Acessibilidade / Reportar erro

Falha de extubação e uso de ventilação não invasiva durante o processo de desmame em pacientes críticos com COVID-19

RESUMO

Objetivo:

Avaliar o desfecho da extubação em pacientes com COVID-19 e o uso da ventilação não invasiva no processo de desmame.

Métodos:

Este estudo retrospectivo, observacional e unicêntrico foi realizado em pacientes com COVID-19 com 18 anos ou mais, internados em uma unidade de terapia intensiva entre abril de 2020 e dezembro de 2021, colocados sob ventilação mecânica por mais de 48 horas com progressão para o desmame. A extubação precoce foi definida como a extubação sem um teste de ventilação espontânea e com uso imediato de ventilação não invasiva após a extubação. Em pacientes submetidos a um teste de ventilação espontânea, a ventilação não invasiva poderia ser usada como assistência ventilatória profilática, quando iniciada imediatamente após a extubação (ventilação não invasiva profilática), ou como terapia de resgate em casos de insuficiência respiratória pós-extubação (ventilação não invasiva terapêutica). O desfecho primário foi falha de extubação durante a internação na unidade de terapia intensiva.

Resultados:

Foram incluídos 384 pacientes extubados. A falha de extubação foi observada em 107 (27,9%) pacientes. Quarenta e sete (12,2%) pacientes receberam ventilação não invasiva profilática. Em 26 (6,8%) pacientes, a extubação precoce foi realizada com o uso imediato de ventilação não invasiva. A ventilação não invasiva para o manejo da insuficiência respiratória pós-extubação foi administrada em 64 (16,7%) pacientes.

Conclusão:

Os pacientes com COVID-19 apresentaram alta taxa de falha de extubação. Apesar do alto risco de falha de extubação, observamos baixo uso de ventilação não invasiva profilática nesses pacientes.

Descritores:
COVID-19; Infecções por coronavírus; SARS-CoV-2; Respiração artificial; Desmame do respirador; Ventilação não invasiva; Extubação

ABSTRACT

Objective:

To assess the outcome of extubation in COVID-19 patients and the use of noninvasive ventilation in the weaning process.

Methods:

This retrospective, observational, single-center study was conducted in COVID-19 patients aged 18 years or older who were admitted to an intensive care unit between April 2020 and December 2021, placed under mechanical ventilation for more than 48 hours and progressed to weaning. Early extubation was defined as extubation without a spontaneous breathing trial and immediate use of noninvasive ventilation after extubation. In patients who underwent a spontaneous breathing trial, noninvasive ventilation could be used as prophylactic ventilatory assistance when started immediately after extubation (prophylactic noninvasive ventilation) or as rescue therapy in cases of postextubation respiratory failure (therapeutic noninvasive ventilation). The primary outcome was extubation failure during the intensive care unit stay.

Results:

Three hundred eighty-four extubated patients were included. Extubation failure was observed in 107 (27.9%) patients. Forty-seven (12.2%) patients received prophylactic noninvasive ventilation. In 26 (6.8%) patients, early extubation was performed with immediate use of noninvasive ventilation. Noninvasive ventilation for the management of postextubation respiratory failure was administered to 64 (16.7%) patients.

Conclusion:

We found that COVID-19 patients had a high rate of extubation failure. Despite the high risk of extubation failure, we observed low use of prophylactic noninvasive ventilation in these patients.

Keywords:
COVID-19; Coronavirus infections; SARS-CoV-2; Respiration; artificial; Ventilator weaning; Noninvasive ventilation; Airway extubation

