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Análise da dor e do cortisol livre em recém-nascidos em terapia intensiva com procedimentos terapêuticos

RESUMO

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS:

Os recém-nascidos de alto risco em unidade de terapia intensiva, são expostos a procedimentos dolorosos, repetitivos e prolongados que podem estar relacionados a alterações no desenvolvimento do cérebro e anomalias comportamentais. O objetivo deste estudo foi relacionar a dor e o cortisol livre de recém-nascidos prematuros, com procedimentos terapêuticos instituídos em terapia intensiva.

MÉTODOS:

Pesquisa quantitativa, descritiva, transversal, realizada com 32 recém-nascidos prematuros submetidos à punção venosa, que foram avaliados quanto à dor e estresse relacionado à ventilação assistida; sedativos, corticoide no pré-natal, tipo de punção venosa, local e número de tentativas.

RESULTADOS:

Recém-nascidos prematuros submetidos à ventilação invasiva apresentaram predomínio de dor moderada em 12 (37,5%) e aumento de cortisol em 14 (43,8%) deles. A punção venosa desencadeou dor moderada e intensa, 10 (31,3%) e em 17 (53,1) ocorreu aumento do nível de cortisol. Mais da metade ocorreu para passagem de cateter central de inserção periférica, de modo que 10 (43,8) tiveram dor moderada. Os resultados da investigação, sugerem que a exposição dos recém-nascidos a procedimentos invasivos é estressante, especialmente quando repetido várias vezes.

CONCLUSÃO:

A punção venosa repetida associada a procedimentos terapêuticos intensificou a dor e alterou o cortisol, o que implica em estresse ao recém-nascido prematuro.

Descritores:
Enfermagem; Estresse fisiológico; Mensuração da dor; Recém-nascido prematuro; Unidades de terapia intensiva

ABSTRACT

BACKGROUND AND OBJECTIVES:

Newborns at high risk in the intensive care unit are exposed to painful, repetitive and prolonged procedures that may be related to changes in brain development and behavioral abnormalities. The objective of this study was to relate pain and free cortisol of premature newborns undergoing therapeutic procedures in intensive care units.

METHODS:

A quantitative, descriptive, cross-sectional study conducted with 32 premature newborns submitted to venipuncture, who were evaluated for pain and stress related to assisted ventilation; sedatives, prenatal corticoid, type of venipuncture, site, and the number of attempts.

RESULTS:

Preterm newborns undergoing invasive ventilation had a predominance of moderate pain in 12 (37.5%) and cortisol increase in 14 (43.8%) of them. Venipuncture triggered moderate and intense pain, 10 (31.3%), and in 17 (53.1) the cortisol levels increased. More than half was due to peripherally inserted central catheter placement, so that 10 (43.8) had moderate pain. The results of the research suggest that the exposure of newborns to invasive procedures is stressful, especially when repeated several times.

CONCLUSION:

Repeated venous puncture associated with therapeutic procedures intensified pain and altered cortisol, causing stress in premature newborns.

Keywords:
Intensive care unit; Nursing; Pain measurement; Physiological stress; Premature newborn

INTRODUÇÃO

O recém-nascido (RN) de alto risco em unidade de terapia intensiva neonatal (UTIN) é exposto a procedimentos dolorosos, eventos repetidos, prolongados, relacionados à deficiência de desenvolvimento do cérebro e anomalias comportamentais11 Jeong IS, Park SM, Lee JM, Choi YJ, Lee J. Perceptions on pain management among Korean nurses in neonatal intensive care units. Asian Nur Res. 2014;8(4):261-6..

A dor neonatal poderá desencadear o estresse. Além disso, o estresse causado pelo ambiente da UTIN pode provocar níveis plasmáticos mais elevados de cortisol do que uma cirurgia. O aumento das concentrações dos hormônios relacionados ao estresse em RN prematuros doentes; está associado ao maior risco de mortalidade22 Taddio A, Katz J. Pain, opioid tolerance and sensitisation to nociception in the neonate. Best Pract Res Clin Anaesthesiol. 2004;18(2):291-302.. Portanto, cabe aos enfermeiros o uso de medidas farmacológicas e não farmacológicas, no intuito de prevenir e reduzir a dor e o estresse neonatal.

