Acessibilidade / Reportar erro

Limiares de dor experimental e características psicossociais ao longo do ciclo menstrual na dor miofascial orofacial em comparação com indivíduos saudáveis: estudo transversal

RESUMO

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS:

O impacto do ciclo menstrual na percepção da dor é um foco importante de estudo, sendo necessária uma maior elucidação na disfunção temporomandibular (DTM). Assim, este estudo transversal avaliou limiares de dor experimental, características psicossociais e relatos de dor em mulheres com DTM ao longo do ciclo menstrual, comparadas com controles saudáveis.

MÉTODOS:

220 prontuários de mulheres foram analisados, sendo 80 selecionados para os grupos de controle (saudáveis, n=40) e DTM (dor miofascial, n=40). Nas fases do ciclo menstrual, as pacientes foram divididas nas categorias Pré-Luteal e Luteal. Os instrumentos Escala de Estresse Percebido (PSS), Escala de Pensamentos Catastróficos (PCS), Limiar de Dor Mecânica (MPT), Wind-up Ratio (WUR), Limiar de Dor à Pressão (PPT), Modulação Condicionada da Dor (CPM) e Escala analógica visual (EAV) foram analisados com nível de significância de 5%, pelos testes ANOVA de dois fatores e Tukey post hoc.

RESULTADOS:

As escalas PSS e PCS foram significativamente diferentes entre os grupos DTM e controle (p<0,001), independentemente do ciclo menstrual. Indivíduos saudáveis na fase luteal apresentaram MPT maior em comparação com outras fases (p,0,001). O PPT mostrou diferença significativa entre as fases menstruais (p=0,022), sem diferença nas comparações múltiplas. Os valores da EAV não apresentaram diferença entre as fases menstruais (p=376).

CONCLUSÃO:

Indivíduos saudáveis na fase luteal têm MPT e PPTl maior na região orofacial. Os relatos de dor em pacientes com DTM não mostraram diferença ao longo do ciclo menstrual, indicando que pequenas alterações nos limiares experimentais podem ser clinicamente relevantes. A presença de dor crônica parece estar mais relacionada com características psicossociais do que com flutuações hormonais.

Descritores
Ciclo menstrual; Dor crônica; Hormônios gonodais; Limiar da dor; Síndrome da disfunção da articulação temporomandibular

ABSTRACT

BACKGROUND AND OBJECTIVES:

The hormonal impact on pain perception during the menstrual cycle is a major focus of study, and further elucidation in temporomandibular disorders (TMD) field is necessary. Thus, this cross-sectional study evaluated experimental pain thresholds, psychosocial features, and clinical pain report on TMD women across menstrual cycle versus healthy controls.

METHODS:

A total of 220 women’s clinical files were screened, with 80 selected and divided into control group (healthy individuals, n=40) and TMD group (myofascial pain, n=40). Regarding the menstrual cycle phases, the files were divided into Pre-Luteal and Luteal. The Perceived Stress Scale (PSS), Pain Catastrophizing Scale (PCS), Mechanical Pain Threshold (MPT), Wind-up (WUR), Pressure Pain Threshold (PPT), Conditioned Pain Modulation (CPM) and Visual Analogue Scale (VAS) were analyzed at a 5% significance level, by Two-Way ANOVA test and post hoc Tukey test.

RESULTS:

PSS and PCS were significantly different between TMD and control group (p<0.001), regardless of menstrual cycle. Healthy individuals in the Luteal phase presented higher MPT values compared to the other phases (p<0.001). PPT showed significant difference across menstrual phases (p=0.022), but no differences in multiple comparisons. VAS values showed no difference between menstrual cycle phases (p=0.376).

CONCLUSION:

Finally, healthy individuals in the Luteal phase have higher MPT and PPT values on the orofacial region. Pain report in patients with TMD showed no difference throughout the menstrual cycle, showing that small alterations on experimental pain thresholds may not be clinically relevant. The presence of chronic pain seems to be more related to psychosocial features than hormonal fluctuations.

Keywords
Chronic pain; Gonadal hormones; Menstrual cycle; Pain threshold; Temporomandibular joint dysfunction syndrome

INTRODUÇÃO

As disfunções temporomandibulares (DTM) são caracterizadas por dor e/ou comprometimento das funções da articulação temporomandibular (ATM), dos músculos mastigatórios e/ou de estruturas associadas11 LeResche L, Mancl L, Sherman JJ, Gandara B, Dworkin SF. Changes in temporomandibular pain and other symptoms across the menstrual cycle. Pain. 2003;106(3):253-61.

2 Slade GD, Fillingim RB, Sanders AE, Bair E, Greenspan JD, Ohrbach R, et al. Summary of Findings From the OPPERA Prospective Cohort Study of Incidence of First-Onset Temporomandibular Disorder: Implications and Slade GD, Fillingim RB, Sanders AE, Bair E, Greenspan JD, Ohrbach R, Dubner R, Diatchenko L, Smith SB, Knott C, Maixner W. Summary of findings from the OPPERA prospective cohort study of incidence of first-onset temporomandibular disorder: implications and future directions. J Pain. 2013;14(12 Suppl):T116-24.
-33 Krunic J, Mladenovic I, Radovic I, Stojanovic N. Changes in pulp sensitivity across the menstrual cycle in healthy women and women with temporomandibular disorders. J Oral Rehabil. 2021;48(2):124-31.. Estudos epidemiológicos revelam que as DTM são mais prevalentes nas mulheres, que procuram tratamento para a dor com maior frequência do que os homens, à semelhança de outras condições crônicas músculo-esqueléticas22 Slade GD, Fillingim RB, Sanders AE, Bair E, Greenspan JD, Ohrbach R, et al. Summary of Findings From the OPPERA Prospective Cohort Study of Incidence of First-Onset Temporomandibular Disorder: Implications and Slade GD, Fillingim RB, Sanders AE, Bair E, Greenspan JD, Ohrbach R, Dubner R, Diatchenko L, Smith SB, Knott C, Maixner W. Summary of findings from the OPPERA prospective cohort study of incidence of first-onset temporomandibular disorder: implications and future directions. J Pain. 2013;14(12 Suppl):T116-24.,44 Maurer AJ, Lissounov A, Knezevic I, Candido KD, Knezevic NN. Pain and sex hormones: a review of current understanding. Pain Manag. 2016;6(3):285-96.. Devido à maior frequência dessas condições nas mulheres, muitos autores deduzem e sugerem a existência de um fator que diferencia ambos os sexos na manutenção e percepção da dor44 Maurer AJ, Lissounov A, Knezevic I, Candido KD, Knezevic NN. Pain and sex hormones: a review of current understanding. Pain Manag. 2016;6(3):285-96.

