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Documentando histórias: a carreira profissional de Milton Carlos Mariotti a partir do método da história de vida

Resumo

Compreender a história da terapia ocupacional no Brasil por meio das trajetórias individuais e coletivas é fundamental, tanto para o avanço da produção de conhecimentos quanto para a formação e desenvolvimento profissional no campo. Este artigo baseia-se na história de vida de Milton Carlos Mariotti, terapeuta ocupacional, Professor Sênior da Universidade Federal do Paraná (UFPR). Objetiva-se documentar sua narrativa profissional, o legado de sua liderança e seu compromisso ético com o desenvolvimento da profissão terapia ocupacional no Brasil. Para tanto, quatro docentes terapeutas ocupacionais reuniram-se para formular um roteiro de entrevista semiestruturada composto por 34 questões. A partir das respostas, organizou-se o texto em quatro eixos temáticos: 1) Formação acadêmica, 2) Atuação como terapeuta ocupacional, 3) Trajetória acadêmica e 4) Militância política. Apresenta-se como resultado uma narrativa histórica que documenta a história de vida profissional do professor e sua contribuição para a institucionalização da terapia ocupacional no Estado do Paraná, Sul do Brasil.

Palavras-chave:
Terapia Ocupacional; Trajetória de Vida; Liderança; Docentes; Ensino; Formação de Recursos Humanos

Abstract

Understanding the history of occupational therapy in Brazil through individual and collective trajectories is fundamental, both for the advancement of knowledge production and for professional training and development in the field. This article is based on the life story of Milton Carlos Mariotti, occupational therapist, Senior Professor at the Federal University of Paraná (UFPR). The objective is to document his professional narrative, the legacy of his leadership and his ethical commitment to the development of occupational therapy in Brazil. For that, four occupational therapist professors got together to formulate a semi-structured interview script composed of 34 questions. Based on the responses, the text was organized into four thematic axes: 1) Educational background, 2) Work as an occupational therapist, 3) Academic trajectory and 4) Political militancy. As a result, a historical narrative is presented that documents the history of the teacher's professional life and his contribution to the institutionalization of occupational therapy in the State of Paraná, southern Brazil.

Keywords:
Occupational Therapy; Life Experiences; Leadership; Teaching; Faculty; Staff Development

Introdução

Avanços na produção acadêmica, científica e social resultam da articulação de diversos atores individuais e coletivos que, cada um à sua maneira, contribuem a fim de coletivamente romperem com barreiras políticas e ideológicas, assim como com paradigmas dominantes. A compreensão desses encontros ao longo do caminho é fundamental para entender, por exemplo, os primórdios da Reforma Sanitária no Brasil (Cohn, 1989Cohn, A. (1989). Caminhos da reforma sanitária. Lua Nova, (19), 124-140. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-64451989000400009.
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).

Nessa perspectiva, entender os caminhos da terapia ocupacional, no campo do conhecimento e da prática, engajada na produção da saúde, por meio das trajetórias individuais e coletivas, é fundamental tanto para o avanço da produção de conhecimentos originais (Cardinalli & Silva, 2021Cardinalli, I., & Silva, C. R. (2021). Trajetórias singulares e plurais na produção de conhecimento de terapia ocupacional no Brasil. Cadernos Brasileiros de Terapia Ocupacional, 29, 1-17. http://dx.doi.org/10.1590/2526-8910.ctoAO2040.
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), quanto para a consolidação da educação e formação e do desenvolvimento profissional regulamentado na sua história no Brasil.

O objeto deste texto é a contribuição do docente Milton Carlos Mariotti que, formado em São Paulo na década de 1980, teve papel decisivo na consolidação da educação superior e na regulamentação da profissão no Estado do Paraná e no processo da descentralização da disciplina, inicialmente centrado na região sudeste. Desempenhou papel na história da terapia ocupacional se constituindo em liderança regional pelo trabalho, seja na assistência, no ensino, ou em prol da formação de entidades representativas com influência na implantação de políticas públicas.

A história da terapia ocupacional no Brasil, legitimada a partir de 1969, principalmente a que se associa à expansão do ensino superior brasileiro, em especial dos cursos de terapia ocupacional, ocorrida nas últimas duas décadas, é devedora da contribuição do protagonismo e pioneirismo de diversos profissionais. Bianchi & Malfitano (2017)Bianchi, P. C., & Malfitano, A. P. S. (2017). Occupational therapy education in Latin America: are we moving to the social issue? World Federation of Occupational Therapists Bulletin, 73(1), 15-23. http://dx.doi.org/10.1080/14473828.2017.1293206.
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identificaram 50 cursos de terapia ocupacional no Brasil.

No estado do Paraná, o Curso de Terapia Ocupacional surgiu em 1981 na Universidade Tuiuti do Paraná e em 2000 o curso foi criado na Universidade Federal do Paraná (UFPR). Durante 39 anos, o Professor Milton participou da formação de terapeutas ocupacionais. Este artigo original baseia-se no método de “história de vida” de Milton Carlos Mariotti, professor da UFPR. O objetivo é apresentar sua trajetória na profissão.

