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Mixoma atrial gigante simulando estenose mitral grave em paciente jovem

Resumos

Homem de 20 anos, previamente hígido, com quadro clínico de dispneia paroxística noturna e cansaço aos médios esforços com evolução em torno de dez dias, apresentou, ao exame ecocardiográfico, mixoma em átrio esquerdo funcionando como estenose mitral grave.

Mixoma; tumores de células gigantes; estenose da valva mitral; adolescente


The echocardiogram of a twenty-year-old man, previously healthy, suffering from paroxysmal nocturnal dyspnea and fatigue after moderate exertion that intensified over a period of about ten days, showed the left atrium myxoma working as severe mitral stenosis.

Myxoma; giant cell tumors; mitral valve stenosis; adolescent


Hombre de 20 años, previamente sano, con cuadro clínico de disnea paroxística nocturna y cansancio a los esfuerzos medios con evolución alrededor de diez días, presentó, al examen ecocardiográfico, mixoma en atrio izquierdo funcionando como estenosis mitral grave.

Mixoma; tumores de células gigantes; estenosis de la válvula mitral; adolescente


RELATO DE CASO

Mixoma atrial gigante simulando estenose mitral grave em paciente jovem

Eric Paiva Vilela; Leonardo Moura; Danielle Pepe; Edson Nunes; Fabio Erthal; Erika Campana

Hospital do Coração Samcordis, São Gonçalo, RJ - Brasil

Correspondência Correspondência: Eric Paiva Vilela Rua Professor Gastão Bahiana, 429 / 207 - Copacabana 22071-030 - Rio de Janeiro, RJ - Brasil E-mail: ericpaivavilela@gmail.com

RESUMO

Homem de 20 anos, previamente hígido, com quadro clínico de dispneia paroxística noturna e cansaço aos médios esforços com evolução em torno de dez dias, apresentou, ao exame ecocardiográfico, mixoma em átrio esquerdo funcionando como estenose mitral grave.

Palavras-chave: Mixoma, tumores de células gigantes, estenose da valva mitral, adolescente.

Introdução

Mixoma é o tumor cardíaco primário mais frequente e pode originar-se de qualquer câmara cardíaca, sendo mais comum no átrio esquerdo, cuja incidência é de 75%. As manifestações clínicas estão relacionadas à tríade: obstrução intracardíaca, fenômenos embólicos e sintomas constitucionais, como febre e perda ponderal. Tumores cardíacos primários são raros, e cerca de 75% apresenta caráter benigno1. A prevalência do mixoma atrial é maior em mulheres (2/3 dos casos), e a ocorrência, entre a 3ª e a 6ª década1. Aproximadamente 70% dos pacientes com mixoma de AE têm sintomas cardíacos, predominantemente insuficiência cardíaca e síncope1. O sintoma mais frequente é a dispneia (70%), seguida de dispneia paroxística noturna. O tamanho, a localização e a mobilidade do mixoma determinarão a sintomatologia e a gravidade da obstrução valvar2. Em apenas 10% dos pacientes, essa obstrução causará estenose mitral grave3-5.

Relato do caso

Paciente masculino, 20 anos, previamente hígido, procurou o Serviço de Cardiologia após episódio de dispneia durante o sono. Em investigação detalhada durante a anamnese ambulatorial, queixava-se de cansaço aos médios esforços com evolução em torno de 15 dias, sendo caracterizado como classe funcional II da NYHA (New York Heart Association). Ao exame físico, apresentava pressão arterial 110X70 mmHg, ritmo cardíaco regular em dois tempos, sopro sistólico em foco mitral, restante do exame físico sem alterações. O eletrocardiograma evidenciava bloqueio de ramo direito; o ecocardiograma evidenciava volumosa massa que ocupava quase a totalidade do átrio esquerdo, medindo 4,3x8,0 cm, e aderida à parede póstero-superior do átrio esquerdo. O diâmetro do átrio esquerdo era de 5,6 cm, e o volume estimado, de 98 cm3. Parte da massa projetava-se através da valva mitral ao ventrículo esquerdo durante a sístole atrial, sendo a área valvar estimada em 1 cm2, e ocasionava restrição ao fluxo mitral compatível com estenose grave (Estenose mitral grave). Foi então indicada cirurgia para a retirada do tumor.