5 Racine M, Tousignant-Laflamme Y, Kloda LA, Dion D, Dupuis G, Choinire M. A systematic literature review of 10 years of research on sex/gender and experimental pain perception - Part 1: Are there really differences between women and men? Pain. 2012;153(3):602-18.

6 Sherman JJ, LeResche L. Does experimental pain response vary across the menstrual cycle? A methodological review. Am J Physiol Regul Integr Comp Physiol. 2006;291(2):R245-56.

7 Paller CJ, Campbell CM, Edwards RR, Dobs AS. Sex-based differences in pain perception and treatment. Pain Med. 2009;10(2):289-99.
-88 Athnaiel O, Cantillo S, Paredes S, Knezevic NN. The role of sex hormones in pain-related conditions. Int J Mol Sci. 2023;;24(3):1866-76., relacionado a discrepâncias hormonais55 Racine M, Tousignant-Laflamme Y, Kloda LA, Dion D, Dupuis G, Choinire M. A systematic literature review of 10 years of research on sex/gender and experimental pain perception - Part 1: Are there really differences between women and men? Pain. 2012;153(3):602-18.,77 Paller CJ, Campbell CM, Edwards RR, Dobs AS. Sex-based differences in pain perception and treatment. Pain Med. 2009;10(2):289-99.

8 Athnaiel O, Cantillo S, Paredes S, Knezevic NN. The role of sex hormones in pain-related conditions. Int J Mol Sci. 2023;;24(3):1866-76.

9 Hassan S, Muere A, Einstein G. Ovarian hormones and chronic pain: a comprehensive review. Pain. 2014;155(12):2448-60.
-1010 Martin VT. Ovarian hormones and pain response: a review of clinical and basic science studies. Gend Med. 2009;6(Part 2):168-92..

Os hormônios gonadais apresentam níveis diferentes em homens e mulheres, e as evidências sugerem o envolvimento do eixo hipotálamo-hipófise-gonadal (HHG)44 Maurer AJ, Lissounov A, Knezevic I, Candido KD, Knezevic NN. Pain and sex hormones: a review of current understanding. Pain Manag. 2016;6(3):285-96.,88 Athnaiel O, Cantillo S, Paredes S, Knezevic NN. The role of sex hormones in pain-related conditions. Int J Mol Sci. 2023;;24(3):1866-76.,1111 Aloisi AM, Buonocore M, Merlo L, Galandra C, Sotgiu A, Bacchella L, Ungaretti M, Demartini L, Bonezzi C. Chronic pain therapy and hypothalamic-pituitary-adrenal axis impairment. Psychoneuroendocrinology. 2011;36(7):1032-9.. O estrogênio e a progesterona parecem apresentar efeitos moduladores na nocicepção, e sua flutuação ao longo do ciclo menstrual pode levar a alterações na percepção da dor99 Hassan S, Muere A, Einstein G. Ovarian hormones and chronic pain: a comprehensive review. Pain. 2014;155(12):2448-60.,1010 Martin VT. Ovarian hormones and pain response: a review of clinical and basic science studies. Gend Med. 2009;6(Part 2):168-92.,1212 Rhudy JL, Bartley EJ. The effect of the menstrual cycle on affective modulation of pain and nociception in healthy women. Pain. 2010;149(2):365-72.

13 Craft RM. Modulation of pain by estrogens. Pain. 2007;132(Suppl1):S3.
-1414 Nasser SA, Afify EA. Sex differences in pain and opioid mediated antinociception : Modulatory role of gonadal hormones. Life Sci. 2019;237:116926.. Além disso, o humor e a sensibilização periférica a estímulos externos são comprovadamente modulados pelo estrogênio e pela progesterona. Esse conjunto de efeitos pode afetar os limiares e a percepção da dor11 LeResche L, Mancl L, Sherman JJ, Gandara B, Dworkin SF. Changes in temporomandibular pain and other symptoms across the menstrual cycle. Pain. 2003;106(3):253-61.,77 Paller CJ, Campbell CM, Edwards RR, Dobs AS. Sex-based differences in pain perception and treatment. Pain Med. 2009;10(2):289-99.,99 Hassan S, Muere A, Einstein G. Ovarian hormones and chronic pain: a comprehensive review. Pain. 2014;155(12):2448-60..

Portanto, a influência dos hormônios sexuais e do ciclo menstrual no comportamento da dor não está bem estabelecida. Alguns autores não encontraram diferenças nos limiares de dor ao longo do ciclo menstrual1515 Vignolo V, Vedolin GM, de Araujo C dos RP, Rodrigues Conti PC. Influence of the menstrual cycle on the pressure pain threshold of masticatory muscles in patients with masticatory myofascial pain. Oral Surgery, Oral Med Oral Pathol Oral Radiol Endodontology. 2008;105(3):308-15. e outros encontraram, mas em estágios divergentes11 LeResche L, Mancl L, Sherman JJ, Gandara B, Dworkin SF. Changes in temporomandibular pain and other symptoms across the menstrual cycle. Pain. 2003;106(3):253-61.,1616 Drobek W, Schoenaers J, De Laat A. Hormone-dependent fluctuations of pressure pain threshold and tactile threshold of the temporalis and masseter muscle. J Oral Rehabil. 2002;29(11):1042-51.

17 Cimino R, Farella M, Michelotti A, Pugliese R, Martina R. Does the ovarian cycle influence the pressure-pain threshold of the masticatory muscles in symptom-free women? J Orofac Pain. 2000;14(2):105-11.

18 Isselée H, De Laat A, De Mot B, Lysens R. Pressure-pain threshold variation in temporomandibular disorder myalgia over the course of the menstrual cycle. J Orofac Pain. 2002;16(2):105-17.

19 Sherman JJ, LeResche L, Mancl LA, Huggins K, Sage JC, Dworkin SF. Cyclic effects on experimental pain response in women with temporomandibular disorders. J Orofac Pain. 2005;19(2):133-43.
-2020 Vilanova L, Goncalves T, Meirelles L, Garcia R. Hormonal fluctuations intensify temporomandibular disorder pain without impairing masticatory function. Int J Prosthodont. 2015;28(1):72-4.. Devido às discrepâncias nas metodologias e nos resultados encontrados na literatura científica, mais estudos que avaliem o papel dessas variáveis na dor contribuiriam para uma melhor compreensão do comportamento e do controle da dor. Assim, o objetivo do presente estudo foi avaliar os limiares experimentais de dor, as características psicossociais e o relato clínico de dor em mulheres com diagnóstico de DTM ao longo do ciclo menstrual em comparação com indivíduos saudáveis. A hipótese nula é que os limiares de dor e as características psicossociais não variam ao longo do ciclo menstrual, não resultando em facilitação da dor.

