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Eventos adversos em pós-operatório cardíaco em uma unidade de terapia intensiva pediátrica: a contribuição do escore VIS e do RACHS-1

RESUMO

Objetivo:

Avaliar a ocorrência de eventos adversos em pós-operatório cardíaco em uma unidade de terapia intensiva pediátrica e estabelecer eventuais associações das características dos pacientes e a possibilidade de predizer tais eventos.

Métodos:

Coorte histórica de 7 dias de pós-operatório cardíaco, de abril a dezembro de 2019, por revisão de prontuários de pacientes com recuperação em unidade de terapia intensiva pediátrica. Foram revisados: características demográficas e clínico-laboratoriais, escores de gravidade dos pacientes e eventos adversos selecionados agrupados em: relacionados a dispositivos, a aspectos cirúrgicos e a aspectos não cirúrgicos.

Resultados:

Foram incluídos 238 prontuários. Ocorreu pelo menos um evento adverso em 110 pós-operatórios (46,2 %). O número total de eventos adversos foi 193 (81%), sendo mais frequente a complicação com cateteres vasculares, seguida de parada cardíaca, sangramento e reexploração cirúrgica. Na análise univariada, escore vasoativo-inotrópico (VIS- vasoactive-inotropic score), Risk Adjustment in Congenital Heart Surgery (RACHS-1) score, idade, Pediatric Index of Mortality (PIM-2), tempo de circulação extracorpórea e de clampeamento aórtico foram estatisticamente significantes com eventos adversos. Na análise multivariável, VIS ≥ 20 (OR 2,90; p = 0,004) e RACHS-1 ≥ 3 (OR 2,11; p = 0,019) mostraram-se relevantes e com significância estatística, enquanto idade e fechamento tardio do esterno possuíam apenas tendência a essa associação. Considerando a previsão de ocorrência de eventos adversos a partir dos valores de escore vasoativo-inotrópico e de RACHS-1, a área sob a curva mostrou valor de 0,73 (IC95% 0,66 - 0,79).

Conclusão:

A frequência de eventos adversos foi expressiva e aqueles relacionados a dispositivos foram os mais frequentes. O VIS e o RACHS-1, utilizados em conjunto, foram capazes de predizer a ocorrência de eventos adversos nesta amostra pediátrica.

Descritores:
Segurança do paciente; Gestão da segurança; Período pós-operatório; Procedimentos cirúrgicos cardíacos/efeitos adversos; Fármacos cardiovasculares; Unidades de terapia intensiva pediátrica

ABSTRACT

Objective:

To evaluate the occurrence of adverse events in the postoperative period of cardiac surgery in a pediatric intensive care unit and to find any patient characteristics that can predict such events.

Methods:

This was a historical cohort study of patients recovering in the pediatric intensive care unit for the first 7 days after cardiac surgery between April and December 2019, by reviewing the medical records. The following were reviewed: demographic, clinical, and laboratory characteristics; patient severity scores; and selected adverse events, grouped into device-related, surgical, and nonsurgical.

Results:

A total of 238 medical records were included. At least one adverse event occurred in 110 postoperative patients (46.2%). The total number of adverse events was 193 (81%). Vascular catheters were the most common cause, followed by cardiac arrest, bleeding, and surgical reexploration. In the univariate analysis, the vasoactive-inotropic score (VIS), Risk Adjustment in Congenital Heart Surgery (RACHS-1) score, age, Pediatric Index of Mortality (PIM-2), cardiopulmonary bypass and aortic clamping duration were significantly associated with adverse events. In the multivariate analysis, VIS ≥ 20 (OR 2.90; p = 0.004) and RACHS-1 ≥ 3 (OR 2.11; p = 0.019) were significant predictors, while age and delayed sternal closure showed only trends toward significance. To predict the occurrence of adverse events from VIS and RACHS-1, the area under the curve was 0.73 (95%CI 0.66 - 0.79).

Conclusion:

Adverse events were quite frequent in children after cardiac surgery, especially those related to devices. The VIS and RACHS-1, used together, predicted the occurrence of adverse events well in this pediatric sample.

Keywords:
Patient safety; Safety management; Postoperative period; Cardiac surgical procedures/adverse effects; Cardiovascular agents; Intensive care units, pediatric

INTRODUÇÃO

Crianças submetidas à cirurgia cardíaca possuem alto risco de morbidade e mortalidade. Desse modo, devem-se identificar e quantificar fatores do pós-operatório imediato que possam indicar os desfechos a curto e longo prazo.(11 Kumar M, Sharma R, Sethi SK, Bazaz S, Sharma P, Bhan A, et al. Vasoactive Inotrope Score as a tool for clinical care in children post cardiac surgery. Indian J Crit Care Med. 2014;18(10):653-8.) A taxa de mortalidade dos pacientes submetidos a cirurgias cardíacas varia entre as instituições e reflete o potencial de melhorias na qualidade assistencial, por meio da identificação e da atenuação de fatores de risco associados a piores desfechos.(22 Jacobs JP, Mayer JE, Mavroudis C, O’Brien SM, Austin EH, Pasquali SK, et al. The Society of Thoracic Surgeons Congenital Heart Surgery Database: 2016 update on outcomes and quality. Ann Thorac Surg. 2016;101(3):850-62.)

