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Estratégias anatômicas foliares de treze espécies de Orchidaceae ocorrentes em um campo de altitude no Parque Estadual da Serra do Brigadeiro (PESB): MG, Brasil

Strategies anatomy from thirteen Orchidaceae species occurring in a "high altitude grasslands" in the State Park of Serra do Brigadeiro (PESB): Minas Gerais State, Brazil

Resumos

O estudo objetivou caracterizar, anatomicamente, as folhas de Orchidaceae ocorrentes em um campo de altitude (PESB), identificando caracteres anatômicos úteis na interpretação das estratégias adaptativas. As treze espécies estudadas vivem em condições ambientais extremas tendo sido estudados apenas indivíduos terrestres, exceto Pleurothallis teres Lindl. espécie exclusivamente rupícola. Avaliando os caracteres anatômicos adaptativos, dois grupos podem ser distinguidos, os das espécies perenes (Epidendrum secundum Jacq., Epidendrum xanthinum Lindl., Oncidium barbaceniae Lindl., Oncidium blancheti Rchb. F., Pleurothallis prolifera Lindl., Pleurothallis teres Lindl., Zygopetalum brackypetalum Lindl. e Zygopetalum mackaii Hook.) e os das espécies com redução das partes aéreas no período seco (Cleistes gracilis Schdl., Habenaria hydrophila Barb. Rodr., Habenaria janeirensis Kraenzl, Habenaria macronectar Hoehne e Prescottia montana Barb. Rodr.). As espécies perenes apresentam caracteres xeromórficos: folhas coriáceas ou coriáceas suculentas, cutícula espessa e estriada, hipoderme, grupos de fibras esparsas no mesofilo homogêneo, parênquima aqüífero com espessamento em barras ou espiralados nas paredes, idioblastos de ráfides e feixes vasculares colaterais circundados e com calotas de fibras. Nas espécies com redução das partes aéreas ocorrem investimentos diferenciados e os caracteres xeromórficos não são acentuados. As folhas são delgadas, com células epidérmicas adaxiais altas sendo a cutícula delgada geralmente desprovida de estriamentos e a presença de idioblastos de ráfides freqüentes no mesofilo. Não ocorre hipoderme e os feixes vasculares são reduzidos e sem associações com fibras.

Orchidaceae; anatomia; estratégias adaptativas; folha; campo de altitude


The purpose of this work was to characterize the leaf anatomy of thirteen Orchidaceae species in a "high altitude grasslands", located at State Park of Serra do Brigadeiro, and identify anatomical characteristics helpful to the interpretation of adaptative strategies of these species. The species studied were all terrestrial plants except Pleurothallis teres Lindl. that occurring on granitic rock living in extremely conditions. Observations made in adaptative anatomic features showed that two different groups can be easily distinguished: perennial species (Epidendrum secundum Jacq., Epidendrum xanthinum Lindl., Oncidium barbaceniae Lindl., Oncidium blancheti Rchb. F., Pleurothallis prolifera Lindl., Pleurothallis teres Lindl., Zygopetalum brackypetalum Lindl. and Zygopetalum mackaii Hook.), and species with reduced aerial parts during drought periods (Cleistes gracilis Schdl., Habenaria hydrophila Barb. Rodr., Habenaria janeirensis Kraenzl, Habenaria macronectar Hoehne and Prescottia montana Barb. Rodr.). The perennial species showed xeromorphic features such as coriaceous or coriaceous-succulent leaves, thick striated cuticle, hypodermis, groups of fibers dispersed into a homogenous mesophyll, aquiferous parenchyma with bars or helical thichenings in the walls, rafid idioblasts and colateral vascular bundles surrounded by groups of fibers. In the species with reduced aerial parts different investments were observed and the xeromorphic features were not stressed. These leaves were thin and showed high adaxial epidermal cells having smooth cuticle and rafid idioblasts present in the mesophyll. No hypodermis was identified and the vascular bundles were reduced without rafid idioblasts with them.