Método

Para apresentar a “história de vida”, quatro docentes terapeutas ocupacionais reuniram-se para formular um roteiro de entrevista semiestruturada composto por 34 questões (Apêndice Apêndice Roteiro de entrevista semiestruturada. 1. Como foi o processo de escolha para fazer o curso de terapia ocupacional e a vivência durante a graduação? 2. O que movimentou e orientou a sua busca para a pós-graduação? 3. O que você relataria sobre a sua experiência nos Cursos de Mestrado e Doutorado (local, processo seletivo, projeto, referencial teórico, etc.)? 4. Cite pessoas que lhe inspiraram durante a sua trajetória de formação acadêmica. 5. Você teve alguma experiência laboral antes ou durante a graduação? 6. Sobre o seu primeiro emprego como terapeuta ocupacional, quais as suas principais impressões relativamente à integração teórico prática? 7. Quais foram as etapas/lugares/serviços e desafios de sua atuação como TO no Paraná? 8. Cite pessoas que lhe inspiraram durante a sua trajetória profissional. 9. Você tinha planos de ser professor? Como foi o processo de decisão de aceitar/concorrer para a sua primeira vaga na docência? 10. Como foi compor o primeiro curso de TO no Paraná? Quais os desafios enfrentados? 11. Você participou da implantação do Curso de TO da UFPR. Como foi esse processo? 12. Conte sua trajetória acadêmica nessa instituição. 13. Como está sendo o processo de construção de pós-graduação stricto sensu no DTO-UFPR? 14. Quando iniciou suas atividades de pesquisa? 15. Qual objeto de estudo direcionou sua carreira de pesquisador? 16. Cite pessoas que lhe inspiraram durante a sua trajetória na academia. 17. Na sua graduação, o que chamava sua atenção e, desde então, você já participava da militância estudantil pela categoria? 18. Quais as experiências da militância na vida universitária na TO? 19. Algum evento/pessoas em sua formação profissional provocou/acendeu/inspirou a liderança de grupos/militância na vida universitária. 20. Como aconteceu seu engajamento na representação profissional? 21. Como TO, como aconteceu a noção de categoria profissional diferenciada para o Milton na TO em Curitiba, no Estado do Paraná, no Brasil, na América Latina e no mundial. 22. Com relação a sua participação internacional, quais momentos marcantes da sua vida você destacaria (publicações internacionais, WFOT, congressos, etc.)? Apresente referências que subsidiem a sua fala, caso hajam. 23. Como organizou o tempo para representar a profissão? Além do tempo, de que outros investimentos um profissional que se dispõe a representar o coletivo necessita? 24. Traçando uma linha do tempo de sua formação até os dias de hoje, quais foram os acontecimentos marcantes relacionados aos aspectos éticos e políticos na TO em Curitiba, no Estado do Paraná, no Brasil e no mundo 25. Que estratégias do coletivo de TOs militantes foram notáveis para você? 26. Olhando o atual cenário político de TOs, quais os desafios? 27. Que desafios éticos políticos (associativismo, desmembramento, participação, mobilização do coletivo) na TO na UFPR, no Estado do Paraná, no Brasil e no mundo você identifica? 28. Descreva suas qualidades e papeis políticos na TO no Estado do Paraná. 29. Quais foram, ao longo de sua trajetória, os seus referenciais teórico-práticos? Cite as referências completas e justifique a sua escolha pelas mesmas. 30. Atividade ou Ocupação, ou outra opção? 31. Como você vê a TO hoje e quando se formou/iniciou sua carreira profissional? 32. Se fosse possível voltar para um lugar/um posicionamento, qual seria? 33. Qual a contribuição mais significativa que você acredita ter deixado para a profissão no Brasil até o momento? 34. Deixe uma mensagem inspiradora para os que estão vindo. ). As perguntas foram discutidas entre os eles de modo a coletar as informações necessárias para a entrevista. O texto foi produzido a partir do encontro intergeracional desses quatro terapeutas ocupacionais com Milton e tem como objetivo documentar sua narrativa profissional sensível à sua liderança, responsabilidade e compromisso ético profissional no Estado do Paraná, bem como suas conexões com a terapia ocupacional no mundo.

Optou-se pelo método da história de vida, que é um procedimento de investigação adotado pela Sociologia e pela Antropologia. Esse método consiste, fundamentalmente, numa recolha intensiva de dados de caráter biográfico sobre uma ou mais pessoas, sendo o próprio ou os próprios a fonte principal da informação, embora não necessariamente a única.

O método de História de Vida se insere dentro de metodologias qualitativas (Abordagens Biográficas) que surge com a Escola de Chicago. O método de História de Vida objetiva apreender as articulações entre a história individual e a história coletiva, uma ponte entre a trajetória individual e a trajetória social (Silva et al., 2017, pSilva, A. P., Barros, C. R., Nogueira, M. L. M., & Barros, V. A. (2017). “Conte-me sua história”: reflexões sobre o método de História de Vida. Mosaico: Estudos Em Psicologia, 1(1), 25-35.. 25).

Os dados da entrevista foram coletados virtualmente e seguiram todos os princípios éticos indicados pela Resolução CNS Nº 466 de 12 de dezembro de 2012 (Brasil, 2012Brasil. Conselho Nacional de Saúde. (2012). Resolução CNS n° 466, de 12 de dezembro de 2012. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília.). A primeira versão da entrevista foi lida na íntegra e depois enviada ao Professor para que ele incluísse informações como referencial teórico utilizado e suas principais produções científicas.

As respostas foram analisadas qualitativamente e o texto foi organizado em quatro eixos temáticos: 1) Formação acadêmica, 2) Atuação como terapeuta ocupacional, 2) Trajetória acadêmica e 4) Militância política. Os dados foram discutidos a partir das produções do Professor Milton e dos referenciais teóricos que nortearam a sua trajetória.