Em relação à ocorrência de eventos adversos (EAs) em crianças com doença cardíaca, tem-se muito a aprender.(33 Thiagarajan RR, Bird GL, Harrington K, Charpie JR, Ohye RC, Steven JM, et al. Improving safety for children with cardiac disease. Cardiol Young. 2007;17 Suppl 2:127-32.) Esses pacientes são submetidos frequentemente a procedimentos cardíacos de alto risco para erros sistemáticos, tornando-os dependentes de um time de alta especialização.(44 Catchpole KR, Giddings AE, de Leval MR, Peek GJ, Godden PJ, Utley M, et al. Identification of systems failures in successful paediatric cardiac surgery. Ergonomics. 2006;49(5-6):567-88.) Eles são mais vulneráveis aos eventos, por terem capacidade fisiológica limitada de tolerá-lo.(33 Thiagarajan RR, Bird GL, Harrington K, Charpie JR, Ohye RC, Steven JM, et al. Improving safety for children with cardiac disease. Cardiol Young. 2007;17 Suppl 2:127-32.) Vale ressaltar que, em cirurgia cardíaca pediátrica, os EAs geralmente ocorrem em cadeia, tendo situações de ápice distintas, conforme a localização do paciente: na sala cirúrgica, por exemplo, relacionados à circulação extracorpórea, ou na unidade de terapia intensiva (UTI) pediátrica, na extubação, na redução de drogas vasoativas, entre outros.(55 Hickey E, Pham-Hung E, Nosikova Y, Halvorsen F, Gritti M, Schwartz S, et al. NASA Model of “Threat and Error” in Pediatric Cardiac Surgery: Patterns of Error Chains. Ann Thorac Surg. 2017;103(4):1300-7.)

A predição das complicações em pós-operatório cardíaco é o passo inicial e crítico para melhoria acerca da segurança do paciente e seu desfecho. Uma ferramenta específica para predizer a ocorrência de complicações em cirurgia cardíaca pediátrica não está disponível.(66 Zeng X, An J, Lin R, Dong C, Zheng A, Li J, et al. Prediction of complications after paediatric cardiac surgery. Eur J Cardiothorac Surg. 2020;57(2):350-8.) No cenário da cirurgia cardíaca, comunicação efetiva com métodos padronizados e treinamento técnico, tanto da equipe cirúrgica quanto da equipe de cuidados intensivos, são cruciais. É importante que um programa de melhorias para a segurança do paciente seja implementado.(33 Thiagarajan RR, Bird GL, Harrington K, Charpie JR, Ohye RC, Steven JM, et al. Improving safety for children with cardiac disease. Cardiol Young. 2007;17 Suppl 2:127-32.)

O objetivo do presente estudo foi avaliar a ocorrência de EA em pós-operatório cardíaco em uma UTI pediátrica e estabelecer eventuais associações das características dos pacientes e a possibilidade de predizer tais eventos.

MÉTODOS

Coorte histórica dos primeiros 7 dias de pós-operatório de pacientes submetidos à cirurgia cardíaca na UTI pediátrica do Hospital da Criança Santo Antônio, em Porto Alegre (RS), Brasil, com média de 125 internações e de 35 cirurgias cardíacas por mês. Essa é uma unidade de cuidados quaternários com pacientes de diversos tipos de patologias complexas, sendo realizados pós-operatórios cardíacos, de transplantes e de diversas malformações congênitas, além do cuidado clínico avançado para as doenças não cirúrgicas. A unidade possui 40 leitos para pacientes de até 18 anos. O hospital é ligado à Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre com Programa de Residência Médica em Pediatria e Terapia Intensiva Pediátrica.

A coleta de dados foi realizada por meio do acesso remoto aos prontuários eletrônicos pela pesquisadora principal e assistentes de pesquisa. Foram revisados os primeiros 7 dias de pós-operatório na UTI pediátrica. Para que a uniformidade de coleta fosse preservada, todos os dados foram revisados pela pesquisadora principal.

A amostra foi definida por conveniência, respeitando os critérios de inclusão e de exclusão descritos a seguir. Foram incluídos no estudo prontuários de pacientes de pós-operatórios de cirurgia cardíaca realizada de abril a dezembro de 2019 que internaram na UTI pediátrica, de zero a 18 anos, de ambos os sexos, com permanência mínima de 2 horas na UTI pediátrica. Foram excluídos os prontuários não recuperados apesar de busca ativa por diversos meios, pós-operatório em outro local que não a UTI pediátrica e prontuários com dados clínicos e laboratoriais faltantes que impossibilitassem os cálculos de escores utilizados no estudo.

