Acessibilidade / Reportar erro

Atividade Física no Tempo Livre, porém não Atividade Física no Deslocamento, está Associada com Risco Cardiovascular em Participantes do ELSA-Brasil

Resumo

Fundamento:

Apesar dos relatos na literatura de que tanto a atividade física no tempo livre (AFTL) quanto a atividade física no deslocamento (AFDESL) promovem benefícios à saúde, estudos comparando a associação desses domínios da atividade física com escores de risco cardiovascular são escassos.

Objetivo:

Verificar a associação entre AFTL e AFDESL com escores de risco cardiovascular na coorte Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (ELSA-Brasil).

Métodos:

Estudo transversal com dados da linha de base de 13.721 participantes de ambos os sexos, com idades entre 35 e 74 anos, livres de doenças cardiovasculares, do ELSA-Brasil. A atividade física foi mensurada por meio do International Physical Activity Questionnary (IPAQ). Foram utilizados cinco escores de risco cardiovascular: escore de Framingham - doença coronariana (colesterol); escore de Framingham - doença coronariana (lipoproteína de baixa densidade - LDL-C); escore de Framingham - doença cardiovascular (colesterol); escore de Framingham - doença cardiovascular (índice de massa corpórea - IMC); e equações de coorte agrupadas para doença cardiovascular aterosclerótica. As associações ajustadas por variáveis de confundimento foram analisadas por meio de regressão logística. Utilizou-se intervalo de confiança de 95% (IC95%).

Resultados:

Com quase todos os escores de risco cardiovascular analisados, a AFTL apresenta-se inversamente associada, enquanto a AFDESL não demonstra associação estatisticamente significante com nenhum deles. Observou-se, ainda, a existência de efeito dose-resposta na associação entre AFTL e escores de risco cardiovascular principalmente em homens.

Conclusões:

A AFTL, porém não a AFDESL, apresenta associação com os escores de risco cardiovascular analisados. A maior quantidade de atividade física (duração e intensidade) está associada de forma mais significativa, principalmente em homens, aos escores de risco cardiovascular em participantes da coorte ELSA-Brasil. (Arq Bras Cardiol. 2017; [online].ahead print, PP.0-0)

Palavras-chave:
Exercício; Técnicas de Exercício de Movimento; Fatores de Risco; Doenças Cardiovasculares / prevenção & controle; Epidemiologia

Abstract

Background:

Despite reports in the literature that both leisure-time physical activity (LTPA) and commuting physical activity (CPA) can promote health benefits, the literature lacks studies comparing the associations of these domains of physical activity with cardiovascular risk scores.

Objective:

To investigate the association between LTPA and CPA with different cardiovascular risk scores in the cohort of the Longitudinal Study of Adult Health ELSA-Brasil.

Methods:

Cross-sectional study with data from 13,721 participants of both genders, aged 35-74 years, free of cardiovascular disease, from ELSA Brazil. Physical activity was measured using the International Physical Activity Questionnaire (IPAQ). Five cardiovascular risk scores were used: Framingham score - coronary heart disease (cholesterol); Framingham score - coronary heart disease (LDL-C); Framingham score - cardiovascular disease (cholesterol); Framingham score - cardiovascular disease (body mass index, BMI); and pooled cohort equations for atherosclerotic cardiovascular disease (ASCVD). Associations adjusted for confounding variables between physical activity and different cardiovascular risk scores were analyzed by logistic regression. Confidence interval of 95% (95%CI) was considered.

Results:

LTPA is inversely associated with almost all cardiovascular risk scores analyzed, while CPA shows no statistically significant association with any of them. Dose-response effect in association between LTPA and cardiovascular risk scores was also found, especially in men.

Conclusions:

LTPA was shown to be associated with the cardiovascular risk scores analyzed, but CPA not. The amount of physical activity (duration and intensity) was more significantly associated, especially in men, with cardiovascular risk scores in ELSA-Brasil.

Keywords:
Exercise; Exercise Movement Techniques; Risk Factors; Cardiovascular Diseases / prevention & control; Epidemiology

Introdução

A atividade física (AF) está inversamente associada com mortalidade por todas as causas e principalmente com mortalidade cardiovascular.11 Nocon M, Hiemann T, Müller-Riemenschneider F, Thalau F, Roll S, Willich SN. Association of physical activity with all-cause and cardiovascular mortality: a systematic review and meta-analysis. Eur J Cardiovasc Prev Rehabil. 2008;15(3):239-46. doi: 10.1097/HJR.0b013e3282f55e09
https://doi.org/10.1097/HJR.0b013e3282f5...
,22 Shortreed SM, Peeters A, Forbes AB. Estimating the effect of long-term physical activity on cardiovascular disease and mortality: evidence from the Framingham Heart Study. Heart. 2013;99(9):649-54. doi: 10.1136/heartjnl-2012-303461.
https://doi.org/10.1136/heartjnl-2012-30...
Além disso, diversos estudos comprovam que a AF, sobretudo quando analisada no domínio do tempo livre, apresenta efeito de proteção contra doenças crônicas e fatores de risco cardiovascular, incluindo diabetes, dislipidemias, hipertensão arterial e marcadores inflamatórios.33 Hu FB, Leitzmann MF, Stampfer MJ, Graham AC, Willett WC, Rimm EB. Physical activity and television watching in relation to risk for type 2 diabetes mellitus in men. Arch Intern Med 2001;161(12):1542-8. PMID: 11427103.

4 Ellison RC, Zhang Y, Qureshi MM, Knox S, Arnett DK, Province MA; Investigators of the NHLBI Family Heart Study. Lifestyle determinants of high-density lipoprotein cholesterol: the National Heart, Lung, and Blood Institute Family Heart Study. Am Heart J. 2004;147(3):529-35. doi: 10.1016/j.ahj.2003.10.033.
https://doi.org/10.1016/j.ahj.2003.10.03...

5 Kohl HM 3rd. Physical activity and cardiovascular disease: evidence for a dose response. Med Sci Sports Exerc. 2001;33(6 Suppl):S472-83. PMID: 11427773.

6 Pitanga FJ, Lessa I. Association between leisure-time physical activity and c-reactive protein levels in adults, in the city of Salvador, Brazil. Arq Bras Cardiol 2009;92(4):302-6. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0066-782X2009000400009.
http://dx.doi.org/10.1590/S0066-782X2009...
-77 Pitanga FJ, Lessa I. [Relationship between leisure-time physical activity and blood pressure in adults]. Arq Bras Cardiol. 2010;95(4):480-4. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0066-782X20100005000124.
http://dx.doi.org/10.1590/S0066-782X2010...