Formação Acadêmica

Por causa de seu interesse pelas pessoas, pela mente humana e pelo sofrimento psíquico, seu foco era a área de saúde mental. Buscou informações e conheceu o curso e a profissão de terapia ocupacional.

No Estado de São Paulo, apenas a Universidade de São Paulo (USP) ofertava o curso de terapia ocupacional até 1976. Fora da cidade de São Paulo, dificilmente alguém conhecia um terapeuta ocupacional. Em 1977, ano em que Milton concorreu a vaga na graduação, cursos de terapia ocupacional foram abertos nas seguintes universidades: Universidade Metodista de Piracicaba (UNIMEP), Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC). Ele foi aprovado na UNIMEP, onde estudou o primeiro ano do curso.

Senti a necessidade de conhecer um terapeuta ocupacional, fui até uma professora do segundo ano e me apresentei; era a Maria Heloisa da Rocha Medeiros ou “Helô”, e conversamos longamente sobre terapia ocupacional. Participei também de um simpósio na USP onde conheci a Professora Irene de Aquino Villar, que falava da terapia ocupacional com muita paixão, da sua experiência de ter ido para os Estados Unidos e das barreiras para trabalhar e cursar o mestrado, por causa das “deficiências do currículo” da Universidade onde ela havia estudado no Brasil. Ela era organizadora e coordenadora do curso da PUC Campinas e havia construído um currículo baseado nas normas internacionais. Agendei uma visita em sua clínica e depois da visita decidi me transferir para a PUC Campinas, onde me formei em 1981 (Mariotti, Curitiba, Entrevista, 2020).

Durante a graduação, participou das semanas de estudos, que segundo ele ocorriam anualmente. Nesses eventos, conheceu muitos profissionais de todo o país, e foi nesse mesmo período que os primeiros professores foram contratados pela PUC.

Duas experiências muito interessantes que determinaram seu interesse pela docência foram ter sido monitor da disciplina Atividades e Recursos Terapêuticos e submeter-se ao processo de terapia ocupacional como paciente, uma espécie de terapia ocupacional didática.

Sua formação foi voltada para a clínica. À época, praticamente todos os professores eram especialistas, apenas duas professoras estavam cursando o mestrado. A única atividade de pesquisa desenvolvida no curso era o Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), para a qual recebeu orientação de Lilian Vieira Magalhães (Mariotti, 1981Mariotti, M. C. (1981). O adolescente carente institucionalizado e a Terapia Ocupacional(Trabalho de Conclusão de Curso). Universidade Católica de Campinas, Campinas.).

Seu interesse pela saúde mental se confirmou durante a graduação. Relatou curiosidade por aprofundar conhecimentos sobre temas como “uso terapêutico do eu” e “potencialidades terapêuticas das ocupações”. Em 1981, iniciou a especialização em Terapia Ocupacional Dinâmica, metodologia em construção, à época, por Benetton (1991)Benetton, M. J. (1991).Trilhas Associativas: ampliando recursos na clínica da psicose.São Paulo: Lemos Editorial..

Em 1983, candidatou-se a uma vaga para Docente na Universidade Tuiuti do Paraná (UTP) em Curitiba. Cursou outra especialização em Magistério Superior, concluída em 1986, e começou a pensar na possibilidade de ingressar em uma pós-graduação stricto sensu.

Iniciou o mestrado no Programa de Pós-Graduação em Educação, linha de pesquisa Arte Educação, na Universidade Federal do Paraná (UFPR). O título de sua dissertação foi “As atividades expressivas e artísticas em terapia ocupacional na saúde mental”, uma correlação entre os fundamentos da arte educação e a utilização das atividades expressivas e artísticas na prática clínica em terapia ocupacional na saúde mental (Mariotti, 1999Mariotti, M. C. (1999). Atividades artísticas e Saúde Mental em Terapia Ocupacional(Dissertação de Mestrado). Universidade Federal do Paraná, Curitiba.). Em 2000, desenvolveu e coordenou o Curso de Especialização de Terapia Ocupacional em Saúde Mental na UTP.

Em 2001, realizou o primeiro teste seletivo para professor substituto da UFPR e foi aprovado como professor efetivo nessa instituição de ensino superior (IES) em 2003. Trabalhando na implantação do curso, foi coordenador por duas gestões consecutivas e chefe do Departamento de Terapia Ocupacional.

O doutorado foi a meta seguinte, realizado sem afastamento, tendo em vista o processo de implantação do curso na UFPR. Realizou seu doutorado na própria instituição, na área de saúde, no Programa de Medicina Interna. A linha de pesquisa escolhida foi da Nefrologia. Seu estudo apresentou características da privação ocupacional e quadros depressivos em pacientes em tratamento de hemodiálise. O título da tese foi “Qualidade de vida na hemodiálise: impacto de um programa de terapia ocupacional” (Mariotti, 2009Mariotti, M. C. (2009).Qualidade de vida na hemodiálise: impacto de um programa de terapia ocupacional(Tese de doutorado). Universidade Federal do Paraná, Curitiba.). O modelo teórico utilizado foi o Modelo da Ocupação Humana de Gary Kielhofner (Ferrari, 1991Ferrari, M. A. C. (1991). Kielhofner e o modelo de ocupação humana. Revista de Terapia Ocupacional da USP, 2(4), 216-219.) e a publicação dos resultados aconteceu na revista Escandinava de Terapia Ocupacional (Mariotti & Rocha de Carvalho, 2011Mariotti, M. C., & Rocha de Carvalho, J. G. (2011). Improving quality of life in hemodialysis: impact of an occupational therapy program. Scandinavian Journal of Occupational Therapy, 18(3), 172-179. http://dx.doi.org/10.3109/11038128.2010.488271.
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). Essa pesquisa possibilitou o trabalho de implantação do serviço de terapia ocupacional numa clínica de nefrologia na cidade de Curitiba, PR.