A caracterização da amostra incluiu idade em meses, sexo, peso em quilogramas, diagnóstico dos defeitos congênitos do sistema cardiovascular,(77 Aiello VD, Caneo LF, Jatene MB, Riso AA, Atik E, Afiune JY, et al. Uma proposta para nomenclatura dos defeitos congênitos do sistema cardiovascular. Rev Bras Cir Cardiovasc. 2002;17(1):1-5.) Risk Adjustment in Congenital Heart Surgery score (RACHS-1),(88 Jenkins KJ, Gauvreau K, Newburger JW, Spray TL, Moller JH, Iezzoni LI. Consensus-based method for risk adjustment for surgery for congenital heart disease. J Thorac Cardiovasc Surg. 2002;123(1):110-8.) Pediatric Index of Mortality (PIM-2),(99 Slater A, Shann F, Pearson G; Paediatric Index of Mortality (PIM) Study Group. PIM2: a revised version of the Paediatric Index of Mortality. Intensive Care Med. 2003;29(2):278-85.) escore vasoativo-inotrópico (VIS - vasoactive-inotropic score)(1010 Gaies MG, Jeffries HE, Niebler RA, Pasquali SK, Donohue JE, Yu S, et al. Vasoactive-inotropic score is associated with outcome after infant cardiac surgery: an analysis from the Pediatric Cardiac Critical Care Consortium and Virtual PICU System Registries. Pediatr Critic Care Med. 2014;15(6):529-37.) no pós-operatório imediato, a presença e o tempo de circulação extracorpórea (CEC), clampeamento aórtico e fechamento tardio do esterno.

Os EAs estudados foram agrupados em três categorias: cirúrgicos (tamponamento cardíaco; reexploração cirúrgica; sangramento), não cirúrgicos (pneumotórax ou hemotórax; parada cardíaca; lesão por pressão) e relacionados a dispositivos (extubação acidental; complicações com cateteres vasculares; complicações com sonda vesical ou dreno de tórax). Os EAs foram definidos por serem considerados de repercussão clínico-assistencial relevante e menos influenciados pelos registros de prontuários.

Foi realizada a classificação de gravidade dos EAs conforme a Organização Mundial da Saúde (OMS):

  • - Leve: sintomas leves, perda de função ou danos mínimos-moderados, duração rápida, apenas intervenções mínimas necessárias.

  • - Moderado: paciente sintomático, necessitando intervenção.

  • - Grave: paciente sintomático, necessitando intervenção para suporte de vida ou intervenção clínica/cirúrgica de grande porte, causando diminuição da expectativa de vida, grande dano ou perda de função permanente ou de longo prazo.

  • - Óbito: dentro das probabilidades, em curto prazo o evento causou ou acelerou a morte.(1111 Brasil. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Implantação do Núcleo de Segurança do Paciente em Serviços de Saúde: 6 - Série Segurança do Paciente e Qualidade em Serviços de Saúde/Agência Nacional de Vigilância Sanitária.. Brasília: Anvisa; 2014.)

O desfecho dos pacientes foi classificado em alta da UTI pediátrica, óbito e outros (reinternação na UTI pediátrica e transferência para outro serviço).

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Irmandade Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre (ISCMPA), com o parecer 3.963.919, e foi realizado segundo os padrões éticos estabelecidos na Declaração de Helsinque de 1964 e suas emendas posteriores ou padrões de ética equivalentes. Além disso, foi registrado na Plataforma Brasil sob CAAE 27472619.7.0000.5683. Tanto o Termo de Consentimento como o de assentimento não foram realizados, por se tratar de estudo observacional, sem interferência na assistência ao paciente.

Dados quantitativos foram descritos por média e desvio-padrão. Na quebra de pressupostos gaussianos, utilizamos mediana e amplitude interquartil (P25 - P75). Dados categóricos foram expressos por contagens e percentuais. As comparações entre variáveis quantitativas foram realizadas pelo teste t ou por seu substituto não paramétrico (teste de Mann-Whitney). Nas situações de variáveis categóricas, usamos o teste qui-quadrado ou, quando necessário, o teste exato de Fisher.

Para avaliar a associação entre variáveis selecionadas e a ocorrência de EAs, utilizamos um modelo de regressão logística. Esse modelo permite, além de obter medidas de magnitude de efeito, estimar a probabilidade de ocorrência de “eventos”. Com isso, obtivemos valores de odds ratio, seus intervalos de confiança de 95% (IC95%) em modelo univarado ou multivarável com estimativas mutuamente ajustadas.

A partir da probabilidade de ocorrência de EAs estimada pelo modelo, obtivemos seu desempenho preditivo, que foi expresso por área sob a curva receiver operating characteristics (ROC). Achados com valor p ≤ 0,05 foram considerados estatisticamente significativos. As análises foram executadas com o auxílio do programa Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) da IBM, versão 27.0.

RESULTADOS

De 261 prontuários de pós-operatórios cardíacos, 238 preencheram os critérios de inclusão do estudo. Houve exclusão de 23, pois 2 não foram localizados, 7 foram a óbito no bloco cirúrgico, 5 estavam em pós-operatórios com recuperação fora da UTI pediátrica e 9 com dados faltantes para cálculo de escores. As características da população estão demonstradas na tabela 1.

Tabela 1
Características sociodemográficas e clínico-laboratoriais e desfechos dos pacientes submetidos a cirurgias cardíacas

Os EAs pesquisados estão dispostos na tabela 2. O número total de EAs foi 193 (81%). A categoria mais frequente foi relacionada a dispositivos invasivos. Destes, as complicações com cateteres vasculares ocorreram em maior número. Os aspectos não cirúrgicos foram o segundo mais frequente e, por último, os relacionados a aspectos cirúrgicos.

