Acessibilidade / Reportar erro

Legalidade “versus” jurisdicionalidade na execução penal? Ônus financeiro da monitoração eletrônica em decisões do TRF-41 1 O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) – Código de Financiamento 001, Bolsa/PROSUP/CAPES.

Legality “versus” jurisdictionality in penal execution? Financial burden of electronic monitoring in brazilian TRF-4 decisions

Resumo

A execução penal é atividade estatal pautada nos princípios da legalidade certa, estrita e taxativa e da jurisdicionalidade, razão pela qual os direitos e deveres dos presos devem sempre observar as determinações legais. Apesar disso, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) vem impondo à pessoa monitorada o ônus de arcar com as despesas decorrentes da monitoração eletrônica, encargo que não encontra amparo na legislação brasileira que trata do assunto. Por essa razão, impõe-se questionar, a título de problema de pesquisa: estas decisões do TRF-4 estão juridicamente corretas? Diante disso, este artigo objetiva analisar criticamente as decisões do TRF-4 nesse sentido e os principais argumentos utilizados, a fim de verificar se estão juridicamente corretas ou equivocadas, em virtude da inexistência de disposição legal taxativa nesse intuito, o que, inclusive, veio a ser reconhecido em diversas oportunidades pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). A escolha pelo TRF-4 é justificada pelo número significativo de decisões da Corte nesse sentido, bem como pelo fato de os demais Tribunais Regionais Federais não possuírem sentenças com esse teor e intuito. O referencial teórico recorre a produções relativas à execução penal e seus princípios da legalidade e jurisdicionalidade. A pesquisa conclui que a referida atuação decisional do TRF-4 está em descompasso com os princípios da legalidade e da jurisdicionalidade na execução penal.

Palavras-Chave
execução penal; monitoração eletrônica; ônus financeiro; taxatividade legal; Tribunal Regional Federal da 4ª Região

Abstract

Criminal execution is a state activity based on the principles of certain, strict and exhaustive legality and jurisdictionality, which is why the rights and duties of prisoners must always comply with legal provisions. Despite this, the Brazilian Regional Federal Court of the 4th Region (TRF-4) has been imposed on the monitored person the burden of bearing the expenses arising from electronic monitoring, a burden that is not supported by Brazilian legislation that deals with the subject. For this reason, it is necessary to question, as a research problem: are these TRF-4 decisions legally correct? In view of this, this article aims to critically analyze the decisions of the TRF-4 in this sense and the main arguments used, in order to verify whether they are legally correct or mistaken, due to the lack of a explicit legal provision in this regard, which, in fact, came to be recognized on several occasions by the Brazilian Superior Tribunal of Justice (STJ). The choice of TRF-4 is justified by the significant number of Court decisions in this regard, as well as by the fact that the other Federal Regional Courts do not have sentences with this content and intention. The theoretical framework uses productions related to criminal execution and its principles of legality and jurisdiction. The research concludes that the aforementioned decisional action of the TRF-4 is out of step with the principles of legality and jurisdictionality in criminal execution.

Keywords
Brazilian Federal Regional Court of the 4th Region; electronic monitoring; financial burden; legal taxativeness; penal execution

Sumário: Introdução; 1. Princípios da legalidade e jurisdicionalidade na execução penal; 2. A monitoração eletrônica na execução penal; 3. O ônus financeiro pelo equipamento de monitoração eletrônica nas decisões do TRF-4; Considerações Finais; Referências.

Introdução

A execução penal, no Brasil, é regida sobretudo pela Lei nº 7.210/1984, que consagra, dentre outros princípios, os da legalidade certa, estrita e taxativa e da jurisdicionalidade, os quais informam essa parcela significativa da referida atividade estatal. No entanto, por se tratar de uma lei federal de normas gerais, não esgota o espaço de regulação da execução penal, deixando espaço para a complementação via legislação, e também pela atuação judicial, nos limites definidos e traçados pela lei.

Nesse sentido, apesar de inexistir previsão legal a respeito da imposição do ônus financeiro decorrente da utilização do equipamento de monitoração eletrônica à própria pessoa monitorada, seja no rol de deveres gerais do art. 39 ou no art. 146-C da Lei de Execuções Penais (LEP), que menciona os deveres específicos da pessoa monitorada, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) vem consolidando sua jurisprudência nesse sentido, em desatenção ao princípio da legalidade, o que constitui um problema jurídico e o problema específico da presente pesquisa.

Por essa razão, impõe-se questionar, a título de problema de pesquisa: estas decisões do TRF-4 estão juridicamente corretas? Objetiva-se, portanto, analisar criticamente as decisões do TRF-4 que impõem à pessoa monitorada o ônus de arcar com as despesas referentes à monitoração eletrônica, partindo-se do pressuposto de que tais decisões estão fundamentadas em argumentos juridicamente equivocados, em virtude da inexistência de disposição legal taxativa nesse intuito.

A escolha pelo TRF-4 se justifica pelo fato de que, neste órgão, a jurisprudência nessa matéria específica já está consolidada, como se menciona nos próprios julgados a respeito. Outrossim, a consulta de jurisprudência nos demais Tribunais Regionais Federais não apontou a existência de decisões nesse sentido.

Para a pesquisa de jurisprudência, que foi realizada no site oficial do TRF-44 4 Disponível em: https://jurisprudencia.trf4.jus.br/pesquisa/pesquisa.php?tipo=%201. Acesso em: 11 abr. 2023. , as palavras-chave utilizadas foram “monitoramento eletrônico. ônus financeiro” e “monitoramento eletrônico. custas”, não apenas na ementa dos julgados, mas no seu inteiro teor, o que favoreceu a descoberta de uma série de outras decisões com este conteúdo. Todas estas decisões foram proferidas pela 7ª e pela 8ª Turmas da Corte, responsáveis por decidir casos em matéria penal, processual penal e de execução penal, segundo os arts. 2º, § 4º, “d” e 4º, § 4º do Regimento Interno da Corte5 5 Disponível em: https://www.trf4.jus.br/trf4/diario/visualiza_documento_adm.php?orgao=1&id_materia=3009494&reload=false. Acesso em: 18 maio 2023. , donde decorre, portanto, sua atribuição para decidir casos envolvendo a monitoração eletrônica no âmbito das execuções penais. Ressalte-se que as decisões começaram a ser proferidas a partir do ano de 2015, que, portanto, marca o lapso temporal inicial da pesquisa jurisprudencial.

Nesse sentido, em 13 de abril de 2023, a pesquisa utilizando as palavras-chave “monitoramento eletrônico. ônus financeiro” encontrou 27 resultados. Em 14 de abril de 2023, a pesquisa por “monitoramento eletrônico. custas” encontrou apenas 2 resultados. No entanto, além dessas decisões, foram descobertas, em suas fundamentações, outras sentenças versando sobre a mesma matéria; decisões pioneiras na argumentação para essa matéria em específico, o que permitiu conhecer outros julgados da Corte com este mesmo conteúdo, ainda que não utilizem as mesmas palavras-chave utilizadas na pesquisa jurisprudencial realizada.

Importante ressaltar que essa busca inicial, desprezadas as decisões que não versavam especificamente sobre a matéria de interesse deste artigo, apresentou aproximadamente 50 decisões cujo conteúdo aparentemente tratava sobre os custos que constituem verdadeiro ônus financeiro para as pessoas monitoradas. Em certos casos, porém, tratava-se apenas de uma menção a respeito do tema, mas não objeto principal da contenda jurídica submetida ao crivo da Corte; noutras, a imposição do ônus se deu de maneira autoexplicativa, sem realização de maiores argumentações; outras, ainda, apenas repetem o que já foi mencionado em sentenças anteriores.

Logo, por razões metodológicas, a partir da análise do conteúdo das decisões, foram excluídas da amostra as sentenças que não tratam necessariamente dessa imposição argumentada do ônus financeiro pela monitoração eletrônica e no âmbito da execução penal, a exemplo daquelas que versam sobre a matéria em âmbito processual penal ou que tratam do parcelamento ou hipossuficiência da pessoa monitorada, por não abordarem a questão central trabalhada pelo artigo6 6 Mais informações e detalhamentos a esse respeito podem ser encontrados, para além da descrição metodológica minuciosa realizada no início da terceira seção do desenvolvimento deste artigo, nos dados públicos constantes na base aberta da plataforma Figshare. Disponível em: https://dx.doi.org/10.6084/m9.figshare.24657840. Acesso em: 29 nov. 2023. . Com isso, a amostra final representativa do total, mencionada no artigo, foi de 12 decisões.

Isso decorre da maior atenção que é conferida a determinadas decisões que, por seu pioneirismo e pelo grande número de citações em outras decisões no mesmo sentido, tornam-se paradigmas nessa matéria, de modo que sua análise reveste-se de uma maior relevância para este trabalho em virtude da construção argumentativa empregada para fins de justificar e fundamentar as decisões nesse sentido.

Para analisar as decisões, a pesquisa emprega o Método de Análise de Decisões, pelo qual é possível organizar informações contidas nas decisões, como os dispositivos normativos envolvidos, a contenda fático-jurídica específica e, especialmente, a argumentação das partes envolvidas – nesse caso, a do TRF-4, órgão julgador. A investigação desses elementos favorece a uma explicação do sentido das decisões a partir de cada processo decisório, dos argumentos utilizados pelo órgão decisor, e também as possíveis implicações teóricas e práticas do que é decidido (FREITAS FILHO; LIMA, 2010FREITAS FILHO, Roberto; LIMA, Thalita Moraes. Metodologia de análise de decisões. Universitas Jus, Brasília, n. 21, p. 1-17, jul./dez. 2010. https://doi.org/10.5102/unijus.v2i0.1206.
https://doi.org/10.5102/unijus.v2i0.1206...
).

Referido método se mostra bastante útil à pesquisa em questão, porque a imposição do ônus financeiro pela monitoração eletrônica por parte do TRF-4, sem fundamento legal existente, como se supõe, traz consequências que não podem ser olvidadas, tanto para a pessoa monitorada, que deverá cumprir um dever não imposto por lei, mas determinado por sentença, quanto para o sistema jurídico, que perde parte da sua coerência e integridade com esse “conflito” aparente entre legalidade e jurisdicionalidade.

Com essa análise, realiza-se uma categorização de acordo com os três principais argumentos utilizados para fundamentá-las: (i) a previsão genérica do art. 39, VIII da LEP acerca do dever de ressarcimento, ao Estado, por parte do condenado, das despesas realizadas com sua manutenção; (ii) o art. 12 do Provimento nº 46/2016, da Corregedoria Regional do TRF-4, que faculta ao magistrado a imposição de ônus financeiro pela utilização do equipamento de monitoração eletrônica; e (iii) o caráter educativo, preventivo e retributivo da compensação financeira realizada pela pessoa que faz uso do equipamento de monitoração eletrônica.

A título de referencial teórico, são utilizadas, em sua maioria, produções acadêmicas e bibliográficas em matéria de execuções penais e seus princípios, em especial os da legalidade e da jurisdicionalidade.

Como se pode observar, este trabalho tem natureza teórica e empírica, serve-se de uma pesquisa exploratória documental, especialmente na LEP e nas decisões do TRF-4 encontradas em matéria de imposição do ônus financeiro pela monitoração eletrônica. Aplica, também, o método qualitativo, apropriado para a abordagem realizada, de cunho investigativo, e o método dedutivo, tendo como a hipótese a proposição teórica de que, se não há previsão legal impondo à pessoa monitorada o ônus de arcar com o equipamento de controle da execução da pena, então, as decisões do TRF-4 nesse sentido estão juridicamente equivocadas, uma vez que a atuação jurisdicional precisa estar pautada no princípio constitucional penal da legalidade certa, estrita e taxativa.

O trabalho está dividido em três partes, cada uma almejando cumprir com um objetivo específico. Assim, na primeira seção, são apresentados os principais contornos dos princípios da legalidade e jurisdicionalidade na atividade executiva penal brasileira, limitadores dos excessos e arbítrios em face dos direitos e garantias das pessoas sujeitas à tutela penal estatal. Em seguida, são discutidos aspectos importantes, mas nem sempre aprofundados devidamente, da monitoração eletrônica, em especial a sua natureza jurídica em sede de execução penal, seus objetivos enquanto medida integrante de uma política criminal desencarcerizadora, e a inexistência de previsão legal impondo à pessoa monitorada o ônus de arcar com suas despesas.