Com relação às inspirações que teve ao longo de sua jornada, no que tange à literatura internacional, o Professor destaca Christiansen & Townsend (2004)Christiansen, C. H., & Townsend, E. A. (2004).Introduction to occupation, the art and science of living.New Jersey: Pearson Education Inc., Townsend (1997), eTownsend, E. (1997).Enabling Occupation, an Occupational Therapy Perspective.Ottawa: CAOT Publications. Wilcock (2006)Wilcock, A. A. (2006).An Occupational Perspective of Health.Thorofare: Slack. como autores que o inspiraram com suas ideias sobre a terapia ocupacional e a ocupação humana.

No Brasil, o Professor cita Irene de Aquino1 1 Primeira coordenadora do curso de Terapia Ocupacional da Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas). Villar, Lilian Vieira Magalhães (2013)Magalhães, L. (2013). Ocupação e atividade: tendências e tensões conceituais na literatura anglófona da terapia ocupacional e da ciência ocupacional. Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, 21(2), 255-263. http://dx.doi.org/10.4322/cto.2013.027.
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, Maria Heloisa da Rocha Medeiros (2009)Medeiros, M. H. R. (2009).Terapia Ocupacional: um enfoque epistemológico e social.Campinas: Hucitec., Maria José Benetton (1991)Benetton, M. J. (1991).Trilhas Associativas: ampliando recursos na clínica da psicose.São Paulo: Lemos Editorial., Rui Chamone Jorge (1981)Jorge, R. C. (1981). Chance para uma esquizofrênica. Belo Horizonte: Imprensa Oficial., Berenice Rosa Francisco (1988)Francisco, B. R. (1988).Terapia Ocupacional. Campinas: Papirus., Michelle Selma Hahn (1991)Hahn, M. S. (1991). O 10 Congresso Mundial de Terapia Ocupacional. Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, 2(2), 71-78., Roseli Esquerdo Lopes (2013)Lopes, R. E. (2013). No pó da estrada. Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, 21(1), 171-186. http://dx.doi.org/10.4322/cto.2013.022.
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e Maria Luisa Guillaumon Emmel (2017)Emmel, M. L. G. (2017). Caminhos trilhados e contribuições para o desenvolvimento da terapia ocupacional no Brasil. Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, 25(1), 235-242. http://dx.doi.org/10.4322/0104-4931.ctoEN0876.
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como pessoas que o inspiraram durante a trajetória de formação acadêmica.

Além dessas, destaco as que me inspiraram em minha trajetória profissional: Ana Maria Silvello, colega de turma e amiga, veio para o sul e fixou residência em Curitiba, informou me sobre a possibilidade de trabalho na UTP, foi uma grande apoiadora. Dr. Alexandre Sech (in memoriam), médico Psiquiatra, Diretor Clínico do Hospital Espírita de Psiquiatria Bom Retiro, um dos responsáveis pela transformação do Hospital durante o processo da reforma psiquiátrica. Dr. Rogério Andrade Mulinari, Diretor do Setor de Ciências da Saúde (Mariotti, Curitiba, Entrevista, 2020).

Atuação como Terapeuta Ocupacional

Vários espaços de trabalho foram desafios para a sua atuação profissional como terapeuta ocupacional. Em Curitiba, a partir de 1983, foi professor e supervisor de estágio. Para o desenvolvimento do estágio, a universidade estabeleceu um convênio com o Hospital Espírita de Psiquiatria Bom Retiro. Após um ano de estágio, a direção do hospital decidiu criar seu próprio serviço de terapia ocupacional, e Milton tornou-se terapeuta ocupacional da instituição com um contrato de 20 horas semanais. No ano seguinte organizou e coordenou um curso de aperfeiçoamento para terapeutas ocupacionais recém-formados, e o resultado dessa educação permanente foi a ampliação do serviço, com a contratação dos seis profissionais.

Segundo o Professor, um dos grandes desafios naquela época na UTP era a falta de estrutura e apoio para pesquisa. Para responder essa demanda, o Professor relata que uma das iniciativas com profissionais que se formaram nas primeiras turmas foi a criação da Associação Cultural dos Terapeutas Ocupacionais do Estado do Paraná (ACTOEP), hoje denominada Associação Brasileira de Terapeutas Ocupacionais - Paraná (ABRATO-PR). Esse espaço social, científico e político constituiu uma referência, um endereço para reunir profissionais e estudantes e promover eventos científicos, e foi fundamental para a criação do Curso de Terapia Ocupacional na UFPR. Decorre que, em 1990, a diretoria da ACTOEP protocolou junto à reitoria dessa IES uma moção de terapeutas ocupacionais com uma consistente justificativa da necessidade social da criação desse curso graduação.

Durante uma década, membros da ACTOEP se articularam nos Congressos Brasileiros de Terapia Ocupacional (CBTO) com novas moções em conjunto com as entidades representativas reforçando o pedido de abertura do curso. Esse foi um movimento incisivo de terapeutas ocupacionais egressas da UTP e servidoras do Complexo do Hospital de Clínicas (CHC/UFPR).