Tabela 2
Eventos adversos pesquisados nos prontuários de pós-operatórios cardíacos

Em 110 pós-operatórios (46,2 %), ocorreu pelo menos um EA. A caracterização dos pacientes em dois grupos - com e sem EAs - está expressa na tabela 3. Idade e peso menores, PIM 2 e VIS mais elevados, RACHS-1 3 e 4, fechamento tardio do esterno, tempo de CEC e clampeamento aórtico maiores foram associados a EA com significância estatística. O RACHS-1 1 teve associação significativa com ausência de EA. Quanto ao desfecho, os pacientes com EA tiveram associação a óbito e os pacientes sem EA à alta da UTI pediátrica.

Tabela 3
Associações das variáveis de interesse do estudo com os pós-operatórios cardíacos com ou sem eventos adversos

A figura 1 expressa a distribuição do número total de EAs nos pós-operatórios avaliados. Ocorreram 1 EA em 57 pós-operatórios (51,8%), 2 em 31 (28,2%), 3 em 15 (13,6%), 4 em 6 (5,5%) e 5 em 1 pós-operatório (0,9%).

Figura 1
Eventos adversos nas cirurgias.

A associação entre variáveis selecionadas e a ocorrência de EAs, no modelo de regressão logística, está na tabela 4. Na análise univariada, VIS ≥ 20, RACHS-1 ≥ 3, idade ≤ 24 meses, PIM-2 ≥ 5, tempo de CEC ≥ 120 minutos e tempo de clampeamento aórtico ≥ 30 minutos obtiveram relação positiva e com significância estatística com a ocorrência de evento. Ao ser realizada análise multivariável, VIS ≥ 20 (OR 2,90; p = 0,004) e RACHS-1 ≥ 3 (OR 2,11; p = 0,019) mostram-se relevantes e com significância estatística, enquanto idade e fechamento tardio do esterno possuem apenas tendência a essa associação.

Tabela 4
Regressão logística das variáveis selecionadas para ocorrência de evento adverso

A figura 2 mostra que, considerando a previsão de ocorrência de EAs a partir dos valores de VIS e de RACHS-1, a área sob a curva ROC foi de 0,73 (IC95% 0,66 - 0,79).

Figura 2
Área sob a curva ROC para predição de eventos adversos a partir de escore vasoativo-inotrópico e do Risk Adjustment in Congenital Heart Surgery.

Do total de EAs, 50,3% foram classificados como leve, seguidos de 37,3% de EAs graves. Os EAs relacionados a dispositivos foram, em sua maioria, de classificação leve (84,3%). Os relacionados a aspectos cirúrgicos tiveram 51% de classificação grave. Já os relacionados a aspectos não cirúrgicos foram, em sua maioria (60%), de intensidade grave, sendo parada cardíaca aquela com maior frequência de associação direta a óbito (25%). A classificação da intensidade do dano dos EAs encontra-se na tabela 5.

Tabela 5
Eventos adversos e classificação de intensidade do dano

DISCUSSÃO

A ocorrência de EAs contribui de maneira evidente para piores desfechos dos pacientes em pós-operatório cardíaco. Saber de antemão quais pacientes possuem maior risco de sua ocorrência é imprescindível para o manejo clínico e melhor evolução deles no pós-operatório. Como não dispomos de ferramenta específica com esse fim,(66 Zeng X, An J, Lin R, Dong C, Zheng A, Li J, et al. Prediction of complications after paediatric cardiac surgery. Eur J Cardiothorac Surg. 2020;57(2):350-8.) o presente estudo buscou apresentar fatores para predição da ocorrência de EAs selecionados.

A incidência de EAs em crianças em serviços de saúde varia de 1 a 62%.(1212 Unbeck M, Lindemalm S, Nydert P, Ygge BM, Nylén U, Berglund C, et al. Validation of triggers and development of a pediatric trigger tool to identify adverse events. BMC Health Serv Res. 2014;14:655.) Estudos usando método de detecção por trigger em UTI pediátrica podem chegar a 76% de ocorrência de EAs.(1313 Verlaat CW, van der Starre C, Hazelzet JA, Tibboel D, van der Hoeven J, Lemson J, et al. The occurrence of adverse events in low-risk non-survivors in pediatric intensive care patients: an exploratory study. Eur J Pediatr. 2018;177(9):1351-8.) Em relação a número de pacientes acometidos, 59% - 62% dos internados em UTI pediátrica sofreram ao menos um EA.(1414 Larsen GY, Donaldson AE, Parker HB, Grant MJ. Preventable harm occurring to critically ill children. Pediatr Crit Care Med. 2007;8(4):331-6.,1515 Agarwal S, Classen D, Larsen G, Tofil NM, Hayes LW, Sullivan JE, et al. Prevalence of adverse events in pediatric intensive care units in the United States. Pediatr Crit Care Med. 2010;11(5):568-78.) Em estudos em crianças submetidas à cirurgia cardíaca, 32% - 43% apresentaram pelo menos um evento.(1616 Benavidez OJ, Gauvreau K, Del Nido P, Bacha E, Jenkins KJ. Complications and risk factors for mortality during congenital heart surgery admissions. Ann Thorac Surg. 2007;84(1):147-55.,1717 Agarwal HS, Wolfram KB, Saville BR, Donahue BS, Bichell DP. Postoperative complications and association with outcomes in pediatric cardiac surgery. J Thorac Cardiovasc Surg. 2014;148(2):609-16.e1.) Nossos números se aproximam dos apresentados na literatura. Foi maior em relação à incidência geral, mas semelhante em relação ao número de pacientes acometidos em pós-operatório cardíaco.