Por fim, na terceira seção, realiza-se a investigação propriamente dita nas decisões do TRF-4 que impõem este encargo, a fim de compreender seus fundamentos e os argumentos utilizados pelos decisores e verificar se essa interpretação está realmente de acordo com os princípios de legalidade e jurisdicionalidade adotados pelo direito penitenciário brasileiro vigente, discussão que aponta para a incorretude jurídica dessa argumentação e, consequentemente, atuação decisional da Corte

1. Princípios da legalidade e jurisdicionalidade na execução penal

Os princípios jurídicos, tanto constitucionais, quanto infraconstitucionais, não são “meros guias, ou indicativos de boas intenções”, mas sim autênticas normas vinculantes cujo cotejo interpretativo e prático deve ser feito a partir de uma necessária correlação entre eles (LIMA, 2012LIMA, Alberto Jorge Correia de Barros. Direito penal constitucional: a imposição dos princípios constitucionais penais. São Paulo: Saraiva, 2012., p. 152). No caso das execuções penais, que representam a última etapa da pretensão punitiva estatal, os princípios podem ser considerados como as “verdades fundantes” que norteiam a aplicação das regras previstas na legislação a respeito, observando-se o caráter imposto pela Constituição à atividade executiva penal, isto é, suas “expectativas de comportamento” e “valorações ideológicas”, como a prevalência da dignidade da pessoa humana (GOULART, 1994GOULART, José Eduardo. Princípios informadores do direito da execução penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994.).

Por exemplo, o princípio da legalidade teve, desde o início, o objetivo de instituir direitos e deveres com base na positivação das leis, a fim de conferir-lhes um grau de certeza, previsibilidade e segurança para o direito – e, consequentemente, para os direitos e liberdades individuais – maiores em relação à anterior vontade do soberano. Bem se vê a relação do princípio da legalidade com o direito penal em sentido amplo, que toca num ponto sensível da vida humana, a saber, a liberdade, limitada apenas quando utilizada em desfavor dos bens jurídicos tutelados pelo direito, reputados como importantes pela sociedade, em razão da necessidade de manutenção da harmonia social minimamente exigida para falar-se numa autêntica comunidade social e política.

Pode-se afirmar que as normas penais diferem das demais pelo campo de regulação, objetivos e conteúdo, pois inclui sanções mais agressivas em caso de descumprimento, em virtude do fato de que o direito penal é o instrumento mais contundente à disposição do Estado para levar adiante o controle social. Isto, evidentemente, não pode ser realizado sem reservas, e é justamente por isso que desponta a legalidade como imperativo de limitação ao arbítrio na punibilidade (BUSATO, 2015BUSATO, Paulo César. Fundamentos para um direito penal democrático. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2015.).

Outrossim, não basta que exista lei objetivando a limitar o controle estatal sobre as condutas humanas: é necessário, ainda, que essa lei seja certa e taxativa, e que os processos de interpretação não admitam analogia ou interpretações extensivas que acabem por prejudicar o réu.

No que diz respeito à analogia, que se trata de “um processo de interpretação que integra uma lacuna existente na lei a partir de um argumento de semelhança”, caso uma determinada conduta não se amolde perfeitamente ao modelo abstrato de ação ou omissão descrito pela norma penal, não é possível aplicar essa norma em desfavor do agente, uma vez que, fazendo-o, o julgador estaria ocupando o espaço do legislador ao criar um novo tipo ou sanção penal para o caso concreto (BRANDÃO, 2010, p. 58-60).

Por outro lado, costuma-se apontar que há distinção entre a analogia propriamente dita e a interpretação analógica, de maneira que, nesta, o intérprete não se afastaria do teor da norma, regulando o caso concreto a partir de norma semelhante, uma vez inexistente norma própria para aquele caso, mas, sim, debruçar-se-ia no sentido literal possível da regra jurídica (BRANDÃO, 2010). Afirma-se, igualmente, que, na interpretação extensiva, “a vontade da lei cogita de contemplar o caso examinado, mas o seu texto diz menos que o pretendido, não o compreendendo”, de maneira que “o intérprete estende o sentido da lei até o caso examinado”, o que estaria de acordo com o postulado da legalidade penal em virtude da “vontade da lei” de reger aquela relação jurídica, ainda que a formulação interpretada esteja inexata (JESUS, 2020JESUS, Damásio de. Direito Penal vol. 1 – Parte geral. 37. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2020., p. 92-93).

Ainda assim, corre-se o risco de tais técnicas de interpretação deturparem a teleologia pretendida pela norma jurídica penal, pois pode acontecer de a prescrição legislativa não ser clara o suficiente, ou, ao menos, não possuir uma única interpretação possível – o que não é raro. Não é demais lembrar, também, que normas jurídicas penais são, muitas vezes, motivadas por interesses de grupos no poder, de modo que a interpretação em prejuízo do réu poderia relegar os cidadãos ao despotismo de governos ou mesmo a um judiciário com poderes excessivos (LIMA, 2012LIMA, Alberto Jorge Correia de Barros. Direito penal constitucional: a imposição dos princípios constitucionais penais. São Paulo: Saraiva, 2012.).

Não é sem razão que a técnica legislativa recomende – e até exija – que a norma jurídica penal tenha um comando de determinação que a permita ser formulada de maneira inequívoca, tendo em vista a necessidade de interpretação e de aplicação que, em matéria penal, revelam-se ainda mais significativas, por versarem, como dito, sobre a liberdade humana, o que exige um grau maior de segurança jurídica (BUSATO, 2020BUSATO, Paulo César. Direito penal: parte geral, volume 1. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2020.).

Todavia, afirma-se que, se a tendência do legislador moderno não é a de expressar-se de forma clara, de maneira que muitos preceitos penais estão, cada vez mais, caracterizados por ambiguidade, imprecisão e indeterminação, isso deve permitir ou permite uma margem “criativa” ao juiz para aplicar prescrições jurídicas demasiadamente vagas (BRANDÃO, 2010BRANDÃO, Cláudio. Curso de direito penal: parte geral. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010.; LIMA, 2012LIMA, Alberto Jorge Correia de Barros. Direito penal constitucional: a imposição dos princípios constitucionais penais. São Paulo: Saraiva, 2012.; BUSATO, 2020BUSATO, Paulo César. Direito penal: parte geral, volume 1. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2020.), o que, entretanto, mina a certeza e a previsibilidade que se espera de uma norma jurídica, especialmente penal.

Por essa razão, deve-se compreender os sentidos da determinação e da taxatividade em matéria de legalidade penal. Nesse sentido, a primeira diz respeito à descrição mais exata possível da conduta humana sujeita a sanções penais, devendo-se dispensar, portanto, a utilização excessiva e até mesmo incorreta de cláusulas gerais e conceitos vagos e indeterminados na construção dos tipos legais de caráter penal. Já a segunda, trata-se de estabelecer as margens às quais está vinculado o julgador, não para amputar ou censurar sua atividade interpretativa, mas para cumprir com os postulados garantistas da legalidade num Estado democrático de direito, evitando-se, com isso, eventual abuso judicial (PRADO, 2021PRADO, Luiz Regis. Tratado de Direito Penal Brasileiro: parte geral (arts. 1º a 120). 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2021.).

Por essa descrição, evidente que o princípio da legalidade opera como imposição restritiva ao legislador, mas não apenas a ele, pois a atividade judicial de interpretação e aplicação de normas jurídicas também deve se pautar no referido princípio (OLIVÉ et al., 2017OLIVÉ, Juan Carlos Ferré et al. Direito penal brasileiro: parte geral: princípios fundamentais e sistema. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2017., p. 86-89). A expressão legalidade penal não se refere tão somente às normas que estabelecem crimes e cominam penas, mas, também, às normas processuais penais e normas de execução penal (DOTTI, 1998DOTTI, René Ariel. Bases e alternativas para o sistema de penas. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998.; BUSATO, 2015BUSATO, Paulo César. Fundamentos para um direito penal democrático. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2015.; BUSATO, 2020BUSATO, Paulo César. Direito penal: parte geral, volume 1. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2020.; PRADO, 2021PRADO, Luiz Regis. Tratado de Direito Penal Brasileiro: parte geral (arts. 1º a 120). 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2021.; BRITO, 2022BRITO, Alexis Couto de. Execução Penal. 7. ed. São Paulo: SaraivaJur, 2022.; MIRABETE; FABBRINI, 2022MIRABETE, Julio Fabbrini; FABBRINI, Renato Nascimento. Execução penal. 15. ed. Barueri: Atlas, 2022.).

A execução penal, no direito brasileiro, ostenta natureza mista e complexa, possuindo tanto aspectos administrativos, quanto jurisdicionais, os quais, inclusive, predominam – a despeito do que diz Rosa (1995, p. 179)ROSA, Antonio José Miguel Feu. Execução Penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995. –, em virtude da orientação e objetivos da LEP, que exigem intensa fiscalização do Poder Judiciário no regular cumprimento das regras de execução, não apenas por parte do agente, mas também do Poder Público. Não se admite, pois, que o preso seja submetido a restrições não previstas em lei, o que decorre, dentre outras, da garantia constitucional do art. 5º, II da CF/88 (MIRABETE; FABBRINI, 2022MIRABETE, Julio Fabbrini; FABBRINI, Renato Nascimento. Execução penal. 15. ed. Barueri: Atlas, 2022.)7 7 É importante ressaltar que, na anterioridade, cada estabelecimento penal tinha suas próprias leis, baixadas pela autoridade administrativa via regulamentos ou outros instrumentos normativos infralegais, visando a regular comportamentos e impondo punições para os casos de descumprimento, o que, claro está, demandava a existência de leis criadas pelo Estado, e não por autoridades individuais, a fim de prescrever as situações dos presos de modo suficientemente uniforme, em razão do princípio da isonomia de tratamento entre presos em idêntica situação jurídica (ROSA, 1995, p. 180-181). .

Sabendo-se que a legalidade deve ser obedecida igualmente na fase de execução da pena imposta, um dos aspectos mais importantes a serem enfatizados é a restrição de direitos, pois, diante do imperativo do art. 3º da LEP, segundo o qual o preso conserva os direitos não atingidos pela sentença e pela lei, logo, tais poderes de agir só podem ser restringidos se houver previsão legal inequívoca nesse sentido, de modo que “não pode o magistrado [...] restringir ou negar um benefício ou direito com base em entendimentos próprios sobre a finalidade do instituto ou sobre o merecimento do beneficiário” (BRITO, 2022BRITO, Alexis Couto de. Execução Penal. 7. ed. São Paulo: SaraivaJur, 2022., p. 24).

Isso é assim porque “um dos momentos em que a disfuncionalidade do sistema global de Direito Penal ganha contornos extremamente graves é o da execução desorientada”, o que, entretanto, vem a ser minorado pelo estabelecimento de um rol de direitos e deveres do preso e o consequente controle jurisdicional das atribuições da Administração na execução penal (DOTTI, 1998DOTTI, René Ariel. Bases e alternativas para o sistema de penas. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998., p. 464-465), a fim de que “as boas intenções” das legislações nessa matéria, em especial em países latino-americanos – e, mais especificamente, no Brasil –, não sejam inexequíveis (BUSATO, 2020BUSATO, Paulo César. Direito penal: parte geral, volume 1. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2020., p. 29-30).

Em virtude de uma miríade de competências do juiz em matéria de execução penal – vide o rol do art. 66 da LEP – espera-se do Poder Judiciário um papel de contrapor maiorias eventuais a nível de governo, circunstância político-ideológica que, como se sabe, tem a aptidão de reforçar a severidade das normas penais em sentido amplo. Logo, o princípio da legalidade, do qual é coetâneo o princípio da jurisdicionalidade, possui – ou, ao menos, deve possuir – um objetivo humanista e garantista a fim de evitar a arbitrariedade estatal na execução das penas (GOULART, 1994GOULART, José Eduardo. Princípios informadores do direito da execução penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994.; LIMA, 2012LIMA, Alberto Jorge Correia de Barros. Direito penal constitucional: a imposição dos princípios constitucionais penais. São Paulo: Saraiva, 2012.).

