EFEITO DO ÓLEO DE COPAÍBA NA MUCOSA INTESTINAL DE RATOS SUBMETIDOS AO CHOQUE HIPOVOLÊMICO

RESUMO

Racional:

O choque hipovolêmico é situação comum em pacientes politraumatizados, podendo acarretar isquemia de vários órgãos, aumentando a morbimortalidade. O intestino é geralmente um dos órgãos mais afetados por essa condição.

Objetivo:

Avaliar os efeitos do óleo de copaíba na lesão da mucosa intestinal de ratos submetidos ao choque hipovolêmico.

Métodos:

Quinze ratos foram distribuídos em três grupos: Sham - operação simulada; isquemia - submissão ao choque hipovolêmico; e copaíba - submissão ao choque hipovolêmico previamente tratados com óleo de copaíba. A pressão arterial média, a gasometria arterial após a indução do choque, o grau da lesão intestinal e o tamanho das vilosidades foram avaliados.

Resultados:

O grupo sham apresentou os menores valores de lactato e PaCO₂ e os maiores valores de pressão arterial média, pH e bicarbonato em relação aos demais grupos. O grau de lesão mesentérica foi de zero no sham; 3,0±1,00 no grupo isquemia; e 3,0±0,71 no da copaíba. O comprimento dos vilos foi de 173,60±8,42 no grupo sham, 142,77±8,33 no da isquemia e 143,01±9,57 no da copaíba. Houve diferença significante entre o grupo sham e os demais grupos (p<0.05); contudo, não houve diferença estatística entre os grupos submetidos ao choque hipovolêmico.

Conclusão:

A administração do óleo de copaíba não reduziu a lesão da mucosa intestinal de ratos submetidos ao choque hipovolêmico.

DESCRITORES:
Doença vascular intestinal; Intestino delgado; Plantas medicinais; Ratos

ABSTRACT

Background:

Hypovolemic shock is a common disease in polytrauma patients and may develop ischemia in various organs, increasing morbidity and mortality. The bowel is usually most affected by this condition.

Aim:

To evaluate the effects of copaiba oil on the intestinal mucosa’s injury of rats submitted to hypovolemic shock.

Method:

Fifteen rats were divided into three groups: sham - simulated surgery; ischemia - animals submitted to hypovolemic shock; and copaiba - animals submitted to hypovolemic shock previously treated with copaiba oil. Mean blood pressure, arterial blood gas after shock induction, degree of intestinal lesion and villus length were evaluated.

Results:

The sham presented the lowest values of lactate and PaCO₂ and the highest values of mean arterial pressure, pH and bicarbonate in relation to the other groups. The degree of mesenteric lesion was zero in the sham group; 3.00±1.00 in the ischemia group; and 3.00±0.71 in the copaiba group. The villus length was 173.60±8.42 in the sham, 142.77±8.33 in the ischemia and 143.01±9.57 in the copaiba group. There was a significant difference between the sham and the other groups (p<0.05); however, there not significant difference between groups Ischemia and copaiba.

Conclusion:

Administration of copaiba oil did not reduce the intestinal mucosa lesion of rats after hypovolemic shock.

HEADINGS:
Mesenteric vascular disease; Small intestine; Medicinal plants; Rats

INTRODUCÃO

O trauma corresponde a uma das principais causas de morte no mundo, principalmente em adultos jovens¹². Diversos são os mecanismos que levam as disfunções orgânicas graves¹⁶, sendo o choque hipovolêmico é um dos mais comuns. Ele acarreta isquemia de diversos órgãos, principalmente rins e território esplâncnico^3,15.

O intestino delgado é muito sensível à isquemia por sua elevada atividade metabólica¹⁹; acarretando em piora da cicatrização após a confecção de anastomoses^5,7, aumento de fistulas, e dificuldade na absorção adequada dos nutrientes, causando desnutrição, anemia e diarreia. Ele é uma das principais fontes de bactérias causadoras de sepse, que acontece com a quebra da barreira intestinal permitindo ampla translocação bacteriana¹⁷.

Diversas alternativas foram avaliadas visando diminuir a lesão por isquemia na mucosa intestinal. Para tanto, foram utilizadas soluções salinas hipertônicas¹³ e hidrocortisona²³ durante a ressuscitação volêmica; medicações como pentoxifilina¹⁸ e N-acetil-cisteina¹; probióticos²²; e terapia nutricional enteral¹⁴. Porém, esses métodos apresentaram efeitos duvidosos ou pouco benéficos.

O óleo de copaíba é originado da seiva das árvores de copaifera (família Fabaceae) e apresenta ações comprovadas^6,24,25 como anti-inflamatório, cicatrizante e antioxidante. Este óleo foi testado em colite induzida²⁰ por ácido acético em ratos e apresentou efeito positivo como anti-inflamatório. Além disso, em um estudo avaliando os efeitos dele em sepse abdominal por ligadura e punção cecal¹⁷, houve aumento da sobrevida global com menor grau de lesão pulmonar e menores níveis de estresse oxidativo.

