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Autoeficácia para dor e atividade física durante o distanciamento social relacionado à COVID-19: estudo transversal

RESUMO

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS:

A pandemia de COVID-19 impactou a prática de atividade física da população com dor musculoesquelética (DME), e um dos modos de ampliar a realização da atividade física é estimulando a autoeficácia para dor. Entretanto, até o momento, não se observou na literatura qualquer estudo que trouxesse a relação entre autoeficácia e atividade física nessa população. O objetivo deste estudo foi analisar a associação do nível de autoeficácia e do tempo semanal de prática de atividade física na população com dor durante o distanciamento social relacionado à pandemia de COVID-19 nos estados do Ceará e São Paulo.

MÉTODOS:

Este estudo se caracteriza como um estudo transversal com abordagem quantitativa. A coleta de dados foi realizada a partir de um formulário eletrônico. Para identificação da associação entre autoeficácia (Pain Self-Efficacy Questionnaire) e tempo semanal de prática de atividade física (variável dependente) na população com dor, foi realizada uma regressão linear múltipla.

RESULTADOS:

A autoeficácia apresentou relação direta (ß = 0,015; p = 0,0016) com tempo de atividade física praticada durante a pandemia. Outras variáveis apresentaram associação com maior tempo de prática de atividade física, como menor intensidade de dor durante a pandemia (ß = -0,064; p = 0,0223), menor índice de massa corporal (ß = -0,036; p=0,0004), ser do sexo masculino (ß = -0,441; p<0,0001) e relatar ausência de comorbidades (ß = -0,297; p = 0,0116). O histórico de diagnóstico positivo para COVID-19 não apresentou associação com tempo de atividade física (p = 0,5347).

CONCLUSÃO:

Identificou-se associação direta entre autoeficácia para dor e tempo de prática de atividade física na população com dor musculoesquelética durante o distanciamento social relacionado à COVID-19.

Descritores:
Dor; Modelo de crenças de saúde; Terapia por exercício.

ABSTRACT

BACKGROUND AND OBJECTIVES:

The COVID-19 pandemic has impacted the practice of physical activity in the population with musculoskeletal pain, and one of the ways to increase the performance of physical activity is to stimulate pain self-efficacy. However, to date, no study that brought the association between self-efficacy and physical activity in this population has been observed in the literature. The aim of this study was to analyze the association of the level of pain self-efficacy and physical activity weekly time in the population with pain during social distancing related to the COVID-19 pandemic in the states of Ceará and São Paulo.

METHODS:

This study is characterized as a cross-sectional study with a quantitative approach. Data collection was performed using an electronic form. To identify the association between pain self-efficacy (Pain Self-Efficacy Questionnaire) and physical activity weekly time (dependent variable) in the population with pain, a multiple linear regression was performed.

RESULTS:

Self-efficacy showed a direct association (ß = 0.015; p = 0.0016) with the time of physical activity practiced during the pandemic. Other variables were associated with longer time of physical activity, such as lower pain intensity during the pandemic (ß = -0.064; p = 0.0223), lower body mass index (ß = -0.036; p = 0.0004), the male gender (ß = -0.441; p<0.0001) and absence of reported comorbidities (ß = -0.297; p = 0.0116). The history of positive diagnosis for COVID-19 was not associated with the physical activity duration (p = 0.5347) in an alternative model.

CONCLUSION:

A direct association between pain self-efficacy and time of physical activity in the population with musculoskeletal pain during COVID-19-related social distancing was identified.

Keywords
Exercise therapy; Health belief model; Pain.

DESTAQUES

  • Maior autoeficácia para o gerenciamento da dor foi associada com maior tempo de atividade física praticada durante a pandemia.

  • Maior tempo de prática de atividade física também foi associado com menor intensidade de dor durante a pandemia.

  • Histórico de diagnóstico positivo para COVID-19 não apresentou associação com tempo de atividade física durante a pandemia.

DESTAQUES

  • Maior autoeficácia para o gerenciamento da dor foi associada com maior tempo de atividade física praticada durante a pandemia.

  • Maior tempo de prática de atividade física também foi associado com menor intensidade de dor durante a pandemia.

  • Histórico de diagnóstico positivo para COVID-19 não apresentou associação com tempo de atividade física durante a pandemia.

INTRODUÇÃO

A pandemia causada pelo novo coronavírus (COVID-19) foi declarada como emergência global pela Organização Mundial da Saúde11 Sohrabi C, Alsafi Z, O’Neill N, Khan M, Kerwan A, Al-Jabir A, et al. World Health Organization declares global emergency: a review of the 2019 novel coronavirus (COVID-19). Int J Surg. 2020;76(1):71-6., com maior taxa de óbito entre adultos de meia-idade e idosos em diferentes localizações geográficas do planeta22 Levin AT, Hanage WP, Owusu-Boaitey N, Cochran KB, Walsh SP, Meyerowitz-Katz G. Assessing the age specificity of infection fatality rates for COVID-19: systematic review, meta-analysis, and public policy implications. Eur J Epidemiol. 2020;35(12):1123-38.. No Brasil, também se observou amplo impacto da COVID-19. De fevereiro a dezembro de 2020, foram registradas 462.149 internações hospitalares no Sistema de Informações Hospitalares do Sistema Único de Saúde, com o objetivo principal de tratamento da população contaminada pelo vírus SARS-CoV-2, correspondendo a um gasto de cerca de R$ 2,2 bilhões de reais33 Santos HLPC, Maciel FBM, Santos Junior GM, Martins PC, Prado NMBL. Gastos públicos com internações hospitalares para tratamento da covid-19 no Brasil em 2020. Rev Saúde Pública. 2021;55:52. .

