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A Formação docente em Geografia e a perspectiva de formação continuada

Resumo

A formação docente não é algo instantâneo, mas algo em contínua construção. Neste contexto, o presente artigo analisa a relação entre formação e prática docente no chão da escola, diante das dificuldades enfrentadas e da importância da educação continuada no processo de ensino e aprendizagem. Para isso, foram feitas leituras bibliográficas visando construir previa noção sobre a importância da educação continuada; posteriormente foi visualizada a experiência docente na Escola Municipal Professora Maria do Carmo Moura; e por fim, foi pensado a construção de um projeto com impacto social, intitulado “Você tem fome do quê?”. Esse possibilitou interação professor-alunos, dando oportunidade de os alunos externarem suas carências e debaterem seus problemas na comunidade escolar, considerando possíveis causas e soluções.

Palavras-chave
Educação continuada; formação docente; escola; aluno; professor

Abstract

The teacher training is not something instantaneous, but something in continuous construction. In this context, this article analyzes the relationship between training and teaching practice on the school floor, given the difficulties faced and the importance of continuing education in the teaching and learning process. For this, bibliographical readings were made in order to build a previous notion about the importance of continuing education; later, the teaching experience at the Municipal School Professora Maria do Carmo Moura was visualized; and finally, the construction of a project with social impact, entitled “What are you hungry for?” was considered. This enabled teacher-student interaction, giving students the opportunity to express their needs and discuss their problems in the school community, considering possible causes and solutions.

Keywords:
Continuing education; teacher training; school; student; Teacher

Resumen

La formación docente no es algo instantáneo, sino algo en continua construcción. En este contexto, este artículo analiza la relación entre la formación y la práctica docente en el piso escolar, dadas las dificultades enfrentadas y la importancia de la formación continua en el proceso de enseñanza y aprendizaje. Para ello se realizaron lecturas bibliográficas con el fin de construir una noción previa sobre la importancia de la educación continua; luego, se visualizó la experiencia docente en la Escuela Municipal Professora Maria do Carmo Moura; y finalmente, se planteó la construcción de un proyecto con impacto social, titulado “¿De qué tienes hambre?”. Esto permitió la interacción docente-estudiante, dando a los estudiantes la oportunidad de expresar sus necesidades y discutir sus problemas en la comunidad escolar, considerando posibles causas y soluciones.

Palabras clave:
Educación continua; formación docente; escuela; estudiante; docente

Introdução

A formação docente não é algo instantâneo, mas sim algo continuo que se constrói conforme associação de teoria e prática. Nesse sentido, a continuação do aprender dos professores consiste no avanço dos seus estudos após a formação, isto é, significa a prossecução de novos ensinamentos e aprendizados para a condição do trabalho. Dessa forma, o profissional da educação deve se dedicar a continuar aprendendo novas formas e técnicas de ensino para que possam atender às necessidades individuais de cada aluno, adaptando-se as mudanças da dinâmica educacional que ocorrem constantemente. Isso porque, problemas ocorrem no âmbito educacional e a existência de profissionais preparados para enfrenta-los condicionam aparatos positivos na promoção do processo de ensino e aprendizagem dos alunos.

É perceptível que o ensino básico sempre foi cheio de percalços, de déficits, etc., resultando em perdas na aprendizagem de diversos alunos na rede pública, perdas essas que, são infelizmente levadas para o decorrer da vida desses alunos.

Esses déficits são vistos de forma progressiva e persistente também no ensino superior, o qual leva muitos estudantes a sentirem bastante dificuldade em executar reflexões, trabalhos analíticos, responder exercícios e provas, entre outras. Diante disso, surge inquietações, como: Será que as pendências do ensino básico são preenchidas no ensino superior? Será que as formações docentes e continuadas contemplam lacunas existentes na vivência profissional do docente?

Nessa perspectiva, acredita-se que algumas das pendências existentes na formação da Educação Básica possam ser amenizadas na formação superior. Todavia, sabe-se que a carga formativa da vida escolar se faz muito importante para uma boa formação superior, posto que as deficiências nessa “carga”, levam discentes em formação, por vezes, a não conseguirem os resultados esperados, sucedendo-se então as lacunas de forma contínua para as salas de aula, ou seja, vai se repassando os déficits aos futuros alunos.

