”.
  • 39
    Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, HC 200.754, Rel. Min. Alexandre de Moraes, DJe 23/04/2021, p. 6.
  • 40
    Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, HC 200.754, Rel. Min. Alexandre de Moraes, DJe 23/04/2021, p.3.
  • 41
    Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, HC 200.754, Rel. Min. Alexandre de Moraes, DJe 23/04/2021, p.10.
  • 42
    Superior Tribunal de Justiça, Decisão Monocrática, HC 619.088, Rel. Min. Saldanha Palheiro, DJe 21/10/2020, p. 2.
  • 43
    Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, HC 193.361, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe 05/11/2020.
  • 44
    Nesse sentido, confira-se: Mirza (2016)MIRZA, Flávio. Novos paradigmas da prisão preventiva: um claro retrocesso. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, v. 24, n. 122, p. 115-134, set./out. 2016.; Badaró (2022, p. 1212)BADARÓ, Gustavo. Processo Penal. 10 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2022.; Prado e Santos (2018, p. 226)PRADO, Luiz Regis; SANTOS, Diego Prezzi. Prisão Preventiva: a contramão da modernidade. Rio de Janeiro: Forense, 2018.; Saad (2013)SAAD, Marta. Assimilação das finalidades da pena pela prisão preventiva. Revista Eletrônica de Direito Penal, Rio de Janeiro, v. 1, n. 1, p. 247-262, jun. 2013..
  • 45
    Na maior parte das vezes, os argumentos sobre periculosidade e reincidência vinham acompanhados de argumentos processuais. Por exemplo, em 65% das vezes que a periculosidade foi citada como argumento para denegação, tratou-se de argumento complementar à supressão de instância. Da mesma forma, em 71% das vezes em que a decisão citou risco de reiteração ou reincidência da pessoa presa para não soltar, esse argumento veio acompanhado de argumento referente à supressão de instância.
  • 46
    A título de exemplo, tal construção textual aparece nas seguintes decisões da amostra: Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, HC 184.532/SP, Ministra Carmen Lúcia, 27 abr. 2020; Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, HC 186.848/MG, Ministra Carmen Lúcia, 16 jun. 2020; e Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, HC 199.960/MG, Ministro Gilmar Mendes, 13 abr. 2021.
  • 47
    Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, HC 186.045/MG, Ministra Rosa Weber, 27 mai. 2020.
  • 48
    Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, HC 189.680/SC, Ministra Carmen Lúcia, 20 ago. 2002.
  • 49
    Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, HC 199.960/MG, Ministro Gilmar Mendes, 13 abr. 2021.
  • 50
    Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, HC 181.708/SP, Ministra Carmen Lúcia, 12 mai. 2020.
  • 51
    Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, HC 184.137/CE, Ministro Edson Fachin, 06 mai. 2020.
  • 52
    Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, HC199.944/SP, Ministro Ricardo Lewandowski, 05 abr. 2021.
  • 53
    Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, HC201.517/SP, Ministro Gilmar Mendes, 13 mai. 2021.
  • 54
    Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, HC201.988/RS, Ministro Dias Toffoli, 31 mai. 2021.
  • 55
    Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, HC191.304/MT, Ministro Gilmar Mendes, 16 set. 2020.
  • 56
    Supremo Tribunal Federal, Decisão Monocrática, HC 198.232/MT, Ministra Carmen Lúcia, 1º mar. 2021.
  • 57
    A maioria dessas 24 decisões de concessão foi proferida pelo Ministro Gilmar Mendes (10) e as demais pelo Ministro Ricardo Lewandowski (4), Ministro Edson Fachin (3), Ministro Marco Aurélio (3), Ministro Luís Roberto Barroso (1), Ministro Dias Toffoli (1), Ministra Rosa Weber (1) e Ministro Nunes Marques (1). As demais decisões não envolveram ordens diretas de desencarceramento e determinaram a realização da audiência de custódia, progressão para o regime semiaberto (em cumprimento à Súmula Vinculante 56) ou a inclusão de julgamento em pauta para evitar excesso de prazo na prisão preventiva.
  • 58
    Como, neste trabalho, foram analisados os textos das decisões monocráticas e os argumentos utilizados pelo Supremo Tribunal Federal, a ausência da referência à pandemia ou à Recomendação foi considerada, para fins desta pesquisa, como ausência de peso argumentativo desse fator nas decisões.
  • 59
    Cf. Supremo Tribunal Federal, Habeas Corpus 193.361/MG, Ministro Gilmar Mendes, 29 out. 2020; Supremo Tribunal Federal, Habeas Corpus 183.693/MG, Ministro Gilmar Mendes, 06 mai. 2020; Supremo Tribunal Federal, Habeas Corpus 186.020 MC/SP, Ministro Gilmar Mendes, 19 jun. 2020.
  • 60
    Supremo Tribunal Federal, Habeas Corpus 193.361/MG, Ministro Gilmar Mendes, 29 out. 2020.
  • 61
    Supremo Tribunal Federal, Habeas Corpus 183.693/MG, Ministro Gilmar Mendes, 06 mai. 2020.
  • 62
    Supremo Tribunal Federal, Habeas Corpus 186.020 MC/SP, Ministro Gilmar Mendes, 19 jun. 2020.
  • 63
    Supremo Tribunal Federal, HC 197.648 MC/PR, Ministro Marco Aurélio, 25 fev. 2021.
  • 64
    VideVasconcelos, Machado e Wang (2020)VASCONCELOS, Natalia Pires de; MACHADO, Maíra Rocha; WANG, Daniel Wei Liang. COVID-19 nas prisões: um estudo das decisões em habeas corpus no Tribunal de Justiça de São Paulo. Revista de Administração Pública, Rio de Janeiro, v. 54, n. 5, p. 1472-1485, set. 2020. http://dx.doi.org/10.1590/0034-761220200536
    https://doi.org/10.1590/0034-76122020053...
    ; Machado e Vasconcelos (2021)MACHADO, Maíra Rocha; VASCONCELOS, Natália Pires. Uma conjuntura crítica perdida: a COVID-19 nas prisões brasileiras. Revista Direito e Práxis, Rio de Janeiro, v. 12, n. 3, p. 2015-2043, 2021.; Vasconcelos, Machado e Yu Jiunn Wang (2020)VASCONCELOS, Natalia Pires de; MACHADO, Maíra Rocha; WANG, Daniel Wei Liang. COVID-19 nas prisões: um estudo das decisões em habeas corpus no Tribunal de Justiça de São Paulo. Revista de Administração Pública, Rio de Janeiro, v. 54, n. 5, p. 1472-1485, set. 2020. http://dx.doi.org/10.1590/0034-761220200536
    https://doi.org/10.1590/0034-76122020053...
    ; Hartmann et al (2020)HARTMANN, Ivar Alberto; MAIA, Natália; SILVA, Lorena Abbas da; MARPIN, Ábia; ALMEIDA, Guilherme. Como STF e STJ decidem Habeas Corpus durante a Pandemia do COVID-19? Uma Análise Censitária e Amostral. 2 jul. 2020. Disponível em: https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=3659624 ou http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.3659624 . Acesso em: 08 mar. 2023.
    https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?...
    ; Quintão e Ribeiro (2022)QUINTÃO, Beatriz Aranha; RIBEIRO, Ludmila. Judiciário em tempos de pandemia: um estudo das decisões em habeas corpus do Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Revista do Instituto de Ciências Penais, Belo Horizonte, v. 7, n. 1, p. 95–130, jan. 2022. https://doi.org/10.46274/1809-192XRICP2022v7n1p95-130
    https://doi.org/10.46274/1809-192XRICP20...
    ; Neri e Carvalho (2020)NERI, Bianca; CARVALHO, Jaqueline. Pandemia e prisão domiciliar: perpetuando o Estado de Coisas Inconstitucional. Atuação: Revista Jurídica do Ministério Público Catarinense, Florianópolis, v. 15, n. 33, p. 212-227, dez. 2020. https://doi.org/10.33946/2595-3966-v15n33-144
    https://doi.org/10.33946/2595-3966-v15n3...
    .
  • 65
    Salienta-se que, em 2023, a Corte julgou o mérito da ADPF 347 e reafirmou o estado de coisas inconstitucional no sistema carcerário brasileiro. Futuras pesquisas poderão mostrar se esse caso servirá como precedente para que o STF promova a saída de pessoas das prisões.
  • 66
    Nesse sentido, por exemplo, há regras legais sobre medidas cautelares que oferecem alternativas à prisão provisória (artigo 318, caput e incisos; artigo 319, caput e incisos, ambos do CPP).