MÉTODOS

O presente estudo retrospectivo transversal foi conduzido de acordo com a Declaração de Helsinque e as diretrizes STROBE (The Strengthening the Reporting of Observational Studies in Epidemiology)2121 von Elm E, Altman DG, Egger M, Pocock SJ, Gøtzsche PC, Vandenbroucke JP. The strengthening the reporting of observational studies in epidemiology (STROBE) statement: guidelines for reporting observational studies. Int J Surg. 2014;12(12):1495-9. para estudos transversais (Aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa local - Parecer número 82201818.3.0000.5417).

Arquivos com dados coletados em uma Faculdade de Odontologia e em um ambulatório de Dor Orofacial, de outubro de 2018 a março de 2020, de uma população do sudoeste do Brasil, foram selecionados, resultando em 220 arquivos, que foram submetidos a uma análise minuciosa de acordo com os critérios de inclusão/exclusão.

Os critérios iniciais de exclusão foram arquivos sem dados precisos sobre o primeiro dia do ciclo menstrual, pacientes sob uso de contraceptivos orais, injetáveis e/ou intrauterinos ou realizando qualquer terapia de reposição hormonal. Além disso, indivíduos com problemas médicos e/ou distúrbios neurológicos também foram excluídos. Os critérios de inclusão selecionaram mulheres entre 18 e 49 anos de idade, com ciclos menstruais regulares, entre 26 e 33 dias, sem distúrbios ginecológicos, que foram examinadas de acordo com os Critérios de Diagnóstico de Pesquisa para Desordens Temporomandibulares (Research Diagnostic Criteria for Temporomandibular Disorders - DC/TMD)2222 Schiffman E, Ohrbach R, Truelove E, Look J, Anderson G, Goulet JP, List T, Svensson P, Gonzalez Y, Lobbezoo F, Michelotti A, Brooks SL, Ceusters W, Drangsholt M, Ettlin D, Gaul C, Goldberg LJ, Haythornthwaite JA, Hollender L, Jensen R, John MT, De Laat A, de Leeuw R, Maixner W, van der Meulen M, Murray GM, Nixdorf DR, Palla S, Petersson A, Pionchon P, Smith B, Visscher CM, Zakrzewska J, Dworkin SF; International RDC/TMD Consortium Network, International association for Dental Research; Orofacial Pain Special Interest Group, International Association for the Study of Pain. Diagnostic Criteria for Temporomandibular Disorders (DC/TMD) for Clinical and Research Applications: recommendations of the International RDC/TMD Consortium Network* and Orofacial Pain Special Interest Group†. J Oral Facial Pain Headache. 2014;28(1):6-27.. As pacientes que apresentavam dor muscular mastigatória (temporal ou masseter) afetada pelo movimento, função ou parafunção da mandíbula, com dor que provocava ou exacerbava a palpação muscular, foram diagnosticadas com mialgia.

Com relação à presença de DTM, as pacientes foram divididos em dois grupos: DTM (diagnóstico de dor miofascial) e controle (indivíduos saudáveis). Em relação à fase do ciclo menstrual, as pacientes foram divididas em dois grupos: Fase pré-luteal (quando avaliadas entre o primeiro e o 14º dia do ciclo menstrual) e fase luteal (quando avaliadas no 15º dia do ciclo ou após). As variáveis incluídas na análise foram os questionários validados no Brasil da Escala de Estresse Percebido (Perceived Stress Scale - PSS) e da Escala de Catastrofização da Dor (Pain Catastrophizing Scale - PCS), o Limiar Mecânico de Dor (Mechanical Pain Threshold - MPT), a Razão Wind-up (Wind-up Ratio - WUR), o Limiar de Dor por Pressão (Pressure Pain Threshold - PPT) e a Modulação Condicionada da Dor (Conditioned Pain Modulation - CPM) do protocolo Quantitative Sensory Testing (QST)2323 Rolke R, Baron R, Maier C, Tölle TR, Treede -DR, Beyer A, Binder A, Birbaumer N, Birklein F, Bötefür IC, Braune S, Flor H, Huge V, Klug R, Landwehrmeyer GB, Magerl W, Maihöfner C, Rolko C, Schaub C, Scherens A, Sprenger T, Valet M, Wasserka B. Quantitative sensory testing in the German Research Network on Neuropathic Pain (DFNS): standardized protocol and reference values. Pain. 2006;123(3):231-43., e a Escala Analógica Visual (EAV), coletada somente do grupo DTM. Todas as variáveis incluídas foram coletadas com o uso de um protocolo padronizado.

Escala de Estresse Percebido (PSS)

Esse questionário consistiu em 14 itens destinados a medir o grau de estresse percebido no último mês, considerando o contexto global do indivíduo e o quanto os entrevistados avaliam suas vidas como imprevisíveis, incontroláveis e sobrecarregadas. A pontuação total podia variar de zero a 56, com base na soma da pontuação de cada item24.

Escala de Catastrofização da Dor (PCS)

Esse questionário mediu os pensamentos catastróficos sobre a dor, especialmente na fase de dor intensa, por meio da indicação da frequência com que os indivíduos têm pensamentos catastróficos sobre sua dor. A PCS é composta por 13 afirmações de pensamentos catastróficos sobre a dor com uma escala de frequência que varia de 0 a 5 (0 = quase nunca e 5 = quase sempre). A pontuação total foi calculada pela soma de todos os itens marcados e variou de 0 a 52 pontos. Quanto maior o valor, maior o grau de catastrofização2525 Sehn F, Chachamovich E, Vidor LP, Dall-Agnol L, de Souza IC, Torres IL, Fregni F, Caumo W. Cross-cultural adaptation and validation of the Brazilian Portuguese version of the pain catastrophizing scale. Pain Med. 2012;13(11):1425-35..

Teste Sensorial

Este estudo avaliou três parâmetros da bateria de testes da QST para avaliação somatossensorial mecânica no lado dominante para o grupo controle (região de inserção do masseter) e no lado em que o paciente relatou dor mais intensa durante o exame clínico para o grupo DTM. A bateria de testes da QST consistiu em (a) MPT, (b) WUR e (c) PPT.

Limiar Mecânico de Dor (MPT)

O teste MPT consiste no uso de monofilamentos adaptados por Semmes-Weinstein para determinar o limiar de dor mecânica. O kit contém 20 monofilamentos Von Frey de nylon com diferentes diâmetros calibrados para exercer forças específicas, variando de 0,008 a 300 g/mm2, aumentando à medida que o calibre do monofilamento também aumenta. Cada monofilamento foi colocado perpendicularmente à região a ser avaliada e uma leve pressão foi aplicada até que o filamento se dobrasse. As participantes foram instruídas a relatar verbalmente quando sentissem uma sensação de “pontada, alfinetada ou picada levemente dolorosa” na área de contato dos monofilamentos.

