Acessibilidade / Reportar erro

Envolvimento do córtex somestésico primário na fibromialgia: revisão de estudos de neuroimagem

RESUMO

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS:

Os mecanismos subjacentes à dor nociplástica, como a fibromialgia (FM), não são totalmente compreendidos, contudo acredita-se que o processamento sensorial e a modulação da dor alterados desempenham papéis proeminentes para a manutenção da dor nociplástica. Com a hipótese de que alterações no córtex somestésico primário (S1) contribuam para o caráter de dor generalizada da FM, o objetivo deste estudo foi avaliar o envolvimento do córtex somestésico primário em humanos com FM, bem como investigar possíveis associações entre alterações de S1 com sinais e sintomas clínicos da FM.

CONTEÚDO:

Para esta revisão integrativa, foram utilizadas as seguintes bases de dados: Pubmed e Web of Science, incluindo estudos observacionais realizados em humanos com FM. No total, 541 estudos foram identificados e quatro foram incluídos. A maioria dos estudos são do tipo caso-controle, publicados entre 2016 e 2022. Ao todo, dados de 161 indivíduos foram incluídos. Foi identificado que há alterações morfológicas, hiperativação e aumento da conectividade funcional entre S1 e substância cinzenta periaquedutal e entre S1 e córtex cingulado anterior.

CONCLUSÃO:

Pacientes com FM apresentam alterações morfológicas e hiperativação em S1, bem como aumento da conectividade funcional entre S1 e substância cinzenta periaquedutal e S1 e sistema límbico. Ademais, diferentes sub-regiões somatotrópicas bilaterais (pernas, tórax, dedos, mãos, face e costas) apresentaram redução da conectividade funcional em pacientes com FM. Essas regiões são frequentemente apresentadas como “tender points” na FM.

Descritores
Dor musculoesquelética; Encéfalo; Sintomas gerais.

ABSTRACT

BACKGROUND AND OBJECTIVES:

The mechanisms underlying nociplastic pain, such as fibromyalgia (FM), are not fully understood, however, it is believed that altered sensory processing and pain modulation play prominent roles in the maintenance of nociplastic pain. The hypothesis is that changes in the primary somesthetic cortex (S1) contribute to the generalized pain character of FM. The objective of this study was to evaluate the involvement of the primary somesthetic cortex in humans with fibromyalgia, as well as to investigate possible associations between S1 changes and clinical signs and symptoms of FM.

CONTENTS:

For this integrative review, the following databases were used: Pubmed and Web of Science, including observational studies carried out in humans with FM. In total, 541 studies were identified and four were included. The majority of studies are case-control studies, published between 2016 and 2022. In total, data from 161 individuals were included in this review. It was identified that there are morphological changes, hyperactivation and increased functional connectivity between S1 and periaqueductal gray matter and between S1 and anterior cingulate cortex.

CONCLUSION:

Patients with FM present morphological changes and hyperactivation in S1, as well as increased functional connectivity between S1 and periaqueductal gray matter and S1 and limbic system. Furthermore, different bilateral somatotropic subregions (legs, chest, fingers, hands, face and back) showed reduced functional connectivity in patients with FM. These regions are often presented as “tender points” in FM.

Keywords
Brain; General symptoms; Musculoskeletal pain

DESTAQUES

  • A fibromialgia está associada com alterações encefálicas morfológicas e funcionais, como alterações de atividade no córtex somestésico primário;

  • Tendo em vista que o córtex somestésico tem função de identificação somatossensorial do corpo como identificação da localização e intensidade da dor, propõe-se a hipótese de que alterações em S1 podem contribuir para a percepção de dor generalizada, alodinia e hiperalgesia em pacientes com fibromialgia;

  • Entender as alterações encefálicas em pacientes com fibromialgia poderá auxiliar na compreensão de sinais e sintomas para adaptar e desenvolver intervenções e tratamentos para a síndrome.

DESTAQUES

  • A fibromialgia está associada com alterações encefálicas morfológicas e funcionais, como alterações de atividade no córtex somestésico primário;

  • Tendo em vista que o córtex somestésico tem função de identificação somatossensorial do corpo como identificação da localização e intensidade da dor, propõe-se a hipótese de que alterações em S1 podem contribuir para a percepção de dor generalizada, alodinia e hiperalgesia em pacientes com fibromialgia;

  • Entender as alterações encefálicas em pacientes com fibromialgia poderá auxiliar na compreensão de sinais e sintomas para adaptar e desenvolver intervenções e tratamentos para a síndrome.