Assim, este estudo pretende investigar os efeitos do óleo de copaíba na mucosa intestinal de ratos submetidos ao choque hipovolêmico.

MÉTODOS

Este trabalho foi aprovado pelo Comité de Ética e Pesquisa no Uso de Animais da Universidade do Estado do Pará (protocolo 11/11). Foram utilizados 15 ratos (Rattus norvegicus) Wistar machos, pesando entre 200-250 g oriundos do biotério do Laboratório de Cirurgia Experimental da Universidade do Estado do Pará. Os animais foram mantidos em ambiente apropriado com temperatura e umidade controladas e ciclo claro e escuro de 12/12 h com água e ração foram ofertadas ad libitum.

Os animais foram aleatoriamente divididos em três grupos (n=5): sham (GS), operação simulada em todas as etapas cirúrgicas sem a realização do choque hipovolêmico; isquemia (GI), animais submetidos ao choque hipovolêmico; e copaíba (GC), animais submetidos ao choque hipovolêmico previamente tratados com óleo de copaíba.

Os animais do GC receberam óleo de copaíba (Copaifera officinalis) por gavagem na dose de 0,63 ml/kg uma vez ao dia durante sete dias antes²⁷ da indução do choque hipovolêmico. A análise espectrofotométrica do óleo está descrita na Tabela 1. Os animais do GS e GI receberam soro fisiológico 0,9% nas mesmas proporções do óleo de copaíba.

TABELA 1
Composição do óleo de copaíba (Copaifera officinalis) utilizado

Constituintes	%
Limonene	0,24
α-copaene	0,10
7-epi-sesquithujene	0,25
cyperene	0,42
cis-α-bergamotene	0,15
β-caryophyllene	10,00
trans-α-bergamotene	18,32
epi-β-santalene	0,05
α-humulene	3,02
γ-curcumene	0,24
mw=204	2,01
α-zingiberene	0,21
β-bisabolene	52,03
(Z)-α-bisabolene	2,90
β-sesquiphelandrene	2,31
mw=204	3,98
(E)-γ-bisabolene	0,20
caryophyllene alcohol	0,05
caryophyllene oxide	0,33
β-atlantol	0,12
epi-β-bisabolol	0,21
epi-α-bisabolol	0,53

Todos os procedimentos cirúrgicos foram realizados sob anestesia (quetamina - 70 mg/kg mais xilasina - 10 mg/kg, intraperitonealmente). Confirmado o plano anestésico, foi realizado uma cervicotomia mediana e dissecção da região direita até identificação e isolamento da artéria carótida comum direita sob magnificação de sistema de videomicrocirurgia². Foi realizada a cateterização da artéria com um jelco 24º G, previamente heparinizado; em seguida foi drenado 30% da volemia do animal (baseado na formula: “volume total (ml)=peso do animal (gramas)x0,06”)²⁶ com auxílio de seringa de vidro durante 10 min, induzindo assim o choque hipovolêmico. Terminado a coleta de sangue, foi mantido o jelco heparinizado para posterior coleta de sangue.

Os animais foram mantidos em ambiente aquecido a 36º C e ressuscitados volemicamente com soro fisiológico 0,9% na dose de 10 ml/kg por via subcutânea. Cinquenta minutos após a indução do choque foi mensurada a pressão arterial média e coletado 0,1 ml de sangue para realização de gasometria arterial²³ através do jelco fixo na artéria carótida comum direita. Após a coleta foi realizada ligadura nos dois cotos da artéria com seda 4-0, e a pele foi suturada com náilon 5-0.

Após esse procedimento, os animais foram acompanhados por 72 h. Ao final desse período, foi realizada a eutanásia por meio da injeção intraperitoneal de xilazina em alta dose.

Foi coletado um segmento de 2 cm do íleo, distando 3 cm do ceco. Este segmento foi lavado em água corrente para retirada de fezes e fixado em formol tamponado e submetido a processo histopatológico de rotina e corado com H&E. Foi avaliado o grau de lesão baseado na escala de Chiu et al⁷ e as medições do comprimento das vilosidades⁵ foram feitas medindo dez vilosidades bem orientadas (cortadas ao longo de seu comprimento) em cada um dos animais.

Análise estatística

Para a análise estatística foram utilizados os seguintes testes e meios: software BioEstat^© 5.3 para a realização das análises estatísticas; ANOVA para comparar o comprimento das vilosidades e parâmetros gasométricos; Kruskal-Wallis para comparar os resultados histopatológico. Foi adotado nível de significância de 5% para rejeitar a hipótese nula.

RESULTADOS

Durante o procedimento e seguimento pós-operatório não houve necessidade de realizar manobras de ressuscitação nem houve mortes de animais. A pressão arterial média dos animais do GS foi de 75,00±1,20 mmHg, no GI de 42,20±2,68 mmHg e no GC de 42,60±1,67 mmHg. Houve diferença significativa entre o GS em relação aos grupos GI e GC (p<0,01).