Os testes começaram com um filamento de menor calibre (0,008 g/mm2), que foi aumentado sequencialmente até que o voluntário relatasse verbalmente ter sentido uma picada levemente dolorosa, conforme instruído anteriormente. Isso foi considerado um estímulo positivo. Também se buscou um estímulo negativo. Em ordem inversa, foi aplicado um filamento de menor calibre até que o voluntário não sentisse mais a aplicação do estímulo tátil nocivo (toque e não uma picada dolorosa). Foram obtidos cinco estímulos negativos (descendentes) e cinco estímulos positivos (ascendentes), e a média geométrica dessas repetições foi calculada2323 Rolke R, Baron R, Maier C, Tölle TR, Treede -DR, Beyer A, Binder A, Birbaumer N, Birklein F, Bötefür IC, Braune S, Flor H, Huge V, Klug R, Landwehrmeyer GB, Magerl W, Maihöfner C, Rolko C, Schaub C, Scherens A, Sprenger T, Valet M, Wasserka B. Quantitative sensory testing in the German Research Network on Neuropathic Pain (DFNS): standardized protocol and reference values. Pain. 2006;123(3):231-43.,2626 Rolke R, Magerl W, Campbell KA, Schalber C, Caspari S, Birklein F, Treede RD. Quantitative sensory testing: a comprehensive protocol for clinical trials. Eur J Pain. 2006;10(1):77-88..

Razão Wind-up (WUR)

O teste foi realizado com o menor filamento de Von Frey, que causou uma sensação de dor leve. O filamento escolhido foi colocado na pele sobre a região do músculo masseter e a pressão foi aplicada até que o filamento se dobrasse. Esse teste foi realizado em uma sequência contínua em que a intensidade de um único estímulo doloroso com o filamento foi comparada com a de uma série de 10 estímulos consecutivos com o mesmo filamento e com a mesma intensidade de força (1 por segundo aplicado em uma área de 1 cm2). Essa sequência foi repetida três vezes e os valores de intensidade da dor de zero (sem dor) a 100 (pior dor) foram quantificados usando uma escala de classificação numérica (NRS) em dois momentos: (1) após o estímulo único e (2) no final da série de 10 estímulos consecutivos. A WUR foi calculado pela razão da soma temporal da dor, dividindo a intensidade média da dor relatada na série de 10 estímulos consecutivos pela intensidade média da dor relatada durante o estímulo único2323 Rolke R, Baron R, Maier C, Tölle TR, Treede -DR, Beyer A, Binder A, Birbaumer N, Birklein F, Bötefür IC, Braune S, Flor H, Huge V, Klug R, Landwehrmeyer GB, Magerl W, Maihöfner C, Rolko C, Schaub C, Scherens A, Sprenger T, Valet M, Wasserka B. Quantitative sensory testing in the German Research Network on Neuropathic Pain (DFNS): standardized protocol and reference values. Pain. 2006;123(3):231-43.,2626 Rolke R, Magerl W, Campbell KA, Schalber C, Caspari S, Birklein F, Treede RD. Quantitative sensory testing: a comprehensive protocol for clinical trials. Eur J Pain. 2006;10(1):77-88..

Limiar de Dor por Pressão (PPT)

As medições do PPT foram realizadas com um algômetro de pressão, com uma ponta circular plana de 1 cm2, por meio da qual foi aplicada uma pressão constante e crescente de aproximadamente 0,5 kg/cm2/s. Antes do exame, os indivíduos foram treinados para pressionar o botão que registra a força aplicada pelo dispositivo quando a sensação de pressão se transforma em um estímulo levemente doloroso (limiar de dor por pressão). Foram obtidas três medidas na sequência e a média aritmética foi considerada como o valor do PPT2323 Rolke R, Baron R, Maier C, Tölle TR, Treede -DR, Beyer A, Binder A, Birbaumer N, Birklein F, Bötefür IC, Braune S, Flor H, Huge V, Klug R, Landwehrmeyer GB, Magerl W, Maihöfner C, Rolko C, Schaub C, Scherens A, Sprenger T, Valet M, Wasserka B. Quantitative sensory testing in the German Research Network on Neuropathic Pain (DFNS): standardized protocol and reference values. Pain. 2006;123(3):231-43.,2626 Rolke R, Magerl W, Campbell KA, Schalber C, Caspari S, Birklein F, Treede RD. Quantitative sensory testing: a comprehensive protocol for clinical trials. Eur J Pain. 2006;10(1):77-88..

Modulação Condicionada da Dor (CPM)

Foi realizado um paradigma sequencial de CPM. Depois de medir o PPT, conforme explicado acima, o indivíduo foi instruído a mergulhar imediatamente a mão contralateral (em relação ao local do teste de PPT) em um recipiente resfriado com água por no máximo 1 minuto. No caso do grupo DTM, foi a mão do lado com menos dor. Antes do teste, o participante foi instruído a relatar a intensidade da dor em uma NRS imediatamente após a imersão da mão na água em uma determinada temperatura que estava diminuindo. Quando o indivíduo relatava intensidade de dor ≥ 03 na NRS, a temperatura era considerada para o teste. Por meio desse parâmetro, a temperatura variou entre 10°C e 16°C entre os participantes. O primeiro PPT foi considerado o estímulo de teste (ET) e a imersão da mão em água resfriada foi o estímulo de condicionamento (EC). Assim, o valor da CPM foi calculado como a diferença absoluta entre “ET e EC”2727 Yarnitsky D, Bouhassira D, Drewes AM, Fillingim RB, Granot M, Hansson P, Landau R, Marchand S, Matre D, Nilsen KB, Stubhaug A, Treede RD, Wilder-Smith OH. Recommendations on practice of conditioned pain modulation (CPM) testing. Eur J Pain. 2015;19(6):805-6..

Escala Analógica Visual (EAV)

A EAV foi preenchida pelos participantes do grupo DTM. A escala consistiu em uma linha horizontal de 10 cm entre as frases: “sem dor alguma” e “a pior dor que já senti” e necessitou que os pacientes fizessem uma marca na linha para indicar sua intensidade de dor no momento da avaliação, antes dos testes clínicos2828 Conti PC, de Azevedo LR, de Souza NV, Ferreira FV. Pain measurement in TMD patients: evaluation of precision and sensitivity of different scales. J Oral Rehabil. 2001;28(6):534-9..