A referida condição deficitária pode ser amenizada com a formação continuada, sobretudo em Geografia, por se tratar de uma ciência em movimento e com reflexos socioespaciais perceptivos e de fácil visualização. As ações do homem no espaço ao construí-lo, conforme imperativos subjetivos e coletivos, precisam ser compreendidos e transmitidos enquanto conhecimento, a fim de que os alunos possam avaliar seu espaço de vida e da humanidade. Deste modo, impõe-se o processo formativo como uma perspectiva de (re)construção de conhecimentos e de formas geradoras de aprendizagens atenuantes das lacunas existentes na educação, seja na Educação Básica, seja de Nível Superior.

Assim, esse artigo dialogará sobre o processo formativo docente e necessidade de formação continuada, partindo dos preceitos definidos pelo Projeto Licenciados/as na Escola (PROLICE/UFS), como condição para a integração do ensino superior às demandas da Educação Básica.

O referido trabalho resulta da análise empírico-analítica vivenciada pelos bolsistas do Prolice na Escola Municipal Professora Maria do Carmo Moura, localizada no povoado Terra Dura, município de Itabaiana/SE (mapa 1). O mesmo foi construído mediante tarefas semanais de revisão bibliográfica, discussões de textos e construção de resenhas, que condicionou aprendizados para os futuros professores de Geografia na lida com a sala de aula.

Mapa 1
Localização da Escola Municipal Professora Maria Moura-Itabaiana - Sergipe

Por essa perspectiva, o artigo se apresenta subdividido nos seguintes itens: A formação contínua: necessidade constate ao docente em sala de aula”; seguido de Formação Continuada durante a graduação com o Projeto Licenciados/as na Escola (Prolice); Considerações Finais e Referências Bibliográficas.

A formação contínua: necessidade constate ao docente em sala de aula

O ser professor envolve vários instrumentos a serem usados no decorrer da construção dessa profissão, e considerando o professor de Geografia, essa construção se torna ainda mais difícil. Nas escolas públicas se percebe o uso do termo “decoreba”, principalmente nessa disciplina, e o quão desanimador é ver professores/colegas de trabalho com essa mentalidade. Esse fato é designado por Paulo Freire como o ensino bancário, o qual o docente explana os assuntos de forma “robótica” e os alunos devem escutar, decorar e não se questionar, com isso, realizase provas para poderem tirar acima da média ou notas que não façam eles reprovarem, aprendendo ou não o assunto, “o importante é passar de série”. De acordo com Paulo Freire (1987FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. 17ª ed. Rio de Janeiro: Ed. Paz e Terra, 1987., p. 37), “o educador é o que educa; os educandos, os que são educados; O educador é o que sabe; os educandos, os que não sabem”. Deste modo, ser professor é ser um educador de fato, fazendo os discentes aprenderem a ler e compreender seu espaço de vida.

No ensino superior os futuros professores são ensinados a não praticarem esse ensino bancário, pois o que se preza, é o ensino em que haja parceria dos dois sujeitos, professor e aluno/aluna e professor, ou seja, são trocas de saberes. Conforme Paulo Freire (1987)FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. 17ª ed. Rio de Janeiro: Ed. Paz e Terra, 1987., o professor não é o único a deter o conhecimento, cada aluno carrega consigo bagagens de conhecimentos adquiridos tanto na sala de aula, quanto fora da mesma. O professor é ensinado a ser um cidadão crítico, sendo preciso ensinar os seus alunos a serem críticos também.

Nos estágios da faculdade ou até em programas que existem para os licenciandos “enfrentarem” uma sala de aula, mostram como os acadêmicos em formação possuem domínio do conhecimento, tem noção de comportamento e mais ainda, percepção da melhor forma de trabalhar o ensinar, com foco na reflexão crítica. Por isso, é de suma importância que os discentes antes de se formarem possam adentrar uma sala de aula da Educação Básica, com foco no sentir a realidade que apreciarão enquanto professores, adquirindo experiências e mais aprendizados, pois, é ensinando que se aprende também.

