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Instrumentos que avaliam a funcionalidade em indivíduos com disfunção temporomandibular e a Classificação Internacional de Funcionalidade: revisão sistemática

RESUMO

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS:

O objetivo desta revisão foi estudar as ferramentas utilizadas para mensuração da funcionalidade em indivíduos com disfunção temporomandibular e verificar sua consistência com o modelo da Classificação Internacional de Funcionalidade (CIF), Incapacidade e Saúde.

CONTEÚDO:

Revisão sistemática realizada nas bases de dados Pubmed, PEDro, Scielo, Bireme, Web of Science, Cochrane, CINAHL, SPORTDiscus e Scopus. Foram incluídos ensaios clínicos publicados de 2001 a 2019, nos idiomas português, inglês e espanhol, tendo como um dos desfechos a avaliação da funcionalidade de pessoas com disfunção temporomandibular. Para a avaliação da qualidade dos artigos foi utilizado o Checklist GRADE. Os questionários foram analisados e suas questões codificadas de acordo com os domínios da CIF. Foram encontrados 425 artigos, 7 deles foram incluídos nesta pesquisa. Apresentavam 4 diferentes instrumentos para avaliação da funcionalidade de pessoas com disfunção temporomandibular: Research Diagnostic Criteria for Temporomandibular Disorders, Mandibular Function Impairment Questionnaire, Pain Disability Index e Escala de comprometimento funcional de 11 pontos. A frequência dos domínios da CIF foi: função (39,8%), estrutura do corpo (22,8%), atividade (17,7%), condição de saúde (8,86%), fatores pessoais (6,8%), participação (2,88), fatores ambientais (1,03%).

CONCLUSÃO:

A literatura é limitada sobre estudos sobre a funcionalidade na população com disfunção temporomandibular. Além disso, os instrumentos utilizados não conseguem abordar os domínios da CIF de uma forma satisfatória, com ênfase na coleta de informações a respeito de funções e estruturas do corpo.

Descritores:
Articulação temporomandibular; Classificação Internacional de Funcionalidade; Incapacidade e saúde; Síndrome da disfunção da articulação temporomandibular

ABSTRACT

BACKGROUND AND OBJECTIVES:

The objective of this review was to study the tools used to measure functioning in individuals with temporomandibular disorders and verify its consistency with the model of the International Classification of Functioning (ICF), Disability and Health.

CONTENTS:

Systematic review performed in the databases Pubmed, PEDro, Scielo, Bireme, Web of Science, Cochrane, CINAHL, SPORTDiscus and Scopus. Published clinical trials from 2001 to 2019, in Portuguese, English and Spanish were included, with one of the outcomes being the evaluation of functioning of people with temporomandibular disorders. For the evaluation of the quality of the articles, the GRADE Checklist was used. The questionnaires were analyzed, and their questions coded according to the domains of the ICF. 425 articles were found and, after screening, 7 of them were included in this research. In these, 4 different instruments used to evaluate the functioning of people with temporomandibular disorders were found: Research Diagnostic Criteria for Temporomandibular Disorders, Mandibular Function Impairment Questionnaire, Pain Disability Index and the 11-point functional impairment scale. The frequency of ICF’s domains was: body functions (39.8%), body structure (22.8%), activity (17.7%), health condition (8.86%), personal factors (6.8%), participation (2.88), environmental factors (1.03%).

CONCLUSION:

The studies related to functioning in the temporomandibular disorder population is still scarce. Moreover, the instruments used fail to address the domains of the ICF in a homogeneous way, and some do not address the whole conceptual model, with an emphasis on gathering information about body functions and structures.

Keywords:
International Classification of Functioning; Disability and Health; Temporomandibular joint; Temporomandibular joint dysfunction syndrome