INTRODUÇÃO

Uma grande proporção de pacientes com a doença do coronavírus 2019 (COVID-19) progride para uma forma mais grave da afecção, o que requer a internação em unidade de terapia intensiva (UTI).(11 Zhou F, Yu T, Du R, Fan G, Liu Y, Liu Z, et al. Clinical course and risk factors for mortality of adult inpatients with COVID-19 in Wuhan, China: a retrospective cohort study. Lancet. 2020;395(10229):1054-62.,22 Botta M, Tsonas AM, Pillay J, Boers LS, Algera AG, Bos LD, Dongelmans DA, Hollmann MW, Horn J, Vlaar AP, Schultz MJ, Neto AS, Paulus F; PRoVENT-COVID Collaborative Group . Ventilation management and clinical outcomes in invasively ventilated patients with COVID-19 (PRoVENT-COVID): a national, multicentre, observational cohort study. Lancet Respir Med. 2021;9(2):139-48.) A maioria desses pacientes requer ventilação mecânica (VM) e apresenta evolução clínica prolongada e marcada pela dificuldade em deixar o ventilador.(33 Bhatraju PK, Ghassemieh BJ, Nichols M, Kim R, Jerome KR, Nalla AK, et al. Covid-19 in critically ill patients in the Seattle Region - Case series. N Engl J Med. 2020;382(21):2012-22.,44 Grasselli G, Zangrillo A, Zanella A, Antonelli M, Cabrini L, Castelli A, Cereda D, Coluccello A, Foti G, Fumagalli R, Iotti G, Latronico N, Lorini L, Merler S, Natalini G, Piatti A, Ranieri MV, Scandroglio AM, Storti E, Cecconi M, Pesenti A; COVID-19 Lombardy ICU Network. Baseline characteristics and outcomes of 1591 patients infected with SARS-CoV-2 admitted to ICUs of the Lombardy Region, Italy. JAMA. 2020;323(16):1574-81.) Os dados sobre o desmame bem-sucedido da VM em pacientes com COVID-19 são limitados.

A decisão de extubar um paciente pode ser bastante difícil. Uma extubação muito precoce pode aumentar o risco de reintubação, prolongar o tempo de internação na UTI e aumentar a mortalidade.(55 Thille AW, Richard JC, Brochard L. The decision to extubate in the intensive care unit. Am J Respir Crit Care Med. 2013;187(12):1294-302.,66 Baptistella AR, Mantelli LM, Matte L, Carvalho ME, Fortunatti JA, Costa IZ, et al. Prediction of extubation outcome in mechanically ventilated patients: Development and validation of the Extubation Predictive Score (ExPreS). PLoS One. 2021;16(3):e0248868.) Por outro lado, um atraso desnecessário na extubação também pode levar a complicações associadas à maior duração da VM e ao uso ineficiente de recursos de terapia intensiva.(77 Fleuren LM, Dam TA, Tonutti M, de Bruin DP, Lalisang RC, Gommers D, Cremer OL, Bosman RJ, Rigter S, Wils EJ, Frenzel T, Dongelmans DA, de Jong R, Peters M, Kamps MJ, Ramnarain D, Nowitzky R, Nooteboom FG, de Ruijter W, Urlings-Strop LC, Smit EG, Mehagnoul-Schipper DJ, Dormans T, de Jager CP, Hendriks SH, Achterberg S, Oostdijk E, Reidinga AC, Festen-Spanjer B, Brunnekreef GB, Cornet AD, van den Tempel W, Boelens AD, Koetsier P, Lens J, Faber HJ, Karakus A, Entjes R, de Jong P, Rettig TC, Arbous S, Vonk SJ, Fornasa M, Machado T, Houwert T, Hovenkamp H, Noorduijn Londono R, Quintarelli D, Scholtemeijer MG, de Beer AA, Cinà G, Kantorik A, de Ruijter T, Herter WE, Beudel M, Girbes AR, Hoogendoorn M, Thoral PJ, Elbers PW; Dutch ICU Data Sharing Against Covid-19 Collaborators. Predictors for extubation failure in COVID-19 patients using a machine learning approach. Crit Care. 2021;25(1):448.,88 Slutsky AS, Ranieri VM. Ventilator-induced lung injury. N Engl J Med. 2013;369(22):2126-36.)

O uso da ventilação não invasiva (VNI) durante o desmame tem sido pesquisado extensivamente em pacientes sem COVID-19. A extubação precoce seguida de VNI imediata, a VNI profilática depois de extubar um paciente que tolerou um teste de ventilação espontânea (TVE) e a VNI como terapia de resgate para insuficiência respiratória pós-extubação são aplicadas durante o desmame da VM.(99 Vaschetto R, Pecere A, Perkins GD, Mistry D, Cammarota G, Longhini F, et al. Effects of early extubation followed by noninvasive ventilation versus standard extubation on the duration of invasive mechanical ventilation in hypoxemic non-hypercapnic patients: a systematic review and individual patient data meta-analysis of randomized controlled trials. Crit Care. 2021;25(1):189.