Em 2000, esse engajamento coletivo resultou na decisão da UFPR de criar o curso.

O curso na UFPR foi iniciado com dois professores substitutos em 2001. Em 2010, foi expandido para um grupo composto por 24 professores efetivos e com inauguração do prédio próprio.

A Professora Rita Aparecida Bernardi Pereira, minha vice-coordenadora por duas gestões e coordenadora subsequente, parceira de trabalho com enorme disposição, seriedade e competência, contribuiu efetivamente para os alicerces e manutenção dessa construção. Depois vieram meus colegas de curso e departamento, muitos deles meus ex-alunos e agora colegas e amigos, são mais de 30. Citarei um nome como representante desse departamento: Mônica de Macedo Ignácio, ex-aluna, colega e amiga, profissional exemplar e competente (Mariotti, Curitiba, Entrevista, 2020).

No ano de 2001, teve início a primeira turma, com uma entrada em período integral com 30 vagas. Foram cinco anos até finalizar o projeto de implantação do curso, e quando essa etapa foi concluída, em razão do plano de expansão do ensino superior no país (REUNI), dos argumentos do interesse do Setor de Ciências da Saúde da UFPR e da escassez de terapeutas ocupacionais no Estado do Paraná, docentes do setor optaram pela expansão do curso de graduação, que passou a ofertar 60 vagas com duas entradas ao ano (verão e inverno), sendo a segunda entrada para a turma no período noturno. Em sete anos, ampliou-se o quadro de seis para 18 docentes com dedicação exclusiva e quatro servidoras técnicas em terapia ocupacional para atender a demanda de entrada de 120 vagas ao ano. Durante esse período, foi possível efetivar o plano de titulação e capacitação dos professores, e foram criadas a Clínica Escola de Terapia Ocupacional (CETO) e as residências Multiprofissional e Saúde da Família no CHC/UFPR.

Só a partir de 2013 foi possível começar a pensar na pesquisa e pós-graduação com orientações de Iniciação Científica, intensificação das pesquisas e publicações.

Em 2017, um grupo docente coordenado pelo Professor Milton iniciou o trabalho de construção de um projeto para a Pós-Graduação Stricto Sensu - mestrado.

Em 2019, um curso de especialização em terapia ocupacional em saúde mental foi desenvolvido e realizado a partir de 2020.

A partir de 2020, mesmo com a conquista da aposentadoria, o Professor Milton tornou-se parte do corpo docente do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE/UFPR), o mesmo onde cursou seu mestrado, um programa CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) nota 6.

Trajetória Acadêmica: O Ensino e a Criação do Curso de Terapia Ocupacional na UFPR

Professor Milton começou a pensar na docência a partir de sua experiência como monitor na disciplina Atividades e Recursos Terapêuticos. Em 1981, tomou conhecimento da abertura de três cursos nas capitais da região sul em universidades privadas e de um projeto na Universidade Federal da Paraíba (UFPB) em João Pessoa. Em 1983, surgiu uma oportunidade na cidade de Curitiba. Como a vaga era para a área de sua especialização, aceitou-a de imediato e começou a trabalhar na UTP, uma universidade particular, com regime de trabalho horista, administração familiar, não preenchimento do total de vagas discentes e finais de ano com dispensa de professores. Foi bastante difícil a experiência institucional, ainda que tenha sido a pioneira no estado a formar terapeutas ocupacionais.

Por outro lado, o Professor relata ter sido positiva a experiência com o grupo de docentes, pois eram muito unidos e enfrentavam os desafios coletivamente apesar da hierarquia institucional.

Sua meta e a de outros colegas era inserir a terapia ocupacional na Universidade pública, e sua trajetória acadêmica na UFPR foi intercalada por atividades estudantis, docentes, administrativas e de pesquisador.

Milton atuou durante a solicitação para a criação do curso de terapia ocupacional na UFPR juntamente com os colegas da Diretoria da ACTOEP, no acompanhamento do processo, nas conversas com os Diretores do Setor de Ciências da Saúde para a criação do curso, na recepção dos primeiros calouros já como professor substituto, depois como professor efetivo e coordenador do curso, no reconhecimento pela Comissão de Avaliação do MEC, nas Provas do Enade (o curso alcançou nota máxima em todas), na filiação na World Federation of Occupational Therapists (WFOT), depois na expansão de 30 para 60 vagas e na criação de mais um curso noturno com a contratação de mais 18 professores, na elaboração do projeto de construção do novo prédio e na busca por financiamentos:

Foi tudo muito difícil, a conquista de cada vaga docente, de cada m2 e de cada equipamento. Nossa estrutura não estava ainda completamente integrada à estrutura de funcionamento da Universidade e tudo era um processo à parte (Mariotti, Curitiba, Entrevista, 2020).

Embora a adesão ao REUNI com a expansão de vagas tenha sofrido críticas, houve planejamento estratégico interinstitucional. De acordo com os cálculos de distribuição de vagas da UFPR, o curso de 30 vagas teria uma cota de oito vagas docentes para o quadro específico de professores terapeutas ocupacionais. Não chegaríamos a ter um Departamento com autonomia, verbas de duodécimo e independência, porque seriam necessários, no mínimo, 12 docentes para isso.