Nesse sentido, a jurisdicionalidade vem a completar a tarefa da legalidade em matéria de execução penal, e é alçada à categoria de princípio por nortear todo o microssistema jurídico inaugurado pela LEP, com vistas de intervir positivamente no comportamento delitivo do preso e, assim, torná-lo idealmente apto a retornar ao convívio em sociedade, o que exige uma fiscalização e atuação tanto com relação ao conjunto de direitos, quanto de deveres do preso, devendo-se observar, sempre, as disposições legais.

No que diz respeito ao princípio da jurisdicionalidade, que, dentre outras garantias, decorre da inafastabilidade da prestação jurisdicional, prevista no art. 5º, XXXV da CF/88 (MIRABETE; FABBRINI, 2022MIRABETE, Julio Fabbrini; FABBRINI, Renato Nascimento. Execução penal. 15. ed. Barueri: Atlas, 2022., p. 42-43), trata-se de “inegável garantia de proteção ao condenado”, no sentido de que o juiz da execução penal pode “ser provocado pelo condenado, quando se sentir vilipendiado em quaisquer de seus direitos” (PRADO et al., 2017PRADO, Luiz Regis et al. (coord.). Direito de execução penal. 4. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017., p. 62).

Essa concepção é relativamente nova, visto que o papel do juiz em matéria de execução da pena imposta cingia-se de subsidiariedade, intervindo nos chamados “incidentes da execução”, alguns dos quais, ainda assim, possuíam – e, para Rosa (1995, p. 179)ROSA, Antonio José Miguel Feu. Execução Penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995., ainda possuem – caráter intensamente administrativo. Com a evolução e complexificação da atividade executiva penal, passou-se a entender, corretamente, que a jurisdicionalidade penal não se encerra com o trânsito em julgado da sentença condenatória, etapa que marca a passagem do processo penal cognitivo para a execução da pena, que também possui aspectos processuais (MIRABETE; FABBRINI, 2022MIRABETE, Julio Fabbrini; FABBRINI, Renato Nascimento. Execução penal. 15. ed. Barueri: Atlas, 2022.).

Basta uma leitura do art. 66 da LEP para constatar o papel significativo que foi conferido ao juízo de execução penal e, consequentemente, à jurisdicionalidade nessa tarefa estatal, bem como a figura do Agravo em Execução, recurso previsto no art. 197 da lei, apesar de não regulamentado (BRITO, 2022BRITO, Alexis Couto de. Execução Penal. 7. ed. São Paulo: SaraivaJur, 2022., p. 221), e a possibilidade de julgamento de Habeas corpus endereçados ao juízo da execução.

Frise-se que as decisões em sede de execução penal, assim como nos demais ramos do direito, devem ser fundamentadas, em virtude do imperativo constitucional do art. 93, IX, que representa uma das balizas do Estado Democrático de Direito, por evitar a mera explanação de opiniões particulares do julgador, atendendo, assim, aos pressupostos do devido processo legal (BRITO, 2022BRITO, Alexis Couto de. Execução Penal. 7. ed. São Paulo: SaraivaJur, 2022.), que, no âmbito processual penal, por exemplo, encontra amparo legislativo no art. 315, § 2º do Código de Processo Penal (CPP), ressaltando-se a complementariedade deste diploma normativo para o processo executivo penal, conforme o art. 2º da Lei de Execuções Penais

Por se tratarem de decisões referentes à liberdade individual, exige-se destas uma fundamentação ainda mais adequada e atenta aos direitos e garantias fundamentais do preso, que não as perde por completo após a sentença penal condenatória, como prescreve o já mencionado art. 3º da LEP. É dizer: não basta fundamentar; é necessário fazê-lo de forma coerente com os princípios, regras, direitos e garantias previstos pelo ordenamento jurídico.

Noutro sentido, soma-se à legalidade e à jurisdicionalidade em sede de execuções penais a implementação de uma série de medidas alternativas ao cárcere, objetivando reduzir as consequências decorrentes do aprisionamento, que atingem tanto o preso, quanto a sociedade, pois esta o receberá, após o cumprimento de sua pena, talvez em piores condições em relação às existentes no momento do ingresso no sistema penitenciário, em virtude das condições degradantes deste em termos de saúde, higiene, integridade física e afastamento dos vínculos familiares e societários mínimos exigidos para que a ressocialização não seja apenas um artigo de fé positivado na lei, mas uma finalidade satisfatoriamente cumprida da concepção de execução penal adotada pela LEP.

É nesse sentido que desponta a monitoração eletrônica como um mecanismo alternativo à privação de liberdade, almejando, dentre outros objetivos, reduzir ou mesmo evitar a superlotação carcerária e seus efeitos, que são tanto indesejados, quanto incompatíveis com uma política criminal8 8 A política criminal é uma das ciências criminais que, com autonomia em relação ao direito penal, objetiva organizar as respostas estatais aos fenômenos criminais enquanto um problema social, com vistas a preveni-lo e repreendê-lo. Desponta como “uma possibilidade de afastar a ideia de fortalecimento do Estado Penal punitivo para dar prioridade às medidas do Estado Social, integrando, assim, juntamente com a criminologia e o direito penal, o tripé que atua na busca por soluções ao problema social do crime” (DELMAS-MARTY, 2004; OLIVEIRA, 2017). que se pretenda eficaz na proposta de recuperação social do agente infrator e seu comportamento.

2. A monitoração eletrônica na execução penal

A monitoração eletrônica de presos integra um amplo conjunto de medidas penalizadoras não privativas de liberdade, mas restritivas a certos direitos, como ocorre, em maior ou menor grau, com todas as sanções penais e suas formas de execução, as quais buscam satisfazer aos ideais de prevenção geral e especial e retribuição ao delito praticado pelo agente.

Tendo origem norte-americana, passou por diversos processos de evolução nas características do equipamento, nos sistemas de monitoração – passivo e ativo, com ou sem uso de Global Positioning System (GPS) –, nas hipóteses de uso e na própria natureza jurídica, isto é, se uma sanção penal ou medida executiva penal alternativa ao cárcere (JAPIASSÚ; MACEDO, 2008; LEAL, 2011LEAL, César Barros. Vigilância eletrônica à distância: instrumento de controle e alternativa à prisão na América Latina. Curitiba: Juruá, 2011.; BOTTINO; PRATES, 2017BOTTINO, Thiago; PRATES, Fernanda. Notas sobre a política de monitoração eletrônica no estado do rio de Janeiro. Revista Brasileira de Direito Processual Penal, Porto Alegre, v. 3, n. 2, p. 719-746, mai./ago. 2017. https://doi.org/10.22197/rbdpp.v3i2.68.
https://doi.org/10.22197/rbdpp.v3i2.68...
).

No Brasil, os primeiros projetos de lei versando sobre a matéria datam do início do século, cabendo-se mencionar o Projeto de Lei nº 4.342/2001, apresentado à Câmara dos Deputados (CAMPELLO, 2019CAMPELLO, Ricardo Urquizas. Faces e interfaces de um dispositivo tecnopenal: o monitoramento eletrônico de presos e presas no Brasil. Tese (Doutorado em Sociologia) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2019. Disponível em: <https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8132/tde-16122019-185040/publico/2019_RicardoUrquizasCampello_VCorr.pdf>. Acesso em: 11 abr. 2023.
https://www.teses.usp.br/teses/disponive...
). Anos após, foram apresentadas outras proposituras, tanto na Câmara dos Deputados, quanto no Senado Federal, de maneira que uma delas, o Projeto de Lei do Senado de nº 175/2007, logrou o maior êxito, tendo sido aprovada e sancionada, com vetos, transformando-se na Lei nº 12.258/20109 9 Um ano após, foi promulgada a Lei nº 12.403/2011, que trata da monitoração eletrônica enquanto medida cautelar diversa da prisão no âmbito do processo penal (art. 319, IX do CPP). .

Em sua redação final, o referido projeto, que recebeu diversos apensos, pretendia facultar ao juiz da execução penal a utilização da monitoração eletrônica para os regimes aberto e semiaberto e suas progressões, saída temporária no regime semiaberto, penas restritivas de direito de limitação de horários ou frequência a determinados lugares, prisão domiciliar, livramento condicional, suspensão condicional da pena e “quando julgar necessário” (BRASIL, 2007BRASIL. Câmara dos Deputados. Redação final do substitutivo da Câmara dos Deputados ao Projeto de Lei nº 1.288-B de 2007 do Senado Federal (PLS nº 175/2007 na Casa de origem). Disponível em: <https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=565896&filename=REDACAO%20FINAL%20PL%201288/2007>. Acesso em: 10 abr. 2023.
https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb...
), expressão demasiado vaga, e que ampliava sobremaneira os poderes do juiz das execuções penais (JAPIASSÚ; MACEDO, 2008JAPIASSÚ, Carlos Eduardo Adriano; MACEDO, Celina Maria. O Brasil e o monitoramento eletrônico. In: BRASIL. Ministério da Justiça. Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária. Monitoramento Eletrônico: uma alternativa à prisão? Experiências internacionais e perspectivas no Brasil. Brasília: Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, 2008, p. 13-38., p. 32-33).

Submetida ao crivo da Presidência da República, a proposta legislativa foi parcialmente vetada, sob os argumentos de que, primeiramente, impor o monitoramento eletrônico no regime aberto, nas penas restritivas de direito, no livramento condicional e na suspensão condicional da pena contrariaria “a sistemática de cumprimento de pena prevista no ordenamento jurídico brasileiro e, com isso, a necessária individualização, proporcionalidade e suficiência da execução penal”. E, porque, ao prever uma variedade de possíveis usos da monitoração eletrônica em sede de execução penal, tal projeto aumentaria os custos públicos com a adoção da medida, sem que houvesse uma redução da população carcerária, “uma vez que não retira do cárcere quem lá não deveria estar e não impede o ingresso de quem não deva ser preso” (BRASIL, 2010BRASIL. Congresso Nacional. Exposição de Motivos nº 213, de 9 de maio de 1983. Diário do Congresso Nacional, Seção 1, Supl. B, p. 017, 1/7/1983. Disponível em: <https://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/1980-1987/lei-7210-11-julho-1984-356938-exposicaodemotivos-149285-pl.html>. Acesso em: 18 maio 2023.
https://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei...
, s.p.).

Com isso, restou acrescentada, na LEP, a Seção VI, “Da Monitoração Eletrônica”, no Título e no Capítulo que tratam da execução das penas privativas de liberdade em espécie, de modo que sua utilização atual, em sede de execuções penais, só é possível nos casos de saída temporária no regime semiaberto e determinação de prisão domiciliar (art. 146-B, II e IV da LEP). A redação final da proposta, da forma como sancionada e publicada, representou uma redução da miríade de possíveis hipóteses que ensejariam sua adoção, e, consequentemente, impediu seu objetivo de redução da superlotação carcerária, ou mesmo de redução de recursos públicos, como constava na origem do projeto de lei e na opinião dos especialistas no assunto (JAPIASSÚ; MACEDO, 2008JAPIASSÚ, Carlos Eduardo Adriano; MACEDO, Celina Maria. O Brasil e o monitoramento eletrônico. In: BRASIL. Ministério da Justiça. Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária. Monitoramento Eletrônico: uma alternativa à prisão? Experiências internacionais e perspectivas no Brasil. Brasília: Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, 2008, p. 13-38.).

Dois aspectos merecem destaque, tanto por sua relevância prática, mas, especialmente, teórica, inclusive no que se refere aos objetivos a que se propõe este trabalho: trata-se da (i) natureza jurídica da monitoração eletrônica em sede de execução penal no Brasil; e da (ii) assunção, por parte da pessoa monitorada, dos encargos financeiros decorrentes da aquisição, utilização e manutenção dos dispositivos destinados à monitoração eletrônica.