Análise estatística

As análises estatísticas foram realizadas com o software open source Jamovi 2.23.6 (Sydney, Austrália), com um nível de significância de 5%. Após o teste Shapiro-Wilk para distribuição normal, as variáveis (idade, PCS, MPT, PPT, WUR, CPM e EAV) não apresentaram distribuição normal e foram adaptadas por meio de uma transformação logarítmica para os testes ANOVA. Foi aplicado o teste ANOVA unidirecional para as comparações da idade entre os grupos DTM e controle e dos valores de EAV entre as fases do ciclo menstrual. O teste ANOVA bidirecional foi realizado para comparar a fase do ciclo menstrual com as variáveis avaliadas. Quando a comparação foi estatisticamente significativa (p<0,05), o teste post-hoc de Tukey foi usado para verificar as interações.

RESULTADOS

Após a análise de acordo com os critérios de inclusão/exclusão, a amostra foi composta por 80 arquivos (Figura 1) de mulheres com idades entre 20 e 49 anos. O grupo controle apresentou uma média de idade de 32,35 ± 7,45 anos e o grupo DTM de 33,17 ± 9,0 anos, sem diferença estatisticamente significativa entre os grupos (p=0,617). O grupo DTM relatou um valor médio de dor na EAV de 4,8 ± 3,3, com mediana de 36 meses (intervalo interquartil = 54 meses) de dor.

Figura 1
Fluxograma de elegibilidade

A Tabela 1 mostra os valores médios de todas as variáveis coletadas nos grupos de controle e DTM e nas diferentes fases do ciclo menstrual. A Tabela 2 evidencia a comparação entre os valores dos grupos controle e DTM nas diferentes fases do ciclo menstrual e suas interações com cada um dos subgrupos. A PSS (p=0,001) e a PCS (p<0,001) apresentaram valores significativamente mais altos no grupo DTM quando comparados aos controles saudáveis. O MPT apresentou valores médios mais altos no grupo de controle (p=0,033) e na fase lútea (p<0,001). Quando as interações foram verificadas nos subgrupos, a fase luteal do grupo controle (2) apresentou médias mais altas em comparação com todos os outros subgrupos (p<0,001). Os valores dos escores da EAV comparados em diferentes fases do ciclo menstrual no grupo DTM são apresentados na Tabela 3, constando que não foram encontradas diferenças (p=0,376).

Tabela 1
Valores médios ± desvio padrão das variáveis coletadas divididas nos grupos por fases do ciclo menstrual.
Tabela 2
Teste ANOVA bidirecional e resultados das interações post-hoc de Tukey nas variáveis coletadas.
Tabela 3
Comparação ANOVA unidirecional EAV entre as duas fases do ciclo menstrual no grupo DTM.

DISCUSSÃO

O objetivo do presente estudo foi avaliar os limiares experimentais da dor, as características psicossociais e o relato clínico de dor em mulheres com diagnóstico de DTM ao longo das fases do ciclo menstrual. Os resultados mostraram que: 1) a PSS e a PCS apresentaram valores mais altos em pacientes com DTM, independentemente da fase do ciclo menstrual; 2) as pacientes do controle luteal apresentaram valores mais altos na MPT; e 3) as pontuações de dor da EAV não diferiram entre as fases do ciclo menstrual em pacientes com DTM. A hipótese nula foi rejeitada com relação às variáveis psicossociais e à dor experimental, de acordo com os achados mencionados anteriormente.

Há um consenso sobre as flutuações dos hormônios sexuais durante as fases menstruais99 Hassan S, Muere A, Einstein G. Ovarian hormones and chronic pain: a comprehensive review. Pain. 2014;155(12):2448-60.,1414 Nasser SA, Afify EA. Sex differences in pain and opioid mediated antinociception : Modulatory role of gonadal hormones. Life Sci. 2019;237:116926.,2929 Mihm M, Gangooly S, Muttukrishna S. The normal menstrual cycle in women. Anim Reprod Sci. 2011;124(3-4):229-36., o que levou a uma grande busca por uma relação com a prevalência de dor nas mulheres55 Racine M, Tousignant-Laflamme Y, Kloda LA, Dion D, Dupuis G, Choinire M. A systematic literature review of 10 years of research on sex/gender and experimental pain perception - Part 1: Are there really differences between women and men? Pain. 2012;153(3):602-18.,1010 Martin VT. Ovarian hormones and pain response: a review of clinical and basic science studies. Gend Med. 2009;6(Part 2):168-92.,2020 Vilanova L, Goncalves T, Meirelles L, Garcia R. Hormonal fluctuations intensify temporomandibular disorder pain without impairing masticatory function. Int J Prosthodont. 2015;28(1):72-4.,3030 Turner JA, Mancl L, Huggins KH, Sherman JJ, Lentz G, Leresche L. Targeting temporomandibular disorder pain treatment to hormonal fluctuations: A randomized clinical trial. Pain. 2011;152(9):2074-84.,3131 Dao TTT, Knight K, Ton-That V. Modulation of myofascial pain by the reproductive hormones: a preliminary report. J Prosthet Dent. 1998;79(6):663-70.. Essas flutuações hormonais também estão associadas a maiores variabilidades no humor das mulheres, o que influencia indiretamente a dor, uma vez que os sintomas de estresse e ansiedade estão presentes em mulheres com ciclagem normal, frequentemente em torno do momento perimenstrual1010 Martin VT. Ovarian hormones and pain response: a review of clinical and basic science studies. Gend Med. 2009;6(Part 2):168-92.,1313 Craft RM. Modulation of pain by estrogens. Pain. 2007;132(Suppl1):S3., quando são observados níveis mais baixos de estrogênio/progesterona, provavelmente relacionados a um aumento na ativação simpática e uma diminuição na modulação cognitiva da dor, altamente associada ao estresse, à ansiedade e à facilitação da dor1313 Craft RM. Modulation of pain by estrogens. Pain. 2007;132(Suppl1):S3.,3232 Veldhuijzen DS, Keaser ML, Traub DS, Zhuo J, Gullapalli RP, Greenspan JD. The role of circulating sex hormones in menstrual cycle-dependent modulation of pain-related brain activation. Pain. 2013;154(4):548-59.. O estresse e os pensamentos de catastrofização, por exemplo, também estão fortemente presentes em mulheres com dor crônica, levando a uma exacerbação da dor22 Slade GD, Fillingim RB, Sanders AE, Bair E, Greenspan JD, Ohrbach R, et al. Summary of Findings From the OPPERA Prospective Cohort Study of Incidence of First-Onset Temporomandibular Disorder: Implications and Slade GD, Fillingim RB, Sanders AE, Bair E, Greenspan JD, Ohrbach R, Dubner R, Diatchenko L, Smith SB, Knott C, Maixner W. Summary of findings from the OPPERA prospective cohort study of incidence of first-onset temporomandibular disorder: implications and future directions. J Pain. 2013;14(12 Suppl):T116-24.,77 Paller CJ, Campbell CM, Edwards RR, Dobs AS. Sex-based differences in pain perception and treatment. Pain Med. 2009;10(2):289-99.,3333 Hellström B, Anderberg UM. Pain perception across the menstrual cycle phases in women with chronic pain. Percept Mot Skills. 2003;96(1):201-11..