Os escores de risco cardiovascular são algoritmos propostos com o objetivo de estratificar o risco coronariano e/ou cardiovascular para estimar a probabilidade do desenvolvimento desses agravos no período de 10 anos após o cálculo em determinado grupo populacional. O primeiro a ser desenvolvido, com foco no risco de doença arterial coronariana, foi apresentado por Wilson et al.,88 Wilson PW, D'Agostino RB, Levy D, Belanger AM, Silbershatz H, Kannel WB. Prediction of coronary heart disease using risk factor categories. Circulation. 1998;97(18):1837-47. PMID: 9603539. tendo como base a coorte de Framingham. Posteriormente, D’Agostino et al.,99 D'Agostino RB Sr, Vasan RS, Pencina MJ, Wolf PA, Cobain M, Massaro JM, et al. General cardiovascular risk profile for use in primary care: the Framingham Heart Study. Circulation. 2008;117(6):743-53. doi:10.1161/CIRCULATIONAHA.107.699579
https://doi.org/10.1161/CIRCULATIONAHA.1...
desenvolveram ferramenta de avaliação que permitiria identificar candidatos de alto risco para todos e quaisquer eventos ateroscleróticos iniciais dentro de 10 anos subsequentes à aplicação do teste (doença arterial coronariana, doenças cerebrovasculares, doença vascular periférica e insuficiência cardíaca) usando medidas prontamente disponíveis na prática clínica. Mais recentemente, o American College of Cardiology (ACC) e a American Heart Association (AHA)1010 Goff DC Jr, Lloyd-Jones DM, Bennett G, Coady S, D'Agostino RB Sr, Gibbons R, et al; American College of Cardiology/American Heart Association Task Force on Practice Guidelines. 2013. ACC/AHA guideline on the assessment of cardiovascular risk: a report of the American College of Cardiology/American Heart Association Task Force on Practice Guidelines. J Am Coll Cardiol. 2014;63(25 Pt B):2935-59. doi:10.1016/j.jacc.2013.11.005. Erratum in: J Am Coll Cardiol. 2014;63(25 Pt B):3026.
https://doi.org/10.1016/j.jacc.2013.11.0...
sugeriram novas equações agrupadas para estimativa de risco para doenças cardiovasculares ateroscleróticas (em 10 anos), definidas como a primeira ocorrência de infarto do miocárdio não fatal, morte por doença arterial coronariana e acidente vascular cerebral fatal e não fatal.

Apesar dos relatos na literatura de que tanto a atividade física no tempo livre (AFTL)1111 Pitanga FJ, Lessa I, Barbosa PJ, Barbosa SJ, Costa MC, Lopes Ada S. Physical activity in the prevention of diabetes in black ethnicity: how much is required? Rev Assoc Med Bras (1992). 2010;56(6):697-704. PMID: 21271139.,1212 Pitanga FJ, Beck CC, De Almeida LA, Freitas MM, Pitanga CP. Physical activity as discriminator of the absence of hypertension in adult men. Rev Bras Med Esporte. 2014;20(6):456-60. doi: http://dx.doi.org/10.1590/1517-86922014200601636.
http://dx.doi.org/10.1590/1517-869220142...
quanto a atividade física no deslocamento (AFDESL)1313 Bueno HM, Sartori M, Macedo HR, Moraes-Silva IC, Aletti F, Irigoyen MC, et al. Bicycling for transportation improves heart rate variability in young adults. J Sports Med Phys Fitness. 2017;57(3):299-304. doi: 10.23736/S0022-4707.16.06037-0.
https://doi.org/10.23736/S0022-4707.16.0...
podem promover benefícios à saúde, estudos que analisam e comparam a associação desses domínios da AF com os escores de risco cardiovascular são escassos.1414 Hu G, Tuomilehto J, Borodulin K, Jousilahti P. The joint associations of occupational, commuting, and leisure-time physical activity, and the Framingham risk score on the 10-year risk of coronary heart disease. Eur Heart J. 2007;28(4):492-8. doi: 10.1093/eurheartj/ehl475.
https://doi.org/10.1093/eurheartj/ehl475...
Os principais mecanismos que podem explicar as associações encontradas entre AF e os escores de risco cardiovascular podem ser atribuídos às alterações favoráveis provocadas pela AF nos níveis pressóricos, perfil lipídico e níveis glicêmicos.1515 American College of Sports Medicine. Physical activity, physical fitness, and hypertension. Med Sci Sports Exerc. 1993;25(10):i-x. PMID: 8231750.

16 Gordon PM, Goss FL, Visich PS, Warty V, Denys BJ, Metz KF, et al. The acute effects of exercise intensity on HDL-C metabolism. Med Sci Sports Exerc. 1994;26(6):671-7. PMID: 8052105.
-1717 Wallberg-Henriksson H. Interaction of exercise and insulin in type II diabetes mellitus. Diabetes Care. 1992;15(11):1777-82. PMID: 1468314.

O estabelecimento de relação quantitativa entre AFTL e/ou AFDESL com os escores de risco cardiovascular pode ajudar os gestores em saúde pública no sentido de que as mensagens de incentivo à prática de AF possam ser mais bem divulgadas na sociedade.

O objetivo do estudo foi verificar a associação entre AFTL e/ou AFDESL com diferentes escores de risco cardiovascular na coorte Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (ELSA-Brasil).

Métodos

População e amostra

O ELSA-Brasil é um estudo de coorte de 15.105 servidores públicos ativos ou aposentados de ambos os sexos, com idades entre 35 e 74 anos, de seis instituições de ensino e pesquisa, localizadas nas cidades de Salvador, Vitória, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre, cujos detalhes metodológicos foram descritos previamente.1818 Aquino EM, Barreto SM, Bensenor IM, Carvalho MS, Chor D, Duncan BB, et al. Brazilian Longitudinal StudyofAdult Health (ELSA-Brasil): objectives and design. Am J Epidemiol. 2012; 175(4):315-24. doi: 10.1093/aje/kwr294.
https://doi.org/10.1093/aje/kwr294...
,1919 Schmidt MI, Griep RH, Passos VM, Luft VC, Goulart AC, Menezes GM, et al. Strategies and development of quality assurance and control in the ELSA-Brasil. Rev Saude Publica. 2013; 47Suppl 2:105-12. PMID: 24346727. Para o presente estudo, foram selecionados todos os participantes da linha de base (2008-2010) que responderam aos questionários sobre AF e com as informações necessárias para os cálculos dos escores de risco cardiovascular. Após a exclusão dos participantes que reportaram infarto do miocárdio, acidente vascular cerebral, doença vascular periférica e insuficiência cardíaca, a amostra ficou constituída de 13.721 participantes (45,3% homens e 54,7% mulheres).