10 Thille AW, Muller G, Gacouin A, Coudroy R, Decavèle M, Sonneville R, Beloncle F, Girault C, Dangers L, Lautrette A, Cabasson S, Rouzé A, Vivier E, Le Meur A, Ricard JD, Razazi K, Barberet G, Lebert C, Ehrmann S, Sabatier C, Bourenne J, Pradel G, Bailly P, Terzi N, Dellamonica J, Lacave G, Danin PÉ, Nanadoumgar H, Gibelin A, Zanre L, Deye N, Demoule A, Maamar A, Nay MA, Robert R, Ragot S, Frat JP; HIGH-WEAN Study Group and the REVA Research Network. Effect of postextubation high-flow nasal oxygen with noninvasive ventilation vs high-flow nasal oxygen alone on reintubation among patients at high risk of extubation failure: a randomized clinical trial. JAMA. 2019;322(15):1465-75.
-1111 Belenguer-Muncharaz A, Mateu-Campos ML, Vidal-Tegedor B, Ferrándiz-Sellés MD, Micó-Gómez ML, Altaba-Tena S, et al. Noninvasive ventilation versus conventional oxygen therapy after extubation failure in high-risk patients in an intensive care unit: a pragmatic clinical trial. Rev Bras Ter Intensiva. 2021; 33(3):362-73.) Até o momento, houve pouquíssimas pesquisas sobre o papel da VNI no desmame da VM de pacientes com COVID-19.

Este estudo teve como objetivo avaliar o desfecho da extubação em pacientes com COVID-19 e o uso da VNI no processo de desmame.

MÉTODOS

Este estudo retrospectivo, observacional e unicêntrico foi realizado na UTI do Hospital Nossa Senhora da Conceição, localizado em Porto Alegre (RS, Brasil), de abril de 2020 a dezembro de 2021. Durante a pandemia da COVID-19, o hospital aumentou o número de leitos de UTI e, no pico da pandemia, alocou 50 desses leitos exclusivamente para pacientes com COVID-19. Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do hospital (nº. 4164341). Devido à natureza retrospectiva do estudo, foi dispensada a necessidade do consentimento informado.

Foram incluídos pacientes com idade ≥ 18 anos que estavam internados na UTI com COVID-19 confirmada por reação em cadeia da polimerase via transcriptase reversa (RT-PCR) ou por teste de antígeno para SARS-CoV-2, submetidos à VM por um período de, pelo menos, 48 horas e que progrediram para o desmame. Foram excluídos os pacientes autoextubados ou acidentalmente extubados; submetidos à traqueostomia antes de uma tentativa de extubação ou que faleceram antes do desmame.

Os critérios para iniciar o processo de desmame foram os seguintes: melhora ou resolução da condição do paciente com o uso de VM; temperatura corporal abaixo de 38,5°C; hemoglobina ≥ 8g/dL; nenhuma dose ou doses mínimas de medicamentos vasoativos e sedativos; pressão arterial de oxigênio (PaO2) > 60mmHg ou saturação periférica de oxigênio (SpO2) > 90%; fração inspirada de oxigênio (FiO2) < 0,4; e pressão positiva expiratória final (PEEP) ≤ 8cmH2O. Os pacientes que toleraram o modo de ventilação com pressão de suporte (VPS) com PEEP de 5 - 8cmH2O e pressão acima da PEEP de 7 - 14cmH2O foram submetidos a um TVE, que foi realizado no modo de VPS com pressão acima da PEEP ≤ 8cmH2O e PEEP ≤ 5cmH2O ou com um tubo T por 30 minutos. Os critérios para intolerância ao TVE foram agitação, ansiedade, baixo nível de consciência (escala de coma de Glasgow < 13), frequência respiratória > 35/minuto e/ou uso de músculos acessórios, SpO2 < 90%, frequência cardíaca > 140 batimentos/minuto ou > 20% em relação à linha de base, pressão arterial sistólica < 90mmHg ou desenvolvimento de arritmia. Os pacientes que toleraram o TVE foram extubados. Para os pacientes com falha no TVE, o modo de ventilação assistida foi reaplicado, e um novo TVE foi realizado após 24 horas.

O desfecho primário foi a falha de extubação, que foi definida como necessidade de reintubação durante a internação na UTI. Os desfechos secundários foram falha de extubação em 48 e 96 horas após a extubação, mortalidade na UTI e mortalidade intra-hospitalar.

