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Detecção de rotavírus em um cão doméstico na cidade de Manaus-AM

Rotavirus detection in a domestic dog in the City of Manaus-AM

Resumos

Os rotavírus do grupo A, são frequentemente associados com gastroenterites em mamíferos e aves. O objetivo deste trabalho foi detectar a presença de rotavírus em fezes de cães sintomáticos e assintomáticos para diarréia aguda. Foram coletadas 32 amostras de fezes de cães. Todas as amostras foram submetidas à extração do RNA viral seguida da Eletroforese em Gel de Poliacrilamida (EGPA), onde se identificou apenas 1 (um) caso de infecção por rotavírus, em amostra assintomática. A análise do eletroferótipo mostrou um perfil 4:2:3:2 longo, e a homologia dos eletroferótipos de rotavírus humano e canino foi muito alta, sugerindo uma possível infecção interespécie.

Rotavírus canino; Gastroenterite Canina; Eletroferótipo


The group A rotaviruses are frequently associated with gastroenteritis in mammals and birds. The objective of this study was to detect the presence of rotavirus in feces of symptomatic and asymptomatic dogs for acute diarrhea. 32 samples of dog feces were collected. All the samples were submitted to viral RNA extraction followed by electrophoresis in poliacrylamide gels (PAGE), where only one case of rotavirus infection in one asymptomatic sample was found. The electrophoretic analysis showed 4:2:3:2 long profile, and the homology between human and dog rotaviruses was very high. This suggests a possible interspecies infection.

Rotavirus; Canine Gastroenteritis; Electrophoretic profiles


NOTAS E COMUNICAÇÕES

Detecção de rotavírus em um cão doméstico na Cidade de Manaus-AM

Rotavirus detection in a domestic dog in the City of Manaus-AM

Renah Boanerges de Queiroz PIMENTELI, Cristóvão Alves da COSTAII

IInstituto Nacional de Pesquisas da Amazônia - INPA, E-mail: renah_bio@yahoo.com.br

IIInstituto Nacional de Pesquisas da Amazônia - INPA, E-mail: crvcosta@inpa.gov.br

RESUMO

Os rotavírus do grupo A, são frequentemente associados com gastroenterites em mamíferos e aves. O objetivo deste trabalho foi detectar a presença de rotavírus em fezes de cães sintomáticos e assintomáticos para diarréia aguda. Foram coletadas 32 amostras de fezes de cães. Todas as amostras foram submetidas à extração do RNA viral seguida da Eletroforese em Gel de Poliacrilamida (EGPA), onde se identificou apenas 1 (um) caso de infecção por rotavírus, em amostra assintomática. A análise do eletroferótipo mostrou um perfil 4:2:3:2 longo, e a homologia dos eletroferótipos de rotavírus humano e canino foi muito alta, sugerindo uma possível infecção interespécie.

PALAVRAS-CHAVE: Rotavírus canino, Gastroenterite Canina, Eletroferótipo.

ABSTRACT

The group A rotaviruses are frequently associated with gastroenteritis in mammals and birds. The objective of this study was to detect the presence of rotavirus in feces of symptomatic and asymptomatic dogs for acute diarrhea. 32 samples of dog feces were collected. All the samples were submitted to viral RNA extraction followed by electrophoresis in poliacrylamide gels (PAGE), where only one case of rotavirus infection in one asymptomatic sample was found. The electrophoretic analysis showed 4:2:3:2 long profile, and the homology between human and dog rotaviruses was very high. This suggests a possible interspecies infection.

KEY-WORDS: Rotavirus, Canine Gastroenteritis, Electrophoretic profiles.

