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Síndrome metabólica e menopausa: estudo transversal em ambulatório de ginecologia

Resumos

FUNDAMENTO: No Brasil, são escassos os estudos sobre síndrome metabólica na população geral, mais raros são os que a correlacionam ao climatério. OBJETIVO: Determinar a prevalência da síndrome metabólica e seus componentes em mulheres climatéricas. MÉTODOS: Estudo transversal com 323 mulheres climatéricas, divididas em dois grupos: pré e pós-menopausadas. Foram avaliadas para presença de síndrome metabólica, segundo os critérios do National Cholesterol Education Program's (NCEP) e da International Diabetes Federation (IDF). Foi verificada a associação entre as variáveis estudadas e a síndrome metabólica por meio de análise uni e multivariada. Um p-valor < 0,05 foi considerado significante estatisticamente. RESULTADOS: A prevalência de síndrome metabólica no climatério foi de 34,7% (NCEP) e de 49,8% (IDF). Os componentes mais frequentes da síndrome metabólica foram o HDL-colesterol baixo, hipertensão arterial, obesidade abdominal, hipertrigliceridemia e diabete em ambos os critérios. A análise multivariada mostrou que a idade foi o fator de risco mais importante para o surgimento da síndrome metabólica (p < 0,001), que esteve presente em 44,4% (NCEP) e 61,5% (IDF) das mulheres menopausadas em comparação a 24% (NCEP) e 37% (IDF) daquelas na pré-menopausa. CONCLUSÃO: A prevalência de síndrome metabólica foi maior nas mulheres menopausadas que naquelas na pré-menopausa. O principal fator de risco para o aumento dessa prevalência foi a idade. A menopausa, quando analisada isoladamente, não se constituiu um fator de risco para a síndrome metabólica.

Síndrome metabólica; menopausa; prevalência; doenças cardiovasculares


FUNDAMENTO: En Brasil, son raros los estudios sobre síndrome metabólico en la población general, más raros son los que la correlacionan al climaterio. OBJETIVO: Determinar la prevalencia del síndrome metabólico y sus componentes en mujeres climatéricas. MÉTODOS: Estudio transversal con 323 mujeres climatéricas, divididas en dos grupos: pre y posmenopáusicas. Se evaluaron para presencia de síndrome metabólico, según los criterios del NCEP y de la IDF. Se verificó la asociación entre las variables estudiadas y el síndrome metabólico por medio de análisis uni e multivariado. Un p-valor < 0.05 fue considerado significante estadísticamente. RESULTADOS: La prevalencia de síndrome metabólico en el climaterio fue de un 34,7% (NCEP) y de un 49,8% (IDF). Los componentes más frecuentes del síndrome metabólico fueron el HDL-colesterol bajo, hipertensión arterial, obesidad abdominal, hipertrigliceridemia y diabetes en ambos criterios. El análisis multivariado evidenció que la edad fue el factor de riesgo más importante para el surgimiento del síndrome metabólico (p<0.001), que estuvo presente en un 44,4% (NCEP) y un 61,5% (IDF) de las mujeres menopáusicas en comparación a 24% (NCEP) y el 37% (IDF) de aquellas en la premenopausia. CONCLUSIÓN: La prevalencia de síndrome metabólico fue mayor en las mujeres menopáusicas que en aquellas en la premenopausia. El principal factor de riesgo para el aumento de esta prevalencia fue la edad. La menopausia, cuando analizada aisladamente, no se constituyó un factor de riesgo para el síndrome metabólico.