INTRODUÇÃO

Fibromialgia (FM) é uma síndrome complexa de dor nociplástica crônica e hiperalgesia, reduzindo drasticamente a qualidade de vida do paciente e aumentando o afastamento de suas atividades, gerando prejuízos econômicos para os membros e seus familiares, bem como para a nação11 Henningsen P. Nociplastic pain is functional pain. Lancet. 2023;339(10335):1603-4.,22 Batista AS, Maia JB, Souza CG, Lins CA, Souza MC. Depression, anxiety and kinesiophobia in women with fibromyalgia practitioners or not of dance. BrJP. 2020;3(4):318-21.. No Brasil, cerca de 2% da população tem FM (ou seja, aproximadamente 5.000.000 de pessoas), e as queixas mais relatadas são dor, com caráter crônico e nociplástica33 Bittencourt JV, Corrêa LA, Bezerra MC, Reis FJ, Luca K, Nogueira LA. Patients with fibromyalgia present different pain phenotypes compared to patients with generalized pain. BrJP. 2022;5(2):119-26.

4 Cuenca Martínez F, Sempere Rubio N, Mollà Casanova S, Muñoz Gómez E, Fernández Carnero J, Sánchez Sabater A, Suso Martí L. Effects of repetitive-transcranial magnetic stimulation (rTMS) in fibromyalgia syndrome: an umbrella and mapping review. Brain Sci. 2023;13(7):1059.
-55 Melo GA, Madruga ML, Oliveira MB, Torro N. Possíveis repercussões da pandemia da COVID-19 em mulheres com fibromialgia: estudo longitudinal. BrJP. 2022;5(3):195-9.. Dor crônica é considerada um problema de saúde pública e está associada à neuroplasticidade cerebral. Diante disso, as condições de dores musculoesqueléticas crônicas, como a FM, têm despertado interesse de cientistas para resolução ou amenização desta problemática global.

A dor é definida como “experiência sensorial e emocional desagradável associada, ou semelhante àquela associada, a uma lesão tecidual real ou potencial”, e trata-se de uma experiência dinâmica e multidimensional. As multidimensões do processamento da dor são definidas por três componentes independentes, mas intimamente relacionados: 1) sensoriais-discriminativos (córtices somestésico), 2) afetivo-emocionais e 3) cognitivo motivacionais66 Raja SN, Carr DB, Cohen M, Finnerup NB, Flor H, Gibson S, Keefe FJ, Mogil JS, Ringkamp M, Sluka KA, Song XJ, Stevens B, Sullivan MD, Tutelman PR, Ushida T, Vader K. The revised International Association for the Study of Pain definition of pain: concepts, challenges, and compromises. Pain. 2020;161(9):1976-82.,77 DeSantana JM, Perissinotti DMN, Oliveira Junior JO, Correia LM, Oliveira CM, Fonseca PR. Revised definition of pain after four decades. BrJP. 2020;3(3):197-8.. Contudo, não há um córtex específico para a percepção e processamento da dor. Ao invés disso, há uma rede complexa de áreas corticais cerebrais e envolvidas no processamento da percepção da experiência de dor. Esta rede complexa é alvo de cientistas objetivando compreender os mecanismos encefálicos para a dor e também a sua associação/correlação com sinais e sintomas clínicos dos pacientes88 Kuner R, Flor H. Structural plasticity and reorganisation in chronic pain. Nat Rev Neurosci. 2016;18(1):20-30..

Com a evolução dos estudos com imagem de ressonância magnética funcional (RMf) e estudos em modelos experimentais, foi identificado que diversas condições de dor musculoesquelética se associam com alterações encefálicas morfológicas e funcionais, influenciando o comportamento de algumas estruturas e regiões encefálicas99 Mosch B, Hagena V, Herpertz S, Diers M. Brain morphometric changes in fibromyalgia and the impact of psychometric and clinical factors: a volumetric and diffusion-tensor imaging study. Arthritis Res Ther. 2023;25(1):81. Erratum in: Arthritis Res Ther. 2023;25(1):89.. Ademais, alguns destes estudos relatam a associação de tais alterações com sinais e sintomas observados nas condições musculoesqueléticas crônicas1010 Kim J, Loggia ML, Cahalan CM, Harris RE, Beissner F Dr Phil Nat, Garcia RG, Kim H, Wasan AD, Edwards RR, Napadow V. The somatosensory link in fibromyalgia: functional connectivity of the primary somatosensory cortex is altered by sustained pain and is associated with clinical/autonomic dysfunction. Arthritis Rheumatol. 2015;67(5):1395-405.