A extubação precoce foi definida como a extubação sem TVE e o uso imediato de VNI após a extubação.(99 Vaschetto R, Pecere A, Perkins GD, Mistry D, Cammarota G, Longhini F, et al. Effects of early extubation followed by noninvasive ventilation versus standard extubation on the duration of invasive mechanical ventilation in hypoxemic non-hypercapnic patients: a systematic review and individual patient data meta-analysis of randomized controlled trials. Crit Care. 2021;25(1):189.) Essa forma de aplicação da VNI foi proposta como alternativa à VM invasiva em pacientes que ainda não estivessem prontos para a extubação (ou seja, a VNI deve facilitar o desmame).(99 Vaschetto R, Pecere A, Perkins GD, Mistry D, Cammarota G, Longhini F, et al. Effects of early extubation followed by noninvasive ventilation versus standard extubation on the duration of invasive mechanical ventilation in hypoxemic non-hypercapnic patients: a systematic review and individual patient data meta-analysis of randomized controlled trials. Crit Care. 2021;25(1):189.) Esses dois critérios eram necessários para definir a extubação precoce, ou seja, não realizar o TVE e usar a VNI imediatamente após a extubação. Esses pacientes apresentavam pressão acima da PEEP ≤ 14cmH2O (critério para iniciar o desmame) e > 8cmH2O (≤ 8cmH2O foi considerado como indicativo de TVE). Nos pacientes submetidos ao TVE, a VNI poderia ser usada como assistência ventilatória profilática quando iniciada imediatamente após a extubação (VNI profilática) ou como terapia de resgate, em casos de insuficiência respiratória pós-extubação (VNI terapêutica).

Os dados clínicos e demográficos coletados foram os seguintes: idade; sexo; Simplified Acute Physiology Score 3 (SAPS 3); uso da VNI como suporte pré-intubação; PaO2/FiO2 pré-intubação; parâmetros ventilatórios no primeiro dia de VM (PEEP e pressão de platô); uso de VNI (profilática, terapêutica ou associada à extubação precoce) após a extubação; balanço hídrico nas 24 horas anteriores à extubação; tempo de desmame (o tempo entre o primeiro TVE e a extubação); duração da VM invasiva; e mortalidade na UTI ou hospitalar.

As variáveis contínuas são descritas como médias e desvios-padrão ou como medianas e intervalos interquartis, e as variáveis categóricas são descritas como números absolutos e porcentagens. O teste t de Student ou teste de Wilcoxon Mann-Whitney foram usados para as variáveis contínuas, e o teste exato de Fisher foi usado para as variáveis categóricas. Um modelo de riscos proporcionais de Cox foi criado para avaliar se a VNI profilática estava associada à falha de extubação. A VNI profilática foi mantida como uma variável de interesse no modelo. Outras variáveis definidas post hoc foram aquelas plausivelmente associadas ao desfecho primário (idade, balanço hídrico, SAPS 3 e duração da VM). A suposição de linearidade das variáveis independentes com log-odds foi avaliada pela transformação de Box-Tidwell. Uma transformação logarítmica foi realizada em variáveis independentes não lineares. Em seguida, as variáveis transformadas foram incluídas no modelo de riscos proporcionais de Cox como variáveis independentes. Em todas as comparações, valor de p < 0,05 foi considerado estatisticamente significativo. As análises estatísticas foram realizadas usando o IBM Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), versão 20.0 (IBM Corp., Armonk, NY, Estados Unidos) e o R 3.6.2 (The R Foundation).

RESULTADOS

Durante o período do estudo, 1.200 pacientes com diagnóstico confirmado de COVID-19 foram internados na UTI. Destes, 816 foram excluídos do estudo. Dessa forma, 384 pacientes foram incluídos na análise final (Figura 1).

Figura 1
Fluxograma de inclusão dos pacientes no estudo.

As características demográficas e os parâmetros clínicos estão descritos na tabela 1. Ao todo, 137 (35,7%) pacientes receberam suporte não invasivo (profilático, terapêutico ou associado à extubação precoce) após a extubação. A falha de extubação foi observada em 107 (27,9%) pacientes. A taxa de falha foi de 19,5% e 24,0% em 48 e 96 horas após a extubação, respectivamente. A taxa de mortalidade na UTI foi de 39,4% em pacientes que necessitaram de reintubação durante a internação no setor. A mortalidade na UTI não diferiu entre os pacientes que precisaram de reintubação em menos de 48 horas (34,2%) ou após mais de 48 horas (47,2%), com p = 0,214.