Em uma investigação na Califórnia com 237 enfermeiros neonatais, 81% deles relataram o uso de instrumentos de avaliação da dor, 83% se sentiram confiantes com o uso de medidas farmacológicas, e 79% não farmacológicas33 Prevention and management of procedural pain in the neonate: An Update. Pediatrics. 2016;137(2):e20154271.. Os autores pontuaram que a gestão de dor foi correlacionada com treinamento e instrumentos adequados de avaliação da dor a partir de protocolos assistenciais.

O cortisol é um glicocorticoide que exerce efeitos fisiológicos sobre o metabolismo dos carboidratos, das proteínas e dos ácidos graxos e tem importante papel na resposta fisiológica ao estresse44 Hingre RV, Gross SJ, Hingre KS, Mayes DM, Richman RA. Adrenal steroidogenesis in very low birthweight preterm infants. J Clin Endocrinol Metab. 1994;78(2):266-70.,55 Gordon BA, Fletcher MA. Neonatology and pathophysiology management of the newborn. 15th ed. Philadelphia: Lippincott Wiliams and Wilkins; 1999..

O cortisol possui também efeitos de feedback negativo sobre o hipotálamo para reduzir a formação do hormônio liberador de corticotrofina, e sobre a hipófise anterior, diminuindo a formação do hormônio adrenocorticotrófico.

Por outro lado, o estresse tem um efeito fisiológico sobre a secreção de hormônio adrenocorticotrófico, desencadeando, em minutos, um aumento de até 20 vezes na secreção de cortisol66 Jett PL, Samuels MH, McDaniel PA, Benda GI, Lafranchi SH, Reynolds JW, et al. Variability of plasma cortisol levels in extremely low birth weight infants. J Clin Endocrinol Metab. 1997;82(9):2921-5..

Nesse sentido, uma pesquisa quantificou a gravidade dos estressores comuns para os prematuros77 Newnham CA, Inder TE, Milgrom J. Measuring preterm cumulative stressors within the NICU: The Neonatal Infant Stressor Scale. Early Hum Dev. 2009;85(9):549-55.. Participaram da pesquisa 17 médicos e 130 enfermeiros que atuam em UTIN, e classificaram a gravidade do estresse percebido de 44 eventos agudos (acesso venoso periférico, acesso arterial periférico, acesso venoso central, ventilação, nutrição, procedimentos médicos, cirurgia, radiologia e outros) e de 24 condições de vida, caracterizadas como crônicas (recebimento de oxigênio intranasal devido à displasia broncopulmonar e infecção repetidas), em prematuros com idade gestacional de 28, 28 a 32 e a partir de 32 semanas. Médicos e enfermeiros perceberam que quase todos os eventos são estressantes para os RN em algum grau e tornam-se igualmente estressante ao longo das idades.

Desse modo, o objetivo deste artigo foi relacionar a dor e o cortisol livre de RN prematuros com procedimentos terapêuticos instituídos em UTIN, com o intuito de avaliar a ocorrência de estresse nesses RN.

MÉTODOS

Pesquisa de abordagem quantitativa, descritiva, transversal, realizada em uma UTIN de uma Instituição hospitalar filantrópica, porte IV, do noroeste do Estado do Rio Grande do Sul. A referida unidade disponibiliza oito leitos neonatais do Sistema Único de Saúde (SUS), com uma equipe multiprofissional, composta por médicos pediatras, enfermeiros, técnicos de enfermagem, fisioterapeutas e fonoaudióloga.

O cálculo da amostra foi por conveniência. Participaram do estudo 32 RN prematuros internados na UTIN no período de março a outubro de 2016 e que atenderam aos critérios de inclusão elencados: ser prematuro, não ter sido submetido a outro procedimento doloroso uma hora antes da punção venosa e o responsável assinar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

A coleta dos dados ocorreu por meio de um protocolo de pesquisa composto por um formulário com dados de identificação, sociodemográficos e clínicos dos RN, obtidos diretamente dos seus prontuários. O respectivo formulário comtempla as variáveis: ventilação assistida; sedativos, corticoide no pré-natal, tipo de punção venosa, local e número de tentativas. A avaliação da dor foi realizada com a Neonatal Infant Pain Scale (NIPS), e o cortisol, com amostras de diurese dos RN.