Acknowledgement

As autoras e os autores agradecem a Bruno Oliveira, Giuliana Maruca e Cassiano Marinho pela assistência de pesquisa na formação da base de dados; a Antônio Pires e Davi Moreira, pela assistência em questões metodológicas de cunho quantitativo; a Arthur Prado e Danyelle Galvão, pelas leituras atentas e comentários críticos valiosos, que muito contribuíram para a formação do texto submetido à Revista.

  • Declaration of originality: the authors assure that the text here published has not been previously published in any other resource and that future republication will only take place with the express indication of the reference of this original publication; they also attest that there is no third party plagiarism or self-plagiarism.

How to cite (ABNT Brazil):

  • WANG, Daniel W. L.; FERREIRA, Luísa M. A.; BARROS, Matheus de; HOMSI, Julia A.; ZAMBOM, Mariana M.; SANTOS, Ezequiel F.; COELHO FILHO, Paulo Sergio A. Decidindo não decidir: a atuação penal do STF durante a pandemia de Covid-19. Revista Brasileira de Direito Processual Penal, vol. 10, n. 1, e884 jan./abr. 2024. https://doi.org/10.22197/rbdpp.v10i1.884

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    » https://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/handle/10438/32392

Editado por

Editorial team

  • Editor-in-chief: 1 (VGV)

  • Assistant-editor: 1 (MBB)

  • Reviewers: 2

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Jan 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    28 Jul 2023
  • Revisado
    10 Ago 2023
  • Revisado
    02 Set 2023
  • Revisado
    13 Set 2023
  • Revisado
    10 Out 2023
  • Revisado
    26 Nov 2023
  • Revisado
    04 Dez 2023
  • Aceito
    04 Dez 2023
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