Síndrome metabólico; menopausia, prevalencia; enfermedades cardiovasculares


BACKGROUND: In Brazil, there are few studies of the metabolic syndrome in the general population, and even fewer studies that establish a correlation between metabolic syndrome and climacteric. OBJECTIVE: To determine the prevalence of metabolic syndrome and its components among climacteric women. METHODS: Cross-sectional study with 323 climacteric women, divided into two groups: pre and post-menopausal. They were examined for the presence of metabolic syndrome, according to the criteria of National Cholesterol Education Program's (NCEP) and International Diabetes Federation (IDF). It was possible to notice the association between the variables under study and the metabolic syndrome by conducting a univariate analysis and a multivariate analysis. A p-value < 0.05 was considered statistically significant. RESULTS: The prevalence of metabolic syndrome during the climacteric was 34.7% (NCEP) and 49.8% (IDF). The most frequent components of the metabolic syndrome were low HDL-cholesterol, hypertension, abdominal obesity, hypertriglyceridemia and diabetes in both criteria. The multivariate analysis showed that age was the most important risk factor for the development of metabolic syndrome (p < 0.001), which was present in 44.4% (NCEP) and 61.5% (IDF) of postmenopausal women compared to 24% (NCEP) and 37% (IDF) of premenopausal women. CONCLUSION: The prevalence of metabolic syndrome was higher in postmenopausal women than in premenopausal women. The main risk factor for the increase in this prevalence was age. Menopause, when it is analyzed alone, did not constitute a risk factor for metabolic syndrome.

Metabolic syndrome; menopause; prevalence; cardiovascular diseases


ARTIGOS ORIGINAIS

EPIDEMIOLOGIA

Síndrome metabólica e menopausa: estudo transversal em ambulatório de ginecologia

José Albuquerque de Figueiredo Neto; Eduardo Durans Figuerêdo; José Bonifácio Barbosa; Fabrício de Flores Barbosa; Geny Rose Cardoso Costa; Vinícius José da Silva Nina; Rachel Vilela de Abreu Haickel Nina

Universidade Federal do Maranhão, Hospital Tarquínio Lopes Filho, São Luiz, MA - Brasil

Correspondência Correspondência: José Albuquerque de Figueiredo Neto Rua Rer Ribeiro Mesquita - Ed. Dom Gabriel, apto 402 Calhau - 65075-260 - São Luiz, MA - Brasil E-mail: jafneto@cardiol.br jafneto@terra.com.br

RESUMO

FUNDAMENTO: No Brasil, são escassos os estudos sobre síndrome metabólica na população geral, mais raros são os que a correlacionam ao climatério.

OBJETIVO: Determinar a prevalência da síndrome metabólica e seus componentes em mulheres climatéricas.

MÉTODOS: Estudo transversal com 323 mulheres climatéricas, divididas em dois grupos: pré e pós-menopausadas. Foram avaliadas para presença de síndrome metabólica, segundo os critérios do National Cholesterol Education Program's (NCEP) e da International Diabetes Federation (IDF). Foi verificada a associação entre as variáveis estudadas e a síndrome metabólica por meio de análise uni e multivariada. Um p-valor < 0,05 foi considerado significante estatisticamente.

RESULTADOS: A prevalência de síndrome metabólica no climatério foi de 34,7% (NCEP) e de 49,8% (IDF). Os componentes mais frequentes da síndrome metabólica foram o HDL-colesterol baixo, hipertensão arterial, obesidade abdominal, hipertrigliceridemia e diabete em ambos os critérios. A análise multivariada mostrou que a idade foi o fator de risco mais importante para o surgimento da síndrome metabólica (p < 0,001), que esteve presente em 44,4% (NCEP) e 61,5% (IDF) das mulheres menopausadas em comparação a 24% (NCEP) e 37% (IDF) daquelas na pré-menopausa.

CONCLUSÃO: A prevalência de síndrome metabólica foi maior nas mulheres menopausadas que naquelas na pré-menopausa. O principal fator de risco para o aumento dessa prevalência foi a idade. A menopausa, quando analisada isoladamente, não se constituiu um fator de risco para a síndrome metabólica.

Palavras-chave: Síndrome metabólica, menopausa, prevalência, doenças cardiovasculares.