As amostras de diurese dos RN participantes da pesquisa foram obtidas por meio de coletor ou diretamente da sonda vesical, após serem submetidos à punção venosa para acesso periférico ou para inserção de cateter central de inserção periférica (PICC). A primeira amostra de diurese foi obtida após a exposição do RN ao referido procedimento. As amostras de urina foram mantidas sem conservante, em refrigerador, à temperatura entre 2º e 8ºC, e posteriormente encaminhadas ao Laboratório de Análises Clínicas e para análise por eletroquimioluminescência. Foram excluídos da pesquisa 11 RN nos quais as amostras de diurese coletadas foram insuficientes para análise do cortisol.

Foram respeitados todos os preceitos éticos que regem uma pesquisa com seres humanos (Resolução 466/12 do Ministério da Saúde)88 Brasil. Resolução CNS Nº 466 - Ministério da Saúde. [citado em 2017 jan. 06]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/cns/2013/res0466_12_12_2012.html.
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis...
. O estudo foi aprovado por Comitê de Ética e Pesquisa, em dezembro de 2015, CAAE nº 50914015.8.0000.5350, Parecer Consubstanciado nº 1.354.128.

Análise estatística

A análise dos dados foi realizada com estatística descritiva, envolveu as medidas de posição (limite inferior, (limite superior, quartil 1, mediana, quartil 3 e média) e de dispersão (desvio padrão e range), e teste t de Student, com o uso do software SPSS 17.0.

RESULTADOS

A tabela 1 apresenta que a ventilação invasiva, que rotineiramente os RN prematuros são submetidos, desencadeia predomínio de dor moderada em 37,5%. Nos RN em continous positive airway pressure (CPAP) a dor moderada ou intensa ocorreu em 9,4% da amostra e nos RN em campânula ocorreu dor intensa em 15,6% dos casos.

Tabela 1
Análise da dor segundo as variáveis dos recém-nascidos em unidade de terapia intensiva neonatal. Março-outubro de 2016

Quanto ao local de punção, nos membros superiores, 68,8% dos RN receberam o maior número de punção e apresentaram dor moderada e intensa na mesma frequência que foi de 31,3%. Em relação à finalidade da punção, mais da metade ocorreu para passagem de PICC, de modo que 10 RN (43,8%) tiveram dor moderada. Ainda em relação à punção venosa, quanto ao número de tentativas, os RN submetidos a uma única punção venosa, apresentaram dor moderada em 12,5% e dor intensa em 9,4% da amostra.

No que tange a ventilação invasiva, a tabela 2 apresenta um aumento de cortisol em 43,8% dos RN. 12,5% dos RN em CPAP e 9,4% dos que estavam em campânula apresentaram alteração nos níveis de cortisol.

Tabela 2
Análise do cortisol segundo as variáveis dos recém-nascidos em unidade de terapia intensiva neonatal. Março-outubro/2016

O maior número de punção foi em MMSS em 68,8% dos RN e 53,1% apresentaram aumento do nível de cortisol. Em relação à finalidade da punção, mais da metade ocorreu para passagem de PICC, de modo que em 43,8% ocorreu elevação nos níveis de cortisol livre. Ainda em relação à punção venosa, quanto ao número de tentativas, 25% dos RN submetidos a uma única punção venosa apresentaram alteração no nível de cortisol.

Na tabela 3 apresentam-se as medidas descritivas do cortisol segundo algumas variáveis, onde observa-se em cada uma delas que o limite inferior (Li) e o limite inferior (LS) têm uma amplitude grande (range). Também, observa-se um desvio padrão amplo em relação à média. Verifica-se que existe diferença significativa somente entre as médias dos níveis de cortisol com variável "tipo de punção". Na figura 1 apresentam-se as medidas de posição (Li, Ls, quartil 1, mediana e quartil 3), onde identificam-se quatro casos de outliers, em que os valores dos níveis de cortisol apresentaram-se muito elevados. Esses recém-nascidos prematuros (RNPT) são considerados os que mais se estressaram.