INTRODUÇÃO

Transtornos orofaciais promovem impactos na saúde e qualidade de vida (QV) da população, e a disfunção temporomandibular (DTM) é considerada a principal causa de dor orofacial11 Balik A, Peker K, Ozdemir-Karatas M. Comparisons of measures that evaluate oral and general health quality of life in patients with temporomandibular disorder and chronic pain. Cranio. 2019;1-11. [Epub ahead of print].,22 Tatli U, Benlidayi ME, Ekren O, Salimov F. Comparison of the effectiveness of three different treatment methods for temporomandibular joint disc displacement without reduction. Int J Oral Maxillofac Surg. 2017;46(5):603-9.. A DTM engloba diferentes condições, estruturais e funcionais, que afetam a articulação temporomandibular (ATM), os músculos mastigatórios e estruturas associadas33 Schiffman E, Ohrbach R, Truelove E, Look J, Anderson G, Goulet JP, et al. Diagnostic Criteria for Temporomandibular Disorders (DC/TMD) for Clinical and Research Applications: recommendations of the International RDC/TMD Consortium Network* and Orofacial Pain Special Interest Group. J Oral Facial Pain Headache. 2014;28(1):6-27.. A prevalência na população varia de 60 a 70%44 Ramos MM, González AP, De La Hoz Aizpúrua JL. Dolor orofacial musculoesquelético (disfunción craneomandibular). RCOE. 2013;18(3):161-5.. Sua etiologia é multifatorial, podendo estar relacionada a condições odontológicas, médicas, traumas, psicossociais ou genéticas55 Bagis B, Ayaz EA, Turgut S, Durkan R, Özcan M. Gender difference in prevalence of signs and symptoms of temporomandibular joint disorders: a retrospective study on 243 consecutive patients. Int J Med Sci. 2012;9(7):539-44.,66 Lopes Pãnos R, Ortiz-Gutiérrez RM, Chana Valero P, Felipe Concepción E. Assessment of postural control and balance in persons with temporomandibular disorders: a systematic review. Rehabilitation. 2019;53(1):28-42.. Os principais sinais e sintomas são as limitações do movimento mandibular, crepitações e estalidos, dores musculares na cabeça e região cervical77 Almoznino G, Goldschleger G, Aviv T, Chweidan H, Yarom N. Oral health-related quality of life in patients with temporomandibular disorders. J Oralfac Pain. 2015;29(3)2311-41..

Pacientes com DTM apresentam limitações físicas e funcionais e desconforto psicológico, acarretando prejuízos na funcionalidade77 Almoznino G, Goldschleger G, Aviv T, Chweidan H, Yarom N. Oral health-related quality of life in patients with temporomandibular disorders. J Oralfac Pain. 2015;29(3)2311-41.,88 Roldán-Barraza C, Janko S, Villanueva J, Araya I, Lauer HC. A systematic review and meta-analysis of usual treatment versus psychosocial interventions in the treatment of myofascial temporomandibular disorder pain. J Oral Facial Pain Headache. 2014;28(3)205-22.. A funcionalidade é considerada importante índice para mensuração da saúde da população, visto que para entender a condição de saúde da população, avaliar as informações sobre óbitos e morbidade não são suficientes99 Stucki G, Bickenbach J. Functioning: the third health indicator in the health system and the key indicator for rehabilitation. Eur J Phys Rehabil Med. 2017;53(1):134-8.,1010 Üstün TB, Chatterji S, Bickenbach J, Kostanjsek N, Schneider M. The International Classification of Functioning, Disability and Health: a new tool for understanding disability and health. Disabil Rehabil. 2003;25(11-12):565-71..

A Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF) é um instrumento proposto pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como elemento de padronização/unificação de conceitos e traz a proposta explicativa do modelo biopsicossocial de funcionalidade1111 Garin O, Ayuso-Mateos JL, Almansa J, Nieto M, Chatterji S, Vilagut G, et al. Validation of the "World Health Organization Disability Assessment Schedule, WHODAS-2" in patients with chronic diseases. Health Qual Life Outcomes. 2010;8:51., disponibilizando uma estrutura que descreve a saúde e seus estados relacionados1212 Farias N, Buchalla CM. A classificação internacional de funcionalidade, incapacidade e saúde da organização mundial da saúde: conceitos, usos e perspectivas. Rev Bras Epidemiol. 2005;8(2):187-93.,1313 Fontes AP, Fernandes AA, Botelho MA. Funcionalidade e Incapacidade: aspesctos conceptuais, estruturais e de aplicação da Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF). Rev Port Saude Publica. 2010; 28(2):171-.. Apresenta a funcionalidade como resultante da interação positiva dos domínios da CIF, que compreendem condição de saúde, funções e estruturas do corpo, atividade, participação, fatores pessoais e ambientais, sendo a incapacidade, seu antagonista. A funcionalidade é a junção dinâmica da condição de saúde com os fatores contextuais1313 Fontes AP, Fernandes AA, Botelho MA. Funcionalidade e Incapacidade: aspesctos conceptuais, estruturais e de aplicação da Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF). Rev Port Saude Publica. 2010; 28(2):171-..