O EA de maior frequência no presente estudo foi relacionado a dispositivos - complicações com cateteres vasculares. Esse dado é relevante e se replica na literatura. A perda de cateter central de inserção periférica foi o EA de maior ocorrência em estudo brasileiro, com 18 vezes (25%).(1818 Silva CB, Silva DG, Carvalho LL, Goulart CL, Silva AL, Angri D. Ocorrência de eventos adversos em unidade de terapia intensiva neopediátrica. Rev Epidemiol Control Infec. 2017;7(4):241-5.) Outro estudo, também brasileiro, demonstrou eventos relacionados a acesso vascular como de maior prevalência, com 227 eventos (40,8%).(1919 Rocha JP, Silva AE, Bezerra AL, Sousa MR, Moreira IA. Eventos adversos identificados nos relatórios de enfermagem em uma clínica pediátrica. Cienc Enferm. 2014;20(2):53-63.) Já em uma publicação internacional, os eventos associados a equipamentos como “linhas e tubos” foram o de segunda maior ocorrência, com 101 vezes (22%).(2020 Skapik JL, Pronovost PJ, Miller MR, Thompson DA, Wu AW. Pediatric safety incidents from an intensive care reporting system. J Patient Saf. 2009;5(2):95-101.) No presente estudo, o segundo evento mais frequente foi relacionado a aspectos não cirúrgicos: parada cardíaca. Em estudo multicêntrico, a taxa total de reanimação cardiopulmonar foi de 2,6%, número menos expressivo que o presente.(2121 Gupta P, Jacobs JP, Pasquali SK, Hill KD, Gaynor JW, O’Brien SM, et al. Epidemiology and outcomes after in-hospital cardiac arrest after pediatric cardiac surgery. Ann Thorac Surg. 2014;98(6):2138-43; discussion 2144.) Outra taxa inferior à nossa - ocorrência de reanimação cardiopulmonar em 20 dos 325 pacientes avaliados (6,1%) - foi indicada em estudo retrospectivo de centro único.(1717 Agarwal HS, Wolfram KB, Saville BR, Donahue BS, Bichell DP. Postoperative complications and association with outcomes in pediatric cardiac surgery. J Thorac Cardiovasc Surg. 2014;148(2):609-16.e1.) Frequência de reanimação cardiopulmonar de 52%, superior aos nossos achados, foi obtida em estudo que analisou óbitos em programas de cirurgia cardíaca pediátrica.(2222 Gaies M, Pasquali SK, Donohue JE, Dimick JB, Limbach S, Burnham N, et al. Seminal postoperative complications and mode of death after pediatric cardiac surgical procedures. Ann Thorac Surg. 2016;102(2):628-35.) Seguindo ordem de frequência, em relação a sangramento, nossos achados de ocorrência situam-se dentro de intervalo relatado na literatura. Taxas de 7% de pacientes com sangramento,(1717 Agarwal HS, Wolfram KB, Saville BR, Donahue BS, Bichell DP. Postoperative complications and association with outcomes in pediatric cardiac surgery. J Thorac Cardiovasc Surg. 2014;148(2):609-16.e1.) menor que a nossa, bem como frequência total de sangramento de 35%(2222 Gaies M, Pasquali SK, Donohue JE, Dimick JB, Limbach S, Burnham N, et al. Seminal postoperative complications and mode of death after pediatric cardiac surgical procedures. Ann Thorac Surg. 2016;102(2):628-35.) - maior que a obtida por nós - foram encontradas na literatura. Em relação à reexploração cirúrgica, dado semelhante ao nosso foi expresso em estudo em que 11% dos recém-nascidos necessitaram de reintervenção cirúrgica cardíaca precoce.(2323 Mazwi ML, Brown DW, Marshall AC, Pigula FA, Laussen PC, Polito A, et al. Unplanned reinterventions are associated with postoperative mortality in neonates with chritical congenital heart disease. J Thorac Cardiovasc Surg. 2013;145(3):671-7.) Números menores que os do presente estudo foram relatados, com 3,5%,(2424 Fiorentino F, Stickley J, Dorobantu D, Pandey R, Angelini G, Barron D, et al. Early reoperations in a 5-year national cohort of pediatric patients with congenital heart disease. Ann Thorac Surg. 2016;101(4):1522-9.) 5,6%(2525 Costello JM, Mongé MC, Hill KD, Kim S, Pasquali SK, Yerokun BA, et al. Associations between unplanned cardiac reinterventions and outcomes after pediatric cardiac operations. Ann Thorac Surg. 2018;105(4):1255-63.) e 5,5% de reintervenção.(1717 Agarwal HS, Wolfram KB, Saville BR, Donahue BS, Bichell DP. Postoperative complications and association with outcomes in pediatric cardiac surgery. J Thorac Cardiovasc Surg. 2014;148(2):609-16.e1.) Cifra expressiva foi observada com 32% de reintervenção cirúrgica não programada.(2222 Gaies M, Pasquali SK, Donohue JE, Dimick JB, Limbach S, Burnham N, et al. Seminal postoperative complications and mode of death after pediatric cardiac surgical procedures. Ann Thorac Surg. 2016;102(2):628-35.)