Tabela 3
Estatística descritiva e teste t de Student do cortisol segundo as variáveis dos recém-nascidos. Março-outubro/2016

Figura 1
Medidas de posição do cortisol segundo as variáveis sexo, sedação, ventilação, corticoide, tipo de punção e número de tentativas. Março-outubro/2016

No entanto, para melhor compreender as relações, optou-se por excluir esses quatro valores extremos de cortisol, que são: 598; 557,1; 373 e 224,1. Os resultados são apresentados na tabela 4, mostrando que existe diferença significativa no valor do cortisol na variável corticoide.

Tabela 4
Estatística descritiva e teste t de Student do cortisol segundo as variáveis dos recém-nascidos

DISCUSSÃO

Os efeitos de longo prazo da dor neonatal não tratada incluem desfechos neurológicos adversos, resposta aumentada à dor, aumento da somatização, dentre outras alterações neuropsicomportamentais99 Anand JJ, Hall RW. Pharmacological therapy for analgesia and sedation in the newborn. Arch Dis Child Fetal Neonatal Ed. 2006;91(6):F448-53.. Nesse sentido, as terapias farmacológicas devem ser usadas em conjunto com intervenções não farmacológicas.

Uma pesquisa analisou a associação dos escores de avaliação da dor obtidos através da prática de reavaliação, conforme a Joint Commission (JC), com eventos dolorosos e uso de analgésicos em 196 prematuros em ventilação mecânica. Em geral, 2% das pontuações sugeriram a presença de dor, 0,1% dos escores de dor foram associados à analgesia. Os RN ventilados que foram expostos a múltiplos procedimentos em um único dia, não demonstraram elevação de pontuação de dor, apesar de frequentes analgésicos preventivos ou contínuos1010 Rohan AJ. The utility of pain scores obtained during 'regular reassessment process' in premature infants in the NICU. J Perinatol. 2014;34(7):532-7..

Os autores concluíram que os escores de avaliação da dor obtidos por meio de reavaliações foram pouco correlacionados com procedimentos ou condições associadas à dor. As baixas pontuações de dor através de reavaliação, podem não se correlacionar com baixa exposição à dor. Embora ocorra supervisão da JC, os resultados deste estudo sugerem que a documentação de reavaliação da dor pode não facilitar diretamente o manuseio eficaz da dor em UTIN1010 Rohan AJ. The utility of pain scores obtained during 'regular reassessment process' in premature infants in the NICU. J Perinatol. 2014;34(7):532-7.. Pesquisas adicionais são necessárias para explorar escalas, reavaliar a dor na UTIN para identificar as melhores práticas e facilitar a gestão da experiência de dor acumulada em prematuros.

Um estudo suíço com 120 RN ventilados e avaliados quanto a presença de dor em procedimentos, durante 14 dias, evidenciou que os RN eram submetidos a 38.626 procedimentos, média de 22,9 procedimentos por paciente, 75,6% dolorosos1111 Cignacco E, Hamers J, van Lingen RA, Stoffeld L, Büchi S, Müller R, et al. Neonatal procedural pain exposure and pain management in ventilated preterm infants during the first 14 days of life. Swiss Med Wkly. 2009;139(15):226-32.. O mais frequente foi a manipulação das cânulas nasais do CPAP. A avaliação da dor ocorreu de quatro a sete vezes por dia, 99,2% dos pacientes receberam medidas não farmacológicas e farmacológicas de dor e 70,8% receberam glicose como analgesia preventiva para dor.

No que tange ao uso de corticoide no pré-natal, o mesmo é indicado à gestante em trabalho de parto, de 23 a 34 semanas de idade gestacional. Um estudo avaliou 463 gestantes e seus 514 RN1212 Duarte JL. [Antenatal corticosteroid use and clinical evolution of preterm newborn infants]. J Pediatr. 2004;80(6):529-30; autor reply 530. Portuguese.. No que se refere aos RN, apresentaram melhores escores de Apgar no 1º e 5º minutos, menor necessidade de intervenção na sala de parto e menor SNAPPE II (Pontuação para Fisiologia Aguda Neonatal com Extensão Perinatal-II) para previsão de mortalidade e morbidade em UTIN, nasceram em melhores condições clínicas, maior peso e idade gestacional. Eles também utilizaram menos surfactante exógeno, e os RN permaneceram menor tempo em ventilação mecânica e oxigenoterapia.