Estudos anteriores já haviam sido realizados pela ACTOEP, Conselho Regional de Fisioterapia e Terapia Ocupacional - 8 (CREFITO 8) e UFPR sobre qual seria o número de profissionais necessário para atender às necessidades do mercado da população do Estado do Paraná. Os resultados estimavam 3.500 profissionais. À época, tínhamos apenas 350 profissionais registrados no CREFITO 8:

A conta era simples: formando 30 profissionais ao ano, levaríamos 100 anos para formar 3.000. Se dobrássemos o número, ainda assim levaríamos 50 anos, e como tínhamos a possibilidade, quadruplicamos o número pensando que em 25 anos poderíamos atingir o número de profissionais necessários no estado para atender à população. Nesse tempo, a maioria dos profissionais formados inicialmente já estaria se aposentando, então teríamos um mercado sempre aberto (Mariotti, Curitiba, Entrevista, 2020).

Empreitadas para pleitear a abertura de outros cursos em outras regiões do estado, como na Universidade Estadual (UEL) em Londrina e na Universidade Latino Americana (UNILA) em Foz do Iguaçu, já haviam sido realizadas e as possibilidades eram remotas. Dessa forma, optou-se por um curso maior, com duas turmas.

Em 2005, o Professor começou a frequentar as atividades do doutorado em Medicina Interna e Ciências da Saúde. Concluiu o curso em 2009, progredindo para professor adjunto. Em 2009, foi criado o Departamento de Terapia Ocupacional e o Professor tornou-se o primeiro chefe de departamento.

Em 2011, passou a se dedicar mais à pesquisa, orientando a Iniciação Científica e coordenando os Projetos de Extensão e Pesquisa em saúde mental na UFPR.

Em 2017, tornou-se Professor Associado e coordenador da Comissão de Pós-Graduação. Nesse período, iniciou coorientação de trabalhos de mestrado e doutorado nos programas de Pós-Graduação em Psicologia e Infância e Adolescência. Em 2019, ingressou no Programa de Pós-Graduação em Educação como professor permanente, na linha de pesquisa Cognição, Aprendizagem e Desenvolvimento Humano. Em 2020, seus primeiros orientandos ingressaram no programa e em março de 2022 ocorreu a primeira defesa de dissertação orientada por ele.

Segundo Milton, a pós-graduação específica em terapia ocupacional é uma necessidade. Em 2008, criou um Grupo de Pesquisas em Terapia Ocupacional na UFPR. Os docentes envolvidos iniciaram orientações de Iniciação Científica e intensificaram o desenvolvimento de Projetos de Pesquisa e publicações.

Em 2017, esse grupo construiu um projeto de Mestrado, que foi apresentado ao Departamento de Terapia Ocupacional, ao Setor de Ciências da Saúde, à Pró-reitoria de Pesquisa e Pós-graduação e à Capes. Eram três itens avaliados, e em 2018 foi recebida a resposta com a aprovação em dois deles, sendo que os quesitos de produção científica e financiamento de pesquisas precisariam ser incrementados.

O Professor Milton e alguns de seus colegas de departamento decidiram ingressar em outros programas de pós-graduação, ao que inicialmente o Professor apresentava bastante resistência. Porém, ressaltou que precisavam aprender como conseguir financiamento e publicar mais e melhor. Em 2019, ingressou no Programa de Pós-Graduação em Educação, conceito 6 na Capes, e iniciou a orientação de estudantes de mestrado.

Suas atividades de pesquisa iniciaram-se desde a graduação, por ocasião do trabalho de conclusão de curso, com uma revisão de literatura e correlação com a prática em uma instituição de adolescentes institucionalizados. Na docência, inicialmente, suas pesquisas eram desenvolvidas basicamente em parceria com os estudantes de graduação em formato de TCC, com revisões narrativas de literatura.

Suas pesquisas formais ocorreram no Mestrado e no Doutorado e a partir daí, com as orientações de Iniciação Científica. Até o momento, foram publicados 20 artigos científicos, três capítulos de livros, um livro e 38 resumos de apresentações em congressos de sua autoria (Casagrande et al., 2015Casagrande, R. P., Mariotti, M. C., & Cardoso, M. M. (2015). Occupational Therapy contributions in the support and assistance to families of people with mental disorders. Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, 23(2), 427-437. http://dx.doi.org/10.4322/0104-4931.ctoAR0398.
http://dx.doi.org/10.4322/0104-4931.ctoA...
; Mariotti, 2020Mariotti, M. C. (2020).Atividades expressivas, criativas e artísticas: prática clínica, ensino-aprendizagem e pesquisa em Terapia Ocupacional.Porto Alegre: Editora Fi.; Uemura et al., 2015Uemura, L., Mariotti, M. C., & Palm, R. D. C. M. (2015). Estigma e transtorno mental: perspectiva do terapeuta ocupacional. Revista de Terapia Ocupacional da Universidade de São Paulo, 26(3), 309-316. http://dx.doi.org/10.11606/issn.2238-6149.v26i3p309-316.
http://dx.doi.org/10.11606/issn.2238-614...
).

Militância Política

A trajetória política do Professor Milton Mariotti foi marcada pelo investimento e crença de que o associativismo é fundamental para o desenvolvimento de uma profissão, do individual ao coletivo:

Acreditem também no poder do associativismo. Poucos conhecem esse poder, mas eu posso afirmar: ele existe e é grandioso. Tente experimentar. Garanto a você que quando conhecer seus benefícios não vai mais querer viver sem eles. Você vai crescer e se desenvolver junto com a profissão (Mariotti, Curitiba, Entrevista, 2020).