Introdução

A epidemiologia, o quadro clínico e o prognóstico das doenças cardiovasculares são diferentes em homens e mulheres. Tipicamente, as mulheres desenvolvem esse tipo de doença dez anos após os homens1. Na faixa etária dos 50 aos 64 anos, elas apresentam um aumento considerável no risco cardiovascular2. Essa mudança no perfil de risco cardiovascular coincide com o climatério e caracteriza-se pelo surgimento ou piora de alguns fatores de risco: obesidade central, hipertensão arterial sistêmica (HAS) e dislipidemia. Esse conjunto de fatores somado à hiperglicemia ou resistência à insulina compõem o conceito da síndrome metabólica (SM)3,4.

A questão a respeito do papel da menopausa como fator de risco para a SM é anterior ao estabelecimento do conceito da síndrome como se conhece atualmente. Desde a década de 70, estudos mostram uma associação causal entre a menopausa e os fatores de risco componentes da SM, enquanto outros atribuem o aumento do risco apenas ao processo de envelhecimento5-7.

Estudos latino-americanos com menopausadas demonstraram que idade, sedentarismo, tempo de menopausa, obesidade e hipertensão aumentam o risco de desenvolver SM8,9.

O risco de doença arterial coronariana (DAC) atribuído à SM parece ser especialmente alto no sexo feminino, e estima-se que metade dos eventos cardiovasculares nas mulheres esteja relacionada à SM10. A associação entre a menopausa e SM é controversa, porém, independentemente de a menopausa ser ou não um fator de risco isolado para a SM, qualquer aumento na prevalência conduzirá a resultados indesejáveis, entre esses o aumento das doenças cardiovasculares11.

No Brasil, especialmente no norte e no nordeste, estudos a respeito da SM na população geral são bastante escassos. Mais raros ainda são os que correlacionam a SM ao climatério. Essa carência de dados, somada à importância da SM como fator de risco cardiovascular motivou-nos a realizar este estudo, cujo objetivo foi determinar a prevalência da SM e de seus componentes em mulheres climatéricas, na pré e pós-menopausa, bem como a associação entre o estado menopausal e a SM.

Métodos

Delineamento do estudo

Estudo transversal e analítico realizado de fevereiro a setembro de 2008 em ambulatório de ginecologia de um hospital público terciário, sendo recrutadas 355 pacientes, das quais 32 recusaram-se a participar da pesquisa.

População

Mulheres climatéricas (40 a 65 anos) sintomáticas, com útero intacto e sem terapia hormonal. Foram constituídos dois grupos: mulheres pós-menopausadas e mulheres pré-menopausadas.

O cálculo amostral, considerando-se a prevalência de SM de 30%, intervalo de confiança de 5%, precisão absoluta de 3%, foi de 323 pacientes.

Definições

Climatério - Período da vida da mulher compreendido entre o fim da fase reprodutiva e o início da senectude (40 a 65 anos de idade)12.

Climatério sintomático - Caracteriza-se por: instabilidade vasomotora, sangramento menstrual irregular, sintomas psicológicos e atrofia geniturinária13.

Menopausa - Última menstruação espontânea12.

Pré-menopausa - Período em que a mulher climatérica ainda apresenta ciclos menstruais, regulares ou não13.

Perimenopausa ou transição menopausal - Período que tem início dois anos antes da última menstruação, estendendo-se até um ano após. As mulheres apresentam ciclos menstruais irregulares e alterações endócrinas13.

Pós-menopausa - Período iniciado um ano após a última menstruação. É subdividida em precoce (até cinco anos da última menstruação) ou tardia (mais de cinco anos)13.

Síndrome metabólica - Transtorno representado por um conjunto de fatores de risco cardiovascular relacionados à deposição central de gordura, resistência insulínica, HAS, HDL-colesterol (HDL-c) baixo e hipertrigliceridemia, diagnosticado de acordo com os critérios do Programa Nacional de Educação em Colesterol - III Painel de Tratamento de Adultos (National Cholesterol Education Program's Adult Treatment Panel III - NCEP-ATP III-2005)3 e da Federação Internacional de Diabete (International Diabetes Federation - IDF-2005)4 (Tabela 1),

Segundo o NCEP-ATP III, a SM representa a combinação de três das seguintes variáveis: diabete, HAS, obesidade abdominal, hipertrigliceridemia, baixo HDL-c3. De acordo com a IDF, o diagnóstico é feito pela presença de obesidade abdominal (CA > 80 cm) e mais dois critérios entre os apresentados na tabela 14.