Orchidaceae; anatomy; adaptative strategies; leaf; high altitude grasslands


Estratégias anatômicas foliares de treze espécies de Orchidaceae ocorrentes em um campo de altitude no Parque Estadual da Serra do Brigadeiro (PESB) - MG, Brasil1 1 Parte da Dissertação de Mestrado da primeira autora. Universidade Federal de Viçosa, Viçosa, MG, Brasil

Strategies anatomy from thirteen Orchidaceae species occurring in a "high altitude grasslands" in the State Park of Serra do Brigadeiro (PESB) - Minas Gerais State, Brazil

Ivone Vieira da SilvaI, 2 2 Autor para correspondência: ivsbotanica@ibest.com.br ; Renata Maria Strozi Alves MeiraII; Aristéa Alves AzevedoII; Rosane Maria de Aguiar EuclydesII

IAvenida Alta Floresta 756, Jardim Primavera, 78580-000 Alta Floresta, MT, Brasil

IIUniversidade Federal de Viçosa, Departamento de Biologia Vegetal, 36570-000 Viçosa, MG, Brasil

RESUMO

O estudo objetivou caracterizar, anatomicamente, as folhas de Orchidaceae ocorrentes em um campo de altitude (PESB), identificando caracteres anatômicos úteis na interpretação das estratégias adaptativas. As treze espécies estudadas vivem em condições ambientais extremas tendo sido estudados apenas indivíduos terrestres, exceto Pleurothallis teres Lindl. espécie exclusivamente rupícola. Avaliando os caracteres anatômicos adaptativos, dois grupos podem ser distinguidos, os das espécies perenes (Epidendrum secundum Jacq., Epidendrum xanthinum Lindl., Oncidium barbaceniae Lindl., Oncidium blancheti Rchb. F., Pleurothallis prolifera Lindl., Pleurothallis teres Lindl., Zygopetalum brackypetalum Lindl. e Zygopetalum mackaii Hook.) e os das espécies com redução das partes aéreas no período seco (Cleistes gracilis Schdl., Habenaria hydrophila Barb. Rodr., Habenaria janeirensis Kraenzl, Habenaria macronectar Hoehne e Prescottia montana Barb. Rodr.). As espécies perenes apresentam caracteres xeromórficos: folhas coriáceas ou coriáceas suculentas, cutícula espessa e estriada, hipoderme, grupos de fibras esparsas no mesofilo homogêneo, parênquima aqüífero com espessamento em barras ou espiralados nas paredes, idioblastos de ráfides e feixes vasculares colaterais circundados e com calotas de fibras. Nas espécies com redução das partes aéreas ocorrem investimentos diferenciados e os caracteres xeromórficos não são acentuados. As folhas são delgadas, com células epidérmicas adaxiais altas sendo a cutícula delgada geralmente desprovida de estriamentos e a presença de idioblastos de ráfides freqüentes no mesofilo. Não ocorre hipoderme e os feixes vasculares são reduzidos e sem associações com fibras.

Palavras-chave: Orchidaceae, anatomia, estratégias adaptativas, folha, campo de altitude

ABSTRACT

The purpose of this work was to characterize the leaf anatomy of thirteen Orchidaceae species in a "high altitude grasslands", located at State Park of Serra do Brigadeiro, and identify anatomical characteristics helpful to the interpretation of adaptative strategies of these species. The species studied were all terrestrial plants except Pleurothallis teres Lindl. that occurring on granitic rock living in extremely conditions. Observations made in adaptative anatomic features showed that two different groups can be easily distinguished: perennial species (Epidendrum secundum Jacq., Epidendrum xanthinum Lindl., Oncidium barbaceniae Lindl., Oncidium blancheti Rchb. F., Pleurothallis prolifera Lindl., Pleurothallis teres Lindl., Zygopetalum brackypetalum Lindl. and Zygopetalum mackaii Hook.), and species with reduced aerial parts during drought periods (Cleistes gracilis Schdl., Habenaria hydrophila Barb. Rodr., Habenaria janeirensis Kraenzl, Habenaria macronectar Hoehne and Prescottia montana Barb. Rodr.). The perennial species showed xeromorphic features such as coriaceous or coriaceous-succulent leaves, thick striated cuticle, hypodermis, groups of fibers dispersed into a homogenous mesophyll, aquiferous parenchyma with bars or helical thichenings in the walls, rafid idioblasts and colateral vascular bundles surrounded by groups of fibers. In the species with reduced aerial parts different investments were observed and the xeromorphic features were not stressed. These leaves were thin and showed high adaxial epidermal cells having smooth cuticle and rafid idioblasts present in the mesophyll. No hypodermis was identified and the vascular bundles were reduced without rafid idioblasts with them.