Tabela 1
Características de pacientes com COVID-19 ventilados mecanicamente

Em relação ao uso da VNI, 47 (12,2%) pacientes receberam VNI profilática. Destes, 16 (34,0%) tiveram falha de extubação. A taxa de falha de extubação nos 337 pacientes que não receberam VNI profilática foi de 27,0% (n = 91; p = 0,304) (Figura 2). A análise de regressão de Cox mostrou que a VNI profilática não foi associada à falha de extubação após o ajuste multivariado (hazard ratio - HR 1,27; IC95% 0,75 - 2,17; hazard ratio ajustado - HRa 0,57; IC95% 0,16 - 1.98). Em 26 (6,8%) pacientes, a extubação precoce foi realizada com o uso imediato da VNI. Não houve diferença na duração média da VM entre os pacientes submetidos à extubação precoce (11,6 ± 6,1 dias) e os submetidos ao TVE (10,9 ± 6,8 dias), com p = 0,586. A VNI para o manejo da insuficiência respiratória pós-extubação foi administrada em 64 (16,7%) pacientes; 32 deles (50,0%) necessitaram de reintubação.

Figura 2
Análise de Kaplan-Meier do tempo desde a extubação até a reintubação, incluindo todos os pacientes e dividindo-os de acordo com o uso profilático da ventilação não invasiva.

DISCUSSÃO

Observamos taxa de falha de extubação de 27,9% em pacientes com COVID-19. Curiosamente, apesar do alto risco de falha de extubação, observamos baixo uso de VNI profilática nesses pacientes.

A taxa de falha de extubação encontrada no nosso estudo foi semelhante à descrita em pacientes com COVID-19 ao levar em consideração a reintubação durante a internação na UTI como critério (22,1% a 33,1%).(1212 Cammarota G, Vaschetto R, Azzolina D, De Vita N, Olivieri C, Ronco C, et al. Early extubation with immediate non-invasive ventilation versus standard weaning in intubated patients for coronavirus disease 2019: a retrospective multicenter study. Sci Rep. 2021;11(1):13418.

13 Guzatti NG, Klein F, Oliveira JA, Rático GB, Cordeiro MF, Marmitt LP, et al. Predictive factors of extubation failure in COVID-19 mechanically ventilated patients. J Intensive Care Med. 2022;37(9):1250-5.
-1414 Ionescu F, Zimmer MS, Petrescu I, Castillo E, Bozyk P, Abbas A, et al. Extubation failure in critically ill COVID-19 patients: risk factors and impact on in-hospital mortality. J Intensive Care Med. 2021; 36(9):1018-24.) Guzatti et al. descobriram que a taxa de falha de extubação foi aproximadamente três vezes maior durante a internação na UTI (22,1%) do que durante o período de 48 horas (7,8%) após a extubação e levantaram a hipótese de que pacientes com COVID-19 apresentam falha de extubação tardia.(1313 Guzatti NG, Klein F, Oliveira JA, Rático GB, Cordeiro MF, Marmitt LP, et al. Predictive factors of extubation failure in COVID-19 mechanically ventilated patients. J Intensive Care Med. 2022;37(9):1250-5.) No nosso estudo, não encontramos essa tendência de falha de extubação tardia, uma vez que 81% dos pacientes que necessitaram de reintubação foram reintubados nos primeiros 3 dias após a extubação.

A maior duração da VM é uma característica que difere dos pacientes sem COVID-19, podendo estar associada a uma maior taxa de falha de extubação. A duração média da VM neste estudo foi de 10,9 ± 6,7 dias, o que se assemelha ao encontrado em outros estudos de pacientes com COVID-19(1212 Cammarota G, Vaschetto R, Azzolina D, De Vita N, Olivieri C, Ronco C, et al. Early extubation with immediate non-invasive ventilation versus standard weaning in intubated patients for coronavirus disease 2019: a retrospective multicenter study. Sci Rep. 2021;11(1):13418.

13 Guzatti NG, Klein F, Oliveira JA, Rático GB, Cordeiro MF, Marmitt LP, et al. Predictive factors of extubation failure in COVID-19 mechanically ventilated patients. J Intensive Care Med. 2022;37(9):1250-5.
-1414 Ionescu F, Zimmer MS, Petrescu I, Castillo E, Bozyk P, Abbas A, et al. Extubation failure in critically ill COVID-19 patients: risk factors and impact on in-hospital mortality. J Intensive Care Med. 2021; 36(9):1018-24.) e que é mais que o dobro em pacientes sem COVID-19.(1515 Jaber S, Quintard H, Cinotti R, Asehnoune K, Arnal JM, Guitton C, et al. Risk factors and outcomes for airway failure versus non-airway failure in the intensive care unit: a multicenter observational study of 1514 extubation procedures. Crit Care. 2018;22(1):236.)