Coleta de dados

Foi preenchida uma ficha-protocolo que continha: idade, grupo (pré ou pós-menopausa), cor da pele, ocupação, antecedentes pessoais e familiares, tabagismo, etilismo, medicamentos, pressão arterial, circunferência abdominal (CA), circunferência do quadril (CQ), IMC, trigliceridemia, HDL-c, glicemia de jejum.

Para "idade", foram adotadas quatro categorias: 40 a 45; 46 a 50; 51 a 55 e 56 a 65 anos. Para "ocupação", foram adotadas três categorias: não manual; manual e fora da população economicamente ativa (PEA). Os dados foram digitados no MS-Excel® (Microsoft, Charlotte, NC, USA) e, em seguida, exportados para o Stata 10.0® (Statacorp, College Station, TX, USA) para a análise estatística.

Análise estatística

Os dados foram apresentados como média, desvio-padrão, percentagens, odds ratio e intervalos de confiança.

A associação entre o estado menopausal e a SM foi verificada em modelo de regressão logística simples, estimando-se o odds ratio e seu intervalo de confiança de 95%. Foi realizada também análise bivariada entre faixa etária, cor da pele e ocupação com SM. Em modelo de regressão logística múltipla, foi calculado o odds ratio do estado menopausal em relação à SM, ajustado para faixa etária, cor da pele e ocupação. As análises foram feitas separadamente para os critérios NCEP e IDF. Um valor de p<0.05 foi considerado significante estatisticamente.

Aspectos éticos

Os dados foram coletados após a aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa da instituição, e as pacientes assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Resultados

A idade média da população estudada foi de 49,7 anos. A prevalência de SM pelos critérios do NCEP foi de 34,7% (112 casos), enquanto, pela IDF, foi de 49,85% (161 casos).

Das 323 mulheres, 154 (47,68%) estavam na pré-menopausa, e 169 (52,32%), na pós-menopausa. A SM foi mais prevalente na pós-menopausa que na pré-menopausa por ambos os critérios. Segundo o NCEP, 44,4% das pós-menopausadas apresentaram SM em comparação a 24% na pré-menopausa - OR=2,52 (IC=1,56-4,07), p<0,001. Já pela IDF, a SM esteve presente em 61,5% das pós-menopausadas e em 37% das pré-menopausadas - OR=2,72 (IC=1,74-4,27), p<0,001.

Em relação às faixas etárias, a SM foi mais frequente quanto maior a idade da paciente, havendo associação estatisticamente significativa entre a idade e a ocorrência de SM por ambos os critérios (p<0,001).

Quando utilizado o conceito do NCEP, não houve associação estatisticamente significativa (p=0,228) entre a cor da pele e a ocorrência de SM, apesar da sua maior frequência naquelas de cor negra (42,9%), seguidas por brancas (37,9%) e pardas (31%). Tal associação também não foi observada quando utilizado o conceito da IDF (p=0,323); embora a SM tenha sido mais prevalente nas mulheres negras (59,2%) seguidas por pardas (49,2%) e brancas (46%).

Em relação às ocupações, observou-se que a SM foi predominante nas mulheres fora da população economicamente ativa (PEA) em ambos os protocolos de diagnóstico. Segundo o NCEP, a SM esteve presente em 42,2% das mulheres fora da PEA, em 29,8% daquelas com ocupações não manuais e em 29,7% das mulheres com ocupações manuais (p=0,071). Também não houve associação estatística entre as categorias de ocupação e a prevalência de SM segundo a IDF (p=0,110).

A prevalência de SM, distribuída quanto a idade, estado menopausal, cor da pele e ocupação, encontra-se demonstrada na Tabela 2 (NCEP) e na Tabela 3 (IDF).