Para controle da COVID-19 em nível mundial, uma série de medidas foram recomendadas com o objetivo de reduzir o contato físico da população, como fechamento de espaços públicos e escolas, redução de voos internacionais e, a principal delas, o distanciamento social44 Khan M, Adil SF, Alkhathlan HZ, Tahir MN, Saiif S, Khan M, Khan ST. COVID-19: a global challenge with old history, epidemiology and progress so far. Molecules. 2020;26(1):39.. Esse distanciamento social foi implementado também no Brasil com a recomendação de que atingisse mais de 55% da população para redução efetiva no número de mortes55 Cruz CHB. Social distancing in São Paulo state: demonstrating the reduction in cases using time series analysis of deaths due to COVID-19. Rev Bras Epidemiol. 2020;23:e200056.. No Brasil, evidenciaram-se características diversas na adesão ao distanciamento social: mulheres aderiram mais que homens, pessoas com maior escolaridade tiveram menor adesão, por outro lado, pessoas com maior escolaridade restringiram mais a circulação de não moradores em suas residências66 Barros AJD, Victora CG, Menezes AMB, Horta BL, Hartwig F, Victora G, Pellanda LC. et al. Padrões de distanciamento social em nove cidades gaúchas: estudo Epicovid19/RS. Rev Saúde Pública. 2020;54:75..

Além disso, observou-se diferentes níveis de adesão ao distanciamento social entre estados geograficamente e economicamente diferentes, como Ceará (43,4%) e São Paulo (37,1%)77 Mapa de Isolamento Social | COVID-19 | Coronavírus no Brasil | Inloco [Internet]. [cited 2021 Oct 21]. Available from: https://mapabrasileirodacovid.inloco.com.br/pt/.
https://mapabrasileirodacovid.inloco.com...
, além de medidas específicas de distanciamento diferentes conduzidas pelos governadores de cada estado ao longo do tempo88 Aquino EML, Silveira IH, Pescarini JM, Aquino R, Souza-Filho JA, Rocha AS, Ferreira A, Victor A, Teixeira C, et al. Social distancing measures to control the COVID-19 pandemic: Potential impacts and challenges in Brazil. Cien Saude Colet. 2020;25(Suppl 1):2423-46.. Essas condições locais de manejo da COVID-19 podem estar relacionadas com as diferentes condições de enfrentamento e de gravidade da doença ao longo do tempo, uma vez que, em Fortaleza - CE, a taxa de mortalidade foi de 191 a cada 100 mil habitantes, enquanto na cidade de São Paulo - SP foi de 125 a cada 100 mil habitantes99 Silva GAE, Jardim BC, Lotufo PA. Age-adjusted COVID-19 mortality in state capitals in different regions of Brazil. Cad Saude Publica. 2021;37(6):e00039221..

Entretanto, o distanciamento social também provocou repercussões na população com dor musculoesquelética (DME), dos quais 65,3% acreditam ter tido aumento da gravidade e 64,7% aumento da interferência da dor durante o distanciamento social nos Estados Unidos, mensurada pelo inventário breve de dor, que contempla a realização de atividades, habilidades para caminhar e apreciar a vida, trabalho, humor e sono1010 Hruschak V, Flowers KM, Azizoddin DR, Jamison RN, Edwards RR, Schreiber KL. Cross-sectional study of psychosocial and pain-related variables among patients with chronic pain during a time of social distancing imposed by the coronavirus disease 2019 pandemic. Pain. 2021;162(2):619-29..

A definição de dor é construída a partir de experiências sensoriais e emocionais desagradáveis, mas também compartilha fatores psicossociais individualizados1111 DeSantana JM. What about patients with pain during and after the COVID-19 pandemic? BrJP. 2020;3(3):292-3., como nível de estresse e ansiedade, que apresentam relação direta com grau de interferência da dor durante o distanciamento social1010 Hruschak V, Flowers KM, Azizoddin DR, Jamison RN, Edwards RR, Schreiber KL. Cross-sectional study of psychosocial and pain-related variables among patients with chronic pain during a time of social distancing imposed by the coronavirus disease 2019 pandemic. Pain. 2021;162(2):619-29.. A DME também pode ser dividida segundo o tempo de duração em aguda e crônica (superior a 3 meses) e, no Brasil, chega a atingir cerca de 45% da população em geral1212 Aguiar DP, Souza CP, Barbosa WJ, Santos-Júnior FF, Oliveira AS. Prevalence of chronic pain in Brazil: systematic review. BrJP. 2021:4(3):257-67.. Uma das possíveis formas de atuar no gerenciamento de DME aguda e crônica durante a pandemia de COVID-19 é através de estratégias que ampliem a autoeficácia do paciente para manejo dos sintomas1313 Santos Junior FFU. Autogerenciamento da dor crônica musculoesquelética durante e após o distanciamento social imposto pela pandemia de COVID-19: quais as nossas opções? In: Educação e Dor: Sementes de Um Novo Futuro. 2021..

Autoeficácia para a dor é definida como a confiança que alguém possui em lidar com sua dor, de modo que o comportamento de enfrentamento da dor passa pela crença na capacidade de prover os recursos necessários para lidar com a dor1414 Turk DC, Okifuji A. Psychological factors in chronic pain: Evolution and revolution. J. Consult Clin Psychol. 2002;70(3):678-90.. Níveis maiores de autoeficácia já foram relacionados a uma menor intensidade de dor, maior percepção de melhora clínica e menor número de sessões de fisioterapia1515 Souza CM, Martins J, Libardoni TC, de Oliveira AS. Self-efficacy in patients with chronic musculoskeletal conditions discharged from physical therapy service: a cross-sectional study. Musculoskeletal Care. 2020;18(3):365-71.. Dentre as ferramentas para agir no nível de autoeficácia para dor, estão a realização de tarefas associadas a um feedback físico e verbal. Além disso, o reconhecimento pelo paciente de que a tarefa foi realizada com sucesso pode auxiliar na manutenção do comportamento de interesse1414 Turk DC, Okifuji A. Psychological factors in chronic pain: Evolution and revolution. J. Consult Clin Psychol. 2002;70(3):678-90..