Key words: Orchidaceae, anatomy, adaptative strategies, leaf, high altitude grasslands

Introdução

O Parque Estadual da Serra do Brigadeiro (PESB) é uma das 76 áreas prioritárias para a conservação da biodiversidade no Estado de Minas Gerais, avaliado pela riqueza das espécies em geral, por espécies ameaçadas de extinção e espécies endêmicas. São poucos os levantamentos florísticos e estudos anatômicos realizados nessa área, especialmente, quanto a monocotiledôneas. Em trabalho recente, em que foram avaliadas a composição florística e a estrutura da vegetação em uma área do PESB (Tótem deitado), foram amostrados 31 famílias, 63 gêneros e 81 espécies (Caiafa 2005), onde Orchidaceae aparece na lista de maior importância, com 14 espécies distribuídas em oito gêneros, cinco tribos e três subfamílias.

A família Orchidaceae é uma das maiores dentro de Fanerógamas, possuindo cerca de 19.500 espécies e 775 gêneros (Judd et al. 1999). Pabst & Dungs (1975), em sua última revisão das espécies brasileiras, apontaram cerca de 2.350 espécies e 191 gêneros. Atualmente, acredita-se que este número aproxima-se de 2.400 espécies (Barros 1996).

As espécies ocorrem no campo de altitude no PESB por apresentar um alto poder de adaptação a diferentes ambientes (Benzing & Friedman 1981). Orchidaceae são organismos extremamente especializados que ocupam uma diversidade de habitats e de nichos ecológicos, ocorrendo até em ambientes extremos como mares, desertos e topos frios de montanhas (Hunt 1985) e apresentando uma série de adaptações morfológicas, anatômicas e fisiológicas.

Pridgeon (1982) afirma que os caracteres de maior importância estão associados com a folha, incluindo informações sobre epiderme, tricomas, hipoderme, espessamento espiralado das paredes de células do mesofilo e número de séries de feixes vasculares. As folhas de Orchidaceae podem apresentar caracteres xeromórficos como parede celular epidérmica espessa e lignificada, presença de hipoderme, baixa densidade estomática relacionada à suculência foliar, metabolismo ácido das crassulaceae (MAC), presença marcante de elementos mecânicos, maior desenvolvimento do parênquima paliçádico, projeções das paredes celulares e de cutícula sobre os estômatos, além da presença de cutina revestindo as câmaras subestomáticas (Fahn & Cutler 1992).

Tendo em vista o número representativo de espécies de Orchidaceae ocorrentes, a carência de trabalhos sobre o PESB e considerando a importância dos estudos anatômicos sobre o órgão foliar para a família, pretende-se analisar, anatomicamente, as folhas das espécies selecionadas, buscando as características que possam respaldar as possíveis estratégias adaptativas.

Material e métodos

As espécies em estudo Cleistes gracilis Schdl., Epidendrum secundum Jacq., Epidendrum xanthinum Lindl., Habenaria hydrophila Barb. Rodr., Habenaria janeirensis Kraenzl, Habenaria macronectar Hoehne, Oncidium barbaceniae Lindl., Oncidium blancheti Rchb. F., Pleurothallis prolifera Lindl., Pleurothallis teres Lindl., Prescottia montana Barb. Rodr., Zygopetalum brackypetalum Lindl. e Zygopetalum mackaii Hook. foram coletadas em seu habitat natural (Fig. 1), na época de floração.



Os dados sobre a morfologia foram registrados em campo. O material testemunha foi coletado, herborizado e incorporado ao acervo do Herbário VIC da Universidade Federal de Viçosa e enviado aos especialistas para confirmação da identidade taxonômica.

Para os estudos anatômicos e histoquímicos foram coletadas três folhas totalmente expandidas de três indivíduos de cada espécie. Estas amostras foram fixadas em FAA50 (formaldeído, ácido acético glacial e etanol 50% 5:5:90, v/v), por 48 horas, mantidas sob vácuo e estocadas em etanol 70% (Johansen 1940).