Quando os componentes da SM são analisados isoladamente, o HDL-C baixo apresentou prevalência de 79,6% (n=257), seguido pela HAS em 65% das pacientes (n=210), hipertrigliceridemia em 12,4% (n=40) e hiperglicemia em 11,8% (n=38).

A prevalência de obesidade abdominal foi de 40,9% (n=132) pelos critérios do NCEP (CA> 88 cm) e de 81,1% (n=262) segundo o conceito da IDF (CA> 80 cm).

A prevalência de todos os componentes estudados foi maior entre as pós-menopausadas que entre as pré-menopausadas, apresentando significância estatística apenas a obesidade abdominal e a HAS (CA-IDF p=0,049) (CA-NCEP p<0,001) (HAS p=0,001) (Tabela 4).

O número de componentes entre as portadoras de SM também foi analisado. Segundo o NCEP, 73,2% das portadoras de SM apresentaram três, 19,6% apresentaram quatro, e 7,1% apresentaram todos os cinco componentes da SM. Quando utilizado o critério da IDF, 77,6%, 15,5% e 6,8% das portadoras de SM apresentaram, respectivamente, três, quatro e cinco componentes.

Em relação ao estado menopausal, o número de componentes entre as portadoras de SM mostrou-se aumentado entre as pós-menopausadas em ambos os critérios de diagnóstico.

Houve associação estatisticamente significativa entre aumento da idade e prevalência de SM pelo conceito do NCEP (p<0,001) e pela IDF (p=0,005). Pelos critérios do NCEP, observou-se incremento de 15 vezes no risco de SM em mulheres na faixa etária de 56 a 65 anos (OR=14,87 IC 4,24-52,13) quando comparadas àquelas entre 40 e 45 anos. Também houve aumento significativo (7,5 vezes) do risco de SM quando as mesmas faixas etárias foram comparadas segundo o conceito da IDF. (OR=7,5 IC 2,18-26,07)

Em relação ao estado menopausal, cor da pele e ocupação, a análise multivariada não demonstrou associação estatisticamente significativa entre essas variáveis e a ocorrência de SM (Tabela 5 - NCEP) (Tabela 6 - IDF).

Discussão

O conceito de SM já existe há várias décadas; entretanto, somente a partir da uniformização dos critérios de diagnóstico, foi possível comparar a prevalência entre as populações. Diferenças genéticas, alimentares, nível de sedentarismo, idade, sexo e hábitos de vida influenciam a prevalência da SM e seus componentes11.

A prevalência da SM em mulheres é muito variável. De acordo com as características da população estudada e do critério de diagnóstico adotado, encontram-se prevalências que vão de 10,7% em mulheres coreanas acima de 30 anos pelo NCEP14,15 até 74% em pós-menopausadas coronariopatas na cidade de Birmingham (EUA) pela IDF16.

A prevalência geral de SM pelo NCEP, neste estudo, foi de 34,7%. Esses dados estão de acordo com os encontrados por Ford e cols.17 em 4.441 mulheres americanas acima de 40 anos, (33%). Deibert e cols.18, acompanhando mulheres climatéricas por 12 meses na Alemanha, encontrou prevalência de 36,1% de SM (NCEP).

Neste estudo, pelo conceito do NCEP, a prevalência da SM entre as pós-menopausadas (44,4%) foi maior que entre as pré-menopausadas (24%). Esse dado é compatível com um estudo multicêntrico de 2007 realizado com 3.965 mulheres climatéricas latino-americanas9, que diagnosticou SM em 42,9% das pós-menopausadas e em 28,1% das pré-menopausadas. Deibert e cols.18 encontraram prevalência de 36,1% na pós-menopausada e de 22,7% na pré-menopausa. Estudos com mulheres menopausadas no Canadá19, Equador8 e Coreia do Sul20 encontraram prevalências de 31%, 41,5% e 54,6% respectivamente.