Entretanto, ver-se que quando o futuro professor de Geografia se depara com a realidade escolar, o impacto muitas vezes é grande, pois muito do que se aprende de forma teórica nos bancos das academias, na prática do ensino básico é dificultoso de ser implementado, visto que, a teoria em alguns casos, difere da realidade a ser enfrentada. Nesse quadro, tentar fazer a diferença para que o ensinar tenha ligação com a realidade tanto dos docentes quanto dos discentes é o desafio. O referencial deve correlacionar os assuntos a serem estudados com problemas enfrentados pelos alunos, a partir de um problema que habita o bairro, o povoado, a cidade em que eles moram. Problemas esses que acreditavam não ter nenhuma aproximação com os assuntos da Geografia, mas que faz parte de forma direta, ou seja, não foge da realidade espacial das pessoas. É relacionando teoria e prática que o aprender flui e pode se tornar mais fácil e prazeroso, um aprender com vivências, em que os próprios alunos expressem suas realidades, tenham reflexão da vivência e construam o senso crítico e passem a se questionar sobre o porquê de certas situações acontecerem de tais formas.

Porém, como explanado, demarca-se que a teoria do Ensino Superior difere da prática na Educação Básica, em virtude do distanciamento de instrumentos normativos, das realidades vivenciadas e dos objetivos almejados. Frequentemente, se percebe que são poucos os programas das universidades que se interligam com as escolas públicas, algo que deveria ser mais constante.

Nesta constante, ser professor é ter domínio da sala de aula, é ensinar, e também fazer ciência. Preza-se que da mesma forma que as academias condicionam pesquisas em diversas perspectivas socioespaciais de cunho geográfico; o ensino também possa ser visualizado como um campo forte do fazer científico, pois sabe-se que professor também é pesquisador. Apesar disso, considera-se que o professor precisa se adequar ao ensinar, adequação essa que já deveria ser orientada desde o início da graduação, a partir de encaminhamentos de pesquisas relacionadas aos problemas encontrados nas escolas públicas e na educação.

Os discentes, em formação, possuindo o acesso pleno a escola, vão se familiarizando a esse meio e construindo planejamento, segurança e noção dos empecilhos que poderão encontrar. Nesse processo formativo, o mestre universitário verá quais dificuldades esses futuros professores possuem e, o mesmo terá como ajudar a suprir deficiências aparentes. Além disso, com a vivência na escola, esses futuros docentes podem pensar em soluções para melhorias nas condições de aprendizagem dos alunos. Fatos que podem ser apresentados mediante trabalhos científicos, pois educar também é ciência vivida todos os dias. Além disso, a exposição desses trabalhos pode demonstrar, via relatos, formas de solucionar problemas comumente vivido pelos professores.

Diante disso, a consubstanciação do processo formativo, leva o professor a ser pesquisador de sua área, pois assinala a necessidade de sempre estar se renovando em termos de conhecimentos. Em Geografia a renovação de conhecimento e vivências requer foco constante, pois essa é uma ciência que possui um leque de assuntos cotidianos, que embasam a relação da sociedade com a natureza constante. Após formado, esse professor é convidado a fazer a diferença em seus saberes, buscando novas especializações em prol de vencer os déficits e lacunas que ficaram do Ensino Superior para a lida com a Educação Básica.

O professor acrescentará conhecimentos lendo autores que ele não teve acesso na graduação, assistindo vídeos nos meios digitais, participando de palestras on-line ou presencias, se especializando em cursos, fazendo algumas pós, mestrado ou doutorado, entre outras possibilidades encontradas. Todos esses meios compactuarão para que os mesmos agreguem mais conhecimentos e possam transmiti-los de forma didática e correlacionado com o dia-a-dia dos seus alunos, fazendo com que estes aprendam a serem cidadãos críticos. Deste modo, o referido professor poderá fazer atividades que ajudem seus alunos a perceberem que a teoria não ocorre em separado da prática, fazendo-se necessário relaciona-las de forma correta.

Contudo, a situação da educação e dos professores estão ainda mais precárias, motivadas pelas mudanças institucionalizadas, como com a imposição da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), que ocasionou a perda de autonomia dos docentes sobre o que e como ensinar, privando-os da liberdade de escolha e de posicionamento diante das conjunturas impostas. As modificações implementadas dificultam a atividade prática do professor em transpor os aprendizados adquiridos na graduação e na sua formação continuada, ocasionando assim, um bloqueio na explanação dos seus conhecimentos.