Os rotavírus do grupo A são considerados os mais importantes agentes etiológicos causadores de diarréia neonatal em humanos e uma grande variedade de espécies animais como: macacos, bezerros, porcos, ratos, coelhos, cães e gatos (Rodger e Holmes, 1979; Roseto et al. 1980; Albert et al. 1987; Anna et al. 1989; Vonsover et al. 1993). Esses vírus não são envelopados e possuem um capsídeo com três camadas e um genoma composto por 11 segmentos de RNA de dupla fita, cada um destes codifica pelo menos uma proteína estrutural e não-estrutural do vírus. As proteínas estruturais extra-capsídeo, VP7 e VP4, são responsáveis pela neutralização do vírus e, baseado nessas proteínas um sistema de dupla classificação foi adotado, sorotipos G (para glicoproteína) definidos pela VP7 e sorotipos P (para os sensíveis a proteínase) definidos pela VP4 (Estes e Cohen 1989).

Rotavírus canino é responsável por formas leves ou assintomáticas de enterites associadas com anorexia e vômitos, especialmente em filhotes, e é considerada de menor importância em cães adultos (Pollock e Carmichael 1998), onde a maioria dessas infecções podem ser assintomáticas (Petric et al. 1981, Mochizuki et al. 1986;).

Poucos são os relatos da ocorrência desses vírus em cães no Brasil. E recentemente as atenções estão sendo voltadas para o real papel dos vírus de origem animal nas infecções em humanos através de estudos de transmissão natural. Portanto o objetivo deste trabalho foi detectar a presença de rotavírus em fezes de cães sintomáticos e assintomáticos, e no caso de resultado positivo fazer uma caracterização da migração dos segmentos genômicos em Eletroforese em Gel de Poliacrilamida (EGPA).

O Trabalho foi realizado na Coordenação de Pesquisas em Ciências da Saúde - CPCS do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia - INPA. Para a realização desta pesquisa, optou-se por executar um estudo prospectivo, descritivo e transversal, programado para durar 3 meses, entre as coletas e o processamento laboratorial das amostras fecais. Foram coletadas 32 amostras fecais no período de agosto a outubro de 2006, sendo 16 amostras do Canil Municipal da Cidade de Manaus, 2 provenientes de uma clínica veterinária da Cidade de Manaus de cães internados com diagnóstico de gastroenterite, vômitos e anorexia, e 14 amostras de residências de pessoas que se ofereceram para ser voluntários na pesquisa fornecendo amostras fecais de seus cães.

A coleta do material fecal no canil era realizada uma vez por semana, pela manhã entre 7:00 e 7:30 hs, antes que as gaiolas fossem limpas, na oportunidade colhiam-se as fezes de secreção natural independentes de serem diarréicas ou não diarréicas. As fezes foram colhidas em recipientes de plásticos com capacidade de 100 ml transportadas sob refrigeração até o Laboratório de Virologia Tropical do CPCS - INPA, onde foram mantidas a - 20°C em freezer, até o momento de serem processadas para extração do RNA viral.

Das 32 amostras coletadas 9 (23%) eram sintomáticas (diarréicas) e 23 (72%) assintomáticas (não diarréicas). As fezes foram preparadas em suspensão de 10 - 20% em tampão TRIS/HCL 0,1M com pH a 7,3, centrifugadas a 2500g por 30 minutos, 700µL de sobrenadante eram recolhidos e submetidos a extração do RNA viral, segundo técnica de Pereira et al.,(1983). A extração do RNA viral foi realizada utilizando a técnica de Fenol-Cloroformio, onde se adicionava 80µL de SDS 10% aos 700µL de sobrenadante sendo incubados a 37ºC por 30 minutos em banho Maria, em seguida adicionou-se 300µL de fenol e 300µL de clorofórmio, agitando-se bem a cada 5 minutos em um intervalo de 15 minutos, seguido de uma centrifugação a 2500g por 30 minutos. O sobrenadante era recolhido e depositado em microtubo com 50µL de NaCl 20%, em seguida era adicionado 950µL de etanol e incubados a -20ºC por 18 horas.