Com relação ao primeiro ponto, a discussão se mostra importante porque a premissa segundo a qual monitoramento eletrônico é uma pena tal qual a privativa de liberdade ou restritiva de direitos implica, automaticamente, em assumir o pressuposto de que compete à União legislar a seu respeito, uma vez que se trataria de matéria concernente ao direito penal (art. 22, I da CF/88). Entretanto, se for compreendido que o monitoramento eletrônico é uma alternativa ao cárcere, medida referente à execução penal, logo, tal mecanismo deverá ser regulado segundo a competência concorrente entre União, Estados e Distrito Federal em matéria de direito penitenciário10 10 Esse foi, inclusive, o argumento jurídico utilizado pelos legisladores de diversos estados-membros da federação, como São Paulo, Espírito Santo e Mato Grosso do Sul, para implementar, em suas jurisdições territoriais, a monitoração eletrônica enquanto forma de auxiliar à execução das penas impostas, antes mesmo da existência de uma lei federal de normas gerais versando sobre o assunto – que viria a ser a Lei nº 12.258/2010 –, como permite o art. 24, § 3º da Constituição, ainda que haja opiniões em sentido contrário acerca da constitucionalidade dessas leis estaduais. Cf, nesse sentido, Bottini (2008) e Campello (2019). (art. 24, I da CF/88) enquanto ramo do direito brasileiro que rege as relações jurídicas decorrentes da atividade executiva penal, independentemente da celeuma terminológica acerca da melhor expressão para designar tal ramo, que não é recente (MIOTTO, 1970MIOTTO, Armida Bergamini. O Direito Penitenciário: importância e necessidade do seu estudo. Revista de informação legislativa, v. 7, n. 28, p. 93-106, out./dez. 1970. Disponível em: <https://www2.senado.leg.br/bdsf/item/id/180530>. Acesso em: 26 abr. 2023.
https://www2.senado.leg.br/bdsf/item/id/...
).

Argumenta-se que a monitoração eletrônica é medida sancionatória de caráter penal, mas não necessariamente uma pena (BOTTINI, 2008BOTTINI, Pierpaolo Cruz. Aspectos Pragmáticos e Dogmáticos do Monitoramento Eletrônico. Revista da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Uberlândia, v. 36, p. 387-404, 2008. Disponível em: <https://seer.ufu.br/index.php/revistafadir/article/view/18456>. Acesso em: 11 abr. 2023.
https://seer.ufu.br/index.php/revistafad...
), e essa constatação decorre de um fundamento legislativo, pois, se é verdade que a Constituição, em seu art. 5º, XVLII, apenas indica, ao legislador, um rol de penas vedadas, o que, em tese, permitiria a adoção de outras para além das previstas pelo Código Penal, este, por seu turno, reconhece, em seu art. 32, apenas três modalidades de pena: a privativa de liberdade, a restritiva de direitos, e a de multa, não constando, pois, nesse rol – que é taxativo, em virtude do princípio da legalidade –, a monitoração eletrônica.

Ainda nesse sentido, as penas privativas de liberdade são cumpridas a título de reclusão ou detenção (arts. 33 a 36 do Código Penal brasileiro), enquanto que as penas restritivas de direito são a prestação pecuniária, perda de bens e valores, limitação de fim de semana, prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas, interdição temporária de direitos e limitação de fim de semana (art. 43 do Código Penal brasileiro); ao passo que a multa “consiste no pagamento ao fundo penitenciário da quantia fixada na sentença e calculada em dias-multa”, e pode ser aplicada tanto isolada quanto cumulativamente com outra pena (arts. 49 e 50 do Código Penal brasileiro).

Observa-se que o monitoramento eletrônico, em sede de execução penal, apesar de restringir certos direitos do preso, como a intimidade e a privacidade – o que decorre, como dito, da própria noção de pena imposta pelo Estado –, não deve ser considerado como matéria sujeita à regulamentação pelo direito penal, mas, sim, pelo direito penitenciário, que trata da execução das penas, e não da imposição de novas penas – o que pertence, isso, sim, à alçada do direito penal.

É verdade – e isso traz à discussão o segundo ponto – que diversos Estados da Federação, sob o argumento de competência concorrente em matéria de direito penitenciário, vêm impondo, pela via legislativa, a obrigação de os presos custearem as despesas oriundas da monitoração eletrônica medida executiva penal. No entanto, tais medidas são inconstitucionais11 11 Em sentido contrário é a decisão do STF, no RE nº 1.364.933/SC, no qual a relatora Ministra Rosa Weber não admitiu o recurso por não vislumbrar inconstitucionalidade numa lei estadual catarinense que impunha, aos presos e apenados do estado, esse dever. Todavia, em seu voto, a relatora se limitou a transcrever trechos de outras decisões, como o RE nº 1.224.396/DF, no qual o STF formulou um conceito jurisprudencial para direito penitenciário, e a ADI nº 3.916/DF, na qual a Corte praticamente reafirmou o permissivo constitucional do art. 24, § 2º, referente à possibilidade de complementação legislativa estadual às leis federais de normas gerais reguladoras dos ramos jurídicos indicados naquele dispositivo constitucional. Em suma, no voto da relatora, não há um argumento específico sequer que fundamente o argumento de constitucionalidade das leis estaduais que impõem ao preso a obrigação de custear as despesas decorrentes da monitoração eletrônica, o que prejudica a coerência e a integridade do direito, e consequentemente os direitos e garantias individuais, nesse caso, dos presos sujeitos à monitoração eletrônica. , justamente por imporem, ao preso, um dever não previsto na lei federal de normas gerais que rege a execução penal e esse assunto em específico, que não é passível de suplementação via legislação estadual por atingir direitos e garantias fundamentais como a isonomia, já que, com isso, cria-se uma circunstância fático-jurídica na qual presos de determinados estados devem pagar pelo uso do equipamento, ao passo que presos em igual situação jurídica, mas cumprindo pena em outros estados, estariam livres dessa obrigação, o que representa um tratamento distinto para presos em idênticas situações jurídicas (SILVA; MENESES; SILVA, 2023SILVA, Thyerrí José Cruz; MENESES, Renato Carlos Cruz; SILVA, Rogério Alves Marinho da. “Pagando pelo mal cometido”: a cobrança da tornozeleira eletrônica à luz da expansão econômica do direito penal. Revista Brasileira de Segurança Pública, v. 17, n. 1, p. 82-103, 2023. https://doi.org/10.31060/rbsp.2023.v17.n1.1475
https://doi.org/10.31060/rbsp.2023.v17.n...
).

A despeito dessa legislação estadual inconstitucional, o fato é que, em que pese tenha surgido como alternativa ao encarceramento, a monitoração eletrônica é, no direito brasileiro, opção estatal para reforçar a execução da pena sem custos para o agente que dela faz uso, em virtude da ausência de previsão legal nesse sentido, seja no art. 146-C da LEP, que trata dos deveres específicos do preso com relação à sua condição de pessoa monitorada, seja no art. 39 da mesma lei, que trata dos deveres gerais do condenado.

Entretanto, o TRF-4, em uma série de decisões em sede de execução penal, vem firmando sua jurisprudência no sentido de que é possível impor à pessoa monitorada o ônus financeiro de arcar com as despesas decorrentes da utilização da monitoração eletrônica, em razão do inciso VIII do referido art. 39 da LEP, segundo o qual constitui dever do condenado indenizar ao Estado, quando possível, as “despesas realizadas com a sua manutenção, mediante desconto proporcional da remuneração do trabalho”.

Nesse sentido, ainda que seja comum, em outros países, o pagamento de taxa mensal ou da própria aquisição do equipamento de monitoração eletrônica (LEAL, 2011LEAL, César Barros. Vigilância eletrônica à distância: instrumento de controle e alternativa à prisão na América Latina. Curitiba: Juruá, 2011.), o que poderia reforçar a responsabilidade e o compromisso do preso com a execução de sua própria pena (CORRÊA JÚNIOR, 2012CORRÊA JUNIOR, Alceu. Monitoramento eletrônico de penas e alternativas penais. Tese (Doutorado em Direito) – Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2012. Disponível em: <https://teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2136/tde-20062013-132709/pt-br.php>. Acesso em: 10 abr. 2023.
https://teses.usp.br/teses/disponiveis/2...
), o fato é que tal obrigação só deveria ser imposta se fosse prevista em lei, em virtude do princípio da legalidade certa, estrita e taxativa, como discutido no capítulo anterior.

Não pode, pois, um órgão jurisdicional impor esse ônus, independentemente da argumentação jurídica empreendida e do fim colimado por uma imposição do tipo – argumentos de princípio e política (DWORKIN, 2010DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. 3. ed. Trad. Nelson Boeira. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2010.) –, já que a jurisdicionalidade e a legalidade não são rivais, e a segunda não pode ignorar a primeira, pois o objetivo desta é justamente frear medidas estatais incompatíveis que podem culminar em arbítrios.

Assim, a fim de se aprofundar nos argumentos jurídicos exarados pela Corte e examinar se, realmente, esse encargo não previsto na LEP pode ser imposto, seja com base no art. 39, VIII da LEP ou no art. 12 do Provimento nº 46/2016, seja por um objetivo de reforço no compromisso com a execução penal, serão analisadas, na próxima seção, as decisões do TRF-4 em matéria de imposição do ônus financeiro à pessoa monitorada.

3. O ônus financeiro pelo equipamento de monitoração eletrônica nas decisões do TRF-4

O TRF-4, assim como os demais tribunais regionais federais, é órgão integrante da Justiça Federal, como se depreende do art. 106, I da Constituição Federal. Possui, atualmente, 39 desembargadores (art. 1º, III da Lei nº 9.967/2000, alterada pela Lei nº 14.253/2021), e, dentre outras competências, julga, em grau de recurso, as causas decididas pelos juízes federais de primeira instância (art. 108, II da Constituição Federal), atuando tanto em Plenário, quanto Corte Especial, Seções e Turmas especializadas. Dentre estas, estão a 7ª e a 8ª Turmas, responsáveis por decidir casos em matéria penal, processual penal e de execução penal, segundo os arts. 2º, § 4º, “d” e 4º, § 4º do Regimento Interno da Corte12 12 Disponível em: https://www.trf4.jus.br/trf4/diario/visualiza_documento_adm.php?orgao=1&id_materia=3009494&reload=false. Acesso em: 18 maio 2023. . Disto decorre, portanto, sua atribuição para decidir casos envolvendo a monitoração eletrônica no âmbito das execuções penais.

Assim, antes de passar para os resultados e discussões do trabalho, é imperioso aprofundar as considerações metodológicas trazidas na introdução. De forma sintética, a escolha pelas decisões do TRF-4 como objeto de pesquisa reside no fato de que este órgão apresenta não apenas uma jurisprudência consolidada em matéria de cobrança pelo equipamento de monitoração eletrônica, mas também uma quantidade significativa de decisões nesse sentido – que, segundo os resultados encontrados, chegam ao número de quase cinquenta, incluindo decisões em sede de cautelares no processo penal –, circunstâncias não observadas nos demais Tribunais Regionais Federais.

Dentre todas essas decisões encontradas, só serão analisadas de forma aprofundada as que versam especificamente sobre a referida imposição judicial e sua legalidade, especialmente no âmbito da execução penal13 13 Com relação à imposição do mesmo ônus financeiro decorrente da monitoração eletrônica, mas no âmbito da cautelar diversa da prisão, prevista no art. 319, IX do CPP, há decisões do TRF-4 que empregam o seguinte raciocínio: o custo médio do equipamento – à época das decisões – era de R$ 275,00 reais, e a duração média de um processo penal desse tipo era de dois anos, logo, o valor da monitoração deveria ser multiplicado pelos vinte e quatro meses, e esse montante deveria ser depositado previamente, o que totalizava a quantia significativa de R$ 6.600,00 reais. Foi o que ocorreu, por exemplo, nos Habeas Corpus de número 5020824-18.2015.4.04.0000/PR, julgado em 23/06/2015, sob a relatoria do Desembargador Márcio Antônio Rocha; 5006603-93.2016.4.04.0000, julgado em 15/03/2016 sob relatoria do Desembargador Sebastião Ogê Muniz; 5024855-47.2016.4.04.0000, julgado em 21/06/2016, sob a relatoria do Desembargador Gilson Luiz Inácio; 5025216-64.2016.4.04.0000, julgado em 21/06/2016, sob a relatoria da Desembargadora Cláudia Cristina Cristofani; 5024322-88.2016.4.04.0000/PR e 5044829-70.2016.4.04.0000/PR, julgados, respectivamente, em 28/06/2016 e 08/11/2016, ambos de relatoria do Desembargador Márcio Antônio Rocha. . Dentro desse novo conjunto, que terá um número reduzido em relação aos inicialmente observados durante as primeiras pesquisas por palavras-chave e filtradas pelo fundo temático da decisão, será feita, ainda, uma categorização das decisões restantes de acordo com os principais argumentos utilizados pelos relatores das ações para fundamentá-las. Tais argumentos residem, como dito, no art. 39, VIII da LEP, no art. 12 do Provimento nº 46/2016 da Corregedoria Regional do TRF-4, e em argumentos de política referentes a possíveis efeitos desta imposição.