O estudo de funcionalidade associado à DTM possibilita melhor compreensão do perfil dos pacientes, oportunizando o planejamento de intervenções centradas no paciente em detrimento de intervenções protocolares, centradas no processo. O estudo das publicações sobre o tema pode oferecer maior conhecimento sobre essa questão e, ao mesmo tempo, disponibilizar uma avaliação crítica dos instrumentos mais citados na literatura, contribuindo para o processo de seleção do instrumento mais adequado para a prática clínica ou pesquisa.

Esta revisão objetivou estudar as ferramentas utilizadas para mensuração da funcionalidade em indivíduos com DTM e verificar sua consistência com o modelo da CIF.

CONTEÚDO

Revisão sistemática realizada em acordo com o Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analysis (PRISMA)1414 Prisma Group. Preferred reporting items for systematic reviews and meta-analyses: the PRISMA statement. Plos Med.2009; 6(7):e1000097. que buscou responder as seguintes perguntas: “Quais os instrumentos utilizados para avaliação da funcionalidade de pessoas com DTM?” e “Os instrumentos utilizados estão de acordo com os conceitos da CIF”?

Estratégia de busca

As buscas foram realizadas por dois pesquisadores, de forma independente, nas bases de dados Pubmed, PEDro, Scielo, Bireme, Web of Science, Cochrane, CINAHL, SPORTDiscus e Scopus. Os descritores utilizados foram combinados por meio dos operadores booleanos da seguinte forma: (Incapacidade OR Desempenho Funcional OR Funcionalidade OR Capacidade Funcional OR Deficiência) AND (Transtorno da articulação temporomandibular OR Síndrome da Disfunção da articulação temporomandibular) em português, inglês e espanhol. O protocolo da revisão foi registrado na plataforma PROSPERO com número CRD42020138859.

Seleção dos estudos

Os trabalhos duplicados foram excluídos. Os títulos e resumos foram analisados por dois pesquisadores de forma independente, havendo um terceiro para caso de discordância. Após essa triagem, os textos foram lidos na íntegra para confirmação.

Critérios de elegibilidade

Foram incluídos ensaios clínicos publicados a partir de 2001, ano de publicação da CIF, até setembro de 2019, com pacientes diagnosticados com DTM por meio do Research Diagnostic Criteria for Temporomandibular Disorders (RDC/TMD) e que apresentassem a avaliação da funcionalidade nesses pacientes, maiores de 17 anos, de ambos os sexos. Foram excluídos estudos de revisão, observacionais, relatos de caso, estudos-piloto, série de casos e que avaliavam a DTM em conjunto com outras doenças (Figura 1).

Figura 1
Fluxo de seleção dos artigos

Extração e análise dos dados

Foram extraídos os dados de autor e ano de publicação, composição da amostra, objetivo e escala de funcionalidade. Os estudos tiveram a qualidade de evidência avaliada pelo GRADE (Grading of Recommendations Assessment, Development and Evaluation), desenvolvido com objetivo de oferecer um sistema universal, transparente e sensível para graduar a qualidade das evidências e a força das recomendações1515 Galvao TF, Pereira MG. Avaliação da qualidade da evidência de revisões sistemáticas. Epidemiol Serv Saúde.2015; 24(1):173-175.. A qualidade metodológica dos estudos foi avaliada por meio da escala PEDro, que tem boa confiabilidade. É uma escala com 11 itens, em que o primeiro, critérios de elegibilidade, não é incluído na soma da pontuação, de maneira que o total varia de zero a 101616 Maher GC, Sherrington C, Herbert RD, Moseley AN, Elkins M. Reliability of the PEDro scale for rating quality of randomized controlled trials. Phys Ther. 2003;83(8):713-21..

O processo posterior consistiu na codificação dos conteúdos significativos dos instrumentos, segundo os domínios da CIF. A codificação foi realizada com a extração dos conceitos de todas as questões e respostas de todos os instrumentos. Depois disso, foram classificados de acordo com os domínios da CIF, seguindo regras já estabelecidas1717 Cieza A, Fayed N, Bickenbach J, Prodinger B. Refinements of the ICF Linking Rules to strengthen their potential for establishing comparability of health information. Disabil Rehabil. 2019;41(5):574-83.. Os resultados foram comparados e as discordâncias resolvidas pelo terceiro pesquisador. Após definição das classificações, os conceitos foram somados e posteriormente divididos pelos domínios e feita a porcentagem de conceitos por domínios em cada um dos questionários.

A busca inicial resultou em 425 artigos, restando 7 após a aplicação dos critérios de seleção (Figura 1).