Neste contexto, soma-se também como empecilho a liberdade do conhecimento, as reformulações do livro didático, sobretudo do ensino médio, cuja geografia foi integrada a outras disciplinas como Ciências Humanas. Esse fato ocasiona perdas de disciplinas, de conteúdos e até evasão escolar de forma corriqueira para muitos desses alunos.

As alterações trazidas pela BNCC condicionaram direção ao que se ensinar, mas sendo meramente tecnicista, isto é, voltada ao preparo de alunos para o mundo do trabalho. As referidas condições fazem com que esses estudantes não se tornem sujeitos pensantes e críticos, mas sim, sujeitos alienados, vez que podem escolher quais disciplinas cursar, sem uma noção real do que desejam vivenciar e sendo obrigados a definirem um direcionamento. Esse aspecto é referendado na Lei nº13.415, que coloca a

[...] eliminação da obrigatoriedade de determinados componentes curriculares, atualmente presentes nas matrizes em prática no ensino público brasileiro. São eles Educação Física, Artes, Sociologia e Filosofia, os quais poderão, de acordo com o §2 do artigo 35-A da Lei, fazer-se presentes obrigatoriamente nos currículos escolares, todavia, apenas sob a forma de estudos e práticas. O segundo refere-se ao §3 do mesmo artigo, o qual estipula como obrigatórios durante os três anos do Ensino Médio, e apenas eles, os componentes curriculares Língua Portuguesa e Matemática, seja como parte da formação geral, seja sob a forma de itinerário formativo. (FERRETTI, 2018FERRETTI, J. C. A reforma do Ensino Médio e sua questionável concepção de qualidade da educação. Ensino de Humanidades. São Paulo, maio-agosto, 2018. Disponível em: https://www.scielo.br/j/ea/a/RKF694QXnBFGgJ78s8Pmp5x/?format=pdf⟨=pt. Acesso em: 25 jun. 2022.
https://www.scielo.br/j/ea/a/RKF694QXnBF...
, p.5-6).

Mas ainda, nessa reforma foi instituída as escolas de ensino integral, aumentando também a carga horária das aulas para os discentes; ao passo que para o professor, a jornada de trabalho ficou ainda mais intensificada, levando a questionamentos: faz necessário à formação continuada de professores? Será que o professor tem autonomia, apoio, etc., para realiza-la? O ser professor tem uma demanda bastante exaustiva, com salários precários e sempre perdendo seus direitos. Isso mostra que os mesmos não possuem apoio do Estado como deveria ser, no sentido de flexibilizar horas para formação continuada, com criações de projetos, cursos e especializações em universidades de forma gratuita.

Formação continuada durante a graduação com o projeto licenciados/as na escola (PROLICE)

O Projeto Licenciandos/as na Escola (PROLICE), vinculado a Pró-Reitora de Graduação da Universidade Federal de Sergipe (UFS), condicionou novas vivências aos autores como bolsistas no chão da escola, a partir da sala de aula, sendo esses futuros professores. O programa tem estabelecido conexão entre o Ensino Superior e a Educação Básica, via estágios prolongados no acompanhamento docente, no desenvolvimento de atividades e na troca de experiências e conhecimentos. Diante disso, o Programa tem servido de alicerce para amadurecimento de discentes em estágios formativos e demonstrado o quão importante se faz a formação continuada como processo de libertação e de estabelecimento de uma escola plural, em que perdure o apoio a autonomia, diversidade e ações integrativas (KATUTA, 2019KATUTA, A. M. Mercantilização e Financeirização da Educação Brasileira: A proposta neoliberal, o Apagão Pedagógico Gobal (APG) e as R-existências. Revista Geografia. V. 44, nº 01, 2019.).

Desde o dia 1 de novembro de 2021, os autores iniciaram o Projeto junto ao curso de Geografia, visando desenvolver o título “GEOGRAFIA: Professor em formação para uma pedagogia da práxis”. Esse título fora desenvolvido na Escola Municipal Professora Maria do Carmo Moura, situada no povoado Terra Dura, município de Itabaiana/SE (foto 1).