No entanto, esteve associado ao aumento de sepse neonatal pois os RN cujas mães receberam corticosteróide antenatal apresentaram maior incidência de hemoculturas positivas e maior uso de antibióticos e enterocolite necrosante. As investigações sobre o tratamento antenatal e o risco de infecção são conflitantes.

A punção venosa é um procedimento doloroso realizado frequentemente em UTIN. Alguns autores analisaram a eficácia de aconchegar o RNPT para realizar a punção venosa. Tratou-se de um estudo composto por 42 RN, 21 no grupo controle e 21 no tratamento. Ao serem submetidos à punção venosa tiveram a dor avaliada com a escala Perfil de Dor do Prematuro Infantil. No grupo tratamento, os RN foram aconchegados antes da punção, e a dor foi significativamente mais baixa (p<0,05)1313 Lopez O, Subramanian P, Rahmat N, Theam LC, Chinna K, Rosli R. The effect of facilitated tucking on procedural pain control among premature babies. J Clin Nurs. 2015;24(1-2):183-91..

Um estudo com 38 RNPT de muito baixo peso, no Hospital Infantil Hermann, no Texas, submetidos à punção venosa em radial para coleta de sangue e/ou punção de calcâneo foram avaliados quanto à variabilidade cardíaca em resposta ao estímulo doloroso1414 Padhye NS, Williams AL, Khattak AZ, Lasky RE. Heart rate variability in response to pain stimulus in VLBW infants followed longitudinally during NICU stay. Dev Psychobiol. 2009;51(8):638-49.. Eles constataram alteração na variabilidade da frequência cardíaca durante os procedimentos, aliada à evidência de que uma resposta baixa da frequência melhorou com o avançar da idade gestacional corrigida.

No que tange ao cortisol, hormônio que avalia o estresse, uma revisão da literatura integrativa que analisou 16 artigos mostrou que o exame de retinopatia e a punção de calcanhar provocaram aumento no nível de cortisol salivar1515 Mörelius E, He HG, Shorey S. Salivary cortisol reactivity in preterm infants in neonatal intensive care: an integrative review. Int J Environ Res Public Health. 2016;13(3): pii: E337.. No entanto, medidas com música, posição prona, e o uso do mesmo berço entre os gêmeos reduziu o nível de cortisol salivar. As dificuldades relatadas referem-se à baixa taxa de amostragem de saliva, e por não usarem grupos de controle.

A avaliação da concentração salivar de cortisol é um método preciso para indicar estresse neonatal1616 Cabral DM, Antonini SR, Custódio RJ, Martinelli CE Jr, da Silva CA. Measurement of salivary cortisol as a marker of stress in newborns in a neonatal intensive care unit. Horm Res Paediatr. 2013;79(6):373-8.. O uso de glicocorticoides no pré-natal, tais como betametasona, interfere na resposta ao estresse devido à supressão da glândula adrenal. RN com peso entre 1.500 e 2.500g mostraram reação mais intensa ao estresse, ao apresentarem média de cortisol salivar de 6,650.0±2,660.0ng/dL. Os autores afirmam que a reação intensa dos RN ao estresse é prejudicial para vários sistemas fisiológicos, funcionais e estruturais a curto e longo período.

RNPT, especialmente os de 24-32 semanas, sofrem repetidos procedimentos dolorosos durante um período de desenvolvimento rápido do cérebro e programação de sistemas de estresse. Possuem circuitos nociceptivos para perceber a dor, no entanto, seus sistemas sensoriais são imaturos de modo que um desequilíbrio de processos excitatórios versus inibitórios pode levar a uma maior sinalização nociceptiva no sistema nervoso central1717 Vinall J, Grunau RE. Impact of repeated procedural pain-related stress in infants born very preterm. Pediatr Res. 2014;75(5):584-7.. Também, células específicas no sistema nervoso central de RNPT são particularmente vulneráveis à excitotoxicidade, estresse oxidativo e inflamação.

Desse modo, maior exposição ao estresse relacionado com a dor neonatal tem sido associada à microestrutura cerebral alterada, níveis de hormônio do estresse e alterações no desenvolvimento cognitivo, motor e comportamental1717 Vinall J, Grunau RE. Impact of repeated procedural pain-related stress in infants born very preterm. Pediatr Res. 2014;75(5):584-7.. Portanto, é importante que o estresse relacionado à dor em RNPT seja identificado com precisão, adequadamente gerenciado e que as estratégias de manuseio da dor sejam avaliadas e efetivadas para efeitos protetores de curto e longo prazos.