Há poucas informações sobre o uso de VNI no desmame de pacientes com COVID-19. Em metanálise de estudos com pacientes sem COVID-19, a estratégia de extubação precoce com VNI imediata foi associada à redução da duração da VM invasiva.(99 Vaschetto R, Pecere A, Perkins GD, Mistry D, Cammarota G, Longhini F, et al. Effects of early extubation followed by noninvasive ventilation versus standard extubation on the duration of invasive mechanical ventilation in hypoxemic non-hypercapnic patients: a systematic review and individual patient data meta-analysis of randomized controlled trials. Crit Care. 2021;25(1):189.) Thille et al. observaram redução na taxa de falha de extubação com o uso de VNI profilática em pacientes sem COVID-19 com alto risco de falha de extubação,(1010 Thille AW, Muller G, Gacouin A, Coudroy R, Decavèle M, Sonneville R, Beloncle F, Girault C, Dangers L, Lautrette A, Cabasson S, Rouzé A, Vivier E, Le Meur A, Ricard JD, Razazi K, Barberet G, Lebert C, Ehrmann S, Sabatier C, Bourenne J, Pradel G, Bailly P, Terzi N, Dellamonica J, Lacave G, Danin PÉ, Nanadoumgar H, Gibelin A, Zanre L, Deye N, Demoule A, Maamar A, Nay MA, Robert R, Ragot S, Frat JP; HIGH-WEAN Study Group and the REVA Research Network. Effect of postextubation high-flow nasal oxygen with noninvasive ventilation vs high-flow nasal oxygen alone on reintubation among patients at high risk of extubation failure: a randomized clinical trial. JAMA. 2019;322(15):1465-75.) e recente metanálise de rede confirmou esse achado.(1616 Boscolo A, Pettenuzzo T, Sella N, Zatta M, Salvagno M, Tassone M, et al. Noninvasive respiratory support after extubation: a systematic review and network meta-analysis. Eur Respir Rev. 2023;32(168):220196.) Por fim, recente ensaio clínico randomizado mostrou que a administração de VNI para tratar a insuficiência respiratória pós-extubação em pacientes sem COVID-19 também reduziu a necessidade de reintubação.(1111 Belenguer-Muncharaz A, Mateu-Campos ML, Vidal-Tegedor B, Ferrándiz-Sellés MD, Micó-Gómez ML, Altaba-Tena S, et al. Noninvasive ventilation versus conventional oxygen therapy after extubation failure in high-risk patients in an intensive care unit: a pragmatic clinical trial. Rev Bras Ter Intensiva. 2021; 33(3):362-73.) Os dados sobre esses três modos de uso da VNI durante o desmame em pacientes com COVID-19 são limitados. Em estudo observacional, Cammarota et al. descobriram que a estratégia de extubação precoce seguida de VNI imediata foi a escolhida em 54,5% dos pacientes e reduziu tanto a duração da VM invasiva quanto a necessidade de reintubação.(1212 Cammarota G, Vaschetto R, Azzolina D, De Vita N, Olivieri C, Ronco C, et al. Early extubation with immediate non-invasive ventilation versus standard weaning in intubated patients for coronavirus disease 2019: a retrospective multicenter study. Sci Rep. 2021;11(1):13418.) Nesse estudo, a VNI profilática foi usada em 60% dos pacientes submetidos ao desmame, e 29% deles foram submetidos a VNI como um tratamento de resgate para a insuficiência respiratória pós-extubação. No nosso estudo, a estratégia de extubação precoce seguida de VNI imediata foi escolhida com pouca frequência e não foi associada a uma menor duração da VM invasiva. Além disso, as taxas de VNI profilática (12,2%) e de VNI como terapia de resgate para insuficiência respiratória pós-extubação (16,7%) foram muito menores no nosso estudo. Provavelmente, a baixa frequência de pacientes com suporte de VNI após a extubação está relacionada à incerteza dos benefícios dessa estratégia nesse grupo de pacientes. Apenas um estudo(1212 Cammarota G, Vaschetto R, Azzolina D, De Vita N, Olivieri C, Ronco C, et al. Early extubation with immediate non-invasive ventilation versus standard weaning in intubated patients for coronavirus disease 2019: a retrospective multicenter study. Sci Rep. 2021;11(1):13418.) avaliou o uso de extubação precoce seguida de VNI imediata, e nenhum avaliou o uso de VNI profilática após a extubação. Ainda não está claro se a VNI profilática após a extubação deve ser usada com frequência maior em pacientes com COVID-19. Porém, a justificativa para aumentar seu uso se baseia não apenas no fato de que esses pacientes poderiam ser considerados como de alto risco para falha de extubação, como também na evidência dos benefícios dessa estratégia em pacientes de alto risco sem COVID-19.