Outra possibilidade para aumentar os níveis de autoeficácia para a dor é a educação em neurociência da dor, especialmente nas primeiras semanas de tratamento, através de explicações orais, metáforas e diagramas1616 Rondon-Ramos A, Martinez-Calderon J, Diaz-Cerrillo JL, Rivas-Ruiz F, Ariza-Hurtado GR, Clavero-Cano S, Luque-Suarez A. Pain neuroscience education plus usual care is more effective than usual care alone to improve self-efficacy beliefs in people with chronic musculoskeletal pain: a non-randomized controlled trial. J Clin Med. 2020;9(7):2195.. No contexto da pandemia de COVID-19, maior autoeficácia tem sido relacionada com níveis menores de ansiedade1717 Xiong H, Yi S, Lin Y. The psychological status and self-efficacy of nurses during COVID-19 outbreak: a cross-sectional survey. Inquiry. 2020;57:46958020957114. e de estresse psicológico, de modo que pessoas com maior autoeficácia e engajamento em comportamentos preventivos contra COVID-19 têm melhor saúde mental em tempos de crise1818 Shahrour G, Dardas LA. Acute stress disorder, coping self-efficacy and subsequent psychological distress among nurses amid COVID-19. J Nurs Manag. 2020;28(7):1686-95..

A COVID-19 trouxe ainda outra limitação para a população com DME, a redução da atividade física, tanto no Brasil1919 Botero JP, Farah BQ, Correia MA, Lofrano-Prado MC, Cucato GG, Shumate G, et al. Impact of the COVID-19 pandemic stay at home order and social isolation on physical activity levels and sedentary behavior in Brazilian adults. Einstein. 2021;19:eAE6156. quanto em outros países1010 Hruschak V, Flowers KM, Azizoddin DR, Jamison RN, Edwards RR, Schreiber KL. Cross-sectional study of psychosocial and pain-related variables among patients with chronic pain during a time of social distancing imposed by the coronavirus disease 2019 pandemic. Pain. 2021;162(2):619-29.,2020 Martínez-de-Quel Ó, Suárez-Iglesias D, López-Flores M, Pérez CA. Physical activity, dietary habits and sleep quality before and during COVID-19 lockdown: a longitudinal study. Appetite. 2021;158:105019.. Nesse sentido, o distanciamento social interferiu nas estratégias físicas para o tratamento da dor1111 DeSantana JM. What about patients with pain during and after the COVID-19 pandemic? BrJP. 2020;3(3):292-3., como redução da realização de atividade física1010 Hruschak V, Flowers KM, Azizoddin DR, Jamison RN, Edwards RR, Schreiber KL. Cross-sectional study of psychosocial and pain-related variables among patients with chronic pain during a time of social distancing imposed by the coronavirus disease 2019 pandemic. Pain. 2021;162(2):619-29.,1919 Botero JP, Farah BQ, Correia MA, Lofrano-Prado MC, Cucato GG, Shumate G, et al. Impact of the COVID-19 pandemic stay at home order and social isolation on physical activity levels and sedentary behavior in Brazilian adults. Einstein. 2021;19:eAE6156.,2020 Martínez-de-Quel Ó, Suárez-Iglesias D, López-Flores M, Pérez CA. Physical activity, dietary habits and sleep quality before and during COVID-19 lockdown: a longitudinal study. Appetite. 2021;158:105019.. A prática de atividade física e exercícios são meios eficazes para tratamento de DME, e podem produzir efeitos benéficos na intensidade da dor, função física e qualidade de vida do praticante2121 Geneen LJ, Moore RA, Clarke C, Martin D, Colvin LA, Smith BH. Physical activity and exercise for chronic pain in adults: an overview of Cochrane Reviews. Cochrane Database Syst Rev. 2017;1(1):CD011279.,2222 Hayden JA, Ellis J, Ogilvie R, Malmivaara A, van Tulder MW. Exercise therapy for chronic low back pain. Cochrane Database Syst. Rev. 2021;9(9):CD009790..

Estimular a autoeficácia é um dos modos de ampliar a realização de exercícios 2323 Rajati F, Sadeghi M, Feizi A, Sharifirad G, Hasandokht T, Mostafavi F. Self-efficacy strategies to improve exercise in patients with heart failure: a systematic review. ARYA Atheroscler. 2014;10(6):319-33., inclusive em pacientes com DME2424 Martinez-Calderon J, Zamora-Campos C, Navarro-Ledesma S, Luque-Suarez A. The role of self-efficacy on the prognosis of chronic musculoskeletal pain: a systematic review. J Pain. 2018;19(1):10-34.. Entretanto, até o momento, não se observou na literatura qualquer estudo que traga a relação entre autoeficácia e atividade física na população com DME durante a pandemia de COVID-19. A relação entre nível de autoeficácia para dor e tempo de realização de atividade física na população com dor é relevante e precisa ser investigada também durante o distanciamento social. Nesse sentido, uma vez que existe correlação entre fatores sociais, biológicos e psicológicos, e variáveis relacionadas ao confinamento2525 Silva DRP, Werneck AO, Malta DC, Souza Júnior PRB, Azevedo LO, Azevedo LO, Barros MBA. Changes in the prevalence of physical inactivity and sedentary behavior during COVID-19 pandemic: A survey with 39,693 Brazilian adults. Cad Saude Publica. 2021;37(3):e00221920., a autoeficácia para a dor pode apresentar-se como alternativa a ser abordada terapeuticamente para a população com dor no contexto atual de pandemia.