O ELSA-Brasil foi aprovado pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP) e também em todos os Comitês de Ética em Pesquisa dos seis centros de investigação envolvidos. Todos os participantes assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE), sendo garantidos o sigilo e a confidencialidade dos dados.

Produção de dados

Os dados foram coletados por uma equipe de entrevistadores e aferidores treinados e certificados por um comitê de controle de qualidade,1919 Schmidt MI, Griep RH, Passos VM, Luft VC, Goulart AC, Menezes GM, et al. Strategies and development of quality assurance and control in the ELSA-Brasil. Rev Saude Publica. 2013; 47Suppl 2:105-12. PMID: 24346727. capacitados a executar o protocolo do estudo em qualquer Centro de Investigação ELSA-Brasil. Realizaram-se entrevistas face a face com questionários padronizados e validados.

Avaliação da atividade física

Para identificação e quantificação da AF, foi utilizado o International Physical Activity Questionnary (IPAQ), que é constituído de questões relativas à frequência e à duração de atividades físicas (caminhada moderada e vigorosa) desenvolvidas no trabalho, no deslocamento, nas atividades domésticas e no tempo livre.2020 Matsudo S, Araújo T, Matsudo V, Andrade D, Andrade E, Oliveira LC et al. Questionário internacional de atividade física (IPAQ): Estudo de validade e reprodutibilidade no Brasil. Rev bras ativ fís saúde. 2001;6(2):5-18. doi: hppt://dx.doi.org/10.12820/RBAFS.V.6N2P5-18.
hppt://dx.doi.org/10.12820/RBAFS.V.6N2P5...
No ELSA-Brasil apenas os domínios do tempo livre e do deslocamento foram avaliados. A AF foi mensurada em minutos/semana por meio da multiplicação da frequência semanal pela duração de cada uma das atividades realizadas.

Para efeito deste estudo, os participantes foram classificados quanto à prática da AF no tempo livre como:

  • sedentário/a (< 10 min/semana de qualquer AF);

  • pouco ativo/a (≥ 10 min a < 150 min/semana de caminhada/AF moderada e/ou de 10 min a < 60 min/semana de AF vigorosa e/ou de 10 min a < 150 min/semana de qualquer combinação de caminhada, AF moderada e vigorosa);

  • fisicamente ativo/a (≥ 150 min/semana de caminhada/AF moderada e/ou ≥ 60 min/semana de AF vigorosa e/ou ≥ 150 min/semana de qualquer combinação de caminhada, AF moderada e vigorosa);

  • muito ativo/a (≥ 150 min/semana de AF vigorosa, ou ≥ 60 min/semana de AF vigorosa mais 150 min/semana de qualquer combinação entre caminhada e AF moderada).

Para as análises dicotomizadas, foram considerados como insuficientemente ativos aqueles classificados como sedentários e pouco ativos, e como ativos aqueles classificados como fisicamente ativos e muito ativos.

A AF no deslocamento foi categorizada como: insuficientemente ativo (< 150 min/semana em AF de caminhada e/ou bicicleta); e fisicamente ativo (≥ 150 min/semana em AF de caminhada e/ou bicicleta).

Avaliação do risco cardiovascular

Utilizaram-se cinco escores de risco cardiovascular. Os dois primeiros foram propostos por Wilson et al.,88 Wilson PW, D'Agostino RB, Levy D, Belanger AM, Silbershatz H, Kannel WB. Prediction of coronary heart disease using risk factor categories. Circulation. 1998;97(18):1837-47. PMID: 9603539. e tiveram como objetivo estimar o risco de doença arterial coronariana. As variáveis usadas foram: idade, pressão arterial (PA) sistólica e diastólica, lipoproteína de alta densidade (HDL-C), diabetes, tabagismo e colesterol total no primeiro; e idade, PA sistólica e diastólica, HDL-C, diabetes, tabagismo e lipoproteína de baixa densidade (LDL-C) no segundo. O terceiro e quarto escores, propostos por D’Agostino et al.,99 D'Agostino RB Sr, Vasan RS, Pencina MJ, Wolf PA, Cobain M, Massaro JM, et al. General cardiovascular risk profile for use in primary care: the Framingham Heart Study. Circulation. 2008;117(6):743-53. doi:10.1161/CIRCULATIONAHA.107.699579
https://doi.org/10.1161/CIRCULATIONAHA.1...
tiveram como objetivo identificar candidatos de alto risco para todos e quaisquer eventos ateroscleróticos iniciais (doença arterial coronariana, doenças cerebrovasculares, doença vascular periférica e insuficiência cardíaca). As variáveis usadas foram: idade, PA sistólica e diastólica tratada e não tratada, HDL-C, índice de massa corpórea (IMC), diabetes, tabagismo e colesterol total no terceiro; e idade, PA sistólica e diastólica tratada e não tratada, HDL-C, IMC, diabetes, tabagismo e IMC no quarto. O quinto escore, indicado pelo ACC e pela AHA,1010 Goff DC Jr, Lloyd-Jones DM, Bennett G, Coady S, D'Agostino RB Sr, Gibbons R, et al; American College of Cardiology/American Heart Association Task Force on Practice Guidelines. 2013. ACC/AHA guideline on the assessment of cardiovascular risk: a report of the American College of Cardiology/American Heart Association Task Force on Practice Guidelines. J Am Coll Cardiol. 2014;63(25 Pt B):2935-59. doi:10.1016/j.jacc.2013.11.005. Erratum in: J Am Coll Cardiol. 2014;63(25 Pt B):3026.
https://doi.org/10.1016/j.jacc.2013.11.0...
objetivou fazer a estimativa de risco para doenças cardiovasculares ateroscleróticas. As variáveis usadas foram: idade, PA sistólica com e sem tratamento, colesterol total, HDL-C, tabagismo e diabetes. Todos os escores de risco cardiovascular foram calculados para os participantes do ELSA-Brasil, e o esquema de pontuação detalhado foi previamente relatado.88 Wilson PW, D'Agostino RB, Levy D, Belanger AM, Silbershatz H, Kannel WB. Prediction of coronary heart disease using risk factor categories. Circulation. 1998;97(18):1837-47. PMID: 9603539.