O presente estudo avaliou os resultados associados às fases do ciclo menstrual e encontrou valores mais altos de estresse e pensamentos catastróficos (questionários PSS e PCS) no grupo DTM, em comparação com o grupo controle, independentemente das fases do ciclo menstrual. Portanto, a presença de dor crônica parece estar mais relacionada a características psicossociais do que à flutuação hormonal em si.

Como mencionado anteriormente, os níveis séricos de estrogênio/progesterona podem estar relacionados a diferentes percepções de dor em dor orofacial experimental11 LeResche L, Mancl L, Sherman JJ, Gandara B, Dworkin SF. Changes in temporomandibular pain and other symptoms across the menstrual cycle. Pain. 2003;106(3):253-61.,33 Krunic J, Mladenovic I, Radovic I, Stojanovic N. Changes in pulp sensitivity across the menstrual cycle in healthy women and women with temporomandibular disorders. J Oral Rehabil. 2021;48(2):124-31.,66 Sherman JJ, LeResche L. Does experimental pain response vary across the menstrual cycle? A methodological review. Am J Physiol Regul Integr Comp Physiol. 2006;291(2):R245-56.,88 Athnaiel O, Cantillo S, Paredes S, Knezevic NN. The role of sex hormones in pain-related conditions. Int J Mol Sci. 2023;;24(3):1866-76.,1515 Vignolo V, Vedolin GM, de Araujo C dos RP, Rodrigues Conti PC. Influence of the menstrual cycle on the pressure pain threshold of masticatory muscles in patients with masticatory myofascial pain. Oral Surgery, Oral Med Oral Pathol Oral Radiol Endodontology. 2008;105(3):308-15.

16 Drobek W, Schoenaers J, De Laat A. Hormone-dependent fluctuations of pressure pain threshold and tactile threshold of the temporalis and masseter muscle. J Oral Rehabil. 2002;29(11):1042-51.

17 Cimino R, Farella M, Michelotti A, Pugliese R, Martina R. Does the ovarian cycle influence the pressure-pain threshold of the masticatory muscles in symptom-free women? J Orofac Pain. 2000;14(2):105-11.
-1818 Isselée H, De Laat A, De Mot B, Lysens R. Pressure-pain threshold variation in temporomandibular disorder myalgia over the course of the menstrual cycle. J Orofac Pain. 2002;16(2):105-17.,2020 Vilanova L, Goncalves T, Meirelles L, Garcia R. Hormonal fluctuations intensify temporomandibular disorder pain without impairing masticatory function. Int J Prosthodont. 2015;28(1):72-4.,3131 Dao TTT, Knight K, Ton-That V. Modulation of myofascial pain by the reproductive hormones: a preliminary report. J Prosthet Dent. 1998;79(6):663-70.,3434 Landi N, Lombardi I, Manfredini D, Casarosa E, Biondi K, Gabbanini M, Bosco M. Sexual hormone serum levels and temporomandibular disorders. A preliminary study. Gynecol Endocrinol. 2005;20(2):99-103. Como exemplo, observou-se que a ocorrência de disfunções patológicas no eixo hipotálamo-pituitária-adrenal (HPA), caracterizadas por reduções nos níveis circulantes de estrogênio e progesterona, está associada ao aumento da frequência de DTM em pacientes do sexo feminino3535 Jedynak B, Jaworska-Zaremba M, Grzechocińska B, Chmurska M, Janicka J, Kostrzewa-Janicka J. TMD in females with menstrual disorders. Int J Environ Res Public Health. 2021;18(14):1-11.. No presente estudo, parâmetros como MPT, WUR, PPT e CPM foram acessados, mas apenas o MPT (p<0,001) e o PPT (p=0,022) apresentaram diferenças significativas entre as fases do ciclo menstrual. As pacientes do controle luteal apresentaram limiares mais altos no MPT quando comparadas a todas as fases nos grupos controle e DTM (p<0,001).

A fase luteal é caracterizada por momentos predominantes de altos níveis de estrogênio/progesterona com eventos de declínio menos acentuados quando comparada à fase pré-luteal, especialmente em seu período inicial, durante o qual esses níveis estão em um ponto muito baixo44 Maurer AJ, Lissounov A, Knezevic I, Candido KD, Knezevic NN. Pain and sex hormones: a review of current understanding. Pain Manag. 2016;6(3):285-96.,99 Hassan S, Muere A, Einstein G. Ovarian hormones and chronic pain: a comprehensive review. Pain. 2014;155(12):2448-60.,1010 Martin VT. Ovarian hormones and pain response: a review of clinical and basic science studies. Gend Med. 2009;6(Part 2):168-92.. O estrogênio e a progesterona têm receptores periféricos e centrais que indicam sua ação em diferentes mecanismos de dor44 Maurer AJ, Lissounov A, Knezevic I, Candido KD, Knezevic NN. Pain and sex hormones: a review of current understanding. Pain Manag. 2016;6(3):285-96., os quais são fundamentais para seu início e sua manutenção.

Em eventos periféricos e agudos, níveis elevados de estrogênio/progesterona estão intimamente relacionados a um comportamento pronociceptivo por meio de vias glutaminérgicas e modulação do fator de crescimento nervoso (NGF), levando à hiperalgesia e à alodinia1010 Martin VT. Ovarian hormones and pain response: a review of clinical and basic science studies. Gend Med. 2009;6(Part 2):168-92.,3636 Martin VT, Lee J, Behbehani MM. Sensitization of the trigeminal sensory system during different stages of the rat estrous cycle: Implications for menstrual migraine. Headache. 2007;47(4):552-63.,3737 Pogatzki-Zahn EM, Drescher C, Englbrecht JS, Klein T, Magerl W, Zahn PK. Progesterone relates to enhanced incisional acute pain and pinprick hyperalgesia in the luteal phase of female volunteers. Pain. 2019;160(8):1781-93.. Por outro lado, no sistema nervoso central, níveis elevados de estrogênio/progesterona estão relacionados a um aumento na modulação da dor inibitória endógena por meio da ativação das vias serotoninérgicas, GABAérgicas e opioides99 Hassan S, Muere A, Einstein G. Ovarian hormones and chronic pain: a comprehensive review. Pain. 2014;155(12):2448-60.,1010 Martin VT. Ovarian hormones and pain response: a review of clinical and basic science studies. Gend Med. 2009;6(Part 2):168-92.,1313 Craft RM. Modulation of pain by estrogens. Pain. 2007;132(Suppl1):S3..