O objetivo deste estudo foi analisar a associação do nível de autoeficácia e atividade física na população com dor durante o distanciamento social relacionado à pandemia de COVID-19 nos estados do Ceará e São Paulo.

MÉTODOS

As diretrizes do STrengthening the Reporting of OBservational studies in Epidemiology (STROBE Checklist) foram consideradas para o adequado relato das etapas deste estudo.

Delineamento de estudo

Este estudo se caracteriza como um estudo observacional do tipo transversal, com abordagem quantitativa não-experimental. Foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CAAE N° 40922620.4.0000.5040, parecer: 4.482.525).

Cálculo amostral, critérios e origem dos participantes

A amostra coletada foi calculada considerando o erro amostral tolerável de 5%, através da fórmula n= (N.n0) /(N+n0), pelo Microsoft Excel®. O valor do tamanho de amostra mínima aproximada calculada foi de 400 (n0) pessoas no Ceará e 400 pessoas em São Paulo, totalizando 800 pessoas. Foram incluídos indivíduos com idade superior a 18 anos, de ambos os sexos, residentes nesses estados e com relato de dor durante o distanciamento social. Foram excluídas 127 pessoas da coleta de dados, dentre os motivos se tinha a não aceitação do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) situado no início do questionário, o que não gerava respostas (4 respostas). Além disso, 123 pessoas que responderam o questionário, mas não relatavam DME durante a pandemia em suas respostas, também foram excluídas. Desse modo, obteve-se um total de 913 respondentes, sendo 431 pessoas do estado do Ceará e 482 pessoas de São Paulo.

Variáveis e descrição da coleta de dados

A coleta de dados foi realizada a partir de um formulário eletrônico com perguntas objetivas. O recrutamento de participantes foi feito por meio da divulgação do link para responder o formulário eletrônico do Google®, somado a um resumo sobre os objetivos do estudo, através das redes sociais e jornal eletrônico. O período de divulgação, acompanhamento e coleta de dados ocorreu durante os meses de dezembro de 2020 a maio de 2021. O formulário eletrônico era composto por três etapas: a primeira tratava-se da concordância com a pesquisa, através da assinatura do TCLE. A segunda continha um questionário sociodemográfico e a terceira o questionário de autoeficácia para dor, o Pain Self-Efficacy Questionnaire (PSEQ-10), para avaliação do nível de autoeficácia na população estudada.

Questionário sociodemográfico

A segunda etapa do formulário foi composta por um questionário com perguntas para a caracterização da amostra com perguntas sobre idade, sexo, peso (kg), altura (m), presença de comorbidades, relato de diagnóstico positivo de COVID-19 e estado de permanência hospitalar durante a pandemia. O índice de massa corporal (IMC) foi calculado posteriormente a partir das respostas de peso (kg) e altura (m), com a fórmula IMC=peso/altura22 Levin AT, Hanage WP, Owusu-Boaitey N, Cochran KB, Walsh SP, Meyerowitz-Katz G. Assessing the age specificity of infection fatality rates for COVID-19: systematic review, meta-analysis, and public policy implications. Eur J Epidemiol. 2020;35(12):1123-38.. Havia questões a respeito do cumprimento do distanciamento social (não, parcialmente, totalmente) e da duração da DME antes da pandemia. As respostas foram agrupadas em uma condição binária (sim/não) relativa à presença de dor crônica (superior a três meses) ou não (com duração inferior a três meses ou sem relato de dor anterior a pandemia).

Além disso, foi avaliada a média da intensidade de dor antes e durante a pandemia de forma autorrelatada, através de uma escala numérica de dor de zero a 10 pontos, na qual zero seria uma condição sem dor e 10 seria a pior dor imaginável2121 Geneen LJ, Moore RA, Clarke C, Martin D, Colvin LA, Smith BH. Physical activity and exercise for chronic pain in adults: an overview of Cochrane Reviews. Cochrane Database Syst Rev. 2017;1(1):CD011279..

Níveis de estresse e de ansiedade autorrelatados foram medidos por meio da escala de zero a 10 pontos, na qual zero corresponde a sem ansiedade/sem estresse e 10 se refere a extremamente estressado/ansioso.

A prática de atividade física foi respondida entre cinco opções (zero = não realizou prática de atividade física; 1 = menos que 30 minutos por semana; 2 = 30 a 75 minutos por semana; 3 = 75 a 150 minutos por semana; 4 = mais que 150 minutos por semana).

Autoeficácia para dor (PSEQ)

A quantificação da autoeficácia foi obtida pelo PSEQ2222 Hayden JA, Ellis J, Ogilvie R, Malmivaara A, van Tulder MW. Exercise therapy for chronic low back pain. Cochrane Database Syst. Rev. 2021;9(9):CD009790.. Este questionário, em sua versão para a língua portuguesa, possui validade e reprodutibilidade adequada (Alfa de Cronbach de 0,90)2222 Hayden JA, Ellis J, Ogilvie R, Malmivaara A, van Tulder MW. Exercise therapy for chronic low back pain. Cochrane Database Syst. Rev. 2021;9(9):CD009790.. Trata-se de 10 itens referentes à realização de tarefas cotidianas avaliados em uma escala de zero a seis, em que zero corresponde a nada confiante e seis corresponde a totalmente confiante. A pontuação total varia de zero a 60, cujas pontuações mais altas refletem crenças de autoeficácia mais fortes.