A região mediana da lâmina foliar compreendendo a nervura mediana e o bordo foram isoladas e incluídas em metacrilato (Meira & Martins 2003). Os blocos foram cortados transversal e longitudinalmente com espessura de 8 µm, em micrótomo rotativo de avanço automático (RM 2155 - Leica), com a utilização de navalhas de aço descartáveis. Os cortes foram corados com azul de toluidina em pH ácido e as lâminas foram montadas em resina (Permount), observadas e fotografadas em um fotomicroscópio (Olympus AX 70 com sistema U-PHOTO).

Secções de material recém coletado foram utilizadas para os testes histoquímicos, empregando-se sudan IV e sudan black para lipídios (Jensen 1962); floroglucina para lignina (Jensen 1962); lugol para amido (Johansen 1940).

Para estudos em microscopia eletrônica de varredura (MEV), parte das amostras foliares fixadas foram desidratadas em série etílica, levadas à secagem em ponto crítico, montadas em "stubs" e metalizadas com ouro (Bozzola & Russel 1992).

Resultados

Pleurothallis teres Lindl. é a única espécie exclusivamente rupícula (Fig. 2). As demais espécies foram encontradas sobre afloramento rochoso, em solo profundo, em manchas de solo raso, diretamente sobre rochas e no caso de Epidendrum secundum Jacq. e Epidendrum xanthinum Lindl. também foram visualizadas epifíticas em Veloziaceae. Com exceção de Pleurothallis teres Lindl., no presente estudo foram analisados somente os espécimes terrestres.

Os resultados obtidos em campo mostram dois grupos distintos, os das espécies perenes (Epidendrum secundum Jacq., Epidendrum xanthinum Lindl., Oncidium barbaceniae Lindl., Oncidium blancheti Rchb., Pleurothallis prolifera Lindl., Pleurothallis teres Lindl., Zygopetalum mackaii Hook. e Zygopetalum brackypetalum Lindl.) e os das espécies que completam o ciclo de vida antes do período seco tendo redução de suas partes aéreas (Cleistes gracilis Schdl., Habenaria hydrophila Barb. Rodr., Habenaria janeirensis Kraenzl, Habenaria macronectar Hoehne e Prescottia montana Barb. Rodr.).

Nas espécies perenes as folhas são coriáceas ou coriáceo-carnosas (Fig. 2) e no outro grupo são delgadas com lâminas foliares conduplicadas, ou seja, dobradas longitudinalmente, assumindo a forma de "V" aberto, em secção transversal. As lâminas foliares de Epidendrum secundum Jacq., Epidendrum xanthinum Lindl., Pleurothallis prolifera Lindl. e Pleurothallis teres Lindl. apresentam variação de cor de verde a púrpura.

A epiderme das espécies perenes analisadas é uniestratificada, recoberta por cutícula espessa e estriada, cuja espessura pode ultrapassar a altura da célula epidérmica (Fig. 3-6) chegando a recobrir parte da câmara subestomática. Habenaria janeirensis Kraenzl, Habenaria macronectar Hoehne, Cleistes gracilis Schdl. e Prescottia montana Barb. Rodr. apresentam cutícula delgada com ornamentações estriadas (Fig. 7). Em Habenaria hydrophila Barb. Rodr., a cutícula é desprovida de estriamentos. A natureza lipídica da cutícula foi evidenciada pelos testes positivos de sudan IV e sudan black B.



As células epidérmicas das espécies perenes, analisadas em corte transversal são baixas, em geral, não há diferenças acentuadas quanto à face analisada como pode se observado em Oncidium blancheti Rchb. (Fig. 9). Já nas espécies com redução das partes aéreas as células epidérmicas são altas e volumosas na face adaxial (Fig. 7, 8, 11). A presença de hifas fúngicas foi observada, algumas vezes, na face abaxial das células epidérmicas de Oncidium barbaceniae Lindl. (Fig. 22) e no mesofilo de Cleistes gracilis Schdl. (Fig. 10).