9 D'Agostino RB Sr, Vasan RS, Pencina MJ, Wolf PA, Cobain M, Massaro JM, et al. General cardiovascular risk profile for use in primary care: the Framingham Heart Study. Circulation. 2008;117(6):743-53. doi:10.1161/CIRCULATIONAHA.107.699579
https://doi.org/10.1161/CIRCULATIONAHA.1...
-1010 Goff DC Jr, Lloyd-Jones DM, Bennett G, Coady S, D'Agostino RB Sr, Gibbons R, et al; American College of Cardiology/American Heart Association Task Force on Practice Guidelines. 2013. ACC/AHA guideline on the assessment of cardiovascular risk: a report of the American College of Cardiology/American Heart Association Task Force on Practice Guidelines. J Am Coll Cardiol. 2014;63(25 Pt B):2935-59. doi:10.1016/j.jacc.2013.11.005. Erratum in: J Am Coll Cardiol. 2014;63(25 Pt B):3026.
https://doi.org/10.1016/j.jacc.2013.11.0...
Os participantes com escores ≥ 20% foram considerados de alto risco para futuros eventos cardiovasculares.2121 Lloyd-Jones DM. Cardiovascular risk prediction: basic concepts, current status, and future directions. Circulation. 2010;21(15):1768-77. doi: 10.1161/CIRCULATIONAHA.109.849166.
https://doi.org/10.1161/CIRCULATIONAHA.1...

Avaliação das covariáveis

A PA foi obtida utilizando-se um dispositivo oscilométrico validado (Omron HEM-705CPINT) após 5 min de repouso com o sujeito em posição sentada numa sala silenciosa e com temperatura controlada (20-24°C). Foram feitas três medições a intervalos de 1 min entre cada uma delas. A média das duas últimas medidas de PA foi calculada e utilizada para nossas análises.

Diabetes foi definido com base em informações autorreferidas e medições laboratoriais. Considerou-se que o participante tinha diagnóstico prévio de diabetes se ele/ela tivesse sido previamente informado por um médico que tinha diabetes ou se tinha usado medicação para diabetes nas duas últimas semanas. Os participantes sem diabetes previamente diagnosticada foram classificados como tendo diabetes se o nível de glicose plasmática em jejum foi ≥ 7,0 mmol/L, glicemia pós-carga de 2 h foi ≥ 11,1 mmol/L, ou hemoglobina glicada (HbA1c) foi ≥ 6,5%.2222 World Health Organization. (WHO). Definition and diagnosis of diabetes mellitus and intermediate hyperglycaemia: report of WHO Consultation. Geneva; 2006.,2323 Schmidt MI, Hoffmann JF, de Fátima Sander Diniz M, Lotufo PA, Griep RH, Bensenor IM, et al. High prevalence of diabetes and intermediate hyperglycemia - The Brazilian Longitudinal Study of Adult Health (ELSA-Brasil). Diabetol Metab Syndr. 2014;6:123. doi: 10.1186/1758-5996-6-123.
https://doi.org/10.1186/1758-5996-6-123...
O participante foi classificado como hipertenso se a pressão arterial sistólica (PAS) fosse ≥ 140 mmHg, a pressão arterial diastólica (PAD) fosse ≥ 90 mmHg ou tivesse tomado algum medicamento para tratar a hipertensão nas duas últimas semanas.

O colesterol total e o HDL-C foram determinados pelo método colorimétrico enzimático. O LDL-C foi calculado pela equação de Friedewald.

A obesidade foi identificada por meio do IMC aplicando-se a equação IMC = peso (kg)/altura(m)22 Shortreed SM, Peeters A, Forbes AB. Estimating the effect of long-term physical activity on cardiovascular disease and mortality: evidence from the Framingham Heart Study. Heart. 2013;99(9):649-54. doi: 10.1136/heartjnl-2012-303461.
https://doi.org/10.1136/heartjnl-2012-30...
e adotando-se o seguinte ponto de corte: obesidade = 0 se IMC < 30,0 e obesidade = 1 se IMC ≥ 30,0.

Procedimentos de análise dos dados

As medidas descritivas (proporções) foram calculadas para todas as variáveis categorizadas. Todas as análises foram estratificadas por sexo a priori. As diferenças entre homens e mulheres quanto às variáveis analisadas no estudo foram identificadas por meio do teste de qui-quadrado. As associações entre as variáveis dependentes (diferentes escores de risco cardiovascular) e as variáveis independentes (AFTL e AFDESL) foram analisadas por meio de regressão logística. Consideraram-se como potenciais confundidoras as seguintes variáveis: idade, obesidade, renda familiar, escolaridade e situação funcional. Foram selecionadas para modelagem as variáveis que na etapa bivariada apresentaram na avaliação simultânea (matriz tetracórica) coeficiente de correlação rho < 0,60 e p ≤ 0,05.

A análise para confundimento foi feita comparando a odds ratio (OR) da associação bruta com aquela da associação ajustada para os possíveis confundidores. O parâmetro usado para identificar a diferença entra as associações foi de 10%. Então a análise de regressão logística foi realizada, iniciando-se pelo modelo completo e retirando-se cada uma das variáveis possíveis confundidoras que causaram alteração igual ou superior a 10% na associação entre AFTL e AFDESL e os diferentes escores de risco cardiovascular.2424 Hosmer JR, Lemeshow S. Appled logistic regression. New York: John Wiley & Sons; 1989. No processo de modelagem não foram identificadas variáveis modificadoras de efeito, e as variáveis idade, obesidade e escolaridade foram identificadas como confundidoras em homens, enquanto entre as mulheres apenas idade e escolaridade foram identificadas com confundidoras. Portanto, o melhor modelo para analisar a associação entre AFTL e AFDESL com os diferentes escores de risco cardiovascular foi o ajustado por idade, obesidade e escolaridade em homens e o modelo ajustado por idade e escolaridade em mulheres.

Foi também analisado o efeito dose-resposta na associação entre AFTL e escores de risco cardiovascular. Para essa análise, criaram-se variáveis dummies para comparação entre o grupo de referência (sedentários) e cada um dos outros estratos da variável AF (pouco ativos, ativos, muito ativos). Foi utilizado o teste de Mantel Haenszel para avaliar a homogeneidade dos valores do OR entre os estratos de cada variável com nível de significância de 0,05. O intervalo de confiança foi estabelecido em 95% (IC95%). Empregou-se o programa estatístico Stata versão 12.0.

Resultados

Foram incluídos na análise 6.222 homens (45,3%) e 7.499 mulheres (54,7%). As características da amostra estão apresentadas na Tabela 1. Os primeiros têm maior renda familiar, são mais ativos no tempo livre e no deslocamento e apresentam maiores valores nos escores de risco cardiovascular analisados, enquanto elas são mais escolarizadas e mais obesas. Constata-se ainda maior percentual de mulheres aposentadas, além de não existirem diferenças estatisticamente significativas entre homens e mulheres com relação a idade.