11 Lim M, Roosink M, Kim JS, Kim HW, Lee EB, Son KM, Kim HA, Chung CK. Augmented pain processing in primary and secondary somatosensory cortex in fibromyalgia: a magnetoencephalography study using intra-epidermal electrical stimulation. PLoS One. 2016;11(3):e0151776.

12 Soldatelli M, Franco ÁO, Picon F, Duarte JÁ, Scherer R, Bandeira J, Zortea M, Torres ILDS, Fregni F, Caumo W. Primary somatosensory cortex and periaqueductal gray functional connectivity as a marker of the dysfunction of the descending pain modulatory system in fibromyalgia. Korean J Pain. 2023;36(1):113-27.
-1313 Lim M, Kim JS, Kim DJ, Chung CK. Increased lowand high-frequency oscillatory activity in the prefrontal cortex of fibromyalgia patients. Front Hum Neurosci. 2016;14(10):111.. Os mecanismos subjacentes a dor nociplástica, como a FM, não são totalmente compreendidos, mas acredita-se que o aumento da dor no sistema nervoso central, o processamento sensorial e a modulação da dor alterados desempenham papéis proeminentes para a manutenção da dor nociplástica11 Henningsen P. Nociplastic pain is functional pain. Lancet. 2023;339(10335):1603-4..

Os córtices somestésicos (primário - S1 e secundário - S2) são regiões encefálicas corticais envolvidas no componente sensório-discriminativo da dor, fornecendo o reconhecimento da localização e da intensidade da dor. Diante disso, levanta-se a hipótese de que alterações no córtex somestésico primário (S1) contribua para o caráter de “localização indiscriminada da dor”. Ou seja, dor sem localização sensorial específica (dor generalizada, por exemplo), condição comum em pacientes com FM.

Diante deste contexto, o objetivo deste estudo foi avaliar o envolvimento do córtex somestésico primário em humanos com FM, bem como investigar possíveis associações entre alterações de S1 com sinais e sintomas clínicos da FM. Os resultados deste estudo trarão informações sobre o comportamento do córtex S1 em pacientes com FM e suas possíveis contribuições para a dor generalizada.

CONTEÚDO

Uma revisão integrativa de estudos observacionais de neuroimagem foi realizada1414 Matias MG, Cavalcante AF, Mescouto KA, Silva Filho EM, Baptista AF, Okano AH, Pegado R. Does anodal transcranial direct current stimulation over left motor cortex show body side pain-related difference in fibromyalgia? BrJP. 2022;5(2):112-8.,1515 Brasil. Diretrizes metodológicas: elaboração de revisões sistemáticas e metanálise de estudos observacionais. Ministério da saúde. 2012.. Revisões integrativas são métodos de pesquisa que proporcionam a síntese de conhecimento e a incorporação da aplicabilidade de resultados de estudos significativos na prática.

Pergunta de pesquisa

Segundo o acrônimo PECO1414 Matias MG, Cavalcante AF, Mescouto KA, Silva Filho EM, Baptista AF, Okano AH, Pegado R. Does anodal transcranial direct current stimulation over left motor cortex show body side pain-related difference in fibromyalgia? BrJP. 2022;5(2):112-8., itens recomendados para a formulação da pergunta de estudos de revisão com estudos observacionais. Realizou-se a seguinte pergunta de pesquisa: em humanos com FM (P, E), como se comporta o córtex somestésico primário (S1) (O), quando comparados a indivíduos sem FM (indivíduos controle)?

As buscas foram realizadas por dois revisores e conduzidas em dois metabuscadores: Pubmed e Web of Science, ambos com um amplo espectro de estudos acerca do assunto investigado1515 Brasil. Diretrizes metodológicas: elaboração de revisões sistemáticas e metanálise de estudos observacionais. Ministério da saúde. 2012.. Também se pesquisou manualmente as listas de referências de cada estudo incluído, procurando por estudos não encontrados no banco de dados online como estratégia de busca. As estratégias de busca foram realizadas entre março e abril de 2023.