As folhas são hipoestomáticas (Fig. 9-11), apenas Pleurothallis prolifera Lindl. e Pleurothallis teres Lindl. são anfiestomáticas. As células-guardas localizam-se no mesmo nível das demais células epidérmicas, contudo, projeções cuticulares salientes formam cristas sobre o poro (Fig. 12, 13). Tais projeções são tão desenvolvidas que nas espécies perenes chegam a formar uma câmara supraestomática (Fig. 12, 13).

As paredes periclinais externas e internas das células-guardas nas espécies perenes e em Prescottia montana Barb. Rodr. são espessas (Fig. 12, 13) e intensamente impregnadas de lignina, confirmado pelo teste com floroglucina ácida. Em Cleistes gracilis Schdl., Habenaria hydrophila Barb. Rodr., Habenaria janeirensis Kraenzl e Habenaria macronectar Hoehne as células-guardas são uniformemente espessas (Fig. 11, 14) e as câmaras subestomáticas são volumosas, possuindo dimensões variáveis (Fig. 11, 14).

Apenas Pleurothallis prolifera Lindl. e Pleurothallis teres Lindl. apresentaram tricomas glandulares que se distribuem em ambas as faces da folha (Fig. 23).

Apenas Prescottia montana Barb. Rodr. apresentou mesofilo com tendência a dorsiventral (Fig. 15), as demais espécies apresentaram mesofilo homogêneo (Fig. 8-11).

A hipoderme ocorre em Epidendrum secundum Jacq., Epidendrum xanthinum Lindl. em ambas as faces e em Oncidium blancheti Rchb. F. (Fig. 9), Oncidium barbaceniae Lindl. (Fig. 16) e Zygopetalum brackypetalum Lindl. somente na face adaxial.

Em Epidendrum secundum Jacq. e Epidendrum xanthinum Lindl. foram observadas barras de espessamento nas paredes das células do parênquima aqüífero no mesofilo (Fig. 17), sendo esta característica mais comum nas proximidades da face abaxial da lâmina foliar. Em Pleurothallis prolifera Lindl. e Pleurothallis teres Lindl. o espessamento das paredes é espiralado (Fig. 18) e ocupa todo o mesofilo (parênquima aqüífero e clorofiliano não se distinguem). No material examinado, ficou evidenciada pela reação com floroglucina ácida uma composição lignificada em Epidendrum secundum Jacq. e Epidendrum xanthinum Lindl. e celulósica em Pleurothallis prolifera Lindl. e Pleurothallis teres Lindl.

Idioblastos contendo ráfides estão distribuídos aleatoriamente como pode ser observado em Habenaria hydrophila Barb. Rodr. (Fig. 11) e Habenaria macronectar Hoehne (Fig. 14).

Fibras esclerenquimáticas interrompem a hipoderme e estão dispersas no parênquima clorofiliano em Epidendrum secundum Jacq., Epidendrum xanthinum Lindl., Oncidium barbaceniae Lindl. e Oncidium blancheti Rchb. F. (Fig. 3, 4, 6, 9, 16, 17), formando cordões paralelos, no sentido longitudinal da lâmina foliar (Fig. 6).

Em Pleurothallis teres Lindl., Pleurothallis prolifera Lindl., Habenaria hydrophila Barb. Rodr., Prescottia montana Barb. Rodr. e Cleistes gracilis Schdl., ficou evidenciada através de reação com lugol, a presença de amido nas células do parênquima clorofiliano, especialmente nas células próximas aos feixes vasculares.

O sistema vascular é constituído por feixes colaterais, de formato ovalado e dimensões bastante variáveis (Fig. 9, 19, 20). Nas espécies perenes, xilema e floema são circundados por uma bainha de fibras que, também formam calotas e concentramse nos pólos (Fig. 9, 19, 20). Nas espécies com redução da parte aérea, os feixes vasculares são colaterais, entretanto, não possuem fibras associadas (Fig. 21).

Discussão

Os campos de altitude dispõem de grande disponibilidade de água durante o verão chuvoso. Estes campos litólicos estão submetidos a um período mais seco com intensa radiação solar e baixa temperatura durante o inverno. No Parque Estadual da Serra do Brigadeiro, nessa estação do ano, esporadicamente, ocorrem fortes ventos, associados com nebulosidade e precipitação atmosférica, um fenômeno conhecido, localmente, como "corrupiana". As corrupianas são esporádicas mas não incomuns, conforme observados nas incursões de campo durante este trabalho e, também, relatadas por outros pesquisadores (Saporetti Junior 2004, comunicação pessoal).