Com relação à intensidade do dano, obtivemos cerca de metade dos eventos classificados como leves - achado que difere da literatura(1515 Agarwal S, Classen D, Larsen G, Tofil NM, Hayes LW, Sullivan JE, et al. Prevalence of adverse events in pediatric intensive care units in the United States. Pediatr Crit Care Med. 2010;11(5):568-78.,2626 Wachter RM. Compreendendo a segurança do paciente. 2a ed. Porto Alegre: AMGH Editora; 2013.) - sendo a maioria relacionada a dispositivos. Parada cardíaca e reexploração cirúrgica, que possuem relação estabelecida a maior risco de óbito,(1717 Agarwal HS, Wolfram KB, Saville BR, Donahue BS, Bichell DP. Postoperative complications and association with outcomes in pediatric cardiac surgery. J Thorac Cardiovasc Surg. 2014;148(2):609-16.e1.,2121 Gupta P, Jacobs JP, Pasquali SK, Hill KD, Gaynor JW, O’Brien SM, et al. Epidemiology and outcomes after in-hospital cardiac arrest after pediatric cardiac surgery. Ann Thorac Surg. 2014;98(6):2138-43; discussion 2144.,2323 Mazwi ML, Brown DW, Marshall AC, Pigula FA, Laussen PC, Polito A, et al. Unplanned reinterventions are associated with postoperative mortality in neonates with chritical congenital heart disease. J Thorac Cardiovasc Surg. 2013;145(3):671-7.

24 Fiorentino F, Stickley J, Dorobantu D, Pandey R, Angelini G, Barron D, et al. Early reoperations in a 5-year national cohort of pediatric patients with congenital heart disease. Ann Thorac Surg. 2016;101(4):1522-9.
-2525 Costello JM, Mongé MC, Hill KD, Kim S, Pasquali SK, Yerokun BA, et al. Associations between unplanned cardiac reinterventions and outcomes after pediatric cardiac operations. Ann Thorac Surg. 2018;105(4):1255-63.) tiveram frequência expressiva em classificação de maior gravidade no presente estudo.

Idade, peso, tempo de CEC e de clampeamento aórtico, fechamento tardio do esterno e PIM-2 foram variáveis relevantes na análise univariada. Dados semelhantes aos nossos foram relatados na literatura - crianças submetidas à cirurgia cardíaca com complicações no pós-operatório eram mais novas, de menor peso e menor estatura.(66 Zeng X, An J, Lin R, Dong C, Zheng A, Li J, et al. Prediction of complications after paediatric cardiac surgery. Eur J Cardiothorac Surg. 2020;57(2):350-8.) Foi demonstrada também associação positiva com tempo cirúrgico, tempo de CEC e de clampeamento aórtico maiores e fechamento tardio do esterno.(66 Zeng X, An J, Lin R, Dong C, Zheng A, Li J, et al. Prediction of complications after paediatric cardiac surgery. Eur J Cardiothorac Surg. 2020;57(2):350-8.) Outro estudo demonstrou que crianças menores de 1 ano tiveram maior taxa de complicações.(1616 Benavidez OJ, Gauvreau K, Del Nido P, Bacha E, Jenkins KJ. Complications and risk factors for mortality during congenital heart surgery admissions. Ann Thorac Surg. 2007;84(1):147-55.) O maior tempo de CEC foi fator de risco para maior ocorrência de complicações cardíacas e não cardíacas.(1717 Agarwal HS, Wolfram KB, Saville BR, Donahue BS, Bichell DP. Postoperative complications and association with outcomes in pediatric cardiac surgery. J Thorac Cardiovasc Surg. 2014;148(2):609-16.e1.) O PIM-2, quando utilizado como trigger para EA, obteve identificação fácil e rápida dos pacientes sob risco de EAs.(2727 Rüegger CM, Frey B. The pediatric index of mortality as a trigger tool for the detection of serious errors and adverse events. Pediatr Crit Care Med. 2018;19(9):869-74.)

De maneira geral, independentemente de idade ou gravidade no momento da internação na UTI pediátrica, a ocorrência de EAs está associada a piores desfechos, tendo relação a aumento de morbidade e mortalidade.(2020 Skapik JL, Pronovost PJ, Miller MR, Thompson DA, Wu AW. Pediatric safety incidents from an intensive care reporting system. J Patient Saf. 2009;5(2):95-101.,2828 Eulmesekian PG, Alvarez JP, Ceriani Cernadas JM, Pérez A, Berberis S, Kondratiuk Y. The occurrence of adverse events is associated with increased morbidity and mortality in children admitted to a single pediatric intensive care unit. Eur J Pediatr. 2020;179(3):473-82.) Esse dado é confirmado no presente estudo, pois o óbito se apresentou relevante no grupo de pacientes com EA.