Seleção dos estudos

Os resultados da pesquisa foram importados para o site de revisão sistemática Rayyan (https://www.rayyan.ai/) para excluir artigos duplicados e identificar estudos que não atenderam aos critérios de elegibilidade. Após a leitura do texto completo, dois revisores independentes realizaram a seleção final1616 Souza MT, Silva MD, Carvalho R. Integrative review: what is it? How to do it? Einstein. 2010;8(1):102-6.,1717 Ouzzani M, Hammady H, Fedorowicz Z, Elmagarmid A. Rayyan - a web and mobile app for systematic reviews. Syst Rev. 2016;5:210..

Todos os artigos foram examinados de acordo com os seguintes critérios de inclusão: realizados em humanos, estudos observacionais (estudos de caso-controle, transversais ou de coorte), língua inglesa e estudos que relataram alterações na conectividade funcional ou morfológicas de S1 em pacientes com FM sem variáveis de confusão (covariáveis) para alterações cerebrais (por exemplo, doença psiquiátrica grave ou doença neurológica). Um artigo foi incluído nesta revisão apenas quando atendeu a todos os critérios de inclusão.

Processo de coleta de dados

Os principais dados referentes às alterações funcionais e/ou morfológicas cerebrais relacionadas à FM foram extraídos dos estudos incluídos. Os dados foram obtidos pelo primeiro autor e um segundo revisor verificou os dados extraídos. Além disso, outras informações importantes de cada estudo foram extraídas: autores e ano de publicação, tipo de estudo, tamanho da amostra e resultados principais.

RESULTADOS

No total, 541 estudos foram identificados. Destes, quatro foram incluídos (Figura 1)99 Mosch B, Hagena V, Herpertz S, Diers M. Brain morphometric changes in fibromyalgia and the impact of psychometric and clinical factors: a volumetric and diffusion-tensor imaging study. Arthritis Res Ther. 2023;25(1):81. Erratum in: Arthritis Res Ther. 2023;25(1):89.

10 Kim J, Loggia ML, Cahalan CM, Harris RE, Beissner F Dr Phil Nat, Garcia RG, Kim H, Wasan AD, Edwards RR, Napadow V. The somatosensory link in fibromyalgia: functional connectivity of the primary somatosensory cortex is altered by sustained pain and is associated with clinical/autonomic dysfunction. Arthritis Rheumatol. 2015;67(5):1395-405.

11 Lim M, Roosink M, Kim JS, Kim HW, Lee EB, Son KM, Kim HA, Chung CK. Augmented pain processing in primary and secondary somatosensory cortex in fibromyalgia: a magnetoencephalography study using intra-epidermal electrical stimulation. PLoS One. 2016;11(3):e0151776.
-1212 Soldatelli M, Franco ÁO, Picon F, Duarte JÁ, Scherer R, Bandeira J, Zortea M, Torres ILDS, Fregni F, Caumo W. Primary somatosensory cortex and periaqueductal gray functional connectivity as a marker of the dysfunction of the descending pain modulatory system in fibromyalgia. Korean J Pain. 2023;36(1):113-27.. A maioria dos estudos são do tipo caso-controle, publicados entre 2016 e 2022. No total, dados de 161 indivíduos foram incluídos nesta revisão (Tabela 1).

Tabela 1
Estudos incluídos

Figura 1
Fluxograma do estudo

Figura 2
Alterações morfológicas e funcionais no córtex somestésico primário em pessoas com fibromialgia.

DISCUSSÃO

Foi identificado que a FM está associada com alterações encefálicas morfológicas e funcionais no córtex somestésico primário. O aumento da conectividade funcional em estado de repouso entre o córtex somatossensorial esquerdo e a substância cinzenta periaquedutal está significativamente relacionada com a disfunção do sistema modulador descendente da dor. Diante disso, tendo em vista que o córtex somatossensorial tem função de identificação somatossensorial para todo o corpo, bem como identificação da localização e intensidade da dor, levantou-se a hipótese de que essas alterações do S1 podem contribuir para a percepção de dor generalizada em pacientes com FM.