Sanford (1974) afirma que o principal fator restritivo à distribuição das Orchidaceae é a disponibilidade de umidade atmosférica. O que não é problema no ambiente amostrado cuja altitude varia entre 1.700 e 1.722 m exercendo importante influência nas características climáticas, amenizando as temperaturas e criando um clima tipicamente serrano nas regiões mais elevadas.

Além da umidade atmosférica, o padrão de distribuição das orquídeas parece resultar da necessidade de altas intensidades luminosas, sendo a composição do substrato, na maioria das vezes, de importância secundária (Johansson 1975). Isso deve ser levado em consideração já que os solos no local são rasos, muito permeáveis e carentes em nutrientes (Benites et al. 2003).

As espécies perenes apresentaram vários caracteres xeromórficos adaptados à sobrevivência em ambiente de forte insolação, seca, altitude elevada, nebulosidade, baixas temperaturas, vento forte e solo com deficiência nutricional. Nas espécies que completam seu ciclo antes do período seco, possuindo redução periódica das partes aéreas, os caracteres xeromórficos não são acentuados, possivelmente, por estarem menos sujeitas a estresse pois, quando todas as partes vegetativas estão presentes, concomitantemente, ocorre disponibilidade hídrica e umidade atmosférica. Para Ferri (1963), o que adapta uma vegetação ao ambiente é seu comportamento. Isso inclui capacidade de diminuir o consumo de água, de obter água e de, principalmente, completar seu ciclo antes do período seco.

Conforme Withner et al. (1974), a forma "V" aberto presentes nas lâminas foliares das espécies que apresentam redução das partes aéreas, diminui a superfície de exposição à luz, conferindo também suporte mecânico. As folhas das espécies perenes são comparáveis às folhas coriáceas ou coriáceas suculentas, referidas por Withner et al. (1974). Esse tipo de folhas, em Orchidaceae, é característico de formas vegetativas mais evoluídas sendo capazes de sobreviver em habitats xéricos.

As folhas coriáceas das espécies do gênero Epidendrum secundum Jacq., Epidendrum xanthinum Lindl. apresentaram barras lignificadas de espessamento. Resultado celulósico foi observado nas barras de espessamento das folhas suculentas de Pleurothallis teres Lindl., Pleurothallis prolifera Lindl. Acredita-se que no caso de folhas coriáceas os espessamentos lignificados serviriam, principalmente, como suporte mecânico evitando o colapso durante a dessecação. Vários trabalhos de anatomia foliar de Orchidaceae registram nomes diferentes para os espessamentos das paredes, entretanto concordam com suas possíveis funções. Tais células de paredes espessadas estariam envolvidas com a armazenagem de água e com suporte mecânico, evitando o colapso celular durante a dessecação (Olatungi & Negin 1980; Pridgeon 1982; Zanenga-Godoy & Costa 2003). Acredita-se que, no material em estudo, as barras de espessamento nas paredes desempenham as duas funções.

A variação na cor das folhas de verdes a púrpuras nas espécies Epidendrum secundum Jacq., Epidendrum xanthinum Lindl., Pleurothallis prolifera Lindl. e Pleurothallis teres Lindl., provavelmente se deve à presença de pigmentos antociânicos nas células dos respectivos órgãos. A presença de antocianinas é comum como resposta das plantas a vários estresses ambientais. Como as espécies estudadas ocorrem em condições ambientais extremas, parece coerente interpretar a presença de antocianina como resposta a ataque fúngico, estresses hídrico, nutricional e à intensa radiação, principalmente por luz ultra-violeta (Taiz & Zeiger 1998; Scatena & Nunes 1996).

Células epidérmicas adaxiais altas observadas nas plantas com redução da parte aérea é um caráter provavelmente, envolvido na substituição da cutícula espessa pois, as demais espécies estudadas apresentaram cutículas espessas e não apresentaram diferenças relevantes no tamanho das células epidérmicas, quando comparadas as superfícies abaxial e adaxial. Segundo Kurzweel et al. (1994), células epidérmicas adaxiais maiores estão relacionadas com a função de reserva de água, o que parece estar acontecendo nas espécies estudadas.