Para avaliação da funcionalidade de pessoas com DTM foi encontrada 1 escala e 3 questionários: RDC/TMD, Mandibular Function Impairment Questionnaire (MFIQ), Pain Disability Index (PDI) e Escala de comprometimento funcional de 11 pontos. Apenas o RDC/TMD se repetiu. Dos estudos que utilizaram esse questionário, dois fizeram uso apenas do eixo II (Tabela 1). Os instrumentos foram codificados de acordo com os domínios da CIF (Tabela 2). A frequência dos domínios é descrita na figura 2.

Tabela 1
Distribuição geral dos artigos
Tabela 2
Distribuição de frequências dos domínios da CIF contida em cada instrumento

Figura 2
Frequência dos domínios da CIF em todos os instrumentos selecionados para avaliação da funcionalidade em indivíduos com disfunção temporomandibular

Com relação a qualidade da evidência, os artigos variaram entre alta, moderada e baixa de acordo com o sistema GRADE. Quanto à qualidade metodológica, os artigos tiveram uma pontuação total média de 5,28 na escala PEDro, variando entre alta e baixa qualidade. Apenas dois estudos estavam indexados na base de dados PEDro, sendo que a qualidade metodológica dos demais foi avaliada pelos revisores (Tabela 1).

DISCUSSÃO

Existem poucos artigos sobre funcionalidade na população com DTM, apesar das buscas iniciais identificarem 425 artigos, apenas 7 tinham a funcionalidade como medida de desfecho em ensaios clínicos. Esta informação evidencia que o conceito de funcionalidade preconizado pela OMS ainda não se encontra adequadamente incorporado às pesquisas intervencionistas da área.

O RDC/TMD foi utilizado para avaliar a funcionalidade em 6 estudos. Por ser o padrão-ouro para classificação de DTM, essa predominância era esperada. É uma das poucas ferramentas disponíveis na literatura que permite a avaliação diagnóstica da disfunção e das condições psicossociais a ela relacionadas. Caracteriza-se por possuir abordagem biaxial, permitindo a mensuração confiável de achados físicos no Eixo I e avaliação do status psicossocial no Eixo II. Ao final, tem-se diagnóstico da DTM baseado em critérios clínicos, bem como a classificação segundo os grupos: desordens musculares (Grupo 1), desordens de deslocamento de disco (grupo 2), artralgia, osteoartrose e osteoartrite (Grupo 3)33 Schiffman E, Ohrbach R, Truelove E, Look J, Anderson G, Goulet JP, et al. Diagnostic Criteria for Temporomandibular Disorders (DC/TMD) for Clinical and Research Applications: recommendations of the International RDC/TMD Consortium Network* and Orofacial Pain Special Interest Group. J Oral Facial Pain Headache. 2014;28(1):6-27.. Também pode ser aferido o grau de dor crônica e seu impacto na funcionalidade1818 Shedden Mora MC, Weber D, Neff A, Rief W. Biofeedback-based cognitive-behavioral treatment compared with occlusal splint for temporomandibular disorder: a randomized controlled trial. Clin J Pain. 2013;29(12):1057-65..

Ao fazer a correspondência dos conceitos presentes no instrumento com a CIF, verificou-se que apresenta os 7 domínios que a compõe, porém, suas questões se concentram mais em função e estrutura do corpo. A participação e fatores ambientais são pouco explorados. Quando utilizado apenas o Eixo II, não há abordagem dos fatores ambientais. Esse seria o instrumento que mais se assemelha da forma recomendada de mensuração da funcionalidade pela OMS.

O MFIQ possibilitou classificar os indivíduos em categorias de gravidade de limitação funcional relacionada à DTM: baixo, moderado e grave. O instrumento apresenta 17 questões referentes a atividades diárias com 5 opções de resposta, indo de ‘’nenhuma dificuldade’’ a ‘’muitíssima dificuldade’’. É descrito que a sua vantagem é a mensuração da limitação funcional relativa à DTM, diferentemente de outros índices que avaliam especificamente a gravidade dos sinais e sintomas clínicos, sendo visto como uma ferramenta adequada para verificar ganhos em termos funcionais após intervenções terapêuticas1818 Shedden Mora MC, Weber D, Neff A, Rief W. Biofeedback-based cognitive-behavioral treatment compared with occlusal splint for temporomandibular disorder: a randomized controlled trial. Clin J Pain. 2013;29(12):1057-65.. Entretanto, ao fazer a correspondência desse índice com a CIF, verifica-se que ele aborda basicamente função e atividades, portanto, não consegue desenvolver o desfecho de maneira completa e produzir dados voltados ao modelo biopsicossocial.