Devido ao tempo mediano de dor relatado na amostra deste estudo (36 meses), caracterizando prováveis pacientes crônicos, é possível inferir que os altos níveis de estrogênio/progesterona mostraram mais atividade na inibição da dor por mecanismos centrais do que por eventos pronociceptivos. Assim, a provável ausência de sensibilização central e a falta de longa exposição a eventos de dor em pacientes do grupo controle podem ser um fator-chave para a maior antinocicepção induzida por hormônios. Os valores mais altos do PPT na fase luteal das pacientes de controle corroboram os achados anteriores.

Embora a dor experimental tenha mostrado diferenças entre as fases do ciclo menstrual, os escores da EAV de dor no presente estudo não foram estatisticamente diferentes entre as fases do ciclo menstrual no grupo DTM (p=0,376), em concordância com estudos anteriores1717 Cimino R, Farella M, Michelotti A, Pugliese R, Martina R. Does the ovarian cycle influence the pressure-pain threshold of the masticatory muscles in symptom-free women? J Orofac Pain. 2000;14(2):105-11.,1919 Sherman JJ, LeResche L, Mancl LA, Huggins K, Sage JC, Dworkin SF. Cyclic effects on experimental pain response in women with temporomandibular disorders. J Orofac Pain. 2005;19(2):133-43.. Esses dados evidenciam que pequenas alterações nos testes experimentais de dor podem não ser clinicamente relevantes ou representar uma rotina diária no relato de dor da paciente.

O presente estudo realizou testes de dor experimental controlados e eficientes, além de cegar o foco principal do estudo em relação às pacientes e incluir variáveis psicossociais que podem interferir na percepção da dor99 Hassan S, Muere A, Einstein G. Ovarian hormones and chronic pain: a comprehensive review. Pain. 2014;155(12):2448-60.. As limitações do presente estudo compreendem uma pequena amostra de conveniência, avaliada em um método transversal único, sem controle diário dos níveis hormonais e das fases do ciclo menstrual pelo método padrão ouro recomendado (amostras de sangue ou urina). Apesar da grande variedade de estudos envolvendo DTM e fases do ciclo menstrual disponíveis na literatura, a falta de metodologias padronizadas dificulta a comparação dos presentes achados com outros estudos.

CONCLUSÃO

Indivíduos sem qualquer condição de dor crônica na fase luteal do ciclo menstrual tendem a ter limiares mais altos de MPT e PPT na região orofacial, embora o relato de dor em pacientes com dor miofascial não tenha sido significativamente diferente entre as fases do ciclo menstrual, elucidando que pequenas alterações nos limiares de dor experimental podem não ser clinicamente relevantes. Por fim, a presença de dor crônica parece estar mais relacionada a características psicossociais do que à flutuação hormonal em si.