Depois de incubados o material foi centrifugado a 13000g por 30 minutos, o etanol era descartado e os tubos invertidos para secagem do material. O sedimento dos tubos era ressuspenso com 100µl de uma solução dissociante para ácido nucléico sem uréia, e incubados a uma temperatura de 37°C durante 30 minutos segundo Laemmli, (1970). Após essa etapa o material foi submetido à Eletroforese em Gel de Poliacrilamida (EGPA), na ocasião um gel de poliacrilamida a 7,5% foi preparado de acordo com Costa et al. (1990) a corrida eletroforética tinha duração de aproximadamente 4 horas e 30 minutos.

Após a corrida o gel foi retirado da cuba e submetido à coloração de nitrato de prata 0,1M de acordo com Herring et al. (1982), o gel corado foi lido em um transluminador de luz branca e fotografado para posterior análise.

A análise foi realizada comparando as amostras com o controle positivo, uma amostra humana, confirmada por biologia molecular pelo projeto - Epidemiologia molecular das infecções por rotavírus e astrovírus na população infantil da Cidade de Manaus-AM, de 2006, dados ainda não publicados.

De todas as amostras processadas, apenas uma foi positiva para rotavírus proveniente de um animal assintomático, apresentando um perfil eletroforético 4:2:3:2, do tipo longo que é típico do grupo A dos rotavírus (Figura 1). A intensidade da coloração dos segmentos genômicos no Gel de Poliacrilamida indicou a possibilidade de uma alta carga viral presente nas fezes, potencializando o animal como um importante disseminador do vírus no ambiente visto que se tratava de um animal assintomático.


No Brasil, a detecção de rotavírus em fezes de cão foi feita por Gabbay et al. (2003), pela técnica imunuenzimática, onde as partículas virais foram posteriormente visualizadas por microscopia eletrônica direta e seus onze segmentos de RNA revelados por eletroforese em gel de poliacrilamida.

O vírus detectado no presente estudo apresentou um padrão eletroforético que é típico do grupo A dos rotavírus, onde estão inseridos a maioria dos vírus detectados em humanos. Em estudo recente foram detectados rotavírus em fezes de dois cães assintomáticos, apresentando perfil de eletroferótipos do tipo 4:2:3:2 (Ruiz et al. 2009). Semelhantes aos encontrados neste estudo, reforçando a importância que estes animais que circulam livremente nas ruas e residências, podem ter na contaminação ambiental com fezes, o que pode representar um problema sanitário sério em áreas urbanas e suburbanas.

O estudo dos eletroferótipos de rotavírus humanos e de animais adquiriu importante significado no estudo epidemiológico da infecção causada por estes vírus, com evidências de circulação de cepas de rotavírus com diferentes padrões eletroferótipos em surtos de diarréia infantil (Costa et al. 1990).

A transmissão de rotavírus de cão para humanos foi intensamente investigada por Nakagomi et al. (1992) que usou uma cepa de rotavírus humano isolado em Israel em 1985, e submeteu a testes de hemaglutinação, verificando que esse rotavírus tinha uma hemaglutinina capaz de aglutinar eritrócitos de porcos, ovelhas, galinhas e humanos, esses resultados sugeriram que o rotavírus em estudo poderia ser um rotavírus de um animal que infectou um humano. E posteriormente Nakagomi e Nakagomi (2000), mostraram por hibridização de RNA-RNA, que rotavírus humanos são muito próximos, geneticamente, aos rotavírus detectados em cães e gatos.

Nossos resultados sugerem que o cão contaminado, poderia atuar como um reservatório e uma fonte disseminadora desse vírus, mantendo sua circulação no ambiente. Embora a transmissão interespécie de rotavírus não esteja suficientemente comprovada em condições naturais, a chance de ela ocorrer existe, e não deve ser negligenciada quando estudos epidemiológicos forem desenvolvidos.

BIBLIOGRAFIA CITADA

Recebido em 29/11/2007

Aceito em 29/10/2009

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Ago 2010
  • Data do Fascículo
    2010

Histórico

  • Recebido
    29 Nov 2007
  • Aceito
    29 Out 2009
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