Será conferida, ainda, uma especial atenção a determinadas decisões que, por seu pioneirismo e pelo grande número de citações em outras decisões judiciais no mesmo sentido, tornam-se verdadeiros paradigmas nessa matéria14 14 Tanto é assim, que algumas decisões chegam até mesmo a transcrever trechos inteiros do que restou decidido anteriormente, o que não é necessariamente negativo, porque, de um lado, mostra uma relativa padronização e uniformização do que é decidido pelo colegiado, mas, de outro lado, causa certa perplexidade, em virtude da imperiosidade de se realizar uma argumentação coerente não apenas com o caso concreto, mas com a totalidade do ordenamento jurídico, o que nem sempre é possível de acontecer em virtude de transcrições de fragmentos completos dos votos de outros relatores de outras decisões. De uma forma ou de outra, isso não parece constituir novidade no direito brasileiro, ao menos segundo registra Rodriguez, cujas pesquisas sinalizam a existência, no país, de um modelo de racionalidade jurisdicional caracterizado justamente por essa prevalência de certas teses jurídicas que são, na verdade, síntese dos resultados das decisões, não se destinando a devida atenção, a seu ver, ao percurso argumentativo realizado até a obtenção desses resultados, cerne de uma fundamentação judicial (RODRIGUEZ, 2013). , de maneira que sua análise reveste-se de uma maior relevância em virtude da construção argumentativa empregada para fins de justificar e fundamentar as decisões nesse sentido, considerando-se que, como sugere a premissa em que se baseia este trabalho, tal dever não possui amparo legal no direito brasileiro – nem mesmo nos dispositivos alegados pelos membros da Corte.

Detalhados esses procedimentos metodológicos, tem-se, de início, entre as decisões que se baseiam no art. 39, VIII da LEP como principal argumento para impor o ônus financeiro decorrente da monitoração eletrônica, o Agravo ne Execução Penal nº 5000280-55.2020.4.04.7106. Neste julgado, o relator Desembargador João Pedro Gebran Neto asseverou que, a despeito da alegação da defesa de inexistência de previsão legal, “a lei permite que o custo de manutenção dos apenados seja com esses partilhado, não ficando unicamente a cargo do Estado”, de maneira que “o fato de a lei ser genérica, não enumerando quais custos serão abarcados pela hipótese, não é empecilho para a cobrança pelo uso do monitoramento eletrônico”, não sendo possível, a seu ver, “exigir que a lei preveja todas as situações possíveis de despesa a ser gerada pelo preso”15 15 Outras decisões seguem essa mesma linha de argumentação. É o caso do Agravo de Execução Penal nº 5000280-55.2020.4.04.7106, julgado em 21/05/2020; da Apelação Criminal nº 5004007-45.2013.4.04.7016/PR, julgada em 09/06/2021; do Agravo de Execução Penal nº 5041523-69.2021.4.04.7000, julgada em 12/08/2021, ambas sob relatoria do mesmo Desembargador; e do Habeas Corpus nº 5029125-07.2022.4.04.0000/PR, julgado em 29/06/2022, sob relatoria do Desembargador Carlos Augusto Thomson Flores Lenz. .

No Agravo de Execução Penal nº 5001497-29.2021.4.04.7000, o relator Desembargador Leandro Paulsen asseverou que “não empeço [sic] que seja imposto ao apenado o ressarcimento dos custos com o aluguel/manutenção do equipamento”, e que “preceito similar já existe na Lei de Execução Penal, quando permite ao Estado que seja deduzido do trabalho remunerado do preso o ressarcimento com as despesas de sua manutenção (art. 29, § 1º, alínea d, da Lei 7.210/84)”16 16 Outras decisões seguem essa mesma linha de argumentação. É o caso do Agravo de Execução Penal nº 5000630-43.2020.4.04.7106/RS, julgado em 02/06/2020, sob relatoria da Desembargadora Cláudia Cristina Cristofani; do Agravo de Execução Penal nº 5000270-11.2020.4.04.7106/RS, decidido em 29/10/2020; e do Agravo de Execução Penal nº 5000630-43.2020.4.04.7106/RS, julgado em 02/06/2020, ambos sob relatoria do Desembargador Leandro Paulsen. .

Para Brito (2022, p. 71)BRITO, Alexis Couto de. Execução Penal. 7. ed. São Paulo: SaraivaJur, 2022., a interpretação do art. 39, VIII da LEP mais adequada com o ordenamento jurídico não deve ser a de que o preso deverá pagar pelo cumprimento da pena no estabelecimento penitenciário, pois, em sua ótica, não haveria sentido “em cobrar da pessoa presa a ‘estadia’ em um sistema que lhe é imposto por força da sentença condenatória para o cumprimento de uma política pública definida pelo Estado” e que é executada apenas por ele, por ser tarefa estritamente pública.

Assim, para o autor (BRITO, 2022BRITO, Alexis Couto de. Execução Penal. 7. ed. São Paulo: SaraivaJur, 2022., p. 71), a melhor interpretação do dispositivo em comento deve relacioná-lo à ideia de indenização como compensação por atos ilícitos eventualmente provocados, o que, inclusive, está disposto no art. 38 do Decreto federal nº 6.049/2007, que aprova o Regulamento Penitenciário Federal. Nucci (2022, p. 81)NUCCI, Guilherme de Souza. Curso de execução penal. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2022., por sua vez, vê lógica e sentido nessa “razoável” indenização ao Estado, embora reconheça sua difícil concretização, em razão da parca remuneração recebida pelos presos, a qual tem outras destinações prioritárias, como consta no art. 29, § 1º da LEP.

De toda forma, tanto o art. 29, § 1º, quanto o art. 39, VIII da LEP não são elucidativos com relação à forma e o meio que deverão ser empregados para concretizar juridicamente esses mandamentos gerais de ressarcimento e indenização ao Estado – ainda que, para alguns (MIRABETE; FABBRINI, 2022MIRABETE, Julio Fabbrini; FABBRINI, Renato Nascimento. Execução penal. 15. ed. Barueri: Atlas, 2022., p. 111), se trate de oportunidade para a legislação estadual complementar, e, para outros (AVENA, 2019AVENA, Norberto. Execução penal. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2019., p. 43), legislação estadual ou federal. Isso porque o primeiro dispositivo menciona que as despesas realizadas pelo Estado com a manutenção do condenado serão ressarcidas “em proporção a ser fixada”, e o segundo, que a indenização será devida “mediante desconto proporcional da remuneração do trabalho” do condenado.

O termo “fixação”, sobretudo por estar associado a uma indenização a ser paga, parece aludir a uma tarefa do magistrado, como ocorre tipicamente no direito civil e sua teoria da reparação integral – e também no âmbito processual penal, mais especificamente com relação à indenização a ser paga em decorrência de imposição da sentença condenatória, nos termos do art. 387, IV do CPP –, segundo a qual a indenização se mede pela extensão do dano ocorrido no caso concreto (art. 944 do Código Civil), e não por meio de um arbitramento prévio realizado pelo legislador, o que excluiria, sob esse argumento, a alegação de que normas jurídicas são as responsáveis por tornar aplicáveis os dispositivos da LEP em comento.

No entanto, a alegação de que compete ao juiz – nesse caso, o da execução penal – a fixação do montante a ser pago pelo preso a título de ressarcimento ao Estado não deve ser utilizada para defender a fundamentação jurídica realizada pelo TRF-4 em suas decisões analisadas. Em primeiro lugar, porque o dever do art. 39, VIII é de caráter geral, ou seja, imposto a todo e qualquer preso sujeito às normas de execução penal previstas pela LEP, independentemente de fazer ou não uso da monitoração eletrônica. Ademais, a redação do dispositivo é demasiado genérica, ao passo que os deveres específicos da monitoração eletrônica estão delimitados no art. 146-C da mesma lei, dentre os quais não consta o ônus de arcar com as despesas financeiras decorrentes de sua aquisição e utilização.

É importante recordar que “a existência de limites vagos ou incertos como determinantes de restrição a direitos não encontra, face ao direito positivo, possibilidade de vingar”, sendo ilegítimas, “venham elas da sentença condenatória ou da interpretação a que ela se dê, ou, ainda, da errônea aplicação da própria lei de execução”, o que pode suscitar o incidente de desvio na execução penal (GOULART, 1995GOULART, José Eduardo. Princípios informadores do direito da execução penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994., p. 94-95).

Assim, impor ao preso um dever não previsto em lei não parece se coadunar com o princípio da legalidade certa, estrita e taxativa, que exige uma redação não sujeita a dúvidas interpretativas do tipo. Outrossim, não se adequa à teleologia de um dispositivo legal original da LEP, promulgada e com vigência iniciada um quarto de século antes da implementação da monitoração eletrônica em sede de execuções penais, quando aquela sequer era cogitada e discutida no direito brasileiro.

Em segundo lugar, a redação do art. 39, VIII, ao mencionar as “despesas com a manutenção do condenado”, parece aludir ao alojamento daquele em espaço físico carcerário mantido pelo Estado para fins de cumprimento da pena, o que não se amolda à realidade da monitoração, alternativa ao cárcere, já que é aplicável apenas aos agentes que já se encontram fora do cárcere, o que reduz as despesas estatais com alimentação, vestuário, higiene, saúde, assistência, dentre outros direitos e garantias do preso.

Em objeção a esse argumento, seria possível alegar que “manutenção”, nesse caso específico, é uma expressão passível de elasticidade hermenêutica a ponto de abarcar a manutenção no sentido de não interrupção da execução da pena em sentido amplo, no que se incluiria a monitoração eletrônica. Por esse ponto de vista, portanto, a interpretação da expressão e do dispositivo legal não deveria ser restrita ao aspecto literal referente às instalações físicas e recursos materiais e humanos necessários à execução penal, mas ao fato de o Estado ser o responsável pela manutenção da execução das penas, que inclui, em seu bojo, a manutenção pelos equipamentos de monitoração eletrônica, ao menos a título de regulamentação normativa e aquisição material.

No entanto, essa interpretação é realizada para fins de favorecer à cobrança do equipamento por parte do monitorado a todo custo – o trocadilho é válido e até inevitável –, o que não parece compatível com os princípios da legalidade, da jurisdicionalidade, do devido processo legal, do in dubio pro reo e da vedação à interpretação extensiva em prejuízo do réu17 17 Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) assentou, no AgRg no HC nº 668.096/SP, julgado em 17 de agosto de 2021, sob relatoria do Relator Ministro Jesuíno Rissato, que “em direito penal não é permitido o uso de interpretação extensiva, para prejudicar o réu, devendo a integração da norma se operar mediante a analogia in bonam partem. Princípios aplicáveis: Legalidade das penas, Retroatividade benéfica e in dubio pro reo. A lei penal deve ser interpretada restritivamente quando prejudicial ao réu, e extensivamente no caso contrário (favorablia sunt amplianda, odiosa restringenda)”. , não podendo, pois, ser acolhida como argumento favorável à imposição do ônus financeiro decorrente da tornozeleira eletrônica à própria pessoa que dela faz uso a título de controle e fiscalização da execução da pena que lhe foi imposta.

É importante ressaltar, também, que existe uma miríade de projetos de lei em nível federal – e também estadual, os quais são inconstitucionais formal e materialmente, como dito anteriormente – visando a impor esse dever ao preso, por meio da inserção de novos dispositivos na LEP. Um deles, o Projeto de Lei nº 8.806/2017, inclusive, foi utilizado como argumento pela Defensoria Pública da União e acatado pela Corregedoria Regional do TRF-4 a fim de revogar o art. 12 do Provimento nº 46/2016, que facultava ao magistrado a imposição desse ônus financeiro – e que é, inclusive, o segundo principal argumento utilizado pelos relatores, nas decisões analisadas, para determinar esse pagamento por parte da pessoa monitorada.