REFERENCES

  • 1
    LeResche L, Mancl L, Sherman JJ, Gandara B, Dworkin SF. Changes in temporomandibular pain and other symptoms across the menstrual cycle. Pain. 2003;106(3):253-61.
  • 2
    Slade GD, Fillingim RB, Sanders AE, Bair E, Greenspan JD, Ohrbach R, et al. Summary of Findings From the OPPERA Prospective Cohort Study of Incidence of First-Onset Temporomandibular Disorder: Implications and Slade GD, Fillingim RB, Sanders AE, Bair E, Greenspan JD, Ohrbach R, Dubner R, Diatchenko L, Smith SB, Knott C, Maixner W. Summary of findings from the OPPERA prospective cohort study of incidence of first-onset temporomandibular disorder: implications and future directions. J Pain. 2013;14(12 Suppl):T116-24.
  • 3
    Krunic J, Mladenovic I, Radovic I, Stojanovic N. Changes in pulp sensitivity across the menstrual cycle in healthy women and women with temporomandibular disorders. J Oral Rehabil. 2021;48(2):124-31.
  • 4
    Maurer AJ, Lissounov A, Knezevic I, Candido KD, Knezevic NN. Pain and sex hormones: a review of current understanding. Pain Manag. 2016;6(3):285-96.
  • 5
    Racine M, Tousignant-Laflamme Y, Kloda LA, Dion D, Dupuis G, Choinire M. A systematic literature review of 10 years of research on sex/gender and experimental pain perception - Part 1: Are there really differences between women and men? Pain. 2012;153(3):602-18.
  • 6
    Sherman JJ, LeResche L. Does experimental pain response vary across the menstrual cycle? A methodological review. Am J Physiol Regul Integr Comp Physiol. 2006;291(2):R245-56.
  • 7
    Paller CJ, Campbell CM, Edwards RR, Dobs AS. Sex-based differences in pain perception and treatment. Pain Med. 2009;10(2):289-99.
  • 8
    Athnaiel O, Cantillo S, Paredes S, Knezevic NN. The role of sex hormones in pain-related conditions. Int J Mol Sci. 2023;;24(3):1866-76.
  • 9
    Hassan S, Muere A, Einstein G. Ovarian hormones and chronic pain: a comprehensive review. Pain. 2014;155(12):2448-60.
  • 10
    Martin VT. Ovarian hormones and pain response: a review of clinical and basic science studies. Gend Med. 2009;6(Part 2):168-92.
  • 11
    Aloisi AM, Buonocore M, Merlo L, Galandra C, Sotgiu A, Bacchella L, Ungaretti M, Demartini L, Bonezzi C. Chronic pain therapy and hypothalamic-pituitary-adrenal axis impairment. Psychoneuroendocrinology. 2011;36(7):1032-9.
  • 12
    Rhudy JL, Bartley EJ. The effect of the menstrual cycle on affective modulation of pain and nociception in healthy women. Pain. 2010;149(2):365-72.
  • 13
    Craft RM. Modulation of pain by estrogens. Pain. 2007;132(Suppl1):S3.
  • 14
    Nasser SA, Afify EA. Sex differences in pain and opioid mediated antinociception : Modulatory role of gonadal hormones. Life Sci. 2019;237:116926.
  • 15
    Vignolo V, Vedolin GM, de Araujo C dos RP, Rodrigues Conti PC. Influence of the menstrual cycle on the pressure pain threshold of masticatory muscles in patients with masticatory myofascial pain. Oral Surgery, Oral Med Oral Pathol Oral Radiol Endodontology. 2008;105(3):308-15.
  • 16
    Drobek W, Schoenaers J, De Laat A. Hormone-dependent fluctuations of pressure pain threshold and tactile threshold of the temporalis and masseter muscle. J Oral Rehabil. 2002;29(11):1042-51.
  • 17
    Cimino R, Farella M, Michelotti A, Pugliese R, Martina R. Does the ovarian cycle influence the pressure-pain threshold of the masticatory muscles in symptom-free women? J Orofac Pain. 2000;14(2):105-11.
  • 18
    Isselée H, De Laat A, De Mot B, Lysens R. Pressure-pain threshold variation in temporomandibular disorder myalgia over the course of the menstrual cycle. J Orofac Pain. 2002;16(2):105-17.
  • 19
    Sherman JJ, LeResche L, Mancl LA, Huggins K, Sage JC, Dworkin SF. Cyclic effects on experimental pain response in women with temporomandibular disorders. J Orofac Pain. 2005;19(2):133-43.
  • 20
    Vilanova L, Goncalves T, Meirelles L, Garcia R. Hormonal fluctuations intensify temporomandibular disorder pain without impairing masticatory function. Int J Prosthodont. 2015;28(1):72-4.
  • 21
    von Elm E, Altman DG, Egger M, Pocock SJ, Gøtzsche PC, Vandenbroucke JP. The strengthening the reporting of observational studies in epidemiology (STROBE) statement: guidelines for reporting observational studies. Int J Surg. 2014;12(12):1495-9.
  • 22
    Schiffman E, Ohrbach R, Truelove E, Look J, Anderson G, Goulet JP, List T, Svensson P, Gonzalez Y, Lobbezoo F, Michelotti A, Brooks SL, Ceusters W, Drangsholt M, Ettlin D, Gaul C, Goldberg LJ, Haythornthwaite JA, Hollender L, Jensen R, John MT, De Laat A, de Leeuw R, Maixner W, van der Meulen M, Murray GM, Nixdorf DR, Palla S, Petersson A, Pionchon P, Smith B, Visscher CM, Zakrzewska J, Dworkin SF; International RDC/TMD Consortium Network, International association for Dental Research; Orofacial Pain Special Interest Group, International Association for the Study of Pain. Diagnostic Criteria for Temporomandibular Disorders (DC/TMD) for Clinical and Research Applications: recommendations of the International RDC/TMD Consortium Network* and Orofacial Pain Special Interest Group†. J Oral Facial Pain Headache. 2014;28(1):6-27.
  • 23
    Rolke R, Baron R, Maier C, Tölle TR, Treede -DR, Beyer A, Binder A, Birbaumer N, Birklein F, Bötefür IC, Braune S, Flor H, Huge V, Klug R, Landwehrmeyer GB, Magerl W, Maihöfner C, Rolko C, Schaub C, Scherens A, Sprenger T, Valet M, Wasserka B. Quantitative sensory testing in the German Research Network on Neuropathic Pain (DFNS): standardized protocol and reference values. Pain. 2006;123(3):231-43.
  • 25
    Sehn F, Chachamovich E, Vidor LP, Dall-Agnol L, de Souza IC, Torres IL, Fregni F, Caumo W. Cross-cultural adaptation and validation of the Brazilian Portuguese version of the pain catastrophizing scale. Pain Med. 2012;13(11):1425-35.
  • 26
    Rolke R, Magerl W, Campbell KA, Schalber C, Caspari S, Birklein F, Treede RD. Quantitative sensory testing: a comprehensive protocol for clinical trials. Eur J Pain. 2006;10(1):77-88.
  • 27
    Yarnitsky D, Bouhassira D, Drewes AM, Fillingim RB, Granot M, Hansson P, Landau R, Marchand S, Matre D, Nilsen KB, Stubhaug A, Treede RD, Wilder-Smith OH. Recommendations on practice of conditioned pain modulation (CPM) testing. Eur J Pain. 2015;19(6):805-6.
  • 28
    Conti PC, de Azevedo LR, de Souza NV, Ferreira FV. Pain measurement in TMD patients: evaluation of precision and sensitivity of different scales. J Oral Rehabil. 2001;28(6):534-9.
  • 29
    Mihm M, Gangooly S, Muttukrishna S. The normal menstrual cycle in women. Anim Reprod Sci. 2011;124(3-4):229-36.
  • 30
    Turner JA, Mancl L, Huggins KH, Sherman JJ, Lentz G, Leresche L. Targeting temporomandibular disorder pain treatment to hormonal fluctuations: A randomized clinical trial. Pain. 2011;152(9):2074-84.
  • 31
    Dao TTT, Knight K, Ton-That V. Modulation of myofascial pain by the reproductive hormones: a preliminary report. J Prosthet Dent. 1998;79(6):663-70.
  • 32
    Veldhuijzen DS, Keaser ML, Traub DS, Zhuo J, Gullapalli RP, Greenspan JD. The role of circulating sex hormones in menstrual cycle-dependent modulation of pain-related brain activation. Pain. 2013;154(4):548-59.
  • 33
    Hellström B, Anderberg UM. Pain perception across the menstrual cycle phases in women with chronic pain. Percept Mot Skills. 2003;96(1):201-11.
  • 34
    Landi N, Lombardi I, Manfredini D, Casarosa E, Biondi K, Gabbanini M, Bosco M. Sexual hormone serum levels and temporomandibular disorders. A preliminary study. Gynecol Endocrinol. 2005;20(2):99-103
  • 35
    Jedynak B, Jaworska-Zaremba M, Grzechocińska B, Chmurska M, Janicka J, Kostrzewa-Janicka J. TMD in females with menstrual disorders. Int J Environ Res Public Health. 2021;18(14):1-11.
  • 36
    Martin VT, Lee J, Behbehani MM. Sensitization of the trigeminal sensory system during different stages of the rat estrous cycle: Implications for menstrual migraine. Headache. 2007;47(4):552-63.
  • 37
    Pogatzki-Zahn EM, Drescher C, Englbrecht JS, Klein T, Magerl W, Zahn PK. Progesterone relates to enhanced incisional acute pain and pinprick hyperalgesia in the luteal phase of female volunteers. Pain. 2019;160(8):1781-93.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    21 Ago 2023
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2023

Histórico

  • Recebido
    07 Mar 2022
  • Aceito
    20 Jun 2023
Sociedade Brasileira para o Estudo da Dor Av. Conselheiro Rodrigues Alves, 937 Cj2 - Vila Mariana, CEP: 04014-012, São Paulo, SP - Brasil, Telefones: , (55) 11 5904-2881/3959 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: dor@dor.org.br