Estratégias para minimizar vieses

Como estratégias de minimização de vieses, foi utilizada linguagem simples e de fácil interpretação, evitando palavras difíceis. Além disso, foram priorizadas perguntas com respostas prontas (para assinalar), no intuito de direcionar melhor os respondentes na compreensão das perguntas, assim como na escolha de suas respostas.

Análise estatística

Os dados foram organizados no programa Microsoft Excel® e, posteriormente, processados no software GraphPad Prism®, versão 9.0. Para a caracterização da amostra, os dados foram descritos em frequência absoluta e percentual, quando categóricos. Dados numéricos foram demonstrados como média e desvio-padrão. Para identificação da associação entre autoeficácia e nível de atividade física (variável dependente) na população com dor, foi realizada regressão linear múltipla.

A seleção das variáveis para este modelo foi realizada de acordo com o Directed Acyclic Graphs (DAG)2626 Textor J, van der Zander B, Gilthorpe MS, Liśkiewicz M, Ellison GT. Robust causal inference using directed acyclic graphs: The R package “dagitty”. Int J Epidemiol. 2016;45(6):1887-94., construído com base nas seguintes variáveis categorizadas: idade (1 = 18 a 35 anos; 2 = 36 a 65 anos; 3 = acima de 65 anos), sexo (1 = masculino; 2 = feminino), presença de comorbidades (zero = não; 1 = sim), estado de permanência durante a pandemia (1 = Ceará; 2 = São Paulo), cumprimento do distanciamento social (zero = não fez distanciamento; 1 = fez distanciamento parcial, o que contemplava idas ao supermercado, farmácias e trabalho; 2 = aderiu totalmente ao distanciamento social, exceto para urgências hospitalares), DME crônica prévia superior a 3 meses antes da pandemia (1 = sim) ou com duração inferior a três meses ou sem relato de dor (zero = não).

Além disso, foram adicionadas ao modelo as seguintes variáveis contínuas: intensidade de dor antes e durante a pandemia (escala de zero a 10 pontos), níveis de estresse autorrelatado (escala de zero a 10 pontos), nível de ansiedade autorrelatado (escala de zero a 10 pontos) e IMC (Figura 1). Uma segunda regressão linear múltipla foi conduzida com a adição da variável relacionada ao diagnóstico de COVID-19, considerando a positividade ou não (zero = não; 1 = sim) durante esse período. Uma comparação entre os dois modelos também foi efetuada para identificação de um modelo a ser priorizado com o teste extra sum-of-squares F. Foi determinado um nível de significância de 5% para as análises propostas.

Figura 1
Directed Acyclic Graphs do modelo de associação entre variáveis estudadas para verificar associação entre autoeficácia para dor e tempo semanal de atividade física durante a pandemia de COVID-19.

RESULTADOS

Este estudo contou com 913 respondentes no total, sendo a maioria do sexo feminino, com idade de 18 a 35 anos, com pós-graduação e sem comorbidades. A maioria da população aderiu parcialmente ao distanciamento social, o que contemplava deslocamento ao supermercado, farmácias e trabalho. Menos de 21% dos respondentes teve diagnóstico confirmado de COVID-19. Quanto ao tempo de prática de exercício durante a pandemia, a maioria da população deste estudo estava sedentária durante a pandemia, por outro lado, menos de 20% relataram praticar mais que 150 minutos de atividade física por semana (Tabela 1). Como caracterização da massa corporal, o IMC médio foi superior a 26 kg/m2 (Tabela 2).

Tabela 1
Caracterização da amostra e hábitos de vida na população analisada nos estados do Ceará, São Paulo e em uma análise agrupada (n=913).
Tabela 2
Fatores psicossociais, dor e índice de massa corporal da população analisada nos estados do Ceará e São Paulo e em análise agrupada (n=913).

Com relação aos fatores psicossociais, observou-se autorrelato de estresse e ansiedade superior a sete/10 pontos. Além disso, identificou-se variação na intensidade de DME de aproximadamente três pontos para mais entre o relato durante a pandemia e o relato de DME preexistentes (Tabela 2).

Dois modelos de regressão linear múltipla foram previamente construídos e, no Modelo 2, foi adicionada a confirmação do diagnóstico de COVID-19 como uma possível variável de confusão. Entretanto, os modelos não apresentaram diferença entre si (p=0,534). Desta forma, optou-se por utilizar o Modelo 1 para responder à pergunta do estudo.

A autoeficácia apresentou relação direta com tempo de atividade física praticada durante a pandemia (0,01482; 95% IC 0,005456 a 0,02418; p=0,0020). Outras variáveis também apresentaram associação com maior tempo de prática de atividade física, como menor intensidade de dor durante a pandemia (-0,05863; 95% IC -0,1122 a -0,005075; p=0,0319), menor IMC (-0,03547;95% IC -0,05557 a -0,01537; p=0,0006), ser do sexo masculino (-0,4352; 95% IC 0,6527 a -0,2177; p<0,0001) e relatar ausência de comorbidades (-0,3038; 95% IC -0,5351 a 0,07254; p=0,0101) (Tabela 3).

Tabela 3
Associação entre nível de autoeficácia para dor e tempo de prática de atividade física durante o distanciamento social por COVID-19.