Este estudo apresenta algumas limitações. Primeiro, o desenho observacional e retrospectivo não permite estabelecer uma associação de causa e efeito entre os vários fatores avaliados e o desfecho da extubação. Segundo, trata-se de um estudo unicêntrico com um pequeno número de pacientes, o que limita a generalização dos resultados. Terceiro, não foi possível obter dados para algumas variáveis, como fraqueza adquirida na UTI e necessidade de aspiração. Por fim, a experiência adquirida ao longo do tempo e a disponibilidade de recursos podem ter influenciado o uso da VNI.

CONCLUSÃO

Os pacientes com COVID-19 apresentaram alta taxa de falha de extubação. Destaca-se a necessidade do monitoramento cuidadoso desses pacientes após a extubação e a importância de identificar e lidar com os fatores de risco da falha de extubação nessa população. Curiosamente, apesar do alto risco de falha de extubação, observamos baixo uso de ventilação não invasiva profilática nesses pacientes. Estudos futuros são necessários para investigar as razões por trás dessa subutilização e determinar se a ventilação não invasiva profilática pode reduzir o risco de falha de extubação em pacientes com COVID-19.

REFERENCES

  • 1
    Zhou F, Yu T, Du R, Fan G, Liu Y, Liu Z, et al. Clinical course and risk factors for mortality of adult inpatients with COVID-19 in Wuhan, China: a retrospective cohort study. Lancet. 2020;395(10229):1054-62.
  • 2
    Botta M, Tsonas AM, Pillay J, Boers LS, Algera AG, Bos LD, Dongelmans DA, Hollmann MW, Horn J, Vlaar AP, Schultz MJ, Neto AS, Paulus F; PRoVENT-COVID Collaborative Group . Ventilation management and clinical outcomes in invasively ventilated patients with COVID-19 (PRoVENT-COVID): a national, multicentre, observational cohort study. Lancet Respir Med. 2021;9(2):139-48.
  • 3
    Bhatraju PK, Ghassemieh BJ, Nichols M, Kim R, Jerome KR, Nalla AK, et al. Covid-19 in critically ill patients in the Seattle Region - Case series. N Engl J Med. 2020;382(21):2012-22.
  • 4
    Grasselli G, Zangrillo A, Zanella A, Antonelli M, Cabrini L, Castelli A, Cereda D, Coluccello A, Foti G, Fumagalli R, Iotti G, Latronico N, Lorini L, Merler S, Natalini G, Piatti A, Ranieri MV, Scandroglio AM, Storti E, Cecconi M, Pesenti A; COVID-19 Lombardy ICU Network. Baseline characteristics and outcomes of 1591 patients infected with SARS-CoV-2 admitted to ICUs of the Lombardy Region, Italy. JAMA. 2020;323(16):1574-81.
  • 5
    Thille AW, Richard JC, Brochard L. The decision to extubate in the intensive care unit. Am J Respir Crit Care Med. 2013;187(12):1294-302.
  • 6
    Baptistella AR, Mantelli LM, Matte L, Carvalho ME, Fortunatti JA, Costa IZ, et al. Prediction of extubation outcome in mechanically ventilated patients: Development and validation of the Extubation Predictive Score (ExPreS). PLoS One. 2021;16(3):e0248868.
  • 7
    Fleuren LM, Dam TA, Tonutti M, de Bruin DP, Lalisang RC, Gommers D, Cremer OL, Bosman RJ, Rigter S, Wils EJ, Frenzel T, Dongelmans DA, de Jong R, Peters M, Kamps MJ, Ramnarain D, Nowitzky R, Nooteboom FG, de Ruijter W, Urlings-Strop LC, Smit EG, Mehagnoul-Schipper DJ, Dormans T, de Jager CP, Hendriks SH, Achterberg S, Oostdijk E, Reidinga AC, Festen-Spanjer B, Brunnekreef GB, Cornet AD, van den Tempel W, Boelens AD, Koetsier P, Lens J, Faber HJ, Karakus A, Entjes R, de Jong P, Rettig TC, Arbous S, Vonk SJ, Fornasa M, Machado T, Houwert T, Hovenkamp H, Noorduijn Londono R, Quintarelli D, Scholtemeijer MG, de Beer AA, Cinà G, Kantorik A, de Ruijter T, Herter WE, Beudel M, Girbes AR, Hoogendoorn M, Thoral PJ, Elbers PW; Dutch ICU Data Sharing Against Covid-19 Collaborators. Predictors for extubation failure in COVID-19 patients using a machine learning approach. Crit Care. 2021;25(1):448.