Instigando esta hipótese, os autores Lim et al.1111 Lim M, Roosink M, Kim JS, Kim HW, Lee EB, Son KM, Kim HA, Chung CK. Augmented pain processing in primary and secondary somatosensory cortex in fibromyalgia: a magnetoencephalography study using intra-epidermal electrical stimulation. PLoS One. 2016;11(3):e0151776. evidenciaram aumento da atividade no córtex somatossensorial em pacientes com FM quando comparados a controles. Ou seja, o córtex S1 está em maior ativação na FM, percebendo mais informações somatossensoriais que em indivíduos controle (sem FM). Isso pode desempenhar um papel importante para a alodínia (percepção de dor em estímulos ineficazes) e hiperalgesia (percepção exacerbada de dor a estímulos que deveriam ser percebidos como dor leve) nestes pacientes.

Segundo o estudo99 Mosch B, Hagena V, Herpertz S, Diers M. Brain morphometric changes in fibromyalgia and the impact of psychometric and clinical factors: a volumetric and diffusion-tensor imaging study. Arthritis Res Ther. 2023;25(1):81. Erratum in: Arthritis Res Ther. 2023;25(1):89., houve alteração de conectividade funcional de S1 em diferentes sub-regiões somatotrópicas bilaterais (pernas, tórax, dedos, mãos, face e costas) em pacientes com FM, mostrando que há uma redução de conectividade funcional em estado de repouso em várias áreas do córtex somatossensorial. Curiosamente, essas regiões são frequentemente apresentadas como regiões de dor, em que se localizam os “tender points”, comuns na FM, e inúmeras vezes utilizados para diagnosticar a FM. Diante disso, é possível que a atividade aumentada nestas sub-regiões somatotrópicas esteja associada com alodínia e hiperalgesia nos “tender points”. Neste mesmo estudo foi observado que os pacientes também apresentaram maior redução da conectividade durante estímulos de dor sustentada. Ademais, a inibição intracortical em S1 também é comprometida em pacientes, podendo, assim, potencializar a dor nos tender points descritos.

Forças e limitações

Compreender as possíveis alterações de conectividade funcional e estrutural do córtex somatossensorial em pacientes com FM pode levar a comunidade científica a entender o surgimento dos sinais dolorosos, como a dor generalizada, alodínia e hiperalgesia, bem como o envolvimento emocional do indivíduo como parte da sintomatologia do paciente, tendo em vista que algumas áreas corticais alteradas em pacientes com FM podem estar vinculadas ao processamento emocional.

Este estudo é de grande destaque, uma vez que a FM é uma doença musculoesquelética crônica prevalente não apenas no Brasil, mas em todo o globo, gerando sofrimento ao paciente e gastos contínuos aos familiares e aos cofres públicos. Portanto, compreender as alterações encefálicas que ocorrem no encéfalo do paciente com FM permite um melhor entendimento dos sinais e sintomas potencializando os futuros estudos no desenvolvimento de intervenções que possam reduzir o impacto desta doença no indivíduo e na nação. Um dos fatores limitantes deste estudo foi não avaliar o risco de viés dos estudos incluídos, impossibilitando determinar a qualidade dos dados analisados. Ademais, apenas quatro estudos foram incluídos, o que pode limitar os achados. Contudo, salienta-se que esta pesquisa identificou o envolvimento do S1 na FM e possíveis implicações para o entendimento dos sinais e sintomas da doença.

CONCLUSÃO

Pacientes com FM apresentam alterações morfológicas de S1 e de conectividade funcional entre S1 e substância cinzenta periaquedutal e S1 e sistema límbico, o que pode sugerir um envolvimento entre informações sensoriais e o sistema descendente modulador da dor e emoção, destacando que o fator emocional pode desempenhar um papel fundamental na modulação da dor e nas informações sensoriais percebidas pelo córtex somestésico primário. Ademais, diferentes sub-regiões somatotrópicas bilaterais (pernas, tórax, dedos, mãos, face e costas) apresentaram redução da conectividade funcional em pacientes com FM. Essas regiões são frequentemente apresentadas como “tender points” na FM. Por fim, salienta-se que alterações de S1 contribuem para a percepção generalizada e a intensidade dor.

