Palavras-chave: Dislipidemias/prevenção e controle; Síndrome X Metabólica; Inibidores de Hidroximetilglutaril-CoA Redutases; Fatores de Risco; Exercício; Esportes; Natação
A dislipidemia e a síndrome metabólica crescem exponencialmente nos últimos anos, inclusive em crianças, principalmente pela baixa qualidade da alimentação e pelo elevado nível de sedentarismo populacional.1–3 Essas duas doenças são importantes fatores de risco para o desenvolvimento de doenças cardiovasculares.4 A redução da lipoproteína de baixa densidade (LDL), bem como do colesterol total (CT) e da relação CT pela lipoproteína de alta densidade (HDL – CT/HDL) são as principais formas de prevenção cardiometabólica.5 O uso de estatinas é considerado tratamento padrão, sendo a medida farmacológica mais eficaz para melhorar o perfil lipídico.6 No entanto, existem alternativas não farmacológicas que também são eficazes, sendo uma delas o exercício físico.
Diferentes evidências trazem a importância da adesão ao treinamento físico regular como forma de prevenção primária ou secundária no desenvolvimento ou agravamento de doenças cardiometabólicas.7–9 No entanto, ainda não há um consenso sobre o efeito da combinação entre o uso de estatinas com o treinamento físico, duas poderosas ferramentas que, combinadas, podem promover um impacto ainda maior no perfil lipídico. Foi o que Costa et al.10 fizeram nesta edição dos Arquivos Brasileiros de Cardiologia, analisando a influência do uso de sinvastatina nas adaptações lipídicas decorrentes do treinamento aeróbico e de força em meio aquático em mulheres idosas com dislipidemia. Para tal, foram analisadas 69 mulheres idosas (66,13±5,13 anos), sedentárias, dislipidêmicas, tanto não usuárias quanto usuárias de sinvastatina (20 mg e 40 mg).
Vamos destacar os principais pontos metodológicos do artigo a seguir: trata-se de um ensaio clínico randomizado, com 3 grupos (treinamento aeróbico em meio aquático – WA; treinamento de força em meio aquático – WR; grupo controle – GC). A intervenção teve duração de 10 semanas (2 vezes por semana) para todos os grupos. O grupo WA foi composto por 23 mulheres (10 em uso de estatina e 13 sem uso de estatina); o grupo WR foi composto por 23 mulheres (9 em uso de estatina e 14 sem uso de estatina); e o GC foi composto por 23 mulheres (9 sem uso de estatina e 14 sem uso de estatina). Destacamos aqui o primeiro ponto positivo do estudo: randomização bem executada com n amostral igual em todos os grupos e distribuição correta de uso de estatina.
Em relação ao programa de treinamento físico aquático, as participantes dos grupos WA e WR realizaram 2 sessões de familiarização antes do início do seguimento. Além disso, a intensidade de exercício foi aumentada após 5 semanas de intervenção. As sessões de exercício tiveram duração de 45 minutos, sendo 8 minutos de aquecimento, 30 minutos de parte principal e 7 minutos de desaquecimento. Para o grupo WA, adotou-se o treinamento intervalado com intensidade entre 90% e 100% da frequência cardíaca correspondente ao limiar anaeróbio (FCLA). Já o grupo WR realizou os exercícios adotando velocidade máxima de execução, e também manteve um tempo fixo de 1 minuto e 20 segundos para cada exercício, enquanto o GC realizou um programa não periodizado de exercícios de relaxamento em imersão, com a finalidade de manter a mesma quantidade de sessões semanais dos outros grupos. O segundo mérito do trabalho foi controlar a intensidade de exercício pela FCLA, além de periodizar o treinamento físico, planejando o incremento da intensidade durante o seguimento.
A seguir, destacaremos os principais achados do estudo: em resumo, o uso de estatina associado ao treinamento físico melhora LDL, CT e CT/HDL. Quanto? Participantes medicadas para LDL: −5,58 a 25,18 mg.dl−1; CT: −3,41 a 25,89 mg.dl−1; CT/HDL: −0,37 a 0,61 mg.dl−1, com p significativo quando comparado às participantes não medicadas, sendo essa redução estatisticamente significativa apenas para o grupo WR. De modo geral, o uso de estatina associado ao treinamento de força em meio aquático parece ser a estratégia mais eficaz na redução dos parâmetros lipídicos avaliados no presente estudo.
Sabemos da importância do treinamento físico aeróbico, principalmente pela sua proteção em relação a diversos fatores de risco cardiovascular. No entanto, diferentes evidências sugerem que o treinamento de força é a ferramenta mais eficaz para melhorar o perfil lipídico, principalmente aumentando o HDL, e consequentemente reduzindo CT/HDL.11 Durante a prática clínica, os especialistas sabem que o treinamento físico combinado, ou seja, aeróbico e força juntos, na mesma sessão ou em sessões diferentes, apresenta benefícios em diversos parâmetros e acaba sendo o mais utilizado no dia a dia profissional, somando os benefícios tanto do exercício aeróbico quanto do exercício de força. O estudo apresenta muitos méritos, no entanto podemos sugerir que para os próximos estudos, seja comparado o efeito do treinamento combinado e também em homens dislipidêmicos, inclusive ampliando a faixa etária, visto que os resultados do presente estudo servem apenas para mulheres idosas.
Agradecimentos
À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pela concessão da bolsa de doutorado e ao Programa de Ciências da Saúde: Cardiologia e Ciências Cardiovasculares pertencente à Universidade Federal do Rio Grande do Sul pela oportunidade de trabalho.
Referências
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Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
06 Set 2021 -
Data do Fascículo
Ago 2021