Tabela 1
Características da amostra na linha de base. The Longitudinal Study of Adult Health (ELSA-Brasil), 2008-2010

A associação entre AFTL e AFDESL e os diferentes escores de risco cardiovascular em indivíduos dos sexos masculino e feminino é apresentada nas Tabelas 2 e 3 Com quase todos os escores de risco cardiovascular analisados, a AFTL apresenta-se inversamente associada, enquanto a AFDESL não se associa de modo estatisticamente significante com nenhum deles. Nas Tabelas 4 e 5 podemos observar a existência de efeito dose-resposta na associação entre AFTL e escores de risco cardiovascular principalmente em homens.

Tabela 2
Associação entre atividade física no tempo livre e no deslocamento e escores de risco cardiovascular em homens: Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (ELSA-Brasil), 2008-2010
Tabela 3
Associação entre atividade física no tempo livre e no deslocamento e escores de risco cardiovascular em mulheres: Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (ELSA-Brasil), 2008-2010
Tabela 4
Efeito dose-resposta na associação entre atividade física no tempo livre e escores de risco cardiovascular em homens: Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (ELSA-Brasil), 2008-2010
Tabela 5
Efeito dose-resposta na associação entre atividade física no tempo livre e escores de risco cardiovascular em mulheres: Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (ELSA Brasil), 2008-2010

Discussão

O estudo analisou a associação entre AFTL e AFDESL com os diferentes escores de risco cardiovascular. A AFTL, porém não a AFDESL, apresentou associação inversa com os escores de risco analisados. Esses resultados, principalmente com relação à AFTL, foram similares àqueles encontrados em 41.053 finlandeses quando foi observado que níveis moderados ou altos de atividade física no tempo livre entre homens e mulheres, e, caminhadas diárias ou de bicicleta para o trabalho apenas entre as mulheres estavam associadas a risco reduzido para eventos coronarianos.1414 Hu G, Tuomilehto J, Borodulin K, Jousilahti P. The joint associations of occupational, commuting, and leisure-time physical activity, and the Framingham risk score on the 10-year risk of coronary heart disease. Eur Heart J. 2007;28(4):492-8. doi: 10.1093/eurheartj/ehl475.
https://doi.org/10.1093/eurheartj/ehl475...

Em outro estudo, quando foram analisados comportamentos saudáveis, entre eles a AF mensurada por acelerometria, observou-se associação inversa com efeito dose-resposta entre os comportamentos saudáveis positivos e o risco para doenças cardiovasculares ateroscleróticas.2525 Loprinzi PD, Nooe A. Health characteristics and predicted 10-year risk for afirst atherosclerotic cardiovascular disease (ASCVD) event using the Pooled Cohort Risk Equations among US adults who are free of cardiovascular disease. Physiol Behav. 2015;151:591-5. doi: 10.1016/j.physbeh.2015.08.031.
https://doi.org/10.1016/j.physbeh.2015.0...
No nosso trabalho, também constatamos a existência de efeito dose-resposta na associação entre AFTL e escores de risco cardiovascular principalmente em indivíduos do sexo masculino. Ou seja, quanto mais AF, menor o risco de eventos cardiovasculares.

O efeito dose-resposta verificado no presente estudo vem sendo reportado já há bastante tempo. Kohl,55 Kohl HM 3rd. Physical activity and cardiovascular disease: evidence for a dose response. Med Sci Sports Exerc. 2001;33(6 Suppl):S472-83. PMID: 11427773. evidenciou, por meio de vasta revisão de literatura, em diferentes estudos longitudinais, a existência de associação inversa na forma dose-resposta entre AF e doenças cardiovasculares, sobretudo doença arterial coronariana. É importante ressaltar que, na classificação adotada neste trabalho, a quantidade de AFTL foi calculada com base tanto na duração quanto na intensidade da AF. Em outros estudos do nosso grupo de pesquisa,1111 Pitanga FJ, Lessa I, Barbosa PJ, Barbosa SJ, Costa MC, Lopes Ada S. Physical activity in the prevention of diabetes in black ethnicity: how much is required? Rev Assoc Med Bras (1992). 2010;56(6):697-704. PMID: 21271139.,1212 Pitanga FJ, Beck CC, De Almeida LA, Freitas MM, Pitanga CP. Physical activity as discriminator of the absence of hypertension in adult men. Rev Bras Med Esporte. 2014;20(6):456-60. doi: http://dx.doi.org/10.1590/1517-86922014200601636.
http://dx.doi.org/10.1590/1517-869220142...
nos quais a AF foi classificada considerando-se apenas a intensidade, foi possível averiguar que somente a AF moderada se apresentou como discriminadora da ausência de hipertensão e diabetes. Assim, pode-se supor que o aumento da quantidade de atividade física para proporcionar maiores benefícios à saúde deve ser sugerido, levando-se em conta tanto a sua intensidade quanto a sua duração.

Os resultados encontrados na associação entre AFTL e os escores de risco cardiovascular são esperados considerando-se que as principais variáveis que compõem esses escores apresentam isoladamente associação com AFTL. Vários estudos salientam que a AFTL está inversamente associada com níveis elevados de PA,77 Pitanga FJ, Lessa I. [Relationship between leisure-time physical activity and blood pressure in adults]. Arq Bras Cardiol. 2010;95(4):480-4. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0066-782X20100005000124.
http://dx.doi.org/10.1590/S0066-782X2010...
,1212 Pitanga FJ, Beck CC, De Almeida LA, Freitas MM, Pitanga CP. Physical activity as discriminator of the absence of hypertension in adult men. Rev Bras Med Esporte. 2014;20(6):456-60. doi: http://dx.doi.org/10.1590/1517-86922014200601636.
http://dx.doi.org/10.1590/1517-869220142...
diabetes,1111 Pitanga FJ, Lessa I, Barbosa PJ, Barbosa SJ, Costa MC, Lopes Ada S. Physical activity in the prevention of diabetes in black ethnicity: how much is required? Rev Assoc Med Bras (1992). 2010;56(6):697-704. PMID: 21271139.,2626 Pitanga FJ, Almeida LA, Freitas MM, Pitanga CP, Beck CC. Padrões de atividade fisica em diferentes domínios e ausência de diabetes em adultos. Motricidade. 2010;6(1):5-17. ISSN-1646-107X. alterações lipídicas2727 Pitanga FJ. Atividade fisica e lipoproteinas plasmáticas em adultos de ambos os sexos. Rev Bras Cie Mov. 2001;9(4):25-31. e risco de doença arterial coronariana.2828 Haapanen N, Miilunpalo S, Vuori I, Oja P, Pasanen M. Association of leisure time physical activity with the risk of coronary heart disease, hypertension and diabetes in middle-aged men and women. Int J Epidemiol. 1997;26(4):739-47. PMID: 9279605. Ainda de acordo com nossos resultados, as associações demonstradas em estudos prévios mostram-se de forma mais consistente em homens do que em mulheres.2828 Haapanen N, Miilunpalo S, Vuori I, Oja P, Pasanen M. Association of leisure time physical activity with the risk of coronary heart disease, hypertension and diabetes in middle-aged men and women. Int J Epidemiol. 1997;26(4):739-47. PMID: 9279605.,2929 Folsom AR, Arnett DK, Hutchinson RG, Liao F, Clegg LX, Cooper LS. Physical activity and incidence of coronary heart disease in middle-aged women and men. Med Sci Sports Exerc. 1997;29(7):901-9. PMID: 9243489.