Desde o primeiro ano (1978) da faculdade, Milton já relatava certa inquietação e consciência de que sua participação ativa faria diferença no processo de crescimento e transformação da profissão. No Encontro Nacional de Estudantes de Reabilitação que participou pode perceber que se tratava de profissões a serem construídas. Observava o movimento e participação de suas professoras, Lilian Magalhães e Sandra Galheigo, que presidiram a Associação de Terapeutas Ocupacionais do Brasil (ATOB) durante seus anos de graduação, e de Irene de Aquino Villar no movimento de implantação do currículo mínimo representando a ATOB e a Associação Paulista de Terapeutas Ocupacionais (APTO). No segundo ano (1979) da universidade, elegeu-se para participar do centro acadêmico. Também participou de um grande movimento que buscou arrecadar fundos para a Presidente da ATOB participar da reunião da WFOT com o objetivo de filiar a ATOB a essa instituição.

Acompanhou o fechamento da APTO na década de 80 e participou de um grupo que estudou a reabertura dessa mesma associação. Ainda em 1986, fez parte do movimento que buscou a retomada da ATOB, que ficou desativada por alguns anos, ressurgindo como Associação Brasileira de Terapeutas Ocupacionais (ABRATO).

Em 1986, em Curitiba, liderou a criação da ACTOEP, da qual foi presidente por duas gestões. Engajou-se no movimento que provocou o desmembramento do CREFITO 3, que se instituiu como CREFITO 8, do qual foi membro do colegiado por três gestões. Também foi presidente do Sindicato de Fisioterapia e Terapia Ocupacional (SINFITO-PR), participou da Rede Nacional de Ensino em Terapia Ocupacional (RENETO) e foi delegado da ABRATO junto à WFOT por dois mandatos.

Na docência, o Professor Milton foi assíduo nos Congressos Brasileiros de Terapia Ocupacional (CBTO), participando ativamente desde a mobilização de profissionais e estudantes ao engajamento ético-político e social, como a divulgação de seus produtos do ensino, pesquisa e extensão. Durante sua representação da ABRATO junto à WFOT, discutia-se sobre os parâmetros curriculares e difundia-se a importância do credenciamento das IES brasileiras de terapia ocupacional.

Em 2002, pela primeira vez, apresentou um trabalho acadêmico, modalidade de pôster, no Congresso Mundial de Terapeutas Ocupacionais em Estocolmo (Suécia) sobre a utilização de atividades expressivas e artísticas em terapia ocupacional, resultado de sua dissertação de Mestrado (Mariotti, 2002Mariotti, M. C. (2002). Occupational therapy expressives activities in mental health. In 13th Congress da World Federation of Occupational Therapists. Stockholm: WFOT.). Em 2006, participou do Congresso Australiano com um pôster sobre a Educação em terapia ocupacional no Brasil (Mariotti, 2006Mariotti, M. C. (2006). Occupational therapy education in under developing countries: policies and pedagogical aspects. In14th Congress of the World Federation of Occupational Therapists. Sidney: WFOT.). Esteve ainda, em 2008, no Council Meeting realizado em Liubliana, na Eslovênia. Em 2009, participou do Congresso Argentino e Latino-americano de Terapia Ocupacional, onde apresentou os resultados do seu trabalho de Doutorado. Foi também um momento importante de aproximação com a realidade da América Latina (Mariotti, 2009Mariotti, M. C. (2009).Qualidade de vida na hemodiálise: impacto de um programa de terapia ocupacional(Tese de doutorado). Universidade Federal do Paraná, Curitiba.).

Fazer parte da construção de uma profissão não é fácil, nem rápido, especialmente quando ela ainda é desconhecida para muitos e em muitos lugares. Às vezes é cansativo e frustrante. Mas, como tudo, tem os dois lados na mesma moeda. Há muitas vantagens em ajudar a construir uma profissão. Os resultados podem demorar e geralmente são de médio e longo prazo, mas eles chegam. Eu pude ver isso se repetindo inúmeras vezes e sempre brincava que os Deuses da Terapia Ocupacional são poderosos... (Mariotti, Curitiba, Entrevista, 2020).

A seguir são destacados marcos históricos que refletem fatos e seu engajamento político na terapia ocupacional regionalmente, nacionalmente e internacionalmente (Tabela 1).

Tabela 1
Marcos históricos para o Prof. Milton Carlos Mariotti.

Algumas estratégias do coletivo de terapeutas ocupacionais que Milton destacou como notáveis: criação e manutenção das Associações Estaduais e Nacional, participação dos terapeutas ocupacionais no sistema Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional (COFFITO)/CREFITOS, expansão dos cursos de graduação pelo país, criação da Rede Nacional de Ensino e Pesquisa em Terapia Ocupacional (RENETO) e criação dos cursos de pós-graduação stricto sensu.

Milton fez uma análise de conjuntura da profissão e destacou desafios e necessidades. Para ele, o atual desafio da profissão é a criação das Associações Científicas de Especialidades para o aprofundamento científico, o estabelecimento da consistência da atuação profissional nas diferentes áreas junto à sociedade e a criação de consensos e práticas comuns baseadas em evidências. A ABRATO, Nacional e Estaduais, têm funcionado como associações de difusão do conhecimento e experiências profissionais. Segundo o Professor, o aprofundamento e a divulgação científica que associações de especialidades realizam são de extrema urgência para a profissão, e cita como exemplo o trabalho responsável realizado pela Associação dos Terapeutas Ocupacionais em Contextos Hospitalares (ATHO-SP). Outro desafio muito importante e necessário para o fortalecimento da profissão apontado por Milton é o desmembramento do Sistema COFFITO/CREFITTOS e a criação de um conselho legislador e fiscalizador específico para a terapia ocupacional.