Foram realizadas algumas análises exploratórias no presente estudo. Na primeira análise, foi identificado nível de autoeficácia maior na população do estado do Ceará em relação ao estado de São Paulo (-4; 95% IC -4 a -1; p<0,0001), por meio do teste de Mann-Whitney. A segunda análise comparou intensidade de dor média antes da pandemia com intensidade de dor média durante a pandemia e evidenciou diferença de dois pontos na mediana do teste pareado de Wilcoxon (2; 95% IC 2 a 3; p<0,0001). Na terceira análise, correlação de Spearman negativa e moderada (r=-0,487; p<0,0001) foi identificada entre o nível de autoeficácia para dor e a intensidade de dor durante o distanciamento social imposto pela pandemia.

DISCUSSÃO

De fato, maior autoeficácia para dor foi diretamente associada a maior tempo semanal de realização de atividade física na população com dor durante o distanciamento social em São Paulo e no Ceará. Níveis mais elevados de autoeficácia para o gerenciamento de dor também já foram relacionados a uma maior prática de atividade física em pacientes com osteoartrite2727 Degerstedt Å, Alinaghizadeh H, Thorstensson CA, Olsson CB. High self-efficacy - a predictor of reduced pain and higher levels of physical activity among patients with osteoarthritis: an observational study. BMC Musculoskelet. Disord. 2020;21(1):380. e problemas cardíacos2323 Rajati F, Sadeghi M, Feizi A, Sharifirad G, Hasandokht T, Mostafavi F. Self-efficacy strategies to improve exercise in patients with heart failure: a systematic review. ARYA Atheroscler. 2014;10(6):319-33., atuando como um possível mediador da adesão à atividade física2828 Seghers J, van Hoecke AS, Schotte A, Opdenacker J, Boen F. The added value of a brief self-efficacy coaching on the effectiveness of a 12-week physical activity program. J Phys Act Health. 2014;11(1):18-29.. Desta forma, a utilização de estratégias diversificadas como educação em neurociência da dor1616 Rondon-Ramos A, Martinez-Calderon J, Diaz-Cerrillo JL, Rivas-Ruiz F, Ariza-Hurtado GR, Clavero-Cano S, Luque-Suarez A. Pain neuroscience education plus usual care is more effective than usual care alone to improve self-efficacy beliefs in people with chronic musculoskeletal pain: a non-randomized controlled trial. J Clin Med. 2020;9(7):2195. e realização de tarefas graduadas associadas com feedbacks imediatos1414 Turk DC, Okifuji A. Psychological factors in chronic pain: Evolution and revolution. J. Consult Clin Psychol. 2002;70(3):678-90. pode ser um meio de promover aumento dos níveis de autoeficácia para a dor.

O presente estudo mostrou que menos de 40% da população investigada atingiu a recomendação do tempo de prática de atividade física dos órgãos internacionais, independentemente da intensidade do exercício. A prática de atividade física possui diretrizes específicas para sua realização, de modo que o Colégio Americano de Medicina Esportiva2929 American College of Sports Medicine. ACSMs Guidelines for Exercise Testing and Prescription [Internet]. 2018 [cited 2021 Oct 21]. Available from: https://www.acsm.org/read-research/books/acsms-guidelines-for-exercise-testing-and-prescription
https://www.acsm.org/read-research/books...
sugere essas orientações para a população em geral, e a Associação Internacional para o Estudo da Dor3030 Reis FJJ, Fullen BM. Physical Activity for Pain Prevention. IASP. 2020. orienta a prática de atividade física para a população com dor crônica.

Em ambas as recomendações, o tempo a ser atingido é de 150 minutos de atividade moderada ou 75 minutos de atividade vigorosa2929 American College of Sports Medicine. ACSMs Guidelines for Exercise Testing and Prescription [Internet]. 2018 [cited 2021 Oct 21]. Available from: https://www.acsm.org/read-research/books/acsms-guidelines-for-exercise-testing-and-prescription
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,3030 Reis FJJ, Fullen BM. Physical Activity for Pain Prevention. IASP. 2020.. Considerando a atualização da diretriz de prática de atividade física publicada pela Organização Mundial da Saúde em 2020, em que o tempo passou a ser de 150 a 300 minutos de atividade moderada e 75 a 150 minutos de atividade vigorosa para adultos2929 American College of Sports Medicine. ACSMs Guidelines for Exercise Testing and Prescription [Internet]. 2018 [cited 2021 Oct 21]. Available from: https://www.acsm.org/read-research/books/acsms-guidelines-for-exercise-testing-and-prescription
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, a presente amostra apresentaria adesão ainda menor às novas recomendações, tanto para adultos quanto idosos. A baixa adesão às recomendações para a prática de atividade física observada na amostra pode ter ocorrido porque parte dos respondentes ainda se encontra no processo de retomada progressiva da frequência e/ou duração da atividade física após flexibilização das medidas de isolamento e distanciamento social, coincidindo com o momento da coleta de dados do presente estudo.