Em relação a análise gasométrica (Tabela 2), o GS apresentou os menores valores de lactato e PaCO₂ e os maiores de pH e bicarbonato em relação aos grupos GI e GC (p<0,05). Não houve diferença significativa entre os grupos GI e GC.

TABELA 2
Média e desvio-padrão dos parâmetros gasométricos de acordo com os grupos

Parâmetro	Sham*	Isquemia	Copaíba
pH	7,39±0,02	7,08±0,06	7,11±0,04
PaCO2	54,00±3,80	65,20±3,70	63,60±4,77
HCO3	25,80±1,48	16,40±3,57	16,20±2,28
Lactato	1,42±0,44	7,20±1,64	7,60±0,54

• p<0,05 sham vs. outros grupos (ANOVA)

O escore médio de lesão intestinal é demonstrado na Tabela 3. O GS mostrou mucosa normal, e houve diferença significativa entre este grupo em relação aos animais submetidos ao choque hipovolêmico; entre grupos GI e GC não houve diferença significativa (p>0,05). Em relação ao comprimento dos vilos (Tabela 2), houve diferença entre o grupo sham e os demais (p<0,05); entretanto, não houve diferença entre os grupos GI e GC (p>0,05).

TABELA 3
Média e desvio-padrão da pontuação da lesão intestinal e tamanho dos vilos de acordo com os grupos

Parâmetro	Sham	Isquemia	Copaíba
Lesão intestinal	0,00±0,00*	3,00±1,00	3,00±0,71
Tamanho dos vilos	173,60±8,42**	142,77±8,33	143,01±9,57

• *p<0,05 sham vs. outros grupos (Kruskal-Wallis);**p<0,05 sham vs. outros grupos (ANOVA)

DISCUSSÃO

A utilização de plantas medicinais é uma prática que vem sendo estimulada pela Organização Mundial de Saúde e nas atuais diretrizes do Sistema Único de Saúde, visto a dificuldade da população na aquisição de medicamentos; contudo, existe a possibilidade de reconhecimento de novos princípios ativos que podem ser agregados ao arsenal terapêutico atual. Porém, há poucos relatos científicos que suportam a utilização da maioria das plantas medicinais, bem como pouco se sabe de seus possíveis efeitos colaterais^{6,20,24,25,27}.

O óleo de copaíba apresenta vários efeitos científicos comprovados como cicatrizante, antibiótico, anti-inflamatório e antioxidante^{6,17,20,24,25,27}. A síndrome de isquemia e reperfusão foram testadas na oclusão vascular em modelos experimentais em isquemia renal⁴, hepática⁹, pele¹⁰ e mesentérica²¹ e, em todos os cenários, apresentou um menor dano celular, devido principalmente aos elevados níveis de ß-carofileno.

No presente estudo, baseado nos parâmetros avaliados, o óleo de copaíba não apresentou efeito benéfico, pois teve resultados semelhantes nos grupos onde foi utilizado. A profilaxia por sete dias utilizando-o mostrou em diversos estudos anteriores melhor cicatrização^{6,20,24,25,27} e proteção contra lesões isquêmicas^4,9,10,21; porém, nenhum estou a ação em modelo de choque hipovolêmico.

A pressão arterial média em ambos os grupos submetidos à hipovolemia foi igual, como inicialmente previsto, devido à baixa influência do tratamento na volemia geral do animal. Porém, não houve mudança no perfil gasométrico e lesão histológica intestinal, contrastando com o encontrado com a maioria dos estudos avaliando o óleo de copaíba em isquemia e reperfusão de órgãos específicos. Comelli Junior⁸ também não identificaram alteração na cicatrização de anastomoses intestinais em ratos tratados com óleo de copaíba.

O elevado grau de inflamação sistêmica causado pelo choque hipovolêmico deve ter sido um dos fatores que influenciou no resultado, reduzindo a níveis quase imperceptíveis a melhora causada pelo óleo de copaíba. A utilização de dose elevadas (200-400 mg/kg)¹¹ talvez pudesse apresentar melhores efeitos.

É importante ressaltar que o resultado negativo desta pesquisa não indica falha. A aquisição de conhecimento com resultados nulos auxilia outros pesquisadores a não repetirem o mesmo método, e a publicação desses resultados é válida por poupar tempo e financiamento, e também por suscitar modificações que possam levar a resultados positivos com outro desenho de estudo.

CONCLUSÃO

A administração do óleo de copaíba não reduziu a lesão da mucosa intestinal de ratos submetidos ao choque hipovolêmico.

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• Fonte de financiamento:

  não há

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  21 Out 2019
• Data do Fascículo
  2019

Histórico

• Recebido
  07 Fev 2019
• Aceito
  16 Maio 2019