No Agravo de Execução Penal nº 5028920-27.2022.4.04.7000, por exemplo, o relator Danilo Pereira Júnior recordou essa revogação do art. 12 do Provimento nº 46/2016 pelo Provimento nº 89/2020, mas, também, mencionou a revogação deste último pelo Provimento nº 112/2021, o que teria, em sua ótica, restaurado a vigência do primeiro, como um efeito repristinatório – o que não constitui uma certeza. Entretanto, constitui certeza o fato de que atos infralegais não podem criar obrigações e deveres, mas apenas a lei, o que decorre da garantia do art. 5º, II da Constituição Federal.

De toda forma, para o relator, com relação ao PL nº 8.806/2017, “a simples existência de projeto de lei detalhando/especificando o ônus do apenado de arcar com os custos do monitoramento eletrônico [...] não importa limitação à atividade hermenêutica”, em virtude da já existente, a seu ver, previsão legal do art. 39, VIII da LEP. Entretanto, a existência desse projeto de lei, e mesmo a sua menção na decisão em comento, indica que a previsão não é suficiente para abarcar a especificidade da situação do condenado monitorado com relação ao seu suposto dever de custear as despesas decorrentes da utilização do equipamento de monitoração eletrônica. E, à possível objeção de que o projeto apenas especificaria uma determinação legal já taxativa e certa, apresenta-se o argumento de que a própria inserção objetivada pela propositura representa a inexistência atual de um dever legal de ônus financeiro por parte da pessoa monitorada.

De toda forma, o fato é que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já reconheceu, em mais de uma oportunidade, o equívoco de algumas decisões do TRF-4 nesse sentido, argumentando sobre a inexistência de disposição legal impondo o referido dever à pessoa monitorada, pelo menos em sede de cautelar processual penal (art. 319, IX), argumento que, entretanto, pode ser estendido para a monitoração eletrônica enquanto mecanismo de execução da pena pela idêntica situação jurídica de inexistência de disposição legal visando a impor o referido ônus financeiro.

Nesse sentido, a primeira dessas decisões do STJ foi o Recurso em Habeas Corpus nº 92.238/RS, de relatoria do Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, julgada em 2018, que enfrentou o Habeas Corpus nº 5053303-93.2017.4.04.0000/RS, julgado pelo TRF-4, sob a relatoria do Desembargador Márcio Antônio Rocha. O mesmo argumento fundamentou a decisão do Habeas Corpus nº 564.300, julgada pelo mesmo relator, em 2020, e a obrigação imposta pelo TRF-4 foi considerada uma “flagrante teratologia” e uma instituição de recolhimento de valores ilegal por não encontrar amparo em nenhum dispositivo normativo, nas palavras do mesmo relator, no julgamento da Petição no Habeas Corpus nº 676.999, decidido em julho de 2021.

Nessa mesma decisão, o relator assentou, ainda, que essa determinação do TRF-4 “ofende a legislação pátria em vários níveis, dado que não tem previsão legal, impõe à pessoa uma despesa que é contrária aos seus interesses próprios e transfere ao réu um custo que é inerente a atividade estatal básica, já financiada via tributos”, argumento repetido no Resp nº 1.966.976, julgado em novembro de 2021, que enfrentou a decisão do Agravo de Execução Penal nº 5041523-69.2021.4.04.7000/PR, de relatoria do Desembargador João Pedro Gebran Neto, do TRF-4 julgado em 12/08/2021. A ausência de previsão legal foi igualmente mencionada como argumento nas decisões da Petição no Habeas Corpus nº 707.092, de relatoria do Ministro João Otávio de Noronha, também julgada em novembro de 2021, e no Habeas Corpus nº 788.447, decidido em dezembro de 2022 pelo relator Ministro Rogério Schietti Cruz.

Assim, considerando-se que o STJ tem por mister a interpretação da legislação infraconstitucional, o que ocorre, dentre outras maneiras, por meio do julgamento, em recurso especial, das causas decididas por Tribunais Regionais Federais quando houver contrariedade a lei federal na decisão recorrida (art. 105, III, “a” da Constituição Federal), constata-se que, de fato, a argumentação do TRF-4 em matéria de imposição do ônus financeiro decorrente da monitoração eletrônica, seja como cautelar processual penal, seja na execução penal, está juridicamente equivocada, argumento que veio a ser reforçado em virtude dessa relativamente farta jurisprudência da Corte Cidadã.

Noutro sentido, no que diz respeito às decisões fundamentadas com base em alegações que mais se aproximam de argumentos políticos que propriamente jurídicos – terceiro argumento mais comum em decisões do tipo, proferidas pelo TRF-4 –, inicia-se com a transcrição de um trecho do Agravo de Execução Penal nº 5002231-65.2017.4.04.7211, uma das decisões mais citadas, nas demais, posteriores, a título de ônus financeiro decorrente da monitoração eletrônica. É que, nesta, o relator Desembargador Leandro Paulsen asseverou que se o agente estivesse cumprindo regularmente as penas alternativas, não teriam sido revertidas em pena privativa de liberdade; “portanto, cabe ao recorrente arcar com os custos decorrentes do monitoramento eletrônico”, como se tal obrigação decorresse do descumprimento das penas alternativas, o que igualmente não encontra amparo jurídico na legislação vigente18 18 No âmbito processual penal, a decisão no Habeas Corpus nº 5016646-21.2018.4.04.0000/PR é enfática ao assinalar, o relator Desembargador Márcio Antonio Rocha, que o custo gerado pela obrigação de pagar pela utilização do equipamento de monitoração eletrônica enquanto cautelar diversa da prisão “somente é gerado pela incapacidade de comprovar condições realmente favoráveis à soltura de forma irrestrita”, o que já havia sido proferido noutras decisões – como os Habeas Corpus de nº 5044829-70.2016.4.04.0000, 5044829-70.2016.4.04.0000, 5006956-02.2017.4.04.0000, 5047625-34.2016.4.04.0000 e 5055094-34.2016.4.04.0000, todos de sua relatoria – e que indica um claro argumento de política criminal que também não encontra legitimidade em sede jurídico-legislativa. .

O mesmo desembargador, por ocasião do Habeas Corpus nº 5031827-91.2020.4.04.0000, assentou, em âmbito processual penal, que “a assunção dos custos com o próprio monitoramento eletrônico, sobretudo quando ausente comprovação de hipossuficiência econômica por parte do paciente, é medida que deve se tornar padrão” uma vez que “existe uma despesa inerente à cautelar que o favorece”, numa nova manifestação de argumento silogístico que não decorre de qualquer dispositivo legal taxativo e explícito19 19 Uma outra atuação jurisdicional do TRF-4 igualmente não prevista em lei é a de imputar à pessoa monitorada o ônus de comprovar a hipossuficiência, caso pretenda se desincumbir do encargo financeiro imposto por sentença e supostamente autorizado pela Lei de Execuções Penais. Cf., nesse sentido, o Habeas Corpus nº 5033188-12.2021.4.04.0000/RS, de relatoria do Desembargador Carlos Eduardo Thomson Flores Lenz, julgado em 12/08/2021. .

No supracitado Agravo de Execução Penal nº 5001497-29.2021.4.04.7000, o mesmo desembargador asseverou que “exigir que o apenado faça o ressarcimento ao erário das despesas com o monitoramento vigiado representa a consolidação dos aspectos retributivos e reeducativos da pena”, o que, se pode não estar incorreto do ponto de vista de política criminal (LEAL, 2011LEAL, César Barros. Vigilância eletrônica à distância: instrumento de controle e alternativa à prisão na América Latina. Curitiba: Juruá, 2011.; CORRÊA JÚNIOR, 2012CORRÊA JUNIOR, Alceu. Monitoramento eletrônico de penas e alternativas penais. Tese (Doutorado em Direito) – Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2012. Disponível em: <https://teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2136/tde-20062013-132709/pt-br.php>. Acesso em: 10 abr. 2023.
https://teses.usp.br/teses/disponiveis/2...
), não pode, entretanto, ser imposto sem que haja uma determinação legal versando a respeito, pois é imperioso que as decisões judiciais, especialmente em matéria de execuções penais, tratem a respeito de situações jurídicas, como direitos e deveres estabelecidos por lei, e não a respeito do que eventualmente poderia ser melhor em termos de política criminal.

Numa síntese, argumentos de política “tentam demonstrar que a comunidade estaria melhor, como um todo, se um programa particular fosse seguido. São, nesse sentido especial, argumentos baseados no objetivo”. Já os argumentos de princípio, ao contrário, afirmam que “programas particulares devem ser levados a cabo ou abandonados por causa de seu impacto sobre pessoas específicas, mesmo que a comunidade como um todo fique consequentemente pior”, baseando-se, pois, em direitos individuais (DWORKIN, 2001DWORKIN, Ronald. Uma questão de princípio. Trad. Luís Carlos Borges. São Paulo: Martins Fontes, 2001., p. IX).

É verdade que haverá casos em que a distinção será relativamente mitigada, em virtude da conjunção dos dois, ou mesmo da dificuldade de separar, categoricamente, uma parcela “de política” e outra “de princípio” num mesmo ato estatal determinado. Todavia, no que diz respeito especificamente à atuação decisional jurisdicional, o fato é que os juízes não devem fundamentar suas decisões utilizando argumentos políticos em sentido estrito, mas sim de princípios – mesmo que, eventualmente, estes tenham alguma carga política em sentido amplo, como o princípio da igualdade, por exemplo (DWORKIN, 2001DWORKIN, Ronald. Uma questão de princípio. Trad. Luís Carlos Borges. São Paulo: Martins Fontes, 2001., p. 3-4; DWORKIN, 2010DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. 3. ed. Trad. Nelson Boeira. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2010., p. 36-37).

Essa exceção, no entanto, não representa o caso das decisões do TRF-4 impondo o ônus de arcar com a monitoração eletrônica, pois esbarram na inexistência de disposição jurídico-normativa a respeito, razão pela qual, mesmo que pudesse apresentar resultados positivos em termos de reforço nos objetivos almejados pela execução penal, tal dever não pode ser imposto apenas com base nesse argumento de política, pois decisões judiciais devem enfatizar os direitos, e não os objetivos de melhoria na comunidade que não estejam previstos em leis.

Depreende-se, portanto, que a atuação juridicamente equivocada do TRF-4 nessa matéria específica prejudica o ideal – possível – de integridade do direito, entendido como a busca pela sua maior precisão, certeza, estabilidade e justiça na medida das possibilidades da comunidade política e jurídica organizada (DWORKIN, 2003DWORKIN, Ronald. O Império do Direito. Trad. Jefferson Luiz Camargo. 2ª tiragem. São Paulo: Martins Fontes, 2003.). Isso porque a imposição, em sede penal em sentido amplo, de deveres não previstos em lei, transgride seu princípio mais basilar, que é o da legalidade, o que causa insegurança jurídica. Não se pode permitir que decisões judiciais que impactam significativamente nos direitos e garantias de certa classe de pessoas – nesse caso, os condenados, que não perdem todos os direitos, como enfatiza o art. 3º da LEP – sejam proferidas sem que a fundamentação se dê com base num dispositivo legal explícito e preciso.

Assim, considerando-se que (i) o monitoramento eletrônico não é, do ponto de vista técnico, formal e jurídico, uma pena ou um regime de cumprimento de pena, e sim uma forma de fiscalização e controle da execução penal, visando a sua regularidade e eficiência; que, (ii) em sede de execução penal, não há um dispositivo análogo ao art. 387, IV do CPP, que especifica a possibilidade de o juiz fixar valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, mas apenas dois dispositivos – art. 29, § 1º, “d” e art. 39, VIII, ambos da LEP – incertos e combinados, que não mencionam qual autoridade (legislativa ou judiciária) está habilitada a efetivar a fixação de indenização e ressarcimento ao Estado; que (iii) a cobrança pela monitoração eletrônica não se confunde e não deve se confundir com a multa penal, com a reparação do dano ou mesmo com a fiança, por ostentarem diferentes naturezas jurídicas, e pelo fato de a primeira não estar prevista em lei; e que (iv) o STJ já assentou, em diversas oportunidades, o argumento de inexistência de base legislativa para a imposição do referido ônus, conclui-se que o TRF-4, em suas decisões nessa matéria, está agindo de forma juridicamente equivocada – podendo-se cogitar até mesmo a ocorrência de desvio na execução penal20 20 Os Itens 170 e 171 da Exposição de Motivos da LEP, sem distinguir o desvio do excesso, destacam que ambos “consistem na prática de qualquer ato fora dos limites fixados pela sentença, por normas legais ou regulamentares”, o que se reputa mais comum no “acidentado” processo executivo penal que no processo civil (BRASIL, 1983, s.p.). Para Avena (2019, p. 378), o excesso na execução penal reside na transgressão quantitativa da execução da pena, ao passo que o desvio caracteriza-se pelo destoar qualitativo da execução em relação aos parâmetros estabelecidos pela lei, transgredindo direitos do preso. .