Foto 1
Frente da Escola Municipal Professora Maria do Carmo Moura- Itabaiana

A escola foi criada em 1946, contudo só reconhecida com espaço próprio para a execução de suas atividades em 1950. Inicialmente agregava o nome de Escola Municipal Terra Dura, mudando posteriormente para o nome de Professora Maria do Carmo Moura em homenagem a primeira professora do povoado. Em 1998, a escola cresce na oferta de matrículas, com a inclusão da Educação Infantil e da Educação de Jovens e Adultos (EJA).

No momento atual, a escola conta com 15 professores na oferta da Educação Infantil, Ensino Fundamental e Educação de Jovens e Adultos (EJA). Desses, cinco são professores do Ensino Fundamental, trabalhando inglês, história, pedagogia, e também Geografia - este último em contrato temporário. Mas ainda, alguns desses professores, possuem formações de outros cursos, a exemplo de um professor que é pedagogo, no entanto, tem pós-graduação em História e uma que possui Magistério e é licenciada em História. Além disso, a escola conta com três funcionários administrativos, que dão suporte a direção na organização da unidade.

Em termos de espaço físico, na escola existem cinco salas, além de uma sala que é considerada biblioteca, a qual guarda livros literários; banheiros; almoxarifado; e um laboratório de informática, utilizado como secretaria, como sala de professores e como espaço de acolhimento da comunidade. Outrossim, as salas de aulas apresentam tamanhos razoáveis, comportando alunos de forma que não fiquem amontoados, com carteiras conservadas, preocupada com o bem-estar dos alunos, e com armários para recolhimento de materiais dos mesmos.

O ambiente escolar é acessível e limpo, com perspectiva de futura reforma para melhor atender as necessidades dos alunos, dos funcionários e da comunidade. Outros aspectos observados na escola em termos geográficos, é a posse de recursos pedagógicos como o globo terrestre, mapas, livros didáticos e livros literários, como também, recursos audiovisuais, do tipo aparelhos de som e tv, utilizados para desenvolvimento de atividades lúdicas, entre outros recursos. Apesar do ambiente acolhedor, a Escola ainda necessita de uma quadra, que está prometida pela Gestão Pública no sentido de sua construção.

A Escola tem uma função importante na sociedade do povoado Terra Dura, pois ela atua diretamente na formação discente e no acolhimento à comunidade, transmitindo conhecimentos sobre casos que atingem a comunidade, como o autismo e o Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) entre os jovens matriculados. A escola promove palestras, cria projetos lúdicos de interação social e promoção da saúde comunitária, com o apoio de outras instituições. Outros feitos, é a definição de programações para datas comemorativas importantes no país, como o dia da mulher, da água, do livro, das mães, dos pais, do estudante, aniversário da cidade e o São João com quadrilhas; além de mobilizar ações para trabalhos de campo, como visitação à comunidade indígena em Porto da Folha; agem também, na criação de amostra de ciências, na participação de jogos internos municipais, na definição de jogos matemáticos, entre outros. Ademais, a instituição é muito importante, tanto para alunos e funcionários, como também para a comunidade, pois os moradores que habitam no povoado, muitas vezes precisam desse espaço escolar para eventos e reuniões comunitárias, se definindo como um espaço de construção de conhecimento, de cidadania e de lazer democráticos.

Partindo da condição espacial, em que a relação homem-natureza modifica o mundo, focalizou-se a relação professor-aluno, a fim de promover a consciência dos discentes diante da condição de seu espaço e das imposições do capital global na vida da sociedade. Essa tomada de consciência a respeito do que vem sendo imposto a sociedade global adveio da vivência como bolsistas do Projeto Licenciandos/as na Escola e da própria retorica profissional de quem faz a escola - a condição de necessidades da comunidade escolar. Para isso, desenvolveu-se o projeto: “Você tem fome do quê?”, considerando que “fomes” se criam e se desenvolvem, no sentido de ter fome alimentar, tecnológica, por produto, cultura e lazer.