Outro instrumento que foi utilizado é o PDI, questionário de autoavaliação que mensura o nível de incapacidade relacionada à dor em 7 áreas da vida diária, atribuindo valores de 0 a 10. Esse índice também apresenta os 7 domínios da CIF, porém em distribuição irregular contemplando principalmente atividade e função.

Também foi utilizada a escala de comprometimento funcional de 11 pontos, que é uma pergunta direta sobre como os indivíduos classificam a sua funcionalidade numa escala de 0-10. Quando codificada, constatou-se que contempla apenas os domínios função e atividade, sendo outro instrumento que também não conseguiu contemplar toda a abrangência que a CIF propõe e, consequentemente, não avalia a funcionalidade em sua totalidade.

Verificou-se que os instrumentos estão centrados nos domínios função e estrutura do corpo e atividade, reforçando o modelo biomédico. A mudança para o modelo biopsicossocial enfatiza a dinâmica e as relações bidirecionais entre a condição de saúde e fatores pessoais e ambientais1313 Fontes AP, Fernandes AA, Botelho MA. Funcionalidade e Incapacidade: aspesctos conceptuais, estruturais e de aplicação da Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF). Rev Port Saude Publica. 2010; 28(2):171-..

Quanto às propriedades psicométricas dos instrumentos, a versão em português do questionário Eixo II do RDC/TMD foi considerada consistente (α Cronbach= 0,72), reprodutível (valores de Kappa entre 0,73-0,91; p<0,01) e válida (p<0,01)1919 de Lucena LB, Kosminsky M, da Costa LJ, de Góes PS. Validation of the Portuguese version of the RDC/TMD Axis II questionnaire. Braz Oral Res. 2006;20(4):312-7.. O MFIQ apresenta boa consistência interna, porém os autores sugerem mais estudos em diferentes amostras de pacientes com DTM2020 Chaves TC, Oliveira AS De, Grossi DB. Principais instrumentos para avaliação da disfunção temporomandibular, parte I: índices e questionários; uma contribuição para a prática clínica e de pesquisa. Fisioter Pesqui. 2008;15(1):92-100.. Já o PDI possui valores de validade e confiabilidade satisfatórios na amostra de pacientes com dor crônica, não sendo analisada especificamente em indivíduos com DTM2121 Tait RC, Chibnall JT, Krause S. The Pain Disability Index: psychometric properties. Pain. 1990;40(2):171-82..

Os estudos selecionados apresentaram como principais limitações a presença de risco de viés, como falta de cegamento dos pacientes em relação ao tratamento, e o risco de imprecisão dos resultados, devido ao pequeno número amostral. Nesse sentido, deve haver estímulo à realização e publicação de estudos com maior consistência metodológica para que essas fragilidades sejam superadas.

O presente estudo apresentou como limitação a reduzida quantidade de artigos. Isso demonstra que mesmo a DTM tendo interferência significativa na funcionalidade, ela ainda é pouco estudada. Outra limitação do estudo é o fato de não abordar de maneira mais aprofundada a análise das propriedades psicométricas dos instrumentos, visto que não foi o objetivo da revisão. Então recomenda-se que, ao escolher o instrumento a ser aplicado, suas propriedades psicométricas, como estabilidade, consistência interna, equivalência e validade sejam levadas em consideração. A importância do estudo está no crescente uso da funcionalidade como índice para avaliar a saúde da população, sendo necessários instrumentos que mensurem esse desfecho de maneira mais coerente com o conceito da CIF.

CONCLUSÃO

A literatura sobre o tema é limitada. Foram encontrados 4 instrumentos para avaliar a funcionalidade na população determinada: RDC/TMD, MFIQ, PDI e Escala de comprometimento funcional de 11 pontos. Os instrumentos mostraram consistência com o modelo da CIF. O RDC/TMD foi o que apresentou os melhores resultados, sendo o mais recomendado e a escala de comprometimento funcional de 11 pontos a menos recomendada. Entretanto, esses instrumentos não conseguem abordar os domínios de forma satisfatória e alguns não abordam todos os componentes do modelo conceitual, havendo ênfase em estruturas e funções do corpo.

  • Fontes de fomento: não há.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Fev 2021
  • Data do Fascículo
    Jan-Mar 2021

Histórico

  • Recebido
    28 Abr 2020
  • Aceito
    08 Nov 2020
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