Assim, pode-se constatar que a imposição do ônus financeiro pela monitoração eletrônica por parte do TRF-4, sem previsão legal existente nesse sentido, traz consequências que não podem ser olvidadas, tanto para a pessoa monitorada, que deverá cumprir um dever não imposto por lei, mas determinado por sentença, quanto para o sistema jurídico, que, por essa razão, perde parte da sua coerência e integridade.

Considerações finais

Este artigo teve como objetivo analisar criticamente as decisões do TRF-4 que impunham à pessoa monitorada o ônus de arcar com as despesas referentes à monitoração eletrônica. O problema de pesquisa formulado consistia no questionamento acerca da (in)corretude dos argumentos empregados pelos julgadores nos casos submetidos à Corte.

Considera-se que a hipótese formulada, referente ao caráter equivocado desses argumentos, foi comprovada, uma vez que, não havendo, realmente, previsão legislativa impondo à pessoa monitorada esse encargo, logo, as decisões do TRF-4 analisadas nesta ocasião não indicam a observância do princípio da legalidade certa, estrita e taxativa.

Nesse sentido, a discussão tornou possível observar, primeiramente, que o princípio da legalidade ostenta especificidades em matéria penal, mais especificamente em sede de execução penal, por regular a atuação estatal com relação à garantia dos direitos e a exigência do cumprimento dos deveres por parte do preso, os quais devem estar previstos de forma explícita e elucidativa na legislação.

Por essa razão, o princípio da jurisdicionalidade não pode ir além das determinações legais para impor encargos, como, inclusive, atestou o STJ em diversas oportunidades, e isso independentemente da argumentação empreendida, como as três principais exaradas pelo TRF-4, a saber, a de que o referido ônus financeiro é permitido pela previsão genérica do art. 39, VIII da LEP, pelo art. 12 do Provimento nº 46/2016 da Corregedoria Regional do TRF-4, e por representar um reforço à responsabilidade no cumprimento da pena.

Conclui-se, portanto, que a argumentação do TRF-4 não parece a mais adequada, sob a ótica defendida neste trabalho, em virtude da inexistência de embasamento legal para essa atuação jurisdicional de imposição de ônus financeiro em decorrência da monitoração eletrônica. Outrossim, legalidade e jurisdicionalidade não são princípios que rivalizam: este último princípio interpreta e aplica as normas a que se refere o primeiro sem ignorar o texto da lei ou ir além dele.

  • 4
  • 5
  • 6
    Mais informações e detalhamentos a esse respeito podem ser encontrados, para além da descrição metodológica minuciosa realizada no início da terceira seção do desenvolvimento deste artigo, nos dados públicos constantes na base aberta da plataforma Figshare. Disponível em: https://dx.doi.org/10.6084/m9.figshare.24657840. Acesso em: 29 nov. 2023.
  • 7
    É importante ressaltar que, na anterioridade, cada estabelecimento penal tinha suas próprias leis, baixadas pela autoridade administrativa via regulamentos ou outros instrumentos normativos infralegais, visando a regular comportamentos e impondo punições para os casos de descumprimento, o que, claro está, demandava a existência de leis criadas pelo Estado, e não por autoridades individuais, a fim de prescrever as situações dos presos de modo suficientemente uniforme, em razão do princípio da isonomia de tratamento entre presos em idêntica situação jurídica (ROSA, 1995ROSA, Antonio José Miguel Feu. Execução Penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995., p. 180-181).
  • 8
    A política criminal é uma das ciências criminais que, com autonomia em relação ao direito penal, objetiva organizar as respostas estatais aos fenômenos criminais enquanto um problema social, com vistas a preveni-lo e repreendê-lo. Desponta como “uma possibilidade de afastar a ideia de fortalecimento do Estado Penal punitivo para dar prioridade às medidas do Estado Social, integrando, assim, juntamente com a criminologia e o direito penal, o tripé que atua na busca por soluções ao problema social do crime” (DELMAS-MARTY, 2004DELMAS-MARTY, Mireille. Os grandes sistemas da política criminal. São Paulo: Manole, 2004.; OLIVEIRA, 2017OLIVEIRA, Samyle Regina Matos. A Política Criminal do Brasil e sua efetividade por meio das Políticas Públicas. Dissertação (Mestrado em Ciência Jurídica) – Universidade Estadual do Norte do Paraná, Jacarezinho-PR, 2017. Disponível em: <https://uenp.edu.br/pos-direito-teses-dissertacoes-defendidas/direito-dissertacoes/9210-samyle-regina-matos-oliveira/file>. Acesso em: 2 jun. 2023.
    https://uenp.edu.br/pos-direito-teses-di...
    ).
  • 9
    Um ano após, foi promulgada a Lei nº 12.403/2011, que trata da monitoração eletrônica enquanto medida cautelar diversa da prisão no âmbito do processo penal (art. 319, IX do CPP).
  • 10
    Esse foi, inclusive, o argumento jurídico utilizado pelos legisladores de diversos estados-membros da federação, como São Paulo, Espírito Santo e Mato Grosso do Sul, para implementar, em suas jurisdições territoriais, a monitoração eletrônica enquanto forma de auxiliar à execução das penas impostas, antes mesmo da existência de uma lei federal de normas gerais versando sobre o assunto – que viria a ser a Lei nº 12.258/2010 –, como permite o art. 24, § 3º da Constituição, ainda que haja opiniões em sentido contrário acerca da constitucionalidade dessas leis estaduais. Cf, nesse sentido, Bottini (2008)BOTTINI, Pierpaolo Cruz. Aspectos Pragmáticos e Dogmáticos do Monitoramento Eletrônico. Revista da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Uberlândia, v. 36, p. 387-404, 2008. Disponível em: <https://seer.ufu.br/index.php/revistafadir/article/view/18456>. Acesso em: 11 abr. 2023.
    https://seer.ufu.br/index.php/revistafad...
    e Campello (2019)CAMPELLO, Ricardo Urquizas. Faces e interfaces de um dispositivo tecnopenal: o monitoramento eletrônico de presos e presas no Brasil. Tese (Doutorado em Sociologia) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2019. Disponível em: <https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8132/tde-16122019-185040/publico/2019_RicardoUrquizasCampello_VCorr.pdf>. Acesso em: 11 abr. 2023.
    https://www.teses.usp.br/teses/disponive...
    .
  • 11
    Em sentido contrário é a decisão do STF, no RE nº 1.364.933/SC, no qual a relatora Ministra Rosa Weber não admitiu o recurso por não vislumbrar inconstitucionalidade numa lei estadual catarinense que impunha, aos presos e apenados do estado, esse dever. Todavia, em seu voto, a relatora se limitou a transcrever trechos de outras decisões, como o RE nº 1.224.396/DF, no qual o STF formulou um conceito jurisprudencial para direito penitenciário, e a ADI nº 3.916/DF, na qual a Corte praticamente reafirmou o permissivo constitucional do art. 24, § 2º, referente à possibilidade de complementação legislativa estadual às leis federais de normas gerais reguladoras dos ramos jurídicos indicados naquele dispositivo constitucional. Em suma, no voto da relatora, não há um argumento específico sequer que fundamente o argumento de constitucionalidade das leis estaduais que impõem ao preso a obrigação de custear as despesas decorrentes da monitoração eletrônica, o que prejudica a coerência e a integridade do direito, e consequentemente os direitos e garantias individuais, nesse caso, dos presos sujeitos à monitoração eletrônica.
  • 12
  • 13
    Com relação à imposição do mesmo ônus financeiro decorrente da monitoração eletrônica, mas no âmbito da cautelar diversa da prisão, prevista no art. 319, IX do CPP, há decisões do TRF-4 que empregam o seguinte raciocínio: o custo médio do equipamento – à época das decisões – era de R$ 275,00 reais, e a duração média de um processo penal desse tipo era de dois anos, logo, o valor da monitoração deveria ser multiplicado pelos vinte e quatro meses, e esse montante deveria ser depositado previamente, o que totalizava a quantia significativa de R$ 6.600,00 reais. Foi o que ocorreu, por exemplo, nos Habeas Corpus de número 5020824-18.2015.4.04.0000/PR, julgado em 23/06/2015, sob a relatoria do Desembargador Márcio Antônio Rocha; 5006603-93.2016.4.04.0000, julgado em 15/03/2016 sob relatoria do Desembargador Sebastião Ogê Muniz; 5024855-47.2016.4.04.0000, julgado em 21/06/2016, sob a relatoria do Desembargador Gilson Luiz Inácio; 5025216-64.2016.4.04.0000, julgado em 21/06/2016, sob a relatoria da Desembargadora Cláudia Cristina Cristofani; 5024322-88.2016.4.04.0000/PR e 5044829-70.2016.4.04.0000/PR, julgados, respectivamente, em 28/06/2016 e 08/11/2016, ambos de relatoria do Desembargador Márcio Antônio Rocha.
  • 14
    Tanto é assim, que algumas decisões chegam até mesmo a transcrever trechos inteiros do que restou decidido anteriormente, o que não é necessariamente negativo, porque, de um lado, mostra uma relativa padronização e uniformização do que é decidido pelo colegiado, mas, de outro lado, causa certa perplexidade, em virtude da imperiosidade de se realizar uma argumentação coerente não apenas com o caso concreto, mas com a totalidade do ordenamento jurídico, o que nem sempre é possível de acontecer em virtude de transcrições de fragmentos completos dos votos de outros relatores de outras decisões. De uma forma ou de outra, isso não parece constituir novidade no direito brasileiro, ao menos segundo registra Rodriguez, cujas pesquisas sinalizam a existência, no país, de um modelo de racionalidade jurisdicional caracterizado justamente por essa prevalência de certas teses jurídicas que são, na verdade, síntese dos resultados das decisões, não se destinando a devida atenção, a seu ver, ao percurso argumentativo realizado até a obtenção desses resultados, cerne de uma fundamentação judicial (RODRIGUEZ, 2013RODRIGUEZ, José Rodrigo. Como decidem as cortes?: Para uma crítica do direito (brasileiro). Rio de Janeiro: FGV, 2013.).
  • 15
    Outras decisões seguem essa mesma linha de argumentação. É o caso do Agravo de Execução Penal nº 5000280-55.2020.4.04.7106, julgado em 21/05/2020; da Apelação Criminal nº 5004007-45.2013.4.04.7016/PR, julgada em 09/06/2021; do Agravo de Execução Penal nº 5041523-69.2021.4.04.7000, julgada em 12/08/2021, ambas sob relatoria do mesmo Desembargador; e do Habeas Corpus nº 5029125-07.2022.4.04.0000/PR, julgado em 29/06/2022, sob relatoria do Desembargador Carlos Augusto Thomson Flores Lenz.
  • 16
    Outras decisões seguem essa mesma linha de argumentação. É o caso do Agravo de Execução Penal nº 5000630-43.2020.4.04.7106/RS, julgado em 02/06/2020, sob relatoria da Desembargadora Cláudia Cristina Cristofani; do Agravo de Execução Penal nº 5000270-11.2020.4.04.7106/RS, decidido em 29/10/2020; e do Agravo de Execução Penal nº 5000630-43.2020.4.04.7106/RS, julgado em 02/06/2020, ambos sob relatoria do Desembargador Leandro Paulsen.
  • 17
    Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) assentou, no AgRg no HC nº 668.096/SP, julgado em 17 de agosto de 2021, sob relatoria do Relator Ministro Jesuíno Rissato, que “em direito penal não é permitido o uso de interpretação extensiva, para prejudicar o réu, devendo a integração da norma se operar mediante a analogia in bonam partem. Princípios aplicáveis: Legalidade das penas, Retroatividade benéfica e in dubio pro reo. A lei penal deve ser interpretada restritivamente quando prejudicial ao réu, e extensivamente no caso contrário (favorablia sunt amplianda, odiosa restringenda)”.
  • 18
    No âmbito processual penal, a decisão no Habeas Corpus nº 5016646-21.2018.4.04.0000/PR é enfática ao assinalar, o relator Desembargador Márcio Antonio Rocha, que o custo gerado pela obrigação de pagar pela utilização do equipamento de monitoração eletrônica enquanto cautelar diversa da prisão “somente é gerado pela incapacidade de comprovar condições realmente favoráveis à soltura de forma irrestrita”, o que já havia sido proferido noutras decisões – como os Habeas Corpus de nº 5044829-70.2016.4.04.0000, 5044829-70.2016.4.04.0000, 5006956-02.2017.4.04.0000, 5047625-34.2016.4.04.0000 e 5055094-34.2016.4.04.0000, todos de sua relatoria – e que indica um claro argumento de política criminal que também não encontra legitimidade em sede jurídico-legislativa.
  • 19
    Uma outra atuação jurisdicional do TRF-4 igualmente não prevista em lei é a de imputar à pessoa monitorada o ônus de comprovar a hipossuficiência, caso pretenda se desincumbir do encargo financeiro imposto por sentença e supostamente autorizado pela Lei de Execuções Penais. Cf., nesse sentido, o Habeas Corpus nº 5033188-12.2021.4.04.0000/RS, de relatoria do Desembargador Carlos Eduardo Thomson Flores Lenz, julgado em 12/08/2021.
  • 20
    Os Itens 170 e 171 da Exposição de Motivos da LEP, sem distinguir o desvio do excesso, destacam que ambos “consistem na prática de qualquer ato fora dos limites fixados pela sentença, por normas legais ou regulamentares”, o que se reputa mais comum no “acidentado” processo executivo penal que no processo civil (BRASIL, 1983BRASIL. Congresso Nacional. Exposição de Motivos nº 213, de 9 de maio de 1983. Diário do Congresso Nacional, Seção 1, Supl. B, p. 017, 1/7/1983. Disponível em: <https://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/1980-1987/lei-7210-11-julho-1984-356938-exposicaodemotivos-149285-pl.html>. Acesso em: 18 maio 2023.
    https://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei...
    , s.p.). Para Avena (2019, p. 378)AVENA, Norberto. Execução penal. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2019., o excesso na execução penal reside na transgressão quantitativa da execução da pena, ao passo que o desvio caracteriza-se pelo destoar qualitativo da execução em relação aos parâmetros estabelecidos pela lei, transgredindo direitos do preso.