Com relação à AFDESL, não foi possível demonstrar associações com os escores de risco cardiovascular, embora estudos prévios tenham encontrado relação entre AFDESL e diabetes, bem como com mortalidade cardiovascular em indivíduos com diabetes tipo 2. Importante ressaltar que essas associações, no caso da mortalidade cardiovascular, perderam a significância após ajustes adicionais para AFTL e AF ocupacional.3030 Hu G, Qiao Q, Silventoinen K, Eriksson JG, Jousilahti P, Lindstrom J, et al. Occupational, commuting, and leisure-time physical activity in relation to risk for type 2 diabetes in middle-aged Finnish men and women. Diabetologia. 2003;46(3):322-9. doi: 10.1007/s00125-003-1031-x.
https://doi.org/10.1007/s00125-003-1031-...
,3131 Hu G, Eriksson J, Barengo NC, Lakka TA, Valle TT, Nissinen A, et al. Occupational, commuting, and leisure-time physical activity in relation to total and cardiovascular mortality among Finnish subjects with type 2 diabetes. Circulation. 2004;110(6):666-73. doi: 10.1161/01.CIR.0000138102.23783.94.
https://doi.org/10.1161/01.CIR.000013810...
Esses achados, provavelmente, refletem o fato de que o instrumento utilizado no nosso estudo para avaliar AF, o IPAQ, não distingue a intensidade do deslocamento, quer seja a pé, quer seja de bicicleta. Assim, se o deslocamento for feito de forma lenta, talvez os benefícios para a saúde não ocorram de modo significativo.

Nesse sentido, em recente publicação com dados do ELSA-Brasil foi observado que a associação entre AFDESL e hipertensão arterial foi positiva em mulheres e sem significância estatística entre homens, enquanto a associação entre AFTL e hipertensão arterial foi inversa em ambos os sexos.3232 Treff C, Benseñor IM, Lotufo PA. Leisure-time and commuting physical activity and high blood pressure: the Brazilian Longitudinal Study of Adult Health (ELSA-Brasil). J Hum Hypertens. 2017;31(4):278-83. doi: 10.1038/jhh.2016.75.
https://doi.org/10.1038/jhh.2016.75...
Resultados de dados também do ELSA-Brasil e ainda não publicados sugerem que o deslocamento ativo, mais frequente nos estratos sociais menos privilegiados, em vez de refletir a adoção de um hábito saudável, provavelmente decorre de desigualdades na mobilidade urbana em cidades brasileiras.

Os mecanismos pelos quais a AF reduz os níveis de PA, glicemia e perfil lipídico permanecem especulativos. Recente publicação enfatizou a necessidade de novos estudos para melhor compreensão dos aspectos celulares e moleculares envolvidos nos principais benefícios para a saúde induzidos pela AF.3333 Neufer PD, Bamman MM, Muoio DM, Bouchard C, Cooper DM, Goodpaster BH, et al. Understanding the cellular and molecular mechanisms of physical activity-induced health benefits. Cell Metab. 2015;22(1):4-11. doi: 10.1016/j.cmet.2015.05.011.
https://doi.org/10.1016/j.cmet.2015.05.0...
Quanto à PA, conforme o American College of Sports Medicine (ACSM),1515 American College of Sports Medicine. Physical activity, physical fitness, and hypertension. Med Sci Sports Exerc. 1993;25(10):i-x. PMID: 8231750. as principais evidências apontam: a) diminuição dos níveis de insulina, com consequente redução da retenção do sódio renal e tônus simpático basal; b) redução dos níveis das catecolaminas; c) liberação, pela musculatura esquelética, de substâncias vasodilatadoras na circulação.

Com relação ao perfil lipídico, existem poucas informações a respeito dos mecanismos responsáveis pela redução nos níveis de LDL-C e de dosagem da lipoproteína de muito baixa densidade (VLDL-C). Entretanto, a principal razão para a elevação do HDL-C é a maior ação da lipoproteína lipase (LPL) em resposta ao exercício físico: a LPL acelera a decomposição do VLDL-C, removendo os triglicerídeos da corrente sanguínea para os músculos; isso resulta numa transferência de colesterol e outras substâncias para o HDL-C aumentando, consequentemente, a concentração deste.1616 Gordon PM, Goss FL, Visich PS, Warty V, Denys BJ, Metz KF, et al. The acute effects of exercise intensity on HDL-C metabolism. Med Sci Sports Exerc. 1994;26(6):671-7. PMID: 8052105. No que diz respeito aos níveis glicêmicos, a AF parece desempenhar importante papel na redução dos níveis de glicose sanguínea, porque promove proliferação de capilares, aumentando a atividade da LPL no músculo - o que, por sua vez aumenta a sensibilidade à insulina. Além disso, maiores níveis de prática de AF podem aumentar o número de fibras musculares oxidativas, mais sensíveis à insulina, promovendo assim redução na glicemia.1717 Wallberg-Henriksson H. Interaction of exercise and insulin in type II diabetes mellitus. Diabetes Care. 1992;15(11):1777-82. PMID: 1468314.

Como ponto forte do estudo, ressalta-se que a amostra se constitui de uma coorte de voluntários de servidores públicos que, apesar de não ser representativa da população de modo geral, apresenta um número expressivo de participantes de seis capitais brasileiras. Outro ponto forte refere-se ao fato de terem sido calculados os valores de diferentes escores de risco cardiovascular, o que permitiu a análise da associação destes tanto com a AFTL quanto com a AFDESL.

Uma possível limitação do estudo (viés de memória) pode ser atribuída à informação sobre AF que foi obtida por meio de questionários, o qual no entanto é um instrumento largamente utilizado em estudos nacionais e internacionais. É importante dizer que o ELSA-Brasil é um estudo longitudinal e está prevista a incorporação de medida mais objetiva, a acelerometria, o que poderá aumentar a validade das informações sobre AF.