Neste contexto, os licenciandos analisaram os tipos de “fomes” sociais interpostos no espaço de construção do conhecimento, no chão da escola, juntamente a discentes que vivenciam as contradições da lógica capitalista nas suas demandas do ter, que se faz salutar no sentido de construção do conhecimento geográfico amplo e refletor das ilusões culturais do sistema do capital. Esse fora desenvolvido num viés prático-analítico, com viés quali-quantitativo, conjugado a instrumentos icnográficos para se alcançar a maior compreensão possível do que foi trabalhado. Para esse desenvolvimento, todos os alunos do Ensino Fundamental Maior, foram organizados no pátio da escola, como forma de dialogar com os prolicianos na construção de saberes sobre as diversas “fomes” trabalhadas pela comunidade local

A partir dessa ação, construiu-se junto aos discentes da escola, uma dinâmica: foram coladas árvores feitas de papelão e tnt nas paredes da unidade, com vários papéis cortados em formato de maçãs, nos quais os alunos foram convidados a manifestarem seus desejos, isto é, vontades sobre coisas as quais tinham anseio de obter. Por essa conexão com eles, foi possível constatar a carências que a comunidade apresenta . Sequencialmente foi possível refletir assuntos pertinentes ao tema central, sendo eles: fome por direito social, fome de lazer, percepção da fome, o sentido do consumismo e a fome real: desigualdade e miséria - como resolvê-la?

A junção das problemáticas possibilitaram dialogar sobre direitos os quais estão garantidos perante a Constituição Federal, mas que na realidade, estão bem distantes de execução e garantias, como, por exemplo: moradia, alimentação e lazer. Os temas trabalhados com os alunos levam a reflexões ainda mais amplas, como e por que se vive tantas desigualdades e carências sociais? Além disso, possibilitou reflexões na escala do local, como: por que não se tem um local adequado para diversão? Por que não se tem quadra na escola? Por que nem todos tem uma alimentação adequada? Por que nem todos tem uma moradia digna? Por que existe tanta desigualdade em termos de distribuição de recursos/riquezas entre as pessoas?

Nesse contexto, o consumismo é mostrado como um grande vilão, pois de certa forma, está ligado a desigualdade social, em que nem todos têm a possibilidade de acompanhar padrões que a mídia indica ser o melhor, isso sempre escondendo os problemas ligados as referidas desigualdades e aos que envolvem a saúde do planeta, haja vista o caráter destrutivo trazido pelo alto consumo humano. Na metodologia da árvore dos sonhos (foto 2), visualizou-se que inúmeros alunos têm “fomes de ter” artigos impostos pela globalização, ao tempo que, esses demonstraram ter vontades simbólicas, no sentido de serem úteis no auxílio financeiro em casa, de poderem contribuir para a mudança de vida de suas famílias.

Foto 2
Árvores e os frutos com sonhos, Pátio da Esocla M. P. Maria do Carmo Moura

O retrato traçado por essa árvore, remete o como a mundialização tem sido um processo que está impregnado na sociedade mundial, e como os valores sociais ficaram a quem à lógica do ter, apesar de tantos ainda referendarem, logicamente que precisamos de mudanças de base, para ter-se uma sociedade mais justa. Assim, as reflexões trazidas pelo projeto mostram como a mundialização do capital e o neoliberalismo se apossam da ideia do coletivo em prol de interesses individuas, subjugando o direito do outro, mediante relações de trabalho (HARVEY, 2014HARVEY, D. O Neoliberalismo: história e implicações. São Paulo: Edições Loyola, 2014.).

Por essa vivência, assim como por toda experiência adquirida em sala de aula, respalda-se o compartilhamento e troca de saberes entre os Prolicianos e a comunidade escolar, alunos, professores e consequentemente toda comunidade. A vivência e os métodos utilizados satisfizeram um primeiro momento de reflexão sobre o espaço dos alunos e sua função na sociedade, assim como, respaldou-se o reconhecimento dos fenômenos vividos no espaço. Deste modo, estudar o espaço perpassou conhecer a própria vivência, conforme referenda Callai (2005CALLAI, H. C. Aprendendo a ler o mundo: a geografia nos anos iniciais do ensino fundamental. Cadernos Cedes, Campinas, vol. 25, n. 66, p. 227-247, maio/ago. 2005. Disponível em <http://www.cedes.unicamp.br>. Acessado em 20 set. 2022.
http://www.cedes.unicamp.br...
, p.235), “[...]olhando em volta, percebendo o que existe, sabendo analisar as paisagens como o momento instantâneo de uma história que vai acontecendo”.