Acknowledgment

to the Brazilian Coordination for the Improvement of Higher Education Personnel (CAPES), for financing this research through the CAPES/PROSUP scholarship of co-author Thyerrí José Cruz Silva.

  • 1
    O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) – Código de Financiamento 001, Bolsa/PROSUP/CAPES.
  • Declaration of originality: the authors assure that the text here published has not been previously published in any other resource and that future republication will only take place with the express indication of the reference of this original publication; they also attest that there is no third party plagiarism or self-plagiarism.

How to cite (ABNT Brazil):

  • SILVA, Thyerrí J. C.; OLIVEIRA, Samyle R. M. Legalidade “versus” jurisdicionalidade na execução penal? Ônus financeiro da monitoração eletrônica em decisões do TRF-4. Revista Brasileira de Direito Processual Penal, vol. 10, n. 1, e872, jan./abr. 2024. https://doi.org/10.22197/rbdpp.v10i1.872

Referências

  • AVENA, Norberto. Execução penal 6. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2019.
  • BOTTINI, Pierpaolo Cruz. Aspectos Pragmáticos e Dogmáticos do Monitoramento Eletrônico. Revista da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Uberlândia, v. 36, p. 387-404, 2008. Disponível em: <https://seer.ufu.br/index.php/revistafadir/article/view/18456>. Acesso em: 11 abr. 2023.
    » https://seer.ufu.br/index.php/revistafadir/article/view/18456
  • BOTTINO, Thiago; PRATES, Fernanda. Notas sobre a política de monitoração eletrônica no estado do rio de Janeiro. Revista Brasileira de Direito Processual Penal, Porto Alegre, v. 3, n. 2, p. 719-746, mai./ago. 2017. https://doi.org/10.22197/rbdpp.v3i2.68.
    » https://doi.org/10.22197/rbdpp.v3i2.68
  • BRANDÃO, Cláudio. Curso de direito penal: parte geral. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010.
  • BRASIL. Câmara dos Deputados. Redação final do substitutivo da Câmara dos Deputados ao Projeto de Lei nº 1.288-B de 2007 do Senado Federal (PLS nº 175/2007 na Casa de origem). Disponível em: <https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=565896&filename=REDACAO%20FINAL%20PL%201288/2007>. Acesso em: 10 abr. 2023.
    » https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=565896&filename=REDACAO%20FINAL%20PL%201288/2007
  • BRASIL. Congresso Nacional. Exposição de Motivos nº 213, de 9 de maio de 1983 Diário do Congresso Nacional, Seção 1, Supl. B, p. 017, 1/7/1983. Disponível em: <https://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/1980-1987/lei-7210-11-julho-1984-356938-exposicaodemotivos-149285-pl.html>. Acesso em: 18 maio 2023.
    » https://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/1980-1987/lei-7210-11-julho-1984-356938-exposicaodemotivos-149285-pl.html
  • BRASIL. Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Mensagem nº 310, de 15 de junho de 2010 Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/Msg/VEP-310-10.htm>. Acesso em: 10 abr. 2023.
    » https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/Msg/VEP-310-10.htm
  • BRASIL. Senado Federal. Projeto de Lei do Senado nº 175, de 2007 Altera o Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, e a Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984 - Lei de Execução Penal, para alterar as regras do regime aberto e prever o rastreamento eletrônico de condenado. Disponível em: <https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/80416>. Acesso em: 10 abr. 2023.
    » https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/80416
  • BRITO, Alexis Couto de. Execução Penal 7. ed. São Paulo: SaraivaJur, 2022.
  • BUSATO, Paulo César. Direito penal: parte geral, volume 1. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2020.
  • BUSATO, Paulo César. Fundamentos para um direito penal democrático 5. ed. São Paulo: Atlas, 2015.
  • CAMPELLO, Ricardo Urquizas. Faces e interfaces de um dispositivo tecnopenal: o monitoramento eletrônico de presos e presas no Brasil. Tese (Doutorado em Sociologia) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2019. Disponível em: <https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8132/tde-16122019-185040/publico/2019_RicardoUrquizasCampello_VCorr.pdf>. Acesso em: 11 abr. 2023.
    » https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8132/tde-16122019-185040/publico/2019_RicardoUrquizasCampello_VCorr.pdf
  • CORRÊA JUNIOR, Alceu. Monitoramento eletrônico de penas e alternativas penais Tese (Doutorado em Direito) – Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2012. Disponível em: <https://teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2136/tde-20062013-132709/pt-br.php>. Acesso em: 10 abr. 2023.
    » https://teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2136/tde-20062013-132709/pt-br.php
  • DELMAS-MARTY, Mireille. Os grandes sistemas da política criminal São Paulo: Manole, 2004.
  • DOTTI, René Ariel. Bases e alternativas para o sistema de penas 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998.
  • DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério 3. ed. Trad. Nelson Boeira. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2010.
  • DWORKIN, Ronald. O Império do Direito Trad. Jefferson Luiz Camargo. 2ª tiragem. São Paulo: Martins Fontes, 2003.
  • DWORKIN, Ronald. Uma questão de princípio Trad. Luís Carlos Borges. São Paulo: Martins Fontes, 2001.
  • FREITAS FILHO, Roberto; LIMA, Thalita Moraes. Metodologia de análise de decisões. Universitas Jus, Brasília, n. 21, p. 1-17, jul./dez. 2010. https://doi.org/10.5102/unijus.v2i0.1206.
    » https://doi.org/10.5102/unijus.v2i0.1206
  • GOULART, José Eduardo. Princípios informadores do direito da execução penal São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994.
  • JAPIASSÚ, Carlos Eduardo Adriano; MACEDO, Celina Maria. O Brasil e o monitoramento eletrônico. In: BRASIL. Ministério da Justiça. Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária. Monitoramento Eletrônico: uma alternativa à prisão? Experiências internacionais e perspectivas no Brasil. Brasília: Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, 2008, p. 13-38.
  • JESUS, Damásio de. Direito Penal vol. 1 – Parte geral 37. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2020.
  • LEAL, César Barros. Vigilância eletrônica à distância: instrumento de controle e alternativa à prisão na América Latina. Curitiba: Juruá, 2011.
  • LIMA, Alberto Jorge Correia de Barros. Direito penal constitucional: a imposição dos princípios constitucionais penais. São Paulo: Saraiva, 2012.
  • MIOTTO, Armida Bergamini. O Direito Penitenciário: importância e necessidade do seu estudo. Revista de informação legislativa, v. 7, n. 28, p. 93-106, out./dez. 1970. Disponível em: <https://www2.senado.leg.br/bdsf/item/id/180530>. Acesso em: 26 abr. 2023.
    » https://www2.senado.leg.br/bdsf/item/id/180530
  • MIRABETE, Julio Fabbrini; FABBRINI, Renato Nascimento. Execução penal 15. ed. Barueri: Atlas, 2022.
  • NUCCI, Guilherme de Souza. Curso de execução penal 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2022.
  • OLIVÉ, Juan Carlos Ferré et al Direito penal brasileiro: parte geral: princípios fundamentais e sistema. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2017.
  • OLIVEIRA, Samyle Regina Matos. A Política Criminal do Brasil e sua efetividade por meio das Políticas Públicas Dissertação (Mestrado em Ciência Jurídica) – Universidade Estadual do Norte do Paraná, Jacarezinho-PR, 2017. Disponível em: <https://uenp.edu.br/pos-direito-teses-dissertacoes-defendidas/direito-dissertacoes/9210-samyle-regina-matos-oliveira/file>. Acesso em: 2 jun. 2023.
    » https://uenp.edu.br/pos-direito-teses-dissertacoes-defendidas/direito-dissertacoes/9210-samyle-regina-matos-oliveira/file
  • PRADO, Luiz Regis. Tratado de Direito Penal Brasileiro: parte geral (arts. 1º a 120). 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2021.
  • PRADO, Luiz Regis et al. (coord.). Direito de execução penal 4. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017.
  • REALE JÚNIOR, Miguel. Fundamentos de direito penal 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020.
  • RODRIGUEZ, José Rodrigo. Como decidem as cortes?: Para uma crítica do direito (brasileiro). Rio de Janeiro: FGV, 2013.
  • ROSA, Antonio José Miguel Feu. Execução Penal São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995.
  • SILVA, Thyerrí José Cruz; MENESES, Renato Carlos Cruz; SILVA, Rogério Alves Marinho da. “Pagando pelo mal cometido”: a cobrança da tornozeleira eletrônica à luz da expansão econômica do direito penal. Revista Brasileira de Segurança Pública, v. 17, n. 1, p. 82-103, 2023. https://doi.org/10.31060/rbsp.2023.v17.n1.1475
    » https://doi.org/10.31060/rbsp.2023.v17.n1.1475

Editado por

Editorial team

  • Editor-in-chief: 1 (VGV)

  • Reviewers: 3

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Jan 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    02 Jun 2023
  • Revisado
    20 Jun 2023
  • Revisado
    16 Ago 2023
  • Revisado
    22 Ago 2023
  • Revisado
    23 Ago 2023
  • Revisado
    10 Out 2023
  • Revisado
    26 Nov 2023
  • Revisado
    29 Nov 2023
  • Aceito
    13 Dez 2023
Instituto Brasileiro de Direito Processual Penal Av. Praia de Belas, 1212 - conj 1022 - Praia de Belas, Porto Alegre - RS / Brasil. CEP 90110-000., +55 (51) 3406-1478 - Porto Alegre - RS - Brazil
E-mail: revista@ibraspp.com.br