As projeções cuticulares salientes formando cristas sobre o poro estomático nas espécies perenes têm sido mencionadas para muitas das espécies de orquídeas (Zanenga-Godoy & Costa 2003; Stern & Carlsward 2004) e consideradas como xeromórficas (Rasmussen 1987). A formação de câmara supraestomática é uma característica comum em orquídeas epifíticas que enfrentam altas temperaturas e pouca disponibilidade de água pois, mantém um pequeno compartimento de ar úmido, reduzindo a transpiração (Rosso 1966; Rasmussen 1987). Nas espécies estudadas as projeções cuticulares e câmara supraestomática podem desempenhar as mesmas funções pois, as condições que enfrentam no campo de altitude são semelhantes às descritas para espécies epifíticas.

A presença de hipoderme em Epidendrum secundum Jacq., Epidendrum xanthinum Lindl., Oncidium barbaceniae Lindl., Oncidium blancheti Rchb. F. e Zygopetalum brackypetalum Lindl. é uma característica comum entre os xerófitos (Esau 1977; Cutter 1978), podendo apresentar células maiores que as epidérmicas e com forte espessamento nas paredes (Withner et al. 1974). Sua função está associada ao acúmulo de água e sustentação (Metcalfe 1979), sendo considerada por Williams (1974) como uma estratégia adaptativa.

Idioblastos contendo cristais sob a forma de ráfides, de oxalato de cálcio e monocristais é bastante documentada para as Orchidaceae (Pridgeon 1982; Pridgeon & Stern 1982; Bonates 1993; Stern et al. 1993; Pridgeon 1994; Oliveira & Sajo 1999; Zanenga-Godoy & Costa 2003; Stern & Carlsward 2004) e comum nas espécies estudadas. Acredita-se que o oxalato de cálcio contribua para tornar as plantas menos palatáveis aos animais (Mauseth 1995). Bonates (1993) encontrou idioblastos com ráfides em Encyclia calamaria (Lindl.) Pabst e, acredita que estão relacionados ao balanço iônico e osmoregulação da planta.

Grupos de fibras esclerenquimáticas estão presentes em Epidendrum secundum Jacq., Epidendrum xanthinum Lindl., Oncidium barbaceniae Lindl., Oncidium blancheti Rchb. F. e também são relatadas para outras espécies de Orchidaceae, sendo esta característica relacionada com a resistência mecânica em casos de desidratação (Bonates 1993; Pridgeon 1994; Oliveira & Sajo 1999; Stern & Carlsward 2004). Fibras mais numerosas e de paredes mais espessas nos pólos do floema como acontece em Oncidium barbaceniae Lindl. e Oncidium blancheti Rchb. F. são consideradas caráter xeromórfico (Rudall 1986).

Estratégias adaptativas bem diferenciadas foram observadas nos dois grupos: enquanto as espécies perenes investem na xeromorfia, como estratégia de sobrevivência a todos os estresses a que estão submetidas, as espécies com redução das partes aéreas completam o ciclo de vida antes do período seco e, por esse motivo, não apresentam caracteres xeromórficos acentuados.

Agradecimentos

À Secretaria Municipal de Educação de Alta Floresta - MT, pelo liberação para qualificação profissional concedida à primeira autora; à Universidade Federal de Viçosa, especificamente ao Departamento de Biologia Vegetal, pelo apoio; ao Instituto Estadual de Floresta (IEF), pela concessão da licença para a realização da pesquisa no Parque Estadual da Serra do Brigadeiro (MG); à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG), pelo auxílio à pesquisa (EDT-212/05); ao biólogo Gilmar Edilberto Valente (UFV), pelo auxilio na coleta e acompanhamento das espécies em campo.

Recebido em 26/9/2005. Aceito em 13/04/2006

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  • 1
    Parte da Dissertação de Mestrado da primeira autora. Universidade Federal de Viçosa, Viçosa, MG, Brasil
  • 2
    Autor para correspondência:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      27 Fev 2007
    • Data do Fascículo
      Set 2006

    Histórico

    • Aceito
      13 Abr 2006
    • Recebido
      26 Set 2005
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