Essas atividades deram possibilidade de a partir de uma pequena escala geográfica, no recorte em que estão inseridos, pensar sobre as causas dos problemas e possíveis soluções, assim como, definir métodos de lutas frente a necessidade de serem reconhecidos como cidadãos do mundo. Isso porque, só reconhecendo a sua própria realidade histórica, os jovens e adultos poderão transformar o mundo em que vivem.

Sendo assim, o chão da escola se faz essencial no intuito de pensar quem é o ser o mundo, pois é a partir da educação que se conseguirá alcançar melhorias sociais de forma coletiva. Neste contexto, Freire demonstra que a escola é o local privilegiado para a construção da liberdade e da compreensão da realidade vivida, pois

[...] é preciso que a educação esteja - em seu conteúdo, em seus programas e em seus métodos - adaptada ao fim que se persegue: permitir ao homem chegar a ser sujeito, construir-se como pessoa, transformar o mundo, estabelecer com os outros homens relações de reciprocidade, fazer a cultura e a história [...] uma educação que liberte, que não adapte, domestique ou subjugue. (FREIRE, 2006FREIRE, P. Pedagogia da esperança. 13ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2006., p. 45).

O PROLICE, enquanto programa institucional da Universidade Federal de Sergipe tem contribuído para a formação discente e demonstrado o quanto se faz importante a formação continuada para a execução da atividade profissional. O programa proporciona a ligação entre o Ensino Superior e a Educação Básica, ao estabelecer vivencia presencial no âmbito escolar, condicionando análise de suas adversidades e suas realizações de forma prática.

Considerações Finais

A formação continuada se faz importante, ao docente e aos acadêmicos no desenvolvimento de seu processo de ensino-aprendizagem, pois promove para ambos atores melhorias no âmbito educacional. Aos docentes possibilitam um leque maior de possibilidades de ensino, provenientes de uma formação contínua e que se adapta aos mais diversos problemas enfrentados no chão da sala de aula, sendo um exemplo, a necessidade do uso de novas tecnologias ou até mesmo, de possíveis saídas na falta das mesmas. Por outro lado, para os acadêmicos, participantes do programa, foi um grande privilégio a participação nesse processo, pois ao vivenciarem a necessidade de execução do ensino-aprendizagem na escola, tornamse o público alvo para a formação, passando a ter um direcionamento específico e mais adaptativo a qualidade ou pelo menos, melhor, no sentido do que vem sendo demandado pela sociedade.

Os discentes/acadêmicos que trabalharam junto ao Prolice na escola Municipal Professora Maria do Carmo Moura, tiveram a chance de reconhecer um espaço escolar e de vivenciarem a realidade social de sala de aula em geografia juntamente a uma comunidade no interior do município de Itabaiana/SE. Nessa vivência, tiveram a condição de desenvolver o projeto intitulado “Você tem fome do quê?”. A proposta resultou em problemáticas que possivelmente, adentrou como “carências” presentes na comunidade escolar, condicionando a compreensão das dificuldades em que grande pare dos discentes da Educação Básica estão inseridos, assim como, favoreceu melhor formação nesse estágio de licenciandos, enquanto professores de geografia.

Portanto, a vivência, como licenciandos na escola, contribuiu como um alicerce na troca de experiências e saberes junto a equipe que gesta a escola e os docentes para a lida em sala de aula, ao tempo que contribuiu para o entendimento de problemas que rondam as famílias da comunidade e que afetam diretamente a aprendizagem dos alunos. A vivência realoca os formandos no sentido de serem mais ávidos para as necessidades reais de professores e alunos na execução de uma educação pública de qualidade e condutora de soluções para melhores transformações sociais.

Agradecimentos

À Pró-Reitoria de Assuntos Estudantis pela disposição de bolsa de Ensino junto ao PROLICE/Universidade Federal de Sergipe.

References

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    07 Jul 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    30 Mar 2023
  • Aceito
    30 Abr 2023
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