Pelos critérios da IDF, observou-se maior prevalência de SM entre as pós-menopausadas (61,5%) em relação às pré-menopausadas (37%). Entre chinesas menopausadas, Ding e cols.21 encontraram 37,3% de SM-IDF. Influências sócio-culturais, hábitos alimentares, nível de sedentarismo e diferente urbanização entre as populações também alteram a prevalência da SM, o que pode justificar essa diferença.

Quanto à faixa etária, esse estudo encontrou uma prevalência crescente da SM. Segundo o NCEP, 14,1% entre 40 e 45 anos e 66,7% entre 56 e 64 anos. Pelo conceito da IDF, 33,3% e 82,4% nas mesmas faixas etárias. Esse dado mostrou-se estatisticamente significante tanto na análise univariada quanto na multivariada. No Brasil, dados epidemiológicos a respeito da SM são escassos na população geral e mais raros ainda entre mulheres climatéricas. Estudo realizado no semiárido baiano com 138 mulheres encontrou 18,2% de SM (NCEP-2001) em mulheres abaixo de 45 anos e 56,9% naquelas com 45 anos ou mais22. Estudo conduzido em Vitória-ES que avaliou 887 mulheres encontrou prevalência de SM (NCEP-2001) de 33,6% em mulheres de 45 a 54 anos e de 53,4% entre 55 e 64 anos23. Estudo realizado nas Ilhas Seychelles encontrou prevalências de 46% e 68% em mulheres nas faixas etárias de 45 a 54 e 55 a 64 anos24.

O aspecto genético pode contribuir para a alta prevalência encontrada neste estudo, pois o traço negroide encontra-se amplamente distribuído na população estudada (73,1% negras/pardas). O mesmo ocorre nas populações estudadas na Bahia22 (84,3%) e no Espírito Santo23 (66,8%). É importante destacar a alta frequência dos componentes da SM entre os afro-descendentes, tais como HAS mais precoce e mais prevalente, obesidade e DM tipo 2, particularmente nas mulheres negras22.

Quando os componentes da SM são analisados isoladamente, a alteração mais encontrada foi a obesidade abdominal pela IDF (CA > 80 cm), com uma frequência de 81,1%. Como o critério de obesidade abdominal pela IDF é mais rigoroso que o do NCEP (CA > 88 cm), e já que as mulheres climatéricas apresentaram um aumento estatisticamente significante da CA, esse componente tornou-se o mais frequente, seguido pelo HDL-c baixo (79,6%), HAS (65%), obesidade abdominal (NCEP) (40,9%), hipertrigliceridemia (12,4%) e hiperglicemia de jejum (11,8%). Quando analisados os componentes da SM em relação ao estado menopausal, a mesma ordem de frequências foi mantida, e todas as alterações foram mais frequentes no grupo pós-menopausa. Oliveira e cols.22 encontraram a mesma ordem de frequências, nas seguintes percentagens: 84,1%, 53,6%, 47,1%, 18,1% e 16,7%. Em Vitória-ES, houve uma inversão apenas nos dois primeiros componentes, os demais seguiram a mesma ordem23.

Em estudo realizado em Porto Alegre, 5,1% das mulheres apresentavam agregação de quatro a cinco fatores de risco para doenças cardiovasculares, e 4,5% apresentavam hipertensão e diabete agregados, dois componentes da SM25.

Oh e cols.15 estudaram 449 mulheres sul-coreanas e encontraram como componentes mais frequentes: HDL-c baixo, HAS, hipertrigliceridemia, hiperglicemia e obesidade abdominal. Segundo os autores, as características genéticas da população coreana são responsáveis por essa menor prevalência de obesidade abdominal.

Os estudos que objetivam demonstrar a correlação entre a menopausa e os fatores de risco cardiovascular, incluindo a SM, são contraditórios. Uma maior prevalência de cada fator e da SM entre mulheres menopausadas que em mulheres em idade fértil é o resultado mais encontrado. Nas décadas de 1980 e 1990, Staessen e col. demonstraram que mulheres menopausadas e mais idosas tinham PA maior que mulheres na pré-menopausa e mais jovens26,27. Em 1987, Villecco e cols.28 encontraram "acréscimo temporário na PA, relacionado à falência ovariana". Hjortland e cols.29 acompanharam 1.686 mulheres climatéricas e não encontraram diferença significativa no peso, na PA e na glicemia na pós-menopausa.