Diante da inexistência de uma ferramenta específica para predizer a ocorrência de EAs em pós-operatório de cirurgia cardíaca pediátrica e analisando as eventuais associações das variáveis selecionadas com EAs, constatamos a importante contribuição do escore VIS e do RACHS-1. Eles já são utilizados para predizer morbidade, mortalidade e tempo de internação. Demonstramos, a partir deste estudo, seu uso combinado para predizer EAs em pós-operatório cardíaco pediátrico.

O VIS é uma das variáveis que pode influenciar desfechos negativos em pós-operatório cardíaco. Estudos na população pediátrica têm mostrado que VIS com valores elevados predizem desfechos desfavoráveis, incluindo morbidade e mortalidade após cirurgia cardíaca.(2929 Koponen T, Karttunen J, Musialowicz T, Pietiläinen L, Uusaro A, Lahtinen P. Vasoactive-inotropic score and the prediction of morbidity and mortality after cardiac surgery. Br J Anaesth. 2019;122(4):428-36.) Crianças com altas doses de drogas vasoativas no pós-operatório imediato têm alta probabilidade de morbidade e mortalidade.(3030 Gaies MG, Gurney JG, Yen AH, Napoli ML, Gajarski RJ, Ohye RG, et al. Vasoactive-inotropic score as a predictor of morbidity and mortality in infants after cardiopulmonary bypass. Pediatr Crit Care Med. 2010;11(2):234-8.) O VIS com 2 horas de pós-operatório foi associado como fator independente para predizer síndrome de baixo débito.(3131 Pérez-Navero JL, Merino-Cejas C, Ibarra de la Rosa I, Jaraba-Caballero S, Frias-Perez M, Gómez-Guzmán E, et al. Evaluation of the vasoactive-inotropic score, mid-regional pro-adrenomedullin and cardiac troponin I as predictors of low cardiac output syndrome in children after congenital heart disease surgery. Med Intensiva (Engl Ed). 2019;43(6):329-36.) A ocorrência de síndrome de baixo débito esteve associada a maior número de complicações.(3131 Pérez-Navero JL, Merino-Cejas C, Ibarra de la Rosa I, Jaraba-Caballero S, Frias-Perez M, Gómez-Guzmán E, et al. Evaluation of the vasoactive-inotropic score, mid-regional pro-adrenomedullin and cardiac troponin I as predictors of low cardiac output syndrome in children after congenital heart disease surgery. Med Intensiva (Engl Ed). 2019;43(6):329-36.) O VIS elevado com 48 horas pós-operatório foi considerado um alerta de que o paciente possui risco de desfechos desfavoráveis.(3232 Davidson J, Tong S, Hancock H, Hauck A, Da Cruz E, Kaufman J. Prospective validation of the vasoactive-inotropic score and correlation to short-term outcomes in neonates and infants after cardiothoracic surgery. Intensive Care Med. 2012;38(7):1184-90.) Em outro estudo, o VIS mais alto foi associado com mortalidade em 30 dias de pós-operatório, parada cardíaca, necessidade de diálise, alterações neurológicas, tempo de ventilação mecânica e tempo de internação em UTI pediátrica.(1010 Gaies MG, Jeffries HE, Niebler RA, Pasquali SK, Donohue JE, Yu S, et al. Vasoactive-inotropic score is associated with outcome after infant cardiac surgery: an analysis from the Pediatric Cardiac Critical Care Consortium and Virtual PICU System Registries. Pediatr Critic Care Med. 2014;15(6):529-37.) Estudo demonstrou que o VIS máximo em 48 horas de pós-operatório foi significativamente associado a desfecho desfavorável, morbidade e mortalidade.(11 Kumar M, Sharma R, Sethi SK, Bazaz S, Sharma P, Bhan A, et al. Vasoactive Inotrope Score as a tool for clinical care in children post cardiac surgery. Indian J Crit Care Med. 2014;18(10):653-8.) O mesmo estudo relatou ainda que VIS mais alto é possivelmente um marcador de fisiologia cardíaca pobre no período imediato após a cirurgia, podendo levar a terapias mais prolongadas, complicações e recuperação cardiopulmonar deficiente.(11 Kumar M, Sharma R, Sethi SK, Bazaz S, Sharma P, Bhan A, et al. Vasoactive Inotrope Score as a tool for clinical care in children post cardiac surgery. Indian J Crit Care Med. 2014;18(10):653-8.)

Não encontramos, na literatura, dados do emprego do VIS em relação específica com o EA, o que, apesar de dificultar a comparação dos nossos resultados, torna nosso estudo relevante neste achado. Em nosso material, pensamos ter demonstrado a importância do VIS como preditor de ocorrência de EA. Esse escore foi considerado elevado no presente estudo, conforme revisão de literatura, quando ≥ 20 e foi calculado no pós-operatório imediato.