Conclusões

A AFTL, porém não a AFDESL, apresenta associação com os escores de risco cardiovascular analisados. A maior quantidade de AFTL (duração e intensidade) está associada de forma mais significativa aos escores de risco cardiovascular em participantes da coorte (ELSA-Brasil).

Os resultados do estudo podem trazer importantes contribuições para a saúde pública, na medida em que o gerenciamento das políticas públicas de promoção da AF pode ser balizado pelo conhecimento do tipo de AF que mais benefícios à saúde pode provocar. A informação de que a AFTL, porém não a AFDESL, aponta associação com o risco cardiovascular deve ser levada aos gestores de saúde pública para que ações de incentivo à prática de AF, principalmente nos momentos de lazer e no tempo livre, possam ser implementadas.

Importante salientar que, apesar de não se ter sido encontrada associação entre AFDESL e risco cardiovascular, as atividades de deslocamento ativo, tanto a pé quanto de bicicleta, devem ser incentivadas em grupos populacionais, sobretudo quando esse deslocamento é realizado em intensidades moderadas. Além disso, considerando o efeito dose-resposta encontrado, principalmente em homens, sugere-se que a população seja incentivada para a prática de maior quantidade de AF para que os benefícios à saúde sejam maximizados.

  • Fontes de financiamento
    O presente estudo foi financiado pelo Ministério da Saúde do Brasil, Ministério de Ciência e Tecnologia do Brasil e CNPq (Conselho Nacional de Pesquisa), processos nº 01 06 0010.00RS, 01 06 0212.00BA, 01 06 0300.00ES, 01 06 0278.00MG, 01 06 0115.00SP, 01 06 0071.00RJ.
  • Vinculação acadêmica
    Não há vinculação deste estudo a programas de pós-graduação.
  • Aprovação Ética e consentimento informado
    Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética do Instituto de Saúde Coletiva da UFBA sob o número de protocolo 027.06/CEP-ISC. Todos os procedimentos envolvidos nesse estudo estão de acordo com a Declaração de Helsinki de 1975, atualizada em 2013. O consentimento informado foi obtido de todos os participantes incluídos no estudo.