Além disso, ele apontou ser de grande importância o aumento de programas de pós-graduação stricto sensu cujos produtos de pesquisa resultem na criação da área de terapia ocupacional junto à CAPES, o que possibilitaria maior autonomia e fomento a pesquisas.

Considerações Finais

O registro da narrativa do Professor Milton é o resultado deste estudo, e constitui um documento para terapeutas ocupacionais compreenderem o protagonismo no ensino, pesquisa e extensão, bem como reconhecerem as possibilidades do ativismo profissional a partir de sua história na terapia ocupacional.

Suas contribuições para a terapia ocupacional são destaques e referências em narrativas de todas as gerações de terapeutas ocupacionais no Estado do Paraná. Sua jornada de trabalho, mesmo após a aposentadoria, prossegue na pesquisa e incentivo ao desenvolvimento da profissão de terapia ocupacional.

Apêndice Roteiro de entrevista semiestruturada.

1. Como foi o processo de escolha para fazer o curso de terapia ocupacional e a vivência durante a graduação?

2. O que movimentou e orientou a sua busca para a pós-graduação?

3. O que você relataria sobre a sua experiência nos Cursos de Mestrado e Doutorado (local, processo seletivo, projeto, referencial teórico, etc.)?

4. Cite pessoas que lhe inspiraram durante a sua trajetória de formação acadêmica.

5. Você teve alguma experiência laboral antes ou durante a graduação?

6. Sobre o seu primeiro emprego como terapeuta ocupacional, quais as suas principais impressões relativamente à integração teórico prática?

7. Quais foram as etapas/lugares/serviços e desafios de sua atuação como TO no Paraná?

8. Cite pessoas que lhe inspiraram durante a sua trajetória profissional.

9. Você tinha planos de ser professor? Como foi o processo de decisão de aceitar/concorrer para a sua primeira vaga na docência?

10. Como foi compor o primeiro curso de TO no Paraná? Quais os desafios enfrentados?

11. Você participou da implantação do Curso de TO da UFPR. Como foi esse processo?

12. Conte sua trajetória acadêmica nessa instituição.

13. Como está sendo o processo de construção de pós-graduação stricto sensu no DTO-UFPR?

14. Quando iniciou suas atividades de pesquisa?

15. Qual objeto de estudo direcionou sua carreira de pesquisador?

16. Cite pessoas que lhe inspiraram durante a sua trajetória na academia.

17. Na sua graduação, o que chamava sua atenção e, desde então, você já participava da militância estudantil pela categoria?

18. Quais as experiências da militância na vida universitária na TO?

19. Algum evento/pessoas em sua formação profissional provocou/acendeu/inspirou a liderança de grupos/militância na vida universitária.

20. Como aconteceu seu engajamento na representação profissional?

21. Como TO, como aconteceu a noção de categoria profissional diferenciada para o Milton na TO em Curitiba, no Estado do Paraná, no Brasil, na América Latina e no mundial.

22. Com relação a sua participação internacional, quais momentos marcantes da sua vida você destacaria (publicações internacionais, WFOT, congressos, etc.)? Apresente referências que subsidiem a sua fala, caso hajam.

23. Como organizou o tempo para representar a profissão? Além do tempo, de que outros investimentos um profissional que se dispõe a representar o coletivo necessita?

24. Traçando uma linha do tempo de sua formação até os dias de hoje, quais foram os acontecimentos marcantes relacionados aos aspectos éticos e políticos na TO em Curitiba, no Estado do Paraná, no Brasil e no mundo

25. Que estratégias do coletivo de TOs militantes foram notáveis para você?

26. Olhando o atual cenário político de TOs, quais os desafios?

27. Que desafios éticos políticos (associativismo, desmembramento, participação, mobilização do coletivo) na TO na UFPR, no Estado do Paraná, no Brasil e no mundo você identifica?

28. Descreva suas qualidades e papeis políticos na TO no Estado do Paraná.

29. Quais foram, ao longo de sua trajetória, os seus referenciais teórico-práticos? Cite as referências completas e justifique a sua escolha pelas mesmas.

30. Atividade ou Ocupação, ou outra opção?

31. Como você vê a TO hoje e quando se formou/iniciou sua carreira profissional?

32. Se fosse possível voltar para um lugar/um posicionamento, qual seria?

33. Qual a contribuição mais significativa que você acredita ter deixado para a profissão no Brasil até o momento?

34. Deixe uma mensagem inspiradora para os que estão vindo.

  • 1
    Primeira coordenadora do curso de Terapia Ocupacional da Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas).
  • Como citar: Mariotti, M. C., Simonelli, A. P., Cruz, D. M. C., Fedeger, A. M., & Macedo, M. (2023). Documentando histórias: a carreira profissional de Milton Carlos Mariotti a partir do método da história de vida. Cadernos Brasileiros de Terapia Ocupacional, 31, e3343. https://doi.org/10.1590/2526-8910.ctoAO256333431

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Editado por

Editora de seção

Profa. Dra. Ana Paula Serrata Malfitano

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Mar 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    04 Jun 2022
  • Revisado
    06 Jun 2022
  • Revisado
    11 Jul 2022
  • Aceito
    28 Nov 2022
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