Com relação ao RACHS-1, sabe-se que o escore é utilizado amplamente para predizer mortalidade dos pacientes em pós-operatório cardíaco. Encontramos, na literatura, estudos acerca do seu uso para outros desfechos. Como modelo de predição de óbito, RACHS-1 demonstrou poder discriminatório moderado, com área sob a curva ROC de 0,68 (IC95% 0,58 - 0,79).(3333 Lelong N, Tararbit K, Le Page-Geniller LM, Cohen J, Kout S, Foix-L’Hélias L, Boileau P, Chalumeau M, Goffinet F, Khoshnood B; EPICARD Study Group. Predicting the risk of infant mortality for newborns operated for congenital heart defects: A population-based cohort (EPICARD) study of two post-operative predictive scores. Health Sci Rep. 2021;4(2):e300.) Apresentou também bom poder de discriminação entre sobreviventes e não sobreviventes em publicação do mesmo centro que o presente estudo, com área sob a curva ROC de 0,70 (IC95% 0,63 - 0,77).(3434 Rezende RQ, Ricachinevsky CP, Botta A, Angeli VR, Nogueira AJ. Assessment of PIM-2 performance among surgical patients with heart disease and correlation of results with RACHS-1. Rev Bras Ter Intensiva. 2017;29(4):453-9.) Ainda quanto à predição de óbito, estudos brasileiros demonstraram bom poder de predição de óbito.(3535 Cavalcante CT, de Souza NM, Pinto Júnior VC, Branco KM, Pompeu RG, Teles AC, et al. Analysis of surgical mortality for congenital heart defects using RACHS-1 risk score in a Brazilian single center. Braz J Cardiovasc Surg. 2016;31(3):219-25)

Relacionado a complicações de pós-operatório cardíaco infantil, publicação recente apresentou o RACHS-1 com bom poder de predição (área sob a curva ROC de 0,68).(66 Zeng X, An J, Lin R, Dong C, Zheng A, Li J, et al. Prediction of complications after paediatric cardiac surgery. Eur J Cardiothorac Surg. 2020;57(2):350-8.) Estudos demonstraram associação de escores de RACHS-1 maiores com a ocorrência de EA (p < 0,001) e sua predição.(3636 Nathan M, Karamichalis JM, Liu H, del Nido P, Pigula F, Thiagarajan R, et al. Intraoperative adverse events can be compensated by technical performance in neonates and infants after cardiac surgery: a prospective study. J Thorac Cardiovasc Surg. 2011;142(5):1098-107, 1107.e1-5.,3737 Nathan M, Karamichalis J, Liu H, Gauvreau K, Colan S, Saia M, et al. Technical Performance Scores are strongly associated with early mortality, postoperative adverse events, and intensive care unit length of stay-analysis of consecutive discharges for 2 years. J Thorac Cardiovasc Surg. 2014;147(1):389-94, 396.e1-396.e3.) Foi demonstrado com significância estatística que pacientes com RACHS-1 maiores tiveram mais chance de complicações nos pós-operatórios cardíacos.(1616 Benavidez OJ, Gauvreau K, Del Nido P, Bacha E, Jenkins KJ. Complications and risk factors for mortality during congenital heart surgery admissions. Ann Thorac Surg. 2007;84(1):147-55.,1717 Agarwal HS, Wolfram KB, Saville BR, Donahue BS, Bichell DP. Postoperative complications and association with outcomes in pediatric cardiac surgery. J Thorac Cardiovasc Surg. 2014;148(2):609-16.e1.) No presente estudo, corroboramos os achados de que escore de RACHS-1 mais elevados estão associados a EAs. Especificamente RACHS-1 3 e 4 foram mais relacionados ao desfecho EA.

No presente estudo, enfatizamos que a análise conjunta de VIS e RACHS-1 obteve bom poder discriminatório para ocorrência de EA em pós-operatório cardíaco infantil, considerando o valor de 0,73 encontrado na análise da curva ROC. Quanto maior o valor do VIS no pós-operatório imediato, bem como o do RACHS-1, maior a possibilidade de ocorrência de EAs. Acreditamos que esse achado possa ter aplicação clínica no cuidado e na prevenção de EAs nesses pacientes.

Entre as limitações do presente estudo, consideramos que a validação externa possa ser prejudicada, uma vez que foi realizado em única UTI pediátrica. O tempo de realização do estudo e a detecção dos EAs, feita por meio de revisão de prontuários, podem ter influenciado na identificação dos eventos.

Por outro lado, como ponto forte do presente estudo, a identificação do uso conjunto do escore VIS e do RACHS-1 na predição específica de EA em pós-operatório cardíaco infantil pode ser de auxílio na prática clínica.

CONCLUSÃO

O presente estudo demonstrou que eventos adversos foram frequentes na população pediátrica submetida à cirurgia cardíaca. O evento adverso mais frequente esteve relacionado a complicações com dispositivos. O escore vasoativo-inotrópico e o Risk Adjustment in Congenital Heart Surgery poderiam ser considerados elementos adequados para predizer a ocorrência de eventos adversos em pós-operatório cardíaco pediátrico.

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Editado por

Editor responsável: Arnaldo Prata-Barbosa

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Jan 2024
  • Data do Fascículo
    Oct-Dec 2023

Histórico

  • Recebido
    24 Ago 2023
  • Aceito
    29 Set 2023
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