REFERENCES

  • 1
    Henningsen P. Nociplastic pain is functional pain. Lancet. 2023;339(10335):1603-4.
  • 2
    Batista AS, Maia JB, Souza CG, Lins CA, Souza MC. Depression, anxiety and kinesiophobia in women with fibromyalgia practitioners or not of dance. BrJP. 2020;3(4):318-21.
  • 3
    Bittencourt JV, Corrêa LA, Bezerra MC, Reis FJ, Luca K, Nogueira LA. Patients with fibromyalgia present different pain phenotypes compared to patients with generalized pain. BrJP. 2022;5(2):119-26.
  • 4
    Cuenca Martínez F, Sempere Rubio N, Mollà Casanova S, Muñoz Gómez E, Fernández Carnero J, Sánchez Sabater A, Suso Martí L. Effects of repetitive-transcranial magnetic stimulation (rTMS) in fibromyalgia syndrome: an umbrella and mapping review. Brain Sci. 2023;13(7):1059.
  • 5
    Melo GA, Madruga ML, Oliveira MB, Torro N. Possíveis repercussões da pandemia da COVID-19 em mulheres com fibromialgia: estudo longitudinal. BrJP. 2022;5(3):195-9.
  • 6
    Raja SN, Carr DB, Cohen M, Finnerup NB, Flor H, Gibson S, Keefe FJ, Mogil JS, Ringkamp M, Sluka KA, Song XJ, Stevens B, Sullivan MD, Tutelman PR, Ushida T, Vader K. The revised International Association for the Study of Pain definition of pain: concepts, challenges, and compromises. Pain. 2020;161(9):1976-82.
  • 7
    DeSantana JM, Perissinotti DMN, Oliveira Junior JO, Correia LM, Oliveira CM, Fonseca PR. Revised definition of pain after four decades. BrJP. 2020;3(3):197-8.
  • 8
    Kuner R, Flor H. Structural plasticity and reorganisation in chronic pain. Nat Rev Neurosci. 2016;18(1):20-30.
  • 9
    Mosch B, Hagena V, Herpertz S, Diers M. Brain morphometric changes in fibromyalgia and the impact of psychometric and clinical factors: a volumetric and diffusion-tensor imaging study. Arthritis Res Ther. 2023;25(1):81. Erratum in: Arthritis Res Ther. 2023;25(1):89.
  • 10
    Kim J, Loggia ML, Cahalan CM, Harris RE, Beissner F Dr Phil Nat, Garcia RG, Kim H, Wasan AD, Edwards RR, Napadow V. The somatosensory link in fibromyalgia: functional connectivity of the primary somatosensory cortex is altered by sustained pain and is associated with clinical/autonomic dysfunction. Arthritis Rheumatol. 2015;67(5):1395-405.
  • 11
    Lim M, Roosink M, Kim JS, Kim HW, Lee EB, Son KM, Kim HA, Chung CK. Augmented pain processing in primary and secondary somatosensory cortex in fibromyalgia: a magnetoencephalography study using intra-epidermal electrical stimulation. PLoS One. 2016;11(3):e0151776.
  • 12
    Soldatelli M, Franco ÁO, Picon F, Duarte JÁ, Scherer R, Bandeira J, Zortea M, Torres ILDS, Fregni F, Caumo W. Primary somatosensory cortex and periaqueductal gray functional connectivity as a marker of the dysfunction of the descending pain modulatory system in fibromyalgia. Korean J Pain. 2023;36(1):113-27.
  • 13
    Lim M, Kim JS, Kim DJ, Chung CK. Increased lowand high-frequency oscillatory activity in the prefrontal cortex of fibromyalgia patients. Front Hum Neurosci. 2016;14(10):111.
  • 14
    Matias MG, Cavalcante AF, Mescouto KA, Silva Filho EM, Baptista AF, Okano AH, Pegado R. Does anodal transcranial direct current stimulation over left motor cortex show body side pain-related difference in fibromyalgia? BrJP. 2022;5(2):112-8.
  • 15
    Brasil. Diretrizes metodológicas: elaboração de revisões sistemáticas e metanálise de estudos observacionais. Ministério da saúde. 2012.
  • 16
    Souza MT, Silva MD, Carvalho R. Integrative review: what is it? How to do it? Einstein. 2010;8(1):102-6.
  • 17
    Ouzzani M, Hammady H, Fedorowicz Z, Elmagarmid A. Rayyan - a web and mobile app for systematic reviews. Syst Rev. 2016;5:210.

Editado por

Editor associado responsável: Levi Higino Sales Júnior https://orcid.org/0009-0008-0895-8041

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Jan 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    05 Ago 2023
  • Aceito
    17 Nov 2023
Sociedade Brasileira para o Estudo da Dor Av. Conselheiro Rodrigues Alves, 937 Cj2 - Vila Mariana, CEP: 04014-012, São Paulo, SP - Brasil, Telefones: , (55) 11 5904-2881/3959 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: dor@dor.org.br