References

  • 1
    Nocon M, Hiemann T, Müller-Riemenschneider F, Thalau F, Roll S, Willich SN. Association of physical activity with all-cause and cardiovascular mortality: a systematic review and meta-analysis. Eur J Cardiovasc Prev Rehabil. 2008;15(3):239-46. doi: 10.1097/HJR.0b013e3282f55e09
    » https://doi.org/10.1097/HJR.0b013e3282f55e09
  • 2
    Shortreed SM, Peeters A, Forbes AB. Estimating the effect of long-term physical activity on cardiovascular disease and mortality: evidence from the Framingham Heart Study. Heart. 2013;99(9):649-54. doi: 10.1136/heartjnl-2012-303461.
    » https://doi.org/10.1136/heartjnl-2012-303461
  • 3
    Hu FB, Leitzmann MF, Stampfer MJ, Graham AC, Willett WC, Rimm EB. Physical activity and television watching in relation to risk for type 2 diabetes mellitus in men. Arch Intern Med 2001;161(12):1542-8. PMID: 11427103.
  • 4
    Ellison RC, Zhang Y, Qureshi MM, Knox S, Arnett DK, Province MA; Investigators of the NHLBI Family Heart Study. Lifestyle determinants of high-density lipoprotein cholesterol: the National Heart, Lung, and Blood Institute Family Heart Study. Am Heart J. 2004;147(3):529-35. doi: 10.1016/j.ahj.2003.10.033.
    » https://doi.org/10.1016/j.ahj.2003.10.033
  • 5
    Kohl HM 3rd. Physical activity and cardiovascular disease: evidence for a dose response. Med Sci Sports Exerc. 2001;33(6 Suppl):S472-83. PMID: 11427773.
  • 6
    Pitanga FJ, Lessa I. Association between leisure-time physical activity and c-reactive protein levels in adults, in the city of Salvador, Brazil. Arq Bras Cardiol 2009;92(4):302-6. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0066-782X2009000400009
    » http://dx.doi.org/10.1590/S0066-782X2009000400009
  • 7
    Pitanga FJ, Lessa I. [Relationship between leisure-time physical activity and blood pressure in adults]. Arq Bras Cardiol. 2010;95(4):480-4. doi: http://dx.doi.org/10.1590/S0066-782X20100005000124
    » http://dx.doi.org/10.1590/S0066-782X20100005000124
  • 8
    Wilson PW, D'Agostino RB, Levy D, Belanger AM, Silbershatz H, Kannel WB. Prediction of coronary heart disease using risk factor categories. Circulation. 1998;97(18):1837-47. PMID: 9603539.
  • 9
    D'Agostino RB Sr, Vasan RS, Pencina MJ, Wolf PA, Cobain M, Massaro JM, et al. General cardiovascular risk profile for use in primary care: the Framingham Heart Study. Circulation. 2008;117(6):743-53. doi:10.1161/CIRCULATIONAHA.107.699579
    » https://doi.org/10.1161/CIRCULATIONAHA.107.699579
  • 10
    Goff DC Jr, Lloyd-Jones DM, Bennett G, Coady S, D'Agostino RB Sr, Gibbons R, et al; American College of Cardiology/American Heart Association Task Force on Practice Guidelines. 2013. ACC/AHA guideline on the assessment of cardiovascular risk: a report of the American College of Cardiology/American Heart Association Task Force on Practice Guidelines. J Am Coll Cardiol. 2014;63(25 Pt B):2935-59. doi:10.1016/j.jacc.2013.11.005. Erratum in: J Am Coll Cardiol. 2014;63(25 Pt B):3026.
    » https://doi.org/10.1016/j.jacc.2013.11.005
  • 11
    Pitanga FJ, Lessa I, Barbosa PJ, Barbosa SJ, Costa MC, Lopes Ada S. Physical activity in the prevention of diabetes in black ethnicity: how much is required? Rev Assoc Med Bras (1992). 2010;56(6):697-704. PMID: 21271139.
  • 12
    Pitanga FJ, Beck CC, De Almeida LA, Freitas MM, Pitanga CP. Physical activity as discriminator of the absence of hypertension in adult men. Rev Bras Med Esporte. 2014;20(6):456-60. doi: http://dx.doi.org/10.1590/1517-86922014200601636
    » http://dx.doi.org/10.1590/1517-86922014200601636
  • 13
    Bueno HM, Sartori M, Macedo HR, Moraes-Silva IC, Aletti F, Irigoyen MC, et al. Bicycling for transportation improves heart rate variability in young adults. J Sports Med Phys Fitness. 2017;57(3):299-304. doi: 10.23736/S0022-4707.16.06037-0.
    » https://doi.org/10.23736/S0022-4707.16.06037-0
  • 14
    Hu G, Tuomilehto J, Borodulin K, Jousilahti P. The joint associations of occupational, commuting, and leisure-time physical activity, and the Framingham risk score on the 10-year risk of coronary heart disease. Eur Heart J. 2007;28(4):492-8. doi: 10.1093/eurheartj/ehl475.
    » https://doi.org/10.1093/eurheartj/ehl475
  • 15
    American College of Sports Medicine. Physical activity, physical fitness, and hypertension. Med Sci Sports Exerc. 1993;25(10):i-x. PMID: 8231750.
  • 16
    Gordon PM, Goss FL, Visich PS, Warty V, Denys BJ, Metz KF, et al. The acute effects of exercise intensity on HDL-C metabolism. Med Sci Sports Exerc. 1994;26(6):671-7. PMID: 8052105.
  • 17
    Wallberg-Henriksson H. Interaction of exercise and insulin in type II diabetes mellitus. Diabetes Care. 1992;15(11):1777-82. PMID: 1468314.
  • 18
    Aquino EM, Barreto SM, Bensenor IM, Carvalho MS, Chor D, Duncan BB, et al. Brazilian Longitudinal StudyofAdult Health (ELSA-Brasil): objectives and design. Am J Epidemiol. 2012; 175(4):315-24. doi: 10.1093/aje/kwr294.
    » https://doi.org/10.1093/aje/kwr294
  • 19
    Schmidt MI, Griep RH, Passos VM, Luft VC, Goulart AC, Menezes GM, et al. Strategies and development of quality assurance and control in the ELSA-Brasil. Rev Saude Publica. 2013; 47Suppl 2:105-12. PMID: 24346727.
  • 20
    Matsudo S, Araújo T, Matsudo V, Andrade D, Andrade E, Oliveira LC et al. Questionário internacional de atividade física (IPAQ): Estudo de validade e reprodutibilidade no Brasil. Rev bras ativ fís saúde. 2001;6(2):5-18. doi: hppt://dx.doi.org/10.12820/RBAFS.V.6N2P5-18
    » hppt://dx.doi.org/10.12820/RBAFS.V.6N2P5-18
  • 21
    Lloyd-Jones DM. Cardiovascular risk prediction: basic concepts, current status, and future directions. Circulation. 2010;21(15):1768-77. doi: 10.1161/CIRCULATIONAHA.109.849166.
    » https://doi.org/10.1161/CIRCULATIONAHA.109.849166
  • 22
    World Health Organization. (WHO). Definition and diagnosis of diabetes mellitus and intermediate hyperglycaemia: report of WHO Consultation. Geneva; 2006.
  • 23
    Schmidt MI, Hoffmann JF, de Fátima Sander Diniz M, Lotufo PA, Griep RH, Bensenor IM, et al. High prevalence of diabetes and intermediate hyperglycemia - The Brazilian Longitudinal Study of Adult Health (ELSA-Brasil). Diabetol Metab Syndr. 2014;6:123. doi: 10.1186/1758-5996-6-123.
    » https://doi.org/10.1186/1758-5996-6-123
  • 24
    Hosmer JR, Lemeshow S. Appled logistic regression. New York: John Wiley & Sons; 1989.
  • 25
    Loprinzi PD, Nooe A. Health characteristics and predicted 10-year risk for afirst atherosclerotic cardiovascular disease (ASCVD) event using the Pooled Cohort Risk Equations among US adults who are free of cardiovascular disease. Physiol Behav. 2015;151:591-5. doi: 10.1016/j.physbeh.2015.08.031.
    » https://doi.org/10.1016/j.physbeh.2015.08.031
  • 26
    Pitanga FJ, Almeida LA, Freitas MM, Pitanga CP, Beck CC. Padrões de atividade fisica em diferentes domínios e ausência de diabetes em adultos. Motricidade. 2010;6(1):5-17. ISSN-1646-107X.
  • 27
    Pitanga FJ. Atividade fisica e lipoproteinas plasmáticas em adultos de ambos os sexos. Rev Bras Cie Mov. 2001;9(4):25-31.
  • 28
    Haapanen N, Miilunpalo S, Vuori I, Oja P, Pasanen M. Association of leisure time physical activity with the risk of coronary heart disease, hypertension and diabetes in middle-aged men and women. Int J Epidemiol. 1997;26(4):739-47. PMID: 9279605.
  • 29
    Folsom AR, Arnett DK, Hutchinson RG, Liao F, Clegg LX, Cooper LS. Physical activity and incidence of coronary heart disease in middle-aged women and men. Med Sci Sports Exerc. 1997;29(7):901-9. PMID: 9243489.
  • 30
    Hu G, Qiao Q, Silventoinen K, Eriksson JG, Jousilahti P, Lindstrom J, et al. Occupational, commuting, and leisure-time physical activity in relation to risk for type 2 diabetes in middle-aged Finnish men and women. Diabetologia. 2003;46(3):322-9. doi: 10.1007/s00125-003-1031-x.
    » https://doi.org/10.1007/s00125-003-1031-x
  • 31
    Hu G, Eriksson J, Barengo NC, Lakka TA, Valle TT, Nissinen A, et al. Occupational, commuting, and leisure-time physical activity in relation to total and cardiovascular mortality among Finnish subjects with type 2 diabetes. Circulation. 2004;110(6):666-73. doi: 10.1161/01.CIR.0000138102.23783.94.
    » https://doi.org/10.1161/01.CIR.0000138102.23783.94
  • 32
    Treff C, Benseñor IM, Lotufo PA. Leisure-time and commuting physical activity and high blood pressure: the Brazilian Longitudinal Study of Adult Health (ELSA-Brasil). J Hum Hypertens. 2017;31(4):278-83. doi: 10.1038/jhh.2016.75.
    » https://doi.org/10.1038/jhh.2016.75
  • 33
    Neufer PD, Bamman MM, Muoio DM, Bouchard C, Cooper DM, Goodpaster BH, et al. Understanding the cellular and molecular mechanisms of physical activity-induced health benefits. Cell Metab. 2015;22(1):4-11. doi: 10.1016/j.cmet.2015.05.011.
    » https://doi.org/10.1016/j.cmet.2015.05.011

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    01 Fev 2018
  • Data do Fascículo
    Jan 2018

Histórico

  • Recebido
    24 Nov 2016
  • Revisado
    01 Jun 2017
  • Aceito
    04 Jul 2017
Sociedade Brasileira de Cardiologia - SBC Avenida Marechal Câmara, 160, sala: 330, Centro, CEP: 20020-907, (21) 3478-2700 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil, Fax: +55 21 3478-2770 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revista@cardiol.br