Um trabalho examinou longitudinalmente a idade gestacional e as diferenças de desenvolvimento nas habilidades autorreguladoras de lactentes pré-termo em resposta a um estressor doloroso, bem como as associações entre as respostas comportamentais e cardiovasculares1818 Lucas-Thompson R, Townsend EL, Gunnar MR, Georgieff MK, Guiang SF, Ciffuentes RF, et al. Developmental changes in the responses of preterm infants to a painful stressor. Infant Behav Dev. 2008;31(4):614-23.. Foram avaliadas amostras de sangue de punção de calcanhar de crianças de 28 a 31 e de 32 a 34 semanas de idade gestacional ao nascimento. Ambos os grupos apresentaram indicações comportamentais e cardiovasculares de estresse em resposta à extração de sangue. Entretanto, os RN em idades gestacionais mais extrema (28-31 semanas) eram mais fisiologicamente reativos.

Nesse sentido, discute-se a maior vulnerabilidade ao estresse dos prematuros de 28-31 semanas em relação aos de 32-34 semanas de gestação e as implicações desse desenvolvimento subsequente.

O estresse no início da vida pode alterar a função do eixo hipotalâmico (HPA) e da glândula suprarrenal1919 Brummelte S, Chau CM, Cepeda IL, Degenhardt A, Weinberg J, Synnes AR, et al. Cortisol levels in former preterm children at school age are predicted by neonatal procedural pain-related stress. Psychoneuroendocrinology. 2015;51:151-63.. Diferenças nos níveis de cortisol foram encontradas em RNPT expostos a estresse processual durante os cuidados intensivos neonatais, em comparação com RN a termo, mas apenas alguns estudos investigaram se a alteração do eixo HPA persiste com o crescimento da criança.

Além disso, há uma lacuna de conhecimento sobre o que pode contribuir para essas alterações no cortisol. Nesse contexto, um estudo de coorte prospectivo examinou os perfis de cortisol salivar em resposta ao estresse da avaliação cognitiva, bem como o ritmo diurno do cortisol, em crianças (n=129) nascidas em diferentes níveis de prematuridade (24-32 semanas de gestação), termo (38-41 semanas de gestação) e aos 7 anos de idade1919 Brummelte S, Chau CM, Cepeda IL, Degenhardt A, Weinberg J, Synnes AR, et al. Cortisol levels in former preterm children at school age are predicted by neonatal procedural pain-related stress. Psychoneuroendocrinology. 2015;51:151-63..

Os autores demonstraram que os perfis de cortisol foram semelhantes nos RN pré-termo e termo, muito embora os pré-termos apresentassem cortisol mais alto na hora de dormir em comparação com crianças a termo. Importante, no grupo pré-termo, maior estresse relacionado à dor neonatal processual foi associado a níveis maiores de cortisol no dia de estudo (p=0,044) e menor cortisol diurno em casa (p=0,023), com efeitos observados principalmente em meninos. Além disso, déficit de atenção, negatividade, e problemas neuropsicocomportamentais estavam associados à resposta ao cortisol na avaliação cognitiva em RN pré-termo1919 Brummelte S, Chau CM, Cepeda IL, Degenhardt A, Weinberg J, Synnes AR, et al. Cortisol levels in former preterm children at school age are predicted by neonatal procedural pain-related stress. Psychoneuroendocrinology. 2015;51:151-63.. Dessa forma, dor e estresse podem contribuir para a alteração da função do eixo HPA até a idade escolar em crianças pré-termo, e o sexo pode ser um fator importante. A exposição pós-natal precoce a procedimentos invasivos é estressante, especialmente quando repetido várias vezes ao dia durante um período de imaturidade.

CONCLUSÃO

O procedimento de punção venosa repetido intensificou a dor e alterou o cortisol. Os membros superiores apresentaram-se mais sensíveis a reações de dor do que os membros inferiores.

  • Fontes de fomento: não há.

REFERENCES

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Jun 2019
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2019

Histórico

  • Recebido
    05 Nov 2018
  • Aceito
    29 Abr 2019
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