Uma recente revisão na Califórnia que correlacionou a menopausa cirúrgica ao risco cardiovascular não pôde realizar a metanálise pretendida devido à heterogeneidade dos resultados encontrados, bem como às falhas metodológicas dos estudos30.

Esses resultados conflitantes podem ser atribuídos a vários fatores: diferentes desenhos metodológicos, população estudada, faixa etária, tempo desde a menopausa, menopausa espontânea ou cirúrgica, critérios diagnósticos da SM e até mesmo graves erros metodológicos. Um estudo realizado na Universidade de Bristol, por exemplo, o estado "menopausada" foi atribuído a toda mulher acima de 50 anos, sob o argumento de que "essa é a idade média da menopausa na mulher britânica"31.

Diante de tantos fatores de confusão, torna-se difícil extrair alguma conclusão definitiva desses estudos. Há uma crença generalizada de que as mulheres perdem a "vantagem cardiovascular" após a menopausa, aumentando a morbimortalidade cardiovascular32. O declínio da função ovariana é considerado a causa desse fenômeno9,33,34.

As estatísticas disponíveis não fornecem suporte para uma conclusão definitiva sobre o papel da menopausa como fator de risco isolado para o aumento na prevalência da SM. Neste estudo, as mulheres menopausadas apresentaram uma prevalência mais alta da SM quando considerados ambos os critérios de diagnóstico, porém essa diferença não se mostrou estatisticamente significativa quando feito o ajuste pela idade, o que diverge da maioria dos estudos. A estratificação em grupos etários mostrou-se estatisticamente significativa na análise univariada e multivariada. Portanto, os resultados encontrados permitem-nos concluir que, na população estudada, o aumento na prevalência da SM nas mulheres menopausadas foi causado principalmente pelo aumento da idade.

Casiglia e cols.35, estudando 9.364 homens e mulheres italianos encontraram resultados semelhantes aos deste estudo: maior prevalência dos componentes da SM na pós-menopausa, porém essa diferença desapareceu após ajuste para idade. Os autores citam, na conclusão do trabalho, que "os efeitos cardiovasculares usualmente atribuídos à menopausa parecem ser uma mera consequência da maior idade das menopausadas"35.

A questão em torno do papel da menopausa como fator de risco para o surgimento da SM e de suas consequências permanece controversa. Uma limitação deste estudo foi o número pequeno da população estudada, ainda que os resultados estejam de acordo com diversos outros trabalhos8,9,19,22,23. Devido à heterogeneidade étnica e cultural da população dessa região, serão necessários outros estudos para confirmar os resultados encontrados e, a partir daí, desenvolver ações de prevenção da SM nas mulheres climatéricas.

Conclusão

A SM foi mais prevalente na pós-menopausa que na pré-menopausa por ambos os critérios. A menopausa não se constituiu um fator de risco independente para a SM, sendo a idade o principal fator de risco independente para a sua ocorrência.

Potencial Conflito de Interesses

Declaro não haver conflito de interesses pertinentes.

Fontes de Financiamento

O presente estudo não teve fontes de financiamento externas.

Vinculação Acadêmica

Este artigo é parte de dissertação de Mestrado de Eduardo Durans Figueredo pela Universidade Federal do Maranhão e do Hospital Tarquínio Lopes Filho.

Artigo recebido em 27/08/09; revisado recebido em 18/03/10; aceito em 26/04/10.

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  • Correspondência:
    José Albuquerque de Figueiredo Neto
    Rua Rer Ribeiro Mesquita - Ed. Dom Gabriel, apto 402
    Calhau - 65075-260 - São Luiz, MA - Brasil
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      23 Jul 2010
    • Data do Fascículo
      Set 2010

    Histórico

    • Recebido
      27 Ago 2009
    • Aceito
      26 Abr 2010
    • Revisado
      18 Mar 2010
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