Nos exames pré-operatórios, a única alteração encontrada foi uma anemia microcítica e hipocrômica. Foi então realizada exérese do tumor com ressecção da fossa oval e atriosseptoplastia com pericárdio bovino. O estudo histopatológico da peça cirúrgica confirmou o diagnóstico de mixoma atrial esquerdo. O seguimento clínico pós-operatório ocorreu sem complicações, e o paciente teve alta hospitalar cinco dias após a cirurgia.

Discussão

O caso apresentado expõe uma patologia rara, o mixoma, que responde por, aproximadamente, 75% das neoplasias primárias do coração1 e, embora de caráter histológico benigno, pode ser responsável por complicações incapacitantes e até a morte súbita, dependendo da localização e das dimensões. Dessa forma, o diagnóstico precoce e a remoção cirúrgica melhoram o prognóstico dos pacientes1.

Diferente do padrão observado na literatura1-3, trata-se de um paciente do sexo masculino na segunda década de vida. A apresentação clínica do caso, classe funcional II, também contraria a apresentação mais comum, em que 70% dos pacientes têm sinais e sintomas de insuficiência cardíaca. A ocorrência de sopro cardíaco, um sinal muito frequente na literatura, também foi observada nesse paciente. É importante ressaltar que a presença de cansaço aos esforços e o sopro cardíaco em um paciente jovem e previamente hígido não devem ser negligenciados e tornam obrigatório o diagnóstico diferencial com doença valvar e cardiopatia hipertrófica.

Os exames laboratoriais gerais (sangue, ECG e RX) podem ser inespecíficos e contribuem de forma modesta com o diagnóstico, como observamos nesse paciente.

Diversos métodos complementares armados podem ser empregados para o diagnóstico do mixoma: Tomografia computadorizada, ressonância magnética, estudo hemodinâmico e o ecocardiograma. O ecocardiograma tem se mostrado um excelente exame complementar com alto índice de positividade no diagnóstico do mixoma1. Nesse caso, o diagnóstico de mixoma foi realizado com auxílio da ecocardiografia transtorácica bidimensional, não sendo considerando necessário o uso de estudo hemodinâmico para a indicação da cirurgia.

Os mixomas geralmente são pediculados, podem apresentar variações com relação aos aspectos macroscópicos, e, com frequência, essas tumorações não são solitárias. O presente caso refere-se a um tumor solitário de grandes dimensões, não pediculado e aderido à parede do átrio6,7 (Figura 1).


Em concordância com a literatura, o procedimento cirúrgico foi realizado sem dificuldades técnicas, e não ocorreram complicações. O paciente apresentou alta hospitalar e, no seguimento de 19 meses, segue livre de eventos.

O presente caso demonstra a ocorrência de uma neoplasia cardíaca rara que, apesar de benigna, pode levar à evolução desfavorável. Dessa forma, o diagnóstico e a remoção precoces melhoram o prognostico do paciente. A história médica atentamente obtida e o uso de um método complementar simples como o ecocardiograma são eficazes para o diagnóstico, e a remoção cirúrgica apresenta alto índice de cura com segurança e baixa mortalidade.

Potencial Conflito de Interesses

Declaro não haver conflito de interesses pertinentes.

Fontes de Financiamento

O presente estudo não teve fontes de financiamento externas.

Vinculação Acadêmica

Não há vinculação deste estudo a programas de pós-graduação.

Artigo recebido em 06/03/09; revisado recebido em 27/03/09; aceito em 25/09/09.

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  • Correspondência:

    Eric Paiva Vilela
    Rua Professor Gastão Bahiana, 429 / 207 - Copacabana
    22071-030 - Rio de Janeiro, RJ - Brasil
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      13 Abr 2011
    • Data do Fascículo
      Out 2010

    Histórico

    • Aceito
      25 Set 2009
    • Revisado
      27 Mar 2009
    • Recebido
      06 Mar 2009
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