Por outro lado, cerca de 27% dos respondentes não praticavam atividade física. Já em 2019, no estudo nacional de vigilância de fatores de risco e doenças crônicas, o número de pessoas consideradas fisicamente inativas no Brasil foi de 13,9% da população3131 Vigitel. Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico [Internet]. Vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico : estimativas sobre frequência e distribuição sociodemográfica de fatores de risco e proteção para doenças crônicas nas capitais dos 26 estados. 2019. 139. Available from: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/vigitel_brasil_2019_vigilancia_fatores_risco.pdf
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, mostrando aumento substancial. Esse é um dado preocupante, pois a não adesão ao tempo recomendado de atividade física2929 American College of Sports Medicine. ACSMs Guidelines for Exercise Testing and Prescription [Internet]. 2018 [cited 2021 Oct 21]. Available from: https://www.acsm.org/read-research/books/acsms-guidelines-for-exercise-testing-and-prescription
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,3030 Reis FJJ, Fullen BM. Physical Activity for Pain Prevention. IASP. 2020. pode influenciar a intensidade de DME2121 Geneen LJ, Moore RA, Clarke C, Martin D, Colvin LA, Smith BH. Physical activity and exercise for chronic pain in adults: an overview of Cochrane Reviews. Cochrane Database Syst Rev. 2017;1(1):CD011279.. Além disso, a prática de atividade física foi comprometida em diversos países1010 Hruschak V, Flowers KM, Azizoddin DR, Jamison RN, Edwards RR, Schreiber KL. Cross-sectional study of psychosocial and pain-related variables among patients with chronic pain during a time of social distancing imposed by the coronavirus disease 2019 pandemic. Pain. 2021;162(2):619-29.,1919 Botero JP, Farah BQ, Correia MA, Lofrano-Prado MC, Cucato GG, Shumate G, et al. Impact of the COVID-19 pandemic stay at home order and social isolation on physical activity levels and sedentary behavior in Brazilian adults. Einstein. 2021;19:eAE6156.,2424 Martinez-Calderon J, Zamora-Campos C, Navarro-Ledesma S, Luque-Suarez A. The role of self-efficacy on the prognosis of chronic musculoskeletal pain: a systematic review. J Pain. 2018;19(1):10-34. com a pandemia de COVID-19, o que pode ter reforçado o comportamento sedentário na população2525 Silva DRP, Werneck AO, Malta DC, Souza Júnior PRB, Azevedo LO, Azevedo LO, Barros MBA. Changes in the prevalence of physical inactivity and sedentary behavior during COVID-19 pandemic: A survey with 39,693 Brazilian adults. Cad Saude Publica. 2021;37(3):e00221920., inclusive na população com dor.

A relação inversa do tempo de prática de atividade física e intensidade de dor durante a pandemia também foi observada no presente modelo multivariado. Exercícios e atividade física já foram amplamente relatados na literatura como um caminho possível para reduzir intensidade de dor, tanto em condições de dores crônicas musculoesqueléticas em geral2121 Geneen LJ, Moore RA, Clarke C, Martin D, Colvin LA, Smith BH. Physical activity and exercise for chronic pain in adults: an overview of Cochrane Reviews. Cochrane Database Syst Rev. 2017;1(1):CD011279. quanto em locais específicos, como na coluna lombar1616 Rondon-Ramos A, Martinez-Calderon J, Diaz-Cerrillo JL, Rivas-Ruiz F, Ariza-Hurtado GR, Clavero-Cano S, Luque-Suarez A. Pain neuroscience education plus usual care is more effective than usual care alone to improve self-efficacy beliefs in people with chronic musculoskeletal pain: a non-randomized controlled trial. J Clin Med. 2020;9(7):2195.,2222 Hayden JA, Ellis J, Ogilvie R, Malmivaara A, van Tulder MW. Exercise therapy for chronic low back pain. Cochrane Database Syst. Rev. 2021;9(9):CD009790. e ombro3232 Pieters L, Lewis J, Kuppens K, Jochems J, Bruijstens T, Joossens L, Struyf F. An update of systematic reviews examining the effectiveness of conservative physical therapy interventions for subacromial shoulder pain. J Orthop Sports Phys Ther. 2020;50(3):131-41.,3333 Hotta GH, Gomes de Assis Couto A, Cools AM, McQuade KJ, Siriane de Oliveira A. Effects of adding scapular stabilization exercises to a periscapular strengthening exercise program in patients with subacromial pain syndrome: a randomized controlled trial. Musculoskelet Sci Pract. 2020;49:102171.. Entretanto, dores crônicas preexistentes não apresentaram relação com duração semanal de atividade física neste modelo, de modo que o contexto atual da pandemia apresentou maior influência com o tempo de prática de atividade física.

Outras variáveis do modelo também apresentaram associação com maior tempo de prática de atividade física, como menor IMC e ser do sexo masculino. A identificação de sobrepeso já está associada a impacto no nível de atividade física durante a pandemia de COVID-191919 Botero JP, Farah BQ, Correia MA, Lofrano-Prado MC, Cucato GG, Shumate G, et al. Impact of the COVID-19 pandemic stay at home order and social isolation on physical activity levels and sedentary behavior in Brazilian adults. Einstein. 2021;19:eAE6156..

Além disso, a prática de atividade física por mais tempo semanal tende a proporcionar perda de peso e redução da obesidade abdominal2929 American College of Sports Medicine. ACSMs Guidelines for Exercise Testing and Prescription [Internet]. 2018 [cited 2021 Oct 21]. Available from: https://www.acsm.org/read-research/books/acsms-guidelines-for-exercise-testing-and-prescription
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. Em relação ao sexo dos participantes, tem-se três observações diferentes na literatura. O primeiro estudo não apresentou diferença entre os sexos no que diz respeito ao nível de atividade física1919 Botero JP, Farah BQ, Correia MA, Lofrano-Prado MC, Cucato GG, Shumate G, et al. Impact of the COVID-19 pandemic stay at home order and social isolation on physical activity levels and sedentary behavior in Brazilian adults. Einstein. 2021;19:eAE6156., já o segundo e o terceiro estudos apresentam o sexo masculino como mais fisicamente ativo, tanto em condições anteriores à pandemia3131 Vigitel. Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico [Internet]. Vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico : estimativas sobre frequência e distribuição sociodemográfica de fatores de risco e proteção para doenças crônicas nas capitais dos 26 estados. 2019. 139. Available from: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/vigitel_brasil_2019_vigilancia_fatores_risco.pdf
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, quanto durante a pandemia2525 Silva DRP, Werneck AO, Malta DC, Souza Júnior PRB, Azevedo LO, Azevedo LO, Barros MBA. Changes in the prevalence of physical inactivity and sedentary behavior during COVID-19 pandemic: A survey with 39,693 Brazilian adults. Cad Saude Publica. 2021;37(3):e00221920.. Essa diferença na prática de atividade física entre homens e mulheres pode estar relacionada a hábitos de distanciamento distintos, com o sexo masculino aderindo menos ao distanciamento66 Barros AJD, Victora CG, Menezes AMB, Horta BL, Hartwig F, Victora G, Pellanda LC. et al. Padrões de distanciamento social em nove cidades gaúchas: estudo Epicovid19/RS. Rev Saúde Pública. 2020;54:75.. Por outro lado, observa-se também aumento do comportamento sedentário no sexo feminino, com mais tempo de televisão e utilização de tablets/computadores durante a pandemia2525 Silva DRP, Werneck AO, Malta DC, Souza Júnior PRB, Azevedo LO, Azevedo LO, Barros MBA. Changes in the prevalence of physical inactivity and sedentary behavior during COVID-19 pandemic: A survey with 39,693 Brazilian adults. Cad Saude Publica. 2021;37(3):e00221920..