  • 8
    Slutsky AS, Ranieri VM. Ventilator-induced lung injury. N Engl J Med. 2013;369(22):2126-36.
  • 9
    Vaschetto R, Pecere A, Perkins GD, Mistry D, Cammarota G, Longhini F, et al. Effects of early extubation followed by noninvasive ventilation versus standard extubation on the duration of invasive mechanical ventilation in hypoxemic non-hypercapnic patients: a systematic review and individual patient data meta-analysis of randomized controlled trials. Crit Care. 2021;25(1):189.
  • 10
    Thille AW, Muller G, Gacouin A, Coudroy R, Decavèle M, Sonneville R, Beloncle F, Girault C, Dangers L, Lautrette A, Cabasson S, Rouzé A, Vivier E, Le Meur A, Ricard JD, Razazi K, Barberet G, Lebert C, Ehrmann S, Sabatier C, Bourenne J, Pradel G, Bailly P, Terzi N, Dellamonica J, Lacave G, Danin PÉ, Nanadoumgar H, Gibelin A, Zanre L, Deye N, Demoule A, Maamar A, Nay MA, Robert R, Ragot S, Frat JP; HIGH-WEAN Study Group and the REVA Research Network. Effect of postextubation high-flow nasal oxygen with noninvasive ventilation vs high-flow nasal oxygen alone on reintubation among patients at high risk of extubation failure: a randomized clinical trial. JAMA. 2019;322(15):1465-75.
  • 11
    Belenguer-Muncharaz A, Mateu-Campos ML, Vidal-Tegedor B, Ferrándiz-Sellés MD, Micó-Gómez ML, Altaba-Tena S, et al. Noninvasive ventilation versus conventional oxygen therapy after extubation failure in high-risk patients in an intensive care unit: a pragmatic clinical trial. Rev Bras Ter Intensiva. 2021; 33(3):362-73.
  • 12
    Cammarota G, Vaschetto R, Azzolina D, De Vita N, Olivieri C, Ronco C, et al. Early extubation with immediate non-invasive ventilation versus standard weaning in intubated patients for coronavirus disease 2019: a retrospective multicenter study. Sci Rep. 2021;11(1):13418.
  • 13
    Guzatti NG, Klein F, Oliveira JA, Rático GB, Cordeiro MF, Marmitt LP, et al. Predictive factors of extubation failure in COVID-19 mechanically ventilated patients. J Intensive Care Med. 2022;37(9):1250-5.
  • 14
    Ionescu F, Zimmer MS, Petrescu I, Castillo E, Bozyk P, Abbas A, et al. Extubation failure in critically ill COVID-19 patients: risk factors and impact on in-hospital mortality. J Intensive Care Med. 2021; 36(9):1018-24.
  • 15
    Jaber S, Quintard H, Cinotti R, Asehnoune K, Arnal JM, Guitton C, et al. Risk factors and outcomes for airway failure versus non-airway failure in the intensive care unit: a multicenter observational study of 1514 extubation procedures. Crit Care. 2018;22(1):236.
  • 16
    Boscolo A, Pettenuzzo T, Sella N, Zatta M, Salvagno M, Tassone M, et al. Noninvasive respiratory support after extubation: a systematic review and network meta-analysis. Eur Respir Rev. 2023;32(168):220196.

Editado por

Editor responsável: Felipe Dal-Pizzol

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    07 Ago 2023
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2023

Histórico

  • Recebido
    10 Jan 2023
  • Aceito
    18 Maio 2023
Associação de Medicina Intensiva Brasileira - AMIB Rua Arminda, 93 - 7º andar - Vila Olímpia, CEP: 04545-100, Tel.: +55 (11) 5089-2642 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: ccs@amib.org.br