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A saúde no Brasil - perspectivas otimistas?

O sistema de saúde brasileiro é misto: público e privado. Existe o sistema público - SUS e o sistema de saúde suplementar (operadoras de saúde). O SUS foi muito bem desenhado e implantado há cerca de 25 anos (1988). A ANS - agência nacional de saúde suplementar é ainda mais jovem, criada em janeiro de 2000. A ANS é a agência reguladora vinculada ao Ministério da Saúde. Os dois sistemas convivem, mas não interagem de maneira adequada.

Do SUS dependem exclusivamente 150 milhões de pessoas e operadoras de saúde têm no seu portólio cerca de 52 milhões de usuários. Vários desses usuários também utilizam o SUS em demandas de saúde e todos nós brasileiros usamos o SUS (vigilância sanitária, por exemplo).

O financiamento público da saúde não tem sido suficiente para atender às demandas das pessoas. A partilha dos gastos dá-se nos três níveis, mas há progressiva desoneração da parcela federal, sacrificando cada vez mais o orçamento estadual e principalmente o municipal. Há cerca de 12 anos, a participação dos gastos federais na saúde era em torno de 60% do todo. Hoje somente 42%, pois cerca de 58% vêm de estados e municípios. Os municípios tem que aplicar pelo menos 12% e estados pelo menos 15% do seu orçamento na saúde pública. O sistema suplementar, que atende cerca de 25% da população, tem mais recursos que o sistema público.

Embora reconheçamos melhorias no sistema de saúde público, a gestão ainda não é qualificada, porque predomina o viés político-eleitoral na escolha desses gestores, que deveria ter forte influência técnica. Não se aproveita de maneira adequada a maior e mais qualificada eficiência do setor de saúde suplementar. Além de não se ter recursos suficientes, ainda gasta-se mal. Contribui também a desenfreada corrupção que teima em assolar nosso país, de povo bom, ordeiro, trabalhador.

Acreditamos que parcerias público-privadas e efetiva priorização do setor saúde poderá trazer ainda mais ganhos ao sistema, beneficiando diretamente a população, especialmente a mais pobre e carente, que já sofre muito, devido a miséria, atrasos na educação, infra-estrutura, segurança etc.

Não somente a assistência na saúde sofre, mas também o ensino, a pesquisa. A assistência deveria priorizar o acesso com qualidade, garantindo fortalecer as duas principais portas de entrada ao sistema: atenção primária, básica e urgência e emergência. Uma rede integrada deveria existir, com grande controle e avaliação, garantindo com segurança, a referência e contra-referência dos pacientes que utilizam o SUS.

O ensino no setor tem deixado a desejar. Abriram-se várias escolas médicas, sendo a grande maioria privada e sem todas as condições para um bom funcionamento: boa estrutura física, pensando nas atividades práticas, como também grade curricular atual para o Brasil e corpo docente qualificado. O governo federal reclama de que nossas escolas médicas formam poucos alunos a cada ano, mas teima em autorizar novas com 40-50 vagas cada ano. Percebe-se que precisamos formar melhor nossos médicos e nossos outros profissionais de saúde. Na pós-graduação também ocorre um desmonte nesse momento, onde também prioriza-se a quantidade, em detrimento da qualidade. Formemos a quantidade necessária, com a devida qualificação, porque é possível, é melhor.

A residência médica, que tem sido o melhor padrão para a assistência, tem sofrido com intervenções descabidas, com elevada intromissão ditatorial.

Não há planejamento para o número de profissionais de saúde (médicos, enfermeiros, dentistas, fisioterapeutas etc.) para os dias atuais, nem para os próximos 10, 20 ou 30 anos. Continuamos improvisando, querendo importar modelos de outros países, fazendo-os com utilização de padrões que não se adequam ao todo da nossa realidade. Por quê o governo diz que quer no Brasil 2,7 médicos por 1.000 habitantes (como no Reino Unido)? Ora, hoje já temos várias cidades que superam esse índice: Brasília, Rio de Janeiro, São Paulo e outras, todavia o sistema público é caótico se analisarmos simplesmente acesso com qualidade. São enormes as filas de pacientes para realizar consultas, exames e procedimentos cirúrgicos. Vários desses pacientes socorrem-se nas emergências, superlotando-as e muitos deles morrem, por causas evitáveis.

A pesquisa clínica no Brasil, sétima economia do mundo, também nos envergonha quando comparada com vários países. Há teimosa burocracia e superposição de poderes, que entre tantas ineficiências, atrasam sobremaneira a análise dos vários estudos. Estamos a reboque na pesquisa clínica. Perdem os pacientes, os pesquisadores, o Brasil. Alguns pacientes deixam de participar de estudos que podem significar ganhos em qualidade de vida e até cura. Nossos pesquisadores perdem várias oportunidades de destaque, principalmente em estudos fase I e II. Perde o Brasil, pois é inegável o ganho que a pesquisa leva ao desenvolvimento, gerando riquezas, divisas.

Contudo, se muito ainda pode e deve ser feito e se não identificarmos que as pessoas que aí estão não conseguem realizá-lo, que utilizemos da nossa força democrática para mudar esse triste cenário. O Brasil é muito mais que qualquer um de nós, qualquer partido. A saúde é nosso bem maior e o população brasileira merece respeito!

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Sep 2014
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