As demais variáveis (dor crônica antes da pandemia, estado da federação de domicílio durante o distanciamento social, nível de ansiedade, nível de estresse, idade e confirmação de diagnóstico de COVID-19) não mostraram associação com o modelo. Nesse contexto, não foi observada diferença do tempo semanal de atividade física entre os estados brasileiros estudados, mesmo eles apresentando características diferentes tanto na adesão ao distanciamento social77 Mapa de Isolamento Social | COVID-19 | Coronavírus no Brasil | Inloco [Internet]. [cited 2021 Oct 21]. Available from: https://mapabrasileirodacovid.inloco.com.br/pt/.
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, quanto na adesão ao tempo de 150 minutos de atividade física semanal antes da pandemia3131 Vigitel. Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico [Internet]. Vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico : estimativas sobre frequência e distribuição sociodemográfica de fatores de risco e proteção para doenças crônicas nas capitais dos 26 estados. 2019. 139. Available from: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/vigitel_brasil_2019_vigilancia_fatores_risco.pdf
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. Quanto à comparação dos modelos estatísticos propostos, o diagnóstico de COVID-19 não foi determinante para a construção de um modelo que pudesse representar como a autoeficácia para dor influenciou na prática de tempos maiores de atividade física durante o distanciamento social.

Possíveis implicações para clínicos e direcionamentos futuros

Os dados foram coletados durante a pandemia de COVID-19 e condutas direcionadas para a melhora da autoeficácia para a dor podem ser uma alternativa para ampliar o tempo semanal de atividade física da população com dor durante a pandemia, inclusive via telerreabilitação. É fundamental para os clínicos desenvolverem habilidades de atuação com estratégias de autoeficácia para a dor em ambiente clínico para ampliar o tempo semanal de atividade física, com o intuito de ampliar a capacidade de manejo de condições dolorosas musculoesqueléticas. Com esse aumento da atividade física, acredita-se que a intensidade de dor pode ser modulada de modo mais eficiente, conforme já descrito na literatura2121 Geneen LJ, Moore RA, Clarke C, Martin D, Colvin LA, Smith BH. Physical activity and exercise for chronic pain in adults: an overview of Cochrane Reviews. Cochrane Database Syst Rev. 2017;1(1):CD011279.,2222 Hayden JA, Ellis J, Ogilvie R, Malmivaara A, van Tulder MW. Exercise therapy for chronic low back pain. Cochrane Database Syst. Rev. 2021;9(9):CD009790.. Além disso, deve-se investigar o efeito moderador do nível de autoeficácia no tempo de prática de atividade física em um estudo longitudinal.

Limitações do estudo

O estudo apresentou algumas limitações. A primeira é que o estudo é composto por uma população com elevado nível de escolaridade, o que pode ser divergente caso os dados sejam extrapolados para a população em geral. A segunda é relacionada à identificação da intensidade do exercício, se moderado ou vigoroso, pois exercícios vigorosos podem ser executados com duração semanal menor que os exercícios moderados, segundo as recomendações internacionais2929 American College of Sports Medicine. ACSMs Guidelines for Exercise Testing and Prescription [Internet]. 2018 [cited 2021 Oct 21]. Available from: https://www.acsm.org/read-research/books/acsms-guidelines-for-exercise-testing-and-prescription
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,3030 Reis FJJ, Fullen BM. Physical Activity for Pain Prevention. IASP. 2020.. Além disso, a individualização do exercício e o grau de conhecimento dos respondentes sobre o que seria considerado com uma intensidade vigorosa ou moderada para eles poderia ter interpretações diversas, dificultando a classificação, especialmente pela população com menor nível de escolaridade. A terceira limitação está relacionada às perguntas sobre dor nos momentos que antecedem a pandemia, pois o viés de memorização pode interferir na confiança das respostas encontradas. Por fim, a última limitação é que, por se tratar de uma coleta de dados dependente de internet, a população sem acesso a internet pode não ter sido efetivamente representada.

CONCLUSÃO

Identificou-se associação entre autoeficácia para dor e tempo de prática de atividade física na população com DME durante o distanciamento social imposto pela pandemia de COVID-19 nos dois estados brasileiros investigados. Outros fatores também foram relacionados com maior tempo semanal de atividade física, como menor intensidade de dor durante a pandemia, ser do sexo masculino e relatar ausência de comorbidades.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Set 2022
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 2022

Histórico

  • Recebido
    12 Abr 2022
  • Aceito
    22 Jul 2022
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