Estatinas na Gestação – Novas Recomendações do Food and Drug Administration

Palavras-chave
Inibidores de Hidroximetilglutaril-CoA Redutases; Gestação; Dislipidemias

O Food and Drug Administration (FDA), orgão responsável pelo controle de segurança e eficácia de medicações nos Estados Unidos, tradicionalmente utiliza uma classificação do nível de risco para o uso de medicações durante a gestação. Nesta classificação, as estatinas eram consideradas da categoria X, o que indica um risco demonstrado de anormalidades fetais acima do benefício do seu uso. No entanto, em julho de 2021, o FDA retirou esta recomendação.¹

Antes da mudança, a recomendação americana era de que as estatinas fossem suspensas desde o início das tentativas de concepção até o término do aleitamento materno. A presente mudança tem embasamento científico adequado. A recomendação prévia de risco fetal associado ao uso de estatinas vem de literatura de estudos experimentais em animais com doses muito mais altas que as utilizadas em humanos.⁴ Já estudos mais recentes e com dados em humanos não demonstram o mesmo risco identificado nos estudos experimentais. Em um estudo observacional recente o uso de estatinas não se associou a maior risco de malformações fetais. No entanto, seu uso associou-se a baixo peso ao nascer e parto prematuro. Ainda, uma metánalise de 5 estudos de coorte publicada recentemente corroborou tais achados.⁵ É importante destacar que o uso de estatinas está associado a maior número de comorbidades que podem levar a baixo peso ao nascer ou parto prematuro. Logo, é possível que estas complicações estejam associadas a comorbidades e não ao uso de estatinas.

Mesmo com o uso seletivo, pesando os riscos e benefícios, esta mudança do FDA tem vários outros desdobramentos. Dentre eles, o principal é facilitar a execução de estudos clínicos com estatinas no periodo pré-concepção, gestacional e durante a amamentação. Além de avaliar o benefício de redução do risco cardiovascular nestes períodos, estudos mais recentes têm investigado outros efeitos potenciais das estatinas. Um estudo publicado neste ano avaliou o impacto da estatina nos resultados de fertilização in vitro de pacientes com dislipidemia a infertilidade. Apesar de limitações importantes, o estudo sugere que pravastatina pode melhorar a eficácia do tratamento com fertilizações in vitro nesta população. No entanto, estudos adicionais são necessários antes de qualquer implementação clínica.

Da mesma forma, diversos estudos têm avaliado o uso de estatinas na prevenção de pré-eclampsia. O racional destes estudos é que as estatinas poderiam reverter o desbalanço entre angiogenese e antiangiogenese que ocorre antes da apresentação clínica da pré-eclampsia. Apesar de diversos estudos realizados, este efeito das estatinas na pré-eclampsia, ainda é controverso. Estudos menores sugeriram benefício, mas estudos randomizados recentes foram negativos.⁶ Até a realização de estudos adicionais, deve-se considerar o benefício da estatina nestes cenários como incerto.

Apesar de um pequeno passo, a mudança de linguagem e recomendação proposta pelo FDA tem vários desdobramentos clínicos importantes e implicações científicas futuras. Por hora, a simples flexibilização do uso de estatinas durante o período pré-concepção e durante a gestação já terá grande impacto na prática clínica rotineira para mulheres com alto risco cardiovascular e doença aterosclerótica estabelecida, que estejam em idade fértil e desejem engravidar.

Referências

• ¹
  Food and Drug Administration [Internet]. Rockville: The U.S. Food and Drug Administration; 2022 [cited 14 Jun 2022]. Available from: https://www.fda.gov/drugs/drug-safety-and-availability/fda-requests-removal-strongest-warning-against-using-cholesterol-lowering-statins-during-pregnancy.
• ²
  Klevmoen M, Bogsrud MP, Retterstøl K, Svilaas T, Vesterbekkmo EK, Hovland A, et al. Loss of Statin Treatment Years During Pregnancy and Breastfeeding Periods in Women with Familial Hypercholesterolemia. Atherosclerosis. 2021;335:8-15. doi: 10.1016/j.atherosclerosis.2021.09.003.
  » https://doi.org/10.1016/j.atherosclerosis.2021.09.003
• ³
  Eisenberg ML, Thoma ME, Li S, McLain AC. Trends in Time-to-Pregnancy in the USA: 2002 to 2017. Hum Reprod. 2021;36(8):2331-8. doi: 10.1093/humrep/deab107.
  » https://doi.org/10.1093/humrep/deab107
• ⁴
  Edison RJ, Muenke M. Mechanistic and Epidemiologic Considerations in the Evaluation of Adverse Birth Outcomes Following Gestational Exposure to Statins. Am J Med Genet A. 2004;131(3):287-98. doi: 10.1002/ajmg.a.30386.
  » https://doi.org/10.1002/ajmg.a.30386
• ⁵
  Karadas B, Uysal N, Erol H, Acar S, Koc M, Kaya-Temiz T, et al. Pregnancy Outcomes Following Maternal Exposure to Statins: A Systematic Review and Meta-Analysis. Br J Clin Pharmacol. 2022. Ahead of print. doi: 10.1111/bcp.15423.
  » https://doi.org/10.1111/bcp.15423
• ⁶
  Döbert M, Varouxaki AN, Mu AC, Syngelaki A, Ciobanu A, Akolekar R, et al. Pravastatin Versus Placebo in Pregnancies at High Risk of Term Preeclampsia. Circulation. 2021;144(9):670-9. doi: 10.1161/CIRCULATIONAHA.121.053963.
  » https://doi.org/10.1161/CIRCULATIONAHA.121.053963

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  11 Jul 2022
• Data do Fascículo
  Jul 2022